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www.esab.edu.br Economia Brasileira Economia Brasileira Vila Velha (ES) 2014 Escola Superior Aberta do Brasil Diretor Geral Nildo Ferreira Diretora Acadêmica Beatriz Christo Gobbi Coordenadora do Núcleo de Educação a Distância Beatriz Christo Gobbi Coordenadora do Curso de Administração EAD Rosemary Riguetti Coordenador do Curso de Pedagogia EAD Claudio David Cari Coordenador do Curso de Sistemas de Informação EAD David Gomes Barboza Produção do Material Didático-Pedagógico Delinea Tecnologia Educacional / Escola Superior Aberta do Brasil Diretoria Executiva Charlie Anderson Olsen Larissa Kleis Pereira Margarete Lazzaris Kleis Conteudista Stephanie Zanichelli Coordenação de Projeto Andreza Regina Lopes da Silva Líderança Técnica Design Educacional Renata Oltramari Líderança Técnica Design Gráfico Fernando Andrade Líderança Técnica Revisão Gramatical Tiago Costa Pereira Design Educacional Aline Batista Revisão Gramatical Laís Gonçalves Natalino Michela Silva Moreira Design Gráfico Laura Rodrigues Neri Gonçalves Ribeiro Diagramação Dilsonir José Martins Junior Equipe Acadêmica da ESAB Coordenadores dos Cursos Docentes dos Cursos Copyright © Todos os direitos desta obra são da Escola Superior Aberta do Brasil. www.esab.edu.br Av. Santa Leopoldina, nº 840 Coqueiral de Itaparica - Vila Velha, ES CEP 29102-040 Apresentação Caro estudante, Seja bem-vindo à disciplina de Economia Brasileira. Nesta disciplina, você terá uma perspectiva da formação histórica da economia brasileira. Inicialmente você será apresentado ao período do descobrimento e às economias agrícolas extrativistas do período colonial. Irá conhecer os motivos e as consequências da crise do café no início da década de 1930. Também conhecerá o lado econômico do golpe militar da década de 1960 e os problemas ocasionados por esse período, assim como os desafios enfrentados pelos choques do petróleo e para o controle da inflação. Por fim, irá compreender como ocorreu a estabilização econômica do Brasil na década de 1990 com o Plano Real e os desafios atuais da economia brasileira. A partir dessa compreensão histórica, você será capaz de analisar os problemas atuais do Brasil referentes à distribuição de renda, às desigualdades regionais e à questão do desemprego. Iremos conhecer os indicadores econômicos e sociais mais utilizados, assim como entender qual o papel do governo brasileiro no desenvolvimento econômico do país e como essa influência interfere no mercado de capitais e na competitividade das empresas brasileiras. Como você pode notar, temos muitos assuntos a trabalhar. Vamos iniciar! Objetivo • Entender a formação econômica e o encerramento do período do Brasil colônia. • Compreender os ciclos econômicos do açúcar e do café. • Analisar o período dos primeiros governos democráticos, em especial a crise do café. • Conhecer o período econômico durante a ditadura militar e os principais planos econômicos utilizados pelos governos até esse período. Habilidades e competências • Conhecer os principais fatores de produção que colaboraram para a formação da economia brasileira. • Identificar os esforços de industrialização dos períodos democráticos e ditatoriais. • Discutir as ferramentas de controle da inflação, a implementação do Plano Real e a inserção do Brasil no contexto internacional. • Compreender as ferramentas utilizadas pelos governos brasileiros para intervir na economia. • Entender os fatores que englobam a conjuntura econômica e como auxiliam na tomada de decisão tanto dos órgãos públicos quanto dos privados. • Analisar as políticas econômicas dos atuais governos. Ementa A formação econômica do Brasil e a moderna economia brasileira. A intervenção do Estado na economia e a nova forma de inserção da economia brasileira nos anos 1990. Plano Real. Conjuntura econômica. Sumário 1. A empresa agrícola do período colonial ..........................................................................6 2. O ciclo do açúcar ...........................................................................................................12 3. O ciclo do café ...............................................................................................................18 4. A crise do café e a crise de 1929 ....................................................................................23 5. A era populista e o golpe militar ...................................................................................28 6. Abordagem histórica da economia brasileira – parte I ..................................................33 7. Abordagem histórica da Economia Brasileira – parte II .................................................40 8. A volta à República .......................................................................................................46 9. A natureza da inflação brasileira ...................................................................................50 10. Inflação: choques externos e primeiras tentativas de controle ......................................54 11. Planos de estabilização econômica da década de 1980 .................................................58 12. Plano Collor I e II ...........................................................................................................64 13. As relações do Brasil com o exterior ..............................................................................69 14. Plano Real – parte I ......................................................................................................74 15. Plano Real – parte II .....................................................................................................80 16. A nova fase do Plano Real a partir de 2002 ...................................................................85 17. Os problemas do desenvolvimento econômico – parte I ...............................................89 18. Os problemas do desenvolvimento econômico – parte II ..............................................94 19. Desemprego e mercado de trabalho ...........................................................................101 20. Indicadores de crescimento e desenvolvimento ..........................................................107 21. Aspectos demográficos ...............................................................................................113 22. Alterações na presença do Estado no desenvolvimento brasileiro ...............................119 23. A reinserção do Brasil nos fluxos de capitais ................................................................124 24. Competitividade das empresas brasileiras ..................................................................129 Glossário ............................................................................................................................136 Referências ........................................................................................................................147 www.esab.edu.br 6 1 A empresa agrícola do período colonial Objetivo Compreender o surgimento do setor agrícola brasileiro e como este se tornou um dos principais setores da nossa economia até os dias atuais. Veremos, nesta unidade, de que maneira ocorreu a colonização do Brasil e como Portugal escolheu o sistema de produção agrícola, com base no latifúndio e na mão de obra escrava. A colonização do Brasil foi decorrente da expansão comercial dos países europeus, liderados naquele momento por Portugal e Espanha. Nesta unidade, veremos como se formou a economia brasileira no período colonial com enfoque na formação da empresa agrícola e na questão do monopólio agrícola frente às outras possibilidades de produção nas colônias. Para abordar esses temas, foi utilizada a obra “Formação Econômica do Brasil”, de Furtado (2007). 1.1 O surgimento da empresa agrícola brasileira A colonização do Brasil e da América, ocorrida no século XVI, ocorreu devido ao avanço comercial dos paíseseuropeus. Ela não foi provocada por deslocamentos demográficos, ou seja, não havia necessidade de deslocamento da população de uma região para outra, mas sim de contornar o problema de desabastecimento de matéria-prima de qualidade que até aquele momento vinha do oriente. Inicialmente Portugal não povoou as terras brasileiras, pois o seu interesse ainda estava voltado às especiarias do oriente. Porém, com a descoberta de ouro nas colônias espanholas, tanto Portugal quanto a Espanha se viram obrigados a povoá-las devido à pressão política dos demais países europeus, liderados por Holanda, França e Inglaterra. Portugal foi o primeiro país a utilizar suas colônias de maneira produtiva, que não fosse pela simples extração de metais preciosos, conseguindo, assim, financiar os gastos com a defesa de suas terras. Com www.esab.edu.br 7 esse objetivo, Portugal começou a exploração agrícola do Brasil, o que inicialmente não pareceu ser uma empresa viável, pois não havia na época nenhum produto agrícola, já produzido localmente, que tivesse uma alta demanda na Europa. Além da demanda, os fretes eram altos demais, devido ao risco do produto naufragar e aos altos custos que a empresa agrícola teria na produção e no escoamento dos produtos dentro do próprio país, por causa da distância com o restante do mundo. O desenvolvimento dessa empresa agrícola possibilitou que Portugal mantivesse suas terras na América, conseguindo financiar as defesas do país na colônia. Por isso, veremos, a seguir, quais foram os fatores que propiciaram o sucesso desse modelo de empresa agrícola no Brasil colônia. 