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CRC Caderno de Referência de Conteúdo 1. INTRODUÇÃO Bem vindo (a) ao estudo da disciplina Direito Canônico II! Acredito que, desta vez, você não esteja mais surpreso (a) por novamente se deparar com uma disciplina "jurídica" em um curso teológico, pois, afinal de contas, já pôde anteriormente des- cobrir a importância e o significado do direito na e da Igreja, bem como a sua relação com a teologia e com a vida concreta de todos os fiéis. Nesta segunda parte do curso nos ocuparemos diretamente de uma realidade fundamental que, talvez, faça parte do seu dia a dia: Os Sacramentos! Saiba você que o estudo dos sacramentos é uma tarefa bas- tante complexa, pois nos coloca diante de várias abordagens que se complementam entre si: a bíblica, a dogmática, a litúrgica, a moral, a pastoral e a jurídica. Aqui, evidentemente, nos fixare- © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 16 mos na dimensão jurídica dos sacramentos e já lhe adianto que o campo de estudo também é muito vasto. Por isso, mais uma vez, estabeleceremos algumas prioridades, deixando, porém, em suas mãos as devidas indicações bibliográficas e outras referências que lhe servirão como material de apoio nesta sua busca de conheci- mento e aprofundamento da disciplina. O conteúdo programático do curso está dividido em sete unidades e foi assim distribuído: 1) Unidade 1 – Os Sacramentos em geral. 2) Unidade 2 – O Batismo e a Confirmação. 3) Unidade 3 – A Eucaristia. 4) Unidade 4 – A Penitência e a Unção dos Enfermos. 5) Unidade 5 – A Ordem. 6) Unidade 6 – O Matrimônio - parte I. 7) Unidade 7 – O Matrimônio - parte II. Acredito que, por tratarmos aqui de um tema muito próximo da realidade vivida por nossas comunidades e considerando o que foi estudado em Direito Canônico I, você terá todas as condições para aproveitar bem esta disciplina. No final de nosso percurso, você verá que o direito sacramental possui a sua razão de ser na vida eclesial. Muitas das relações jurídicas que os fiéis estabele- cem entre si estão intimamente conexas com os sacramentos. Desse modo, desejamos que se sinta motivado (a) e desafia- do (a) neste estudo que agora iniciamos. Bom proveito e muito êxito neste caminho que juntos per- correremos. 2. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA DISCIPLINA Abordagem Geral da Disciplina Neste tópico, apresenta-se uma visão geral do que será es- tudado nesta disciplina. Aqui, você entrará em contato com os 17© Caderno de Referência de Conteúdo assuntos principais deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportunidade de aprofundar essas questões no estudo de cada unidade. No entanto, essa Abordagem Geral visa fornecer-lhe o conhecimento básico necessário a partir do qual você possa cons- truir um referencial teórico com base sólida – científica e cultural – para que, no futuro exercício de sua profissão, você a exerça com competência cognitiva, ética e responsabilidade social. Vamos co- meçar nossa aventura pela apresentação das ideias e dos princí- pios básicos que fundamentam esta disciplina. O primeiro passo é situar a normativa relativa aos sacra- mentos. Saiba você que ela se encontra, sobretudo, no livro IV do Código de Direito Canônico atual (CIC) cujo título é: De Ecclesiae munere sanctificandi, ou seja, Do múnus de santificar da Igreja. Todavia, é bom lembrar que este livro não contém todas as normas que regem a função de santificar da Igreja, pois alguns cânones coligados com o múnus de santificar foram inseridos, embora em escala bem menor, nos livros I, II, III e V do Código, sem falar, ainda, nos livros litúrgicos que, também, contém uma normativa litúrgi- ca e sacramental. Tudo isso nos revela que a função de santificar ocupa um lugar central na vida da Igreja e a normativa canônica é simplesmente um reflexo disso. O Título do livro IV Antes de apresentarmos a sistemática do livro IV (o faremos em seguida) me parece importante uma breve alusão ao título deste livro, pois possui as suas raízes na reflexão do Concílio Va- ticano II. Este Concílio deu muita importância à distinção entre as três funções (munera) de Cristo e da Igreja (ensinar, santificar e governar), resumindo em torno delas toda a missão de Cristo e da Igreja. O CIC atual, inspirado, então, pelo Vaticano II, quis mostrar com os dois livros que fazem referência à função de ensinar (livro III) e santificar (livro IV), a intrínseca relação que existe entre a ma- téria por eles regulada e a missão salvífica da Igreja. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 18 Convém ressaltar, também, que a função de santificar possui um significado amplo: significa tanto "tornar-nos santos" e, neste sentido, se faz referência àquela parte da liturgia que atinge este objetivo em benefício das pessoas (movimento descendente), quanto "glorificar Àquele que é santo" e, neste sentido, se faz re- ferência ao culto divino como tal, isto é, ao serviço humano apre- sentado a Deus (movimento ascendente). Teologicamente as duas partes não estão justapostas, mas cada uma delas é necessária à verdade cristã da outra. Coerente com esta perspectiva o CIC pro- cura dar uma visão unitária seja da liturgia, evitando reduzi-la a um conjunto de leis e rubricas, seja do direito dos sacramentos. Divisão do livro IV Entrando, agora, na questão sistemática, tenha presente que o livro IV foi dividido em três partes e compreende 420 cânones assim distribuídos: 1) 06 cânones introdutórios de caráter geral que tratam da função de santificar própria da Igreja (cânn. 834-839); 2) 326 cânones sobre os sacramentos assim agrupados: os sacramentos em geral (cânn. 840-848); o batismo (cânn. 849-878); a confirmação (cânn. 879-896); a santíssima Eucaristia (cânn. 897-958); a penitência (cânn. 959-997); a unção dos enfermos (cânn. 998-1007); a ordem (cânn. 1008-1054); o matrimônio (1055-1165); 3) 39 cânones sobre os outros atos do culto divino, assim distribuídos: os sacramentais (cânn. 1166-1172); a li- turgia das horas (cânn. 1173-1175); as exéquias eclesi- ásticas (cânn. 1176-1185); o culto dos santos, imagens sagradas e relíquias (cânn. 1186-1190); o voto e o jura- mento (cânn. 1191-1204); 4) 48 cânones sobre os lugares e tempos sagrados (cânn. 1205-1253). Note que a normativa é bastante vasta e não será possível estudá-la por completo. De qualquer forma iremos longe, pois nesta disciplina você se ocupará dos 326 cânones que se referem aos sacramentos, o que não é pouco! 19© Caderno de Referência de Conteúdo O livro IV e o concílio vaticano II O livro IV do CIC, como dito, recebeu um grande influxo do Concílio Vaticano II e da reforma litúrgica por ele desejada. A reno- vação resulta evidente se compararmos os caracteres fundamen- tais do CIC de 1917 em matéria litúrgica com o CIC atual. Vamos fazer este exercício de comparação? No CIC de 1917 o direito litúrgico baseava-se na reforma pós- -tridentina, confirmada e afirmada pelo Concílio Vaticano I. Dentre as características principais desta reforma destacamos: a) a centralização litúrgica (somente a Santa Sé podia regu- lar e aprovar os livros litúrgicos); b) a uniformidade litúrgica; c) a exclusão da adaptação da liturgia às várias culturas; d) o rubricismo. Não sem razão os críticos afirmavam que o direito litúrgico de então tinha se desenvolvido à margem da teologia e da pasto- ral, limitando-se a conservar determinadas práticas tradicionais. A normativa litúrgica do Concílio Vaticano II, por sua vez, apresenta características novas em relação àquela anterior. O con- ceito de liturgia, por exemplo, possui uma inspiração teológica vas- ta e profunda, sendo, ao mesmo tempo, cristológico e eclesiológi- co. A referência fundamental para compreendermos tal conceito é a constituição Sacrosanctum Concilium (SC), sobretudo, nos nú- meros 5-7, como, também, a constituição dogmática Lumen Gen- tium (LG). Eis como a SC no nº7 descreve a liturgia: Com razão, pois, a Liturgia é tida como o exercício do múnus sacer-dotal de Jesus Cristo, no qual, mediante sinais sensíveis, é signifi- cada e, de modo peculiar a cada sinal, realizada a santificação do homem; e é exercido o culto público integral pelo Corpo Místico de Cristo, Cabeça e membros. Disto se segue que toda a celebração litúrgica, como obra de Cristo sacerdote, e de Seu Corpo que é a Igreja, é uma ação sagrada por excelência, cuja eficácia, no mesmo título e grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 20 À luz desta definição se compreende, então, como a liturgia não possa ser reduzida às "rubricas" que regulam as celebrações, nem possa ser considerada imutável ou uniforme a ponto de não permitir a participação ativa dos fiéis e a adaptação às diversas culturas. É possível constatar que o livro IV do CIC assumiu os grandes princípios que inspiraram a reforma do Concílio Vaticano II e que os resumimos em nove para o seu conhecimento: 1) A centralidade da liturgia e o seu primado na vida da Igreja. 2) A unidade inseparável entre santificação e culto como duas faces de uma mesma realidade. 3) O reconhecimento da comunidade eclesial inteira como sujeito da função de santificar quando esta se manifesta e é exercitada nas ações litúrgicas. 4) A afirmação da necessária relação entre fé e liturgia, fundamental para que seja vivida a verdade dos sacra- mentos e estimulada a ação pastoral. 5) O caráter público das ações litúrgicas, acentuando-se a participação ativa de todos os membros da Igreja. 6) A afirmação da dimensão comunitária das celebrações litúrgicas, que não são um fato meramente privado. 7) A atribuição de poder às Conferências Episcopais e ao Bispo diocesano em matéria litúrgica. 8) O reconhecimento implícito do princípio de adaptação e de inculturação da liturgia, salva, porém, a unidade que não pode de forma alguma ser prejudicada. 