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EA D 4 O Governo da Igreja em Âmbito Universal 1. ObjetivOs • Compreender os vários níveis de governo da Igreja. • Estudar o primado do Romano Pontífice e a Colegialidade Episcopal. • Conhecer os órgãos de governo da Igreja universal. 2. COnteúdOs • Premissas. • Sacra potestas (poder sagrado, potestade sagrada). • Primado do Romano Pontífice e a Colegialidade Episcopal. • Órgãos de governo da Igreja universal. 3. Orientações para O estudO da unidade Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que você leia as orientações a seguir: © Direito Canônico I200 1) Nesta unidade, vamos conhecer um pouco mais de per- to a estrutura de governo da Igreja em nível ou âmbito universal. Isso o colocará diante de pessoas e institui- ções bastante conhecidas, como é o caso, por exemplo, da figura do Papa, do Colégio Episcopal, do Concílio Ecu- mênico, do Sínodo dos Bispos, dos Cardeais, da Cúria Romana e dos Legados Pontifícios. Tenha presente que não é possível compreender adequadamente o governo da Igreja sem ter presente o seguinte dado teológico: a Igreja não nasce de uma autônoma e livre decisão de um grupo de pessoas (como ocorre com a sociedade civil), mas de um chamado divino. Ela vive na história graças aos vínculos de comunhão que derivam da Palavra de Deus e dos sacramentos, livremente acolhidos pelos fi- éis sob a autoridade dos legítimos pastores. 2) Não é sem razão que logo de início você irá se deparar com algumas premissas de ordem teológica que justa- mente têm por finalidade indicar alguns elementos que dão sustentação à compreensão eclesial do governo e do exercício do poder na Igreja. Particular importância adquire o discurso relativo à "sacra potestas", compre- endida em torno do tríplice múnus de Cristo e da Igreja: santificar, ensinar e reger. Neste tríplice múnus, mani- festa-se o prolongamento da ação de Cristo na Igreja e evidencia-se a natureza de tudo peculiar do poder no âmbito interno da sociedade eclesial. 3) Particular destaque para uma correta visão do governo da Igreja diz respeito ao Papa e ao Colégio dos Bispos. Nesse sentido, nunca é demais recordar as palavras do Concílio Vaticano II em sua constituição dogmática Lu- men gentium nº 18: Este Sacrossanto Sínodo, seguindo os passos do Concílio Vaticano I, com ele ensina e declara que Jesus Cristo, Pastor Eterno, fundou a santa Igreja, enviando os Apóstolos, assim como Ele mesmo fôra enviado pelo Pai (Jo 20,21). E quis que os sucessores dos apóstolos, isto é, os Bispos, fossem em Sua Igreja Pastores até a consumação dos séculos. E para que o próprio Episcopado fosse uno e indiviso prepôs aos demais Apóstolos o bem-aventurado Pedro e nele insti- tuiu o perpétuo e visível princípio e fundamento da unidade de fé e comunhão. Esta doutrina sobre a instituição, perpetuidade, po- der e natureza do sacro Primado do Romano Pontífice e sobre seu infalível Magistério, o Sagrado Sínodo novamente a propõe para Claretiano - Centro Universitário 201© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal ser crida firmemente por todos os fiéis. E continuando na mesma iniciativa, resolveu declarar e professar diante de todos a doutrina sobre os Bispos, sucessores dos Apóstolos, que junto com o Suces- sor de Pedro, Vigário de Cristo e Cabeça visível de toda a Igreja, regem a casa de Deus vivo. 4) Esperamos que no estudo desta unidade, tendo por base este subsídio, como, também, a bibliografia indica- da, você possa adquirir uma visão panorâmica, mas su- ficiente, do governo da Igreja, particularmente em nível universal, e, sobretudo, dos elementos que dão susten- tação à compreensão eclesial que dele se tem. 4. intrOduçãO À unidade Esta unidade e a próxima têm por finalidade possibilitar-lhe uma adequada compreensão do governo da Igreja em seus vários níveis que, por suas características muito peculiares, se diferencia das formas de governo conhecidas por você. Nesta primeira parte, faremos uma breve apresentação da- queles elementos que fundam o poder de governo na Igreja, bem como daqueles órgãos e instituições mediante os quais são exerci- tadas as funções de governo na Igreja universal. No final desta unidade, você terá uma visão suficiente do primado do Romano Pontífice, da Colegialidade Episcopal e dos principais órgãos do governo eclesial em âmbito universal. Vamos lá? 5. preMissas A Igreja, que nesta terra se apresenta como sociedade hie- rarquicamente organizada, recebeu do Senhor a missão de pregar o Evangelho a todos os povos (munus docendi) e de administrar os sacramentos, sinais e instrumentos da graça divina, que perpetu- am a presença de Cristo na história para a santificação das pessoas (munus sanctificandi). © Direito Canônico I202 O Capítulo III da Lumen Gentium trata do Mistério da Igreja. No número 8, ela é apresentada, ao mesmo tempo, como uma comu- nidade de fé, esperança e caridade e uma sociedade provida de órgãos hierárquicos, pois não se trata de duas realidades, mas de uma única realidade na qual se funde o elemento divino e humano. A Palavra de Deus e os sacramentos representam bens pre- ciosos e são, sem dúvida, a fonte mais autêntica do ordenamento eclesial e de sua organização de governo, pois é sobre a Palavra de Deus e os sacramentos que se fundamenta o ordenamento ecle- sial. A missão recebida de Cristo e os meios de salvação sobre os quais ela se realiza diferenciam a Igreja de qualquer outra socieda- de que você conhece. No mandato recebido do Senhor, a Igreja funda e organiza a própria estrutura hierárquica e o poder sagrado (sacra potestas) que estão ordenados à transmissão da Palavra, ao culto divino e à administração dos sacramentos. Ela se constitui em uma comu- nidade de pessoas ligadas entre si por vínculos de comunhão que colocam os fiéis em um tipo de relação finalizada à realização da- quela missão que Cristo confiou à Igreja. A imagem da Igreja como comunhão institucional hierarqui- camente ordenada, fortemente sublinhada pelo Concílio Vaticano II, exprime o caráter específico e peculiar da Igreja. Ela não nasce de uma autônoma e livre decisão de um grupo de pessoas (como ocorre com a sociedade civil), mas de um chamado divino. Ela vive na história graças aos vínculos de comunhão que derivam da Pa- lavra de Deus e dos sacramentos, livremente acolhidos pelos fiéis sob o governo de legítimos pastores. Sem esses dados de base e de fé não é possível colher os ele- mentos específicos e peculiares do governo da Igreja em relação aos demais governos conhecidos e, portanto, é bom você tê-los em mente como premissa para o estudo e a compreensão do go- verno na e da Igreja. Claretiano - Centro Universitário 203© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal 6. a SACRA POTESTAS (PODER SAGRADO, POTESTA- DE SAGRADA) Provavelmente, a expressão sacra potestas (poder sagrado, potestade sagrada) lhe é estranha, mas não se assuste. Contudo, você precisa saber que o tema da sacra potestas é bastante com- plexo e qualquer argumentação sobre o assunto requer uma refle- xão muito bem articulada. Aqui, não será possível dar conta des- ta complexidade e, portanto, nos limitaremos a um breve aceno, cabendo a você aprofundar o seu conhecimento sobre este tema com alguma leitura complementar. Para conhecer a problemática que envolve o tema, como, tam- bém, uma abordagem suficientemente abrangente sobre a sacra potestas, sugerimos que você leia: G. GHIRLANDA, G. O direito na Igreja, mistério de comunhão. Compêndio de Direito Eclesial. Aparecida: Santuário, 2003, p. 285-306. Sobre as relações entre sacerdócio e governo eclesiástico, veja: FELICIANI, G. As bases do Direito da Igreja: comentários ao Código de Direito Canônico. São Paulo: Paulinas, 1994, p. 92. Veja, também: LOMBARDIA, P. Lições de direito canônico. Introdução. Direito Constitucional. Parte Geral. São Paulo: Loyola, 2008, p. 107-121. As exigências inseridas