1.2 Os fatores de êxito da empresa agrícola e as razões do monopólio agrícola Furtado (2007) afirma que o êxito da empresa agrícola portuguesa no Brasil se deve a um conjunto de fatores favoráveis. O primeiro deles é o conhecimento dos portugueses sobre a cultura em grande escala do açúcar, pois já tinham essa experiência em sua colônia nas ilhas do Atlântico. Com essa experiência anterior, Portugal adquiriu conhecimento e equipamentos para instalar os engenhos de açúcar no Brasil. Essa experiência nas ilhas do Atlântico não se limitou à produção do açúcar, mas também ao campo comercial. Os portugueses já possuíam o conhecimento dos melhores portos e tinham como parceiro comercial os holandeses, que compravam o açúcar em Lisboa, refinavam e vendiam açúcar refinado por toda a Europa. Os holandeses contribuíram não somente com a parte comercial do açúcar, mas também com o financiamento da empresa agrícola açucareira no Brasil, uma vez que financiaram tanto as instalações produtivas quanto a importação de mão de obra escrava (FURTADO, 2007). E o tipo de mão de obra utilizada também contribuiu para o sucesso da empresa agrícola. www.esab.edu.br 8 Caso fosse optado por outro tipo, que não a escrava, seria inviável trazer a quantidade necessária de trabalhadores da Europa. Além do número necessário, seria inviável o pagamento do salário desses trabalhadores, visto que, para atrair mão de obra para uma terra distante, teria que se pagar um salário acima do praticado em Portugal. Percebe-se que, apesar de não ter ocorrido um planejamento para a implantação da empresa agrícola no Brasil, houve um esforço para resolver os problemas que poderiam inviabilizar seu sucesso. Esses problemas podem ser resumidos em: técnica de produção, criação de mercado, financiamento e mão de obra. Você deve imaginar que a Espanha também seguiu por esse caminho e que suas colônias eram concorrentes no mercado de açúcar, não é mesmo? Porém, isso não ocorreu. Isso porque a Espanha, por ter descoberto rapidamente o potencial de extração de metais preciosos, concentrou-se nessa atividade e não expandiu para outras, como a empresa agrícola. Essa grande circulação de metais preciosos pela Espanha gerou uma grave crise de inflação, já que o nível de renda aumentou consideravelmente por causa dos gastos públicos e dos subsídios dados pelo governo espanhol. Demanda maior que a oferta pode gerar a inflação tipicamente conhecida como inflação de demanda, de acordo com o que foi visto na unidade 19 do módulo de Economia. Devido a essa crise de inflação, as indústrias de produto manufaturado da Espanha não conseguiam abastecer as suas colônias que ficaram restritas ao consumo de produtos artesanais. E, por causa dessa crise econômica, Portugal se manteve como monopolista no abastecimento de açúcar e produtos tropicais na Europa, possibilitando o êxito da empresa agrícola portuguesa. O tópico a seguir nos mostra como essa ligação entre Portugal e Espanha culminou para o encerramento da etapa colonial no Brasil. www.esab.edu.br 9 1.3 Encerramento da etapa colonial No início do século XVII, ocorreram grandes modificações políticas e econômicas na Europa. Para o Brasil, a principal modificação foi a incorporação de Portugal como território da Espanha. Esse fato interferiu na economia e na política do Brasil Colônia, pois a Espanha se encontrava em guerra com a Holanda (FURTADO, 2007). Como vimos anteriormente, a Holanda escoava a produção de açúcar das colônias portuguesas para a Europa. Sem essa cooperação, era impossível que o Brasil e as demais colônias distribuíssem o açúcar produzido. Como a Holanda não desejava abrir mão do controle de distribuição e do refinamento do açúcar, ela ocupou, durante 25 anos, a região produtora de açúcar no Brasil. Durante essa permanência, os holandeses adquiriram o conhecimento do processo produtivo da cana-de-açúcar e, com isso, Portugal deixou de possuir o monopólio da produção. Com essa nova concorrência, os preços do açúcar foram reduzidos pela metade no final do século XVII. Quando Portugal recuperou sua independência da Espanha, sua economia encontrava-se extremamente frágil em razão da desorganização do mercado de açúcar e da perda de sua colônia no oriente. Para conseguir manter suas colônias, Portugal se aliou à Inglaterra por meio de acordos. Esses acordos asseguravam que os comerciantes ingleses em Portugal possuíam liberdade de comércio com as colônias, bem como o controle sobre as tarifas que as mercadorias importadas da Inglaterra deveriam pagar. Em contrapartida, a Inglaterra garantia a proteção de Portugal e de suas colônias no caso de uma possível invasão holandesa ou espanhola. Além disso, com a vinda da coroa portuguesa para o Brasil, a Inglaterra passou a ter os mesmos benefícios na colônia brasileira. www.esab.edu.br 10 No final do século XVIII e início do século XIX, o Brasil já avançava na exploração do ouro e foi esse ouro que financiou a Revolução Industrial inglesa. Esse financiamento ocorreu através de um acordo entre Portugal e Inglaterra, sendo que Portugal se comprometia em comprar os produtos manufaturados ingleses e a Inglaterra em comprar o vinho português. Dica Para saber mais sobre a vinda da família real, assista ao filme “Carlota Joaquina, a Princesa do Brazil” (1995). Ele mostra, de maneira cômica, a vinda da família real portuguesa ao Brasil. Nele, é possível notar a relação de dependência entre Portugal e Inglaterra e como o Brasil passou a ter a função de metrópole durante esse período. Com a partida da família real para Portugal em 1820, a pressão para a independência do Brasil colônia cresceu, até que em 1822 a independência ocorreu por meios diplomáticos. O novo governo brasileiro garantiu aos ingleses a manutenção dos privilégios do período colonial, para que negociassem com Portugal a separação do Brasil sem a necessidade de haver conflito. Com esse acordo, assinado em 1827, o governo inglês negociou a independência do Brasil com o governo português. Contudo, o governo brasileiro precisou limitar a sua soberania econômica, pois ficou dependente dos favores ingleses e teve que manter os benefícios que estes possuíam quando a família real estava instalada no Brasil, entre eles: a abertura dos portos aos produtos ingleses e a isenção nos impostosde importação. Note que o processo de independência ocorreu devido à necessidade de a colônia brasileira manter o comércio com as demais nações, o que só foi possível com a vinda da família real ao Brasil, pois anteriormente, com o Pacto Colonial, o Brasil só poderia comercializar com Portugal. Pacto Colonial foi o nome dado para a forma de relação entre a colônia e a metrópole. www.esab.edu.br 11 Nessa relação, a metrópole tinha exclusividade na exploração das riquezas da colônia, assim como na comercialização de seus produtos. O Brasil só poderia vender seus produtos para Portugal, como só poderia comprar os produtos portugueses. Com a vinda da família real ao Brasil o Pacto Colonial se desfez, pois para adquirir os produtos consumidos pela corte portuguesa o Brasil teve que abrir seus portos para os demais países. Com a independência da colônia e com o fim do monopólio do açúcar, foi necessário que o Brasil desenvolvesse outras culturas para possibilitar o crescimento econômico do país recém-criado. Assim, iremos abordar na unidade 2 e 3 quais foram essas novas culturas. Nesta unidade, vimos que a criação de uma empresa agrícola eficiente, com a cultura do açúcar e a utilização da mão de obra dos escravos, propiciou as condições para o povoamento e o desenvolvimento da colônia portuguesa no Brasil. Foi essa empresa agrícola que formou as bases da nossa economia atual e possibilitou a negociação da independência do Brasil. Você verá, a seguir, a importância do ciclo do açúcar para o desenvolvimento da região nordeste e para a expansão territorial dessa região. www.esab.edu.br 12 2 O ciclo do açúcar Objetivo Analisar o ciclo do açúcar e sua contribuição para a expansão territorial do complexo econômico nordestino. Vimos, na unidade 1, os fatores que contribuíram para que Portugal tivesse sucesso ao criar a empresa agrícola brasileira, nesse primeiro momento focada na produção de açúcar. Com o auxilio do trabalho de Furtado (2007), veremos, nesta unidade, como ocorreu essa implementação em solo brasileiro e como funcionava o fluxo de renda e de crescimento no período que ficou conhecido como o ciclo do açúcar. 2.1 O ciclo do açúcar no Brasil e seu fluxo de renda e crescimento O esforço português não ocorreu somente nas parcerias com a Holanda, mas também com os donatários de terra. A eles foram dados diversos privilégios sobre as terras na colônia brasileira, entre eles estão a exclusividade na produção de moenda e de engenho d’água, isenção de tributos, garantia contra a penhora dos instrumentos de produção, honrarias e títulos, entre outros. Com relação à mão de obra, o plano inicial era utilizar a indígena, porém esta se mostrou inviável, devido à quantidade de mão de obra necessária para a produção da grande escala requerida pelos engenhos, o que demonstrou que a escravidão era essencial aos colonos naquele período. A mão de obra escrava africana foi utilizada no momento em que era preciso expandir a empresa agrícola, após a rentabilidade desta já ter sido comprovada e tornar a produção mais eficiente e com mais recursos financeiros. www.esab.edu.br 13 Em decorrência da escolha de mão de obra escrava, a renda estava concentrada nas mãos dos proprietários de engenho e dos donos de canaviais. Apenas uma parte dessa renda, menor do que cinco por cento, correspondia a pagamentos por serviços prestados fora do engenho, como transporte e armazenamento (FURTADO, 2007). Havia também alguns assalariados, sendo eles homens de vários ofícios (feitores, mestres de açúcar, caldeireiros, entre outros) e supervisores do trabalho dos escravos. O engenho realizava alguns outros gastos monetários, principalmente na compra de gado, utilizado para tração; e de lenha, utilizada nas fornalhas. Essas compras mantinham o vínculo entre a economia açucareira e os demais núcleos de povoamento existentes no país. (FURTADO, 2007, p. 51). Os senhores de engenho possuíam muitos recursos financeiros disponíveis, sendo