9) A harmonização dos outros meios com os quais a Igre- ja satisfaz a função de santificar (oração pessoal, obras de penitência e caridade, exercícios de piedade) com a liturgia. Confrontada com aquela do CIC de 1917 a legislação litúrgica renovada a partir do Concílio Vaticano II e contida no Código e nos livros litúrgicos, não aparece mais uniforme e imutável. O reconhe- cimento de um adequado espaço às legítimas diversidades e adap- 21© Caderno de Referência de Conteúdo tações aos vários grupos étnicos, às regiões e aos povos (SC 38-40) abriu o caminho para o direito litúrgico particular que aos poucos irá adquirir uma importância cada vez maior (assim esperamos). Obviamente que nem tudo é perfeito no livro IV do CIC e que críticas sempre serão feitas. Contudo, é inegável que Código pôde dar a sua parcela de contribuição para uma renovação da liturgia, ao menos naquela parte em que depende do direito. Feita esta breve apresentação do livro IV do CIC, faremos, em seguida, uma sintética exposição dos principais aspectos teoló- gicos e jurídicos dos sacramentos em geral. Não será possível aqui falar de cada sacramento, mesmo porque, é isso que será objeto de estudo nas sete unidades deste material didático. Aspectos teológicos e jurídicos fundamentais Saiba você que o Código não desenvolve de maneira articu- lada e completa uma teologia dos sacramentos, pois não é esta a função de um texto normativo. Todavia, a pressupõe e dela faz de- rivar importantes diretivas disciplinares. Sendo assim, é necessário conhecê-la um pouco. Vamos lá, então? Noção de sacramento – O cân. 80 descreve os sacramentos do Novo Testamento como "sinais e meios pelos quais se exprime e se robustece a fé, se presta culto a Deus e se realiza a santifi- cação dos homens". Trata-se de uma descrição em clara sintonia com o conteúdo do cân. 834 no qual encontramos a noção de li- turgia à qual nos referimos há pouco. Na liturgia e, portanto, nos sacramentos, se significa e se realiza a santificação dos homens, se presta culto a Deus e se expressa e fortalece a fé. Temos, portanto, aqui, uma definição clássica de sacramento, adotada pelo Magis- tério da Igreja. Todo sacramento é um sinal eficaz de graça; significa o que causa e causa o que significa. Significação e causalidade são, por conseguinte, dois componentes essenciais da sacramentalidade do Novo Testamento, diferentemente dos sacramentos da Anti- © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 22 ga Aliança que prometiam e significavam a salvação, sem, porém, realizá-la, uma vez que ela chegou a nós por intermédio de Cristo. Portanto, é a atuação de Cristo que comunica a graça que o sacra- mento significa. Elementos essenciais – Os sacramentos possuem alguns ele- mentos essenciais que os configuram como tal. São eles: a) O sinal sacramental – é sempre de natureza sensível (por ex: água, pão, vinho, óleo, etc.). O sinal, além de manter o seu significado humano, é enriquecido de novos sig- nificados dados pela Palavra de Deus. É composto, por- tanto, por dois elementos: matéria (coisas ou ações) e forma (palavras) mediante a qual se determina o signifi- cado do sinal. b) A realidade significada e causada pelo sinal – trata-se aqui da graça santificante concedida por Deus a quem o recebe, pois é através dela que nos santificamos. Esta graça é o efeito último, mas não único, do sacramento. c) O ministro do sacramento – é aquele que age in persona Christi (fazendo as vezes da pessoa de Cristo) e, também, in nomine Ecclesiae (em nome ou com o "mandato" e a "representação" de toda a Igreja). Atua em nome da Igreja aquele que confecciona o sinal sa- cramental e que administra o sacramento aos fiéis. Sua função é apenas instrumental, razão pela qual não se requer essencialmen- te nem sua fé pessoal e nem sua santidade de vida para que opere válida e eficazmente o sacramento. Mesmo que a atuação do mi- nistro seja apenas instrumental, pois é o próprio Cristo o ministro principal dos sacramentos, ela é necessária, pois os sacramentos requerem sempre um ministro; a) O sujeito que recebe o sacramento – É aquele em favor do qual o sacramento é administrado. Fora o caso do sa- cramento da penitência, cujos atos do penitente consti- tuem parte essencial do rito sacramental, a falta de ade- quada disposição do sujeito não é um obstáculo para a válida celebração do sacramento, mas o é para que a graça sacramental produza os seus efeitos e, sobretudo, dê seus frutos na vida da pessoa. 23© Caderno de Referência de Conteúdo b) A comunidade que celebra o rito – a comunidade ecle- sial é um aspecto importante a ser recuperado na práti- ca sacramental, pois os sacramentos não são realidades individuais que dizem respeito, apenas, ao ministro e a quem o recebe. Os sacramentos são ações de Cristo e da Igreja e a presença da comunidade explicita uma eclesia- lidade ministerial e não, apenas, clerical. A eficácia dos sacramentos - Todo sacramento, como disse- mos, é um sinal eficaz de graça; significa o que causa e causa o que significa. Significação e causalidade são, portanto, dois componen- tes essenciais da sacramentalidade do Novo Testamento. Em matéria de eficácia dos sacramentos seria conveniente recordar aqui duas expressões técnicas e clássicas, muito conhe- cidas na história da sacramentária: ex opere operato e ex opere operantis. A primeira expressão (ex opere operato) quer exprimir a efi- cácia objetiva de todo sacramento, uma vez realizado validamen- te o sinal sacramental. Tal eficácia se fundamenta nos méritos de Cristo e não nos do ministro ou de quem recebe o sacramento. Afirmar que o sacramento é eficaz ex opere operato significa pro- clamar que é Deus, e não o homem, quem justifica; que é a ação de Cristo, e não a da pessoa, fonte de salvação. Equivale a afirmar que os sacramentos são, em primeiro lugar, ações de Cristo, subor- dinadamente, ações da Igreja e, apenas, instrumentalmente ações do ministro. A segunda expressão (ex opere operantis) quer exprimir os frutos subjetivos de todo sacramento.Dizer que o sacramento é eficaz ex opere operantis significa ter presente que a ação santi- ficadora comunicada pelo sacramento pode ficar bloqueada por falta de disposição da pessoa, sem produzir algum fruto, embora seja válido. Deste modo, se procura evitar a idéia de que a eficácia sacramental ex opere operato seja entendida como um automatis- mo mágico, pois sacramento não é magia. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 24 Enfim, para que o sacramento seja eficaz (produza os seus efeitos) é necessário, em primeiro lugar, que tenha sido válido, ou seja, que o sinal sacramental seja realizado de acordo com a von- tade de Cristo e segundo as normas de validade estabelecidas pela Igreja. Uma vez celebrado validamente, o sacramento opera ob- jetivamente sua eficácia salvífica (ex opere operato) e quando tal dom é acolhido torna-se, também, frutuoso (ex opere operantis). Hoje em dia alguns autores ao refletirem sobre os sacramen- tos e sua eficácia buscam ampliar esta compreensão tradicional, recorrendo a outras categorias. Para conhecê-las sugiro que se in- terem da bibliografia indicada no texto base, como, também, nas informações complementares. De qualquer forma é minha função orientá-lo (a), apresentando aquelas categorias com as quais o le- gislador trabalha e que, portanto, estão presentes na normativa. Outros efeitos dos sacramentos - Suposta a validade do sa- cramento, se produz objetivamente a graça significada e causa- da, que, como afirmado, é o efeito último de todo sacramento. Não obstante, o sujeito pode colocar obstáculos para a recepção da graça e fazer com que o sacramento não seja frutuoso em sua vida. Todavia, existem outros efeitos de especial relevância teoló- gica e canônica que derivam de um sacramento válido, qualquer que sejam as disposições do sujeito. Neste sentido, o sacramento é sempre eficaz. Vejamos... Em relação ao batismo, por exemplo, podemos afirmar que o seu efeito imediato é o caráter mediante o qual o fiel fica confi- gurado a Cristo, consagrado e destinado ao culto da religião cristã e incorporado à Igreja. Algo semelhante ocorre com o caráter da confirmação, mediante o qual os fiéis se vinculam mais estreita- mente à Igreja e adquirem um compromisso apostólico reforçado. No caso do caráter da ordenação, o fiel é configurado com Cristo Sacerdote e destinado a exercitar as funções próprias do Cristo-Ca- beça. Já em relação à Eucaristia, o Corpo e o Sangue do Senhor são o primeiro e imediato efeito do sinal sacramental corretamente realizado. Por fim, em relação ao matrimônio, o efeito imediato é 25© Caderno de Referência de Conteúdo o vínculo sacramental que deriva de um pacto conjugal válido. Se, portanto, falta a vida de fé do ministro ou de quem recebe o sacra- mento, nem por isso os sacramentos perdem a validade e deixam de produzir estes efeitos que acabamos de mencionar. Dimensão eclesial dos sacramentos - Os sacramentos foram instituídos por Cristo e são principalmente ações d’Ele. Eles nos recordam sua ação redentora, atualizam aqui e agora esta mesma ação e anunciam o estado futuro de nossa consumação definitiva em Cristo. Em outras palavras, toda ação sacramental comemora os mistérios redentores de Cristo, realiza estes mistérios no tempo da Igreja e anuncia a plenitude da salvação em Cristo no final dos tem- pos. Porque os sacramentos são acima de tudo ações de Cristo é que se afirma, como dito, a eficácia sacramental ex opere operato. Não podemos nos esquecer, porém, que os sacramentos são, também, ações da Igreja. Através deles se constrói e edifica a Igreja e, portanto, eles são parte essencial de seu mistério, razão pela qual a Igreja está sempre implicada em qualquer celebração sacramental, mesmo que só esteja presente o ministro e quem re- cebe o sacramento. A Igreja não tem o poder sobre a substância dos sacramen- tos, ou seja, sobre aquelas coisas que, em conformidade com a Re- velação, Cristo determinou que devessem ser mantidas como sinal sacramental. Neste sentido, a Igreja depende e existe mediante os sacramentos tais como foram determinados pelo direito divi- no (Revelado). Porém, este depósito institucional (sacramentos) foi confiado à Igreja para que o defenda, interprete, administre corretamente e regule a sua disciplina de modo que, mantendo a instituição intacta, determine ou modifique o que achar mais con- veniente para a utilidade dos fiéis. Desde este ponto de vista, os sacramentos dependem da Igreja. Em resumo: a Igreja faz os sacramentos e os sacramentos fazem a Igreja e nada mais lógico que eles concorram para criar, fortalecer e manifestar a comunhão eclesial, tal como nos recorda o cân. 840. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 26 Outra dimensão eclesial importante é que "... os sacramentos constituem sinais e meios pelos quais se exprime e se robustece a fé" (cân. 840). Os sacramentos são celebrações da fé no sentido que sempre são celebrados na fé da Igreja. Portanto, é a fé da Igreja que assume a intenção do ministro; é a fé da Igreja que entra na consti- tuição mesma do sacramento, mediante as palavras pronunciadas por meio do ministro, outorgando, assim, uma significação ao ele- mento material. Contudo, não é a fé da Igreja que outorga a eficá- cia ao sacramento, mas, apenas, o reconhece como instrumento de Deus que é a causa eficiente principal de todo sacramento. A eficácia jurídica dos sacramentos – Você já sabe que os sacramentos são sinais eficazes da graça. Foram instituídos com a finalidade de atualizar permanentemente no tempo histórico da Igreja a salvação de Jesus Cristo, certo? Tenha presente que esta finalidade primária e substancial dos sacramentos não nos impede de considerá-los como causa de vários efeitos jurídicos e, inclusi- ve, de configurá-los como fatos ou atos jurídicos. Estranho isso? Lembre-se que entre o sinal visível e a graça existe um efeito in- termediário revestido de importantes conotações jurídicas. Vamos voltar a ele, então... A Igreja se constrói como sociedade estruturada e organiza- da a partir dos sacramentos, pois são eles que estruturam juridica- mente a Igreja, tornando-se a causa das relações jurídicas básicas sobre as quais se fundamenta a estrutura e organização da Igreja. Vejamos isso concretamente... Do batismo e da ordem derivam os dois grandes princípios constitucionais do povo de Deus: o princípio da igualdade e o prin- cípio da diversidade funcional (hierárquico). Pelo batismo se veri- fica entre todos os fiéis uma verdadeira igualdade (cân. 208). Pela ordem, alguns, dentre os fiéis, são constituídos ministros sagrados com a finalidade de desempenhar em pessoa as funções de Cristo- -Cabeça (cân. 1008). 27© Caderno de Referência de Conteúdo Pelo batismo o homem se incorpora à Igreja e nela se consti- tui pessoa, com os deveres e direitos que são próprios dos cristãos (cân. 96). No batismo se fundamenta a origem do vínculo jurídico de incorporação à Igreja e do estatuto jurídico de fiel, com os de- veres e direitos que o integram. Pelo sacramento da ordem, o fiel se incorpora à ordem dos clérigos, dando origem a um estatuto jurídico próprio, com um conjunto de obrigações e direitos que afetam diretamente sua vida e ministério. Quanto ao matrimônio, além de uma série de efeitos jurídi- cos que derivam do pacto conjugal, há um importante efeito que deriva do sacramento: o vínculo conjugal. Tal vínculo adquire com a consumação do matrimônio uma especial firmeza a ponto de não poder ser dissolvido por ninguém (cân. 1141), exceto nas pou- cas exceções previstas das quais não nos ocuparemos aqui. Menos perceptíveis são os efeitos jurídicos dos demais sa- cramentos. Assim, por exemplo, a confirmação imprime caráter e é este, portanto, o efeito imediato de tal sacramento. Não está claro se si trata de uma capacidade jurídica distinta daquela que o fiel já tem como batizado. Quanto à Eucaristia, mais que produzir efeitos jurídicos, nosencontramos diante de uma realidade para a qual se orientam to- dos os demais sacramentos e através da qual se significa e realiza a unidade do povo de Deus e a edificação do Corpo de Cristo (cân. 897). Os sacramentos como objeto de regulamentação canônica - Na administração dos sacramentos a Igreja sempre se reconhe- ceu com poder para estabelecer ou mudar aquilo que, segundo a variedade das circunstâncias, tempo e lugar, julga ser mais conve- niente para a utilidade dos fiéis ou para a veneração dos mesmos sacramentos. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 28 O Concílio de Trento sancionou esta doutrina afirmando que compete a Igreja aprovar ou definir não apenas os requisitos de liceidade, como também, aqueles que condicionam a validade dos sacramentos. É por isso que os sacramentos sempre foram objeto de regulamentação canônica, residindo aí a sua mais conhecida dimensão jurídica. A Igreja, através de sua disciplina, determina os aspectos fundamentais do sinal sacramental e dos fatores que o integra (matéria e forma), assim como os requisitos para a valida- de e a liceidade (poderes, capacidades, disposições, direitos, deve- res) que afetam tanto ao ministro quanto o sujeito que o recebe. Concluindo: os sacramentos são juridicamente relevantes seja porque, queridos por Cristo, desenvolvem uma função consti- tutiva na Igreja, seja porque são causa de efeitos jurídicos no orde- namento da Igreja, seja porque necessitam de um adequado orde- namento que assegure a celebração, administração e recepção de acordo com a justiça e a verdade. Feita esta grande introdução, na qual nos ocupamos de uma série de tópicos com a finalidade de introduzi-lo (a) no estudo da disciplina sacramental da Igreja, desejo e espero que se sinta bas- tante motivado (a) para conhecê-la um pouco mais. Tenho certeza que esse estudo, se feito com a devida seriedade e empenho, irá surpreendê-lo (a) muito positivamente em relação a uma série de coisas, pode acreditar! Bom estudo! Glossário de Conceitos O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rápi- da e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de co- nhecimento dos temas tratados na disciplina Direito Canônico II. Veja, a seguir, a definição dos principais conceitos desta disciplina: 1) Administrador diocesano: é aquele que assume tem- porariamente o governo de uma diocese durante a va- 29© Caderno de Referência de Conteúdo cância da sé episcopal. O can. 416 nos recorda que a sé episcopal se torna vacante pela morte do Bispo dioce- sano, pela renúncia aceita pelo Romano Pontífice, pela transferência e pela privação intimada ao Bispo. O administrador diocesano geralmente é eleito pelo co- légio dos consultores (a respeito do qual nos fala o cân. 502), tendo as mesmas obrigações e o mesmo poder do Bispo diocesano, com exclusão do que se excetua pela natureza da coisa ou pelo próprio direito (cân. 427). A eleição do administrador diocesano deve ser realizada em conformidade com os cânn. 165-178 e os requisitos necessários para a função são fixados pelo cân. 425. 2) Ato administrativo: os diversos atos administrativos singulares possuem cada um o seu significado específi- co e características peculiares. Todavia, possuem, tam- bém, elementos comuns, justamente porque participam do gênero ato administrativo singular e, neste sentido, podem ser regulados por uma normativa comum. Nos cânn. 35-47 encontramos um conjunto de normas que regulam esses atos administrativos. Por ora basta que saiba que por ato administrativo sin- gular podemos entender uma disposição dada pela com- petente autoridade (pessoa física ou jurídica) executiva (cân. 35) ou legislativa (cân. 76 §1), na forma estabele- cida pelo direito, para um caso particular e com eficácia jurídica limitada a tal caso. Às vezes o ato administrativo singular contém uma de- claração de vontade (licença – cân. 1124; admissão – cân. 641; dispensa – cân. 1127 §2; punição – cân. 1375; transferência – cân. 190; revogação – cân. 141) e, outras vezes, uma decisão de juízo ou de certificação (certifica- do, autenticação, parecer, etc.). 3) Caráter – o selo, junto com o penhor do Espírito, talvez seja na Igreja primitiva a fórmula encontrada para desig- nar aquilo que no século IV foi elaborado com o nome de caráter sacramental. Nesta evolução teve uma impor- tância decisiva a discussão com os donatistas no tempo do papa Milcíades (311-324), que destacou a validade © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 30 das ordenações conferidas, inclusive, por apóstatas, como ensinou, também, o sínodo de Arles do ano 314. É doutrina da Igreja que os sacramentos do batismo, da confirmação e da ordem imprimem caráter que pode ser considerado como uma realidade sobrenatural e confi- guradora que imprime uma marca no núcleo pessoal do homem, de acordo com a finalidade do caráter. Sugiro que procure no Catecismo da Igreja Católica ou num di- cionário de teologia o termo "caráter", pois há muitos elementos a considerar quando nos referimos a esta re- alidade. Saiba, de antemão, que esta palavra possui na teologia é empregada com um significado diferente da linguagem usual. 4) Concílio Ecumênico: Concílio significa originariamente uma reunião ou assembléia para dirimir diferenças. No uso eclesiástico desde os primeiros séculos chamaram- -se concílios as assembléias em que havia uma prevalên- cia de Bispos. Sempre, porém, houve presença de outras pessoas (presbíteros e mesmo leigos). Aos concílios cabe deliberar sobre questões de ordem doutrinal, disciplinar e pastoral. Já a palavra Ecumênico é utilizada como si- nônimo de universal. A Igreja católica reconhece como ecumênicos 21 concílios, o primeiro dos quais foi o de Nicéia (325 dC) e o último o Vaticano II (1962-1965). A normativa sobre o Concílio Ecumênico encontra-se ex- plicitada nos cânn. 337-341 (cf. nota de roda pé do CIC de 1983, na qual o Pe. Jesus Hortal, SJ faz um comentário ao cânon 337). 