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PROJETO EDITORIAL Lucia Maria Sá Antunes Costa PROURB- Programa de Pós-graduação em Urbanismo FAUjUFR] Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa em Paisagismo CooRDENAÇÃO EDITORIAL Marta Mosley Editora Viana & Mosley CAPA E PROJETO GRÁFICO Leonardo Ventapane Patrícia Façanha Rafael Cazes IMAGEM DA CAPA Leonardo Venta pane- still de vídeo DIAGRAMAÇÃO E ARTE FINAL Larissa Averbug Rafael Secim REVISÃO DE TEXTO Lilian Dias APOIO ~APERJ ViANA & MOSLEY Editora Av. Ataulfo de Paiva, 1.079 I sala 704 Leblon- Rio de Janeiro CEP: 22440-034 Diretor Comercial: Richard Mosley Te! I Fax: 21-2540-8571 E-mail: vmeditora@globo.com www.vmeditora.com.br prourb~ Programa de Pós-graduação em Urbanismo FAUIUFRJ Av. Reitor Pedro Calmon, sln- Prédio da FAU- Reitoria- 5• andar- sala 521 Cidade Universitária- Rio de Janeiro, R) - 21941.590 Coordenação: Prof. Denise Barcellos Pinheiro Machado Te!: (55.21) 2598-1990 Fax: (55.21) 2598-1991 e-mail: prourb@fau.ufrj.br www.fau. ufrj. br lprourb Rios e paisagens urbanas em cidades brasileiras I Lúcia Maria Sá Antunes Costa (org.).- Rio de Janeiro : Viana & Mosley: Ed. PROURB, 2oo6. 192 p.: i!.; 20 x 24 em. Inclui bibliografia. ISBN 85-88721-38-4- r. Arquitetura paisagística. 2. Urbanismo. 3· Cidades e vilas - Brasil. 4- Rios. I. Costa, Lúcia Maria Sá Antunes. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Programa de Pós-Graduação em Urbanismo. CDD: 7n RIO DE RO PROURB - FAU- UFRJ 2006 Entre a paisagem o rio fluía como uma espada de líquido espesso. A cidade é fecundada_ por aquela espada que se derrama "O Cão sem Plumas" João Cabral de Melo Neto ÍNDICE RIOS URBANOS E O DESENHO DA PAISAGEM Lucia Maria Sá Antunes Costa 9 VIVER ÀS MARGENS DOS RIOS: UMA ANÁLISE DA SITUAÇÃO DOS MORADORES DA fAVELA PARQUE UNIDOS DE ACARI Ana Lucia Britto e Victor Andrade Carneiro da Silva 17 MAPEAMENTO AMBIENTAL E PAISAGÍSTICO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS URBANAS: ESTUDO DE CASO DO RIO CARIOCA Mônica Bahia Schlee, Ana Luiza Coelho Netto e Kenneth Tamminga 33 A PAISAGEM DA BORDA: UMA ESTRATÉGIA PARA A CONDUÇÃO DAS ÁGUAS, DA BIODIVERSIDADE E DAS PESSOAS Paulo Renato Mesquita Pellegrino, Paula Pinto Guedes, Fernanda Cunha Pirillo e Sávio Almeida Fernandes 57 A FLUVIALIDADE EM RIOS PAULISTAS Jorge Hajime Oseki e Adriano Ricardo Estevam 77 RIBEIRÃO PRETO: OS VALORES NATURAIS E CULTURAIS DE SUAS PAISAGEM URBANAS Alessandra Soares Ghilardi e Cristiane Rose de Siqueira Duarte 95 A FORMAÇÃO HISTÓRICA DAS PAISAGENS DO RIO CAPIBARIBE NA CIDADE DO RECIFE Vera Mayrink I2I o RIO SANHAUÁ E A CIDADE DE JOÃO PESSOA Flaviana Vieira Raynaud I4/ A PAISAGEM DO RIO RIO ITAJAÍ-AÇU NA CIDADE DE BLUMENAU Soraia Loechelt Porath e Sonia Afonso r63 BELÉM, CIDADE DAS ÁGUAS GRANDES Cristóvão Fernandes Duarte I77 RIOS URBANOS E O DESENHO DA PAISAGEM INTRODUÇÃO Existem muitas maneiras de falarmos sobre cidades. Elas são uma das materializações mais complexas da inteligência e da imaginação huma- nas, e portanto apresentam múltiplas possibili- dades de abordagem2 • Este livro fala de algumas cidades brasileiras a partir da paisagem de seus rios urbanos. Em cada capítulo, os autores bus- cam observar uma cidade tendo seus rios como ponto de partida, trazendo questionamentos, indagações e observações que ampliam o nosso entendimento sobre os valores e significados dos rios urbanos no Brasil. O livro tem como objetivo principal a divulgação de um conjunto representativo de estudos sobre rios urbanos em cidades brasileiras, enfocando as relações entre rios, cidades e suas populações sob diferentes perspectivas. Os capítulos apresentados buscam reunir fundamentos e métodos em Paisagismo, Arquitetura e Urbanismo que possam contribuir para a valorização dos recursos hídricos em ambientes urbanos, reconhecendo ainda o enfoque interdisciplinar inerente ao tema. Lucia Maria Sá Antunes Costa Paisagem, país foito de pensamento da paisagem, na criativa distância espacitempo, à margem de gravuras, documentos, quando as coisas existem com violência mais do que existimos: nos povoam e nos olham, nos fixam. Contemplados, submissos, delas somos pasto, somos a paisagem da paisagem. Carlos Drummond de Andrade1 As contribuições dos autores se dão a partir de alguns desdobramentos principais. Inicialmente, explorando e conectando diferentes possibilidades de leitura da paisagem fluvial urbana, como plane- jamento ambiental, ecologia da paisagem, estudos culturais, história das cidades e fenomenologia, demonstram a riqueza da abordagem interdisci- plinar nos estudos sobre a paisagem. Segundo, e a partir destas conexões, contribuem para o enten- dimento do conceito de paisagem- com ênfase na paisagem fluvial urbana- enquanto um processo, que participa ativamente na construção de nossa visão de mundo3. E finalmente, ao iluminar os rios como foco principal de uma leitura da paisagem da cidade, ressaltam a imagem poética trazida por Carlos Drummond de Andrade: os rios, enquanto paisagem, "nos povoam e nos olham, nos fixam''. _ RlDS E PAW~lGENS URBANH~L 9 RIOS URBANOS O menino tinha certeza de que havia nascido no dia em que viu o rio. (. .. ) O menino amou o rio pois acreditou que o rio havia também nascido no dia em que ele o viu. Ziraldo 4 Como as cidades habitam os rios? É muito antiga a relação de intimidade que se estabelece entre rios e cidades brasileiras. Muitas das cidades coloniais surgiram inicialmente às margens dos rios - mesmo aquelas situadas em baias ou à beira-mar5• É, portanto, a partir de rios - grandes, médios, ou ainda pequenos cursos d'água- que muitos núcleos urbanos brasileiros vão surgir. Os rios tinham muito a oferecer, além de água: controle do território, alimentos, possibilidade de circulação de pessoas e bens, energia hidráulica, lazer, entre tantos outros. E desta forma as paisagens fluviais foram paulatinamente se transformando também em paisagens urbanas. A complexidade das relações entre rios e cida- des brasileiras são abordadas ao longo dos capítu- los a partir de suas congruências e contradições. Veremos que rios são importantes corredores bio- lógicos que permitem a presença e a circulação da flora e fauna no interior das cidades. Veremos também que eles são espaços livres públicos de grande valor social, propiciando oportunidades de convívio coletivo e lazer que atendem aos mais diversos interesses. E veremos também que olhar para as relações entre cidades e rios a partir de sua bacia hidrográfica nos permite expandir e entrela- çar suas dimensões culturais e ambientais. Esta relação de intimidade entre rios e cidades brasileiras, entretanto, não tem se dado sem con- flitos. Veremos que os rios tem tido suas margens ocupadas por habitações informais ou irregulares, e suas águas transformadas em coletores de lixo e de esgoto doméstico e industrial. Ao longo dos anos, cidades e rios tem travado muitos embates, principalmente através de enchentes periódicas. Cidades invadindo as águas, e águas invadindo as cidades - situações pendulares, cíclicas, geradas a partir de antigos conflitos entre os sistemas da cultura e os sistemas da natureza. Seja cruzando a cidade ou passando ao lar- go dela, é muito difícil para um rio, principal- mente os pequenos rios e córregos, atravessar um tecido urbano. A base desta dificuldade se situa, de um modo geral, principalmente numa visão dos rios enquanto estrutura de saneamen- to e drenagem urbanas. Os conflitos entre pro- cessos fluviais e processos de urbanização tem sido de um modo geral enfrentados através de drásticas alterações na estrutura ambiental dos rios, onde, em situações extremas, chega-se ao desaparecimento completo dos cursos d'água da . b 6 paisagem ur ana . Certamente estas questões não se dão apenas entre os rios das cidades brasileiras7. Sabemos que idéias, modelos e gestos projetuais circulam internacionalmente,e as experiências relaciona- das às inserções paisagísticas dos rios urbanos não seriam uma exceção. Porém, enquanto alguns dos valores atribuídos aos rios podem ser observa- dos em muitas outras cidades ao redor do mundo, outros são mais específicos, e se relacionam com a história e a cultura do lugar. Voltamos, então, à questão: como as cidades habitam os rios? Habitar é construir, como ar- gumenta Norbeg-Schulz a partir de Heidegger, é tornar-se um com a paisagem e com os atri- butos do lugar8. É quando a intervenção huma- na, no seu processo de construção, e portanto de transformação de mundo, revela e valoriza ainda mais os significados e os atributos da paisagem, tornando-os visíveis. Por este enfoque, muito de nossos rios ainda estão por ser habitados. Não te- mos olhado para eles como o menino na estória 10 _ f<IOS E PAISAGENS URBANAS de Ziraldo que, ao olhar para o rio, descobriu-o, descobrindo também a si mesmo. Reconhecer o rio como paisagem, portanto, é habitar o rio. Desenho da paisagem Cada cidade, em seu habitat paisagístico, estabelece um ambiente ecológico e cultural único em si mesmo (. .. ) 9 Lawrence Halprin Paisagem e cidade estão destinadas a uma per- manente relação de cumplicidade. Em um texto seminal, o arquiteto paisagista Lawrence Halprin argumenta que as cidades mais interessantes são aquelas que deixam esta cumplicidade transpa- recerw. A nossa experiência da paisagem urbana se enriquece quando a complexidade do sítio pai- sagístico se faz presente na forma e no desenho da cidaden. Já sabemos da importância da água desenhando a paisagem, em suas diversas escalas. Neste con- texto, a compreensão do papel dos cursos d'água é de fundamental