capazes de investir em seus engenhos e aumentar em até dez vezes a produção de açúcar até o final do século XVI (FURTADO, 2007). Porém, o que se percebe é que esse aumento de produção só ocorria quando o mercado externo possuía capacidade de absorção. Com essa informação, salientamos que a tomada de decisão com relação à comercialização gerenciava toda a indústria do açúcar na colônia. Portanto, a renda que não era reinvestida no aumento de produção ficava para os comerciantes do açúcar, explicando a coordenação entre a comercialização do açúcar e os níveis de produção dos engenhos. Podemos afirmar, com base no que estudamos na unidade 1, que inicialmente tanto o capital quanto os equipamentos necessários e a mão de obra eram importados. Depois de instalado o engenho e estando em operação, o processo de expansão seguia o mesmo padrão de gastos: importação de equipamentos, de materiais de construção e de mão de obra escrava. Logo, a diferença entre o custo de reposição e de manutenção da mão de obra escrava representava o lucro para o empresário agrícola. O conjunto de fatores necessários para o funcionamento da economia e os fatores de produção estavam nas mãos dos senhores de engenho. Toda a renda era obtida através da exportação, assim como os gastos eram todos realizados com o exterior, ou seja, percebidos pelo valor das importações. www.esab.edu.br 14 Qual a capacidade de crescimento dessa estrutura? Pelo ponto de vista da disponibilidade de território e da disponibilidade de capital, havia um amplo espaço para crescimento. Porém, como vimos, o crescimento foi comedido para que não ocorresse um superabastecimento, nem a redução dos preços e da lucratividade dos empresários. Ocorreram crescimentos nesse setor produtivo, mas sem que ocorresse grande alteração na estrutura do sistema econômico, sendo então um crescimento puramente na extensão do negócio. Ou seja, a empresa do açúcar crescia em tamanho e em produção, entretanto não havia mudanças que provocassem o surgimento de mercado interno para essa produção ou novas fontes de receita. Não era possível que um impulso externo gerarsse um processo de desenvolvimento. Portanto, a única renda afetada pelas modificações na produtividade foi o lucro dos empresários. Essa economia escravista exportadora estava ligada totalmente à demanda externa. Assim, as reduções de preço no mercado externo não afetavam a estrutura do sistema, já que o empresário continuava produzindo o máximo de sua capacidade, pois uma redução na utilização da capacidade produtiva levaria os empresários a perdas maiores, por causar ociosidade nos escravos e a consequente perda de investimento. O ciclo do açúcar persistiu no nordeste brasileiro por três séculos, com momentos de crise durante a extração mineral, porém retomando sua importância econômica no início século XIX. Como vimos na unidade anterior, Portugal precisava afirmar sua posse da colônia, através da ocupação do território. Veremos, a seguir, como as demais atividades econômicas do período auxiliaram nessa tarefa. www.esab.edu.br 15 2.2 O movimento de expansão territorial e a inserção da pecuária Furtado (2007) afirma que o ciclo do açúcar na região do Nordeste brasileiro trouxe consequências diretas e indiretas para as outras regiões da colônia. A primeira consequência direta foi a criação de um mercado, ou seja, surgiu uma demanda para atender às necessidades de gêneros alimentícios e de consumo dos empresários do café, capaz de absorver a produção de outras atividades econômicas. Entretanto, inicialmente essa demanda foi direcionada para as importações. Isso ocorreu por causa do baixo frete dos navios utilizados para o comércio de açúcar e também pela preocupação em não criar uma atividade na colônia que pudesse concorrer com a metrópole. As atividades secundárias inseridas pelo cultivo do açúcar foram a criação de animais para consumo próprio e para percorrer grandes distâncias,além da extração da madeira. Com relação ao gado, com o decorrer do tempo foi proibido o cultivo nas terras do litoral pelo governo português, por causa da invasão dos animais nas plantações de açúcar. Foi essa separação da atividade agrícola e do cultivo de animais que deu origem a uma nova atividade econômica, a pecuária, que se iniciou no nordeste e migrou para a região sul da colônia. Porém, ela tinha características totalmente diferentes da atividade agrícola. Primeiramente, a ocupação da terra, apesar de ser extensiva, era itinerante, devido ao regime de águas e as distâncias dos mercados consumidores que exigiam a movimentação dos animais. Com relação à expansão, a pecuária estava sempre aproveitando as oportunidades de crescimento ao se deparar com terras a serem ocupadas, não se contendo pelas condições de demanda. Por causa dessas características, a pecuária foi fundamental para a ocupação do território no interior do Brasil. www.esab.edu.br 16 Precisamos ter em mente, que pelo menos no início, a pecuária não possuía a rentabilidade da produção agrícola, sendo essa renda composta pelo gado vendido no litoral e a exportação de couros. Com relação à expansão do território brasileiro, esta ocorreu primeiramente em todo o litoral até a foz do rio Amazonas com o cultivo da cana-de-açúcar. Porém, o interior ainda não era habitado. Para não perder suas terras, Portugal enviou tropas fixas e colônias de povoamento para as regiões hoje conhecidas como: Maranhão, Pará, São Vicente e Piratininga. As colônias de Piratininga e de São Vicente iniciaram suas atividades econômicas através da captura de escravos indígenas quando o mercado de escravos africanos apenas iniciava. As colônias do Maranhão e do Pará também tentaram esse caminho, dedicando-se ao o cultivo de fumo e produtos tropicais; porém, com o declínio de Portugal, o envio de recursos para essas colônias diminuiu, e elas precisaram desenvolver a agricultura de subsistência. No século XVIII, a região do Pará passou a exportar produtos tropicais como a baunilha, o cacau, a canela e o cravo. Aos jesuítas foi atribuída a responsabilidade de organizar a mão de obra indígena para a colheita desses produtos de maneira voluntária e, com isso, contribuíram para a ocupação da Bacia Amazônica e para a expansão da colheita de uma nova mercadoria. Saiba mais Os jesuítas tiveram grande importância na colonização brasileira, assim como no relacionamento com os indígenas. Para conhecer mais sobre a influência dos jesuítas na expansão territorial e na colonização brasileira, assista ao vídeo “A conquista da terra e da gente”, clicando aqui. http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=20485 http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=20485 www.esab.edu.br 17 A expansão territorial da colônia também ocorreu a partir de motivos políticos e de defesa, como nos casos do Maranhão, Pará e Piratininga, afinal, como vimos na unidade 1, sem o povoamento, os direitos de propriedade não eram considerados como de Portugal para os demais países europeus. Assim, para o país se defender de possíveis invasores, tornou-se necessária a expansão territorial para o interior da colônia. O ciclo do açúcar, apesar de não ter se encerrado, foi enfraquecido ao longo do tempo, em decorrência das baixas dos preços e perdeu importância econômica para a extração de ouro e também para o ciclo do café. Vimos, nesta unidade, que o ciclo do açúcar propiciou a ocupação da colônia e o desenvolvimento de uma atividade econômica lucrativa, que atraiu a atenção de Portugal para o Brasil. O ciclo do açúcar propiciou ao Brasil o surgimento de um molde de produção agrícola que se perpetuou durante muito tempo, como veremos nas unidades seguintes, do século XVI ao XIX. Foi para atender à demanda por produtos alimentícios dos engenhos de açúcar que novas atividades foram desenvolvidas, como a pecuária, a extração de especiarias e o plantio do algodão. Na próxima unidade, iremos conhecer como se deu a cultura do café e quais foram as mudanças decorrentes desse ciclo. www.esab.edu.br 18 3 O ciclo do café Objetivo Entender como chegou ao fim o período colonial e as consequências desse período para a economia brasileira, assim como relatar o início do ciclo do café. Na unidade anterior, vimos que o ciclo do açúcar foi importante para o Brasil, pois mostrou que a atividade agrícola poderia ser bastante lucrativa. Além disso, foi através desse ciclo que os moldes da empresa agrícola foram instalados e propiciaram o cenário adequado para o cultivo do café. Com a crise na Europa, em decorrência das Guerras Napoleônicas, ocorreu uma estagnação do preço do açúcar em patamares muito baixos e uma redução da extração de metais preciosos. Em razão da proibição de importação de novos escravos – por parte da Inglaterra – a todos os países, a economia brasileira no final do século XVIII se encontrava estagnada. Ademais, os avanços percebidos pela sociedade, em decorrência da vinda da família real portuguesa ao Brasil, foram: a instalação de uma capital administrativa no Rio de Janeiro, a criação de um banco nacional e algumas iniciativas governamentais. Porém, não se observa no Brasil uma influencia da Revolução Industrial de 1770, que se iniciou na Inglaterra por meio da máquina a vapor (entre outras características), a não ser pelos bens de consumo, o que em nada alterou o sistema produtivo da colônia. Então, qual alternativa se apresentava para que o Brasil pudesse superar essa estagnação econômica? Veremos que, para superar a estagnação econômica do período, o Brasil tentou encontrar outro produto para importação que substituísse o café. www.esab.edu.br 19 3.1 Gestação da economia cafeeira Furtado (2007) afirma que a estagnação não poderia ser superada através do mercado interno, pois não havia no período complexidade suficiente na sociedade – dividida em senhores de engenho, culturas de subsistência, escravos e trabalhadores assalariados – que levasse a