5) Domicílio - não é necessário evidenciar a importância do lugar na vida do homem e, também, do cristão, e, por conseguinte, sua relevância nos ordenamentos jurídicos. De fato, nós, vivendo no espaço e no tempo no âmbito de uma determinada comunidade, temos precisos pon- tos de referência ligados ao lugar do nosso nascimento e de nossa residência. Tendo por base o lugar são estabe- lecidos relações no âmbito da família e da comunidade eclesial (paroquial ou diocesana). O fiel pelo fato de ha- bitar em um lugar faz parte de uma comunidade de per- tença onde exercita alguns de seus direitos fundamen- 31© Caderno de Referência de Conteúdo tais, como, por exemplo, o de celebrar os sacramentos da vida cristã. A aquisição do domicílio (cân. 102 §1) comporta um elemento objetivo: a residência no território de uma paróquia ou, ao menos, de uma diocese. Além deste re- quisito, que não pode faltar, exige-se, ainda, uma certa estabilidade que poderá ser verificada a partir de dois critérios: tempo ou intenção. No primeiro caso, exige- -se, então, que a pessoa permaneça no lugar por cinco anos completos. No segundo caso, exige-se o animus, ou seja, a intenção de permanecer perpetuamente naquele determinado lugar em que a pessoa reside, mesmo que, por causas imprevistas, tenha que abandonar o lugar. Portanto, havendo tal intenção imediatamente se adqui- re o domicílio, independentemente do tempo. Já a perda do domicílio se dá quando a pessoa deixa o lugar em que reside com a intenção de não mais voltar. Aqui temos uma exceção para o menor emancipado, pois, neste caso, perde o domicílio legal e adquire o do- micílio voluntário, podendo ser o mesmo em que já es- tava. 6) "Ex opere operato" e "ex opere operantis" – a primeira expressão quer exprimir a eficácia objetiva de todo sa- cramento, uma vez realizado validamente o sinal sacra- mental. Tal eficácia se fundamenta nos méritos deCristo e não nos do ministro ou de quem recebe o sacramento. Afirmar que o sacramento é eficaz ex opere operato sig- nifica proclamar que é Deus, e não o homem, quem jus- tifica, que é a ação de Cristo, e não a do homem, fonte de salvação. Equivale a afirmar que os sacramentos são, em primeiro lugar, ações de Cristo, subordinadamente, ações da Igreja e, apenas, instrumentalmente ações do ministro. A segunda expressão quer exprimir os frutos subjetivos de todo sacramento. Dizer que o sacramento é eficaz ex opere operantis significa ter presente que a ação santificadora comunicada pelo sacramento pode fi- car bloqueada por falta de disposição do ministro ou de quem recebe o sacramento, sem produzir algum fruto. Deste modo, procura-se evitar a ideia de que a eficácia © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 32 sacramental ex opere operato seja entendida como um automatismo mágico. 7) Impedimento – no direito canônico a palavra "impedi- mento" aparece em contextos diversos. Trata-se de uma palavra genérica que significa obstáculo. No contexto do direito matrimonial, que é o que nos interessa aqui, pode ser aplicada a qualquer obstáculo legal que impeça a válida celebração do matrimônio, tanto se tal obstácu- lo procede de uma qualidade da pessoa, quanto da falta de um elemento essencial, como é o caso, por exemplo, da forma canônica, ou, mesmo, da falta ou vício de con- sentimento. No CIC atual, ainda em âmbito matrimonial, a palavra impedimento é acompanhada de um qualificativo: di- rimente. Na verdade, como é sabido, a divisão dos im- pedimentos em dirimentes (com sanção de nulidade) e impedientes (sem sanção de nulidade) desapareceu do código atual. Portanto, todo impedimento é sempre di- rimente de modo que falar estrita e tecnicamente hoje em impedimento matrimonial equivale a dizer impedi- mento dirimente. Assim, pois, o qualificativo vigente no CIC não tem precisamente a função de diferenciar e clas- sificar, mas, sim, de clarificar o conceito. Em relação à expressão "dirimente", utilizada pelo cân. 1073 para clarificar o conceito de impedimento, pode- mos afirmar que significa duas coisas: a) tais impedimen- tos proíbem a celebração do matrimônio; b) impedem que se contraia validamente o matrimônio. Deste modo, fica esclarecida a natureza jurídica do impedimento. Tra- ta-se de uma lei que, em primeiro lugar, proíbe a uma determinada pessoa a celebração do matrimônio. Além disso, é uma lei inabilitante, ou seja, à norma do cân. 10, torna a pessoa inábil para contrair matrimônio e, caso o faça, o mesmo será inválido. Sendo uma lei, o impedi- mento é uma realidade eminentemente jurídica. Deste modo, a circunstância ou o fato que serve de sustenta- ção para a lei, não entra na natureza do impedimento enquanto lei. Em outras palavras, a essência do impedi- mento consiste em ser lei, que, porém, que não foi ema- 33© Caderno de Referência de Conteúdo nada por capricho ou arbítrio, mas, sim, fundada sobre um fato ou circunstância objetiva que interessa à pessoa do contraente. Vejamos um exemplo: o fato da recepção do sacramento da ordem serve de sustento ao legislador para estabelecer a lei que impede a válida celebração do matrimônio a um determinado sujeito. O impedimento não seria o fato objetivo que lhe serve de sustento, mas, sim, a lei criada a partir deste fato. Uma outra qualidade do impedimento, como visto aci- ma, é a nota da inabilidade. Segundo o cân. 10, as leis podem ser consideradas irritantes ou inabilitantes. As primeiras interessam diretamente o ato jurídico e o tor- nam nulo. As segundas tocam diretamente a pessoa e a tornam inábil. Em outras palavras, existem leis que para tutelar determinados valores estabelecem a nulidade do ato jurídico quando não for realizado em conformidade com a lei. Esta nulidade poderá derivar ou da falta de um elemento que constitui o ato jurídico como tal, ou da incapacidade da pessoa para colocar um determina- do ato jurídico. No primeiro caso, temos uma lei irritante e, no segundo, uma lei inabilitante. No caso dos impedi- mentos matrimoniais nos encontramos diante de uma lei inabilitante. Assim, do impedimento-lei que torna a pessoa inábil, surge necessariamente o efeito de dirimir o matrimônio caso seja realizado. 8) Incardinado, incardinação: no direito canônico antigo os clérigos eram normalmente ordenados para o serviço de uma determinada igreja. Esta igreja se encontrava natu- ralmente em uma diocese, mas os clérigos eram adscri- tos imediatamente na igreja à qual serviam e nem tanto em uma diocese. De fato, a incardinatio entendida como adscrição a uma diocese, tal como disciplinada pelo CIC de 1917, é o resultado de uma práxis do século 19. O Concílio Vaticano II nos recorda que o ministro ordena- do não é um sujeito privado, que administra autonoma- mente um ministério a ele confiado de acordo com a sua utilidade pessoal; ao contrário, ele pertence à Igreja, na e por meio da realidade sacramental que a torna presen- te em um determinado lugar, isto é, a Igreja particular. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 34 Além disso, Concílio quis apresentar uma visão mais uni- versal do ministério sagrado. O sacerdote é visto como o colaborador não apenas do seu bispo, mas da ordem episcopal (LG 28b). Por isso, o decreto Presbyterorum Ordinis no número 10 solicitou que fossem revistas as normas sobre a incardinação e a excardinação de modo que este instituto antiqüíssimo, mesmo permanecendo em vigor, estivesse mais em sintonia com as necessida- des pastorais de hoje. O motu proprio Ecclesiae Sanctae (06/08/1966) deu novas normas que tornavam mais fácil a passagem de um clérigo de uma diocese para outra, normas que foram integradas substancialmente pelo CIC de 1983. Podemos, portanto, afirmar que o instituto da incardina- ção não representa um fato acidental, mas pode ser de- finido como um vínculo jurídico estável que cada clérigo tem com uma concreta porção do povo de Deus, para ela dedicar-se (servir) sob a autoridade do bispo dioce- sano (ou equivalente). Isso implica uma pertença a esta Igreja em nível jurídico, afetivo e espiritual e a obrigação do serviço ministerial. A normativa relativa à incardinação dos clérigos encon- tra-se no CIC nos cânn. 265-272. Na nota de roda pé do cân. 265, elaborada pelo Pe. Jesus Hortal, encontra-se a explicação etimológica da palavra, como, também, a sua definição jurídica. 9) Indulgências – é de fundamental importância sublinhar, logo de início, que as indulgências possuem um caráter de intercessão que a Igreja eleva em favor dos fiéis em- penhados nos exercícios de penitência. A Igreja se sen- te co-envolvida na situação daqueles que, após terem recebido o perdão das culpas, estão, agora, expiando as conseqüências, históricas e concretas, dos pecados cometidos. Isso vale, também, para as dolorosas conse- qüências que os pecados produzem em nós. A confissão das culpas e o perdão que recebemos no sacramento da penitência, são, apenas, o primeiro passo, pois, em seguida, devemos percorrer um caminho que consisti- rá em neutralizar os efeitos dos pecados cometidos. A 35© Caderno de Referência de Conteúdo indulgência, entendida como intercessão da Igreja em favor dos fiéis que se empenham nos exercícios de pe- nitência entra justamente aqui. Desde as suas origens a Igreja sempre acompanhou com as suas orações estes esforços dos fiéis e é nesta perspectiva que se desen- volverá na idade média a oração ligada às indulgências. Hoje é impensável um discurso sobre as indulgências sem vinculá-las aos méritos da obra redentora de Cristo. Podemos, então, como definição, afirmar que as indul- gências são uma invocação dirigida a Deus, para que se mostre magnânimo no confronto com o pecador e o cure com o seu amor, libertando-o das resistências interiores e exteriores, que o fazem ainda depender do pecado, e dando a ajuda necessária para que possa ressarcir os da- nos pelosquais é responsável, abrindo-se, assim, para uma vida nova a ser construída. 