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Unidade IV

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Unidade IV 
 
Ensino híbrido: personalização e tecnologia na 
educação. 
cap. 9, p. 169-189 
 
 
A cultura escolar na era digital 
 
O impacto da aceleração tecnológica na relação professor-aluno, no currículo e na organização 
escolar RODRIGO ABRANTES DA SILVA AILTON LUIZ CAMARGO Qual o significado da expressão 
“cultura escolar”? Trata-se de sua cultura material? Da cultura dos alunos? Dos princípios e 
valores que definem sua política pedagógica? De seu sistema de gestão? Enfim, quais seriam 
os elementos definidores da cultura escolar? A escola e o sistema educativo em seu conjunto 
podem ser entendidos como uma instância de mediação entre os significados, os sentimentos 
e as condutas da comunidade social e o desenvolvimento particular de novas gerações. (PÉREZ 
GÓMEZ, 2001, p. 11). Não podemos ignorar que a atividade educativa é, antes de tudo, uma 
manifestação cultural e, portanto, constitui-se ao longo do tempo por meio de rupturas, 
mudanças e transformações sociais, políticas e econômicas. Além disso, ela está diretamente 
vinculada às tradições, aos valores, às ideias e aos costumes de um povo, em um determinado 
período histórico. Dessa forma, assumindo o pressuposto de que a natureza da escola e do 
sistema educativo é cultural, qualquer análise do panorama educacional nacional ou 
internacional parte necessariamente da consideração do contexto cultural em que a 
comunidade escolar está inserida, de modo direto ou indireto, tendo em vista seu caráter 
multifacetado e dinâmico. O conceito de cultura adotado neste capítulo foi citado no livro A 
cultura escolar na sociedade neoliberal, de A. I. Pérez Gómez: trata-se daquele “[...] todo 
complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, leis, moral, costumes e qualquer outra 
capacidade e quaisquer outros hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro de uma 
sociedade” (PÉREZ GÓMEZ, 2001, p. 13). Ainda segundo Gómez, a cultura acaba por ser o 
contexto simbólico que circunda a vida humana em sociedade. Dessa forma, constitui as bases 
estruturais das relações sociais que inevitavelmente serão consolidadas e reproduzidas no 
ambiente escolar. Portanto, a cultura escolar forma-se a partir das noções e das práticas 
sociais utilizadas, bem como da cultura dos atores envolvidos, para conceber o valor da escola 
e das suas atribuições – como, por exemplo, as práticas de ensino ou as noções de ensino e 
aprendizagem desenvolvidos. Nesse sentido, é preciso observar a relação entre a cultura 
escolar e a sociedade, ou seja, em que medida ela se encontra em correspondência com as 
formas contemporâneas de organização social? Observemos alguns elementos que nos 
possibilitam identificar os traços predominantes de uma cultura escolar. Tomemos a 
linguagem usada pela instituição para se relacionar com os atores de sua comunidade (alunos, 
professores, pais, parceiros). Os objetivos da escola são enunciados com clareza? Há 
correspondência entre o que é dito e o que é feito? Esse ponto é particularmente relevante, 
pois a distância entre teoria e prática, intenção e ato, é indício de problemas. Outro elemento 
importante para ser analisado são os valores da instituição. Os valores declarados revelam-se 
por meio de ações e condutas em seu interior? Por exemplo, se digo que considerar o aluno no 
centro do ensino é um valor em minha escola, devo garantir as condições para que ele 
aprenda em seu ritmo, receba tutoria personalizada e seja o protagonista do processo de 
aprendizagem. Além disso, devo garantir que essa prática seja incorporada à política 
pedagógica da instituição, sendo multiplicada entre seus membros. De outro modo, se digo 
que minha escola insere o aluno no centro da aprendizagem, porém meus professores 
permanecem reproduzindo os mesmos modelos, por exemplo, aulas expositivas seguidas de 
resolução de exercícios, é sinal de que não estou conseguindo implementar as mudanças 
enunciadas. O ambiente sociocultural formado por todas as instituições que compõem a 
sociedade e que estão presentes no contexto social imediato em que a escola está localizada: a 
religião, a família, as tradições, as associações, etc. que exercem pressão sobre a escola a 
respeito de suas necessidades e expectativas, no sentido de manter ou modificar a estrutura 
social vigente. Quando a instituição escolar não atende às demandas do ambiente 
sociocultural, é pressionada à modificação. (HORA, 2007, p. 42-43). Há uma crise latente na 
educação brasileira atribuída à má qualidade de ensino, entendida como a implicação de um 
conjunto de fatores, agravados ao longo dos anos, por uma política pública de sucateamento e 
mercantilização do ensino no país. A comunidade escolar, formada por pais, alunos, docentes, 
gestores e parceiros da sociedade, tem sido refém do descaso e da barganha política há anos. 
Todavia, a crise atual do modelo educativo adotado em praticamente todo o território 
nacional é agravada pela estrutura engessada e nada desafiadora das escolas, seja no formato 
da sala de aula, seja da própria aula em si, seja, ainda, dos espaços físicos nas unidades 
escolares. De fato, diante do turbilhão de mudanças diárias proporcionadas, por exemplo, 
pelos avanços tecnológicos, é preciso haver coerência entre o discurso e a prática de uma 
instituição escolar. Para isso, é preciso empreender uma análise mais abrangente, inserindo a 
instituição no contexto de nossa época e de seu local. Nesse sentido, é importante considerar 
algumas balizas que foram constituindo historicamente a cultura escolar. A CULTURA 
ESCOLAR: DA ERA INDUSTRIAL À ERA DIGITAL Após analisar a relação entre o discurso e a 
prática de uma escola, precisamos identificar a relação entre o modelo da instituição e a 
realidade social em que se insere. Dessa forma, não é prudente ignorar que a cultura escolar, 
em uma perspectiva histórica, pode ser caracterizada por certo atraso se relacionada às 
transformações surgidas, desde o último século, nas concepções da vida cultural dentro e fora 
do Brasil. A escola, em uma perspectiva de longa duração, sofreu inúmeras alterações em sua 
função primordial desde a Antiguidade. Passou por mudanças significativas conforme as novas 
necessidades advindas dos contextos históricos que atravessava: da Grécia Clássica e sua 
formação direcionada à cidadania, passando pela religiosidade europeia do período Medieval, 
em direção à época moderna da conquista da América, chegando, por fim, à culminação da 
Revolução Industrial, que acabou por determinar o modelo de ensino que se perpetuaria em 
suas estruturas mais internas. De maneira bastante simplificada, pode-se afirmar que, a partir 
da Revolução Industrial, a necessidade de formar operários de maneira padronizada e 
homogênea desencadeou um processo educativo muito próximo daquele que se tem como 
estrutura básica do ensino atual: ensino padronizado para crianças diferentes, interações 
circunscritas ao ambiente da sala de aula, compartimentação das salas por crianças de mesma 
faixa etária, ritmo de aprendizagem determinado pelo tempo cartesiano e quantificado – 
expresso pelo relógio, pelo sinal (o mesmo dos turnos nas fábricas) –, o conhecimento 
fragmentado por disciplinas que, muitas vezes, não apresentam conexão umas com as outras 
e, por fim, a escola no centro da verdade a ser transmitida. Essas são as características do 
modelo hegemônico que ainda rege a maioria das organizações escolares e as torna bastante 
engessadas e incapazes de responder aos desafios do mundo atual. Essa constatação tem 
levado alguns autores a defender uma urgente mudança nos modelos de organização das 
escolas (SENGE, 2004). A transição da era industrial para a pós-industrial acarretou uma 
quebra nos padrões verticais de organização social, dando origem a formas menos 
hierárquicas, horizontalizadas, culminando no que chamamos de sociedade em rede 
(CASTELLS, 2009). Durante esse período, que ocorreu ao longo da segundametade do século 
XX, a escola pouco mudou. No entanto, um novo cenário tem se configurado nos últimos anos, 
apontando para o surgimento de uma nova era, a digital (SCHMIDT; COHEN, 2013). Para as 
escolas, a passagem do mundo industrial, moderno, para o pós-industrial ou pós-moderno 
acarretou modificações na posição dos pro-fessores e dos alunos. Enquanto na sociedade 
moderna o professor acre-ditava ter um aluno cativo, com um circuito relacional previamente 
deter-minado, na sociedade pós-moderna evidenciou-se que o docente necessita estabelecer 
novos laços sociais, criar outras maneiras de lidar com a educação, as escolas, os alunos e a 
sociedade (BAUMAN, 1999; MRECH, 2005). Nos últimos anos, a aceleração do 
desenvolvimento tecnológico tem acentuado de maneira enfática o aspecto essencialmente 
mutante da cultura contemporânea, o que implica dizer que o modelo de ensino vigente não 
corresponde mais à realidade e às necessidades do contexto sociocultural da história recente. 