importância. Os rios, córregos e riachos são os caminhos das águas doces que buscam um nível mais baixo de repouso. E des- ta forma vão desenhando seu percurso em linha ao sabor da topografia, conectando montanhas e planícies, florestas e mares, conectando enfim di- ferentes fisionomias paisagísticas. O rio é assim uma estrutura viva, e portanto mutante. É principalmente uma estrutura fluida, que pela sua própria natureza se expande e se re- trai, no seu ritmo e tempo próprios. Ocupa tanto um leito menor quanto um leito maior, em fun- ção do volume sazonal de suas águas. Ao fluir, seu percurso vai riscando linhas na paisagem, como um pincel de água desenhando meandros, arcos e curvas. O rio traz o sentido de uma maleabilidade primordial no desenho da paisagem. Esta maleabilidade deve encontrar uma corres- pondência no desenho da paisagem urbana, para que o rio possa vibrar na cidade. Portanto, é básico considerar propostas projetuais a partir das quais o tecido urbano que tem o privilégio de receber um curso d'água possa participar desta qualidade, que é um dos atributos da paisagem fluvial. Por este motivo, já sabemos que não é mais aceitável pensar em retificar um rio, revestir seu leito vivo com calhas de concreto, e substituir suas margens vegetadas por vias asfaltadas, como uma alternativa de projeto para sua inserção na paisa- gem urbana. Estas propostas, que tinham como uma de suas bases conceituais a busca do controle das enchentes urbanas, são muito criticadas não só pela fragilidade sócio-ambiental no resultado final do projeto, como também pela pouca eficiên- cia no controle destas mesmas enchentes'2 • No adensamento do espaço construído, os rios trazem uma outra importante contribuição para a experiência urbana: como espaços livres de edifi- cações, ampliam a possibilidade de fruição da pai- sagem da cidade. O que se pode ver de um rio? Ele nos permite ver uma água que corre, o céu, as nu- vens, as estrelas. Ele nos traz a perspectiva de um horizonte longínquo, ou o desejo do outro lado da margem, ou mesmo ainda sua fabular "terceira margem'', como nos conta Guimarães Rosa'3. O desenho da paisagem fluvial urbana na esca- la do pedestre que favorece esta fruição inclui pos- sibilidades de caminhar ao longo do rio e de ter acesso físico à água. Permite ainda atravessar para a outra margem, onde as pontes que trazem um outro ritmo ao seu percurso são também como terraços que nos permitem observar os horizon- tes urbanos estando sobre a água. E já discutimos anteriormente como visibilidade e acesso público aos rios urbanos e suas margens, além de conec- _ tividade com os demais corpos d'água que com- põem a rede hidrográfica, são critérios de desenho importantes para valorizar sua dimensão ambien- tal e cultural'4 . Desenhar a paisagem urbana a partir das águas dos rios que cruzam ou bordeiam a cidade é, por- Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce Tainara Realce l tanto, um desafio e uma oportunidade privilegia- da. Os autores que contribuem para este livro, em- bora tragam abordagens distintas para diferentes cidades brasileiras, apresentam muitos pontos em comum. Entre estes, deixam claro que compreen- der o rio urbano como paisagem é também dar à ele um valor ambiental e cultural que avança na idéia de uma peça de saneamento e drenagem. É reconhecer que rio urbano e cidade são paisagens mutantes e com destinos entrelaçados. Cidades brasileiras Ao apresentar um breve conteúdo das contri- buições dos autores separadamente, é preciso também ressaltar outro aspecto da relevância do conjunto destes textos. Sua leitura vai nos reve- lando lentamente o grande valor do patrimônio cultural, ambiental e paisagístico que representa a paisagem fluvial urbana nas cidades no Brasil. Ana Lucia Britto e Victor Silva iniciam a dis- cussão sobre rios e paisagem urbana em cidades brasileiras, apresentando uma situação que se dá não apenas na cidade do Rio de Janeiro, mas também em muitas outras cidades no Brasil: a apropriação das faixas marginais de proteção por ocupações irregulares e favelas. Os autores dis- cutem relação entre pobreza e riscos ambientais apresentando a complexidade dos elos que se es- tabelecem entre o rio Acari e sua população ribei- rinha: inundações, lixo, esgoto, mau cheiro, do- enças. Argumentam que a situação só irá mudar quando forem tomadas medidas que reconheçam o rio e sua várzea inundável como uma única uni- dade ambiental. E ressaltam que a recuperação dos recursos hídricos precisa estar necessaria- mente atrelada a uma política habitacional para população de baixa renda. Ainda com o enfoque na cidade do Rio de Ja- neiro, Monica Schlee, Ana Luiza Coelho Neto e Kenneth Tamminga apresentam um diagnóstico a partir do mapeamento sócio-ambiental do rio de maior importância histórica para a cidade: o rio Carioca, hoje parcialmente oculto da paisagem urbana. Ressaltando a importância da bacia hidro- gráfica como recorte para análises ambientais e paisagísticas, os autores propõem uma metodolo- gia de caráter interdisciplinar para avaliar a trans- formação da paisagem ao longo da bacia e seus efeitos na qualidade ambiental urbana local. Os re- sultados encontrados apontam que, quanto maior a transformação da paisagem conforme os padrões de urbanização existente, mais intensos e negati- vos são os efeitos da qualidade ambiental local. A bacia hidrográfica é também o ponto de par- tida do capítulo apresentado por Paulo Pellegrino, Paula Guedes, Fernanda Pirillo e Sávio Fernandes para o córrego Bananal, pertencente à bacia do rio Cabuçu de Baixo, no município de São Paulo. Eles discutem um programa de recuperação ambiental e da paisagem, visando principalmente a redução ou eliminação das inundações. Os autores salien- tam o importante papel dos espaços abertos urba- nos, livres de edificações, para a exploração de um novo paradigma para a drenagem das águas, que alia a melhoria da qualidade de vida urbana à me- lhoria das condições ambientais. A metodologia utilizada para a apresentação de uma proposta de infra-estrutura verde inclui o planejamentoam- biental, ecologia da paisagem, corredores verdes urbanos, e alagados construídos. Para uma avaliação das paisagens fluviais da ci- dade de São Paulo, Jorge Oseki e Adriano Estevam trazem o conceito de mediância. Partindo de uma breve descrição do sítio paisagístico da cidade e dos processos de urbanização que desembocaram na inserção paisagística de seus rios e córregos, os autores discutem as propostas de cunho higie- nista, as fases de canalizações e das avenidas de fundo de vale, e as experiências dos reservatórios de amortecimento nas bacias hidrográficas urba- nas, discutindo com detalhes as propostas para a sub-bacia do rio Aricanduva. Os autores ressaltam a gradativa perda da relação entre a cidade e seus '12 _FHDS PAISAGENS tmBANAS rios urbanos e argumentam sobre a importância de se propor uma nova apropriação social para as paisagens fluviais urbanas, superando a visão quantitativa das engenharias. Uma ênfase no valor social dos rios, principal- mente como espaços livres públicos de lazer, é uma das questões discutidas por Alessandra Ghilardi e Cristiane Duarte no estudo sobre o Ribeirão Preto, principal rio na cidade de mesmo nome situada no estado de São Paulo. Neste capítulo, as autoras fazem uma apresentação da evolução urbana da cidade, ressaltando as diferentes intervenções e projetos visando a inserção do rio no tecido urba- no. Mostram que o rio vai perdendo importância à medida que as intervenções sobre seu curso vão acontecendo, visando conter as enchentes perió- dicas. Ao avaliar os diferentes usos ao longo do Ribeirão Preto, concluem argumentando que o lazer é um dos valores mais importantes que a po- pulação local atribui ao rio, apesar de sua situação ambiental degradada. A partir de uma outra perspectiva, V era Mayrink apresenta o rio Capibaribe, na cidade do Recife, através das representações de sua paisagem retratadas em mapas, poemas, relatos de viajantes e outros documentos, desde sua fundação até os dias de hoje. Reconhecendo o rio enquanto paisagem cultural, a autora argumenta que os diferentes grupos sociais, a partir de sua maneira de ver o mundo, nos trazem várias representações da paisagem do Capibaribe, contribuindo assim para um melhor entendimento das relações entre a população e o rio. Aponta a importância do rio na fundação da cidade, constituindo um dos elementos mais marcantes de sua paisagem urbana. Finalizando, a autora pergunta, a partir de uma relação contraditória com o rio, qual tem sido o significado do rio Capibaribe para a população do Recife. Flaviana Raynaud nos traz também uma avalia- ção de um rio de importância histórica, local de fundação da cidade: o rio Sanhauá, em João Pes- soa. Olhando para o trecho do rio no bairro de Va- radouro, local de fundação da cidade, a autora nos mostra como, a partir do momento em que foram abertas as relações viárias de João Pessoa com o mar, a cidade foi aos poucos de desvinculando do rio. Desta forma, o local, antes uma viva e impor- tante área de comércio, foi tornando-se esquecido e desvalorizado. A paisagem ribeirinha foi sendo ocupada por comunidades carentes, e as edifica- ções históricas foram recebendo novos usos. A au- tora ressalta que este processo de abandono resul- tou numa degradação ambiental e urbanística com grandes prejuízos para a cidade como um todo. O rio Itajaí-Açu e sua participação fundamen- tal na construção da paisagem pública da cidade de Blumenau, em Santa Catarina, é a contribui- ção trazida por Soraia