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LINFEDEMA PÓS MASTECTOMIA Jaqueline Munaretto Timm Baiocchi Sumário CAPÍTULO 1. LINFEDEMA PÓS TRATAMENTO DO CÃNCER DE MAMA. CAPÍTULO 2. AVALIAÇÃO DO LINFEDEMA CAPÍTULO 3. FISIOTERAPIA COMPLEXA DESCONGESTIVA CAPÍTULO 4. NOVAS TERAPÊUTICAS CAPÍTULO 1 – LINFEDEMA PÓS TRATAMENTO DO CÂNCER DE MAMA _____________________________PONTOS-CHAVE_______________________________ • Linfonodectomia axilar, radioterapia adjuvante, obesidade e infecções são os maiores fatores de risco para o linfedema pós-mastectomia; • Prevalência de fisioterapia pós linfonodectomia axilar: 20%; • Prevalência de fisioterapia pós linfonodectomia axilar mais radioterapia adjuvante: 34%; • Prevalência após biópsia do linfonodo sentinela: 5%; • Realizar fisioterapia no primeiro ano de pós-operatório reduz a chance de ter linfedema em 78%; • Musculação não causa linfedema; pelo contrário, melhora o quadro; • Sensação de peso no braço que não melhora com o repouso pode ser sinal de linfedema subclínico; • A terapia sistêmica e/ou hormonioterapia não são consideradas fatores de risco para a ocorrência de linfedema; • Viajar de avião, medir pressão no membro, se expor ao calor e carregar peso não causam linfedema; • O tratamento padrão ouro para o linfedema é a Fisioterapia Complexa Descongestiva; • Novas terapêuticas vem sendo propostas para serem associadas ao tratamento do linfedema: pressoterapia, laserterapia, terapia por ondas de choque e autovestimentas. Nas últimas décadas, houveram extraordinários avanços no tratamento do câncer de mama, tanto na cirurgia como nos tratamentos adjuvantes entretanto o linfedema continua sendo mais temida e frequente complicação após o tratamento oncológico. A cirurgia é uma das principais formas de tratamento do câncer e na presença de disseminação linfática do tumor, é realizado a linfonodectomia, ou seja, retirada de toda cadeia linfática de drenagem para onde o tumor drena. Atualmente entre 30% a 50% das pacientes ainda necessitarão de linfonodectomia axilar clássica como parte do tratamento cirúrgico. Uma vez realizada a remoção dos linfonodos, os principais coletores linfáticos que ali desembocam ficam sem o caminho para dar continuidade à drenagem linfática. A ausência dos linfonodos gera uma obstrução do sistema linfático, levando a uma sobrecarga funcional do sistema linfático onde o volume da linfa excede o seu transporte pelos coletores e absorção pelos capilares. O linfedema nem sempre surge logo após a cirurgia, pode aparecer meses ou anos depois. Isto justifica-se pela retirada dos linfonodos regionais e pela retração cicatricial pós-cirúrgica e pós radioterapia, gerando lesão dos vasos linfáticos ou linfonodos e bloqueio do fluxo linfático. O linfedema também pode ser causado por invasão tumoral dos gânglios linfáticos, aderências cicatriciais, infecções, obesidade e envelhecimento. As estimativas de incidência e prevalência do linfedema relacionados ao câncer de mama variam consideravelmente na literatura devido à falta de uma padronização dos critérios diagnósticos, procedimentos de medição, limitações metodológicas dos estudos, juntamente com variações das populações e de duração dos acompanhamentos pós-operatórios. No geral, a prevalência do linfedema varia entre 9 e 40%, sendo 24% a 49% após mastectomia, 4 a 28% após a tumorectomia com dissecção axilar e 5 a 34% após cirurgia e radioterapia. Se fizermos um cálculo baseado nas estimativas de câncer de mama no Brasil cerca de 3 mil a 5 mil pacientes ao ano com câncer de mama desenvolverão linfedema. A abordagem axilar do primeiro nível dos linfonodos axilares já pode acarretar risco de linfedema, devido à maior rede linfática estar localizada nesse nível. O risco aumentado pode também ser observado em estudos que compararam a ocorrência de linfedema em mulheres submetidas à biópsia do linfonodo sentinela (BLS). Porém, a BLS tem apresentado risco significativamente menor (aproximadamente 5%) de ocorrência de linfedema quando comparado à linfonodectomia axilar. A radioterapia também desempenha um fator de risco associado ao linfedema. Ela não foi fator de risco para o linfedema quando realizada após ressecção segmentar da mama ou no plastrão, mas sim se realizada nas cadeias de drenagem. A terapia sistêmica e/ou hormonioterapia não são consideradas fatores de risco para a