As inovações tecnológicas, os modelos de negócios adotados e em expansão, as novas 
organizações sociais familiares e as mudanças de paradigmas vindos da modernidade 
acabaram por engendrar necessidades e posturas mais críticas e profundas do ser humano em 
formação. Naturalmente, cada pessoa possui raízes culturais ligadas à herança, à memória 
étnica, constituídas por estruturas, funções e símbolos, transmitidas de geração em geração 
por longos e sutis processos de socialização. É óbvio, também, que cada indivíduo, antes de 
decidir sua própria proposta de vida, se encontra imerso na imanência de sua comunidade, nas 
coordenadas que configuram o pensar, o sentir e o agir legítimo em seu grupo humano. (PÉREZ 
GÓMEZ, 2001, p. 13). Obviamente, muitas mudanças ocorreram no contexto cultural desde a 
industrialização dos séculos XVIII e XIX, o que mostra a característica flexível, multifacetada e 
dinâmica do desenvolvimento humano e social. Ao mesmo tempo, é evidente que este 
capítulo não tem a pretensão de se aprofundar nesses aspectos culturais, tampouco de 
esgotar todas as suas possibilidades, mas deseja apontar para sua natureza diversa e estrutural 
a fim de pensar as atividades educativas. Até hoje, a escola se posicionou de maneira um tanto 
refratária e adversa às transformações da pós-modernidade. Todavia, nos últimos anos, a 
aceleração do desenvolvimento tecnológico tornou inevitável o confronto da escola com a 
cultura digital, em função do modo como esta afeta a interação entre as pessoas, os processos 
de comunicação e a produção e a transmissão de conhecimento. Em suma, a relevância social 
da instituição escolar dependerá, em grande medida, de sua capacidade de se reinventar 
diante da mudança de era em que vivemos. Nesse novo cenário, a tecnologia digital aparece 
como parte essencial da cultura escolar, pois permeia a vida de alunos, professores e pais, que 
interagem na internet por meio de dispositivos. Esse novo cenário exige da instituição de 
ensino um posicionamento sobre, pelo menos, duas questões: uma comportamental e outra 
pedagógica. Do ponto de vista comportamental, trata-se de dispor de abordagens e de 
entendimento para lidar com as novas gerações, que têm chegado à escola sabendo manipular 
dispositivos eletrônicos e atuar em ambientes digitais. Do ponto de vista pedagógico, trata-se 
de dispor de estratégias de aprendizagem que correspondam às condições de produção, 
acesso e transmissão do conhecimento em nossa época. Nesse sentido, a cultura escolar entra 
em correspondência com a cultura digital, ou seja, com o modo como as pessoas interagem, 
produzem conhecimento, aprendem e se comunicam. Essa perspectiva tornará possível a 
superação dos modelos herdados da era industrial. A tarefa, no entanto, não é simples. É 
necessário rever modelos de organização e de aprendizagem, além do próprio espaço da 
escola e a legislação que rege a atuação dos educadores, sob pena de desperdiçar recursos 
(CHRISTENSEN; HORN; JOHNSON, 2008; CASTRO, 2013). PRÁTICAS DE ENSINO HÍBRIDO EM 
CONTEXTO DE MUDANÇA DE ERA – MODELOS SUSTENTADOS OU DISRUPTIVOS? Escolas ainda 
presas em modelos do passado têm sido pressionadas, por diferentes setores da sociedade, a 
mudar. Discute-se, sobretudo, a necessidade- de desenvolver habilidades que qualifiquem os 
indivíduos a entender e atuar- em sociedades complexas, que têm na tecnologia um elemento-
chave de sua organização.39 Para iniciar um processo de mudança, as escolas contam com 
bons marcos teóricos e exemplos práticos. Nesse sentido, uma referência fundamental para 
delinear planejamentos é o Horizon Report, uma publicação resultante da análise 
empreendida por diversos especialistas em educação sobre o impacto que as tecnologias 
emergentes terão no campo do ensino e os prazos previstos para sua incorporação pelas 
escolas. O relatório para a educação básica já conta com versão em português, com análises 
provenientes da realidade brasileira (HORIZON REPORT, 2012). Entre as inovações emergentes, 
a mobilidade, por exemplo, apresenta um alto potencial de impacto na democratização do 
ensino, e vem ao encontro do que defendem os autores de A nova era digital: [...] quando as 
salas de aula estão superlotadas ou malservidas de professores ou quando o currículo nacional 
é limitado, o acesso proporcionado por equipamentos móveis pode complementar a educação 
das crianças e ajudá-las a cumprir seu potencial, não importando suas origens. (SCHMIDT; 
COHEN, 2013, p. 20). De modo geral, não se acredita que a tecnologia, por si só, acarretará 
grande transformação. Por isso, é preciso criar aquilo que alguns autores chamam de 
ecossistema de inovação, ou seja, um ambiente capaz de incorporar iniciativas provenientes 
de diferentes esferas, como empresas, entidades sociais, comunidades e famílias, em prol da 
modernização dos processos de aprendizagem e da melhoria da qualidade do ensino.40 Na 
prática, muitas escolas estão modificando suas estratégias de ensino, combinando a 
integração de recursos tecnológicos com formas tradicionais de aprendizagem. Essa mistura de 
elementos on-line, disponíveis por meio de recursos tecnológicos, com elementos da sala de 
aula presencial, tem sido chamada de modelos híbridos (CHRISTENSEN; HORN; JOHNSON, 
2008). Os modelos híbridos usam as tecnologias emergentes para estabelecer novas 
configurações de formas de aprendizagem. Para se ter uma ideia, o Horizon Report pontua que 
os seguintes recursos tecnológicos deverão estar integrados à educação até 2017: 
•Computação em nuvem •Ambientes colaborativos •Aprendizagem baseada em jogos 
•Dispositivos móveis •Conteúdo livre •Inteligência coletiva •Laboratórios móveis •Ambientes 
pessoais de aprendizado •Grades de cursos abertos on-line Como seria muito complicado 
integrar todos esses recursos da noite para o dia, as escolas precisam de um plano de 
transição. Nesse sentido, os modelos híbridos oferecem condições para que a instituição 
realize essa mudança de forma sustentada, ou seja, sem correr o risco de perder sua 
identidade nem abrir mão daqueles modelos que se tornaram parte de sua cultura e ainda 
revelam-se funcionais. Inserir as novas tecnologias nas escolas exige, portanto, planejamento 
estratégico. Repensar os espaços de aprendizagem, a formação dos professores e as formas de 
produzir e transmitir conhecimentos são apenas alguns aspectos da organização escolar que 
deverão ser ajustados para possibilitar novas experiências aos alunos. Isso implica investir em 
formação de pessoas e de equipes, além de infraestrutura adequada às novas relações de 
aprendizagem. Em suma, para a maioria das escolas, os modelos de transição sustentados 
serão os mais indicados, pois possibilitarão uma transição sem grandes abalos. No entanto, 
instituições que tenham condições de ousar poderão experimentar modelos disruptivos, 
sobretudo em projetos experimentais. Nesse processo, poderão descobrirnovos caminhos 
para a inovação e a originalidade. Como começar a mudança? Observar a escola com um 
enfoque cultural significa uma mudança de perspectiva levando em conta aspectos que não 
podem ser ignorados, pois a [...] análise do que realmente acontece na escola e dos efeitos 
que tem nos pensamentos, nos sentimentos e nas condutas dos estudantes requer descer aos 
intercâmbios subterrâneos de significados que se produzem nos momentos e nas situações 
mais diversas e inadvertidas da vida cotidiana da escola. (PÉREZ GÓMEZ, 2001, p. 16-17). 