Porath e Sonia Afonso. As autoras destacam a importância da navegabilida- de fluvial e acesso à água para a escolha do sítio de implantação da cidade, fundada por imigran- tes alemães. A partir de então, a cidade vai se es- truturar a partir da topografia e do rio. Os lotes são demarcados em relação ao rio, para permitir acesso à água. Avaliando as grandes e sucessivas enchentes, as autoras também argumentam que a bacia hidrográfica deve ser o principal recorte de análises ambientais, e ressaltam a importân- cia de um desenho da paisagem urbana que au- mente o contato da população com as margens dos rios, de modo a valorizá-las. E finalmente, o livro apresenta a leitura de Cris- tóvão Duarte sobre a paisagem líquida da cidade de Belém do Pará, situada na foz do rio Amazo- nas, numa estratégica posição de posse e controle daquela parte do território brasileiro. O autor nos mostra que, ao patrimônio edificado de Belém, junta-se na construção de sua paisagem cultural a imensidão das águas que a cercam e a emoldu- ram, e que também deságuam sobre ela em chu- vas torrenciais que comandam a vida cotidiana da cidade. Tantos rios, tanta água, que ele argumenta - que água e cidade se misturam em constante es- tado de transição. E, para avançar nesta imagem, Cristóvão nos fala de uma Belém submersa e re- nascente a partir de uma chuva que diariamente renova a paisagem mutante da cidade. H!DS PAISf4GENS UmlANAS~ 13 Tainara Realce HoRIZONTEs Esta paisagem? Não existe. Existe espaço vacante, a semear de paisagem retrospectiva somos a paisagem da paisagem. Carlos Drummond de Andrade'' Esperamos que este livro seja um indutor de novos encaminhamentos e debates em torno da inserção paisagística e urbanística dos rios urba- nos em cidades brasileiras. Os capítulos que se se- guem não apenas discutem experiências passadas e suas repercussões na paisagem, mas principal- mente sugerem caminhos a serem experimenta- dos na busca do nosso relacionamento com pai- sagens fluviais urbanas. Neste sentido, podemos dizer que este é um livro otimista, que traz uma visão prospectiva, destacando o quanto ainda há por fazer para que possamos apreender a riqueza do sítio paisagístico a partir do desenho da pai- sagem. Como nos lembra o poeta Carlos Drum- d d A d d . . ,r6 mon e n ra e: "a paisagem vai ser . Para o sonhador de paisagens, desenhar com a água é sempre uma aventura transformadora, traz a dinâmica de um devir. Este livro portanto espera abrir novas janelas, sugerir aberturas metodológi- cas de projeto paisagístico e urbanístico, provocar novos horizontes. A água, na sua mutante primor- dialidade, permite múltiplos desenhos. Figura 1 -foto Carlos Murad NoTAS r- A ANDRADE, Carlos D. de. "Paisagem: como se faz''. In As Impurezas do Branco, Rio de janeiro: José Olympio Ed., 1974, pg46. 2- Ver LYNCH, Kevin. Good City Form. Mass.: The MIT Press, !980. 3- Ver CORNER, )ames (ed) Recovering Landscape: essays in Contemporary Landscape Architecture. New York: Princeton Architectural Press, 1999; 4- ZIRALDO. Menino do Rio Doce. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1996, sjp. 5- Ver, por exemplo, REIS, Nestor G. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. São Paulo: EDUSPjFAPESP, 2000. 6- Ver, por exemplo, BARTALINI, Vladimir. "Os córregos ocultos e a rede de espaços públicos urbanos". In Revista do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAUUSP, W r6, 2004, pp. 82-96. 7- Ver, por exemplo, MANN, Roy. Rivers in the City. New York: Praeger Publishers, 1973: PENNING-ROWSELL, Edmund & BURGESS, jaquelin. "River landscapes: changing the concrete overcoat?" In Landscape Research, Vol. 22, N°I, 1997, pp. 5 a n; ou ainda RILEY, Ann L. Restoring Streams in Cities: a guide for planners, policymakers and citizens. Washington D.C.: Island Press, 1998. 8- NORBERG-SCHULZ, Christian. Genius Loci: Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. 9- HALPRIN, Lawrence. "The collective perception of cities: we reflect our urban landscapes". In Taylor, L. (ed) Urban Open Spaces. Londres: Academy Ed., 1981, pp-4-6. IO· Ibid. n-Este argumento, inicialmente levantado pelo arquiteto paisagista McHARG, Ian. Design with Nature. Washington D.C: The Conservation Foundation, 1967, foi posteriormente retomado e elaborado por outros arquitetos paisagistas. Ver, por exemplo, SPIRN, A.W. The Granite Garden: urban natureand human design. New York: Basic Books, 1984, ou ainda HOUGH, M. Cities and Natural Processes. London: Routledge, 1995· 12- Ver RILEY, Op.cit. 13- GUIMARÃES ROSA, João. Primeiras Estórias. Rio de janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1988. 14- Estas questões foram discutidas, considerando o contexto brasileiro, em COSTA, L.M.S.A. e MONTEIRO, Patrícia M. "Rios urbanos e valores ambientais" In: Del Rio, V.; Duarte, C. R. e Rheingantz, P.A. (org) Projeto do lugar: colaboração entre psicologia, arquitetura e urbanismo. Rio de janeiro: Contra Capa, 2002, pp. 291-298, e ainda em COSTA, L.M.S.A. "A paisagem em movimento". In Pinheiro Machado, D.B. (org) Sobre Urbanismo. Rio de janeiro: Viana & Mosley f PROURB, 2006, p. 154·163. 15- ANDRADE, Carlos D. de. Op.cit., pg. 46. r6- Ibid, p-46. RIOS E PAISAGENS URBANAS_ 15 VIVER ÀS MARGENS DOS RIOS: , -UMA ANALISE DA SITUAÇAO DOS MORADORES DA FAVELA PARQUE UNIDOS DE AcARI Os rios são elementos de fundamental impor- tância na paisagem do Rio de Janeiro. Porém, no processo de crescimento urbano da cidade, sua importância foi menosprezada. Dos 250 rios exis- tentes, poucos são visíveis. O processo de ocupa- ção urbana da cidade fez com que a maior parte deles fosse canalizada e coberta, desaparecendo da paisagem visível, e, aos poucos, da memória dos habitantes do Rio de Janeiro. O tratamento dado aos rios pelas obras tradi- cionais de engenharia hidráulica, através de reti- ficações e canalizações, além de mudar sua fisio- nomia e retirar sua visibilidade, fez com que eles se transformassem em um sistema de drenagem subterrâneo, cuja função inicial seria a de evitar enchentes e facilitar a ocupação urbana de um território com amplas terras de baixada, sujeitas a inundações no período de chuvas mais fortes. Com nascentes nas montanhas, mas correndo em áreas de baixada, os rios apresentavam uma velocidade baixa de escoamento da água, fazendo com que as terras das faixas marginais permane- cessem alagadas por longos períodos de tempo. O sistema de canalização adotado buscava direcionar e conduzir as águas das enchentes o mais rápido possível rio abaixo, esperando assim controlar o problema. Hoje se reconhece que essas obras, em- bora proporcionem melhorias locais em épocas de enchentes mais freqüentes, muitas vezes transfe- Ana Lucia Britto Victor Andrade Carneiro da Silva rem o problema para jusante e agravam significa- tivamente a situação das enchentes excepcionais. Por outro lado, as obras de saneamento, ao lon- go de várias décadas, priorizaram a construção de sistemas de coleta de esgotos e relegaram a segun- do plano a questão do tratamento destas águas usadas. Os rios eram usados indiscriminadamen- te como receptáculo destes esgotos não tratados, em uma concepção de saneamento que desconsi- derava as conseqüências nefastas da poluição dos corpos hídricos urbanos para o meio ambiente e para a qualidade de vida da população da cidade. A poluição dos rios e os riscos freqüentes de enchentes fizeram com que, até muito recente- mente, grande parte das áreas ribeirinhas fosse considerada espaço desvalorizado, desprezado pelos processos formais de urbanização, transfor- mando-se em paisagem residual, sujeita a ocupa- ções irregulares. De fato, um dos graves problemas sócio-am- bientais que a cidade hoje precisa enfrentar, asso- ciado às inundações, é a ocupação irregular da fai- xa marginal dos rios, principal causa de seu asso- _ reamento e, conseqüentemente, das inundações. No município do Rio de Janeiro, a lei prevê que seja preservada a distância mínima de quinze me- tros de cada lado do espelho d'água, para que a na- tureza seja preservada. Como aponta a equipe da extinta Fundação Rio Águas, hoje Subsecretaria de I I Águas Municipais, na revista Rio-Águas, em ma- téria onde tece comentários a respeito do Progra- ma de Proteção das FNAs, (faixas non aedíficandi), esta delimitação de faixas, em alguns casos muito extensa, inviabiliza qualquer tipo de ocupação re- gular ao longo das mesmas. Isto provoca o desin- teresse dos proprietários de terrenos, que acabam ficando abandonados e sujeitos a invasões e ocu- pações irregulares, atingindo níveis alarmantes no município do Rio. A Superintendência Estadu- al de Rios e Lagoas (SERLA) calcula que existam hoje na cidade cerca de 25 mil construções irregu- lares dentro da faixa marginal de proteção de 30 metros ao longo de rios, canais e lagoas. Como mostra Maricato (2003), no Rio de Ja- neiro, como em outras metrópoles brasileiras, a invasão de terras é uma regra e não uma exceção, sendo esta ditada pela falta de alternativas. O pro- blema é grave e de difícil solução, pois está direta- mente ligado à situação pobreza em que vive parte importante da população carioca, que não conse- gue aceder à moradia dentro do mercado formal de habitação, e à inexistência de políticas de pro- visão de habitação popular para a população de baixa renda. Estas políticas, visando ampliar o acesso legal e regular destes moradores da cidade à habitação com infra-estrutura adequada, são essenciais para evitar a ocupação irregular das margens dos rios. A legislação de proteção da faixa marginal e as políticas de ordenamento do solo