Buscar

HIPERNATREMIA - DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DO SÓDIO

Prévia do material em texto

Ádila Cristie Matos Martins 	 UCXVI 	 	 Aula 1, INTERPRETAÇÃO CLÍNICA II
t
DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DO SÓDIO 
Hipernatremia 
- É a concentração sérica de sódio > 145 mEq/L, parâmetro laboratorial que 
expressa e quantifica o estado hiperosmolar, já que o sódio é o principal elemento 
da osmolaridade EC. Implica déficit do total de água corporal em relação ao total 
de sódio corporal porque a ingestão de água fica abaixo da perda
- É hipertônica, ou seja, sempre cursa com ↑ da osmolaridade plasmática efetiva
PRINCIPAIS SITUAÇÕES CLÍNICAS QUE CURSAM COM HIPERNATREMIA 
- Para desenvolver hipernatremia, duas condições são necessárias: (1) perda de 
água livre ou de fluidos hipotônicos (isto é, com mais água do que sódio) e (2) 
incapacidade de ingerir ou acesso limitado a líquidos 
- Encontramos a hipernatremia geralmente em recém-natos, lactentes, idosos, 
pacientes intubados, pacientes com mecanismo de sede prejudicado e indivíduos 
com rebaixamento da consciência ou pacientes gravemente enfermos e acamados, 
pois são justamente estes os pacientes que não têm livre acesso à água
- A perda de água livre geralmente se dá pelo aumento das chamadas “perdas 
insensíveis”, ou seja, transpiração (perda cutânea, relacionada à febre ou clima 
quente), respiração (hiperpneia), fezes (diarreia) e urina (poliúria). Estes pacientes 
encontram-se desidratados, um tipo denominado desidratação hipertônica 
PERDA DE ÁGUA LIVRE:
- Aumento das perdas cutâneas: estão entre as causas mais comuns de perda de 
água livre e hipernatremia. O suor é um líquido hipotônico, por conter 
concentrações eletrolíticas muito baixas. A exposição a ambientes quentes, 
exercícios físicos prolongados e extenuantes, febre alta diária, queimaduras, todos 
são importantes causas de perda de água livre, com uma perda geralmente 
desprezível de eletrólitos
- Perda respiratória: indivíduos com hiperpneia ou taquipneia perdem uma 
quantidade expressiva de água livre pela respiração. Se não beberem água ou 
receberem fluidos hipotônicos na hidratação, podem desenvolver hipernatremia 
- Diabetes Insipidus (DI): é a situação patológica de insuficiência do ADH, seja por 
deficit de produção do hormônio no hipotálamo ou de sua liberação na neuro-
hipófise (DI central), seja por resistência à ação periférica (renal) deste hormônio 
(DI nefrogênico). Se o paciente for ambulatorial e tiver o centro da sede 
preservado, não fará hipernatremia. Contudo, pode ocorrer em pacientes 
internados, comatosos e sem acesso espontâneo à água ou com disfunção do 
centro da sede. Estes pacientes podem desenvolver hipernatremia grave e 
fatal 
PERDA DE FLUIDOS HIPOTÔNICOS:
- São causas de hipernatremia por perda de fluidos que, embora sejam hipotônicos, 
possuem uma quantidade apreciável de eletrólitos, causando, portanto, espoliação 
volêmica (hipovolemia) e calêmica (hipocalemia)
- Diarreia osmótica: presença em grande quantidade de uma substância alimentar 
não absorvível pelo TGI causa diarreia por efeito osmótico. O líquido diarreico, 
neste caso, contém baixas concentrações de sódio e potássio. A perda de água 
em excesso à perda eletrólitos leva à hipernatremia. Tem como causas: 
- gastroenterites infecciosas
- tipos de laxante (laxantes salinos, como o hidróxido de magnésio)
- sorbitol (presente em gomas de mascar ou em alguns doces diet)
- lactulose (usada no tratamento da encefalopatia hepática)
- manitol (utilizado para preparo intestinal pré-operatório ou pré-colonoscopia)
- enteropatias crônicas que levam à síndrome disabsortiva
- Diuréticos de alça: como agem no segmento tubular responsável por gerar a 
hiperosmolaridade do interstício medular, estes diuréticos, ao contrário dos 
tiazídicos, reduzem o poder de concentração urinária, tornando a urina isosmolar 