Observar a realidade escolar pressupõe uma análise apurada das especificidades de cada 
unidade, tendo em vista que, apesar de inúmeros problemas vividos pelo setor educacional no 
Brasil serem recorrentes e comuns a todo o território nacional, é preciso levar em conta as 
especificidades locais, pois o contexto sociocultural pode mudar de um lugar para outro – às 
vezes, mesmo dentro da mesma jurisdição têm-se realidades díspares na cultura escolar. “As 
diferentes culturas que se entrecruzam no espaço escolar impregnam o sentido dos 
intercâmbios e o valor das transações em meio às quais se desenvolve a construção de 
significados de cada indivíduo” (PÉREZ GÓMEZ, 2001, p. 17). Os significados são construídos 
por meio da cultura, ou seja, trata-se do resultado de uma ação social compartilhada 
coletivamente a partir das condições materiais, políticas, históricas e espirituais em um 
determinado espaço e tempo. Ela se expressa no âmbito da vida individual ou coletiva de uma 
comunidade escolar e deve ser considerada para o levantamento das perspectivas e 
finalidades da educação em uma determinada localidade, sem perder de vista que essa 
interpretação é dinâmica e, portanto, deve ser revista periodicamente. Ademais, muito se fala 
em coparticipação, compartilhamento e interatividade como qualidades que sempre foram 
valorizadas no processo de ensino e aprendizagem e que agora podem ser amplificadas com os 
recursos tecnológicos disponíveis. Porém, a empreitada não é tão simples, e exige não apenas 
disponibilidade de tecnologia, mas também – e principalmente – o interesse dos educadores, 
seu engajamento emotivo e intelectual. É nesse momento que se pode esbarrar nas famosas 
resistências provenientes de padrões de comportamentos e crenças há muito interiorizados. 
Por exemplo, há professores que não apenas tratam com indiferença os recursos tecnológicos 
que a escola lhes oferece, mas os demonizam. São profissionais que há décadas se habituaram 
a resumir pontos de um manual didático na lousa, para que os alunos os copiem e, na 
sequência, façam exercícios. Seu conteúdo está pronto, e eles reproduzem o mesmo esquema 
de aula em todas as classes ao longo dos anos letivos. É o famoso professor “linha de 
montagem”: se ele sempre apertou o parafuso daquela maneira, por que teria de mudar 
agora? Para não sair da zona de conforto, prefere manter seus alunos em uma passividade 
facilmente manipulável.41 Para modificar essa situação, evitam-se soluções mágicas. É preciso 
olhar antes para o projeto pedagógico da escola, sua equipe, as possibilidades de treinamento, 
a infraestrutura de rede da instituição, os equipamentos, etc., para, então, começar a 
identificar as possibilidades de mudança. Nesse processo, algumas perguntas-chave poderão 
ajudar: Que modelo de ensino minha escola tem condições de implementar? Que postura de 
professor espero em sala de aula? E de aluno? Seria uma postura de transmissão de conteúdo 
ou de produção conjunta de sentidos? Os recursos tecnológicos servirão como meros 
acessórios para complementar ou enfeitar uma aula ou atuarão como recursos desafiadores 
aos estudantes? Quero meu aluno participando junto com o professor da produção de sentido, 
do significado de estar ali, descobrindo o porquê da relevância da aprendizagem em sua 
trajetória de vida, ou quero apenas cumprir os programas de conteúdo já prontos? De que 
forma vou comunicar aos professores e aos estudantes as mudanças a serem implementadas? 
Quais recursos de desenvolvimento profissional vou oferecer? As respostas a essas perguntas 
poderão servir de base à elaboração de um planejamento estratégico para a implementação 
de modelos híbridos e a introdução de recursos tecnológicos. Infelizmente, muitas escolas 
inserem recursos como algo a mais na grade curricular, sem efetuar mudanças no plano da 
organização. O resultado é um efeito cumulativo de trabalho, tanto para o professor quanto 
para o aluno. Em consequência, gera-se uma mentalidade que associa tecnologia a mais 
trabalho. Acreditamos que um dos fatores determinantes dessa atitude seja o medo de 
arriscar uma nova abordagem. Escolas temem errar e, assim, perder alunos; por isso, tendem a 
permanecer na zona de conforto. As mudanças ocorrem de tal maneira que precisamos de 
pessoas dispostas a aprender e a se reinventar a cada dia. Essa capacidade é o que faz a 
diferença. Porém, isso demanda tempo, dinheiro e energia. Para acessar o vídeo, clique no 
ícone: Planejando mudanças em relação ao perfil da escola e de sua perspectiva de futuro 
Hoje, o enfoque está sobre a forma ideal para a aprendizagem dos alunos, o melhor espaço 
físico organizacional para o trabalho intelectual de docentes e discentes, o papel da gestão e 
do professor na escola e o uso da tecnologia dentro e fora das salas de aulas. Essas constantes, 
se discutidas à luz de uma reflexão apurada do contexto da cultura escolar em determinada 
localidade, podem levar à solução de problemas recorrentes nas escolas. O uso a ser feito do 
ensino híbrido deve partir dos resultados dessa reflexão para se verificar de que forma ele 
contribuirá para a solução dos problemas e, consequentemente, para o processo educativo. 
Segundo Gómez, diante do caráter ambíguo e multifacetado dessas análises, “[...] viver uma 
cultura e dela participar supõe reinterpretá-la, reproduzi-la, assim como transformá-la” (PÉREZ 
GÓMEZ, 2001, p. 17). Desse modo, nota-se que não estamos trabalhando com categorias ou 
situações engessadas, mas dinâmicas, multifacetadas e rigorosamente interpretativas, o que 
significa que a cultura escolar pode ser ressignificada. Uma escola tradicional e conservadora 
poderá encontrar dificuldades para implementar processos de mudança. Nesse caso, uma 
revisão de paradigmas provavelmente terá de ser empreendida. A gestão precisará tomar 
consciência dos caminhos a seguir e mobilizar recursos para implementar novos modelos. Em 
contrapartida, uma instituição que já vem refletindo sobre a necessidade de rever sua atuação, 
aquela com mais abertura e perfil progressista, poderá navegar com mais tranquilidade. É 
muito provável que ela tenha professores que já praticam alguma forma de ensino híbrido, 
ainda que não usem essa nomenclatura. Nesse caso, identificar esses docentes, torná-los 
membros de uma equipe de transição, posicionando-os em programas de desenvolvimento 
profissional, de modo que possam se aperfeiçoar e, ao mesmo tempo, transmitir habilidades 
adquiridas a outros professores, é uma solução que tem sido implementada por diversas 
escolas. Independentemente do perfil da instituição, o plano de transição sustentada precisa 
considerar que o reposicionamento da escola deve supor o acesso igualitário à tecnologia 
como um princípio fundamental para que o direito universal à educação seja assegurado. 