urbano são ino- perantes se não vierem associadas às políticas de provisão de habitação. Assim, é preciso enfrentar uma situação onde, o que do ponto de vista ambiental é identificado como problema, do ponto de vista de parte dos mo- radores da cidade é percebido como solução. Toda- via, esta solução implica para estes moradores em uma série de riscos, decorrentes das enchentes e do convívio diário com as águas poluídas, pois na maior parte das vezes os esgotos domésticos e o lixo destas ocupações são despejados diretamente nos rios. Neste trabalho, nos propomos a refletir sobre as situações de risco ambiental a que estão expostas as populações de baixa renda que vivem em ocupações irregulares e favelas nas margens dos rios que cortam o município do Rio de Janeiro, apresentando um estudo de caso da Favela Parque Unidos de Acari, situada às margens do rio Acari no bairro da Pavuna, AP3 (Área de Planejamento 3), do município do Rio de Janeiro. Esta reflexão se insere no âmbito da pesquisa "Desigualdades Sócio-Ambientais e Risco Am- bientar' desenvolvida por uma equipe de professo- res e pesquisadores do PROURB (Ana Lucia Brit- to e Victor Andrade Carneiro da Silva) e do IPPUR (Luciana Correa do Lago e Adauto Lucio Cardo- so). Nesta pesquisa, foram realizados estudos de caso sobre diferentes áreas de habitação popular na região metropolitana do Rio de Janeiro. Esses estudos tinham, entre os diferentes objetivos es- pecíficos às três pesquisas, avaliar condições de acesso a serviços de saneamento, problemas am- bientais e situações de risco ambiental. A pesquisa de campo referente ao estudo aqui apresentado foi realizada entre outubro e novembro de 2004. Fo- ram feitas diversas visitas à área Parque Unidos de Acari, e a equipe de bolsistas de iniciação cien- tífica aplicou 79 questionários domiciliares. Além destas informações, foram utilizados neste traba- lho os estudos e diagnósticos elaborados por pes- quisadores no âmbito do projeto de urbanização da área, produzidos pelo escritório de arquitetura Arqui Traço. ' Na pesquisa aqui apresentada, compreendemos por risco ambiental a existência de uma maior pro- babilidade de ocorrência de desastres que afetem a integridade física, a saúde ou os vínculos sociais da população em determinadas porções do terri- tório. O fato de que determinadas áreas estejam em situação de risco ambiental é uma decorrência da interação entre processos ambientais (carac- terísticas geofísicas do sítio, clima, pluviosidade, etc.), processos econômicos (existência de indús- trias poluidoras ou de equipamentos ou infra-es- truturas sujeitas a acidentes) e processos sociais (características da população, como renda, escola- ridade, etc.). Entendemosque o risco ambiental não se distribui de forma aleatória, mas obedece aos padrões de desigualdade e segregação social que marcam a estruturação das cidades. Ou seja, são as populações situadas nos níveis inferiores da escala da estratificação social, por características de renda, escolaridade, cor e gênero, que residem ou utilizam os territórios de maior risco ambien- tal, como a população das favelas, o que as coloca numa situação que denominamos de vulnerabili- dade sócio-ambiental, onde se sobrepõem vulnera- bilidades sociais à exposição a riscos ambientais. Todavia, dentro de uma estratégia de sobrevi- vência, uma parcela destes moradores vivencia esta exposição aos riscos ambientais como parte integrante de seu cotidiano, criando mecanismos para conviver com eles, a ponto de, muitas vezes, não identificá-los mais enquanto risco, como ob- servamos no caso de Parque Unidos de Acari. A ÁREA DE ESTUDO: O TERRITÓRIO DA BACIA DO RIO AcARI Localizado na parte noroeste da bacia hidro- gráfica da Baía de Guanabara o rio Acari compõe uma das sub-bacias desta macro-bacia (sub-bacia Pavuna- Acari) (Fig.I). O rio Acari possui 8300 metros de extensão e uma área de drenagem de cerca de 107 Km\ e drena áreas de 8 bairros: Ma- rechal Hermes, Guadalupe, Pavuna, Coelho Neto, Irajá, Acari, Parque Columbia e Jardim América, formando uma planície aluvionar. Tem sua foz no rio São João de Meriti, no bairro de Jardim Améri- ca. Um de seus principais afluentes é o rio Tingui, cuja foz se encontra no trecho final do rio Acari, na travessia do mesmo com a estrada Camboatá no bairro de Deodoro, quando ele passa a ser de- nominado rio Sapopemba. O território da bacia hidrográfica do rio Acari corresponde ao que foi designado no Plano Dire- tor de Esgotamento de Sanitário da Região Metro- politana do Rio de Janeiro de 1994 como bacia do RHJS Figura 1 - Foto área do Rio Acari Acari. O plano indica que, na maior parte da ba- cia, os efluentes são lançados nas galerias fluviais e encaminhados para os córregos e para o rio Aca- ri, que tem a qualidade das suas águas bastante comprometida, sendo classificado na categoria 4 pelo CONAMA (Conselho Nacional do Meio Am- biente, que significa o grau mais alto de compro- metimento das águas, que tem seus usos restritos à navegação, harmonia paisagística e outros usos menos exigentes. Apenas em uma pequena área da bacia existe rede de esgotamento e tratamento dos efluentes em duas estações: ETE (Estação de Tramamento _ de Esgoto) Realengo e ETE Acari. Esta área cor- responde a parte do bairro de Realengo e de Padre Miguel e aos bairros de Vila Militar, Magalhães Bastos e Deodoro. Os outros bairros que com- põem a planície aluvional do rio Acari são despro- vidos de redes de esgotamento. Esta área deveria ser atendida pelo Sistema Pavuna, projetado pelo Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, que inclui estação de tratamento (ETE Pavuna) e redes de coleta. A ETE Pavuna foi construída, mas opera abaixo da sua capacidade, pois até de 2oo6 apenas 23% dos coletores haviam sido instalados. De fato, não foram realizadas intervenções im- portantes para ampliação da rede de esgotamento existente na bacia. O mesmo ocorre com a rede de drenagem. As obras realizadas de esgotamento e drenagem se inseriram dentro dos programas Favela Bairro e Bairrinho da prefeitura, voltados para urbanização de favelas, e de outros progra- mas também da prefeitura como Rio-Cidade, Rio Comunidade e o programa de regularização de lo- teamentos. Em 2005, no âmbito do Favela-Bairro estavam sendo realizadas intervenções na área do Complexo de Acari (Vila Esperança, Parque Prole- tário Acari, Vila Rica de Irajá) e havia sido concluí- da a intervenção na comunidade de Fazenda Bota- fogo. O bairro de Acari sofreu intervenção do Rio Comunidade, e os bairros de Marechal Hermes e Pavuna do Rio-Cidade. A bacia do rio Acari foi objeto de um projeto básico de macrodrenagem e de um projeto de canalização elaborado em 1991 e modificado em I997· Mesmo assim, o problema das inundações permanece concentrado no rio, segundo a SERLA um dos mais problemáticos do município, com 27 pontos de inundação. A área de inundação das en- chentes em 2006 na bacia do Acari atingiu uma população de mais de 5o.ooo habitantes. Além do assoreamento, que afeta seis trechos de rios da ba- cia como o Piraquê, o Catarino e o próprio Acari, há problemas ocasionados por pontes e travessias de pedestres, construídas pelos próprios morado- res, que impedem o escoamento das águas e acu- mulam lixo; é o caso das pontes das ruas Recife, Manuas e da avenida Marechal Alencastro Guima- rães, todas sobre o rio Acari 2 .Constatamos que as obras hidráulicas realizadas não trouxeram solu- ção para o problema das inundações, que ainda são recorrentes na época de chuvas intensas. Hoje as principais ações da prefeitura e da SERLA com relação ao rio Acari é a limpeza e dragagem, para minimizar o problema que tem como causa prin- cipal a ocupação irregular de suas margens. Seu curso atravessa a zona norte do município do Rio de Janeiro, na região identificada como AP3, sendo a área marcada por um número importante de favelas e ocupações irregulares (Fig. 2e 3). Segun- do análise realizada por Silva, com base em dados do IBGE relativos à renda, escolaridade e acessos a serviços de saneamento (abastecimento de água, es- gotamento sanitário e coleta de lixo) esta é uma área de alta vulnerabilidade sócio-ambiental, onde se as- sociam pobreza, precárias condições de saneamento e exposição a riscos ambientais. (Silva, 2oo6) É na AP3 que se concentra o maior número de favelas do município (312 favelas). Segundo infor- mações da prefeitura do Rio de Janeiro, em 2000, aproximadamente 544·737 dos habitantes da AP3 viviam em favelas, o correspondente a 23,1% do total da população da área. Levando em conta que a população de favela, em 1991, correspon- dia a 480.524 habitantes (ou 20,7%), houve um acréscimo dessa população na ordem de 13,4% no período I99I/2ooo. Enquanto isso, no mesmo in- tervalo, a AP viu crescer sua população total em 1,5%. A AP3 possui um total de 4-9n lotes distri- buídos em 768.r8r m 2 , com 74,7% destes, ou seja, 3.667 lotes, edificados em loteamentos irregula- res inscritos no Núcleo de Regularização de Lotea- mentos. Além do grande número de favelas, com alta densidade de ocupação do espaço, a região apresenta um expressivo esvaziamento econômi- co que se caracteriza pelo abandono de terrenos e instalações onde havia uso industrial ou galpões, notadamente ao longo da avenida Brasil. A AP3 é ainda caracterizada pela carência de áreas verdes (menos de r mz por habitante), de espaços cultu- rais e esportivos, de lazer, de contemplação. Uma parte importante das ocupações irregula- res localiza-se às margens de rios, como o rio Aca- ri. Neste rio, segundo estudo da Secretaria Muni- cipal