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LUCIANO BATISTA DE OLIVEIRA Professor autor/conteudista É vedada, terminantemente, a cópia do material didático sob qualquer forma, o seu fornecimento para fotocópia ou gravação, para alunos ou terceiros, bem como o seu fornecimento para divulgação em locais públicos, telessalas ou qualquer outra forma de divulgação pública, sob pena de responsabilização civil e criminal. SUMÁRIO Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4 1 . A Constituição Federal e o meio ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 2 . O meio ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 2.1. Meio ambiente natural. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 2.2. Meio ambiente artificial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .21 2.3. Meio ambiente cultural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .21 2.4. Meio ambiente do trabalho. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 3 . Direito Ambiental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 4 . Direito Ambiental Internacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 4.1. Conferência de Estocolmo de 1972 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 4.2. A Rio/92 ou Eco/92 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 4.3. Protocolo de Kyoto. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 4.4. Rio+10 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 4.5. Conferência de Bali . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 4.6. COP-15 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 5 . Princípios ambientais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 6 . Competência constitucional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 7 . A Política Nacional de Meio Ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 8 . A Política Nacional de Meio Ambiente: parte III . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 9 . A Política Nacional de Meio Ambiente: parte III . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88 Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 Pág. 4 de 92 INTRODUÇÃO Ao longo da história da humanidade, os recursos ambientais foram explorados sem a preocupação em cuidar do planeta Terra para as futuras gerações. A preocupação com o meio ambiente é muito recente e intensificou-se principalmente na segunda metade do século passado, sobretudo após a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre o tema em Estocolmo, em 1972. Com a criação do conceito de desenvolvimento sustentável, o Brasil precisou mobilizar-se para normatizar a proteção ao meio ambiente. FIGURA 1 – Exploração dos recursos naturais Fonte: Rich Carey/shutterstock É dentro desse contexto que se entende a criação da Política Nacional de Meio Ambiente, em 1981, e, posteriormente, da grande novidade constitucional. Pela primeira vez, o Brasil ganhou, em 1988, uma Constituição Federal que dedica todo um capítulo ao tema meio ambiente. O capítulo VI tem apenas um artigo, o 225, que exerce o papel de principal norteador do meio ambiente, devido a seu complexo teor de direitos. Ele assegura a obrigação do Estado e da sociedade de garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado, já que se trata de um bem de uso comum do povo que deve ser preservado e mantido para as presentes e as futuras gerações. Pág. 5 de 92 Esta disciplina trata exatamente da discussão sobre o direito de todo cidadão brasileiro a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. O primeiro capítulo discute o tão importante art. 225 da Constituição, e há o desmembramento dos seus incisos para o melhor entendimento dos direitos constitucionais. Em um segundo momento, procurou-se discutir os princípios do Direito Ambiental. Dentro da concepção jurídica, princípios são normas, e, como tal, dotados de positividade, que determinam condutas obrigatórias e impedem a adoção de comportamentos com eles incompatíveis. Servem, também, para orientar a correta interpretação das normas isoladas e indicar, dentre as interpretações possíveis diante do caso concreto, qual deve ser obrigatoriamente adotada pelo aplicador, em face dos valores consagrados pelo sistema jurídico. Portanto, é importante uma apresentação dos mais importantes princípios ambientais que norteiam toda a legislação associada ao tema. Também é fundamental saber como estão distribuídas as obrigações de proteção ao meio ambiente entre os entes federativos, entendidos aqui como União, estado, Distrito Federal e municípios. Pela leitura desse capítulo, você poderá saber sobre os diferentes tipos de competências para cuidar dos recursos naturais dentro do território brasileiro. No final, a disciplina buscará uma discussão muito especial sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, uma vez que é ela que norteou todas as ações de intensificação da proteção ao meio ambiente em território brasileiro, já que veio antes que a Constituição de 1988. Complementando os estudos, há a indicação de diversos vídeos com discussão de conceitos, complementação de textos, exemplos e reportagens interessantes sobre a questão ambientais. Não deixe de assistir aos vídeos e acompanhar os áudios. Bom estudo! 1. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E O MEIO AMBIENTE A preocupação com a inserção do homem no ambiente é bastante recente, sobretudo a partir da segunda metade do século passado. Como diz Machado (1982, p. 6): “Não se separa o homem e seu ambiente como compartimentos estanques”. Por isso, é bom destacar a Constituição de 1988, que ratificou esse interesse pela temática ambiental ao criar um capítulo inteiro para a discussão dela, o capítulo VI. A constitucionalização da Pág. 6 de 92 proteção do meio ambiente é tendência internacional, contemporânea do surgimento e do processo de consolidação do Direito Ambiental. No presente texto, portanto, faremos uma análise dos fundamentos ético-jurídicos e das técnicas de constitucionalização do meio ambiente, em especial na Constituição Federal de 1988. Vamos começar com o único artigo do capítulo VI, uma vez que é no art. 225 que se encontra o núcleo principal da proteção do meio ambiente na Constituição de 1988. Art. 225 - Todostêm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Repare que, logo no início, o Estado brasileiro quer deixar claro que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Isso significa dizer que não é qualquer meio ambiente que é bom para a população, mas sim aquele que é ecologicamente equilibrado, ou seja, com qualidade. É fundamental destacar que esse bem, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, é para todos, tanto desta geração quanto da futura. Devemos preservá-lo. Isso está associado ao conceito de desenvolvimento sustentável. FIGURA 2 – Desequilíbrio ecológico Fonte: kwest/Shutterstock Pág. 7 de 92 De acordo com Rodrigues (2008), ao ser tachado de essencial à sadia qualidade de vida, o meio ambiente tornou-se indissociável de uma vida saudável, vinculando o ambiente equilibrado a uma condição imprescindível para acesso à saúde. Continuemos com a Constituição: Art. 225 [...] § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas. No primeiro inciso, já há a obrigatoriedade de restaurar processos ecológicos desfeitos. A Constituição Federal é taxativa e transferiu esse ônus ao Poder Público. Nesse caso, é bom também diferenciar as ações verbais: • Preservar: significa, de maneira mais ampla, a manutenção do bem, nesse caso, ambiental. • Restaurar: é o ato de não apenas lhe conferir estabilidade, mas recuperar, o mais possível, as características originais. De acordo com Rodrigues (2008), há diferenças fundamentais entre recuperar e restaurar o meio ambiente. As políticas de recuperação não possuem compromisso com a condição original do ambiente degradado, mas principalmente com o restabelecimento do equilíbrio ambiental. Por sua vez, o termo restaurar é usado para definir as políticas de restituição de um ecossistema degradado o mais próximo possível a sua condição original. Verifique também que o inciso deixa claro que cabe ao Poder Público prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas, ou seja, precisam-se desenvolver práticas de conservação ambiental. “II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético.” Ao Poder Público, também ficou a incumbência de preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e à manipulação desse material. É bom sempre lembrar de que o Brasil é um dos países que abrigam maior biodiversidade no planeta. Atualmente, a Lei nº 11.105/05 fixou normais de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados (OGMs) e seus derivados. Pág. 8 de 92 FIGURA 3 – Organismo geneticamente modificado Fonte: Cherries/Shutterstock SAIBA MAIS Assista a um vídeo interessante que demonstra como a Áustria vem tentando fazer com que toda a União Europeia se torne uma zona livre de transgênicos. O anti-OGM tornou-se um argumento de campanha para as eleições do Parlamento Europeu, tanto à esquerda como à direita. EURONEWS. A caminho de uma Europa sem OGM? Publicado em 24.maio.2009. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=5gf5efeTZEI, acesso em: 23.nov.2010. III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção. Foi imposta também ao Estado a missão de definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais que devam ser protegidos. Essa norma foi regulamentada, posteriormente, pela Lei nº 9.985/00, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (figura 4). Pág. 9 de 92 FIGURA 4 – Unidades de conservação federais e seus tipos Área dos parques Até 300.000 ha De 300.001 a 1.000.000 ha Acima de 1.000.000 ha Área dos reservas Até 300.000 ha De 300.001 a 500.000 ha Acima de 500.000 ha Área das estações ecológicas Área das �orestas Até 300.000 ha De 300.001 a 500.000 ha Acima de 500.000 ha Até 200.000 ha De 200.001 a 1.000.000 ha Acima de 1.000.000 ha Parques Reservas biológicas Reservas ecológicas Reservas �orestais Reservas extrativistas Estação ecológicas Florestas (sem área de�nida) Fonte: IBGE (2000). De acordo com a Lei nº 9.985/00, existem cinco tipos de unidades de conservação: (1) Estação ecológica. As áreas assim determinadas são de domínio público, ou seja, se alguma propriedade particular estiver incluída no projeto, ela é desapropriada. É aberta somente a visitação com objetivo educacional, desde que previsto em seu plano de manejo. Até mesmo as pesquisas científicas devem ser autorizadas. Pág. 10 de 92 (2) Reserva biológica. Possui as mesmas características da estação ecológica, porém seu uso é mais restrito. Esta tem como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas. Já a reserva biológica tem o objetivo único de proteger integralmente a biota sem nenhuma interferência humana, a não ser para medidas de recuperação. (3) Parque nacional. Também é de domínio público (pode ainda ser estadual ou municipal), mas, ao contrário das UCs (unidades de conservação) anteriores, pode ser utilizado para recreação, pesquisa científica, turismo ecológico e demais atividades educativas, desde que previstas no seu plano de manejo. As pesquisas devem ser autorizadas. (4) Monumento natural. É uma reserva que pode ser particular, desde que o uso pelos seus proprietários corresponda ao objetivo da UC, que é preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica. (5) Refúgio da vida silvestre. Tem como objetivo proteger áreas naturais necessárias para a reprodução e a manutenção de espécies. Da mesma forma que o monumento natural, o refúgio da vida silvestre pode ser particular, desde que respeitados os objetivos da UC. Caso contrário, a área pode ser desapropriada. Veja que apenas lei formal poderá estabelecer qualquer possibilidade de alteração ou supressão dos recursos ambientais existentes nessas unidades de conservação. “IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.” Constitucionalizou-se a exigência de estudo prévio de impacto ambiental para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental. Os estudos ambientais tornaram-se, a partir da Carta Magna, parte integrante e imprescindível de licenciamento ambiental, tanto para empreendimentos públicos como privados. É só ver o exemplo do processo de licenciamento da menina dos olhos do governo Lula, a Hidrelétrica de Belo Monte. Existem duas resoluções importantes a ser comentadas nesse caso: a) Resolução Conama nº 1/86: estabelece as definições, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental. Pág. 11 de 92 b) Resolução Conama nº237/97: organiza os procedimentos e os critérios utilizados no licenciamento ambiental, de forma a efetivar a utilização do sistema de licenciamento como instrumento de gestão ambiental, e lista os empreendimentos que necessitam de Estudos de Impactos Ambientais (EIA/Rima) porque desenvolvem atividades potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental. “V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.”Esse inciso recorre aos princípios de precaução e de prevenção. O primeiro diz respeito ao fato de que, se não se conhece ou não se controla as consequências que o uso de técnicas, métodos e sinergia de substâncias podem causar à vida e ao ambiental, então é melhor não empregá-lo. No segundo caso, a situação é um pouco diferente. Se há a hipótese conhecida de risco, precisam-se desenvolver técnicas para enfrentar o limite máximo de consequências negativas. FIGURA 5 – Poluição da água causada por mineração de cobre Fonte: Mikadun/Shutterstock Cabe ao Poder Público também estabelecer limites de emissões que possam de alguma forma ameaçar o equilíbrio ambiental e pôr em risco a vida humana. “VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente.” Pág. 12 de 92 Como diz Rodrigues (2008), a educação é a única ferramenta capaz de alterar a cultura e os costumes de um povo. O inciso VI foi regulamentado pela Política Nacional de Educação Ambiental (Lei nº 9.795/99). “VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.” O número inigualável de espécies de plantas, peixes, anfíbios, pássaros, primatas e insetos faz com que o nosso país seja alvo da biopirataria, termo usado para caracterizar o desvio ilegal das riquezas naturais (flora e fauna) e do conhecimento das populações tradicionais sobre a utilização deles (CAVALCANTE, 2010). De acordo com a ministra do Meio Ambiente em 2010, Izabella Teixeira, “O Brasil é o G1 da biodiversidade”. Segundo ela, é fundamental regulamentar os recursos genéticos do país (AGUIAR, 2010). Também é bom destacar que o Brasil aparece ao lado da Austrália, do México, da China e da Indonésia como um dos países que reúnem o maior número de espécies ameaçadas. Se tais práticas não forem contidas, o equilíbrio ambiental estará certamente fadado à extinção. FIGURA 6 – Papagaio de peito roxo, espécie ameaçada Papagaio de peito roxo, u uma das espécies mais ameaçadas de nossa fauna. Em virtude do desmatamento e do tráfico, suas populações sofreram tremendo decréscimo desde os anos 1940. Fonte: Alexandra Giese/Shutterstock Pág. 13 de 92 De acordo com Gomes (2007), ainda faltam no Brasil instrumentos de repressão penal e uma lei que regulamente o setor. A difícil interpretação jurídica e as atuais exigências burocráticas para autorização de pesquisas de campo sobre biodiversidade desestimulam o desenvolvimento científico e econômico, impedindo o objetivo maior, que é repartir benefícios para todas as cadeias que participaram da geração desse conhecimento. Atualmente, o tema está regulamentado no país pela Medida Provisória nº 2.186/01, editada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ainda está tramitando na instância pública o anteprojeto da Lei de Acesso a Recursos Genéticos, Conhecimentos Tradicionais e Repartição de Benefícios. “§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.” Deixa claro o legislador que o ambiente degradado por exploração mineral deve ser recuperado, de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão público competente. Todos ainda se lembram dos grandiosos impactos ambientais causados pela exploração mineral da Província Mineral de Carajás, na região Norte do país, que apresenta até, hoje, fortes passivos ambientais (figura 7). FIGURA 7 – Mineração em Carajás Degradação ambiental da mineração em Carajás. Fonte: T photography / Shutterstock Pág. 14 de 92 O Regulamento do Código de Mineração, previsto pelo Código de Mineração como legislação específica e complementar deste, foi aprovado pelo Decreto nº 62.934, de 2 de abril de 1968. Ele dispõe sobre os direitos relativos às massas individualizadas de substâncias minerais ou fósseis, encontradas na superfície ou no interior da terra, formando os recursos minerais do país; o regime de sua exploração e aproveitamento; e a fiscalização pelo governo federal da pesquisa, da lavra e de outros aspectos da indústria mineral. Atualmente, o Ministério de Minas e Energia elaborou uma nova proposta para a regulamentação da atividade de mineração no Brasil, com o objetivo de fortalecer o processo regulatório, por meio da criação da Agência Nacional de Mineração (ANM), de atrair investimentos para o setor e de acabar com a informalidade na área. § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. De acordo com Rodrigues (2008), esse dispositivo é iluminado pelo princípio da ubiquidade, por meio do qual o agente de uma conduta nociva ao meio ambiente é responsabilizado nas três esferas de poder: administrativa, penal e civil. Traduz-se que uma única atitude contrária ao equilíbrio ambiental gera a tríplice responsabilização do agente, com punições administrativas, penais e civis. A diferença entre as responsabilidades é: • Administrativa: aplica-se às pessoas jurídicas e corresponde ao dever de observar procedimentos garantidores de lisura, transparência e equidade para manter vínculo com a Administração Pública. • Civil: é a responsabilidade de reparar danos causados a terceiros. • Penal: é definida na Lei de Crimes Ambientais e pode colocar na cadeia os responsáveis por um dano ambiental. § 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. Nesse caso, quis o legislador que houvesse o reconhecimento da importância dos biomas brasileiros, por isso eles são considerados patrimônio nacional. Verifique que, embora se deva assegurar a sua preservação, eles não são intangíveis e podem ser utilizados de maneira sustentável. A lei autoriza, mas limita a sua exploração. Pág. 15 de 92 Destaca-se, no entanto, que o cerrado não está presente nessa legislação. Quando foi elaborada a Carta Magna, o Brasil estava passando por amplo processo de implantação do agronegócio na região Centro-Oeste brasileira, e havia o interesse de não resguardar esse importante bioma. FIGURA 8 – Biomas do Brasil BIOMA AMAZÔNIA BIOMA CERRADO BIOMA PANTANAL BIOMA PAMPA BIOMA CAATINGA BIOMA MATA ATLÂNTICA Fonte: IBGE (2000). “§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.” Durante o Brasil Colônia, as terras eram divididas pelas capitanias hereditárias (sabia-se de quem elas eram). Quando o país se tornou independente, a Lei das Terras, de 1850, limitou o acesso a elas. Somente se poderiam adquirir terras por compra e venda ou por doação do Estado. Portanto, a maior parte daquelas terras das capitanias hereditárias ficou sem dono. Pág. 16 de 92 FIGURA 9 – Capitanias hereditárias Divisão da América portuguesa em capitanias hereditárias (1574. Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Capitanias.jpg. Terras devolutas são terras que não pertencem ao domínio público, nem ao particular. Seriam, portanto, terras de ninguém. De acordo com o legislador, elas devem conglobar os recursos ambientais existentes, portanto, determina-se a sua indisponibilidade para outras ações, como para a reforma agrária (figura 10). Pág. 17 de 92 FIGURA 10 – Terras devolutas no Brasil 99.97 64.90 48.92 36.04 22.74 0.00 85.11 Terras devolutas no Brasil – 2003. Fonte: http://www.mstfelisburgo.eu/tabelle/mapa1.gif. “§ 6º - As usinas que operem com reatornuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.” O país já detém a sétima maior reserva de urânio do mundo, de acordo com dados da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben), e está entre os sete países que têm conhecimento e meios para gerar energia elétrica de fonte nuclear. Pág. 18 de 92 TABELA 1 – As 10 maiores reservas conhecidas recuperáveis - 2007 País Reserva 1 Austrália 1.243.000 2 Cazaquistão 817.000 3 Rússia 546.000 4 África do Sul 435.000 5 Canadá 423.000 6 EUA 342.000 7 Brasil 278.000 8 Namíbia 275.000 9 Níger 274.000 10 Ucrânia 200.000 Fonte: Eletrobras (2010). No interesse nacional, reservou-se ao Congresso Nacional, por lei federal, definir a localização de usinas que operem com reator nuclear. Até agora, apenas as usinas de Angra, cujas localizações já estavam definidas anteriormente à Constituição, estão em funcionamento, no Rio de Janeiro (figura 11). Pág. 19 de 92 FIGURA 11 – Reservas nacionais de urânio Reservas nacionais de urânio, unidades de extração, beneficiamento e produção de elementos combustíveis e usina termonuclear de Angra dos Reis. Fonte: Eletrobras (2010). Após a construção da terceira usina em Angra, no Rio de Janeiro, o governo pretende investir na tecnologia nuclear no Nordeste e no Sudeste. Em 2009, houve o lançamento do Programa Nuclear Brasileiro: Autonomia e Sustentabilidade do País, e divulgou-se que o país precisa dobrar sua capacidade de geração energética até 2030. Para atingir essa meta, o Plano Nacional de Energia – PNE 2030 – estabelece cenários de implantação entre 4.000 MW e 8.000 MW de usinas termonucleares até esse ano (ROTHMAN, 2009). Pág. 20 de 92 2. O MEIO AMBIENTE O conceito de meio ambiente é mais intuitivo do que preciso em seus termos. Tanto a palavra “meio” como “ambiente” possuem o mesmo sentido, qual seja: “aquilo que circunda” ou “aquilo que envolve”. Trata-se, de certo, de um pleonasmo, mas cuja utilização está disseminada em todos os meios (FURLAN; FRACALOSSI, 2010, p. 22). Tem, no entanto, um sentido mínimo, que é: o local/ espaço que envolve os seres vivos e as coisas (MILARÉ, 2011). No Brasil, o conceito adotado sobre meio ambiente é normativo ou legal, estampado que está no art. 3º, I, da Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA, Lei nº 6.983/81), no qual está expresso que é “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. À luz desse conceito referencial e legal, Milaré (2011) afirma que os estudiosos utilizam dois conceitos interligados, demonstrando a amplitude dele: o conceito jurídico estrito e o amplo. O primeiro refere-se “ao patrimônio natural e às relações com e entre seres humanos” (MILARÉ, 2011). O segundo diz respeito à natureza original (natural) e à artificial (antrópica), isto é, ao meio ambiente natural ou físico, constituído pelo solo, pela água, pelo ar, pela energia, pela fauna e pela flora, e ao meio ambiente artificial (criado pelo homem), formado por assentamentos urbanos/construções, edificações, equipamentos e alterações do hábitat natural pelo homem. Aprofundando, no entanto, a análise, os estudiosos do Direito entendem que o meio ambiente deve ser entendido segundo suas subespécies: o meio ambiente natural, o meio ambiente artificial, o meio ambiente cultural e o meio ambiente do trabalho. A seguir, salientam-se o conceito e os aspectos de cada subespécie. 2.1. Meio ambiente natural Conforme já explicado, o meio ambiente natural ou físico é composto pelos recursos naturais: água, solo, ar atmosférico, fauna e flora. Encontra-se tutelado juridicamente no art. 225, I e VII, tratando do fenômeno da homeostase, “consistente no equilíbrio dinâmico entre os seres vivos e o meio em que vivem” (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). Pág. 21 de 92 2.2. Meio ambiente artificial O meio ambiente artificial é formado pelos assentamentos urbanos/construções, pelas edificações, pelos equipamentos e pelas alterações do hábitat natural pelo homem (MILARÉ, 2011). Os bens ambientais que formam o meio ambiente urbano são especialmente protegidos pela Constituição Federal de 1988. Conforme o exposto no art. 182, é dever do Poder Público municipal implementar políticas de desenvolvimento urbano, objetivando ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. Essas políticas devem estar legalmente estruturadas no plano diretor municipal, exigido para cidades com mais de 20 mil habitantes (art. 182, § 1º, CF). FIGURA 12 – Meio ambiente urbano Fonte: GaudiLab/Shutterstock Sob tal ótica é que os bens que compõem o meio ambiente artificial adquirem seu valor, sendo certo que a propriedade urbana deve cumprir sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor (art. 182, § 2º, CF). 2.3. Meio ambiente cultural Considera-se meio ambiente cultural o conjunto de bens e manifestações humanas aptos a contribuir para a formação e a afirmação de valores culturais do povo brasileiro (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). Pág. 22 de 92 O meio ambiente cultural também é protegido juridicamente. Conforme o exposto no art. 215 da Constituição, o “Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”. Ao mais, segundo a própria Constituição: Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I – as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. Por fim, tendo por meta o desenvolvimento cultural no Brasil, cabe ao Estado, com a criação de um Plano Nacional de Cultura (art. 215, § 3º): I – defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro; II – produção, promoção e difusão de bens culturais; III – formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas dimensões; IV – democratização do acesso aos bens de cultura; e, V – valorização da diversidade étnica e regional. 2.4. Meio ambiente do trabalho O meio ambiente do trabalho é o local laboral onde homens e mulheres estão inseridos, incorporando todo o complexo da empresa. Deve garantir aos trabalhadores um ambiente de trabalho limpo, sadio, seguro, tranquilo e harmônico (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). A tutela do meio ambiente do trabalho está exposta nos arts. 200, VIII, e 225 da Constituição. Eles fornecem o entendimento de que o Estado deve implementar normas e fiscalização a fim de garantir um ambiente laboral adequado ao cumprimento das funções dos trabalhadores e à própria saúde deles. Pág. 23 de 92 Sob tal aspecto é que existem inúmeras normas internacionais que regulam o meio ambiente do trabalho das quais o Brasil é signatário. Uma delas é a Convenção 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que versa sobre o desenvolvimento de uma Política Nacional de Saúde e Segurança do Trabalho pelos países (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). 