na pregaçãodo Evangelho e na ad- ministração dos sacramentos, bem como a salvação das pessoas que, na Igreja, é sempre a lei suprema (cf. cân. 1752), manifestam a existência de uma dimensão de justiça nas relações interpessoais na Igreja e a necessidade de pastores a serviço da comunidade. Vejamos o que sobre isso nos diz o Concílio Vaticano II: Para apascentar e aumentar sempre o Povo de Deus, Cristo Senhor instituiu na Sua Igreja uma variedade de ministérios que tendem ao bem de todo o Corpo. Pois os ministros que são revestidos do sagrado poder servem a seus irmãos para que todos os que for- mam o Povo de Deus e, portanto, gozam da verdadeira dignidade cristã, aspirando livre e ordenadamente ao mesmo fim, cheguem à salvação (LG 18ª). O termo "sacra potestas" encontra-se presente em alguns textos do Concílio Vaticano II e tem sido muito utilizado por teólo- © Direito Canônico I204 gos e canonistas de nosso tempo. Na interpretação mais comum, a "sacra potestas" identifica-se com a função pastoral em um sen- tido bem amplo. Seria, portanto, a potestade ou poder que corres- ponde aos ministros sagrados (clérigos) e, mais concretamente, ao Papa e aos Bispos. Tal poder, Cristo transmitiu aos Apóstolos e a seus sucessores para que em seu nome ensinassem, santificassem e governassem a Igreja. Na LG nº. 10, o termo sacra potestas é utilizado no contexto da distinção entre sacerdócio comum e ministerial. Já na LG nº. 18, o termo aparece em relação à constituição hierárquica da Igreja. Leia-os! Há no poder da Igreja um caráter pessoal pelo fato de estar vinculado ao sacramento da ordem que imprime na pessoa um ca- ráter que não se apaga, mas, ao mesmo tempo, possui uma forte dimensão institucional, em virtude dos estreitos vínculos de co- munhão que ligam entre si os membros do Colégio Episcopal e os seus colaboradores mais próximos (os presbíteros). A "sacra potestas", ou poder sagrado, estrutura a Igreja como uma sociedade hierárquica e, embora unitária, distingue-se em poder de ordem, de magistério e de governo ou regime, cor- respondendo, assim, ao tríplice múnus de Cristo (sacerdotal, pro- fético e régio). Nesta tríplice dimensão do poder sagrado, temos, então, uma espécie de prolongamento da ação de Cristo na Igreja e se evidencia a natureza peculiar do poder na sociedade eclesial. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A Lumen Gentium, ao tratar do ministério episcopal nos números 24-27, aprofun- da o significado do múnus de ensinar, santificar e governar. O tríplice múnus de Cristo é o ponto de partida para especificar as funções que correspondem aos Bispos no serviço pastoral que prestam ao povo de Deus. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O "poder de ordem" é aquele ordenado à santificação das pessoas mediante a ação litúrgica, a administração dos sacramen- tos e dos outros meios de graça (cân. 834). É conferido pelo sacra- Claretiano - Centro Universitário 205© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal mento da ordem e possui um caráter pessoal no sentido de que é conferido a uma pessoa concreta, nela imprimindo um caráter indelével. A sua peculiaridade consiste no fato de conferir ao seu titular a possibilidade de, sobretudo, administrar os sacramentos. Trata-se, na verdade, de uma faculdade e não tanto de um poder, uma vez que não se traduz no poder de governar a vida social, mas, sim, na capacidade de realizar determinados atos capazes de gerar vida sobrenatural. O "poder de magistério" consiste em uma dupla função re- cebida pela Igreja e, particularmente, confiada aos Apóstolos e a seus sucessores, como, também, a seus colaboradores diretos (presbíteros). Trata-se do dever de anunciar a verdade revelada e de reafirmar aqueles princípios morais, inseridos na natureza humana e no projeto divino da criação, que representam, para a Igreja, o fundamento da dignidade da pessoa humana e, portanto, valem para todos (cân. 747 §§1 e 2). Em tempos passados, no contexto de uma sociedade cristã, o poder de magistério dirigia-se, essencialmente, aos crentes, para ensiná-los as verdades de fé, para contrastar os erros doutrinais e convidá-los a observar os preceitos da moral cristã. Hoje, ao con- trário, no contexto de uma sociedade amplamente secularizada, o magistério da Igreja tende sempre mais a se dirigir, também, para fora da comunidade cristã, tendo em vista reafirmar aqueles prin- cípios morais que, segundo a doutrina cristã, se fundam sobre a natureza humana e que, portanto, vinculam a todos. O "poder de regime ou governo", que na Igreja existe por instituição divina, consiste na capacidade de governar a vida so- cial da Igreja e de dirigir, coordenar e controlar as atividades de natureza pública. Tal poder encontra-se intimamente ligado ao sa- cramento da ordem. Sua origem está na pertença ao Colégio Epis- copal, sucessor do Colégio Apostólico, ao qual se chega mediante a via ontológico-sacramental da ordenação episcopal. Uma parti- cipação ontológica a tal poder cabe aos presbíteros por força do © Direito Canônico I206 sacramento da ordem que os constitui como colaboradores dos Bispos no exercício do poder sagrado. A sacra potestas não expressa somente um poder jurídico, pois nela está incluída a capacidade recebida no sacramento da ordem de se produzir em nome de Cristo os efeitos sobrenaturais que derivam da práxis sacramental e da pregação da Palavra. Essa característica do poder de regime é de tudo peculiar ao governo da Igreja, pois seu ordenamento desenvolve-se, especial- mente, sobre a base do sacramento da ordem, reservando a quem o recebeu os ofícios de governo, embora, como já visto, os leigos, também possam cooperar no exercício do poder de regime. Um último elemento a considerar é que o poder de regime ou governo na Igreja não é tripartido, como ocorre nos ordena- mentos civis. Assim, não temos na Igreja o princípio da separa- ção dos poderes (legislativo, executivo e judiciário), colocados um diante do outro com recíprocas funções de controle. Na Igreja, aqueles que ocupam ofícios capitais (Papa e Bispos) possuem um poder pessoal e próprio que é, ao mesmo tempo, legislativo, exe- cutivo e judiciário. Contudo, tal poder, em seu exercício, no que tange a determinadas funções, é confiado a outros que o exercem em nome do titular (poder vicário). Portanto, quando falamos em tripartição dos poderes na Igreja, não o fazemos na perspectiva dos ordenamentos civis, pois são realidades diferentes. Assim, temos: • O poder legislativo: destinado à produção de normas ge- rais hierarquicamente superiores. Deve ser exercitado no modo estabelecido pelo direito. Tal poder não pode ser delegado a ninguém por parte de qualquer legislador in- ferior à autoridade suprema da Igreja. • O poder judiciário: ordenado à resolução das controvér- sias mediante a aplicação do direito ao caso concreto. Tal poder é confiado aos juízes e aos tribunais (poder vicário). Deve ser exercitado no modo estabelecido pelo direito. Claretiano - Centro Universitário 207© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal Tal poder não pode ser delegado, exceto quando se trata de atos preparatórios de qualquer decreto ou sentença. • O poder executivo: ordenado aos fins da administração eclesiástica mediante a aplicação das leis. Tal poder é o mais utilizado e o possui quem ocupa determinados ofí- cios na Igreja, podendo ser delegado e até subdelegado, a não ser que haja uma proibição do direito. 