ocorrência de linfedema3. Figura 1: Anatomia do sistema linfático da mama Fonte: Krasnow A.Z., Elgazzar A.H., Kazem N., Alenezi S.A. (2015) Lymphoscintigraphy. In: Elgazzar A. (eds) The Pathophysiologic Basis of Nuclear Medicine. Springer, Cham CAPÍTULO 2 –AVALIAÇÃO DO LINFEDEMA Primeiramente, o linfedema se apresenta como uma sensação de peso ou aperto, podendo não existir edema visível. Com sua progressão, pode se tornar evidente, com ou sem prejuízo funcional. O acúmulo intersticial de proteínas plasmáticas e a insuficiência da atividade proteolítica promovem fibrose, impedindo a regressão do linfedema. A progressão do linfedema cursa com intensificação dessas fibroses e liposubstituição, fazendo com que a capacidade de transporte da linfa fique ainda mais reduzida. A inspeção do linfedema é feita através de um pinçamento com o polegar e o dedo indicador para verificar se há aumento da espessura da pele e observação dos contornos das proeminências ósseas. No teste de Godet ou Cacifo, o examinador realiza uma pressão com o polegar na região edemaciada durante alguns segundos para verificar a quantidade de líquido que é deslocado. Quanto maior é o deslocamento do líquido, menor é a fibrose tecidual Figura 2: Teste de Godet ou sinal de cacifo positivo Os métodos de avaliação disponíveis são: bioimpedância, tonometria, linfocintilografia, tomografia computadorizada, ressonância nuclear magnética, linfografia, linfofluoroscopia e ultrassonografia. Para a avaliação quantitativa utilizamos a perimetria manual, volumetria por deslocamento de água e volumetria optoeletrônica. O método mais utilizado na prática clínica pela sua praticidade é a perimetria. Para isso pontos equidistantes são marcados nos membros bilateralmente. O diagnóstico é feito através dos valores das circunferências correspondentes com diferença maior que 2 cm do membro afetado em dois pontos ou mais, equivalente ao do membro contralateral. Os valores de corte para linfedema de membro superior mais aceitos na literatura são acima de 200ml ou 10% de diferença do membro afetado em relação ao controle. Considera-se linfedema leve uma diferença < 3 cm, moderado de 3 a 5 cm e severo acima de 5 cm. Figura 3: Perimetria do membro superior. O linfedema apresenta quatro estágios cujo quadro clínico de progressão é confuso devido a falta de consistência nas definições e dos métodos de avaliação na literatura. De acordo com a ISL International Society of Lymphology, o linfedema tem 4 graus, conforme tabela abaixo: Estágio 0: condição latente ou sub-clínica. O paciente refere sensação de peso, mas o inchaço não é ainda evidente. Pode existir meses ou anos antes do aparecimento do linfedema. Estágio 1: há pouco edema tecidual, com aparente depressão na palpação, sem fibrose e reversível espontaneamente com degravitação dos membros. Apresenta fluído com presença de proteínas. Pode aparecer o sinal de cacifo ou Godet. Estágio 2: irreversível espontaneamente, onde o tecido apresenta uma consistência mole e edema sem depressão. Pode apresentar sinais de fibrose Estágio 3: engloba elefantíase linfostática com alterações tróficas, como fibrose intensa, acantose e deposição de gordura. Figura 4: Linfedema grau 1, 2 e 3 respectivamenteCAPÍTULO 3 – FISIOTERAPIA COMPLEXA DESCONGESTIVA O padrão ouro de tratamento de linfedema é a Fisioterapia Complexa Descongestiva que é composta por cuidados com a pele, drenagem linfática manual, bandagem compressiva multicamadas e exercícios miolinfocinéticos. Estes componentes devem ser realizados conjuntamente e eventualmente podem sofrer alguma modificação na sua aplicação dependendo do quadro clínico do paciente. Se realizados separadamente o resultado pode mostrar-se ineficaz. O tratamento é dividido em duas fases. A primeira etapa é uma fase intensiva, denominada descongestiva, onde a frequência do tratamento é maior, podendo ser diária ou em dias alternados. O objetivo é a maior redução do volume do membro possível. Tem duração de 2 a 8 semanas. Na segunda fase, após o desaparecimento do edema palpável, obtém-se a fase de manutenção, onde o paciente deve conter o volume retirado com compressão elástica apropriada e manter os cuidados com a pele e os exercícios miolinfocinéticos. Fase 1 Fase 2 Drenagem linfática manual Drenagem linfática manual (menor frequência) Enfaixamento multicamadas Uso de braçadeira