Ademais, o cruzamento de culturas promovido pela escola é o responsável por dar sentido e 
consistência àquilo que é aprendido pelo aluno em sua vida acadêmica. Portanto, o estudante 
tem seu desenvolvimento cognitivo moldado a partir dos intercâmbios realizados nesse 
ambiente cultural, o que pode ocorrer com a seleção dos conteúdos pelos professores em suas 
disciplinas, na relação destes com os significados e expectativas pretendidos, nos ritos, nos 
costumes e nas formas de organizar o espaço e o tempo, entre outros fatores responsáveispela formação das futuras gerações. A prática educativa cumpre um papel fundamental dentro 
da cultura escolar, pois é a responsável pelo direcionamento do processo educativo 
determinado pelo regimento escolar. Ademais, ela depende do desenvolvimento do trabalho 
realizado pelo professor, tendo em vista a necessidade de atualização e aperfeiçoamento do 
profissional da educação que, segundo Antoni Zabala, só acontece “[...] ­mediante o 
conhecimento e a experiência; o conhecimento das variáveis que intervêm na prática e a 
experiência para dominá-las” (ZABALA, 1998, p. 13). De alguma forma, todos sabem da 
necessidade de revisar modelos mentais e padrões de comportamento que estão na base da 
prática escolar, mas que não surtem o mesmo efeito de outrora entre os jovens. As 
possibilidades de mudança são muitas, mas é preciso criatividade e intuição para discernir 
práticas pertinentes a cada situação. Possibilidades do ensino híbrido para a educação em 
transição No formato de ensino aplicado comumente em todo o território nacional é marcante 
o destaque para o seu caráter classificatório nivelado de cima para baixo pelo vestibular. 
Entretanto, a escola não pode ignorar sua função formativa e cultural diante do esgotamento 
do sistema de ensino, e os inúmeros problemas decorrentes dele refletem a urgência de que 
docentes, gestores e poder público repensem a realidade da educação atual. O ensino híbrido 
vem ao encontro das necessidades recentes de descobrir a melhor prática educativa para 
professores e escolas. Trata-se de um modelo de ensino que pressupõe o uso da tecnologia 
para o desenvolvimento das atividades dentro e fora da classe, em que o aluno é estimulado a 
buscar o conhecimento com a mediação do professor e da escola. Nesse formato de ensino, 
alguns papéis acabam sendo alterados, bem como o foco do planejamento dos docentes. O 
professor, além de mero orador, passa a assumir uma postura de facilitador do processo de 
ensino e aprendizagem do aluno, uma alteração que promove o desenvolvimento da 
autonomia do estudante e lhe dá a responsabilidade pelo conhecimento que deve adquirir. 
Nesse caso, o docente precisa alinhar sua prática, de forma personalizada, a fim de possibilitar 
ao aluno o avanço coerente com o seu real estágio de aprendizagem, respeitando seu ritmo e 
seus interesses. O foco no planejamento do professor não está exclusivamente na 
aprendizagem dos conteúdos do currículo nacional para cada disciplina escolar, no qual devem 
ser acrescentadas aulas e atividades preocupadas com os relacionamentos dos alunos, 
personalização e autonomia, o que garante uma análise da experiência do estudante de 
maneira mais global. Inúmeras escolas norte-americanas têm desenvolvido trabalhos 
significativos em uma estrutura física e pedagógica totalmente dentro dos parâmetros do 
blended learning, seja no formato da sala de aula ou da própria aula em si, no papel do 
professor e do aluno, na função do conteúdo e da busca pelo conhecimento com o máximo de 
autonomia. Um dos maiores exemplos dessas escolas é a Summit Public Schools, na Califórnia, 
que se destaca pela estrutura organizacional completamente voltada para o blended, em que a 
autonomia dos alunos é estimulada desde muito cedo com níveis ideais- de personalização de 
ensino. A KIPP Los Angeles é outra protagonista na implementação do ensino híbrido nos 
Estados Unidos, pois usa o sistema de rotação por estações como base para seu modelo de 
educação e tem atingido resultados destacados para os níveis educacionais norte-americanos. 
Na Navigator Schools, os benefícios do laboratório foram unidos perfeitamente com o melhor 
da sala de aula tradicional. Essas são escolas muito recentes e que promoveram mudanças 
significativas em sua ação educativa, utilizando o blended em seus aspectos mais disruptivos e 
obtendo resultados que têm sido referência na educação norte-americana e brasileira. Esse 
modelo de ensino propõe a solução de inúmeras variáveis da prática educativa a partir do 
desenvolvimento da personalização e da autonomia do aluno, que ocorre por meio de 
intervenções do professor conforme sua observação e experiência para propor atividades, 
bem como considerando o local de partida de cada aluno e o ritmo de ensino de cada um. As 
diferentes variáveis, como indisciplina, falta de interesse, dificuldade com o conteúdo, etc., 
podem ser avaliadas durante a prática dos modelos educativos próprios do ensino híbrido, 
como laboratório rotacional, rotação por estações, flex e sala de aula invertida, cuja principal 
característica é seu aspecto profundamente dinâmico e estimulante. Esses modelos práticos 
permitem o desenvolvimento de todos os pontos relevantes do ensino híbrido, pois garantem, 
sobretudo, a autonomia dos alunos e um elevado grau de personalização; ao mesmo tempo, 
são perfeitamente adaptáveis a qualquer realidade escolar, mesmo àquelas instituições sem 
estrutura tecnológica satisfatória. Além disso, os modelos podem ser alterados pelos 
professores, os quais também podem criar outros, conforme a sua necessidade. Imagine seus 
alunos envolvidos em atividades que eles escolheram para fazer, conforme suas intervenções 
e proposições. Os ganhos para o desenvolvimento desse estudante, bem como o aprendizado 
dos conteúdos selecionados pelo professor, serão mais bem aproveitados. Isso é possibilitado 
pelo modelo flex, em que, diante de algumas estações de trabalho, o aluno seleciona aquelas 
que quer fazer parte, ou pelo modelo de rotação por estações, em que ele desenvolve todos 
os pressupostos do blended, passando por diferentes formatos de tarefas. Apesar de entender 
que o blended é uma possibilidade disruptiva de implementação de ensino mais adequado ao 
contexto sociocultural atual e em franca expansão, ele não necessariamente precisa ser 
aplicado em sua plenitude. Contudo, pode servir aos propósitos determinados pelos 
professores em sua prática educativa dentro ou fora da sala de aula, pois os modelos híbridos 
são perfeitamente adaptáveis e maleáveis para as diferentes nuan-ces das salas de aulas 
brasileiras. A preocupação e a necessidade de elevar o nível de personalização e de autonomia 
dos alunos, bem como de mudar o formato das aulas e o uso dos seus conteúdos disciplinares, 
são discussões anteriores ao advento desse tipo de modelo de ensino. Contudo, o caráter 
inovador do blended potencializa os resultados e permite uma melhor avaliação do professor 
sobre a real situação de aprendizagem do aluno e dos caminhos a serem seguidos, respeitando 
o ritmo, as habilidades e as competências dos estudantes em cada disciplina. Para atingir o 
nível de ensino esperado, a cultura escolar precisa ser ressignificada e comprometida com a 
realidade da instituição, pensando em suas especificidades, seus objetivos, seu formato e sua 
coerência com o contexto sociocultural. Evidentemente, será necessário investir e estimular 
uma nova visão sobre o processo de ensino e aprendizagem, cuja necessidade latente bate à 
porta com insistência, ao mesmo tempo em que promove mudanças de papéis dos atores 
escolares, seja na instituição como um todo, seja em determinada disciplina ou aula em 
particular. QUAIS OS PONTOS PRINCIPAIS A SEREM MODIFICADOS PARA A IMPLEMENTAÇÃO 
DO MODELO DE ENSINO HÍBRIDO? É preciso estar convencido de que o lugar do professor 
mudou, assim como o perfil do aluno. A escola, que manteve sua autoridade em função de ser 
a guardiã e a responsável pela transmissão dos conhecimentos memorizados pela 
humanidade, encontra-se em xeque. Em suportes cada vez mais móveis e virtuais, 
armazenamos um número inconcebível de dados e libertamos nossa inteligência para o 
pensamento, a criatividade e a invenção. Diante da democratização desses suportes e de sua 
utilização na vida diária das populações, o modelo escolar fundamentado na memória se vê 
cada vez mais obsoleto (MOSÉ, 2013). O primeiro ponto a sermodificado para a 
implementação do modelo de ensino híbrido é o entendimento dos papéis que professores e 
alunos poderão assumir nesse novo cenário. Essa compreensão é crucial para que a escola 
possa promover novas formas de aprendizagem, reconhecê-las e certificá-las. Se a instituição 
de ensino conseguir ter consenso em torno do entendimento da alteração de seu lugar social, 
poderá iniciar um planejamento estratégico de mudanças. A cultura escolar estará preparada 
para responder aos desafios contemporâneos, pois a cultura não é estática, mas dinâmica. 