(300 mOsm/L), isto é, isostenúria. Se a ingestão de líquidos for reduzida, haverá 
predisposição à hipernatremia, pelo prejuízo ao mecanismo de conservação de 
água pelo rim. Entretanto, a hipovolemia causada por estes diuréticos pode 
aumentar a produção de ADH, predispondo à hiponatremia, caso o paciente 
consuma grande quantidade de fluidos hipotônicos
- Poliúria osmótica: principal e mais comum é o diabetes mellitus. Uma glicemia > 
180 mg/dl excede o limiar renal de reabsorção da glicose, gerando glicosúria. A 
glicose é uma substância osmótica que leva a água consigo. A urina, portanto, fica 
rica em glicose e água, mas pobre em sódio. A consequência é a perda de água 
em excesso ao sódio, causando hipernatremia. A hipernatremia pode estar 
“escondida” pelo efeito translocacional hiponatrêmico da hiperglicemia. Após a 
reposição de insulina e correção da hiperglicemia, a hipernatremia aparece, 
Ádila Cristie Matos Martins 	 UCXVI 	 	 Aula 1, INTERPRETAÇÃO CLÍNICA II
t
demonstrando o real deficit de água livre desses pacientes. Os outros dois tipos de 
diurese osmótica são o uso do manitol (geralmente para o tratamento do edema 
cerebral) e o aumento da ureia urinária, pela alimentação hiperproteica
REDUÇÃO PATOLÓGICA DA INGESTÃO DE ÁGUA:
- Hipodipsia hipotalâmica: alguns pacientes com lesão do hipotálamo, por tumor, 
doença infiltrativa (sarcoidose) ou doença cerebrovascular, possuem hipodipsia 
(diminuição da sensação de sede) e são cronicamente hipernatrêmicos. Os níveis 
plasmáticos de ADH estão menores do que deveriam estar para o grau de 
hipernatremia
GANHO DE SAL OU SOLUÇÕES HIPERTÔNICAS:
- Ingestão de sal ou infusão hipertônica: existem diversas situações de 
hipernatremia por ganho de sódio, em vez de perda de água livre. São elas: infusão 
inadvertida de salina hipertônica, infusão de bicarbonato de sódio, ingestão 
excessiva de sal sem beber água, ingestão de água salgada (ou afogamento no 
mar), dieta enteral hiperosmolar, múltiplos clisteres salinos, diálise hipertônica etc. 
A reposição diária de soro fisiológico 0,9% em pacientes que não bebem água 
pode causar uma hipernatremia, geralmente leve (no máximo 154 mEq/L)
- Hiperaldosteronismo primário: excesso hormonal com efeito mineralocorticoide, 
como a aldosterona, ocorre nos adenomas ou adenocarcinomas suprarrenais ou na 
hiperplasia suprarrenal idiopática. As principais consequências do 
hiperaldosteronismo primário são a HAS por hipervolemia crônica e hipocalemia + 
alcalose metabólica. Esses pacientes frequentemente possuem uma hipernatremia 
discreta (145-147 mEq/L), devido ao reajuste do osmostato hipotalâmico pela 
hipervolemia. Na síndrome de Cushing, o excesso de cortisol pode ter efeito 
mineralocorticoide, provocando hipervolemia, hipocalemia, alcalose e 
hipernatremia 
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 
- O principal sintoma é a sede. A ausência de sede em pacientes conscientes com 
hipernatremia sugere uma alteração do mecanismo da sede
- Pacientes com dificuldades de comunicação ou de ambulação podem não 
conseguir expressar sede ou obter acesso à água. Às vezes, os pacientes com 
dificuldades de comunicação expressam sede ou tornam-se agitados
- A hipernatremia aguda grave leva à desidratação neuronal e cerebral, provocando 
distúrbios neurológicos (encefalopatia hiperosmolar), especialmente quando 
excede 160 mEq/L (osmolaridade efetiva > 330 mOsm/L)
- Surge rebaixamento da consciência, chegando ao coma e crise convulsiva (esta 
é mais comum durante a reidratação)
- Fraqueza e dor muscular são indícios de rabdomiólise hipernatrêmica
- A mortalidade pode chegar a 40-60%, e o dano cerebral permanente pode ser 
observado em até 1/3 dos casos
- A desidratação abrupta do cérebro pode romper pequenas veias levando à 
hemorragia intraparenquimatosa, subaracnoide ou mesmo subdural
- Na hipernatremia CRÔNICA (instalação lenta e progressiva) desencadeia um 
mecanismo protetor, caracterizado pela capturacelular de substâncias osmóticas, 