ou meias compressivas Pressoterapia Cuidados com a pele Cuidados com a pele Exercícios miolinfocinéticos Exercícios miolinfocinéticos Pressoterapia (manutenção) Drenagem linfática Manual (DLM) O objetivo global da DLM no tratamento do linfedema é traçar nova rota do fluxo de líquido linfático estagnado em torno de áreas bloqueadas e direcionar para vasos linfáticos saudáveis, que drenam para o sistema venoso. Nos linfedemas de membro superior, é necessário reencaminhar o fluxo de líquido estagnado no interstício em direção aos linfonodos axilares do lado oposto. Para isso utilizamos as vias de interanastomoses axilo- axilar anterior e posterior e interanastomose axilo-inguinal e as vias derivativas cefálica e posterior. A drenagem linfática manual deve começar de proximal para distal e deve ser feita lenta e suavemente. A DLM não é capaz de disseminar o tumor e criar mestástases. É um procedimento seguro a ser feito em pacientes com câncer e mesmo nas pacientes com linfedema metastático. Figura 5: Caminhos alternativos de drenagem pós linfonodectomia axilar. Figura 6: Figura ilustrativa das vias derivativas de drenagem, cefálica e posterior respectivamente Bandagens multicamadas As fibras teciduais elásticas da pele estão danificadas no membro linfedematoso, portanto, são incapazes de oferecer resistência suficiente no membro favorecendo o acúmulo de líquido no espaço intersticial. A aplicação de compressão externa compensa essa insuficiência elástica, aumentando a pressão do tecido e também aumenta o retorno venoso e linfático, melhorando a função das válvulas nestes vasos. O aumento da pressão fornecida por compressão do tecido externo reduz a quantidade de fluido que sai dos capilares sanguíneos para o instertício e aumenta o retorno de fluidos intersticial de volta para os capilares sanguíneos e linfáticos, reduzindo assim a quantidade de fluido nos tecidos. Outro fator importante para o retorno linfático e venoso é o movimento muscular e articular. A compressão da bandagem multicamadas fornece uma força contrária à musculatura, ou seja quando o músculo se contrair contra um superfície pouco elástica, o tecido não cederá e aumentara assim a eficiência de drenagem linfática. A isso chamamos de pressão de trabalho. As bandagens devem ser aplicadas sobrepostas na horizontal ou escama de peixe. A sobreposição das camadas inelasticas somam-se formando um tecido mais rígido, chegando a pressões mais elevadas, necessárias para reabsoração do linfedema, porém sem causar garroteamento. Por baixo das camadas de bandagens, usamos uma malha tubular e espumas de diferentes espessuras para proteção de proeminências ósseas e uniformização da pressão no membro. O enfaixamente deve ser trocado de 2 a 5 x na semana conforme a necessidade Figura 7: Enfaixamento compressivo multicamadas Exercícios miolinfocinéticos Exercícios miolinfocinéticos são exercícios que visam maximizar os efeitos de drenagem propiciados normalmente pelas bombas musculares, articulares e respiratórias. O fluxo de linfa através dos vasos linfáticos é auxiliado pela ação mecânica dos músculos, articulações e alguns órgãos. Quando um músculo se contrai ele aperta o vaso linfático massageando-o. Desse modo os exercícios miolinfocinéticos agem diretamente sobre as estruturas linfáticas, estimulando a motilidade do sistema linfático. Os exercícios são escolhidos para favorecer a drenagem da região afetada pelo linfedema e em função das limitações apresentadas pelo paciente. Exercícios que estimulam uma boa contração muscular são bem vindos. Diversos exercícios de musculação, pilates, yoga, tai chi entre outras técnicas são bons exercícios miolinfocinéticos. Vale lembrar que o levantamento de peso de forma lenta e progressiva não tem efeito deletério sobre o linfedema, pelo contrário, resulta em redução dos sintomas e maior resistência muscular. Figura 11: Exercícios miolinfocinéticos Cuidados com a pele Os cuidados diários com a pele são essenciais. Medidas higiênicas e dietéticas melhoram o aspecto da pele prevenindo infecções bacterianas (erisipelas) e micoses. Para isso deve-se lavar bem os membros com água e sabão neutro, limpar bem as dobras e pregas cutâneas, hidratar bem a região e manter o peso ideal través de uma dieta balanceada. O paciente deverá ser sempre orientado quanto o que pode ou não fazer. Orientações para pacientes