um desenvolvimento de tecnologia de produção. Também não havia crédito disponível, tanto no Brasil quanto nos demais países, para financiar uma geração de mercado interno, uma vez que o Brasil não apresentava projetos atrativos ou garantias para oferecer pela tomada de empréstimo. Portanto, uma maneira de sair da estagnação era expandir novamente o comércio internacional. No entanto, os preços dos produtos tradicionais de exportação brasileira, como açúcar e algodão, não apresentavam perspectivas de melhoria. O açúcar, como vimos na unidade 2, não apresentava uma melhoria em seus preços. Já o comércio de algodão, segundo produto na pauta de exportações, estava concorrendo com a produção dos Estados Unidos, efetuada em larga escala e que mantinha comércio direto com a Inglaterra. Esses fatores contribuíram para a queda na demanda do algodão brasileiro e à consequente redução dos preços no mercado mundial. Os demais produtos, como fumo, couro, arroz e cacau, tinham um peso menor nas exportações, sem grandes perspectivas de expansão. Considerando que não havia capital, nem mão de obra disponíveis, já que estes estavam estagnados na indústria açucareira ou deslocados para serviços domésticos, era necessário encontrar um produto que utilizasse a terra como principal fator de produção, visto que esta era abundante no país. Por volta da metade do século XVIII, promoveu-se o café como item de consumo dos países europeus e dos EUA atendendo às necessidades do Brasil, porque esse produto já era cultivado por todo o país para o consumo próprio, mas passou a assumir importância mundial depois da queda de produção do Haiti, que era o principal produtor nesse período. Assim, a cultura do café foi centralizada na região sudeste do país devido à evasão das minas de ouro, à mão de obra abundante e à proximidade com o porto de Santos. www.esab.edu.br 20 A empresacafeeira, assim como o açúcar, era intensiva na utilização de mão de obra escrava, todavia a diferença entre essas empresas estava no grau de capitalização. A empresa cafeeira possuía uma capitalização mais baixa, pois o equipamento necessário era mais simples e com fabricação local, enquanto a empresa açucareira tinha um grau maior de capitalização, visto que seu maquinário era mais caro e muitas vezes importado. Devemos, contudo, lembrar que tanto o café quanto o açúcar são culturas permanentes, ou seja, os cafeicultores teriam o retorno do investimento após alguns anos. Podemos, então, explicar o desenvolvimento tão intenso da empresa cafeeira pelos seus baixos custos. Somente um aumento no preço da mão de obra poderia atrapalhar seu desenvolvimento, o que não ocorreu, já que a cultura do café foi desenvolvida com base na mão de obra excedente da região de mineração. A alta do preço do café após a metade do século XVIII, em decorrência do aumento do consumo e da queda de produção do Haiti, fez pressão para uma transferência da mão de obra escrava da região nordeste para o sul do país. Vale ressaltarmos que, durante a etapa de gestação da economia cafeeira, formou-se uma classe empresarial a partir da acumulação de capital procedente do comércio e do transporte de mercadorias para abastecer a cidade do Rio de Janeiro, onde se localizava o maior mercado consumidor do país no período. Essa nova classe tinha como objetivos: aquisição de terras, recrutamento de mão de obra, organização e direção da produção, transporte interno, comercialização nos portos, contatos oficiais e interferência na política financeira e econômica (FURTADO, 2007). Ao se concluir a fase de gestação da economia cafeeira, o problema da expansão do comércio internacional já estava resolvido. Essa nova economia já possuía capacidade para autofinanciar suas expansões e formou uma nova classe que liderou a expansão do café por meio de ferramentas políticas. Porém, surgiu um novo problema a ser resolvido: a mão de obra. www.esab.edu.br 21 3.2 O problema da mão de obra: o fim do trabalho escravo, o trabalho assalariado e os imigrantes europeus A oferta de mão de obra se tornou um problema, porque, com a proibição da importação de escravos, a quantidade de escravos em terras brasileiras estava diminuindo devido às condições precárias nas fazendas, tanto de alimentação quanto no trabalho. Assim, para a cultura do café poder expandir-se, era necessário encontrar uma solução urgente para esse problema (FURTADO, 2007). Não existia mão de obra interna no país, isso porque o setor de subsistência da economia brasileira estava disperso de norte a sul, com densidade demográfica mínima. Além disso, os roceiros estavam ligados ao setor pecuário, sendo que os pecuaristas ofereciam a terra para o plantio de subsistência e, quando necessário, utilizavam essa mão de obra para o que precisassem. Havia nessa relação uma fidelidade. Entretanto, nas zonas urbanas também havia se formado um excedente de mão de obra, a qual não encontrava ocupação permanente, pela dificuldade de adaptação, pelas condições de vida e pela disciplina de trabalho impostas nas grandes fazendas. Percebendo essa falta de adaptação, a sociedade concluiu que a mão de obra livre do país não conseguia trabalhar nas grandes fazendas (FURTADO, 2007). Considerando que a mão de obra escrava formou a base da economia e da estrutura social do Brasil, a abolição foi vista como um empobrecimento de parte da população que era responsável pela criação de riqueza no país. Do ponto de vista econômico, a abolição repercutiu somente na forma de organização da produção, em como os fatores seriam aproveitados, na distribuição de renda e na maneira com que essa renda seria utilizada. No Brasil, ocorreram dois movimentos distintos a partir da abolição. No nordeste, a mobilidade dos escravos foi limitada devido à falta de terras desocupadas no litoral, aos centros urbanos lotados e à característica árida do interior da região, sendo esta de difícil adaptação. Assim, os ex-escravos se deslocavam entre os engenhos à procura de trabalho e, por causa disso, os salários na região eram relativamente baixos. www.esab.edu.br 22 Na região cafeeira, as consequências da abolição foram outras. Não houve tanta migração dessa mão de obra para o planalto paulista, já que se iniciava a migração dos europeus para São Paulo. Nas regiões de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, a situação dos ex-escravos era mais favorável. Parte deles se dedicou à economia de subsistência, pois existiam terras disponíveis e outra parte passou a trabalhar nas lavouras de café dessas regiões em troca de salários relativamente altos. Porém, esse aumento do salário, bem acima das necessidades dos antigos escravos, fez com que parte desses trabalhadores preferisse o ócio ao trabalho, visto que em três dias já garantiam renda suficiente para adquirir o necessário para a sua sobrevivência pelo restante do mês. Em decorrência desses problemas com mão de obra interna e ex-escrava, em períodos de maior pressão da produção do café, a importação de mão de obra surgiu como uma solução. Dessa forma, com o agravamento do problema da mão de obra pela pressão dos preços do café e também do algodão, em 1852, um grande cafeicultor decidiu trazer 80 famílias da Alemanha para trabalharem em sua lavoura. Esse movimento aumentou e outras fazendas fizeram o mesmo, mas o trabalhador arcava com todos os custos e as incertezas de sua vinda, sendo, portanto um regime de semisservidão. A partir de 1860, ocorreu uma evolução: o colono passou a ter garantido um pagamento fixo e outro variável após a colheita. Além disso, a questão do custeio da viagem foi solucionada, pois o governo se encarregava dos custos de transporte dos imigrantes e o fazendeiro cobria os gastos do imigrante durante o primeiro ano. Além disso, colocava terras à disposição para a agricultura de subsistência. Com a crise política na Itália no período, a imigração para o estado de São Paulo chegou a 800 mil pessoas no final do século XIX, sendo 577 mil vindas desse país. Assim, o problema da mão de obra estava solucionado e a economia brasileira tinha encontrado um novo produto exportador, capaz de movimentar não somente o seu setor como os demais. Veremos, a seguir, como ocorreu o declínio do ciclo do café e os efeitos da crise de 1929 na economia brasileira. www.esab.edu.br 23 4 A crise do café e a crise de 1929 Objetivo Compreender como o cultivo do café alterou o fluxo de renda no Brasil e modificou a estrutura da mão de obra. Na unidade anterior, vimos como o ciclo do café iniciou no Brasil e como, a partir dele, o problema de escassez de mão de obra foi resolvido. Em razão da nova mão de obra vinda (em sua maioria, dos países europeus), configurou-se uma nova classe trabalhadora e assalariada no país. Além disso, o café trouxe enormes lucros para seus produtores, alterou o eixo econômico do país da região norte para a região sudeste, trouxe para a região sudeste grandes plantações e teve grande influência no novo governo que se formou. Porém, as diversas crises mundiais estabeleceram novos desafios a essa produção. Veremos, nesta unidade, quais foram os meios de defender a produção e a rentabilidade desse setor. Para isso, continuaremos a utilizar a obra de Furtado (2007). 