3. DIREITO AMBIENTAL O Direito Ambiental é o conjunto de normas e princípios cujo fim é a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, em prejuízo, via de regra, do exercício pleno do direito de propriedade e exploração dos recursos naturais por quaisquer pessoas físicas ou jurídicas (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). FIGURA 13 – Meio ambiente em prejuízo Fonte:macknimal/Shutterstock Nesse contexto, entende-se que o Direito Ambiental no Brasil passou por três etapas, que são: a) Fase individualista (descobrimento até meados do século XX): escassa proteção jurídica do meio ambiente, momento em que vigia o princípio laissez-faire ambiental, no qual a exploração dos recursos naturais para o desenvolvimento econômico era o objetivo a ser atingido. b) Fase fragmentária (a partir da década de 1960): maior atenção à proteção do meio ambiente, com produção de normas jurídica de forma esparsa (fragmentada), protegendo bens ambientais com conotação econômica.1 1 Lei nº 4.771/65 (antigo Código Florestal); Lei nº 5.197/67 (Código de Caça); Decreto-Lei nº 221/67 (Código de Pesca); Decreto-Lei nº 227/67 (Código de Mineração); Lei nº 6.453/77 (Lei de Responsabilidade por Danos Nucleares); Lei nº 6.803/80 (Lei do Zoneamento nas Áreas Críticas de Poluição). Pág. 24 de 92 c) Fase holística: proteção do meio ambiente de forma global e sistematizada, tendo por marco legal a promulgação da Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), em 1981(BENJAMIN, 2003). No entanto, segundo o ponto de vista de Milaré (2011), o Direito Ambiental passou por outras duas fases, que são: a) Antropocêntrica: o homem é o centro das preocupações ambientais e, assim, toda a produção normativa visa proteger bens ambientais essenciais ao ser humano. b) Ecocentrismo ou biocentrismo (ou fisiocentrismo): a natureza tem valor per si ou de forma intrínseca; sua proteção jurídica ocorre porque os bens ambientais que a compõem são valorados por si mesmos e não em razão da essencialidade ou da importância ao ser humano. O nosso ordenamento jurídico, entretanto, não adota in totum as duas posições. Adota uma perspectiva denominada de antropocentrismo alargado, que denota o meio ambiente ecologicamente equilibrado como um bem de uso comum do povo, de interesse da coletividade e essencial à sadia qualidade de vida. Isso define a proteção constitucional do meio ambiente (LEITE; AYALA, 2012). Trata-se, assim, de uma proposta mediana, na qual o meio ambiente possui seu valor singular e é de essencial importância à sobrevivência do ser humano e de suas comunidades. Ao mais, o Direito Ambiental tem por característica central ser interdisciplinar. Conforme entende Padilha (2010), o meio ambiente é uma temática extremamente abrangente e complexa, não se limitando a conceitos e definições estanques, nem tampouco, a compartimentos fragmentados que o limitem em determinada dimensão, tampouco na ambiental, pois possui inúmeras interfaces e inter-relações que afetam o fenômeno social, político e econômico. Assim, a multidisciplinaridade do meio ambiente, como objeto científico, obriga à interligação com o conhecimento científico produzido nas demais ciências que o estudam, sob pena de não permitir o enfrentamento dos grandes desafios que sua proteção necessita. Portanto, é imprescindível a interação com as demais ciências envolvidas com o meio ambiente, exige que se dê um passo adiante nessa interação de conhecimentos, para que se possibilite a ocorrência da interdisciplinaridade na construção do saber jurídico ambiental (PADILHA, 2010). Pág. 25 de 92 Sob tal aspecto, nos dizeres de Padilha (2010), a interdisciplinaridade é a transferência de métodos de uma área cientifica (disciplina) para outra, por meio do diálogo entre os diferentes campos do saber, com o intuito de promover interações ou reciprocidades entre pesquisas especializadas. Portanto, uma possibilidade de busca de conhecimento, que não pode, em absoluto, ser ignorada pelo Direito. Portanto, o estudo do Direito Ambiental demanda a sua conexão com os demais ramos do conhecimento que lidam com a temática do meio ambiente, permitindo compreender adequadamente o seu objeto protetivo, o meio ambiente com seus bens, de forma eficaz. 4. DIREITO AMBIENTAL INTERNACIONAL O Direito Ambiental Internacional é o conjunto de tratados (convenções, convênios, acordos, pactos ou protocolos) que versam sobre a proteção do meio ambiente em âmbito internacional, obrigando os seus signatários. Dentro desse universo, destacam-se os seguintes instrumentos normativos a reger as relações dos signatários sobre a proteção do meio ambiente: a Conferência de Estocolmo de 1972; a Rio/92 ou Eco/92; o Protocolo de Kyoto de 1997; a Rio +10 de 2002; a Conferência de Bali de 2007; e a Conferência de Copenhague (COP-15) de 2009. Adiante, faz-se uma breve síntese de cada um. FIGURA 14 – Direito ambiental internacional Fonte: Mopic/Shutterstock Pág. 26 de 92 4.1. Conferência de Estocolmo de 1972 Essa conferência foi realizada em Estocolmo, na Suécia, em 1972, versando sobre as diretrizes do Direito Ambiental. Ela estabeleceu um conjunto de princípios que enfocavam as preocupações sobre a preservação do meio ambiente, formando a Declaração de Estocolmo. Seguem os principais preceitos estampados na Declaração de Estocolmo: 1. O homem é obra e construtor do meio ambiente que o cerca, o qual lhe dá sustento material e lhe oferece oportunidade para desenvolver-se intelectual, moral, social e espiritualmente. [...] 2. A proteção e o melhoramento do meio ambiente humano é uma questão fundamental que afeta o bem-estar dos povos e o desenvolvimento econômico do mundo inteiro, um desejo urgente dos povos de todo o mundo e um dever de todos os governos. 3. A capacidade do ser humano em transformar o que o cerca carrega consigo a responsabilidade de saber usá-la, visto que quaisquer transformações podem trazer benefícios e desenvolvimentos, ou causar danos ao próprio ser humano e ao meio ambiente. [...] 4. Para ocorrer um desenvolvimento socioeconômico, nos países em desenvolvimento, são necessárias medidas que amenizem as discrepâncias sociais, sem deixar de se preocupar com as questões ambientais. Enquanto que os países industrializados têm por responsabilidade diminuir as diferenças com os países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. [...] 5. [...] Dentre tudo existente no planeta, os seres humanos são os mais valiosos, pois são capazes de progredir socialmente, criar riqueza social, desenvolver a ciência e tecnologia, assim transformando o meio ambiente. 6. [...] Com um conhecimento mais profundo e uma ação mais prudente, podemos conseguir para nós mesmos e para nossa posteridade, condições melhores de vida, em um meio ambiente mais de acordo com as necessidades e aspirações do homem – assim A defesa e o melhoramento do meio ambiente humano para as gerações presentes e futuras se converteu na meta imperiosa da humanidade. [...] (apud AGUIAR, 1994). 4.2. A Rio/92 ou Eco/92 A Eco/92 ocorreu no Rio de Janeiro em 1992 com a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (ou Conferência da Terra). Ela foi composta por 117 chefes de Estado, os quais discutiram, entre outros temas, o desenvolvimento sustentável e as saídas para conter a degradação ambiental que assolava o mundo (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). Pág. 27 de 92 FIGURA 15 – Eco 92 Fonte: Andreas Liem/Shutterstock As conquistas da Eco/92 foram as seguintes: 1. Agenda 21: programa de ação global, contendo 40 capítulos, que versa sobre o desenvolvimento sustentável. 2. Declaração do Rio: documentos simbólico e síntese da Eco-92, contendo princípios sobre a proteção do meio ambiente. 3. Declaração de Princípios sobre Florestas: documento que garante aos Estados o direito soberano de aproveitar suas florestas de modo sustentável. 4. Convenção do Clima: documento que propôs a volta das emissões de gás carbônico aos níveis de 1990, reduzindo-se os gases responsáveis pelo aquecimento da Terra. 5. Convenção da Biodiversidade: documento cujo objeto é a proteção das espécies vivas do planeta, estabelecendo mecanismos para que países tivessem acesso pago a florestas e fontes de biodiversidade. 4.3. Protocolo de Kyoto Na cidade de Kyoto, no Japão, em 1997, foi assinadoo Protocolo de Kyoto por 105 chefes de Estado. Esse é um acordo vinculante, obrigando de forma mais rígida a redução dos gases de efeito estufa causadores do aquecimento global. Suas principais diretrizes são: • Compromete a uma série de nações industrializadas a reduzir suas emissões em 5,2% (tendo por parâmetro os níveis de 1990) para o período de 2008-2012; Pág. 28 de 92 • Estabelece três “mecanismos de flexibilidade” (implementação conjunta; comércio de emissões; e, o mecanismo de desenvolvimento limpo) que permitem a esses países cumprir com as exigências de redução de emissões, fora de seus territórios; • Especifica que as atividades compreendidas nesses mecanismos mencionados devem ser desenvolvidas adicionalmente às ações realizadas pelos países industrializados dentro de seus próprios territórios; • Permite aos países ricos medir o valor líquido de suas emissões, ou seja, contabilizar as reduções de carbono vinculadas às atividades de desmatamento e reflorestamento; e, • Determina que é essencial criar um mecanismo que garanta o cumprimento do Protocolo de Kyoto (Fonte: http://www.greenpeace.org.br/clima/pdf/protocolo_kyoto.pdf, acesso em: 16 jan.2015). 