de Meio Ambiente, no trecho entre a nascen- te no rio São João de Meriti e a avenida Automóvel Clube, o maior problema são as ocupações irregu- BAÍA DE SEPETIBA lares das margens, com casas construídas pratica- mente dentro d'água. É neste trecho, na margem esquerda, que se localiza a comunidade Parque Unidos de Acari, objeto deste trabalho. Na mar- gem direita está o bairro de Parque Columbia. No trecho entre a avenida Automóvel Clube e a aveni- da Brasil, o rio está canalizado, com 6o metros de largura de acordo com o cadastro da SERLA. De acordo com o estudo da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, neste trecho, o canal serve como bacia de sedimentação de sólidos e detritos, o que exige dragagens permanentes (SMAC, 2006). No trecho seguinte, entre a avenida Brasil e a estrada João Paulo, em Honório Gurgel, as margens direi- ta e esquerda estão parcialmente ocupadas pelas comunidades de Parque Bela Vista e Almirante Tamandaré. No trecho entre a estrada João Paulo, em Deodoro, até a rua Luis Coutinho Cavalcante, em Guadalupe, a margemesquerda está ocupada com edificações, algumas de baixo, outras de bom padrão construtivo. Na margem direita, existe uma área livre, possível de ser usada para reassen- tamento de população. . I OCEANO ATLÂNTICO Figura 2 - Mapa das APs com a localização do Rio Acari Fonte: Acervo Grupo de Pesquisa Britto, PROURB As margens do rio Acari encontram-se assorea- das ou erodidas. A presença de casas nas margens dificulta o trabalho de dragagem feito rotineira- mente pela SERLA e pela Rio-Águas, da prefeitu- ra, pois o leito não pode ser aprofundado como deveria porque os barracos na margem correm o risco de desabar. Além disso, a intensificação do processo de ocupação irregular das margens do rio, transformou partes do Acari em um esgoto a céu aberto. Pouco valorizado na paisagem local, o rio recebe grande quantidade de resíduos, tais como entulhos, galhada e lixo. Emrelaçãoàfaixamarginaldeproteçãodosrios,a revista Rio-Águas apresenta uma matéria onde tece comentários a respeito do Programa de Pro- teção das FNAs. Esta matéria informa que, para cursos d'água perenes e com vazão igual ou superi- _ ora rom3fs no município do Rio de Janeiro, a faixa mínima determinada pela legislação vigente é de 15 m para cada bordo (Rio Águas, 2002). Porém, o projeto de canalização do rio Acari anotou uma fai- xa de ro m para cada lado da borda do canal, onde foi prevista uma via com o nome de avenida Canal. A coMUNIDADE PARQUE UNIDOS DE AcARI A comunidade Parque Unidos do Acari é uma área residencial localizada próximo à grande área industrial situada na margem esquerda do rio Aca- ri, enquadrada como Zona Industrial 2. Ela ocupa a área entre a ma Embaú e o rio Acari, sendo re- cortada pela Linha Verde. No entorno imediato, está localizada a avenida Automóvel Clube e a es- tação de metrô Fazenda BotafogojAcari. Na escala metropolitana, Parque Unidos de Acari localiza-se entre a avenida Brasil e a rodovia Presidente Du- tra, dois importantes eixos rodoviários da região metropolitana do Rio de Janeiro No entorno, há outras ocupações irregulares localizadas nos bair- ros de Acari e Irajá (Parque Proletário Acari, Par- que União, Vila Esperança, Vila Rica de Irajá), e Pavuna (Pedreira, Fazenda Botafogo e Parque Co- lúmbia). A denominação Acari é usada para o bair- ro, em função do rio que passa nas proximidades da região, hoje chamada de Complexo de Acari - que na verdade é a junção do Conjunto Ama- relinho, constmído no final dos anos 50 na beira da avenida Brasil, e mais três localidades: Parque Proletário de Acari, Coroado e Vila Esperança. O Complexo de Acari iniciou seu processo de ocu- Figura 3 - Mapa da Favelas do Entorno pação no ano de 1946 e atualmente possui uma população de cerca de 42 mil habitantes. Hoje apresenta um dos maiores índices de pobreza no estado do Rio de Janeiro. A comunidade aqui estu- dada, Parque Unidos de Acari, está fora do Com- plexo, como mostra a figura a seguir. A população de Parque Unidos de Acari tem re- gistrado um crescimento expressivo nos últimos dez anos, pois, de acordo com o censo de 1991 possuía 418 unidades habitacionais. Já na época da elaboração de uma proposta do programa de urbanização Favela-Bairro para a área, os dados indicavam 650 domicílios (dados do edital). O le- vantamento realizado pela equipe da Arqui-Traço indicou a existência de r.o3r domicílios. Segundo dados censitários IBGE de 2000, Par- que Unidos de Acari é uma comunidade de baixa renda, onde os chefes de família têm remuneração média de r salário mínimo e meio. Consta que pre- dominam moradores com faixa de renda de até 500 reais (68%). Existe uma parcela muito pequena de moradores com empregos fixos. Entre as empre- sas empregadoras destacam-se a Casas Bahia, na ma Embaú e o Ponto Frio, em Irajá. Há também o FAVElAS Favelas Pq Un1dos deAcari relato de que algumas pessoas da comunidade tra- balham no CEASA, situado próximo dali. A maior parte dos chefes de família garante o sustento fami- liar com atividades informais como biscates (guar- dadores de carros, camelôs e catadores de material para reciclagem como papéis, ferro velho e garra- fas). Constatou-se, ainda, na pesquisa de campo, a importância dos programas sociais oficiais ou de igrejas locais que distribuem cestas básicas. Algu- mas famílias vivem exclusivamente destes e de ou- tros donativos, sendo que alguns poucos entrevis- tados têm acesso ao cheque cidadão do governo do estado. A situação sócio-econômica é caracterizada também pela baixa escolaridade, que limita as pos- sibilidades de uma melhor inserção no mercado de trabalho. A escolaridade média destes chefes de fa- mília chega a cinco anos de atividade escolar, sem completar o ciclo fundamental. Estando assentada próximo ao morro da Con- ceição e ao morro da Pavuna, e sendo limitada ao sul pelo rio Acari, a comunidade apresenta uma topografia variada, com uma encosta na parte cen- tral e uma área mais plana junto ao rio. Os taludes das margens do rio Acari, junto à comunidade, encontram-se com solo exposto e vegetação rala, constituindo num ponto de lançamento de lixo; entulhojaterro. O lançamento desses detritos pro- voca mobilizações recorrentes do talude em épo- cas chuvosas, assoreando o rio a jusante. Na parte oeste da comunidade existe uma grande elevação resultado do acúmulo irregular de entulho em va- zadouro clandestino. Na década de 50, o morro da Ferraria (ma Em- baú) e terras próximas foram loteadas e vendidas. Foi o início da ocupação residencial e da pequena favela conhecida como "Corta Rabd' na encosta do morro da Ferraria próximo ao brejo. A década de 6o marcou o crescimento da favela impulsionado pelo desenvolvimento do parque in- dustrial de Fazenda Botafogo atraindo migrantes do Norte Fluminense. Durante a década de 70, áreas próximas às mar- gens do rio Acari passaram a servir de vazadouro de lixo, a Lixeira de Acari. O despejo de lixo próxi- mo ao brejo da favela Corta Rabo acabou alterando o leito do rio que, na segunda metade da década de 70, foi oficialmente retificado. (Figs. 4, 5 e 6). Figuras 4, 5 e 6 - Mapa histórico, elaborado por Flavia Royse. RIOB PniSAGENS UR8ANf!S _ 23 Figura 7 - Barracos sob a Linha Verde, Acervo Grupo de Pesquisa Britto, PROURB. O aterro de lixo criou solo para a expansão da favela, onde foi construído um campo de futebol (1978) e também novos barracos. Estes barracos foram vendidos pelo Sr. Souza, primeiro presiden- te da Associação de Moradores criada em r98o e que mudou o nome da favela Corta Rabo para Par- que Unidos de Acari. Observa-se, portanto, que parte da ocupação se deu sobre um solo frágil, com a camada superior do terreno constituída de material de aterro e entulho. A Linha Verde, inaugurada em 1974, separou a comunidade em duas partes e criou uma cisão espacial entre elas (Fig. 7). O projeto da Linha Verde criou uma ponte so- bre o rio Acari, proporcionando um acesso mais rápido até a rua Automóvel Clube. Para a cons- trução da Linha Verde, foi necessário fazer novas obras de movimento de terra, gerando uma rearti- culação dos barracos da favela. A encosta "central", conhecida como morro da Ferraria, foi cortada na época da execução da Linha Verde, e não foram feitos no corte remanescente a contenção e o sis- tema de drenagem adequados, nem foi plantado algum tipo de vegetação que auxiliasse na prote- ção da encosta. A parte superior foi densamente ocupada e apresenta árvores de grande porte loca- lizadas no limite do corte e que se projetam sobre as casas edificadas na parte baixa. Essa parte baixa também apresenta um grande número de casas Figura 8 - Vazadouro, Acervo Grupo de Pesquisa Britto, PROURB. junto ao "barranco", e no caminho do que seria a drenagem "naturaY' do terreno. Nessa encosta, há risco de deslizamentos Como outras favelas do município do Rio de Ja- neiro, Parque Unidos de Acari apresenta uma forte heterogeneidade interna, com áreas de ocupação maisantiga já consolidadas e de ocupação mais re- centes extremamente precárias. Na década de 8o, a favela se expandiu para as margens do rio Acari e sob os viadutos da Linha Verde, onde foram cons- truídos novos barracos em situação de risco. O período registrou uma piora das condições econômicas dos moradores em função da falência de inúmeras indústrias como Formiplac, princi- pal empregadora da região. No caso das moradias construídas ao longo da Linha Verde, não há afas- tamento frontal. No final da década de 8o, parte do terreno da antiga Olaria, então desocupado, começou a ser utilizada como vazadouro clandestino