tais como eletrólitos (Na+, K+, Cl-), aminoácidos e inositol, os chamados osmoles 
idiogênicos. Com isso, as células ficam mais hiperosmolares, à semelhança do 
plasma, evitando uma desidratação celular acentuada
- Nos pacientes crônicos é perigosa a reposição rápida de água livre, corrigindo 
abruptamente a osmolaridade para níveis normais; o plasma se torna subitamente 
hiposmolar em relação aos neurônios, provocando edema cerebral agudo. Este 
edema justifica muitos casos de manutenção ou piora do estado de coma, ou crise 
convulsiva, após a correção da hipernatremia
TRATAMENTO 
- É a reposição de água livre. A água deve ser oferecida de preferência pela via 
oral, pelo cateter enteral, ou por qualquer outro tipo de acesso ao tubo digestivo 
(ex.: tubo de gastrostomia). Quando um grande volume for necessário, podemos 
dividi-lo entre as vias enteral e parenteral
- Se houver indicação de reposição intravenosa exclusiva (ex.: redução do nível de 
consciência, obstrução intestinal), a solução escolhida não poderá ser a água 
destilada, pois a infusão de grandes quantidades desta solução na veia provoca 
hemólise. Por este fato, as soluções de escolha serão o soro glicosado a 5% ou a 
salina hipotônica (0,2% ou 0,45%), dependendo do tipo de perda do paciente 
- Após calcular o deficit corporal de água, acrescenta-se a este montante a 
reposição das “perdas insensíveis” normais (cerca de 1.500 ml), pois tais perdas 
podem agravar ou dificultar a correção da hipernatremia
Ádila Cristie Matos Martins 	 UCXVI 	 	 Aula 1, INTERPRETAÇÃO CLÍNICA II
t
- Antes de iniciar a reposição, é importante determinar se a perda foi de água livre 
(perda cutânea, pela respiração, diabetes insipidus) ou de fluidos hipotônicos 
(diarreia, poliúria). No primeiro caso, temos que repor água livre “pura” (água 
potável pelo trato digestivo ou SG 5% pela via intravenosa). No último caso, como 
geralmente há hipovolemia associada, temos que repor água livre + sódio (na 
forma de salina hipotônica 0,2% ou 0,45%).
- Reposição de água livre: pela via oral ou enteral daremos água potável, e pela via 
parenteral utilizaremos soro glicosado 5%
- Reposição de fluidos hipotônicos: se houver franca hipovolemia, inicialmente 
faremos SF 0,9% em bolus até a correção do volume circulante efetivo, mas na 
ausência de instabilidade hemodinâmica devemos evitar o soro fisiológico 0,9% 
(pois ele pode piorar a hipernatremia)... A solução de escolha, então, é a salina 
hipotônica, que pode ser a 0,2% ou 0,45%. A salina 0,2% pode vir pronta ou ser 
preparada, misturando-se água destilada com SF 0,9% na proporção 3:1. O 
mesmo pode ser dito em relação à salina 0,45% (mistura-se água destilada ou soro 
glicosado com SF 0,9%, meio a meio, ou seja, na proporção 1:1). Estas soluções 
corrigem ao mesmo tempo o deficit de água livre e o deficit de sal, lembrando que 
o deficit de água livre é proporcionalmente maior 
- O objetivo do tratamento da hipernatremia aguda sintomática é baixar a natremia a 
uma taxa máxima de 10 mEq/L em 24 h. Uma correção mais rápida do que esta 
pode precipitar edema cerebral agudo e agravamento do quadro neurológico! Em 
pacientes com hipernatremia grave (Na+ > 160 mEq/L), é necessário corrigir o 
sódio sérico ao longo de 48-72h, para não ultrapassar o limite de 10 mEq/L a cada 
24h
- Uma das fórmulas para se calcular o deficit de água livre é:
Homem: Deficit de água (L) = 0,5 x Peso x [(Na do paciente / Na desejado)] - 1
Mulher: Deficit de água (L) = 0,4 x Peso x [(Na do paciente / Na desejado)] - 1
- O deficit de água livre pode ser reposto com água potável via enteral, ou por via 
intravenosa com SG 5%, salina 0,2% (multiplicar por 1,33), ou ainda, salina 0,45% 
(multiplicar por 2)
- Lembre-se de adicionar a reposição das “perdas insensíveis” (1.500 ml)
REFERÊNCIAS 
1.CLÍNICA MÉDICA USP, volume 3 
2.Hipernatremia e Hiponatremia — Manual MSD 
3.Nefro, volume 4 — MedCurso (2019)

Continue navegando