10) Liturgia: a Constituição Sacrosanctum Concilium nos diz que a Liturgia é tida como o exercício do múnus sacerdo- tal de Jesus Cristo, no qual, mediante sinais sensíveis, é significada e, de modo peculiar a cada sinal, realizada a santificação do homem; e é exercido o culto público in- tegral pelo Corpo Místico de Cristo, Cabeça e membros. Disto se segue que toda a celebração litúrgica, como obra de Cristo sacerdote, e de Seu Corpo que é a Igre- ja, é uma ação sagrada por excelência, cuja eficácia, no mesmo título e grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja (SC 7). 11) Ministro ordinário e ministro não ordinário - O primei- ro é aquele a quem compete por ofício administrar os sacramentos, como, por exemplo, o bispo e o pároco. O segundo é aquele que sucede o ministro ordinário em casos de necessidade, por faculdade ou por delegação, como seria o caso, por exemplo, do diácono quando as- siste ao matrimônio. 12) Ministro sacro: o cân. 1008 nos recorda que por institui- ção divina, graças ao sacramento da ordem, alguns entre os fiéis, pelo caráter indelével com que são assinalados, são constituídos ministros sagrados, isto é, são consa- grados e delegados a fim de que, personificando a Cristo © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 36 Cabeça, cada qual em seu respectivo grau, apascentem o povo de Deus, desempenhando o múnus de ensinar, santificar e governar. No direito canônico, ministro sacro ou sagrado é, portan- to, aquele que recebeu o sacramento da ordem a qual, por sua vez, possui três graus: episcopado, presbiterato e diaconato (cân. 1009). No direito canônico os ministros sagrados são chamados de clérigos (cân. 207). Todavia, convém esclarecer que todo sacerdote é um ministro sagrado ou clérigo, mas nem todo ministro sagrado é sacerdote, como é o caso do diácono. 13) Missio canonica: esta expressão possui, também, alguns significados e, portanto, é preciso se ater ao contexto no qual aparece. No caso, por exemplo, do exercício do múnus de ensinar nas universidades e faculdades eclesi- ásticas, o legislador foca a sua atenção na figura dos pro- fessores, pois têm a grande responsabilidade de exer- citar o ministério da palavra de Deus. Por isso, devem ser mestres da fé para os estudantes, testemunhas vivas da verdade evangélica e modelos de fidelidade à Igreja. Devem, por conseguinte, distinguir-se pela honestidade de vida, integridade de doutrina e dedicação ao traba- lho (SCH art. 26 §1). Aqueles professores que ensinam matérias relativas à fé e à moral devem desenvolver esta função em plena comunhão com o magistério autêntica da Igreja, em particular, do Papa. Por conseguinte, ne- cessitam receber a missio canonica do Grão Chanceler, após terem emitido a profissão de fé e o juramento de fi- delidade, para poderem lecionar, pois o seu ensinamen- to é realizado não em nome e por autoridade própria, mas em nome e pela autoridade da Igreja. Neste caso, a missio canonica é um encargo formal para ensinar teologia naquela específica universidade ou fa- culdade eclesiástica. Tal encargo é dado por escrito e aquele que o recebe contribui, assim, para a realização da função de ensinar da Igreja (cân. 807) em matéria te- ológica (dogmática, sagrada escritura, moral, direito ca- nônico, etc.). 37© Caderno de Referência de Conteúdo 14) Motu proprio: o Romano Pontífice exerce o seu magisté- rio recorrendo a uma variedade de documentos. Aque- les documentos papais que contém a expressão "motu proprio" indicam que foram escritos por iniciativa pesso- al dele e com a sua própria autoridade. 15) Munus docendi, sanctificandi e regendi – como é sabido o atual ordenamento jurídico da Igreja possui profundas raízes na reflexão do Concílio Vaticano II. Este Concílio deu muita importância à distinção entre as três fun- ções (munera) de Cristo e da Igreja (ensinar, santificar e governar), resumindo em torno delas toda a missão de Cristo e da Igreja. Por isso o CIC atual, inspirado pelo Vaticano II, quis mostrar, com os dois livros que fazem referência à função de ensinar (livro III) e santificar (livro IV), a intrínseca relação que existe entre a matéria por eles regulada e a missão salvífica da Igreja. Uma referência importante para compreender estas três funções é a constituição dogmática Lumen gentium, par- ticularmente no capítulo III em que se ocupa da consti- tuição hierárquica da Igreja e em especial do episcopa- do, nos números 25 a 27 e, também, no capítulo IV em que se ocupa dos leigos, mencionando explicitamente a participação deles no múnus sacerdotal (nº 34), pro- fético (nº 35) e régio (nº36) de Cristo. A leitura de tais números é suficiente para uma adequada compreensão destes três múnus. 16) Pena irrogada ou declarada: a Igreja ao perseguir o seu fim sobrenatural, a salvação das pessoas, além do poder legislativo, executivo (administrativo) e judiciário pos- sui, também, um poder coativo, pois possui o direito e o dever de tutelar o bem público através da constituição, aplicação e remissão das penas. O resultado do exercício desta faculdade é o direito penal, isto é, o complexo das normas com as quais a Igreja exercita e regula a faculda- de punitiva e que se encontra contido no livro VI e em parte do livro VII (cânn. 1717-1731) do CIC latino. A Igreja quando constitui as penas exercita o poder le- gislativo (emanando leis penais) ou administrativo (ema- nando preceitos penais). Já quando aplica as penas, © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 38 exercita o poder judiciário (caso utilize um processo judi- cial) ou, então, executivo ou administrativo (caso utilize um processo administrativo). Por fim, quando remite as penas a Igreja se vale do poder executivo ou administra- tivo. Uma peculiaridade do ordenamento canônico é o insti- tuto das penas latae sententiae. A sua origem se perde na primeira metade da Idade Média, embora sua inter- pretação nem sempre seja clara. É recorrente na Igreja a discussão sobre a oportunidade ou não de conservá-lo. Existem razões a favor e contra tal instituto. O fato é que o CIC atual dá preferência pelas penas ferendae senten- tiae, mas não renunciou às penas latae sententiae, tor- nando mais rigorosa a sua aplicação. A pena é latae sententiae quando configurada de modo tal que nela se incorre pelo simples fato de se cometer um determinado delito, sem a necessidade de qualquer intervenção da autoridade competente. Como diz o ter- mo, trata-se de uma pena que decorre de uma sentença já emanada pelo legislador no momento em que consti- tui a pena, seja por lei ou preceito. A pena é ferendae sententiae quando requer a interven- ção do Superior ou do juiz que a irroga por decreto ou sentença após ter sido cometido o delito. Caso não haja a intervenção da autoridade, a pena não é aplicada. O princípio geral é que na maioria das vezes a pena é ferendae sententiae e, portanto, deve constar expressa- mente na lei quando se tratar de pena latae sententiae. No caso de dúvida deve sempre se considerar a pena como ferendae sententiae, pois a interpretação é estrita (cân. 18). Diante do exposto podemos esclarecer, agora, os dois termos. A pena é irrogada quando é imposta pela inter- venção do Superior ou do juiz. Faltando tal intervenção a pena não é aplicada. A pena é declarada quando a pessoa nela incorre pelo simples fato de ter cometido o delito, cabendo ao Superior ou juiz apenas declarar o fato e não impor pena alguma, pois isso a norma já o fez. Evidentemente que no direito penal da Igreja existem 39© Caderno de Referência de Conteúdo circunstâncias que mitigam ou agravam a pena, mas não é o caso de disso nos ocuparmos aqui. 17) Sacramental, sacramentais – tendo por referência a SC 60, o catecismo da Igreja Católica apresenta os sacra- mentais da seguinte forma: "A santa mãe Igreja instituiu os sacramentais, que são sinais sagradospelos quais, à imitação dos sacramentos, são significados efeitos prin- cipalmente espirituais, obtidos pela impetração da Igre- ja. Pelos sacramentais os homens se dispõem a receber o efeito principal dos sacramentos e são santificadas as diversas circunstâncias da vida" (nº 1667). Nos números seguintes (1668-1673) encontramos os traços caracterís- ticos dos sacramentais e as suas diversas formas. 18) Salus animarum: o ordenamento jurídico da Igreja, as leis e os preceitos, como, também, os direitos e deveres que dele derivam devem sempre estar em consonância com o fim sobrenatural da Igreja: a salvação das pesso- as (salus animarum). É certo que nem todas as normas jurídicas são dadas diretamente para fomentar a busca de tal fim sobrenatural ou para favorecer a cura pasto- ral. Todavia, é necessário que todas elas, sem exceção, estejam sempre em harmonia com o fim sobrenatural de todos os homens. Não é à toa que o último cânon do CIC atual nos chama justamente a atenção para este dado básico, afirmando que na Igreja a salvação das al- mas (pessoas) deve ser sempre a lei suprema. 19) Válido e lícito – as diversas leis em geral não tornam nulo o ato contrário a elas. Trata-se de um princípio de res- peito do legislador pela liberdade das pessoas que são chamadas a respeitar as leis com uma adesão consciente e livre. Caso a pessoa aja contra a lei viola um princípio jurídico, agindo, portanto, ilicitamente. Porém, tal ato de um ponto de vista jurídico não é nulo, isto é, não deixa de produzir os seus efeitos. Todavia, há casos ou situa- ções em que o legislador reage a determinados compor- tamentos ilegítimos de modo mais severo, declarando inválido o ato realizado de modo contrastante com aqui- lo que foi estabelecido pela lei ou por uma pessoa inábil. Veja-se, por exemplo, os cânn. 1108 e 656. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 40 As leis que prevêem a nulidade do ato quando não rea- lizado em conformidade com o que estabelece a lei são chamadas de irritantes ou inabilitantes. Tais leis são ne- cessárias para evitar lides, abusos de poder, prepotên- cias, incertezas e situações perigosas para a moralidade e garantir a certeza do direito. Em matéria de liturgia, o termo "validade" nos remete para o conceito de eficácia. O ato válido é eficaz por- que produz os seus efeitos. Válido e eficaz coincidem. O efeito substancial é o de modificar a situação jurídica precedente, ou seja, recebido validamente o batismo ou ordem ou sendo dado um consentimento matrimonial válido, o sujeito resulta batizado, ordenado, casado. A situação jurídica precedente muda. A eficácia do ato depende da pessoa que o realiza em conformidade com o que foi fixado pela lei. O vínculo matrimonial deriva do consentimento dos cônjuges ma- nifestado conforme os cânones. Já o batismo de crianças e os efeitos que dele derivam se dão pela fé da Igreja na qual são batizados. Não se pode afirmar, então, que o batismo é administrado sem a fé. Segundo o cân. 124 §1, válido é o ato que possui todos os elementos essenciais e que foi realizado na observância das formalidades e dos requisitos impostos pelo direito. O cân. 841 afirma que aprovar e definir os requisitos de validade dos sacramentos compete apenas à suprema autoridade da Igreja, ou seja, ao Papa (cân. 331) e ao Colégio Episcopal (cân. 336). Isto porque os sacramentos pertencem ao depósito da fé. Para a sua interpretação é necessário ater-se aos princípios dogmáticos. Já para os aspectos de liceidade na celebração, administração e recepção, possuem competência as Conferências Epis- copais e os Bispos diocesanos (cân. 838 §§ 3-4). 20) Vigário geral, vigário episcopal: diferentemente do CIC de 1917, o vigário geral é um ofício de constituição obri- gatória na diocese (cân. 475). Enquanto que a figura do vigário geral já aparece no século XI para definir-se no século XIV como aquele que faz às vezes do Bispo, o vi- gário episcopal nasce com o Concílio Vaticano II (cf. CD 41© Caderno de Referência de Conteúdo 27ª). Tanto o vigário geral quanto o vigário episcopal de- vem ser sacerdotes, são livremente nomeados pelo Bis- po diocesano e não podem ser consangüíneos dele até o quarto grau. Possuem uma potestade ordinária, vicá- ria, administrativa (cânn. 476; 479), mas não legislativa ou judiciária. Trata-se, portanto, de um ofício de caráter eminentemente pastoral. Como regra geral o CIC estabelece que seja constituído um só vigário geral, a não ser que a extensão da dioce- se, o número de moradores ou outras razões pastorais aconselhem diversamente (cân. 475 §2). Podem, ao con- trário, ser constituídos um ou mais vigários episcopais que tenham em determinada parte da diocese, ou em determinada espécie de questões, ou quanto aos fiéis de determinado rito ou de certa classe de pessoas, o mesmo poder ordinário que compete ao vigário geral por direito universal (cân. 476). Portanto, em razão de seu ofício, o vigário geral possui a potestade executiva em toda a diocese (cân. 479 §1), ao passo que o vigário episcopal possui, ipso iure, a mesma potestade execu- tiva, mas circunscrita ao território, ou aos assuntos, ou às pessoas a ele confiadas (cân. 479 §2), exceto as cau- sas que o Bispo tenha reservado a si ou ao vigário geral, ou que, pelo direito, exijam mandato especial do Bispo (cân. 479 §2). Cabem também ao vigário geral e ao vigário episcopal, no âmbito da própria competência, todas as faculdades habituais concedidas ao Bispo diocesano pela Santa Sé, como, também, a execução dos rescritos, salvo haja de- terminação expressa em contrário ou tenha sido esco- lhida a própria competência pessoal do Bispo diocesano (cân. 479 §3). O vigário geral e o vigário episcopal são considerados no CIC como ordinários do lugar no sentido do cân. 134 §§ 1-2. A potestade dos vigários é uma participação limitada da potestade do ofício principal que é o do Bispo diocesa- no (cân. 479 §1). Os vigários possuem um poder ordi- nário (enquanto anexo a um ofício – cân. 131 §1), pró- © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 42 prio (apenas no sentido que existe um âmbito de poder atribuído pelo próprio direito ao ofício que ocupam) e vicário (pela estreita conexão com as funções e as com- petências próprias do Bispo diocesano). Os vigários agem enquanto titulares de um ofício, o qual consiste em cooperar com o ofício principal. O ofício principal não perde os seus poderes cedendo-os aos vi- gários, mas estes dele participam de modo subordina- do. Não há, desta forma, uma descentralização do poder com a perda dos poderes por parte do ofício principal, mas uma participação subordinada neste poder. Portan- to, a natureza vicária desta potestade deve ser entendi- da no sentido de que não poderia existir sem se referir de modo subordinado ao ofício principal. A cessação do ofício de vigário é ligada a várias circuns- tâncias: término do mandato, renúncia, remoção, trans- ferência, morte, sede vacante. 21) Vigário judicial: o vigário judicial faz as vezes do Bispo na área da administração da justiça, quer no julgamento das causas, quer no governo do tribunal, neste caso com funções administrativas em âmbito judicial (estabelecer os turnos dos juízes, confiar as causas a cada turno, dar a permissão para que a causa matrimonial seja introduzi- da no foro do demandante ou das provas, etc.). O vigário judicial forma com o Bispo um único tribunal (cân. 1420 §2), embora tenha a liberdade para julgar, como qual- quer outro juiz. Por isso, não é possível apelar ao Bispo contra as decisões do vigário judicial e nem apresentar a ele recursos contra eventuais decisões do Bispo. O ofício de vigário judicial é autônomo e independente em relação ao vigário geral, pois são esferas diferentes de atuação. O primeiro atua em âmbito judicial e o se- gundo em âmbito executivo ou administrativo. 22) Viático - é a comunhão dada àquelas pessoas que se encontram em perigo iminente de perdera vida, cons- tituindo-se, portanto, em um auxílio espiritual de gran- de relevância para os que estão prestes a partir deste mundo. 43© Caderno de Referência de Conteúdo 23) Voto: o voto é uma promessa deliberada e livre de um bem possível e melhor, feita a Deus, para ser cumprido em razão da virtude da religião (cân. 1191). O voto é pú- blico, quando aceito pelo superior legítimo em nome da Igreja; caso contrário é privado. Este termo é importan- te, particularmente quando se estuda a vida religiosa. Nos institutos religiosos os conselhos evangélicos são necessariamente assumidos mediante votos públicos, pois o instituto religioso para ser tal comporta, acima de tudo, o vínculo dos votos. Esquema dos Conceitos-chave Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais im- portantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um Es- quema dos Conceitos-chave da disciplina. O mais aconselhável é que você mesmo faça o seu esquema de conceitos-chave ou até mesmo o seu mapa mental. Esse exercício é uma forma de você construir o seu conhecimento, ressignificando as informações a partir de suas próprias percepções. É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações en- tre os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais complexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você na ordenação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino. Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende- -se que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esquemas e mapas mentais, o indivíduo pode construir o seu co- nhecimento de maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pe- dagógicos significativos no seu processo de ensino e aprendiza- gem. Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem es- colar (tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas em Educação), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda, © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 44 na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que es- tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos conceitos e de proposições na estrutura cognitiva do aluno. Assim, novas ideias e informações são aprendidas, uma vez que existem pontos de ancoragem. Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa, ape- nas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é preci- so, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se configure como uma aprendizagem significativa. Para isso, é importante con- siderar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos concei- tos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma vez que, ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cog- nitivas, outros serão também relembrados. Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é você o principal agente da construção do próprio conhecimento, por meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tor- nar significativa a sua aprendizagem, transformando o seu conhe- cimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja, estabele- cendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo (adaptado do site disponível em: <http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapascon- ceituais/utilizamapasconceituais.html>. Acesso em: 11 mar. 2010). 