de entulho. Com quinze anos de funcionamento, o vazadouro conforma uma montanha de entulho de aproxi- madamente ro metros de altura, que continua a crescer e se projetar em direção à Linha Verde. O vazadouro clandestino de entulho é fonte de re- cursos para diversas famílias (Fig. 8). Nos anos 90, foi criada uma nova área de expan- são da comunidade em área contígua a este vaza- douro, conhecida como Terra Nostra (Fig. 9 e 10). Figura 9 - Mapa histórico com a localização de Terra Nostra, elaborado por Flavia Royse. A ocupação se deu a partir da migração interna de moradores mais pobres da comunidade para essa área, principalmente com as desocupações geradas pela construção da Linha Verde. Mora- dores que foram removidos da área para a cons- trução da via, migraram para o mangue, situado próximo ao local de intervenção. Esta área possui hoje cerca de 150 barracos, construídos com materiais precários, e é desprovi- da de saneamento; a maior parte dos moradores não possui qualquer tipo de renda, e subsiste ca- tando entulho, ou com apoio de programas sociais que distribuem cestas básicas. Segundo relatos dos moradores da área, parte das casas é atingida quan- do as águas do rio Acari sobem com as chuvas. Em levantamento realizado para o diagnóstico do programa Favela-Bairro, foram identificados na comunidade três setores com diferentes padrões de ocupação. O primeiro é denominado setor Parque Unidos, ou Beira-Rio, delimitado pelo rio Acari que conforma o eixo referencial da comuni- dade no sentido leste-oeste, reafirmado pela rua Padre Lima, que é paralela ao rio. A estrutura de lotes característica do setor foi sendo conformada de maneira não planejada, com acesso às edifica- ções por becos e travessas com traçado irregular e alta densidade de edificações. No setor Parque Unidos, embora existam algumas casas de ma- deira, o padrão construtivo da maioria das casas é de alvenaria e grande parte delas não apresenta revestimento. Neste setor, as melhores casas estão localizadas ao longo da rua Projetada e no largo da Associação. O setor Parque Unidos apresenta três eixos principais: Linha Verde, rua Padre Lima e rua Pro- jetada. Este setor tem o campo de futebol Beira Rio, importante área livre interna em uma ocupa- ção de alta densidade. O campo do "Beira Rid', na parte central da co- munidade, abriga os campeonatos que mobilizam times do entorno, como o do Ceasa, o "Sensação do Nordeste", o do "Ferro Velho" e o "Flor do Em Cima da Hora" - os dois últimos, times do local, cujos fundadores ajudam a manter esse campo. Segundo entrevistas com os moradores, o campo de futebol se situa numa área deprimida, o que faz as águas da chuva convergirem para ele, drenando-as, o que colabora com as pessoas que vivem no seu en- torno. Somente quando ele é saturado, a água passa a atingir os moradores das suas proximidades. Nesta área há o maior contato da população com rio. As casas estão localizadas à margem do rio Acari, que corre paralelamente à rua Padre Lima, sendo que as casas têm a frente para a rua e os fundos para o rio. Não existem limites entre o rio e as casas. Os lotes têm como limite o leito do rio. Esta parte posterior das casas é usada muitas vezes como depósito de objetos sem uso, de lixo e entulho. Figura 1 O -Terra Nostra, Acervo Grupo de Pesquisa Britto, PROURB. Figura 11 - Casas na margem do rio, Acervo Grupo de Pesquisa Britto, PROURB. E DSC é o trecho mais sujeito a inundações, que ocorrem em épocas de chuvas fortes, quando o rio Acari extravasa seu leito, chegando a inundar até o campo de futebol. Algumas casas, para se proteger das enchentes, passaram por reformas, tendo sido soerguidas sobre pilotis; outras apre- sentam a tipologia de palafita, ou então uma ver- são simplificada de porão com o objetivo de impe- dir o alagamento do interior das casas. O segundo setor- Em baú tem como elemen- tos marcantes: a própria encosta do morro da Fer- raria, fator determinante na paisagem do setor; a rua Embaú, importante eixo viário do entorno imediato, que funciona como principal eixo do se- tor e determina o limite da comunidade; e o lote- amento projetado em r942 no morro da Ferraria onde foram planejadas vilas perpendiculares à rua Embaú. Vale ressaltar uma característica peculiar do setor Em baú: a maioria das ruas são sem saída, dando um caráter privado aos becos e travessas da comunidade. O setor Embaú apresenta o padrão construtivo de melhor qualidade, com uma signi- ficativa quantidade de residências de alvenaria e com revestimento externo. Este setor, nos trechos da rua Embaú e da rua Projetada é conhecido pe- los moradores como a "Zona Sul da comunidade", pois segundo eles, é habitado por pessoas com maior poder aquisitivo. Mesmo assim, podemos constatar que não há sistema de drenagem na comunidade e muitas casas possuem pequenas trincheiras de cimento nas portas de entrada, para impedir a entrada da água em dias de chuva. Se- gundo moradores, a água chega a atingir um me- tro de altura próximo à rua projetada. O setor Terra Nostra, de mais recente ocupação, não possui uma estrutura formalizada, e os acrés- cimos e modificações nos barracos de madeira são registrados com freqüência. Segundo informações do presidente da associa- ção de moradores, a "Terra Nostra" seria uma área de ocupação "provisória" para aqueles (as) que, por algum motivo, passassem por necessidades extremas de moradia e tivessem algum tipo de re- lação com a associação de moradores, no sentido de obter indicação e permissão para assentar-se ali. Desta forma, várias das unidades existentes não seriam de posse dos moradores, mas mora- dias provisórias, nas quais as pessoas permanece- riam até a superação das dificuldades pelas quais passam. Assim, segundo uma espécie de pacto estabelecido, não é permitido que os moradores edifiquem com alvenaria o local. Melhorias reali- zadas nas moradias ficam por conta dos morado- res. Tivemos informação, também, de que, embo- ra as pessoas autorizadas a morar nas casas tem- porariamente não precisassem pagar nenhuma forma de aluguel, deveriam contribuir com algum dinheiro para os que deixam a moradia no mo- mento da ocupação, como forma de compensar as benfeitorias realizadas. O setor apresenta um beco principal com traça- do extremamente irregular que conecta os barra- cos de madeira. A área oeste do setor é delimitada pelo vazadouro clandestino de entulho em terreno pertencente à Pulmman, pelo rio Acari e pela Li- nha Verde. O vazadouro clandestino já apresenta uma elevação de cerca de ro m de altura, decor- rente do acúmulo irregular de material de aterro. Junto ao vazadouro existe um depósito de ferro velho, do qual o vice-presidente da associação de moradores é um dos proprietários. O setor sofre com as inundações freqüentes. O rio Acari, neste trecho, é bastante poluído, exala mau cheiro, e suas margens são tomadas por ha- bitações precárias, algumas com estrutura seme- lhante à de palafitas. Para passar entre as casas nas pequenas ruelas, a população coloca, perma- nentemente, tábuas que servem como caminho sobre a lama Esse trecho pode ser considerado área de risco, levando-se em conta que não houve um planeja- mento para sua ocupação como aterro, nem foram realizadas obras de contenção para o armazena- mento do material.Além disso, não há controle da procedência e nem da forma como foi e continua sendo depositado o material no local. Sendo as- sim, pode haver deslizamentos ou contaminação, dependendo do tipo de material que foi usado no aterro (Figs. n e r2). O setor Terra Nostra é o ex- tremo oposto do Embaú, por apresentar uma he- gemonia de edificações de madeira e sucata com alta vulnerabilidade, constituindo uma situação de alta precariedade ambiental e de risco. A comunidade de Parque Unidos possui redes de abastecimento de água operadas pela CEDAE Companhia Estadual de Águas e Esgotos). Na al- tura da rua Embaú, foi executado um ramal com diâmetro de 300 mm, que se desenvolve ao longo desta via, e atende ao setor morro da Ferraria. Pró- ximo à Linha Verde, os moradores, juntamente com a CEDAE, instalaram um ramal secundário de 75 mm para atender ao setor Parque Unidos. Na Linha Verde, o ramal de 75 mm segue no di- âmetro de 2"-PVC. As moradias são atendidas por ramais secundários que percorrem todas as ruas dos setores Embaú e Parque Unidos. A área nordeste da comunidade se encontra urbanizada e, desta forma, a região ribeirinha ao rio Acari, junto à rua Leão Cordado, é atendida por rede de água executada durante a urbanização. Todavia, o abastecimento da grande maioria das residên- cias é realizado por meio de ligações domiciliares precárias e clandestinas na rede oficial. Existem redes executadas pelos moradores para atender os becos. Não há sistema de medição de água e controle de perdas através da instalação de micro- medidores (hidrômetros) nas moradias, e de ma- cro-medição nas redes principais. Na maioria dos domicílios pesquisados (59%) o abastecimento se dá através de ligações clandestinas na rede oficial, não havendo pagamento de conta de água. Durante uma das visitas de campo, havia um enorme vazamento jorrando água em uma das ca- nalizações da CEDAE que atravessa a comunidade. O setor denominado Terra Nostra é atendido por uma rede muito precária pendurada sob a estrutura da ponte sobre o rio Acari. Esta linha, construída pelos moradores, é proveniente da rede que alimentava a desativada fábrica de gelo seco, com diâmetro de roo mm, ramal da 2" linha da av. Automóvel Clube, localizada na margem sul do rio Acari. As ruas do setor Terra Nostra não são