4.4. Rio+10 A Cúpula Mundial de Desenvolvimento Sustentável (denominada de Rio+10) foi realizada em Johanesburgo, na África do Sul, em 2002, com a presença de 189 chefes de Estado. Seu ponto central foi o debate sobre a redução pela metade, até 2015, de pessoas vivendo com menos de US$ 1,00 por dia. Também incluiu outros assuntos, como água, energia, saúde, agricultura e biodiversidade (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). FIGURA 16 – Cúpula Mundial de Desenvolvimento Sustentável Fonte: By GrandeDuc/Shutterstock Pág. 29 de 92 4.5. Conferência de Bali A 13ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas foi realizada na ilha de Bali, na Indonésia, reunindo 189 representantes de Estado. Teve por objetivo substituir o protocolo de Kyoto, o principal instrumento internacional de controle da mudança do clima. Em seu bojo, a principal meta estabelecida foi a diminuição da emissão de gases poluentes entre 20% e 40% para 2020, tendo por comparação as emissões da década de 90 do século passado (FURLAN; FRACALOSSI, 2010). 4.6. COP-15 A 15ª Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas foi realizada em 2009 em Copenhague, na Dinamarca. Nela, discutiu-se sobre o avanço na produção de um novo acordo sobre proteção ao clima global, visando à redução das emissões de gases de efeito estufa. A COP 15, no entanto, resultou apenas em um acordo de intenções, sem efeito vinculante. Seus principais pontos são: • A temperatura global não poderá sem aumentada além de 2 °C. • Cortes profundos nas emissões de CO²: os países ricos deveriam reduzir em 25% e 40% em relação ao emitido em 1990, e os em desenvolvimento, em 15% a 30%. • As nações ricas comprometeram-se a investir cerca de US$ 30 bilhões de dólares entre 2010 e 2012 para ajudar os países pobres a lidar com as mudanças climáticas. • Criação de incentivos financeiros para projetos de redução de emissões por desmatamento e degradação florestal (Redd), para diminuição da degradação do meio ambiente. • Criação de mecanismos de tecnologia em prol do meio ambiente. • Revisão do acordo em 2016, incluindo a possibilidade de buscar um aumento máximo da temperatura mais ambicioso, isto é, de 1,5 °C. 5. PRINCÍPIOS AMBIENTAIS O Direito Ambiental fundamenta-se em diversos princípios, tais como: acesso equitativo aos recursos naturais, prevenção, reparação, qualidade, participação popular e publicidade. De acordo com Nunes (2006), o Direito Ambiental é o conjunto de normas que controlam de forma coercitiva as atividades relacionadas ao meio ambiente, visando à preservação ambiental, tanto para a geração atual como para as futuras gerações, buscando equalizar, conscientizar e fiscalizar as atividades da sociedade como um todo, trazendo consigo a punibilidade para aqueles que venham a desrespeitar tais normas. Pág. 30 de 92 Essa subdivisão do Direito surgiu como resposta às agressões em nível mundial do meio ambiente e tem como sua base de estudos ramos de diferentes ciências, como biologia, geografia, ciências sociais, antropologia e o próprio Direito. Dessa forma, surgiu o Direito Ambiental, recurso competente para tutelar o meio ambiente em todas suas espécies, da agressão humana, tentando fazer nossos descendentes disporem de condições análogas às que nos são oferecidas, buscando um desenvolvimento sustentável. Como disciplina autônoma que é, o Direito Ambiental rege-se por princípios próprios, eficazes no combate à interferência lesiva humana na natureza, constituindo eles a base das demais normas reguladoras deste ramo jurídico, sendo estas seus sucedâneos (CAVALCANTE, 2004). Como em qualquer ramo do Direito, há um conjunto de princípios que regem o Direito Ambiental, que são a base fundamental ou a estrutura central na qual as normas são construídas. Nunes (2006) deixa claro, entretanto, que esses princípios sempre caminharão em conformidade com os de outros ramos, e nem poderiam estar apartados, pois, uma vez fazendo parte do nosso ordenamento jurídico, devem fortalecer nossa estrutura normativa, firmando assim a unicidade e a coerência dela. Nesse sentido, elencam-se alguns dos mais importantes princípios do Direito Ambiental: QUADRO 1 – Princípios do Direito Ambiental Princípios Descrição Desenvolvimento sustentável Devido equilíbrio entre o desenvolvimento das atividades econômicas e a proteção do meio ambiente para as gerações presentes e futuras (art. 225, Constituição Federal). Função social da propriedade Demonstra que a propriedade privada e seu exercício não são absolutos, mas sim relativos, mantendo um vínculo social que transcende o indivíduo em si; assim, deve ser exercida sem prejuízo à sociedade e deve respeitar a legislação ambiental, administrativa e laboral (art. 5º, XXIII, Constituição Federal). Prevenção Determina a ação estatal em dirimir os impactos ambientais desconhecidos ou pouco estudados de atividades. No caso, deve-se aplicar o estudo de impacto ambiental (EIA) para averiguar tal aspecto, cabendo ao empreendedor provar que sua atividade não trará impactos negativos (art. 225, § 1º, Constituição Federal). Existe, assim, a inversão do ônus da prova em razão do in dubio pro ambiente. Pág. 31 de 92 Princípios Descrição Precaução Determina a ação estatal em dirimir os impactos ambientais negativos de atividades cujos efeitos são conhecidos, devendo-se aplicar também o estudo de impacto ambiental (EIA) – art. 225, § 1º, Constituição Federal. Poluidor-pagador Estabelece que aquele que lesar o meio ambiente deve recuperá-lo ou compensá-lo independentemente de culpa (responsabilidade objetiva) - art. 225, §§ 2º e 3º, Constituição Federal. Intergeracionalidade Obriga a proteção do meio ambiente para a geração presente, bem como para as futuras. Cria, assim, um dever jurídico e moral consistente no uso racional e equilibrado meio ambiental para com o futuro da humanidade (art. 225, Constituição Federal). Fonte: Furlan e Fracalossi (2010). SAIBA MAIS Tendo por fim aprofundar o temário, indica-se assistir aos seguintes vídeos: PROVA FINAL. Princípios do Direito Ambiental 1. Publicado em 10 ago.2009. Disponível em: http://www. youtube.com/watch?v=cX2GnRBGgOU, acesso em: 18 nov.2010. PROVA FINAL. Princípios do Direito Ambiental 2. Publicado em 10 ago.2009. Disponível em: http://www. youtube.com/watch?v=TnDnK7ETBwo, acesso em: 18 nov.2010. PROVA FINAL. Princípios do Direito Ambiental 3. Publicado em 10 ago.2009. Disponível em: http://www. youtube.com/watch?v=bVaWljtUNpY, acesso em: 18 nov.2010. PROVA FINAL. Princípios do Direito Ambiental 4. Publicado em 10 ago.2009. Disponível em: http://www. youtube.com/watch?v=riGTOwwMnAI, acesso em: 18 nov.2010. PROVA FINAL. Princípios do Direito Ambiental 5. Publicado em 10 ago.2009. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=V4fFCeCNjxg, acesso em: 18 nov.2010. PROVA FINAL. Princípios do Direito Ambiental 6. Publicado em 10 ago.2009. Disponível em: http://www. youtube.com/watch?v=dg3egHDQfDE, acesso em: 18 nov.2010. Pág. 32 de 92 Outros princípios do Direito Ambiental são os que se seguem: QUADRO 2 – Princípios do Direito Ambiental Princípios Descrição Princípio da consideração da variável ambiental no processo decisório de políticas de desenvolvimento Tendo em vista o impacto em nosso meio de cada decisão tomada, tanto pública quanto privada, esse princípio versa sobre a obrigação de se analisar as variáveis ambientais. Isso porque, dependendo da decisão, pode haver impacto negativo para o meio. Princípio da participação comunitária Segundo esse princípio, que não é aplicado somente no Direito Ambiental, para que sejam instituídas políticas ambientais, bem como para a discussão salutar desses assuntos, é fundamental a cooperação entre o Estado e a comunidade. O sucesso nos resultados demonstra que tanto a população quanto a força sindical têm se envolvido ativamente em definir e realinhar tais políticas. Princípio da cooperação entre os povos Esse princípio trata do fato de que não há em nenhum outro assunto tanta interdependência entre os países quanto o do meio ambiente. Por exemplo, a chuva ácida provocada pela indústria química nos Estados Unidos atingiu o Canadá, e a poluição do mar pode ser levada a milhares de quilômetros, atravessando vários países. Assim sendo, há necessidade cada vez maior de integração ou cooperação entre todos os povos, a fim de realmente discutir o assunto, criar políticas ambientais, resolver problemas dessa ordem, bem como disseminar a cultura de proteção a todo custo do meio ambiente. Princípio da informação É direito da população receber e ter acesso às informações sobre todos os procedimentos, públicos ou privados, que intervenham no meio ambiente. Assim, a população tem o direito de ser informada sobre a qualidade dos bens ambientais, a realização de obras e atividades efetiva e potencialmente poluidoras etc. Princípio da equidade intergeracional Assegurar a solidariedade da presente geração em relação às futuras, para que estas também possam usufruir, de forma saudável, dos recursos naturais (princípio 2º, Declaração de Estocolmo; princípio 