7. O priMadO dO rOManO pOntÍFiCe e a COLe- GIALIDADE EPISCOPAL A constituição hierárquica da Igreja por instituição divina está fundada sobre o Colégio dos Bispos e sobre o primado que, no âmbito interno deste Colégio, compete ao Papa, Bispo de Roma e sucessor de Pedro. Portanto, a constituição hierárquica possui uma natureza colegial e primacial. O Colégio dos Bispos sucede ao originário Colégiodos Após- tolos ao qual Cristo confiou a missão da Igreja. Trata-se de uma sucessão orgânica e não pessoal, no sentido de que cada Bispo, no momento de sua ordenação, passa a fazer parte do Colégio, par- ticipando de sua inteira missão e não sucedendo singularmente a um dos 12 apóstolos. Já no caso do Papa, temos uma sucessão de caráter pessoal, pois ele, pessoalmente, ocupa o lugar de Pedro, a quem Cristo confiou uma função e específicas prerrogativas (Mt 16, 18-19). A relação entre colegialidade e primado representa o eixo fundamental do sistema de governo da Igreja. Nela, a suprema au- toridade é constituída pelo Papa e pelo Colégio dos Bispos que estão unidos entre si (cân. 330). Ambos gozam de poder supremo sobre a Igreja universal, mas, enquanto o primeiro pode sempre o exercitar livremente, ou seja, sem estar subordinado a qualquer autoridade humana, o segundo não pode ser entendido sem o Papa (LG, 22b). © Direito Canônico I208 –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Os números 22 e 23 da Lumen Gentium tratam da relação entre o Papa e o Colégio Episcopal, e da dos Bispos entre si. A nota explicativa prévia da Lu- men Gentium esclarece que a expressão "Colégio" não deve ser entendida em um sentido estritamente jurídico, ou seja, como um grupo de iguais, mas, sim, como um grupo estável cuja estrutura deriva da Revelação. De fato, o Colégio Episcopal, necessariamente e sempre, tem como cabeça o Romano Pontífice e sem ele não pode ser compreendido. No Colégio, o Papa conserva íntegro o seu ofício de Vigário de Cristo e de Pastor da Igreja universal. Em outras palavras, a distinção não é entre o Papa e os Bispos em seu conjunto, mas entre o Papa, separadamente, e o Papa juntamente com os Bispos. Dessa forma, o Romano Pontífice, enquanto Cabeça do Colégio, pode, sozinho, realizar certos atos que não competem aos Bispos, como, por exemplo, convocar e dirigir o Colégio, aprovar suas decisões, etc. Um comentário sobre esta nota explicativa da Lumen Gentium, você poderá encontrar na seguinte obra: NEVES, A. O Povo de Deus: renovação do Direito na Igreja. São Paulo: Loyola, 1987, p.129-132. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Como você pode perceber, estamos diante de uma estrutu- ra de governo diferente das que conhecemos em outros ordena- mentos civis. Trata-se de algo originário que deriva da natureza da Igreja, tal como disposta por seu fundador, que confiou a mis- são apostólica ao inteiro Colégio Apostólico, tendo como cabeça o apóstolo Pedro. Na Igreja, o poder sagrado vem do alto, por força de uma espécie de investidura ontológico-sacramental, e não de- baixo, como nas experiências seculares de governo democrático. O método colegial que inspira o funcionamento da Igreja e de suas instituições não pode ser assimilado de maneira simplista à lógica democrática (maioria/minoria) que é seguida na organi- zação da comunidade política, mas deve ser compreendido como uma expressão da natureza da Igreja como comunhão, na qual se perpetua a missão apostólica. Tendo presente o significado da sacra potestas, do primado do Papa e da Colegialidade Episcopal que constituem o eixo cen- tral para uma adequada compreensão do governo na e da Igreja, podemos passar, agora, para o estudo dos órgãos de governo em âmbito universal. Claretiano - Centro Universitário 209© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal 8. ÓRGÃOS DE GOVERNO DA IGREJA UNIVERSAL Não detalharemos, aqui, toda a normativa. Faremos, ape- nas, um breve aceno para os tópicos de maior relevância, cabendo a você o desafio de aprofundá-la em seu estudo individual. O romano pontífice (cânn. 331-335) O cân. 331, ao tratar do Romano Pontífice, usa o título "bispo da Igreja de Roma" (LG nº. 22), pois é este o seu título originário, não somente em sentido histórico, mas, também, do ponto de vis- ta teológico-canônico. O ministério do Romano Pontífice é, acima de tudo, um serviço que ele presta à sua diocese, sobre a qual possui uma responsabilidade episcopal imediata e direta (cân. 381 §1). Radicado localmente na Igreja de Roma, o Romano Pontífice é, também, a título pessoal, supremo pastor do corpo das Igrejas, enquanto sucessor de Pedro. Os outros títulos elencados pela norma são: • Cabeça do Colégio Episcopal. • Vigário de Cristo. • Pastor da Igreja universal. Mediante o ofício do Romano Pontífice, permanece na Igreja a função de Pedro. O Colégio Episcopal não é um sujeito autôno- mo, separado ou independente do Papa, uma vez que tal Colégio somente poderá existir cum Petro et sub Petro. Em virtude da or- denação episcopal, o Romano Pontífice é membro do Colégio dos Bispos e, sobre o plano sacramental, é igual aos outros Bispos; em virtude da eleição por ele aceita, ele é a cabeça do Colégio Episco- pal e o pastor da Igreja universal, e, por isso, há uma desigualdade de natureza jurisdicional em relação aos outros Bispos. O Papa, segundo a doutrina do Vaticano I, retomada e de- senvolvida pela LG nº. 18b, enquanto exercita o próprio ministério na obediência e na fidelidade a Cristo, princípio e fundamento invi- © Direito Canônico I210 sível, é o fundamento e o princípio visível da unidade da Igreja, na dupla direção do episcopado e da fé e comunhão dos fiéis. O Papa, portanto, não age nem como um monarca absoluto, nem como um mero representante de um colégio que pode decidir tudo por maioria. As decisões do Colégio são aquelas que o Papa ratifica ou aprova, mesmo permanecendo como decisões de um Colégio. No Bispo da Igreja de Roma, permanece o ofício concedido, singularmente, a Pedro. Diante deste múnus recebido do Senhor, a potestade nada mais é do que o poder ou a capacidade de atuá-lo, com todas as faculdades necessárias para este fim. Portanto, em força de seu ofício, o Romano Pontífice possui uma potestade ordi- nária não somente na Igreja universal, mas, também, sobre todas as Igrejas particulares (e seus agrupamentos) confiadas aos cuida- dos dos Bispos (cân. 333 §2), salva a justa autonomia deles (LG 23). Segundo o cân. 331, retomando a constituição apostólica Pastor aeternus, capítulo 3, e, também, o cân. 218 do CIC de 1917, as notas do poder do Papa são as seguintes: ordinário, supremo, pleno, imediato e universal e pode sempre ser exercido livremente (cân. 331). Vejamos, então, mais detalhadamente, cada uma dessas no- tas. 1) Ordinário: porque é anexo diretamente ao seu ofício e à dignidade dele por direito divino e em maneira absoluta- mente estável (cânn. 131 §1 e 141 §1). Também porque habitual e contínuo, não se reduzindo a casos ordinários ou extraordinários. 2) Supremo: significa que, na Igreja, não existe nenhum poder superior àquele do Papa, o qual não é limitado nem pelo concílio, nem pela autoridade civil. O Papa não pode ser julgado por quem quer que seja (cân. 1404). Não existe apelo ou recurso contra as suas sentenças ou decretos (cânn. 333 §3, 1372, 1405 §2, 1732). Este poder supremo, evidentemente, possui limites que se encon- tram na Palavra de Deus (DV 10), no direito divino e na- tural, naquelas disposições que Cristo estabeleceu para Claretiano - Centro Universitário 211© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal a sua Igreja, não lhe sendo permitido, portanto, mudar a sua constituição. Além disso, deve ter presente o Colé- gio dos Bispos e o direito dos fiéis. Portanto, o poder do Romano Pontífice não se identifica, em nenhum modo, com arbítrio e não é absoluto. 3) Pleno ou Total: não lhe falta nenhum elemento necessá- rio e nenhum suplemento de autoridade deve pedir para obter o fim intrínseco que o justifica. 4) Imediato: tem um duplo sentido, seja porque pode ser exercitado sobre todas as Igrejas particulares e sobre todos os fiéis, seja porque qualquer um na Igreja pode se comunicar diretamente com o Papa, sem, necessaria- mente, recorrer a alguma mediação, como,por exem- plo, a dos Bispos. 