com linfedema O que fazer: • Usar sempre suas vestimentas compressivas • Use sabonetes neutros ou hipoalergênicos • Manter o peso ideal • Usar luvas de borracha nos serviços domésticos • Usar luvas de borracha quando for trabalhar no jardim • Cuidar com queimaduras quando for cozinhar • Manter a pele saudável, bebendo água e usando hidratantes neutros. Pele ferida ou machucada é porta de entrada para erisipela. • Usar vestimentas compressivas quando viajar de avião ou longas viagens de carro. • Fazer exercícios físicos usando suas vestimentas compressivas, elas ajudam no retorno linfático. • Na praia ou piscina, cubrir o membro afetado com linfedema com uma toalha molhada gelada • Usar protetor solar • Secar bem todas as dobras de pele e entre os dedos O que não fazer: • Cuidar com mordidas de insetos. Usar repelente. • Para depilação, usar barbeador elétrico e não lâminas ou ceras. • Não fazer exercícios físicos de forma extenuante. • Cuidar para não sofrer arranhões ao brincar com animais de estimação • Não tomar soro ou injeções no lado afetado • Não colher sangue para exames no lado afetado • Evitar temperaturas acima de 38,7 graus • Evitar fumar e consumir bebidas alcóolicas CAPÍTULO 4 - NOVAS TERAPÊUTICAS Compressão Pneumática Intermitente (CPI) Também conhecida como pressoterapia ou luvas pneumáticas, a CPI é um recurso valioso para ser associado na TFC. Essa terapêutica é descrita como parte integrante da TFC por diversos consensos para o tratamento do linfedema. A pressoterapia é um aparelho de drenagem linfática mecânica que tem uma luva inflável e através do enchimento e esvaziamento cíclico das câmaras de ar, realiza continuamente a drenagem linfática mecânica no paciente. Os primeiros modelos na década de 50, tinham vestimentas com uma única câmara, o que acabava por gerar uma única pressão em todo o membro e se mostrava ineficaz e maléfica ao sistema linfático. Atualmente as vestimentas são multicâmaras, variando entre 3 a 21 células interligadas. As máquinas podem vir com um gradiente de pressão pré determinado, ou pode ser ajustado pelo terapeuta. Deve–se graduar a pressão de forma decrescente em 20% de distal para proximal. Se o equipamento não possuir o modo pré terapia, o fisioterapeuta deve iniciar o processo com DLM, priorizando as vias de interanastomoses proximaos. O fisioterapeuta deve estar atento para a formação do anel fibroso em raiz de membro. Figura 10: Pressoterapia marca Lympha Press modelo braço e jaqueta Laserterapia A laserterapia de baixa potência, ou laser terapêutico empregados na fisioterapia possui um comprimento de onda entre de 630 e 904 nanômetros por isso, não são considerados cancerígenos ou ionizantes e podem ser feitos com total segurança. O mecanismo do laser no corpo humano se dá quando parte da luz é absorvida pelo tecido gerando um fenômeno fotobiológico na célula que promove ações analgésicas, anti- inflamatórias, anti-edematosas, anti-fibronolíticas e de reparação tecidual. O sucesso da terapia com laser em baixa intensidade dependerá do cálculo ideal da dose a ser irradiada e dos parâmetros do laser. O número de sessões é variável, podendo ser diariamente ou semanalmente. Figura 11: Laserterapia (DMC) e ledterapia (Cosmedical) Autovestimentas As autovestimentas são vestimentas confeccionadas com tecido pouco elásticos, onde as propriedades do tecido assemelham-se às das bandagens. A paciente é orientada a usar o máximo de tempo possível, inclusive dormir com elas. Existem alguns modelos disponíveis comercialmente com cadarços, velcros ou zíperes. Esse tipo de vestimenta traz mais funcionalidade, autonomia e qualidade de vida, visto que podem ser lavadas e retiradas para tomar banho e a paciente consegue se auto-tratar. Figura 12: Modelo Linfavest da Absoluta Medical. Terapia por ondas de choque A terapia extracorpórea por ondas de choque (TOC) é definida como uma terapia alternativa não invasiva onde uma onda mecânica sonora caracterizados por alta pressão de pico seguido de uma diminuição até a pressão atmosférica é capaz de causar mecanotransdução nos tecidos biológicos. Evidências apontam que a aplicação da terapia por ondas de choque estimula a angiogênese, a linfangiogênese, é fibrinolítica e melhora da elasticidade da pele. Figura 13: Aplicação de ondas de choque (KLD sistemas)
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