3º, Eco-92; art. 1º-A, II, Novo Código Florestal). Princípio do equilíbrio Estabelece o sopesamento das implicações das intervenções no meio ambiente, buscando um resultado final conciliador. Princípio da cooperação internacional Determina o esforço conjunto de países/nações na busca pela preservação do meio ambiente numa escala mundial (art. 1º-A, IV, Novo Código Florestal). Pág. 33 de 92 Princípios Descrição Princípio da responsabilização Exige a imputação de sanções penais, administrativas e civis ao causador do dano, inclusive o próprio Estado (art. 225, § 3º, Constituição; art. 14, § 1º, Lei nº 6.938/81). Princípio da correção da fonte (ou autossuficiência, ou produtor-eliminador, ou proximidade) Visa buscar exame de causas e sujeitos prováveis da poluição, tendo por fim eliminar ou evitar a continuidade dos fatores que possam afetar o meio ambiente. Princípio da solidariedade ambiental Determina que o Estado e a sociedade devem ser solidários na proteção do meio ambiente. Princípio da solidariedade na responsabilidade civil Estabelece que o causador do dano ambiental responde integral e solidariamente, podendo mover ação regressiva em face de outros degradadores. Princípio da função social da propriedade Estabelece que o uso da propriedade será condicionado ao bem- estar social e à devida preservação do meio ambiente (art. 186, II, Constituição). Princípio do in dubio pro ambiente Determina que, quando o Poder Público estiver diante de dúvida científica acerca de um risco de degradação ambiental, decide-se a favor da proteção do meio ambiente e contra o potencial poluidor. Princípio da ubiquidade Infere que o meio ambiente é ubíquo, isto é, está presente em toda parte, em todo o globo, e que, portanto, qualquer lesão em sua estrutura, independentemente do local onde ocorra, tem reflexos, diretos ou indiretos, em toda a natureza. Princípio da proibição do retrocesso ambiental Determina a proibição ao legislador e ao administrador de flexibilizar o nível de proteção do meio ambiente atualmente atingido, ou seja, não podem diminuir o rigor da proteção ao meio ambiente atualmente conquistado em leis e normas administrativas. Princípio do progresso ecológico É um subprincípio do princípio do retrocesso ambiental e determina a proibição da estagnação legislativa na proteção do meio ambiente, obrigando o Estado a rever e a aprimorar a legislação existente. Fonte: Nunes (2006); Furlan e Fracalossi (2010). Pág. 34 de 92 6. COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL Competência é uma palavra do senso comum, utilizada para designar uma pessoa qualificada para realizar alguma coisa. Mas, dentro do âmbito constitucional, o conceito tem algumas variações importantes. FIGURA 17 – Competência constitucional Fonte: niroworld/Shutterstock A competência é uma parcela de responsabilidade que um órgão jurisdicional possui para resolver os conflitos. Nesse liame, prelecionam Marinoni e Arenhart (2007, p. 37): “A competência, portanto, nada mais é do que uma parcela de jurisdição que deve ser efetivamente exercida por um órgão ou grupo de órgãos do Poder Judiciário”. Nesse sentido, a tradução é simples. Na Constituição, competência não é quem sabe fazer, e sim quem pode fazer. É a Carta Magna que a distribui entre os entes federativos. A competência divide-se em legislativa e administrativa. A competência legislativa se expressa no poder de estabelecer a entidade normas gerais, leis em sentido estrito. Por sua vez, a competência administrativa, ou material, cuida da atuação concreta do ente, que tem o poder de editar normas individuais, ou seja, atos administrativos. É quem pode executar a lei (SANTOS, 1999). Sendo a federação o sistema de organização de Estado adotado pelo Brasil, surge o problema da repartição, ou seja, da distribuição de competências entre o governo central (União), os estados- membros, o Distrito Federal e os municípios, os chamados entes federativos (figura 18). Pág. 35 de 92 FIGURA 18 – Entes federativos Entes federativos União Estados DistritoFederal Município Fonte: Produção do autor. Levando isso em consideração, salienta-se que o art. 225 da Constituição Federal determina que é dever do Estado e da sociedade a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, por ser um bem de uso comum do povo. Em tal modelo, está estabelecida uma complexa repartição de competências (deveres) legislativas e administrativas. A seguir, descrevemos as competências legislativas dos entes federados. A União é titular de competências privativas legislativas, ou seja, que somente a ela cabe exercer. Elas estão estampadas no art. 22 da Constituição: I — direito civil, comercial, penal processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; II — desapropriação; [...] IV — águas, energia, informática, telecomunicações e radiofusão; [...] VIII — comércio exterior e interestadual; IX — diretrizes da política nacional de transportes; X — regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aero- espacial; XI — trânsito e transporte; XII — jazidas, minas, outros recursos naturais e metalurgia; Pág. 36 de 92 XIII — nacionalidade, cidadania e naturalização; XIV — populações indígenas; [...] XVIII — sistema estatístico, sistema cartográfico e de geologia nacionais; [...] XXII — competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais; XXVI — atividades nucleares de qualquer natureza; XXVII — normas gerais de licitação e contratação em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionaisda União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III. [...] A competência privativa legislativa da União é delegável, logo, pode ser cedida a outro ente federado. Tal situação está expressa no art. 22, § único, da Constituição, que autoriza aos estados legislarem sobre questões específicas das matérias arroladas como de competência privativa da União. FIGURA 19 – Delegação de competência Fonte: Niyazz/Shutterstock Pág. 37 de 92 Doutra parte, a Constituição, em seu art. 24, também cria a denominada competência concorrente, a possibilidade de que, sobre uma mesma matéria, diferentes entes políticos legislem. Assim, a União, os estados e o Distrito Federal poderão legislar sobre: [...] VI — florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; VII — proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; VIII — responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. [...] Sobre essa competência concorrente, cabem alguns apontamentos: • A União irá legislar sobre normas gerais ambientais (art. 24, § 1º, CF). • Os estados e o Distrito Federal terão competência supletiva, ou seja, legislarão naquilo que for de interesse local, desde que não entre em conflito com a legislação federal (art. 24, § 2º, CF). • Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os estados e o Distrito Federal irão exercer a competência legislativa plena, desde que para atender às suas peculiaridades (art. 24, § 3º, CF). • Por fim, sendo criada norma federal superveniente, ficará suspenso aquilo que lhe for contrário nas leis dos estados e do Distrito Federal. Finalizando a temática da competência legislativa, cita-se o caso dos municípios, que a possuem, sim, porém suplementar, caso esteja caracterizado o interesse local (art. 30, I, CF). Assentado isso, adentremos na competência administrativa dos entes federados. A competência administrativa é a execução de tarefas “que conferem ao Poder Público o desempenho de atividades concretas, através do exercício do seu poder de polícia” (MILARÉ, 2011). No que se refere a esse assunto, o exercício da competência administrativa ambiental é comum, isto é, trata-se da distribuição de competências administrativas a todos os entes federativos para que as exerçam sem preponderância de um sobre o outro (sem hierarquia). Dessa forma, foi estabelecido no art. 23 da Constituição Federal que as competências administrativas e ambientais podem ser exercidas de modo paralelo entre União, estados, Distrito Federal e municípios de forma igual, sem nenhuma prioridade de um sobre o outro. Por conseguinte, a Pág. 38 de 92 atuação de um ente federativo não depende da de outro; da mesma forma, não afasta a possibilidade de atuação de outro. As competências administrativas ambientais comuns são as estampadas nos seguintes incisos do art. 23 da Constituição: [...] III — proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; [...] VI — proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer das suas formas; e VII — preservar as florestas, a fauna e flora. 