Tendo isso em vista, será possível iniciar algumas atividades práticas de planejamento, o que 
permitirá a implementação de ações de impacto na cultura escolar. Mapear as competências 
das pessoas da escola é um dos passos mais importantes. Nesse processo, será possível 
identificar o grau de fluência tecnológica dos professores e, com isso, dimensionar as 
necessidades de suporte para a implementação de um modelo que exigirá uso de 
tecnologia.42 Além disso, também será possível dimensionar o impacto cultural provocado 
pela introdução de dispositivos tecnológicos na sala de aula, no plano da rotina dos 
professores e alunos. Nesse aspecto, muitos gestores acreditam que basta comprar uma série 
de computadores e colocá-los na sala de aula, sem considerar seu uso – enfim, sem mexer no 
plano das estratégias de aprendizagem propriamente ditas. Outro ponto importante é dar 
liberdade para que os docentes possam efetuar mudanças em seus planejamentos e em suas 
dinâmicas de aula. Muitas escolas introduzem tecnologia na sala de aula apenas como algo a 
mais a ser feito. Por exemplo, insere-se uma plataforma LML (learning management system) 
com a finalidade única de acrescentar mais listas de exercícios e materiais complementares, 
seguindo uma lógica puramente quantitativa de acumulação de conhecimento. Muitas vezes, 
as atividades inseridas nesses ambientes não justificam seu suporte on-line, por não se 
diferenciarem de sua forma impressa. Estamos, com isso, questionando objetos digitais que 
apenas reproduzem atividades que poderiam perfeitamente ser reproduzidas em mídias não 
digitais. Esse tipo de atividade, embora disponíveis em uma plataforma digital, pouco ou nada 
contribuem para o avanço do letramento digital ou da fluência tecnológica de quem a utiliza. O 
resultado, com frequência, são professores e alunos sobrecarregados com mais tarefas, o que 
pode, inclusive, acarretar desmotivação. Ora, a possibilidade de trabalhar com tecnologia, 
inovar e ser criativo deve ser fonte de motivação. Portanto, é preciso considerar o impacto que 
as decisões e a introdução de tecnologia terão na organização e no relacionamento entre 
professores, alunos e coordenadores. O elemento humano, como sempre, será determinante 
para o sucesso ou fracasso das iniciativas. POR ONDE COMEÇAR A MODIFICAÇÃO DE UMA 
CONSCIÊNCIA VOLTADA ÀS NOVAS FORMAS DE TRABALHO EM SALA? Uma vez atingido o 
consenso de que a escola está diante da necessidade de se reposicionar em função da 
realidade social que a cerca, é preciso considerar que a essência da instituição escolar é o 
relacionamento entre professores e alunos. Há muitas iniciativas, provenientes de empresas 
do setor de tecnologia, que buscam atingir diretamente o estudante, sem considerar o papel 
do docente no processo de aprendizagem. Como observaram os fundadores do Wikispaces, 
esse é um grave problema de visão, pois, dessa forma, se exclui a essencial e necessária 
articulação com o outro no processo de aprendizagem.43 Assim, será interessante que os 
alunos tenham aulas com recursos tecnológicos, como lousa digital, plataformas adaptativas, 
simuladores 3D, etc.? Pode ser, mas eles precisam ganhar vida na sala de aula, e isso 
dependerá da forma como professores e estudantes irão se apropriar dessas ferramentas. 
Ninguém deixará de reconhecer que os alunos precisam de aulas diferentes. Deixar uma 
geração que está crescendo em uma época tão estimulante percorrer toda a sua trajetória 
escolar tendo aulas expositivas não faz o menor sentido em tempos de YouTube. De fato, a 
ideia de aula como um período de 50 minutos, com um professor expositor, não se encaixa na 
concepção moderna de tempo. Porém, o grande desafio da escola não é oferecer aulas com 
efeitos especiais, pelo contrário: é empoderar o aluno das habilidades que o tornarão 
protagonista de seu processo de aprendizagem. Do lado do professor, para que ele possa se 
reinventar nesse processo, não é necessário apenas que seja empoderado de recursos 
tecnológicos. Ele terá que dispor de conhecimento das possibilidades pedagógicas dos 
recursos tecnológicos disponíveis, das competências e capacidades envolvidas no uso do 
recurso, de condições para planejar e avaliar as aplicações disponíveis. Além disso, será 
importante a proposição de um uso voltado para situações autênticas da vida em sociedade. 
Nesse aspecto, questões relacionadas à organização do currículo e aos sistemas de avaliação 
terão de ser revistas. Muitos professores perdem mais tempo corrigindo avaliações do que 
interagindo com seus alunos. Assim, se a escola exigir uma mudança de atitude, mas não 
oferecer ao professor as condições e o suporte para efetuá-la, certamente novos conflitos 
serão gerados. Mudar não deve significar fazer mais coisas, mantendo o que está da forma 
como está. Porém, em muitas escolas, é exatamente assim que as iniciativas estão sendo 
implementadas. Mudar deve significar fazer diferente, com mais qualidade, e os recursos para 
isso existem. No plano das secretarias de educação, seria importante garantir a infraes-trutura 
necessária ao bom funcionamento dos dispositivos adotados pelas escolas e o suporte à 
elaboração de um programa consistente de desenvolvimento profissional, contando com a 
formação de uma equipe de suporte. Quanto aos níveis de direção e coordenação da escola, 
espera-se envolvimento e liderança na preparação de abordagens em sala de aula condizentes 
com os modelos implementados. Para isso, posições determinadas por hierarquias 
burocráticas certamente terão de ser revistas. Além de serem empoderados com ferramentas 
tecnológicas, é fundamental que os professores tenham voz ativa no processo de decisão. 
Caso contrário, resistência a mudanças e conflitos interpessoais serão inevitáveis. Nas escolas 
em que os docentes são considerados no processo decisório, evidencia-se um aumento no 
desejo de ser o primeiro a fazer algo novo, ainda que isso exija trabalho extra do planejado. 