4.1 Os mecanismos de defesa do café Como vimos na unidade 3, o final do século XIX foi muito favorável para a expansão do café no Brasil. Com o problema da mão de obra resolvido e muitas terras disponíveis para o cultivo do café, havia uma tendência de haver, em longo prazo, uma redução do preço do café. E isso ocorreu pelo equilíbrio do mercado (FURTADO, 2007). Como você deve ter estudado na disciplina de economia, quando há muita oferta, ocorre uma redução no preço do produto. Mas, você deve estar se questionando: por que a produção do café se expandiu se havia a tendência de redução do preçopelo aumento da oferta? Destacamos que, no Brasil, o café era o produto que apresentava maior vantagem relativa para o comércio internacional. De acordo com a teoria do economista David Ricardo, o país irá escolher para produzir os bens que tiveram maior vantagem relativa e passará a importar os www.esab.edu.br 24 bens que possuírem menor vantagem relativa. Apesar de o café não ter um aumento de demanda significativo, havia, no período, terras ociosas, crédito e mão de obra disponíveis. E por conta desses três fatores abundantes, o Brasil controlava a produção de ¾ da oferta mundial de café (FURTADO, 2007), possibilitando aos empresários brasileiros controlarem a quantidade e o preço do café ofertado no comércio internacional. Com esse controle, foi possível que os empresários se defendessem contra a queda de preços no início do século XX, através do controle da oferta. O café que não foi comercializado no período de baixa seria estocado e vendido em períodos mais favoráveis, com relação ao preço ou para cobrir períodos de baixa colheita. Outro mecanismo de proteção do café utilizado foi a depreciação externa da moeda, assim, ainda que o preço do café no exterior se tornasse mais barato, o produtor receberia a mesma quantia de moeda nacional. Esse mecanismo foi utilizado durante a crise nos EUA de 1893. Já na depressão de 1897, foi preciso retirar do mercado parte dos estoques de café que se acumulavam no país. No Convênio de Taubaté, firmado em 1906, os cafeicultores juntamente com o governo definiram que, para manter a rentabilidade do setor e o preço do produto, o governo compraria os excedentes de café por meio de empréstimos estrangeiros que seriam quitados através de um imposto em ouro sobre as exportações do café. Além disso, definiu-se que, a fim de evitar problemas futuros de superprodução, os governos estaduais seriam responsáveis por desencorajar a expansão das plantações. Para que os governos estaduais pudessem evitar o crescimento da produção do café, seria fundamental apresentar aos empresários uma nova oportunidade de investimento tão lucrativa quanto o café. Entretanto, nesse período, nenhuma produção parecia viável do ponto de vista da disponibilidade dos fatores de produção. Furtado (2007, p. 178) afirma que, através desse mecanismo de defesa da economia cafeeira, ocorreu uma “[...] transferência para o futuro da solução de um problema que se tornaria cada vez mais grave”, como veremos no tópico a seguir. www.esab.edu.br 25 4.2 A crise de 1929 e suas consequências para o Brasil Vimos, no tópico anterior, que existia um desequilíbrio entre a quantidade ofertada e a quantidade demandada no mercado de café. Assim, os estoques de café estavam se acumulando e a situação se agravou a partir de 1929, com a crise da bolsa de Nova York. A Grande Depressão, como foi chamada a crise da bolsa de Nova York em 1929, foi uma crise de confiança no mercado financeiro. Descobriu- se, no período, que muitas das ações negociadas na bolsa de Nova York eram de empresas fantasmas, ou seja, não existiam de fato somente no papel. Por conta disso, ocorreu uma retirada em massa do capital investido em bolsa de valores. A partir disso, muitas empresas faliram e muitos investidores perderam todo o seu capital. A partir dessa crise, cabia ao governo e aos empresários do café resolverem os seguintes problemas (FURTADO, 2007). • Os empresários deveriam colher o café ou deixá-lo apodrecer nos arbustos? • Se a escolha fosse colher o café, que destino deveria ser dado? As opções seriam: forçar o mercado mundial, reter o café em estoques ou destruí-lo? • Caso a decisão fosse estocar ou destruir o produto, como financiar essa operação? Inicialmente, a solução mais racional seria abandonar os cafezais. Porém, restava a questão de quem pagaria pelas perdas. O cenário de estoques altos até 1929 gerou uma redução nas reservas de ouro e de metais preciosos do Brasil, e a falta de crédito disponível no mercado internacional para o financiamento ocasionou a falta de recursos para manter a valorização do café. Dessa forma, os comerciantes internacionais de café transferiram para os produtores brasileiros os seus prejuízos com a crise mundial. Além disso, todo o cenário descrito anteriormente levou a uma desvalorização da moeda brasileira e, com isso, o preço das importações subiu e as perdas www.esab.edu.br 26 do café foram transferidas para toda a sociedade brasileira. Portanto, era necessário adotar novas medidas para atenuar o problema do café. Com todo esse cenário, a decisão mais lógica a ser tomada foi a destruição dos excedentes das colheitas: pois, qualquer outro mecanismo faria com que os produtores continuassem colhendo cada vez mais café, pressionando o preço para baixo e o câmbio para cima. Com a queima de parte da quantidade ofertada de café, obtinha-se novamente o equilíbrio entre a oferta e a demanda, a partir de um nível maior de preços (FURTADO, 2007). Nos anos seguintes, principalmente a partir de 1933, notou-se uma recuperação na economia mundial. Porém, os preços do café não acompanharam essa melhoria. Podemos perceber que o fator renda não interferia na demanda de café, assim como o efeito preço, ou seja, as alterações de preço tanto para mais quanto para menos, demonstraram alterar pouco a quantidade demandada. Furtado (2007) afirma que, em 1933, o consumo de café era exatamente igual ao de 1929. Todavia, para a economia brasileira de modo geral, a política de destruição e de retenção do café excedente garantiu a manutenção do nível de emprego, tanto para os setores ligados à exportação quanto para o mercado interno. Como não houve uma redução nas rendas dos produtores e dos exportadores de café, também não houve uma redução em seu consumo interno, o que manteve o consumo dos produtores nacionais. Caso isso não tivesse ocorrido, toda a economia brasileira no período poderia ter sofrido uma perda da renda nacional. Estudo complementar Para saber mais sobre como ocorreu a crise de 1929, e como os EUA superaram a crise através da teoria keynesiana, leia o artigo: “Keynes e a superação da crise”, clicando aqui. http://educaterra.terra.com.br/voltaire/mundo/crise_economia6.htm www.esab.edu.br 27 Essa política de proteção do café explica o fato de que, em 1933, a renda nacional já estava em expansão, ou seja, o impulso para que a economia voltasse a crescer já tinha sido recuperado (FURTADO, 2007). No entanto, devemos ressaltar que o setor externo da economia brasileira ficou bastante endividado nesse período e os grupos de pressão – como a classe média urbana, os industriais, os comerciantes e os banqueiros internacionais – exigiam maior participação no poder político. Na próxima unidade, veremos como ocorreu esse aumento de poder dos demais setores da população e como os problemas de inflação e de endividamento foram tratados pelos governos seguintes culminando no golpe militar de 1964. www.esab.edu.br 28 5 A era populista e o golpe militar Objetivo Refletir historicamente sobre o populismo e a ditadura abordando aspectos políticos, econômicos e sociais. Vimos, até a unidade 4, como o país se desenvolveu economicamente a partir da empresa agrícola, inicialmente com o ciclo do açúcar e, em seguida, o cultivo do café. Na unidade anterior, vimos que o cultivo do café teve muita importância para as mudanças sociais, políticas e econômicas ocorridas no Brasil. Veremos, a partir desta unidade, como as políticas econômicas influenciaram no desenvolvimento econômico, político e social do Brasil até os dias atuais. Para isso, utilizaremos a obra de Vasconcellos, Gremaud e Toneto Júnior (2011). Iniciaremos com o período posterior à crise de 1929, para entendermos quais foram as medidas adotadas pelo governo do período para contornar a crise. 5.1 A era populista – 1930 a 1964 Chamamos o período de 1930 a 1964 de era dos governos populistas, pois estes tinham como característicaprincipal agradar aos mais variados grupos de pressão existentes na sociedade. A partir de 1930, depois da eleição de Getúlio Vargas, o governo federal passou a centralizar as decisões de políticas econômicas. Com isso, tornou-se possível ao governo realizar uma maior intervenção na economia, tendo este um papel de empresário, por abrir diversas empresas com a intenção de gerar a infraestrutura necessária para o fortalecimento de um novo setor, a indústria. Foi nesse período que tivemos a criação de diversas empresas estatais – como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a Companhia Vale do Rio Doce – e de leis trabalhistas – como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que estabeleceu o salário mínimo e o descanso semanal remunerado. www.esab.edu.br 29 Além disso, entre as políticas de fortalecimento da indústria está o Programa de Substituição de Importações (PSI), que teve como principal objetivo reduzir o percentual das importações dentro do Produto Interno Bruto (PIB). A preocupação com essa redução objetivou equilibrar a balança de pagamentos do Brasil, visto que, com a crise do café, houve uma redução nas exportações e o saldo da balança passou a ser negativo. Para contornar esse problema, o governo decretou moratória da dívida externa em 1937, o que impôs um controle na utilização dos recursos externos e dificultou a utilização desses recursos, que só eram permitidos para a aquisição de bens essenciais e para o pagamento de compromissos externos (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). Assim, o crescimento da economia nesse período foi ditado pelo crescimento do mercado interno, através da proteção dada à produção nacional em relação aos concorrentes externos. Portanto, percebemos que o PSI caracterizava-se por um ideal de construção nacional. Os mecanismos utilizados para a produção da indústria nacional foram a desvalorização cambial, o controle do câmbio, as taxas múltiplas de câmbio (em que cada setor da economia tem um mercado de câmbio específico) e a elevação das tarifas de importação (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). Porém, a implantação desse programa encontrou dificuldade relacionadas à tendência de desequilíbrio da balança comercial, ao aumento da concentração de renda e à escassez de fontes de financiamento, cabendo ao governo federal prover as fontes de financiamento. Uma das fontes de financiamento foi a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES) em 1952, além de usar recursos do já existente Banco do Brasil. Dando continuidade ao PSI e ao governo fundamentado no populismo, em 1956 o presidente Juscelino Kubitschek (JK) adotou o Plano de Metas, que tinha como objetivo fazer com que o país crescesse 50 anos em 5. Esse crescimento estava embasado em três pontos: investimento em infraestrutura (transporte e energia elétrica); aumento da produção de bens intermediários (aço, carvão, cimento); e introdução de indústrias de bens de consumo duráveis e de bens de capital. Vasconcellos, Gremaud e Toneto Júnior (2011) afirmam que o cumprimento das metas foi satisfatório, observando-se rápido crescimento econômico no período, com mudanças estruturais da base produtiva brasileira. www.esab.edu.br 30 O ponto problemático do Plano de Metas era sua fonte de financiamento, pois os investimentos públicos realizados precisaram ser financiados por meio de emissão de moeda, resultando em um crescimento do processo de inflação no período. Com a eleição de Jânio Quadros em 1961, foi necessário reorganizar a política fiscal e o balanço de pagamentos, em decorrência do problema de financiamento do Plano de Metas. Esse governante, por falta de apoio político, renunciou e seu vice João Goulart assumiu o país em meio a um cenário político e econômico turbulento. Com a intenção de diminuir a inflação, João Goulart propôs o plano trienal, que tinha como base a substituição de produtos importados e uma política de redistribuição de renda, em uma tentativa de elevar a taxa de crescimento do país. Porém, para realizar esse plano ocorreu uma aumento dos impostos, dos salários e da tomada de empréstimos estrangeiros. Como não houve reformas de base, o plano gerou mais revolta popular e culminou com o golpe militar em 31 de março de 1964, que veremos a seguir. 5.2 A era ditatorial – 1964 a 1984 Com a crise dos anos 1960, houve uma queda acentuada nos investimentos na indústria assim como da taxa de crescimento da renda nacional e ocorreu uma forte aceleração da inflação. Com o golpe militar em 1964, propôs-se uma série de reformas institucionais e de condução da política econômica, entre elas o Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG), lançado pelo presidente Castello Branco. O PAEG tem como área de atuação as conjunturas políticas de combate à inflação e também as reformas estruturais. Para o combate à inflação, foram adotadas as seguintes medidas: redução do déficit público, com redução de gastos e do aumento das receitas através de reforma tributária e aumento das tarifas públicas; restrição do crédito; e uma política salarial, com determinação dos ajustes salariais via governo para contenção da demanda (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). A partir dessas medidas, a inflação foi reduzida, entre 1964 e 1968, de 90% a.a. para 20% a.a., preparando a economia para a retomada do crescimento no período seguinte. www.esab.edu.br 31 A partir de 1968 até 1973, o Brasil viveu o período chamado de “Milagre Econômico”. Esse período foi caracterizado pela estabilidade dos preços e por uma taxa média de crescimento acima dos 10% a.a. Essas altas taxas tiveram como fonte a retomada do investimento público em infraestrutura, o aumento do investimento das empresas estatais, o aumento da demanda por bens duráveis, o crescimento do setor de construção civil e o crescimento das exportações. Gremauld, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 388) comentam que, nesse período, houve o primeiro endividamento externo no governo militar. E esse endividamento, de US$ 9 bilhões, foi facilitado pelo excesso de recursos internacionais disponíveis. Além disso, houve um alto endividamento interno decorrente do controle do Estado sobre as decisões de investimentos, tanto da administração pública quanto das empresas estatais, que correspondiam a 50% da formação bruta de capital fixo. Ocorreu também um aumento na concentração de renda, que ficou conhecido como “Teoria do Bolo”: era necessário esperar o bolo crescer para depois dividir. Após esse rápido crescimento no período do Milagre econômico, houve o surgimento de alguns desequilíbrios que retomaram o avanço da inflação e os desequilíbrios da balança comercial. Por conta disso, o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) foi lançado, em 1974, para resolver a questão do choque do petróleo, que desequilibrava ainda mais a balança comercial brasileira – já que o preço do barril de petróleo aumentou 400% em cinco meses no ano anterior. O objetivo desse plano era ajustar a estrutura de oferta no longo prazo, a fim de diminuir as importações e fortalecer as exportações. De fato, após diversas alterações na economia, ocorreu um redirecionamento para o setor de insumos, de máquinas e de equipamentos (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). Em 1980, houve uma nova tentativa de retomada do crescimento e de redução da inflação, mas essa política teve como resultados a aceleração da inflação para 100% a.a. e uma crise da dívida externa. Para resolver essa crise, que foi diagnosticada como resultado do excesso de demanda interna que pressionava as importações, adotou-se, em 1982, uma política que procurou conter os gastos públicos, restringir o crédito e www.esab.edu.br 32 reduzir o salário real, assim como desvalorizar a moeda, aumentar o preço dos combustíveis e estimular a competitividade das indústrias nacionais através da diminuição dos subsídios. Todas essas medidas buscavam resolver a crise da inflação.Como resultado, o país entrou em recessão de 1981 a 1983, com inflação em 100% a.a., porém com um superávit da balança comercial. Ao mesmo tempo, ocorreu no país uma abertura política que ocasionou um forte questionamento sobre a condução das políticas econômicas adotadas pelo governo. Ademais, pesava sobre o governo a opinião de que se deveria decretar moratória da dívida e, com isso, não sacrificar o crescimento econômico. Esses questionamentos motivaram o amplo apoio ao movimento “Diretas Já”. Assim, em um período de crise econômica e de alta inflação, em que a população mostrava-se resistente às políticas adotadas pelo governo militar, o regime se encerrou. Saiba mais Para compreender melhor como ocorreu o movimento das “Diretas Já”, leia o artigo clicando aqui. O fim do regime militar trouxe a esperança do controle da inflação sem o sacrifício do crescimento econômico e da população para a quitação da dívida externa brasileira. Nas unidades seguintes, veremos como os governos tentaram combater a inflação através de diversos planos econômicos. http://www.brasilescola.com/historiab/direta-ja.htm www.esab.edu.br 33 6 Abordagem histórica da economia brasileira – parte I Objetivo Refletir historicamente sobre os aspectos políticos, econômicos e sociais. Na unidade anterior, vimos que, mesmo após diversos planos econômicos, os problemas envolvendo a inflação e o crescimento econômico no final da ditadura militar não foram solucionados. Antes de avançarmos sobre a volta da ditadura, consideramos importante fazermos uma reflexão e uma retomada dos primeiros anos da economia e da política brasileira, aprofundando o aspecto econômico a partir das questões sociais e políticas do período. Para abordar esses assuntos, utilizaremos a bibliografia de Vasconcellos, Gremaud e Toneto Júnior (2011). 6.1 A economia agroexportadora – até 1930 Vimos, nas quatro primeiras unidades, que a economia agroexportadora se desenvolveu pelo conhecimento dos portugueses na plantação de cana-de- açúcar em larga escala e no comércio com os holandeses. Assim, durante todo o período de colonização, nossa sociedade se baseou nos interesses da metrópole em ocupar o território e obter lucros na colônia brasileira. A ocupação de território se fez necessária pelos interesses da Inglaterra e da Holanda, assim como da Espanha, em utilizar o território das colônias portuguesas para a obtenção de terras e rendimentos. Para Portugal obter lucros no Brasil, utilizava a empresa agrícola que se mostrou lucrativa nesse período pela utilização de mão de obra escrava. Com o declínio do ciclo do açúcar, fez-se necessário encontrar outra atividade que gerasse lucros na mesma escala. Nesse período, começou a exploração das minas de ouro no centro do Brasil, o que atraiu o interesse da Inglaterra para a colônia portuguesa. A vinda da família real www.esab.edu.br 34 ao Brasil fez com que a Inglaterra se aproximasse ainda mais do Brasil. Tal aproximação possibilitou, mais tarde, a negociação entre Portugal e Inglaterra pela independência do Brasil. Foi também através dos interesses da Inglaterra que ocorreu o fim do tráfico de escravos e, por causa disso, ocorreu no Brasil um desabastecimento de mão de obra para as usinas de açúcar e para as plantações de algodão. Nesse período, iniciou-se a plantação de café na região sudeste do Brasil. Em decorrência dessa nova atividade lucrativa, houve a falta de mão de obra, que mais tarde foi solucionada pela imigração de trabalhadores da Europa. Os cafeicultores perceberam a influência que possuíam sobre novo governo; pois, além de estarem bem localizados, próximos à capital (que naquela época estava localizada na cidade do Rio de Janeiro), também perceberam que era através de suas plantações que se gerava riqueza no país. Logo, por meio dessa percepção da riqueza do café, instalou-se no país uma política chamada de “café com leite”, em que ora o governo estava com São Paulo, ora estava com Minas Gerais. Contudo, os tempos de bonança do café se encerraram