7. A POLÍTICA NACIONAL DE MEIO AMBIENTE Nos anos 1980, a primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, apresentou o relatório Nosso Futuro Comum, originário da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, formada pela ONU em 1983. FIGURA 20 – Gro Harlem Brundtland, primeira-ministra da Noruega (1990-6) Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Gro_Harlem_Brundtland_(cropped).jpg. Nesse documento, fixava-se o entendimento de que a definição de desenvolvimento sustentável “prevê a satisfação das necessidades presentes, sem prejuízo da capacidade de futuras gerações exercerem os mesmos direitos” (apud ARAÚJO, 1997). Pág. 39 de 92 FIGURA 21 – Desenvolvimento sustentável Sustentabilidade econômica Crescimento econômico Sustentabilidade corporativa Proteção ambiental Comunidade e equidade Sustentabilidade social Sustentabilidade ambiental Fonte: http://sergionunespersonal.blogspot.com.br/2011/06/sustentabilidade.html. Foi a partir desse momento que a Organização das Nações Unidas, por intermédio de seus organismos financiadores, passou a incorporar e solicitar novos mecanismos de aferição para o financiamento de projetos, entre eles, a avaliação dos impactos ambientais. Em razão dessas exigências internacionais, alguns projetos desenvolvidos em fins da década de 1970 e início dos anos 1980, financiados pelo Bird e pelo BID, foram submetidos a estudos ambientais, dentre eles, as usinas hidrelétricas de Sobradinho (BA) e Tucuruí (PA) e o terminal porto-ferroviário Ponta da Madeira, no Maranhão, ponto de exportação do minério extraído pela Companhia Vale do Rio Doce na Serra do Carajás. No entanto, os estudos foram realizados segundo as normas das agências internacionais, já que o Brasil ainda não dispunha de normas ambientais próprias (IBAMA, 1995). Pág. 40 de 92 FIGURA 22 – Usina hidrelétrica de Tucuruí, Pará Fonte: http://arquivos.ana.gov.br/imprensa/noticias/20121031_TOCA_143%208040444%20-%20 Usina%20Hidrel%C3%A9trica%20de%20Tucuru%C3%AD%20-%20PA%20-%20Rui%20Faquini.jpg. É dentro desse contexto que surgiu a Política Nacional de Meio Ambiente. A partir da consciência de que Brasil não poderia se submeter indefinidamente a normas estritamente internacionais na avaliação dos impactos ambientais gerados no país, face às peculiaridades e aos atributos incomparáveis da nossa biodiversidade, passamos a buscar a nossa própria política ambiental. É bom lembrar que a lei foi publicada em 1981, quando o país ainda estava sob as ordens da Ditadura Militar. O fato é que, em 31 de agosto de 1981, foi editada a Lei nº 6.938, criando a Política Nacional do Meio Ambiente, estabelecendo conceitos, princípios, objetivos, instrumentos, penalidade, fins, mecanismos de formulação e aplicação e instituindo o Sisnama (Sistema Nacional de Meio Ambiente) e o Conama - Conselho Nacional do Meio Ambiente (art. 1º). É fundamental destacar que a lei é anterior à Constituição promulgada em 1988, por isso, teve alguns textos suspensos pela Carta Magna e também pela regulamentação do setor, posteriormente. É importante dar destaque ao fato de que o art. 2º da Lei nº 6.938/81, antes mesmo da Constituição de 1988, já oferecia o reconhecimento da necessidade de preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida: Pág. 41 de 92 Art. 2º - A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: [...]. Em seguida, o legislador evidencia quais princípios devem ser seguidos para se atingir esse objetivo: “I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo”. Nesse inciso, a lei deixa claro que o meio ambiente é um patrimônio público, bem de todos e, por isso, devem as ações governamentais encontrar meios de manter o equilíbrio ecológico. Atende-se ao princípio ambiental da natureza pública da proteção ambiental. Para Rodrigues (2008), todo plano de investimentos, público ou privado, deve necessariamente incluir em seus objetivos o respeito e a preservação máxima ao equilíbrio ambiental diretamente envolvido. “II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar.”Observe que a Carta Magna deixa clara a possibilidade de uso dos recursos solo, subsolo, água e ar (biosfera), desde que de maneira sustentável. Embora sejam bens que devam ser mantidos com equilíbrio ecológico, pode-se utilizá-los de maneira racional. A biosfera é o espaço da vida que envolve o planeta Terra. Seu limite superior é a camada de ozônio, situada a 14 km de altura no equador e aproximadamente a 7 km dos polos. Essa camada protege os seres vivos da radiação ultravioleta do sol. Seu limite inferior varia desde os primeiros centímetros de profundidade do solo, junto à sua superfície, até o fundo do oceano (aproximadamente 10 km). A biosfera como espaço de vida do planeta é muito pequena e pode ser considerado como uma lâmina bastante estreita que envolve a Terra, como se fosse uma folha de papel, se compararmos sua espessura com o volume total da Terra. Pág. 42 de 92 FIGURA 23 – Biosfera Fonte: mariait/Shutterstock “Ill - planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais.” Para se alcançar o desenvolvimento sustentável, são fundamentais o planejamento e a fiscalização do uso dos recursos ambientais. Planejamento é um processo contínuo e dinâmico que consiste em um conjunto de ações intencionais, integradas, coordenadas e orientadas para tornar realidade um objetivo futuro, de forma a possibilitar a tomada de decisões antecipadamente. Observe que esse inciso está diretamente associado ao art. 23 da Carta Magna, que faz referência à proteção do meio ambiente e ao combate à poluição em qualquer de suas formas e também à preservação das florestas, da fauna e da flora. Para que ele seja aplicado, é fundamental o poder de polícia ambiental na administração pública das diferentes esferas de poder, para exercerem a legítima fiscalização dos atributos ambientais. Pág. 43 de 92 As Polícias Militares Ambientais do Brasil As Polícias Militares Ambientais atuam na preservação e na conservação ecológica por meio de ações de fiscalização e controle nas áreas de mineração, poluição, queimadas, caça e pesca ilegais. Operam também programas na área de educação ambiental. A maior parte das riquezas naturais brasileiras está em áreas privadas, portanto, os esforços de fiscalização são mais focados nesses locais, onde, geralmente, existem poucas unidades de conservação. Procurando o melhor resultado possível em suas ações, as Polícias Militares Ambientais trabalham de forma integrada com Ibama, Secretarias Estaduais de Meio Ambiente, universidades, ONGs e outras instituições. Por intermédio dessas parcerias é que se torna possível obter uma ação eficaz de fiscalização e preservação. Dos 27 estados brasileiros, 26 possuem unidades da Polícia Militar Ambiental, somando um efetivo de quase 10 mil homens, que garantem a segurança da biodiversidade da nação. Nos últimos 10 anos, a ação eficiente das Polícias Militares nos diversos ecossistemas do país contribuiu para a conservação mostrando os seguintes resultados: • Redução do contrabando e comércio ilegal de animais silvestres. • Maior controle de desmatamento da Mata Atlântica. • Controle total da caça ilegal de jacaré no Pantanal. • Elaboração e implantação de programas para capacitação interna. • Implantação e execução de diversos programas de educação ambiental. • Controle das ações ilegais de extração mineral. • Apoio a diversos programas de pesquisas científicas. • Fonte: Polícia Militar Ambiental do Brasil (2007). CURIOSIDADE Vamos acompanhar o vídeo que mostra a atuação da Polícia Ambiental em Paripueira, município de Alagoas: http://www.youtube.com/watch?v=gfAVzrpus-Y. “IV - proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativa.” Aqui, há uma reafirmação do legislador sobre a proteção dos ecossistemas nacionais, embora se deva registrar que a Carta Magna poderia substituir o termo “ecossistema” por “bioma”, uma vez que há diferenças importantes entre os termos. Ecossistema é o sistema integrado e autofuncionante que consiste em interações dos elementos bióticos e abióticos. Suas dimensões podem variar consideravelmente. Por sua vez, bioma é o Pág. 44 de 92 conjunto de vida (vegetal e animal) definido pelo agrupamento de tipos de vegetação contíguos e identificáveis em escala regional, com condições geoclimáticas similares e história compartilhada de mudanças, resultando em uma diversidade biológica própria. Portanto, o termo bioma estaria mais bem aplicado nesse inciso. Vale destacar também a necessidade de se criar unidades de conservação que possam oferecer preservação de cada um dos ecossistemas presentes em território nacional. As unidades de conservação podem ser classificadas em dois tipos. As de proteção integral, ou de uso indireto, são aquelas onde haverá a conservação dos atributos naturais, efetuando-se a preservação dos ecossistemas em estado natural com um mínimo de alterações, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais (art. 2º, VI, Lei nº 9.985/00). As unidades de conservação de uso sustentável ou de uso direto são aquelas em que haverá conservação dos atributos naturais, admitida a exploração de parte dos recursos disponíveis em regime de manejo sustentável (art. 2º, X e XI, Lei nº 9.985/00). ACONTECEU Veja o caso da Reserva Biológica das Perobas, uma unidade de conservação de proteção integral. Reserva das Perobas guarda mistérios no noroeste do Paraná. Disponível em: http://g1.globo.com/pr/parana/videos/t/todos-os-videos/v/reserva-das-perobas-guarda-misterios-no-noroeste-do- parana-parte-1/5293505/ http://g1.globo.com/pr/parana/videos/t/todos-os-videos/v/reserva-das-perobas-guarda-misterios-no-noroeste-do- parana-parte-2/5293522/ Acesso em: 29 dez.2016. “V - controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras.” Nesse inciso, há uma clara menção ao princípio ambiental do limite, pelo qual o Poder Público é o responsável por estabelecer limites às atividades produtivas potencial ou efetivamente poluidoras, como é o caso de refinarias. O zoneamento constitui uma medida oriunda do poder de polícia, tendo por fundamento a repartição do solo municipal em zonas e a designação de seu uso. Pág. 45 de 92 O dispositivo normativo do zoneamento é um avanço considerável na legislação ambiental do período da Ditadura Militar. Envolve o estabelecimento de zonas, com fronteiras definidas por estudos ambientais, para o desenvolvimento das atividades que podem recorrer à ação de poluir, mas sempre com limites. Como orienta Rodrigues (2008), as políticas de zoneamento que recaiam sobre algum ente federativo podem, por exemplo, identificar a vocação econômico-ambiental para cada zona, implementar e sugerir políticas de desenvolvimento sustentável individualizado. FIGURA 24 – Política de zoneamento Fonte: rm/Shutterstock “VI - incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais.” Se a preservação, a conservação, a recuperação e a restauração ambientais são ações importantes que geram benefícios para toda a sociedade, então é importante desenvolver ferramentas para o incentivo dessas práticas. Pág. 46 de 92 A interpretação do inciso IV é simples: tecnologias menos poluidoras podem ser desenvolvidas, mas é preciso amplo e aprofundado trabalho de estudo e pesquisas. É importante deixar claro que mesmo os estudos que parecem não ter resultados em curto prazo precisam ser incentivados. “VII - acompanhamento do estado da qualidade ambiental.” Nesse caso, o legislador quis valorizar a necessidade do acompanhamento da qualidade ambiental. Esse tipo de procedimento é comum quando se realiza um estudo da qualidade da água, por exemplo. Há coleta de água de um determinado corpo hídrico mensalmente para verificar a presença de coliformes fecais. “VIII - recuperação de áreas degradadas.” Esse item está apenas reforçando o art. 225, § 1º, I, da Carta Magna, já citado. É fundamental não somentea preservação dos recursos ambientais existentes, mas a recuperação daqueles que já se encontram degradados. “IX - proteção de áreas ameaçadas de degradação.” Você aprendeu que um dos princípios do Direito Ambiental é a prevenção. Observe que quis o legislador que ocorresse a preocupação de dar atenção às áreas que já estão ameaçadas de degradação. ACONTECEU Floresta fóssil no Piauí está ameaçada de degradação. Veja no link: http://www.portalaz.com.br/noticia/ municipios/132093. “X - educação ambiental a todos os níveis de ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente.” Como já informado na discussão sobre o art. 225, § 1º, VI, da Constituição Federal, a educação é a única ferramenta capaz de alterar a cultura e os costumes de um povo. O Ministério de Educação vem fazendo a sua parte, embora ainda se tenha muito que fazer. Pág. 47 de 92 CURIOSIDADE Circuito Tela Verde O circuito tem como objetivo promover a sensibilização e a reflexão dos públicos sobre o meio em que vivem; levar filmes sobre a temática a setores excluídos dos circuitos dos festivais de vídeos ambientais, produções premiadas e/ou de reconhecida importância para conscientização socioambiental; e estimular a produção de materiais pelas próprias comunidades, por jovens, crianças e adultos, que conseguem olhar seu meio e traduzir, em processo educomunicativo, em linguagem de áudio e vídeo. Dessa forma, busca-se conscientizar as pessoas da importância de suas ações nos processos de gestão ambiental. A comunidade não só pode como deve participar dos processos de gestão ambiental local. Leia mais em: http://www.mma.gov.br/educacao-ambiental/educomunicacao/circuito-tela-verde. Agora que terminamos de trabalhar com o art. 2º, está na hora de avançar para o art. 3º, que conceitua os termos trabalhados pela lei, para deixar claro o seu conteúdo. Art. 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; As diferentes ciências que discutem a degradação e a preservação dos recursos naturais, como geografia, física e biologia, têm conceitos diferentes sobre o termo “meio ambiente”. Na Política Nacional de Meio Ambiente, ele estará atrelado sempre à existência da vida, ou seja, “que abriga e rege a vida em todas as suas formas”. FIGURA 25 – Meio ambiente Fonte: amenic181/Shutterstock Pág. 48 de 92 “II - Degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente.” Rodrigues (2008) comenta que o legislador buscou uma forma racional de se conceituar a degradação ambiental, vinculando-a à adversidade, ao prejuízo e à quebra do equilíbrio. É um termo de conotação claramente negativa e está geralmente associado à ideia de perda de qualidade. O causador é sempre o ser humano. III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. Observe que o legislador deixa claro que a poluição é um tipo de degradação ambiental. Você pode desmatar uma região e não estará lançando nenhum tipo de poluição, mas com certeza estará degradando o meio ambiente. Atente para o fato de a Lei nº 6.938/81 ter entrelaçado os temas, com o objetivo de dar autonomia aos conceitos e permitir que eles possam conviver de forma indissociada para melhor facilitar sua aplicação, notadamente nos enquadramentos das sanções administrativas e penais. Enquanto que as primeiras alíneas estão voltadas para o bem-estar de seres humanos e, posteriormente, à biota (plantas e animais), as últimas estão associadas ao efeito negativo dos poluentes sobre os recursos naturais vivos. A alínea III também deixa bem clara a questão dos limites estabelecidos pelos órgãos ambientais. É possível emitir alguma sonoridade ao oferecer uma festa em seu ambiente de trabalho. Mas é bom ficar atento aos limites impostos para a emissão do barulho, que poderá ser considerado poluição sonora. Pág. 49 de 92 Poluição sonora A OMS (Organização Mundial de Saúde) considera que um som deve ficar em até 50 db para não causar prejuízos ao ser humano. A partir disso, os efeitos negativos começam. A Lei Ambiental (Lei nº 9.605/98) é federal e em seu art. 54 determina uma pena de reclusão de um a quatro anos e multa a quem “causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana [...]”. Fonte: Lacerda (2009). Aquele que lançar “matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos” poderá ser considerado poluidor pela lei, mesmo que o ser humano e a biota não tenham sofrido impactos. “IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.” Não é considerado poluidor apenas um cidadão comum, mas também uma empresa ou um conglomerado de indústrias. A lei ainda deixa claro que o Estado e seus diferentes entes federativos podem ser considerados como tal. Percebe-se que é perfeitamente cabível a responsabilidade civil do Estado, na qualidade de poluidor indireto, quando sua omissão ou atuação ineficaz possuir nexo causal com o dano ambiental, seja por facilitar a ação do poluidor direto, seja por não cessar a atividade degradadora do poluidor. Ou se o poder público permanece inerte ou atua de forma precária em face ao dano ambiental, atual ou iminente, deve ser responsabilizado solidariamente com aquele que por ação causou o prejuízo (MORAES, 2010). “V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora.” Os recursos ambientais podem ser divididos em duas categorias: vivos e não vivos. No primeiro, trabalha-se com a ideia de fauna e flora. Por sua vez, atmosfera, solo e subsolos são considerados não vivos, mas também são recursos naturais. Pág. 50 de 92 8. A POLÍTICA NACIONAL DE MEIO AMBIENTE: PARTE III FIGURA 26 – Recursos naturais Fonte: Tonhom1009/Shutterstock Vamos continuar avançando para trabalhar com o quarto artigo da lei. “Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:”. Como já foi comentado no art. 2º, o objetivo da Lei nº 6.938/81 é a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana. Mas quis o legislador deixar claros os objetivos e amplificar, como nos diz Rodrigues (2008), ao máximo as formas de preservar, recuperar e melhorar o meio ambiente. Seu objetivo é o estabelecimento de padrões que tornem possível o desenvolvimento sustentável, por meio de mecanismos e instrumentos capazes de conferir ao meio ambiente uma maior proteção. “I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico;” Pág. 51 de 92 Observe que, mais uma vez, o legislador deixa clara a sua intenção de aplicação do conceito de desenvolvimento sustentável. Em seu trabalho, Araújo (1997) destaca que, atento a tal dispositivo, em 1995, o Ibama iniciou estudos visando à criação do Protocolo Verde, que foi oficialmente instituído por decreto em 29 de maio de 1996. O objetivo era incorporar a variável ambiental ao processo de gestão e concessão de crédito oficial e benefícios fiscais às atividades produtivas,
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