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Historia crianças no brasil

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1° texto
No brasil, com a proclamação da república esperava-se do regime político democrático orientado para dar garantias ao indivíduo numa sociedade de território amplo e de natureza abundante e generosa. Desenhado com frescor nacionalista e esperanças incontáveis, o novo século anunciava uma nova nação que se propunha rivalizar com as grandes potencias internacionais, assumindo um papel diretivo na américa do sul.
Veio o século em que muitos jovens e crianças experimentaram crueldades inimagináveis. Crueldades geradas no próprio núcleo familiar, nas escolas, nas fabricas e escritórios, nos confrontos entre gangues, nos internatos ou nas ruas entre traficantes e policiais.
Num pais de tradição escravocrata, as críticas a situação de vida das crianças (sem escola, com trabalho não regulamentado e regulamentos desrespeitados, habitando em condições desumanas) abriram frentes para reivindicações políticas de direitos e contestações as desigualdades.
A prisão moderna, desde sua criação, foi criticada pelos reformadores por ser incapaz de responder as especificidades dos crimes, ser dispendiosa, multiplicar vícios, deixar os prisioneiros a mercê das arbitrariedades dos guardiães e por permitir o exercício da tirania por parte das autoridades.
O mundo dos prisioneiros não existe como algo separado ou marginal, ele se comunica com o mundo dos cidadãos livres por meio das ilegalidades, interceptações e exclusões.
Desde o código de menores de 1927 até a política nacional do bem-estar do menor que ficou consagrada no código de menores de 1979, foram mais de sessenta anos usando da pratica de internação para crianças e jovens, independentemente de tratar-se de regime político democrático ou autoritário.
No início do século, o importante era garantir, pouco a pouco, p acesso de pobres a escola. No estado de São Paulo, pela lei estadual o governo ficava autorizado a colocar nos lugares de que dispunha nos estabelecimentos de ensino subvencionados, os alunos das escolas primarias que mais se distinguem durante o ano e fossem reconhecidamente pobres.
A criança e o jovem se transformam em prioridade ao estado. A legislação pretende protege-los da família desestruturada e dos maus-tratos que venham sofrer; quer garantir educação, políticas sociais, alimentação e bases para o exercício da cidadania.
O Código Penal brasileiro de 1940, da época da ditadura de Getúlio Vargas, distingue maus-tratos de lesão corporal, demarca a diferença entre penalidades e localiza as autoridades (pais, professores, médicos, policiais etc.) que cometem violências denunciadas q apuradas contra crianças e adolescentes.
Como lembrava o poeta Rene char, “aquele que veio ao mundo para não incomodar, não merece respeito, nem paciência”. Estas crianças e jovens, mais do que legislação adequada, instrução publica, políticas sociais, merecem a liberdade de viver para, talvez, criar seus filhos distantes das punições, inventando prazeres.
	