Quando, ao contrário, os professores não participam das tomadas de decisão, o efeito é o 
oposto, ou seja, eles tendem a encarar tudo como um fardo, toda mudança como trabalho não 
pago. O entusiasmo dos docentes e sua capacidade de se engajar em novos projetos e, ao 
mesmo tempo, engajar seus alunos, sua capacidade de análise, discernimento e pesquisa, em 
um mundo marcado pelo excesso de informação em diversos ambientes, serão fundamentais 
ao sucesso de todo o projeto de mudança na organização escolar. Foi com entusiasmo que 
começaram a proliferar grupos de discussão sobre novas práticas, nos quais passaram a ser 
compartilhadas experiências que, hoje, já se incorporaram aos procedimentos habituais dos 
professores. Esse é o caso da expressão flipped classroom, ou sala de aula invertida. Os 
docentes passaram a usar a variada gama de bibliotecas digitais, recursos audiovisuais e 
conteúdos já organizados didaticamente em ambientes vir-tuais para oferecer material aos 
alunos fora da sala de aula. Assim, o horário de encontro com o professor na sala passa a ser 
aproveitado para reelaborar esses conteúdos por meio da resolução de problemas, elaboração 
de projetos e criação de materiais em novos moldes. A facilidade para criar e publicar textos 
virtuais também têm entusiasmado professores que já possuem materiais acumulados ao 
longo de sua prática, e que podem, agora,compartilhá-los e incorporá-los de maneira efetiva à 
sua prática em sala de aula. Nesse processo, recursos que a literatura tem explorado há 
tempos, como a obra aberta, a participação do leitor como construtor do conhecimento, 
podem ser usados em novos moldes, em função da capacidade de compartilhamento e 
interatividade que os recursos digitais nos oferecem. A escola é um espaço privilegiado para a 
manifestação dessas mudanças, de forma crítica e sistematizada. O pressuposto de uma escola 
construtora da cidadania traz em si a responsabilidade de filiar-se à realidade e promover sua 
compreensão entre os alunos, para que possam agir na vida social. Portanto, a comunidade 
escolar precisa promover uma discussão sobre os impactos dessas mudanças na escola e no 
seu sistema de ensino, para, a partir disso, elaborar um plano de ação o mais adequado 
possível. O ensino híbrido vem ao encontro do debate: Formar culturalmente os sujeitos 
sociais significa possibilitar-lhes a compreensão da realidade social, para que possam agir-
aderindo, transformando e participando da sociedade, sem o que, torna-se inviável sua 
presença na produção cultural. (HORA, 2007, p. 39). O domínio dos instrumentos culturais de 
maneira autônoma, pressuposto do blended, permite ao aluno uma concepção mais apurada 
do mundo e de seu momento histórico, o que contribui para a formação voltada para a 
cultura, o trabalho, a sociedade e a política. Ademais, a proposta do ensino híbrido, como ficou 
claro neste capítulo, está diretamente relacionada a uma mudança substancial na cultura 
escolar. Portanto, seus direcionamentos devem ser bem estudados antes de implementados, 
pois alteram de modo significativo todas as concepções educacionais já consolidadas no Brasil. 
Se não forem bem esclarecidas para toda a comunidade, podem criar inúmeros problemas de 
aceitação, os quais são normais no início, mas que coordenação e docentes devem preocupar-
se em trabalhar arduamente para reverter. Segundo Hora, a escola diferencia-se das outras 
organizações educacionais por suas estrutura, proposta pedagógica, ação docente e ambiente 
sociocultural. O ensino híbrido pode permear todos esses elementos ou ser adaptado apenas 
em alguns deles; contudo, está diretamente ligado a uma urgente mudança na cultura escolar. 
O docente é responsável por um contínuo processo de ressignificação da aprendizagem, 
promovendo o desenvolvimento global dentro das áreas do conhecimento. É ele quem deve 
avaliar, em primeiro lugar, as possibilidades do ensino híbrido dentro das suas especificidades 
escolares, a partir das reflexões necessárias e das posturas adotadas pela comunidade escolar. 
Muitos estarão em busca de uma solução precisa sobre o que fazer para que uma modificação 
aconteça. Porém, dificilmente algo mudará a partir de regras determinadas a priori. Tampouco 
essa alteração virá de convicções pedagógicas ou de concepções de mundo. Ao contrário, para 
que uma mudança possa ocorrer, é preciso que uma relação comece, e esta só pode ter início 
nas condições determinadas pela experiência do aluno que chega à escola. 
 
 
 
Uma história social da mídia: de Gutenberg à 
internet. 
 
cap. 7, p. 346-378. 
 
7. Dentro e fora do ciberespaço O CURTO PERÍODO ENTRE O INÍCIO do novo milênio e os 
atentados aéreos a Nova York e Washington em 11 de setembro de 2001 pode ser 
considerado, apenas em retrospecto, um interlúdio. Os atentados chegaram de surpresa. O 
que aconteceu depois na primeira e turbulenta década do novo milênio é ainda difícil de ver 
em perspectiva. A vitória de Barack Obama nas eleições presidenciais norte-americanas de 
2008 não foi uma surpresa no mesmo sentido, mas teria sido impossível de prever em 2001. Já 
é amplamente percebida como algo que assinala o começo de uma nova era, uma expressão 
fora de moda, na história mundial, mas seu impacto permanece incerto, assim como o futuro 
da economia e do sistema bancário. O último capítulo deste livro, uma pesquisa de longa 
duração, tal como sua introdução, chega a um final, mas não a uma conclusão. Na história 
social e cultural da mídia desde Gutenberg, assim como, na verdade, em todas as narrativas da 
história social e cultural, todo capítulo final deve ser considerado inconcluso. Entre 2001 e 
2008 metas econômicas, sociais e ecológicas estavam sendo estabelecidas para o futuro e 
cronogramas elaborados para alcançá-las. Também se faziam tentativas, nem sempre 
estatísticas, de avaliar tendências, cujo grau de confiabilidade, assim como possibilidade de as 
metas serem atingidas, não será aqui discutido – uma das tendências inequívocas era a 
digitalização. Estabeleceram-se cronogramas no rádio e na televisão digitais, mas agora 
sabemos que aqueles relativos aos anos anteriores a 2008 nem sempre foram cumpridos. Da 
mesma forma, as metas referentes à banda larga nem sempre foram alcançadas. Tanto a 
digitalização quanto a banda larga precisam ser mais elucidadas. Diferentemente de 
tecnologias de telecomunicações anteriores – as redes de telefonia e a televisão a cabo e por 
satélite –, a banda larga prometia uma gama de potencialidades que não podiam ser 
facilmente definidas. O Broadband Stakeholder Group, ou Grupo de Intervenientes da Banda 
Larga, da Grã-Bretanha, descreveu-a em 2004 como “sempre acessível, no trabalho, em casa 
ou em movimento”, fornecida por “uma série de tecnologias de linha fixa, sem fio ou por 
satélite … larguras de banda progressivamente maiores, capazes de suportar conteúdos, 
aplicações e serviços genuinamente novos e inovadores”. No mesmo ano falou-se de uma 
“corrida da banda larga” entre diferentes países. (Bem de acordo com a época, uma metáfora 
esportiva.) As estatísticas coletadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento 
Econômico (OCDE), em Paris, mostraram que o Japão e a Coreia do Sul, países de fora da 
Europa e da América e com densas concentrações urbanas, estavam à frente nos números 
relativos à adoção da banda larga ultrarrápida, e cobravam dos consumidores os preços mais 
baixos. A Suécia vinha em terceiro lugar. A Grã-Bretanha considerava difícil imitá-los, já que 
carecia de sua impressionante infraestrutura, mas em 2004 seu governo fez do fornecimento 
de uma banda larga mais rápida e mais barata uma prioridade nacional. O mesmo fez George 