45© Caderno de Referência de Conteúdo Nucleóide e citoplasma com poucas organelas Microscópio óptico Descoberta da célula: Robert Hooke Neurônio e Células da Glia OS SACRAMENTOS CIC 1983 CCEO 1990 Os sacramentos de iniciação cristã Os sacramentos de cura Batismo, Confirmação e Eucaristia Penitência e Unção dos Enfermos Os sacramentos do serviço: O ministro O Sujeito passivo: quem recebe o sacramento Aspectos teológico- jurídicos fundamentais A celebração Estrutura comum no estudo canônico dos sacramentos Ordem e Matrimônio Síntese dogmática e implicâncias canônicas Matéria e forma; Tempo e lugar Ordinário, Extraordinário Validade Liceidade Intenção, habilidade jurídica e preparação. Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave da disciplina Direito Canônico II. Como você pode observar, esse Esquema dá a você, como dissemos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais im- portantes deste estudo. Ao segui-lo, você poderá transitar entre um e outro conceito desta disciplina e descobrir o caminho para construir o seu processo de ensino-aprendizagem. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 46 O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambien- te virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como àqueles relacionados às atividades didático-pedagógicas realiza- das presencialmente no polo. Lembre-se de que você, aluno EaD, deve valer-se da sua autonomia na construção de seu próprio co- nhecimento. Questões Autoavaliativas No final de cada unidade, você encontrará algumas questões autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertativas. Responder, discutir e comentar essas questões, bem como relacioná-las com a prática do ensino da Teologia pode ser uma for- ma de você avaliar o seu conhecimento. Assim, mediante a reso- lução de questões pertinentes ao assunto tratado, você estará se preparando para a avaliação final, que será dissertativa. Além disso, essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua prática profissional. As questões de múltipla escolha são as que têm como respos- ta apenas uma alternativa correta. Por sua vez, entendem-se por questões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos matemáticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada, inalterada. Já as questões abertas dissertativas obtêm por res- posta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado; por isso, normalmente, não há nada relacionado a elas no item Gabarito. Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus colegas de turma. Bibliografia Básica É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus es- tudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as bibliogra- fias apresentadas no Plano de Ensino e no item Orientações para o estudo da unidade. 47© Caderno de Referência de Conteúdo Figuras (ilustrações, quadros...) Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte inte- grante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustra- tivas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no texto. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os con- teúdos da disciplina, pois relacionar aquilo que está no campo vi- sual com o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual. Dicas (motivacionais) O estudo desta disciplina convida você a olhar, de forma mais apurada, a Educação como processo de emancipação do ser humano. É importante que você se atente às explicações teóricas, práticas e científicas que estão presentes nos meios de comunica- ção, bem como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois, ao compartilhar com outras pessoas aquilo que você observa, per- mite-se descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a ver e a notar o que não havia sido percebido antes. Observar é, portanto, uma capacidade que nos impele à maturidade. Você, como aluno do curso de Graduação na modalidade EaD, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente. Para isso, você contará com a ajuda do tutor a distância, do tutor presencial e, sobretudo, da interação com seus colegas. Sugeri- mos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas. Éimportante, ainda, que você anote as suas reflexões em seu caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas pode- rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ- ções científicas. Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discu- ta a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoau- las. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 48 No final de cada unidade, você encontrará algumas questões autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas, pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure- cimento intelectual. Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores. Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a esta disciplina, entre em contato com seu tutor. Ele estará pronto para ajudar você. 1 EA D Os Sacramentos em Geral 1. OBJETIVOS • Analisar o conjunto dos principais aspectos teológicos e jurídicos dos sacramentos, globalmente considerados, bem como de alguns aspectos jurídicos específicos. • Identificar a normativa relativa aos sacramentos em geral e que precede a disciplina dos sacramentos em especial. 2. CONTEÚDOS • Apresentação geral do livro IV do CIC atual. • Aspectos teológicos e jurídicos fundamentais dos sacra- mentos em geral. • Aspectos jurídicos específicos relativos aos elementos que compõem os sacramentos. • Os cânones preliminares da normativa sacramental do CIC atual. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 50 3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que você leia as orientações a seguir: 1) Nesta unidade achamos por bem fazer um pequeno apanhado dos principais aspectos teológico-jurídicos relativos aos sacramentos em geral, pois consideramos de fundamental importância tê-los presente, antes do estudo da normativa de cada sacramento em particular. 2) Na distribuição da matéria relativa aos sacramentos e contida no livro IV do CIC o legislador adotou uma sis- temática inspirada nos textos conciliares e, justamente por isso, sugerimos que você esteja atento a essas fontes indicadas ao longo do texto. 3) É importante, também, compreender a noção de sacra- mento, seus elementos essenciais, sua eficácia, sua di- mensão eclesial e jurídica. 4) No estudo da normativa reveste-se de particular impor- tância a análise dos cânn. 840-848, pois alguns deles contêm os pressupostos doutrinais de toda a legislação canônica nesta matéria. Particular destaque merece o cân. 844 que traduz em termos disciplinares os princí- pios que inspiram as relações ecumênicas relativas aos sacramentos. O cânon é importante porque mostra a es- treita ligação que existe entre a comunhão eclesial e a comunhão sacramental. 5) Por fim, sugerimos que não deixe de consultar a biblio- grafia indicada no final da unidade, pois contém algumas indicações de leitura que ajudam a completar as infor- mações disponibilizadas neste material de apoio que, como você bem sabe, é apenas um instrumento para facilitar um caminho que lhe cabe percorrer. 4. INTRODUÇÃO À UNIDADE Nesta primeira unidade, você será convidado a refletir sobre o conjunto dos principais aspectos teológicos e jurídicos dos sacra- 51© Os Sacramentos em Geral mentos, globalmente considerados, bem como sobre alguns as- pectos jurídicos específicos. Esta visão constituirá uma espécie de "pano de fundo" para uma adequada compreensão da normativa canônica dos sacramentos, da qual nos ocuparemos nas unidades subsequentes. Além disso, você será inserido no estudo da norma- tiva relativa aos sacramentos em geral e que precede a disciplina dos sacramentos em especial. No final desta unidade, você terá um horizonte de compre- ensão que lhe permitirá identificar aqueles elementos essenciais para uma correta compreensão do direito sacramental da Igreja. Vamos lá? 5. APRESENTAÇÃO GERAL DO LIVRO IV DO CIC ATUAL Antes de estudarmos a normativa relativa aos sacramentos, é importante que você saiba onde ela se encontra. Por esse mo- tivo, dedicaremos este espaço para uma breve apresentação do livro IV do Código de Direito Canônico atual (CIC), dedicado à fun- ção de santificar da Igreja, pois é, especialmente, nele que você irá encontrar o direito sacramental da Igreja latina. Todavia, saiba você que existe um direito litúrgico, presente de modo especial nos livros litúrgicos, o qual também contém diversas disposições sobre a liturgia e os sacramentos, mas dele não nos ocuparemos nesta disciplina. Na sistemática adotada pelo CIC, o livro IV é dedicado à fun- ção de santificar da Igreja. Dividido em três partes compreende 419 cânones assim distribuídos: 1) 06 cânones introdutórios de caráter geral que tratam da função de santificar própria da Igreja (cânn. 834-839). 2) 326 cânones sobre os sacramentos assim agrupados: a) os sacramentos em geral (cânn. 840-848); b) o batismo (cânn. 849-878); c) a confirmação (cânn. 879-896); © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 52 d) a santíssima Eucaristia (cânn. 897-958); e) a penitência (cânn. 959-997); f) a unção dos enfermos (cânn. 998-1007); g) a ordem (cânn. 1008-1054); h) o matrimônio (1055-1165); 3) 39 cânones sobre os outros atos do culto divino assim divididos: a) os sacramentais (cânn. 1166-1172); b) a liturgia das horas (cânn. 1173-1175); c) as exéquias eclesiásticas (cânn. 1176-1185); d) o culto dos santos, imagens sagradas e relíquias (cânn. 1186-1190); e) o voto e o juramento (cânn. 1191-1204); 4) 48 cânones sobre os lugares e tempos sagrados (cânn. 1205-1253). Informação Complementar ––––––––––––––––––––––––––––– Toda esta vasta matéria anteriormente elencada foi recolhida sob o título De Ec- clesiae munere sanctificandi, que veio substituir o termo res, utilizado pelo CIC de 1917 como título para o livro III, o qual compreendia, além dos cânones rela- tivos à função de santificar da Igreja, aqueles que tratavam dos bens temporais (livro V do CIC atual) e da função de ensinar da Igreja (livro III do CIC atual). Con- vém lembrar que o termo res é de derivação romana (persone, res, actiones) e no CIC anterior indicava tudo aquilo que se distinguia das pessoas e dos processos. Por este motivo é que o livro III da legislação anterior era pouco homogêneo e suscitou muitas críticas. Não resta dúvida que do ponto de vista eclesiológico a nova sistemática do CIC atual é muito mais expressiva. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– É bom que você saiba que o livro IV não reúne toda a disci- plina relativa à função de santificar da Igreja, pois encontramos alguns cânones coligados com o múnus de santificar, embora em escala bem menor, nos livros I, II, III e V do CIC. Isto revela que a função de santificar ocupa um lugar central na vida da Igreja. Em poucas palavras e de maneira resumida, podemos afirmar que o livro IV do CIC, atento à inteira realidade eclesial, coloca em des- taque a índole sagrada e orgânica desta mesma realidade e como nela é exercitada a função de santificar. 53© Os Sacramentos em Geral Nesta disciplina, o nosso foco estará voltado exclusivamen- te para um tema essencial no estudo da função de santificar: os sacramentos. Portanto, nos ocuparemos dos cânones que tratam: 1) dos sacramentos em geral (cânn. 840-848); 2) do batismo (cânn. 849-878); 3) da confirmação (cânn. 879-896); 4) da santíssima Eucaristia (cânn. 897-958); 5) da penitência (cânn. 959-997); 6) da unção dos enfermos (cânn. 998-1007); 7) da ordem (cânn. 1008-1054); 8) e do matrimônio (1055-1165). Isso porque, como há pouco indicado, a normativa contida no livro IV é muito extensa e não temos como esgotá-laaqui. Além disso, mesmo permanecendo no âmbito do nosso tema, não será feita uma análise exaustiva de cada cânon, pois não é o propósito desta disciplina e nem teríamos espaço para uma abordagem do tipo exegética. Limitaremo-nos aos principais aspectos da norma- tiva, dentro de uma visão panorâmica, porém, suficiente. Feitas essas considerações iniciais a respeito dos conteúdos do livro IV e do nosso objetivo, iremos tocar, agora, em alguns sub- -temas que servem como um apoio importante para a compreen- são daquilo que constitui o objeto de estudo desta disciplina. O título do livro IV O título do livro IV do CIC possui as suas raízes na reflexão do Concílio Vaticano II. Este Concílio deu muita importância à distin- ção entre as três funções (munera) de ensinar, santificar e gover- nar, resumindo em torno delas toda a missão de Cristo e da Igreja. O CIC atual, inspirado pelo Concílio Vaticano II, quis mostrar, com os dois livros que fazem referência à função de ensinar (livro III) e santificar (livro IV), a intrínseca relação que há entre a matéria por eles regulada e a missão salvífica da Igreja. © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 54 A função de santificar possui um significado amplo: significa tanto "tornar-nos santos" e, nesse sentido, faz-se referência àque- la parte da liturgia que atinge este objetivo em benefício das pes- soas (movimento descendente), quanto "glorificar Àquele que é santo" e, nesse sentido, faz-se referência ao culto divino como tal, isto é, ao serviço humano apresentado a Deus (movimento ascen- dente). Teologicamente, as duas partes não estão justapostas, mas cada uma delas é necessária à verdade cristã da outra. Coerente com esta perspectiva o CIC procura dar uma visão unitária seja da liturgia, evitando reduzi-la a um conjunto de leis e rubricas, seja do direito dos sacramentos, do qual nos ocuparemos nesta disciplina. O livro IV e o Concílio Vaticano II O livro IV do CIC recebeu um grande influxo do Concílio Vati- cano II e da reforma litúrgica por ele desejada. A renovação resulta evidente se compararmos os caracteres fundamentais do CIC de 1917 em matéria litúrgica com o CIC atual. INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR ––––––––––––––––––––––– No CIC de 1917 o direito litúrgico baseava-se na reforma pós-tridentina, confir- mada e afirmada pelo Vaticano I. Dentre as características principais, destaca- mos: a) a centralização litúrgica (somente a Santa Sé podia regular e aprovar os livros litúrgicos); b) a uniformidade litúrgica; c) a exclusão de adaptação às várias culturas e assembleias; d) o rubricismo. Por isso, não sem razão, os críticos afirmavam que o direito litúrgico de então tinha se desenvolvido à margem da te- ologia e da pastoral, limitando-se a conservar determinadas práticas tradicionais. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A normativa litúrgica do Concílio Vaticano II apresenta ca- racterísticas novas em relação àquela anterior. O conceito de litur- gia, de uma inspiração teológica vasta e profunda, é, ao mesmo tempo, cristológico e eclesiológico. A referência fundamental para compreendermos tal conceito está nas constituições Sacrosanc- tum Concilium (SC) e Lumen Gentium (LG). INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR ––––––––––––––––––––––– A SC no nº7 descreve a liturgia com as seguintes palavras: Com razão, pois, a Liturgia é tida como o exercício do múnus sacerdotal de Jesus Cristo, no qual, mediante sinais sensíveis, é significada e, de modo peculiar a 55© Os Sacramentos em Geral cada sinal, realizada a santificação do homem; e é exercido o culto público inte- gral pelo Corpo Místico de Cristo, Cabeça e membros. Disto se segue que toda a celebração litúrgica, como obra de Cristo sacerdote, e de Seu Corpo que é a Igreja, é uma ação sagrada por excelência, cuja eficácia, no mesmo título e grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja. À luz desta definição se compreende como a liturgia não possa ser reduzida às "rubricas" que regulam as celebrações, nem possa ser considerada imutável ou uniforme a ponto de não permitir a participação ativa dos fiéis e a adaptação às diversas culturas. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O livro IV do CIC assumiu os grandes princípios que inspiraram a reforma do Concílio Vaticano II e que os resumimos em nove: 1) A centralidade da liturgia e o seu primado na vida da Igreja. 2) A unidade inseparável entre santificação e culto como duas faces de uma mesma realidade. 3) O reconhecimento da comunidade eclesial inteira como sujeito da função de santificar enquanto que esta se ma- nifesta e é exercitada nas ações litúrgicas. 4) A afirmação da necessária relação entre fé e liturgia, fundamental para que seja vivida a verdade dos sacra- mentos e estimulada a ação pastoral. 5) O caráter público das ações litúrgicas, acentuando-se a participação ativa de todos os membros da Igreja. 6) A afirmação da dimensão comunitária das celebrações litúrgicas. 7) A atribuição de poder às Conferências Episcopais e ao Bispo em matéria litúrgica. 8) O reconhecimento implícito do princípio de adaptação e de inculturação da liturgia, salva, porém, a unidade que não pode de forma alguma ser prejudicada. 9) A harmonização dos outros meios com os quais a Igre- ja satisfaz a função de santificar (oração pessoal, obras de penitência e caridade, exercícios de piedade) com a liturgia. Confrontada com aquela do CIC de 1917 a legislação litúr- gica renovada a partir do Concílio Vaticano II não aparece mais uniforme e imutável. O reconhecimento de um adequado espaço © Direito Canônico II Centro Universitário Claretiano 56 às legítimas diversidades e adaptações aos vários grupos étnicos, às regiões e aos povos (SC 38-40) abriu o caminho para o direito li- túrgico particular que aos poucos adquirirá uma importância cada vez maior. Portanto, é inegável que o CIC pôde dar a sua contribui- ção para uma renovação da liturgia ao menos naquela parte que depende do direito. 6. ASPECTOS TEOLÓGICOS E JURÍDICOS FUNDAMEN- TAIS DOS SACRAMENTOS EM GERAL O CIC não desenvolve de maneira articulada e completa uma teologia dos sacramentos, pois não é esta a função de um texto nor- mativo. Contudo, a pressupõe e dela faz derivar importantes direti- vas disciplinares. Sendo assim, é necessário conhecê-la um pouco. Sugestão de leitura –––––––––––––––––––––––––––––––––– Todo estudo dos sacramentos em especial deve ser precedido de uma visão geral da sacramentária. Muitas vezes se reduz o sacramental aos sete sacra- mentos, esquecendo-se de que tais sinais estão inseridos em uma realidade sacramental bem mais profunda. Para se interar do assunto, sugerimos que você leia a obra: Borobio, Dionisio. Celebrar para viver: liturgia e sacramentos da Igre- ja. São Paulo: Loyola, 2009, p. 103-144. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Noção de sacramento Os sacramentos do Novo Testamento são "sinais e meios pe- los quais se exprime e se robustece a fé, se presta culto a Deus e se realiza a santificação dos homens" (cân. 840). Esta noção está em clara sintonia com o conteúdo do cân. 834 no qual aparece a noção de liturgia. Nela e, portanto, nos sacramentos, se significa e realiza a santificação dos homens, se presta culto a Deus e se expressa e fortalece a fé. Informação Complementar –––––––––––––––––––––––––––– Na noção de sacramento oferecida pelo cân. 840 encontramos uma sólida teolo- gia, fruto de séculos de experiência cristã. Este cânon tem como fonte o Decreto para os armenos, do Concílio de Florença do ano 1439 (DS 1310-1327), os câ- 57© Os Sacramentos em Geral nones do Concílio de Trento sobre os sacramentos (DS 1601-1613) e, também, o ensinamento do Concílio Vaticano II que nos abriu uma nova síntese entre realismo e simbolismo sacramental (SC 59 e 61). Para explorar um pouco mais o conteúdo desta noção veja o seguinte texto: HORTAL, J. Os sacramentos da Igreja na sua dimensão canônico-pastoral. São Paulo:
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