5) Universal: enquanto território, sobre a Igreja universal e Igrejas particulares; enquanto pessoal, sobre todas as pessoas (pastores e fiéis), individualmente ou em gru- pos. 6) De livre exercício: a afirmação conclusiva do cân. 331, relativa ao livre exercício da potestade papal, é uma con- sequência lógica das notas anteriores, pois, faltando a liberdade de exercício, essas notas seriam mera forma- lidade. Evidentemente, todas essas notas da potestade do Papa não comportam, certamente, que esta seja ilimitada e, muito menos, arbitrária. Não o pode ser porque pertence à mesma constituição divina da Igreja, à qual pertencem, também, outros elementos constitutivos (a Palavra de Deus, os sacramentos, a condição de igualdade fundamental dos fiéis, os direitos inerentes a esta con- dição, o episcopado etc.) e porque é exercitada somente a serviço da Igreja e da sua missão. Portanto, os limites naturais da potes- tade primacial do Papa são: o direito divino, natural e positivo, e a natureza e o fim próprio da Igreja. Como Pedro recebeu o seu poder diretamente de Cristo, sem alguma mediação, assim o Romano Pontífice recebe diretamente de Deus o seu ofício e com o ofício o poder que lhe é anexo, cujas notas vimos anteriormente. © Direito Canônico I212 O modo de obter este ofício é a eleição legítima, aceita pelo eleito, juntamente com a consagração episcopal (cân. 332 §1). Por- tanto, uma vez aceita a eleição ao sumo pontificado, o eleito, se já havia recebido a ordenação episcopal, é, imediatamente, Bispo da Igreja de Roma, verdadeiro Papa e Cabeça do Colégio dos Bis- pos. Imediatamente, adquire a plena e suprema potestade sobre a Igreja universal, podendo exercitá-la livremente. Faltando algum elemento indicado (eleição legítima, aceitação e ordenação epis- copal), o poder primacial não está plenamente constituído. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A possibilidade de se eleger um papa fiel, leigo ou clérigo, privado do caráter episcopal, repropõe a questão da relação entre o poder de ordem e aquele de jurisdição. Aqui, nós temos duas teses: aquela da natureza sacramental da po- testade e aquela que afirma que a potestade não deriva do sacramento, mas da missio canonica. Conforme a primeira tese, toda a potestade na Igreja, compre- endida aquela de ensinar e de governar, é de natureza sacramental e encontra a sua fonte no sacramento da ordem. Aqui, a comunhão hierárquica e a missão canônica seriam necessárias para o exercício da potestade de ensinar e gover- nar, mas não confeririam, propriamente, um poder, e sim apenas as condições para o exercício de um poder. Segundo tal tese, o Papa é tal não com a eleição, mas com a ordenação episcopal. De acordo com a segunda tese, a potestade de governo não é conferida mediante o sacramento da ordem, mas por meio da missio canonica. Portanto, o Papa receberia a potestade diretamente de Deus, uma vez realizada a eleição legítima e aceita por ele, sem, necessariamente, ter recebido o sacramento da ordem. A solução encontrada pelo legislador foi a de exigir que o eleito, se não for Bispo, receba imediatamente a ordem episcopal. Desse modo, tentou-se reduzir a distância entre o sacramento e a jurisdição, mas, sem dúvida, a questão está longe de ser uma doutrina segura e certa, pois não cabe ao CIC tal função. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Quanto ao exercício do seu múnus e de sua potestade na Igreja, a constituição LG nº. 22b afirma que o Colégio dos Bispos não pode existir sem o Papa, nem pode agir contra ele ou sem ele. O Romano Pontífice preside o Colégio dos Bispos não enquanto deste recebe a sua potestade, mas porque, imediatamente, por missão divina, a recebe de Cristo. O Pontífice, portanto, possui o direito de determinar, segun- do as necessidades da Igreja, a modalidade, pessoal ou colegial, de exercitar o seu múnus e a sua potestade (cân. 333 §2). Na carta Claretiano - Centro Universitário 213© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal encíclica Ut unum sint nº. 88, o Papa João Paulo II reconheceu que, para a maior parte dos outros cristãos, há uma dificuldade para se acolher o exercício do primado e, por isso, convidou aos teólogos e aos responsáveis por outras Igrejas e comunidade eclesiais para iniciarem um diálogo sobre formas alternativas para o exercício do seu ministério. É evidente que, em tal diálogo, alguns pontos deverão per- manecer inalterados, a saber: 1) a Igreja reconhece como seu elemento constitutivo o primado confiado diretamente por Cristo a Pedro e con- tinuado nos seus sucessores; 2) o primado deve ser supremo, ou seja, não submetido a qualquer outra autoridade eclesial; 3) cada fiel deve sempre poder apelar ao Papa, ao passo que seus atos não conhecem apelo; 4) a relação entre o primado e a colegialidade episcopal não pode ser compreendida em termos concorrenciais, mas a potestade colegial dos Bispos, por sua vez, deve ser coligada e distinta da potestade que cada Bispo pos- sui em sua diocese; 5) o Papa no exercício do seu poder deve sempre se manter em comunhão com os outros Bispos e está sempre limi- tado no seu agir pelo direito divino, natural e positivo e pelo princípio da necessidade da Igreja que irá determi- nar a finalidade e as modalidades do seu agir. A liberdade que o direito reconhece ao Romano Pontífice no exercício do seu poder permanece um elemento constitutivo do seu ministério pastoral. Todavia, esta liberdade concerne, es- pecialmente, ao exercício do poder (cân. 333 §2). Sobre esse pla- no, o Papa possui uma verdadeira discrecionalidade. A partir do Concílio Vaticano II, os Papas insistiram sobre a necessidade de dar ao governo da Igreja universal um estilo participativo e corres- ponsável. De fato, esse estilo atua nos sínodos dos Bispos junto ao Papa, nos sínodos continentais e regionais, nos concílios particu- lares, nas Conferências Episcopais. Tudo isso, juntamente com as © Direito Canônico I214 visitas ad limina apostolorum e as viagens apostólicas do Papa, é uma expressão da união dos membros do Colégio dos Bispos com o Romano Pontífice e vice-versa. Durante a vacância da Sede apostólica, que se verifica com a morte do Papa ou por sua legítima renúncia ao ofício, o governo da Igreja é interinamente assumido pelo Colégio dos Cardeais, que não pode, porém, modificar ou inovar nada na vida da Igreja. No caso de renúncia do Papa, esta somente é válida se for realizada livre e devidamente manifestada, sem necessitar de qualquer tipo de aceitação, pois, na Igreja, o Papa é sempre a última instância, uma vez que o seu poder é supremo. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– É possível que se eleja um papa enquanto o predecessor ainda está vivo, como seria no caso da renúncia ou da sede totalmente impedida (cân. 335). Na segun- da hipótese, poderíamos pensar em uma gravíssima doença que impeça o Ro- mano Pontífice de se comunicar até mesmo por carta com os fiéis ou por outros motivos indicados pelo (cân. 412). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Para se inteirar um pouco mais da normativa relativa ao Romano Pontífice, veja as seguintes obras: FELICIANI, G. As bases do Di- reito da Igreja: comentários ao Código de Direito Canônico. São Paulo: Paulinas, 1994, p. 95-100; GHIRLANDA, G. O direito na Igreja, mistério de comunhão. Compêndio de Direito Eclesial. Apa- recida: Santuário, 2003, p. 564-574; LOMBARDIA, P. Lições de direito canônico. Introdução. Direito Constitucional. Parte Geral. São Paulo: Loyola, 2008, p.134-138. O Colégio episcopal (cânn. 336-341) Não detalharemos, aqui, toda a normativa, mas faremos um breve aceno para os tópicos de maior relevância. Caberá a você aprofundar o seu conhecimento acerca deste conteúdo, conforme o seu interesse. A estrutura fundamental do colégio dos apóstolos perdura no Colégiodos Bispos. O ofício conferido pelo Senhor a Pedro per- Claretiano - Centro Universitário 215© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal dura nos seus sucessores e, do mesmo modo, o ofício apostólico de apascentar a Igreja perdura na ordem dos Bispos, os quais o exercitam sem interrupção. O Concílio Vaticano II confirmou a doutrina do primado do Romano Pontífice e do seu infalível magistério (LG nº. 18), e, ul- teriormente, a precisou, esclarecendo a natureza colegial da hie- rarquia eclesiástica ao afirmar que o primado e o episcopado são diretamente correlativos entre si (LG nº. 22). A noção de colégio aplicada aos Bispos, juntamente com o Romano Pontífice, não deve ser assumida no sentido de um gru- po de iguais que delegaram a própria potestade ao presidente do colégio, mas, sim, no sentido de um grupo estável, cuja estrutura deriva da própria revelação. O Colégio Episcopal, cuja "Cabeça" é o Papa, é formado por todos os Bispos em razão da ordenação episcopal e da comunhão hierárquica com o Papa e com os demais membros do Colégio. Portanto, a colegialidade encontra o seu fundamento na ordena- ção episcopal e na comunhão hierárquica que constituem os dois elementos fundamentais sem os quais não é possível se tornar membro do Colégio. Assim, somente um Bispo legitimamente or- denado está em comunhão hierárquica e pode ser assumido em um determinado ofício com a respectiva missio canonica. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A legítima consagração existe quando o novo Bispo foi nomeado livremente pelo Romano Pontífice ou foi por ele confirmado (se eleito legitimamente – cân. 377 §1) e existiu um mandato pontifício para a sua consagração (cânn. 1013 e 1382). A missio canonica é o ato jurídico da competente autoridade eclesiástica (nesse caso, o Papa) com o qual confere um determinado ofício (no sentido do cân. 145 §1) ao Bispo legitimamente ordenado. Nela, determina-se, juridicamente, o âmbito de exercício do tríplice múnus da Igreja. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Tanto o Romano Pontífice pessoalmente, quanto o Colégio dos Bispos com o Papa representam a Igreja universal e possuem sobre ela plena e suprema potestade (cânn. 331 - 333 §1; 336). A potestade é plena porque possui em si todos os elementos ne- © Direito Canônico I216 cessários para ser aplicada, e suprema porque somente é limitada pela Palavra de Deus (DV 10), pelo direito divino e natural e pelas disposições que Cristo estabeleceu para a sua Igreja, não sendo possível mudar a sua constituição. A potestade colegial, em sentido estrito, é exercitada em modo solene sobre a Igreja universal no concílio ecumênico (cân. 337 §1). Enquanto o Colégio dos Bispos é de direito divino, o con- cílio ecumênico é de direito eclesiástico e é regulado por normas positivas. O concílio ecumênico pode ser definido como uma legítima reunião de todos os Bispos e de outros convocados pelo Roma- no Pontífice para deliberar questões doutrinais, disciplinares e pastorais relativas a toda a Igreja. Possuem o direito e o dever de participar do concílio ecumênico com voto deliberativo todos, e somente, os Bispos membros do colégio (diocesanos, titulares e eméritos), isto é, os legitimamente consagrados e em comunhão entre si e com o Bispo de Roma (cân. 339 §1). Não participam, por direito, os que foram apenas eleitos para o episcopado e aqueles que foram colocados à frente de uma Igreja Particular e que, pelo direito, se equiparam aos Bispos. Outros que não sejam Bispos po- dem ser convocados pelo Romano Pontífice, ao qual compete de- terminar qual será a participação deles (cân. 339 §2). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O CIC de 1917, fundado em uma antiga tradição histórica, estabelecia que fos- sem chamados ao concílio ecumênico e tivessem direito a voto deliberativo os cardeais, mesmo os não Bispos, os patriarcas, os primazes, os arcebispos e Bispos residenciais, mesmo se não ainda consagrados, os abades primazes e os superiores das congregações monásticas, os moderadores supremos dos insti- tutos religiosos isentos (cân. 223 §1). Previa, ainda, a participação de teólogos e canonistas, mas apenas com voto consultivo. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Os direitos do Papa em relação ao concílio são enunciados pelos cânn. 338, 340 e 341. Compete a ele convocar o concílio, dirigi-lo e confirmá-lo e, além disso, aprovar os argumentos que serão tratados, dissolver o concílio, transferir, eventualmente, a Claretiano - Centro Universitário 217© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal sua sede, suspender, temporariamente, os trabalhos, dar continui- dade ao concílio interrompido e promulgar os decretos, tornando- -os vinculantes. A potestade colegial é exercitada, também, mediante a ação conjunta dos Bispos espalhados pelo mundo, desde que sugerida ou livremente recebida pelo Papa, transformando-se em um ver- dadeiro ato colegial (cân. 337 §2). Nesse caso, a intervenção do Papa é essencial (cân. 337 §3). A ação colegial, assim entendida, poderia realizar-se mediante uma pesquisa a respeito da opinião dos Bispos em meio aos sínodos provinciais ou às Conferências Episcopais (LG nº. 22). Para maior compreensão das normas que tratam do Colégio Epis- copal, sugerimos que você consulte os seguintes textos: GHIR- LANDA, G. O direito na Igreja, mistério de comunhão. Compên- dio de Direito Eclesial. Aparecida: Santuário, 2003, p 574-578; LOMBARDIA, P. Lições de direito canônico. Introdução. Direito Constitucional. Parte Geral. São Paulo: Loyola, 2008, p.129-132; NEVES, A. O Povo de Deus: renovação do Direito na Igreja. São Paulo: Loyola, 1987, p. 138-144. instituições e pessoas que ajudam o papa (cânn. 342-367) O Papa no governo da Igreja é assistido por pessoas e insti- tuições Em razão da pertença ao Colégio dos Bispos, a cooperação maior compete, acima de tudo, aos Bispos. O Sínodo dos Bispos é uma das formas privilegiadas de cooperação colegial, baseada na corresponsabilidade dos Bispos no confronto de toda a Igreja (cânn. 342-348). Em seguida, aparecem os Cardeais, que tanto colegial- mente quanto singularmente (cânn. 349-359) ajudam o Romano Pontífice no governo da Igreja. Por fim, temos a Cúria Romana (cânn. 360-361) e os Legados Pontifícios (cânn. 362-367), que também au- xiliam o Romano Pontífice em questões de governo e pastoral. © Direito Canônico I218 Vejamos, agora, de modo bem sucinto, cada uma dessas ins- tituições. O sínodo dos bispos (cânn. 342-348) Provavelmente, você já deve ter ouvido falar no Sínodo dos Bispos, pois, de vez em quando, este nome aparece nos órgãos de imprensa. O Sínodo dos Bispos foi criado pouco antes do encerramento do Concílio Vaticano II, por iniciativa do Papa Paulo VI, em sintonia com as conclusões dos debates ocorridos no concílio. O pedido inicial do Papa ao Concílio era o de ver associado a si, em certo modo e para certas questões, alguns representantes do episco- pado, particularmente entre os Bispos que dirigem uma diocese, para auxiliá-lo no governo eclesiástico. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A resposta do Concílio veio no art. 5 do decreto Christus Dominus, que assim estabelece: Bispos escolhidos de diversas regiões do orbe, segundo modos e métodos estabelecidos ou a serem estabelecidos pelo Romano Pontífice, prestam ao Supremo Pastor da Igreja ajuda mais válida no Conselho que tem por nome Sínodo Episcopal. Este Sínodo, re- presentando todo o Episcopado católico, ao mesmo tempo significa que todos os Bispos em comunhão hierárquica participam na solici- tude pela Igreja Universal. O texto conciliar reconhece, portanto, que o Sínodo dos Bispos é expressão da colegialidade episcopal e uma forma particular de sua atuação. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– No motu proprio Apostolicasollicitudo (15-09-65), de Paulo VI, e nos documentos sucessivos, o Sínodo dos Bispos é apresenta- do como um órgão consultivo do ofício primacial e, nessa perspec- tiva, desenvolveu-se a normativa atual. O cân. 342 descreve o Sínodo dos Bispos como: A assembléia dos Bispos que, escolhidos das diversas regiões do mundo, reúnem-se em determinados tempos, para promover a es- treita união entre o Romano Pontífice e os Bispos, para auxiliar com seu conselho ao Romano Pontífice na preservação e crescimento Claretiano - Centro Universitário 219© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal da fé e dos costumes, na observância e consolidação da discipli- na eclesiástica, e, ainda, para examinar questões que se referem à ação da Igreja no mundo. O Sínodo dos Bispos, de um ponto de vista substancial, é um órgão que manifesta o afeto colegial do inteiro episcopado, parti- cipando da potestade do Papa para o bem da Igreja universal. De um ponto de vista jurídico formal, o sínodo é um órgão consultivo primacial, ou seja, um instrumento utilizado pelo Papa para exer- citar melhor o seu ofício. Com base nesse ponto de vista, o Sínodo dos Bispos possui somente uma função consultiva, e, por essa ra- zão, não pode vincular o Papa em seus pareceres e, nem mesmo, possui competência jurídica no governo da Igreja universal. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Alguns autores chegaram a sugerir que fosse estendido ao Sínodo dos Bispos o poder deliberativo. Mas isso não foi aceito porque, na verdade, o sínodo não é uma expressão de todo o colégio episcopal, sendo um instituto autônomo e distinto do segundo. Na verdade, o sínodo é um meio mediante o qual o Papa exercita o próprio ofício primacial de um modo colegial. Isso não significa que o sínodo não tenha o seu valor, pois as conclusões por ele formuladas podem fazer parte do processo de formação das decisões e dos pronunciamentos pontifícios que se seguem ao sínodo. Nos casos em que o Romano Pontífice tenha conce- dido ao sínodo uma potestade deliberativa (delegada), as decisões tomadas por este órgão deverão ser ratificadas pessoalmente pelo Papa (cân. 343). Sobre o caráter consultivo do Sínodo, Dadeus Grings observa o seguinte: Não gozando de poder decisório, o Sínodo dos Bispos vive continu- amente num impasse. Discutem-se longamente os temas e todos voltam um pouco frustrados para casa, à espera de que o Papa eventualmente faça algum uso das sugestões apresentadas. Senão tudo passa para o arquivo. Na verdade, porém, têm surgido, em conseqüência das assembléias sinodais, documentos pontifícios importantes, como, por exemplo, sobre a evangelização, a cateque- se, a família, a penitência (1986, p. 67). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Além da índole consultiva, ao Sínodo dos Bispos é reconhe- cida uma finalidade de comunhão que se realiza por meio da in- formação sobre a efetiva situação das Igrejas em relação a deter- minadas matérias, da comunicação de experiências pastorais e da proposta de soluções para os problemas em estudo. Tal comunhão © Direito Canônico I220 visa favorecer uma estreita união entre o Romano Pontífice e os Bispos (cân. 342) e promover um acordo de opiniões sobre pontos essenciais da doutrina e sobre o modo pastoral de agir no governo da Igreja. Cf. o Motu proprio Apostolica sollicitudo, n. II, 1-2. Tratam-se, por- tanto, de objetivos e finalidades que colocam o Sínodo dos Bispos em relação com todo o episcopado com a intenção de se atingir um governo de comunhão, como requer uma eclesiologia de co- munhão. Por meio da communio pastorum, realiza-se a communio ecclesiarum e, como consequência, a unidade da Igreja. O Sínodo dos Bispos pode ser convocado pelo Romano Pon- tífice em três formas diversas, indicadas pelo cân. 345: • assembleia geral ordinária: quando o assunto a ser trata- do, pela sua natureza ou importância, requer a doutrina, a prudência e o parecer do inteiro episcopado católico; • assembleia geral extraordinária: quando o assunto a ser tratado, mesmo sendo relacionado ao bem de toda a Igreja, exige uma rápida definição; • assembleia especial: quando o argumento a ser estudado diz respeito a uma ou mais regiões geograficamente de- terminadas e, portanto, sem alcance universal. As três diversas assembleias são reguladas com normas es- pecíficas que determinam a composição do sínodo, a sua estrutura orgânica (presidência, secretaria, ofícios, organismos), a convoca- ção e os procedimentos. Os detalhes desta normativa encontram- -se no Ordo Synodi. Quanto aos direitos do Romano Pontífice em relação ao Sí- nodo (cân. 344), convém observar a existência de um evidente pa- ralelismo com o cân. 338, do qual já falamos anteriormente. Por fim, é importante considerar que o legislador, tratando da Constituição hierárquica da Igreja, colocou os cânones relati- vos ao Sínodo dos Bispos (cânn. 342-348) imediatamente depois Claretiano - Centro Universitário 221© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal daqueles relativos ao Romano Pontífice (cânn. 331-335) e ao Colé- gio Episcopal (cânn. 336-341), antes, portanto, daqueles relativos ao Colégio Cardinalício (cânn. 349-359) e à Cúria Romana (cânn. 360-361). Trata-se de uma posição canônica de privilégio que reco- nhece seja a particular dignidade do Sínodo dos Bispos, seja a sua superioridade teológica e funcional em relação aos organismos tradicionais da cúria romana. Para maior compreensão do assunto, sugerimos que você leia alguns dos textos que se ocupam do Sínodo dos Bispos: MAR- CHESI, M. Organismos de participação numa Igreja de comunhão. In: CAPPELLINI, E. (Org.). Problemas e perspectivas de Direito Canônico. São Paulo: Loyola, 1995, p. 123-128; FELICIANI, G. As bases do direito da Igreja. Comentários ao Código de Direito Canônico. São Paulo: Paulinas, 1994, p. 107-109; GHIRLANDA, G. O direito na Igreja, mistério de comunhão. Compêndio de Direi- to Eclesial. Aparecida: Santuário, 2003, p. 579-584; NEVES, A. O Povo de Deus: renovação do Direito na Igreja. São Paulo: Loyola, 1987, p. 144-146. O Colégio Cardinalício (cânn. 349-359) O nome cardeal não lhe é estranho, certo? A etimologia do termo cardeal encontra-se no latim cardo/cardinis, e no português gonzo ou eixo, algo que gira em torno de alguma coisa, nesse caso, em torno do Papa. Assim, os Cardeais da santa Igreja Romana são chamados desse modo em razão do peculiar vínculo que há entre o Colégio Cardinalício e a Igreja de Roma e, em particular, com o Papa. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Nos primeiros séculos da Igreja, o Papa era auxiliado no governo da diocese de Roma por um grupo de presbíteros, incardinados em uma igreja titular de Roma, e de diáconos, responsáveis pelos serviços litúrgicos, pela administração dos bens temporais e pelo serviço da caridade nas regiões político-administrativas de Roma. A partir do século 6º, os sete Bispos das dioceses que circundavam Roma, chamadas suburbicárias, passaram a prestar serviços litúrgicos na basíli- ca do Latrão, sendo, portanto, nela incardinados. A partir do século 10, em Roma, os três grupos, Bispos cardeais, presbíteros car- deais e diáconos cardeais, já estavam definidos e ser cardeal comportava sim- plesmente assistir ao Bispo de Roma nas celebrações litúrgicas mais solenes. © Direito Canônico I222 A passagem mais importante se dá quando esses três grupos se tornam um único colégio, no interior do qual as diferenças entre as ordens tornam-se secun- dárias e somente nominais. A partir de 1059, esse colégio intervém diretamente na eleição do Papa, juntamente com os outros clérigos e leigos de Roma e, do Concílio Lateranense III em diante (1179), torna-se o único a escolher o Papa. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Os Cardeais constituem, na Igreja de Roma, um peculiar co- légio ao qual compete, sobretudo, assegurar a eleição do Romano Pontífice e assisti-lo, sejacolegialmente, quando são convocados para juntos tratar as questões de maior importância, seja singu- larmente, nos ofícios que ocupam, prestando ajuda ao Papa, es- pecialmente no cuidado cotidiano pela Igreja universal (cân. 349). Para a melhor compreensão desse assunto, sugerimos que você realize a leitura do seguinte texto: GHIRLANDA, G. O direito na Igreja, mistério de comunhão. Compêndio de Direito Eclesial. Apa- recida: Santuário, 2003, p. 584-587. Vejamos, agora, os principais aspectos relativos à organiza- ção do Colégio Cardinalício: 1) Funções: os Cardeais constituem um peculiar colégio de prelados ao qual compete assegurar a eleição do Roma- no Pontífice (UDG 33) e assisti-lo, seja colegialmente, quando convocados para, juntos, tratarem as questões de maior importância, seja singularmente, nos ofícios que ocupam (cân. 349). Os Cardeais podem ajudar o Papa ocupando alguns ofícios na Cúria Romana (cân. 356) ou, também, como legados a latere (cân. 358). Du- rante a sede vacante o governo da Igreja compete ao Co- légio dos Cardeais até a eleição do novo Pontífice. 2) Nomeação: os Cardeais são escolhidos livremente pelo Romano Pontífice, entre Bispos e presbíteros que se dis- tinguem em modo eminente pela doutrina, costumes, piedade e prudência no agir. Aqueles que não são Bispos devem receber a ordenação episcopal (cân. 351 §1). Claretiano - Centro Universitário 223© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal O Papa pode autorizar que um presbítero continue como tal, como no caso dos Cardeais Henri de Lubac (1983), Pietro Pavan (1985) e Paolo Dezza (1991). Cardeais são criados com um decreto do Romano Pontífice que se torna público diante do Colégio dos Cardeais (Consistório). No caso do Papa manter em segredo uma nomeação, surge a figu- ra do cardeal in pectore, o qual não possui qualquer dever ou di- reito relativo aos Cardeais (cân. 351 §§ 2-3) enquanto o seu nome não for publicado. 3) Articulação do colégio cardinalício: o Colégio dos Carde- ais é dividido em três ordens, a saber, episcopal, pres- biteral e diaconal. A primeira é composta por aqueles aos quais o Romano Pontífice atribuiu o título de uma igreja suburbicária e pelos patriarcas orientais incluídos no Colégio. A segunda é composta por aqueles aos quais o Papa atribuiu um título de uma Igreja de Roma. A ter- ceira é composta por aqueles aos quais o Papa confiou o título de uma diaconia de Roma e, normalmente, esses ocupam funções na Cúria Romana (cân. 350). Em deter- minadas condições, os Cardeais da ordem presbiteral e diaconal podem passar, respectivamente, para outro título ou outra diaconia (cân. 350 §5). Os Cardeais diá- conos que permaneceram como tal por dez anos podem passar para a ordem presbiteral com precedência sobre outros Cardeais presbíteros cooptados sucessivamente (cân. 350 §6). O Colégio é presidido, sem qualquer po- testade de governo sobre os outros membros, pelo Car- deal Decano; caso este esteja impedido, é substituído pelo Subdecano (cân. 352 §1). 4) O Consistório: os Cardeais ajudam colegialmente o Ro- mano Pontífice nos consistórios ordinários, ou seja, quando são convocados todos os que residem em Roma para tratar assuntos de certa gravidade ou, então, para participar de grandes solenidades. Neste último caso, o consistório pode ser público e são admitidos Bispos, representantes diplomáticos e outros convidados. Já os © Direito Canônico I224 consistórios extraordinários ocorrem quando, diante de necessidades especiais da Igreja ou de graves questões a serem tratadas, são convocados todos os Cardeais da Igreja (cân. 353). O processo de internacionalização do Colégio Cardinalício faz com que este, mesmo não sendo um órgão representativo do episcopado mundial, pos- sa recolher opiniões de Bispos do mundo inteiro sobre questões particularmente significativas. 5) Outros aspectos relevantes: ao completar 75 anos de idade, os Cardeais são convidados a apresentar a renún- cia ao ofício que ocupam, e, ao cumprir 80 anos, perdem o direito de participar do conclave e, portanto, de eleger o Romano Pontífice (cân. 354). No caso de vacância da Sé Apostólica, o Colégio Cardinalício assume o governo da Igreja, mas possui somente aquela potesta- de estabelecida por legislação peculiar (cân. 359). a Cúria romana (cânn. 360-361) O Papa no exercício do seu ofício, além da ajuda dada pelo Episcopado e, em particular, pelo Sínodo dos Bispos e pelo Colégio dos Cardeais, utiliza-se de um complexo de pessoas, de ofícios e de instituições denominado Cúria Romana. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O CIC atual dedica apenas dois cânones à Cúria Romana (cânn. 360-361). Isso porque há uma normativa que não se encontra no CIC, mas em uma legislação particular promulgada pelo Papa João Paulo II em 1988, chamada Pastor Bonus. Neste documento, o Papa assim descreve a Cúria Romana: A cúria romana é o conjunto dos dicastérios e dos organismos que coadjuvam o romano pontífice no exercício do seu supremo ofício pastoral para o bem e o serviço da Igreja universal e das Igrejas particulares, exercício com o qual se reforçam a unidade da fé e a comunhão do povo de Deus e se promove a missão própria da Igreja no mundo (art.1). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Claretiano - Centro Universitário 225© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal Para compreender melhor este assunto, leia: GHIRLANDA, G. O direito na Igreja, mistério de comunhão. Compêndio de Direito Eclesial. Aparecida: Santuário, 2003, p. 587-595. Do ponto de vista eclesiológico, a Cúria Romana surgiu com uma única finalidade: tornar mais eficaz o exercício universal do ministério que Cristo confiou a Pedro e a seus sucessores. Isso faz que a Cúria tenha um caráter eclesial e ministerial. Certamente, não pertence à constituição divina da Igreja nem pode ser equipa- rada ao Colégio Episcopal. Possui um caráter eclesial enquanto e na medida em que a sua existência e competência se fundamen- tam na vontade do pastor da Igreja universal. Do ponto de vista jurídico, a Cúria é um instrumento nas mãos do Romano Pontífice e não possui qualquer autoridade ou poder além daquele que recebe diretamente do Papa, tendo, por- tanto, um poder vicário. Por isso, a Cúria Romana não age por ini- ciativa própria nem por direito próprio. É no poder que recebeu do Papa que está sua força, seus limites e suas prerrogativas. Quanto à composição, a constituição apostólica Pastor bo- nus afirma que a Cúria se compõe de dicastérios e institutos (ar- tigos 1 e 2; cân. 360). Com o nome de dicastérios, entende-se: a Secretaria de Estado, as Congregações, os Tribunais, os Conselhos e Ofícios (Câmara Apostólica, Administração do patrimônio da S. Apostólica, a Prefeitura dos negócios econômicos da S. Sede). Já com o nome de institutos: a Prefeitura da casa pontifícia e o ofício das celebrações litúrgicas do Romano Pontífice. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Eis um breve apanhado desta complexa estrutura: 1) Secretaria de Estado: possui o objetivo de ajudar, de muito perto, o Romano Pontífice no exercício de sua missão suprema (artigos 39-40). É presidida pelo cardeal secretário de Estado e possui duas secções: a secção dos negó- cios gerais, dirigida por um substituto (artigos 41-44), e a secção das relações com os Estados, dirigida pelo próprio secretário (artigos 45-47). © Direito Canônico I226 2) Congregações (artigos 48-116): são nove, no total, a saber, para a Doutrina da Fé; para as Igrejas Orientais; para o Culto Divino e a disciplina dos Sacra- mentos; para a causa dos Santos; para os Bispos; para a Evangelização dos Povos; para o Clero; para os IVC e SVA; para a Educação Católica. 3) Tribunais (artigos 117-130): temos três tribunais, quais sejam, Penitenciaria apostólica; Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica;Tribunal da Rota Ro- mana. 4) Pontifícios Conselhos (artigos 131-170): no total, são 12: para os leigos; para o desenvolvimento da unidade dos cristãos; para a família; para a justiça e a paz; para a promoção da caridade; da pastoral para os migrantes e itineran- tes; da pastoral para os operadores de saúde; para a interpretação dos textos legislativos; para o diálogo inter-religioso; para o diálogo com os não crentes; da cultura; das comunicações sociais. 