pavimentadas, e a rede que alimenta a comu- nidade se encontra aparente, com canos rachados Figura 12- Casas na margem do rio, Acervo Grupo de Pesquisa Britto, PROURB. que passam por dentro do esgoto e da lama con- taminada. Não há ligação formal de água para nenhum domicílio desse setor. O diagnóstico re- alizado para o Favela-Bairro, indica que, segundo informações obtidas junto à associação dos mo- radores, o sistema de abastecimento de água não atende satisfatoriamente a comunidade, com for- necimento fraco em alguns períodos do ano. Nas entrevistas que realizamos, apenas no setor Terra Nostra foram levantados problemas com relação à qualidade do abastecimento. Como visto anteriormente, a região não dispõe de sistema de coleta de esgotos. Conforme dados do cadastro da CEDAE, o entorno da comunidade é caracterizado por loteamentos particulares. Exis- tem loteamentos que utilizam fossas, e outros que são desprovidos de sistema de coleta de esgotos. O efiuente das fossas e o esgoto "in natura" são encaminhados para as redes de drenagem execu- tadas nas ruas dos loteamentos, e lançados no rio Acari. A comunidade Parque Unidos é totalmente desprovida de redes formais para coleta de esgoto sanitário. A maioria dos moradores executou re- des coletoras improvisadas nos becos e na Linha Verde, com tubos em anéis de concreto com os di- âmetros variando de 200 mm e po mm e caixas de passagem em alvenaria. Estas redes se desen- volvem em determinados trechos sob as residên- cias correndo o risco de serem obstruídas, e sem condições de recuperação. Destaca-se ainda o fato de existirem várias casas geminadas e aglomera- das, o que prejudica a delimitação da rede pública com a ligação domiciliar. As residências lançam o esgoto "in natura" no sistema de drenagem pre- visto para a comunidade, ou diretamente no rio Acari. Foi verificada, em diversos locais da comu- nidade, a existência de rasgos no pavimento para a instalação de tubos de esgoto. A situação é mais precária no setor Terra Nos- tra, onde foi executada pelos moradores uma rede destinada à coleta de águas pluviais e esgoto sani- tário. Em alguns trechos desta rede, o esgoto é en- caminhado a céu aberto, no meio de amontoados de lixo. Este fato permite que, em épocas de chuva intensa, ocorra o afloramento e estagnação dessas águas servidas em diversos trechos da rede, tra- zendo problemas de toda natureza, acompanha- dos de mau cheiro e mau aspecto, além de facilitar a proliferação de ratos e outros vetores transmis- sores de doenças. Durante as entrevistas e as visi- tas de campo, o forte cheiro de esgoto foi relatado pelos pesquisadores. "tinha um cheiro muito forte que fazia arder os olhos e os moradores dali não sentiam nada e nem co- mentavam do cheiro, apenas reclamavam dos insetos e ratos, que estão até mesmo dentro de casa." De fato, o principal problema relacionado à precariedade do sistema de coleta de esgoto, iden- tificado nas entrevistas com os moradores, foi a proliferação de insetos e ratos. As redes de esgoto executadas pelos moradores são utilizadas também para captação de águas plu- viais, por meio de ralos instalados ao longo dos becos. Em algumas áreas, estas redes passam por baixo de várias residências, para permitir o lança- mento do esgoto no rio. Segundo informações ob- tidas junto aos moradores, não foram executadas fossas nas residências. Apesar do governo estadual, sob a gerência da SERLA, ter contratado a dragagem do rio Acari, segundo os moradores em alguns períodos o rio fica assoreado. Este fato provoca, em épocas de chuva intensa, inundações em algumas regiões às margens do rio. Como as redes de drenagem que coletam também esgoto desembocam no rio, acontece o inevitável: o retorno do esgoto às resi- dências. As moradias existentes ribeirinhas ao rio Acari lançam o esgoto diretamente no rio, por meio de tubulações penduradas nas paredes, caracterizan- do que na maioria das residências não há caixas separadoras de gordura, peça indispensável para viabilizar qualquer tratamento de esgoto. Um dos principais problemas enfrentados pela comunidade são as inundações. Dos domicílios pesquisaclos, 78% afirmaram sofrer com as inun- dações. Foram realizados pela SERLA serviços de dragagem do rio Acari (Contrato 043/98). Segun- do a associação de moradores, após a realização destes servips, a situação melhorou. Porém, como a dragagem do rio não é executada regularmente, nos períodos de chuva intensa o rio extravasa seu leito e inunda as regiões ribeirinhas, neste caso a área ocupada pela comunidade Parque Unidos de Acari. Na área da comunidade, segundo os proje- tos analisados na Rio Águas e dados levantados em campo para o diagnóstico do programa Favela Bairro, só foram executadas redes de drenagem nas ruas Embaú, Projetada e nas ruas da área ur- banizada localizada no nordeste da comunidade. As águas pluviais são enc:;minhadas ao rio Acari por meio das redes de drenagem existentes cons- truídas pelos moradores. Estas redes são em geral constituídas por tubos de concreto com diâmetros variando entre 40 em e 150 em, e PV's com espa- çamento de cerca 40 m. A captação é realizada por meio de caixas de ralo nos dois lados das ruas. O estado geral das redes não é satisfatório, pois foi verificado que a maioria dos ralos estão assorea- dos e com lixo. No cruzamento das ruas Embaú e Projetada foi executada uma bateria de ralos. Na travessa de Lima e rua Padre Lima, e em vários becos, foram cons- truídos pelos moradores redes provisórias para co- leta de esgoto que também são utilizadas indevida- mente para o transporte de águas pluviais e obvia- mentenão atendem a nenhum dos dois sistemas. Um dos problemas que contribui para o agrava- mento das enchentes é a presença de lixo deposita- do em vários pontos da comunidade. Existe coleta regular de lixo em Parque Unidos, executada pela COMLURB (Companhia Municipal de Limpeza Urbana). A coleta de lixo é realizada três vezes por semana das TOOh às r5:2oh, nas ruas principais: Linha Verde, nas ruas Padre Lima, Projetada e Embaú, e nas travessas Padre Lima, União, Bom Jardim e Embaú. A con:unidade possui garis co- munitários que realizam a varredura e limpeza geral das áreas públicas. Os garis comunitários têm seu apoio funcionando na associação de mo- radores. Este sistema, no entanto, parece não ser suficiente pois existe grande quantidade de lixo acumulado nas margens do rio Acari, principal- mente próximo à ponte da Linha Verde. De fato, nas áreas de mais difícil acesso, a coleta de lixo não é realizada. Segundo uma moradora de Terra N ostra, todos os moradores desta região levam o lixo doméstico para o terreno ao longo do leito do rio, para onde é dirigido todo o esgoto local; isto é relatado de forma natural, já que, segundo ela, é feito há anos. Ela informou ainda que doenças como dengue, cólera, leptospirose, ascaridíase e diarréias já apareceram em sua família. Apesar da existência de diversos depósitos irregulares e do vazadouro clandestino de entulho em terreno pertencente à empresa Pulmman (no limite oeste da comunidade) alguns moradores afirmaram nas entrevistas que não existem depósitos de lixo na comunidade. Outros moradores entrevistados de- monstraram a consciência da necessidade de pre- servação do rio Acari, e consideram as pessoas mal informadas por continuarem jogando lixo no rio. Os MORADORES E O RIO ACARI O trecho da comunidade aterrado próximo ao rio Acari, identificado como Parque Unidos ou Beira Rio, apresenta um grande número de habi- tações. Muitas delas são palafitas que estão locali- zadas na faixa de inundação do rio. Há, portanto, o risco recorrente de inundações. Todavia, são os fundos dos lotes que estão em contato com o rio; pode-se afirmar que, em termos de estrutura físi- ca, a comunidade está de costas para o rio. As precárias condições de saneamento, associa- das ao risco de inundações, fazem com que a relação - da comunidade de Parque Unidos de Acari com o rio Acari seja extremamente complexa. As entrevis- tas revelaram que, para muitos, o rio é visto como uma fonte de problemas, em conseqüência das inundações que já foram extremamentefreqüentes. Na pesquisa de campo, a maior parte dos mo- radores assinalou que a área sofre com as inun- dações, sendo este, juntamente com a os riscos ligados à violência, os principais problemas apon- tados pelos moradores do bairro. Alguns aponta- ram como principal problema a poluição do rio, reconhecendo que ela decorre do despejo de lixo nas águas e da inexistência de sistemas adequa- dos de coleta e tratamento de esgotos, fazendo com que, em determinadas épocas, o rio exale um cheiro forte de esgoto. É interessante notar que as casas ribeirinhas se estruturam com a parte de fundos para o rio, com a sala e as partes mais nobres voltadas para a rua, o que denota o pouco valor dado a este im- portante elemento da paisagem. Outros morado- res, sobretudo os mais antigos, lembram de um rio não poluído, onde era possível nadar e pescar, atividades que hoje são pouco freqüentes devido à alta contaminação das águas; estes moradores re- conhecem a necessidade de buscar soluções para os problemas de inundação e poluição. A melhoria do sistema de esgotamento aparece entre as reivindicações de alguns moradores. To- davia, as principais reivindicações dos entrevista- dos em Parque Unidos de Acari estão vinculadas a serviços relacionados ao trabalho, como creches e melhor acesso aos transportes. De fato, a situação de pobreza em que vive a maior parte dos mora- dores, a questão da violência relacionada ao tráfico de drogas, e a premência da garantia da subsistên- cia cotidiana indicam que os problemas relativos à qualidade do ambiente são considerados secun- dários. Mesmo reconhecendo que a qualidade do ambiente é precária, as entrevistas mostram que a comunidade, apesar de já densamente ocupada, continua em expansão, com famílias recém-insta- ladas. A escolha do local se faz através de família ou amigos que já moravam na área, e da localização, que facilita as possibilidades de acesso ao trabalho. A proposta de urbanização para a área dentro do programa Favela-Bairro de 2003 implicava várias ações que, segundo a equipe técnica do es- critório Arqui-Traço, responsável pela sua elabora- ção, tinham um custo financeiro muito elevado. A proposta envolvia a construção de casas para o reassentamento da população ribeirinha na área onde hoje existe o vazadouro de lixo. Este deveria ser desativado e a área devidamente adequada à construção de habitações para a população do se- tor Terra Nostra e do setor Parque UnidosjBeira Rio. Alegando que os custos eram muito elevados, a prefeitura não chegou a desenvolver a proposta. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os rios são atributos importantes da paisagem da cidade e podem propiciar uma situação privile- giada aos seus habitantes, particularmente àqueles que vivem na sua proximidade. Eles podem usu- fruir dos recursos hídricos, e de um habitat rico, com grande variedade de características biológicas (espécies vegetais, de pássaros e outros pequenos animais) e geomorfológicas (Penning - Rowsell & Burgess, 1997 e Costa e Medeiros, 2002). Por outro lado, as paisagens dos rios são elementos de contemplação, podem ter efeitos relaxantes e estimulantes, através do fluxo das suas águas e da vegetação das suas margens, assim como podem ser um lugar para atividades esportivas e de lazer. Neste sentido, os rios podem ser percebidos como amenidades urbanas. Diferentemente de outras áreas onde os rios são elemento de contemplação e lazer, constituin- do-se em uma amenidade ambiental que valoriza a paisagem e o espaço de vida cotidiana para aque- les que habitam suas margens, em Parque Uni- dos de Acari e em grande parte da zona norte do Rio de Janeiro, os rios são ameaças à segurança e integridade física dos habitantes ribeirinhos, que temem as enchentes, enfrentam o rnau cheiro e o contato com as águas poluídas. Refletindo sobre os caminhos para transformar esta situação, podemos relacionar algumas medi- das no âmbito da sub-bacia do Rio Acari, e outras medidas, de caráter local, voltadas para as particu- laridades de Parque Unidos de Acari, que seriam necessárias para reduzir os riscos e melhorar as condições ambientais e de habitabilidade para a população que vive nas margens do rio. Estas me- didas partem do princípio de que o rio e sua vár- zea são uma unidade. Uma primeira medida a ser aplicada no âmbito da sub-bacia seria a construção das redes de esgoto previstas, e a complementação do Sistema Pavuna, que reduziria o lançamento de esgotos não tratados no rio. Uma outra medida seria a dragagem do rio Acari a ser realizada com a freqüência adequada e baseada em estudos hidrológicos e hidráulicos. Se- ria necessária a delimitação de áreas polder, previs- tas para o armazenamento das águas de enchente e o aumento da largura do canal, assim como a delimitação de logradouros públicos nas margens do rio, com o uso de pavimentação permeável que permita que a água da chuva se infiltre no solo. Observamos que a maior parte dos autores que discute a preservação e valorização paisagística dos rios urbanos ressaltam a visibilidade e o acesso público como importantes estratégias de melhoria ambiental de rios urbanos. Neste sentido, seriam importantes intervenções que possibilitassem ca- minhadas ao longo de suas margens e permitis- sem o acesso público à água. No caso do rio Acari, esta é uma estratégia importante, pois hoje, em di- ferentes trechos, inclusive no trecho que margeia a comunidadede Parque Unidos de Acari, o rio fica oculto da paisagem por estar como fundo de lote. No caso específico de Parque Unidos de Acari, fa- zem-se necessários a remoção e o reassentamento da população que vive na área sujeita à inundação, bem como da que vive na área de risco junto à Linha Verde. Esta proposta, que já estava presente na in- tervenção do programa Favela-Bairro, elaborado pelo escritório Arqui-Traço, e não chegou a ser executada, está contida na proposta de reabilitação integrada do rio Acari, elaborada pela Secretaria Municipal de Meio-Ambiente. Segundo este estudo, não apenas na área de Parque Unidos de Acari, mas também em outros trechos ao longo do rio, deveria haver remo- ções das habitações construídas na faixa marginal. O projeto exige um volume de recursos finan- ceiros importante, pois implica na construção de novas habitações para grande parte das famílias removidas. Como as casas apresentam, na maioria dos casos, baixo padrão construtivo, a indenização por benfeitoria implicaria no pagamento de um valor muito baixo, o que inviabilizaria o realoja- mento das famílias cujas casas fossem removidas. Isso demonstra de forma extremamente objetiva que a política de proteção da faixa marginal e de recuperação dos recursos hídricos têm que estar necessariamente integradas a uma política públi- ca de provisão de habitação para a população de baixa renda. Somente a possibilidade de acesso à habitação dentro do mercado formal poderá evitar que a população de baixa renda venha ocupar irre- gularmente as áreas ribeirinhas. A criação de áreas de lazer e parque lineares nas áreas de várzea ao longo das margens liberadas, com tratamento paisagístico e implantação de equipamentos seria um passo importante para impedir a invasão da área por novas habitações. As áreas de lazer, das quais a região da AP3 é extremamente carente, permitiram o estabelecimento de uma nova relação entre os moradores, grande parte deles de comunidades carentes, e o rio. Neste sentido, faz-se necessária também a recuperação da mata ciliar e das áreas de mangue, que vão atuar no sentido de minimizar a erosão e a sedimentação. O plantio de árvores e a recuperação da vegetação poderiam ser acompanhados da implantação de caminhos para bicicletas e pedestres, e lugares de descanso e contemplação da água. A região, mesmo com a retirada da população ri- beirinha, continuará marcada pela presença de fa- velas, e por isso é imprescindível a implantação de um programa de coleta de lixo adequado a este tipo de ocupação, para que as áreas liberadas e recupe- _ radas não se tornem depósitos de lixo. Estes progra- mas devem envolver a capacitação dos garis comu- nitários, e a utilização de equipamentos de peque- no porte, capazes de percorrer ruas e vielas estrei- tas. Seria interessante conceber sistemas de com- pra de lixo, como os existentes em outras cidades. NoTAS r- Nos referimos aos estudos elaborado por Victor Carneiro da Silva e Tatiana Dahmer Pereira. 2- Informação do Jornal o Globo de r6(o2(2oo6, pp.r6. BIBLIOGRAFIA ARQ UITRAÇO. Projeto Urbanístico e Paisagístico da Comunidade Parque Unidos de Acari- Rio de Janeiro: PROGRAMA FAVELA BAIRRO, agosto de 2003- BRITTO, A. L. e CARDOSO, A. L. "Crise e gestão metropolitana e desigualdades sacio-ambientais: o caso do Rio de Janeiro". 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São Paulo: EDUSP, I995· (parte IV) MAPEAMENTO AMBIENTAL E PAISAGÍSTICO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS URBANAS: EsTuDo DE cAso Do Rio CARIOCA INTRODUÇÃO Este capítulo apresenta um diagnóstico das condições ambientais e paisagísticas da bacia do Rio Carioca, no Rio de Janeiro, embasado por uma abordagem transdisciplinar que integra análises históricas, biológicas, urbanísticas e de ecologia da paisagem, através de mapeamento geo-referen- ciado que reúne indicadores tais como qualidade da água, evolução do uso do solo e cobertura vege- tal (análises temporais de 1972 e 1999), dinâmi- ca populacional (análises temporais relativas aos censos IBGE de 1991 e 2000), unidades de con- servação, configuração da fronteira floresta-malha urbana e correlação entre o sistema viário local e o adensamento construtivo, organizados coletiva- mente ao longo de um perfil topográfico longitu- dinal síntese. O Rio Carioca foi, ao longo do tempo, teste- munha e agente transformador da paisagem do Rio de Janeiro. O processo de transformação da paisagem que ocorreu nesta bacia reflete bastante bem a tensão existente entre a estruturação urba- na carioca e a natureza tropical. Primeira fonte de abastecimento d'água para seus habitantes, o Carioca foi vetor de ocupação humana em direção às encostas e indutor na preservação da floresta Atlântica carioca. Mônica Bahia Schlee Ana Luiza Coelho Netto Kenneth Tamminga Este estudo procura demonstrar as vantagens da utilização de bacias hidrográficas como recorte espacial em análises ambientais e paisagísticas, com aplicação direta no planejamento e gestão de cidades. O mapeamento ambiental e paisagístico de bacias hidrográficas apresenta-se como um ins- trumento eficaz para auxiliar planejadores, gesto- res e membros da comunidade no planejamento, preservação e na reabilitação de ambientes situa- dos às margens e nos raios de abrangência de cor- pos d'água urbanos. O processo de urbanização levado a cabo no Rio de Janeiro a partir do século XVI promoveu alterações radicais no sistema ambiental local, dei- xando profundas marcas em seus corpos d'água. Córregos, rios, lagoas e baías cariocas refletem os impactos
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