W. Bush em sua campanha presidencial daquele ano, quando enfatizou a necessidade de uma 
tecnologia de banda larga com acesso universal e de baixo custo na altura de 2007. Na Europa, 
em 2007 o Comissário da União Europeia para Sociedade da Informação e Mídia explicou a um 
público composto em grande parte por norte-americanos que dominar a banda larga era a 
principal meta da maioria dos países europeus na área das comunicações. A velocidade da 
banda larga era um tema de discussão, da mesma forma que o acesso a ela, e a velocidade era 
exaltada do mesmo modo que o fora quando se construíram as ferrovias (ver p.127-8) ou 
quando os futuristas italianos sonharam com uma velocidade de voo cada vez maior (ver 
p.229-30). Uma notícia publicada em 2008 dizia que “a BT [British Telecom] aposta[va] seu 
futuro numa banda larga vinte vezes mais rápida que a atual”. O serviço de 50 Mbs da Virgin 
Media significava que um álbum musical inteiro podia ser baixado em onze segundos e um 
programa de TV de uma hora, em apenas um minuto. Não deixa de ser irônico que houvesse 
menos ênfase na velocidade no que se refere ao transporte físico, tanto na aviação civil quanto 
nas viagens de trem. Isso se deu, em parte, em função dos congestionamentos de veículos, 
mas, sobretudo, dos alertas sobre emissões de carbono e aquecimento global. A construção de 
novas pistas em aeroportos era sempre contestada. O conforto – encontrar um lugar para se 
sentar num trem, por exemplo – era mais importante do que a velocidade ferroviária. A 
compra de passagens pela internet significava que os agentes de viagens perderiamo 
emprego. Qual seria o futuro do automóvel? Carros elétricos estavam sendo desenvolvidos, e 
até mesmo anunciados, mas não havia infraestrutura para estimular o seu uso. Todas as 
grandes empresas automobilísticas tiveram graves problemas econômicos em 2008. Será que 
as cidades do passado recente, com frequência dependentes do transporte motorizado, teriam 
maior sobrevivência que as do passado remoto? Uma placa comemorativa do lado de fora da 
fábrica da Ford em Highland Park, subúrbio de Detroit, que foi inaugurada em 1910 e em 1925 
produziu 9 mil Fords Modelo T em um único dia, exibia as palavras “A produção em massa logo 
saiu daqui para todas as fases da indústria norte-americana e estabeleceu o padrão de 
abundância para a vida no século XXI”. Em 2008, ano de colapso econômico internacional, 
quando Ford, General Motors e Chrysler recorreram a Washington em busca de ajuda 
financeira, todas as palavras dessa placa pareciam desonestas. Da mesma forma, muitas 
palavras sobre privacidade e direitos humanos numa era de vigilância que coincidiu com o 
sexagésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Houve incertezas 
morais a respeito de privacidade e direitos humanos, apenas brevemente apresentadas neste 
capítulo, tal como houve crises econômicas, globais em suas consequências e com influência 
sobre China e Japão, assim como sobre Grã-Bretanha e França. Os Estados Unidos eram o 
centro delas. Poderia haver remédios globais? Até que ponto a responsabilidade era da 
ambição humana? Neste capítulo temos de olhar tanto para trás quanto para a frente e 
assumir velhas e novas questões. Diante disso, concluímos o capítulo não com um epílogo para 
contrabalançar a introdução ou com conclusões formais, perfeitamente resumidas, mas com o 
que chamamos de clímax. Em direção ao ciberespaço Em nossa introdução, visitamos por um 
breve período o ciberespaço, depois saímos dele rapidamente, de volta ao “mundo real”, 
conceito tão difícil de identificar quanto “realidade virtual”. Ciberespaço é uma palavra que 
entrou em uso geral durante a década de 1990 por meio da internet, mas muito antes dela, 
em 1938, um redator da Harper’s Magazine, C.R. White, havia previsto que a tecnologia logo 
invadiria o “território do real”. “Claramente, a corrida hoje é … entre as coisas que são e 
aquelas que parecem ser.” Em 1938, os “efeitos sonoros” já tinham começado a tomar o lugar 
do som em si, e não apenas no cinema. White não tentou identificar “as coisas que são”. Nem 
retornou através dos séculos até Platão, como faria Anthony Smith em seu primeiro livro sobre 
a radiodifusão, The Shadow in the Cave: The Broadcaster, his Audience and the State (1973). 
Mais de vinte anos depois, o léxico do ciberespaço, por vezes chamado hiperespaço, ainda 
estava numa fase de “turbulência formativa”, segundo Meredith Bricken, cientista do 
Laboratório de Tecnologia com Interface Humana da Universidade de Washington. “A relação 
da tecnologia informacional atual com os elementos constituintes do mundo virtual”, escreveu 
ele, “não é totalmente clara.” Muitos outros acadêmicos concordaram. Uma coletânea de 
textos relacionados a Cyberspace, First Steps, de Michael Benedikt, estabelecera o tom do 
discurso sobre o ciberespaço. Benedikt era um professor de arquitetura da Universidade do 
Texas, em Austin, que via o ciberespaço como “um território pleno de dados e mentiras, com 
as substâncias da mente e as memórias da natureza, com 1 milhão de vozes e 2 milhões de 
olhos”. Esse milhão retórico havia retomado mais uma vez o seu lugar (ver p.144). Nem 
mesmo Benedikt, contudo, conseguiu prever que em março de 2008 haveria nada menos que 
1,4 bilhão de usuários da rede mundial, com mais de 305 milhões de pessoas conectadas por 
banda larga. A palavra “ciberespaço”, parte de um grupo de ciberpalavras, foi proposta em 
1984 pelo autor de vanguarda de ficção científica William Gibson (1948-), e sete anos depois 
ele descreveu um mundo em que todos os telefones seriam substituídos pelo Matrix, a soma 
interconectada de todas as redes de computadores existentes. A televisão também fazia parte 
da visão de Gibson. Descrevendo o céu sobre o porto que então sobrevoava em seu romance 
Neuromancer, ele introduziu a vigorosa imagem de um céu “da cor de uma televisão 
sintonizada num canal fora do ar”. Evidentemente, a televisão não morreu no começo do 
século XXI e, num ambiente multimídia, devia haver poucos canais inativos. Na verdade, no 
século XXI a televisão continuou sendo um veículo popular forte e persistente, atraindo amplas 
audiências, como a imprensa escrita, que em alguns aspectos era um meio ainda mais 
poderoso do que antes, investigando e expondo os fatos. Os livros tampouco estavam mortos, 
embora sua morte, até mesmo iminente, tenha sido frequentemente prevista. O cinema 
anunciou o ciberespaço antes que a palavra fosse criada. Tron (1982) apresentou um 
personagem envolvido na busca frenética de informação ou controle por meio de um terminal 
de computador. Indo além do tema homem versus máquina, o filme mostrava sequências 
geradas ou realçadas por computador. Vetores gráficos são amplamente usados para gerar o 
que se poderia chamar de ciberespaço. A saída final da ciberpaisagem nos mostra na tela um 
adolescente jogando videogame. Para o romancista J.G. Ballard (1930-2009), escrevendo antes 
de Tron, “pela paisagem da comunicação movem-se os espectros de tecnologias sinistras”. Ao 
lado do cinema e dos romances de ficção científica, os quadrinhos também faziam parte da 
genealogia do ciberespaço. Em 1992, a revista londrina 2000 AD, título revelador para uma 
série centrada no futuro, incluiu legendas como “A realidade virtual comanda”. Destinada aos 
“terráqueos”, ela não se referia ao ciberespaço, mas ao paraespaço, e incluía o retrato bizarro 
de um “vírus de computador senciente”. Outra legenda dizia “É melhor voltarmos para o 
mundo real”. O romancista norte-americano William Burroughs (1914-97), que Gibson 
reconheceu como um de seus predecessores, tinha aplicado a palavra “vírus” à mídia antes 
que ela começasse a ser usada por tecnólogos e jornalistas multimídia em relação a 