5) Oficinas (artigos 171-179): são três, a saber, Câmara apostólica; Administra- ção do patrimônio da Sé Apostólica; Prefeitura dos assuntos econômicos da Santa Sé. 6) Outras instituições (artigos 180-182): Prefeitura da casa pontifícia; Ofício das celebrações litúrgicas do sumo pontífice. 7) Coligados com a S. Sé (187-193): o Arquivo secreto do Vaticano; a Biblioteca apostólica Vaticana; a Pontifícia Academia das ciências; a Tipografia Poliglota Vaticana, a LEV; o L´Osservatore Romano, a Rádio Vaticana e o Centro Tele- visivo Vaticano; a Fábrica de São Pedro e a "Elemosineria" apostólica. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Há, entre os dicastérios, uma paridade (art. 2 §2). São com- postos pelo cardeal prefeito ou por um arcebispo presidente; por um número determinado de padres cardeais e Bispos, com a aju- da de um secretário. Além desses, há os consultores, os oficiais maiores e um número apropriado de outros oficiais. A presença de leigos em determinados dicastérios não lhes permite o exercí- cio da potestade de governo, reservada àqueles que receberam o sacramento da ordem. Por fim, por Santa Sé, ou Sé Apostólica, deve-se entender, em primeiro lugar, o Papa, mas, também, observando-se a nature- za e o contexto, a Secretaria de Estado, o Conselho para os negó- cios públicos da Igreja e a Cúria Romana com os seus organismos (cân. 361). Os Legados pontifícios (cânn. 362-367) A expressão "legado pontifício" talvez lhe seja desconheci- da, embora, na prática, alguma ideia você já tenha. Por exemplo, Claretiano - Centro Universitário 227© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal certamente, já ouviu falar na figura do núncio apostólico aqui no Brasil. Trata-se de alguém que, pessoalmente, representa o Papa. A Igreja Católica afirma o direito nativo e independente do Romano Pontífice de nomear e enviar seus Legados, seja junto às Igrejas particulares nas várias regiões do mundo, seja junto aos Estados e Governos (cân. 362). O fundamento teológico do direito de representação da San- ta Sé é individuado na missão confiada por Cristo ao Papa de con- firmar os irmãos, de guiá-los, de mantê-los unidos, de sustentá-los e de confortá-los, não somente com a sua palavra, mas, também, com a sua presença. O direito de representação da Santa Sé sempre obteve re- conhecimento jurídico por parte do direito internacional e, ainda hoje, entre a Santa Sé e muitos Estados há relações com objetivos mais espirituais do que políticos. Por causa da dupla dimensão que caracteriza o ofício de le- gado pontifício (em muitos casos, intraeclesial e diplomática), esse instituto jurídico é regulado por diversos tipos de normas. A fun- ção diplomática dos legados pontifícios é realizada com base nas normas do direito internacional, enquanto a função intraeclesial observa as normas canônicas (cânn. 362-367), sendo que estas es- tão em íntima sintonia com aquelas. Para se interar melhor sobre os legados pontifícios, sugerimos que você faça a leitura das seguintes obras: CORRAL SALVADOR, C.; URTEAGA EMBIL, J. M. (Org.). Dicionário de Direito Canônico. São Paulo: Loyola, 1993, p. 428-433; GHIRLANDA, G. O direi- to na Igreja, mistério de comunhão. Compêndio de Direito Eclesial. Aparecida: Santuário, 2003, p. 595-598. O instituto da representação do Romano Pontífice compre- ende uma pluralidade de figuras referentes ao tipo e ao grau de representação. A classe do representante pontifício diferencia-se em relação ao caráter temporal ou estável do mandato recebido. © Direito Canônico I228 Para as missões temporárias junto às autoridades eclesiásticas e que não possuem um caráter diplomático, temos as seguintes fi- guras: os legados a latere, ou seja, Cardeais que recebem a missão de representar, como uma espécie de alter ego, a pessoa do Papa em particulares celebrações ou assembleias solenes; o visitador ou delegado apostólico, quando a missão recebida tem uma fun- ção de controle. Tratando-se de uma missão diplomática, usa-se a figura do enviado especial. Para as missões estáveis, o CIC indica- -nos os seguintes tipos de legados: Delegados Apostólicos; Nún- cios; Representantes e Observadores; Encarregados de negócios ad interim. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Os núncios desenvolvem a própria função de modo estável contemporaneamen- te diante dos chefes de Estado e diante da Hierarquia Eclesiástica do lugar. No direito internacional, são equiparados aos embaixadores de um país. Atualmen- te, a Santa Sé possui Núncios Apostólicos junto a 172 países e em 50 deles o Núncio é o Decano do Corpo Diplomático. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O cân. 363 não exige que o legado pontifício tenha recebido o sacramento da ordem. Os clérigos continuam tendo a preferên- cia por razões pastorais e devido à participação do legado ao mú- nus do Bispo de Roma. As funções dos legados, que são elencadas pelo cân. 364, dizem respeito à tutela do exercício da potestade dos Bispos (2º, 6º, 7º); às relações com as Conferências Episcopais (3º); à nomea- ção dos Bispos (4º); à informação à Santa Sé sobre a situação das Igrejas particulares (1º); à promoção do ecumenismo, da paz e da cooperação entre os povos (5º), às relações com os institutos de vida consagrada (Sollicitudo omnium Ecclesiarum IX, 1; 2). Aqueles que, também, exercitam a função junto aos governos dos Estados possuem a missão de promover e sustentar as relações entre a Santa Sé e as autoridades do lugar. Claretiano - Centro Universitário 229© U4 - O Governo da Igreja em Âmbito Universal 9. Questões autOavaLiativas Confira, na sequência, as questões propostas para verificar seu desempenho no estudo desta unidade: 1) Quem na Igreja possui poder supremo? 2) O poder na Igreja é tripartido, como acontece em vários países? Esclareça. 3) Quais são os requisitos necessários para ser membro do Colégio Episcopal? 4) Quais são as notas da potestade do Romano Pontífice. Explique-as. 5) Podemos afirmar que o Sínodo dos Bispos ocupa no CIC uma posição ca- nônica de privilégio em relação ao Colégio Cardinalício e à Cúria Romana? Justifique. 6) Quem escolhe os Cardeais e quais os requisitos para se tornar cardeal? 7) Um leigo pode ser legado pontifício? Justifique. 10. COnsiderações Esta unidade apresentou uma breve abordagem a respeito do governo da Igreja universal. Agora, caberá a você, valendo-se da bibliografia indicada, esclarecer outros aspectos da normativa. Com tais conhecimentos, estamos aptos a estudar, na Uni- dade 5, o governo da Igreja em âmbito particular, a Igreja Católica é uma comunhão de Igrejas particulares que possuem um próprio governo e é dele que nos ocuparemos logo na sequência. Esperamos que essa seja mais uma oportunidade de cresci- mento e amadurecimento para todos nós! Vamos lá? 11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAPPELLINI, E. (Org.). Problemas e perspectivas de direito canônico. São Paulo: Loyola, 1995. © Direito Canônico I230 DE LIMA, M. C. Introdução à história do direito canônico. São Paulo: Loyola, 1999. FELICIANI, G. As bases do direito da igreja. Comentários ao código de direito canônico. São Paulo: Paulinas, 1994. GEROSA, L. A interpretação da lei na igreja: princípios, paradigmas e perspectivas. São Paulo: Loyola, 2005. GHIRLANDA, G. O direito na Igreja: mistério de comunhão. Compêndio de Direito Eclesial. Aparecida: Santuário, 2003. GRINGS, D. A ortopráxis da igreja. O direito canônico a serviçoda pastoral. Aparecida: Santuário, 1996. LOMBARDIA, P. Lições de direito canônico. Introdução. Direito Constitucional. Parte Geral. São Paulo: Loyola, 2008. NEVES, A. O Povo de Deus: renovação do direito na igreja. São Paulo: Loyola, 1987.
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