2°
O Brasil tem uma longa história de exploração da mão de obra infantil. As crianças pobres sempre trabalharam. Para quem? Para seus donos, no caso das crianças escravas da colônia e do império; para os “capitalistas” do início da industrialização, como ocorreu com as crianças órfãs, abandonadas ou desvalidas a partir do século XX.
O advento da republica inaugura uma era de novas preocupações. O país em crescimento dependia de uma população bem mais preparada para impulsionar a economia nacional. Era preciso formar e disciplinar os braços da indústria e da agricultura.
Em 1995, o Brasil tinha aproximadamente oiti milhões de crianças e adolescentes de cinco a 17 anos trabalhando. Muitos começam cedo na luta pela sobrevivência: são 522 mil crianças de cinco a nove anos trabalhando, a maioria na agricultura.
O número de meninas trabalhadoras é menor do que o de meninos. Este fato significa que elas trabalhem menos. A dedicação exclusiva aos afazeres domésticos, sem escola, atinge quase dois milhões de crianças e adolescentes entre dez e dezessete anos.
Temos ainda um número significativo de crianças e adolescentes de dez e dezessete anos aparentemente desocupados, constituído por 658 mil indivíduos que não estudam, não trabalham e nem realizam afazeres domésticos.
Nem sempre a família tem distanciamento crítico suficiente para ver a atividade da criança como trabalho. Elas entendem que seus pequenos fazem “bicos” nas ruas.
Os trabalhadores infantis, na maioria dos casos, são vítimas da miséria. O trabalho, quando é obstáculo ao pleno desenvolvimento da criança ou mesmo perigoso, é percebido como degradante, tanto pelos pequenos trabalhadores quanto por seus pais, mas necessário a manutenção familiar.
Na Zona da Mata (Pernambuco), crianças pegam na foice a partir dos sete anos. Desnutridas, infestadas de vermes e intoxicadas pelos agrotóxicos, a expectativa de vida na região não passa dos 46 anos de idade.
Todos sabem que a cola de sapateiro é prejudicial a saúde da criança. Mas no Rio Grande do Sul, crianças tem jornadas de trabalho de até 14 horas em fabricas e ateliês familiares de calçados e bolsas, sujeitos a doenças por esforços repetitivos e intoxicações por cola e outros produtos químicos.
Crianças e adolescentes que passam anos dentro da escola sem saberem ler e escrever o próprio nome são comuns em todo o país, só restando a eles uma vida de miséria, dependente do trabalho desqualificado e explorador. Fome e aproveitamento escolar são incompatíveis.
3°
Pouco se sabe e pouco se fala sobre o trabalho infantil na agroindústria da cana-de-açúcar. A exploração de crianças e adolescentes nas atividades agrícolas canavieiras só recentemente passou a ser objeto de preocupação dos formuladores e executores de políticas públicas.
As populações da região como um todo são expostas direta e indiretamente aos efeitos da poluição que o uso intensivo de produtos químicos nesta atividade acarretam.
As razões dos empregadores utilizarem crianças no corte da cana somara-se as necessidades as necessidades de sobrevivência e de complementação de renda or parte das famílias que tradicionalmente trabalharam nas empresas canavieiras, sobretudo pelo monopólio da terra que os grandes proprietários sempre detiveram na região.
Até os anos 70, os filhos de trabalhadores rurais da zona canavieira não tinham acesso a rede pública de ensino; a aprendizagem, no ambiente privado, reduzia-se portanto a assinar o nome, no melhor dos casos; mas a iniciação ao difícil mundo do trabalho assalariado na cana-de-açúcar era imediata, irremediável.
A situação desoladora das escolas no meio rural da zona canavieira tem contribuído para perpetuar uma situação de carência educacional secular.
A generalização das atividades profissional das crianças e adolescentes fazia parte de uma estratégia forçada de sobrevivência do grupo familiar. A questão crucial, e permanece, a luta contra a fome. E, nesse sentido, a participação de cada um, por mínima que seja pode fazer toda a diferença entre manter-se vivo e morrer de inanição.
As reivindicações mais frequentes nos documentos do Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais mencionam a assistência medica e dentaria, e o direito a escola.
As aspirações dos pais para seus filhos e netos são a dimensão clara da dureza da vida que lhes é imposta. Em resumo, diz José Francisco da Silva, 64 anos, de Igarassu: “Desejo pra meus filhos é ter outra vida melhor que a minha”.
Apesar da comprovada melhorada vida das famílias das 27 mil crianças e adolescentes beneficiadas até setembro de 1998 pelo programa Brasil Criança Cidadã, em Pernambuco, problemas diversos ainda comprometem sua suas estratégias gerais.
Olhando para o passado de tantas gerações de cortadores de cana que perderam sua infância nos canaviais, vemos o quanto é difícil encontrar o registro do que eles pensavam e diziam, quando eram crianças. Hoje, esses “trabalhadores invisíveis” não precisam mais correr em meio as plantações de cana-de-açúcar para esconder a exploração do qual foram vítimas durante cinco séculos.

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