com a crise financeira de 1929. Depois, mesmo com todos os mecanismos de defesa já vistos, não foi possível obter a mesma lucratividade. Nesse período, iniciou-se no país uma leve industrialização nos centros urbanos, que foi gerada de maneira espontânea a partir dos lucros das plantações de café, para satisfazer a demanda dos empresários do café. A seguir, veremos como se desenvolveu no país uma política para substituir as importações e desenvolver as indústrias nacionais. Essa preocupação surgiu em virtude do saldo deficitário dos prejuízos ocasionados pela política de proteção do café. www.esab.edu.br 35 6.2 A industrialização pelo processo de substituição de importações (PSI) – 1930 a 1961 O surgimento da leve indústria e o crescimento da população urbana pressionou a redução dos mecanismos de defesa do café. Os novos governos tiveram, portanto, a missão de impulsionar a industrialização do país, proporcionando a infraestrutura necessária, e de utilizar a mão de obra urbana que se encontrava, em sua maioria, ociosa. Com o aumento das pressões dos trabalhadores urbanos no país, o governo aprovou a lei que estabelece a CLT e que instituiu o salário mínimo, a estabilidade após dez anos de trabalho, a carteira de trabalho, as férias anuais, o descanso semanal remunerado e a proteção ao trabalho da mulher e do menor. Como vimos na unidade anterior, a fim de impulsionar a industrialização e equilibrar a balança comercial, o governo federal adotou medidas protecionistas, para evitar a importação de bens de consumo, tais como o aumento das tarifas e taxas de câmbio diferenciadas para cada tipo de setor. Além disso, ofereceu aos empresários juros subsidiados e linhas de crédito específicas para o surgimento de indústrias. Outra ferramenta adotada foi a facilitação da importação de bens de capitais, proporcionando um aumento da formação bruta de capital fixo no país, com a intenção de formar uma indústria de base capaz de proporcionar os bens intermediários para as demais indústrias em longo prazo. Além dessas interferências na economia, o governo federal passou a ser provedor de bens públicos, com o objetivo de aquecer a economia e custear o desenvolvimento de setores estratégicos Entre eles, temos a criação da Companhia Nacional de Siderurgia (CNS), o financiamento de hidrelétricas e a criação da Petrobrás, em 1953. Os planos econômicos adotados até então tinham como principal gargalo o financiamento dos investimentos públicos, pois as reservas internacionais foram consumidas pelos mecanismos de defesa do café. Objetivando realizar os investimentos para a industrialização nacional, o governo federal realizou empréstimos no exterior, causando o seu endividamento e o desequilíbrio na balança de pagamentos. Ademais, www.esab.edu.br 36 ocorreu o crescimento dos níveis de inflação, também decorrentes da pressão dos desequilíbrios da balança de pagamentos e das pressões da demanda interna. A seguir, veremos as medidas adotas para solucionar esses problemas. 6.3 A crise dos anos 1960 e as reformas institucionais no PAEG – 1962 a 1967 O aumento da inflação e os desequilíbrios na balança de pagamentos levaram o Brasil a uma crise econômica e a um período de baixo crescimento, ao mesmo tempo em que se estabeleceu um cenário político instável, pois o presidente eleito Jânio Quadros não possuía apoio político para implementar as medidas de austeridade econômica necessárias para que o país se recuperasse da crise. A principal medida a ser realizada era uma reforma fiscal e monetária no país. Afinal, sem essas reformas, o endividamento do Estado ficaria cada vez maior, visto que as receitas fiscais eram menores do que os gastos com investimento para a manutenção do PSI. A partir desse cenário, ocorreu uma mobilização para a tomada do governo pelos militares, que se tornou ainda mais intensa com a renúncia de Jânio Quadros. Devido a essarenúncia, o vice-presidente João Goulart precisaria assumir a presidência, porém ele se encontrava na China e houve tentativas de impedir o seu retorno ao país. Mesmo retornando, em 1964, João Goulart foi deposto e o governo militar se instaurou no país sob o comando do presidente militar Castello Branco. Para retomar o crescimento, alavancar a industrialização e controlar a inflação, que no período já se encontrava em 90% a.a., Castello Branco lançou o programa PAEG, um plano que possuía diversos aspectos impopulares e que só puderam ser realizados por meio da ditadura, tais como: congelamento dos salários e dos preços, reformas tributárias e bancárias, controle do déficit na balança de pagamentos e diminuição das diferenças regionais, através da integração entre as diversas regiões. www.esab.edu.br 37 No âmbito da reforma tributária, os principais aspectos foram a transformação dos impostos do tipo cascata para impostos de valor adicionado, a criação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM) e o Imposto Sobre Serviço (ISS). Além disso, ocorreu a redistribuição dos impostos, ficando com o governo federal o IPI, o imposto de renda, os impostos únicos, os impostos do comércio exterior e o Imposto Territorial Rural (ITR). Surgiram também os fundos, como o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o Programa de Integração Social (PIS), sendo fontes de poupança compulsória. Na reforma financeiro-monetária, foram realizadas medidas como a criação das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTNs) e da correção monetária, do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central do Brasil (Bacen), criação do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e do Banco Nacional da Habitação (BNH) e uma reforma do mercado de capitais, segmentando o mercado financeiro nacional. Por meio dessas medidas, foram criadas as bases para a volta ao crescimento econômico no período seguinte, chamado de Milagre Econômico. Veremos, na próxima unidade, como se configuram, a partir da economia, os aspectos políticos e sociais do Milagre Econômico até o final do II Plano Nacional de Desenvolvimento. Fórum Caro estudante, dirija-se ao Ambiente Virtual de Aprendizagem da instituição e participe do nosso Fórum de discussão. Lá você poderá interagir com seus colegas e com seu tutor de forma a ampliar, por meio da interação, a construção do seu conhecimento. Vamos lá? www.esab.edu.br 38 Resumo Na unidade 1, compreendemos como a empresa agrícola foi instituída no período do Brasil Colônia e quais foram as principais características que favoreceram a instalação desse tipo de atividade econômica. Na unidade 2, vimos como o ciclo do açúcar possibilitou rendimentos tão atrativos e como a renda circulava dentro do país. Além disso, abordamos as demais atividades econômicas que eram praticadas e que possibilitaram a expansão territorial para as regiões Centro-Oeste e sul, através da pecuária e da extração de ervas e especiarias da natureza. A unidade 3 relatou o início do ciclo do café e das dificuldades quanto à disponibilidade de mão de obra no período, visto que, com o fim da escravidão, muitas pessoas se deslocaram para os centros urbanos e desejavam algum tempo sem ocupação. Entendemos que, para solucionar essa dificuldade, ocorreu a imigração da mão de obra dos países da Europa. Devido à crise financeira de 1929, conforme estudamos na unidade 4, os cafeicultores encontraram dificuldade em manter a lucratividade anterior e desenvolveram, juntamente com o governo federal, diversos mecanismos de defesa contra a crise, entre eles foi realizada a queima da produção. A partir dessa crise, os governos seguintes tentaram fortalecer o mercado interno e equilibrar a balança comercial e de pagamentos. Abordamos, na unidade 5, que essas tentativas foram realizadas através dos governos populistas que tinham como objetivo promover a industrialização do país para o abastecimento da demanda interna. Essa industrialização foi realizada através do Programa de Substituição de Importações (PSI), que visava a trocar os produtos importados pelos nacionais. Porém, o resultado do PSI e do Plano de Metas, de Juscelino Kubitscheck, foram o endividamento externo e a inflação. E essa crise econômica e política de 1960 fez com que ocorresse o golpe militar em 1964. www.esab.edu.br 39 Abordamos também o Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG), o qual propiciou o cenário adequado para o Milagre Econômico no período seguinte, em que o país teve taxas recordes de crescimento. Após os choques do petróleo de 1973 e 1979, ocorreu um novo desequilíbrio no balanço de pagamentos e a inflação voltou à casa de 90 a 100% a.a. Assim, em 1984, o governo militar saiu do poder após grande pressão popular. www.esab.edu.br 40 7 Abordagem histórica da Economia Brasileira – parte II Objetivo Refletir historicamente sobre os aspectos políticos, econômicos e sociais. Na unidade passada, retomamos o período inicial da formação econômica do Brasil até as reformas institucionais de 1967. Nesta unidade, daremos continuidade a essa retomada, avançando pelo período do Milagre Econômico até o final da década de 1970 e o governo Geisel. Para ilustrar esse período da economia e política brasileira, iremos utilizar Vasconcellos, Gremaud e Toneto Júnior (2011). 7.1 O Milagre Econômico – 1968 a 1973 Segundo os autores Vasconcellos, Gremaud e Toneto Júnior (2011), o período de 1968 a 1973 que compreendeu os governos de Costa e Silva (1967-1969) e também de Médici (1969-1974) foi chamado de Milagre Econômico, pois apresentou as maiores taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) da história recente do país. Além do alto crescimento do PIB, ocorreu nesse período uma relativa estabilidade nos preços dos bens e serviços. A Tabela 1 demonstra os grandes avanços do PIB nesse período. Tabela 1 – Taxas de crescimento (%) e dívida externa bruta em US$ milhões de 1968 a 1973 Ano PIB (%) Dívida externa bruta em US$ milhões 1968 9,8 3780,0 1969 9,5 4403,3 1970 10,4 5295,2 1971 11,3 6621,6 1972 12,1 9521,0 1973 14,0 12571,5 Fonte: Adaptada de Vasconcellos, Gremaud e Toneto Júnior (2011). www.esab.edu.br 41 Esse resultado só foi possível a partir das reformas institucionais e da recessão vivida nos anos anteriores, como vimos na unidade 6. Foi devido à recessão do período anterior que se gerou a capacidade ociosa na indústria e se criaram as condições necessárias para a retomada do crescimento pelo aumento da demanda. Esse período também foi possível pelo crescimento da economia mundial (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). A retomada do crescimento econômico e a contenção da inflação, na casa de 20 a 30% a.a., foram as diretrizes do governo Costa e Silva em 1967. Ainda sobre a inflação durante os primeiros governos da ditadura militar, o excesso de demanda na economia foi apontado como sua principal causa; já no governo Costa e Silva, a análise feita pelos economistas do período foi de que a inflação era motivada pelos custos de produção. Assim, com esse novo diagnóstico, as políticas fiscais, monetárias e de crédito foram afrouxadas e permitiram um aumento da demanda e uma política de controle de preços. Para isso, foi criado o Conselho Interministerial de Preços (CIP) em 1968. Segundo Vasconcellos, Gremaud e Toneto Júnior (2011, p. 388), as principais fontes de crescimento foram: • A retomada do investimento público em infraestrutura, possibilitada pela reforma fiscal do período anterior; • O aumento do investimento das empresas estatais, neste período surgiram 231 novas empresas estatais; • Demanda por bens duráveis, decorrente da expansão do crédito ao consumidor; • Aumento da construção civil, provocada pela expansão do crédito do SFH; • Crescimento das exportações graças ao crescimento mundial e melhoria nos incentivos fiscais para exportação. Ainda na Tabela 1 podemos observarque, para alavancar esse crescimento no período, a dívida externa bruta do Brasil aumentou em mais de três vezes seu valor. E isso ocorreu tanto pela falta de linhas de financiamento de longo prazo no Brasil como pela taxa de juros elevada no mercado interno, em decorrência da reforma financeira no www.esab.edu.br 42 período anterior que introduziu a correção monetária nos investimentos nacionais, como a poupança. Outro ponto relevante é o nível de intervenção do setor público na economia, por meio do controle dos preços e das decisões de investimento das empresas estatais, correspondentes a 50% do investimento em formação bruta de capital fixo (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). Como já citamos na unidade 5, foi nesse período em que tivemos um aumento da concentração de renda, sendo esta a principal crítica ao período do Milagre Econômico. Os autores acima citados afirmam que a concentração de renda no período era vista como necessária para aumentar a poupança da economia nacional e para financiar os investimentos. Portanto, quando ocorresse o crescimento econômico, todos os brasileiros poderiam usufruir da renda decorrente do Milagre Econômico. Como vimos na unidade 5, essa teoria sobre a concentração de renda ficou conhecida como Teoria do Bolo, pois primeiro seria preciso esperar o bolo crescer para depois dividi-lo. Com o final do Milagre Econômico em 1973, decorrente da crise do choque do petróleo, o governo do presidente Geisel tentou manter o crescimento e o nível de preços através do segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), o qual estudaremos a seguir. www.esab.edu.br 43 7.2 A manutenção do crescimento com endividamento externo: o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND) – 1974 a 1979 Vimos anteriormente que a manutenção dos níveis de preço em torno de 20 a 30% a.a. foi uma das metas do governo Costa e Silva, assim como do governo Médici. Porém, a utilização de toda a capacidade ociosa durante o período do Milagre Econômico e o problema na balança comercial, com o aumento das importações no final do período do milagre, levaram a um aumento da inflação nos períodos seguintes, atingindo o patamar de 77,2% a.a. no ano de 1979 (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). A crise internacional, com o choque do preço do petróleo em 1973, instaurou um cenário econômico externo desfavorável para a manutenção do crescimento brasileiro, já que dependíamos do financiamento externo para a expansão da nossa capacidade produtiva. Para cobrir o aumento dos gastos internos, com o aumento do preço do petróleo e da importação dos bens de capital e insumos necessários para a manutenção do crescimento no período anterior, foi necessário utilizarmos as reservas financeiras existentes, o que deixou o Brasil em situação vulnerável. Dica As reservas financeiras, também conhecidas como reservas internacionais, são os depósitos de moedas estrangeiras em poder dos bancos centrais e que são utilizados para cumprir compromissos externos, como pagamento de dívidas ou emissão de moeda. Além disso, com a mudança de presidentes em 1974 (saiu Emílio Médici e entrou Ernesto Geisel), aumentou a pressão social para uma melhor distribuição de renda e uma maior abertura política. Essa pressão política colocou duas opções para a condução da economia nacional: a primeira de ajustamento, ou seja, contenção da demanda interna e controle da inflação com correção dos desequilíbrios do setor externo; a segunda opção seria www.esab.edu.br 44 pelo financiamento do crescimento, ou seja, manutenção das taxas de crescimento com ajuste dos preços relativos, por meio de financiamento externo. Na época, acreditava-se que a crise duraria pouco tempo. Inicialmente, decidiu-se pela opção de ajustamento; contudo, com o aumento da pressão política do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e a derrota do partido do governo militar (Aliança Renovadora Nacional - ARENA) nas eleições para o congresso, o governo abandonou a estratégia de ajustamento e adotou a política de financiamento do crescimento (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). A partir dessa mudança, o II PND foi lançado com o objetivo de manter o crescimento econômico em torno de 10% a.a., taxa de crescimento que não foi atingida. E o crescimento econômico foi mantido, embora com taxas menores do que as desejadas. O II PND alterou as prioridades da industrialização brasileira, com o investimento focado na produção de bens de capital e de insumos básicos (setor siderúrgico), ao contrário do período anterior que focava na produção de bens duráveis de consumo. Essa mudança foi uma tentativa de reduzir as importações desse setor, aumentar a produção do setor siderúrgico em alumínio, zinco e minério de ferro, assim como diminuir a importação de energia (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). Essa redução se daria por meio do aumento da capacidade hidrelétrica, do projeto Itaipu, da produção de carvão em Santa Catarina, da inserção da energia nuclear no país e da ampliação e retirada de petróleo no Nordeste. Os problemas para a execução do II PND estão relacionados ao apoio político e ao financiamento do processo, os quais estavam fundamentados politicamente nas alianças com as empreiteiras e as oligarquias tradicionais, que exigiam a descentralização dos investimentos para o Norte e o Nordeste do país. A questão do financiamento se dividiu em duas: as empresas estatais e as empresas privadas. As empresas estatais adotaram a linha de crédito externo, o que iniciou o processo de estatização da dívida externa. Já o setor privado teve o financiamento através das linhas de crédito subsidiadas pelo governo, principalmente do BNDES. Com essas fontes de financiamento, a dívida externa atingiu www.esab.edu.br 45 US$ 17 bilhões em 1979 (VASCONCELLOS; GREMAUD; TONETO JÚNIOR, 2011). A partir desse cenário, em 1979, quando encerrou o governo Geisel, o resultado do II PND foi um alto endividamento externo com vulnerabilidade para mudanças no cenário internacional, decorrentes da natureza variável dos juros da dívida externa e um desequilíbrio nos níveis de preço. Nesta unidade, vimos que o Milagre Econômico se caracterizou por um extraordinário aumento do PIB, financiado pelo aumento do endividamento externo e público. Outro grande questionamento ao referido milagre refere-se aos aspectos sociais, uma vez que houve um aumento na concentração de renda do país. O intenso crescimento trouxe benefícios para as classes de maior renda, incluindo-se aí a parte da classe média assalariada que fornecia os quadros técnicos necessários à gestão da economia, como os engenheiros, economistas, administradores, analistas de sistemas etc. A renda concentrou-se ainda mais em consequência da diminuição do valor real do salário mínimo. Com isso, o país não teve condições de sustentar por longo tempo esse alto desempenho econômico. A partir de 1974, o crescimento do PIB passou a apresentar tendência declinante justificado por choques externos e uma piora nas condições de tomada de empréstimo, provocando um aumento da dívida externa. E, em 1981, o país entrou em crise profunda. Veremos a seguir como o aumento das pressões políticas, sociais e econômicas encerraram o período da ditadura militar no Brasil e as consequências do problema do endividamento para os próximos governos. www.esab.edu.br 46 8 A volta à República Objetivo Entender os impactos da crise da dívida externa e o ressurgimento da inflação na economia e política brasileira. Vimos, na unidade anterior, a vulnerabilidade da economia brasileira no final da década de 1970. Assim, com o segundo choque do petróleo em 1979, ocorreu uma alteração no cenário econômico internacional que afetou as condições de financiamento, com elevação da taxa de juros da dívida externa. Veremos, nesta unidade, as consequências dessa mudança de cenário para a economia brasileira e para o cenário político
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