computadores em particular. Também havia referências transmidiáticas. Quando um “vírus de 
computador do mundo real” foi descrito pela imprensa em “tempo real” em 1988, tanto o 
New York Times quanto a revista Time usaram quadrinhos para ilustrar o que queriam dizer 
com a expressão “infecção viral”, com a Time acrescentando outra referência histórica em seu 
título, “Invasion of the Data Snatchers”.b Cada vírus tinha sua própria “assinatura”, e embora 
fosse possível fornecer proteção contra alguns deles por meio de software antivírus, não havia 
garantia absoluta de não infecção. Os paralelos com a saúde pareciam pertinentes, mesmo 
que apenas porque houvesse, a partir da década de 1980, uma preocupação crescente com a 
saúde, pública ou privada, tanto na mídia pública quanto entre os políticos. Em maio de 2000 o 
chamado love bug foi amplamente divulgado, não menos por ter se originado, não nos Estados 
Unidos, mas nas Filipinas. Era verdadeiramente global, assim como o chamado bug do milênio, 
cujo temor já se havia dissipado a um elevado custo. Em 2001 o próprio Gibson, olhando em 
retrospecto para seus primeiros textos, de vinte anos antes, avaliou que seus lampejos iniciais 
sobre o ciberespaço já estavam ultrapassados. Ele intitulou seu prefácio ao livro Multimedia: 
From Wagner to Virtual Reality, uma coletânea de textos históricos da autoria de Randall 
Packer e Ken Jordan, “Geeks e Artboys”, e nele descreveu a “cibersubstância instavelmente 
emergente” da década de 1980 e seu próprio papel de artboy em ajudar a criá-la. Ele não tinha 
perdido o entusiasmo pela “multimídia”, mas agora ela se baseava, afirmou ele, na crença de 
que ela (no singular) não era “uma invenção, mas uma descoberta permanente da forma como 
amente e o universo que esta imagina se ajustam e interagem”. Naquele momento o 
“paradigma das luvas e dos óculos velhos” da realidade virtual tinha dado lugar a videogames 
baseados na internet, uma das formas de entretenimento mais populares, alguns deles 
apavorantes. O primeiro jogo para computador foi Spacewar (1962), que apresentava 
contornos simplórios de espaçonaves, os quais logo se tornaram conhecidos de todos os 
telespectadores. Em 2009, quando foi lançado um novo filme da série Jornada nas estrelas, o 
jogo Star Trek Scrapbook, da Trek Movies, lhe fez companhia. Enquanto Gibson, 
retrospectivamente, colocava em perspectiva sua “artística” ficção científica inicial, um dos 
mais explícitos profetas da internet, David Gelernter, autor de Mirror Worlds (1991), usava 
“fluxo de vida”, uma expressão mais velha do que ciberespaço, para descrever como 
acreditava que a internet deveria avançar. A imagem do desktop associada à Microsoft antes 
de o número de usuários da internet crescer espetacularmente era para ele inapropriada: 
baseava-se numa falsa analogia entre computadores e gavetas colocadas em cima ou embaixo 
da mesa. Para ele computadores eram fundamentalmente diferentes de gavetas porque 
podiam “levar à ação” em qualquer nível. Eles criavam um “fluxo de vida” ou, usando uma 
metáfora espacial já mencionada neste capítulo, uma paisagem em que se podia navegar ou 
voar em qualquer nível. O espaço, tal como usado na palavra ciberespaço, podia ser “vivido” 
da mesma forma que navegado ou sobrevoado. Essa é a ideia por trás do Second Life, um 
mundo virtual lançado em 2003 pela Linden Lab em que os usuários, conhecidos como 
“residentes”, podem conhecer outros usuários e até comprar e vender propriedades virtuais. 
O artista de computador norte-americano Myron Krueger (1942-) percebeu isso antes de 
Gibson criar a palavra ciberespaço. A partir de 1969, usando a cibernética como porta de 
entrada, ele colaborou com artistas e engenheiros, sob a influência do músico John Cage, na 
criação do que chamou de “ambientes reativos”, “realidades artificiais que buscam não 
estimular o mundo físico, mas definir relações arbitrárias e abstratas, se não impossíveis, entre 
ação e resultado”. A linguagem é difícil, mas o feito foi substancial. Entre 1969 e o fim da 
década de 1970, Krueger e os colegas que trabalhavam com ele receberam financiamentos da 
Fundação Nacional de Ciências e do Fundo Nacional para as Artes, uma interessante 
combinação institucional transcultural. Krueger realizou muitas exposições, também, que o 
vinculam ao mundo real: uma delas em 1971, no que chamou de “espaço físico”, e outra em 
1975, no que denominou “videoespaço”. Ele e seus colegas não estavam sozinhos, fosse em 
suas pesquisas ou exposições. Durante a década de 1990, Daniel Sandin, um artista de mídia, e 
Thomas da Tanti, engenheiro, que vinte anos antes haviam entrado juntos para o Laboratório 
de Visualização Eletrônica da Universidade de Illinois, em Chicago, projetaram o que 
chamaram (tendo em mente Platão) de Cave (Cave Automatic Virtual Environment, ou caverna 
digital), que juntava imagens interativas geradas por computador e áudio em 3D com espaço 
físico. Os participantes eram cercados por imensas pinturas rupestres digitais. Naquele 
momento, como Gibson observou em 2001, os habitantes da caverna não precisavam usar os 
capacetes ou as luvas eletrônicas geralmente usados nos primeiros movimentos deliberados 
rumo ao ciberespaço. Um dos primeiros capacetes, desenvolvido nos laboratórios da Nasa que 
estavam testando técnicas de simulação, mostrou-se interessante para a televisão, o cinema, 
fabricantes de videogames e publicitários. Era um “clássico”. Mulheres, crianças, televisão e 
internet As mulheres figuravam apenas de forma estritamente limitada no paradigma das 
“velhas luvas e óculos de proteção”, menos, de fato, do que as crianças, que abriram seu 
caminho no ciberespaço independentemente de seus pais. Assim, apareceram com destaque 
em todas as discussões sobre a internet, como tinha ocorrido em todas as discussões sobre a 
televisão (ver p.279). Havia múltiplos vínculos. Tim Campbell, “embaixador das crianças” de 
Londres em 2007, era mais conhecido como o vencedor de uma competição da BBC em 2006 – 
houve muitas delas – cujo prêmio era tornar-se o Aprendiz do milionário sir Alan Sugar. A 
televisão estava quase interligada à vida das crianças, como parecia ter sido durante os anos 
1970 e 1980. Na Grã-Bretanha, em 2008, segundo a agência de pesquisa de mercado 
Childwise, 63% delas viam televisão na cama antes de dormir, e um número maior de crianças 
entre doze e catorze anos passava doze horas por semana na internet, deixando de lado a BBC 
e a ITV. Esta última decidiu, assim, cortar o tempo de programação infantil na TV e não 
autorizar novos programas. Em resultado, segundo a agência reguladora Ofcom (ver p.375), 
das 115 mil horas de programação infantil transmitidas por ano, apenas 1% era produzido na 
Grã-Bretanha. Isso afetava a vida nos lares, onde as crianças agora estavam passando da 
programação agendada para a internet. Nas escolas, por toda parte, incluindo os países em 
desenvolvimento, as crianças eram estimuladas a mudar para novas tecnologias tanto na sala 
de aula quanto fora dela. Entusiastas falavam de um “País das Maravilhas digital”, 
“educacionalistas”, uma palavra proibida, salientando a importância de se aprender jovem, da 
mesma forma que os idiomas. Mas a mídia impressa geralmente enfatizava mais os perigos da 
internet para as crianças do que as oportunidades que ela oferecia. Assim, na Irlanda, em 
2004, o Irish Times noticiou uma pesquisa da Junta de Aconselhamento sobre a internet, 
mostrando que os pais estavam cada vez mais conscientes dos “perigos” da rede. Nove por 
cento das crianças tinham visto alguma coisa que as deixara desconfortáveis na internet, 13% 
tinham visto coisas que seus pais não gostariam que vissem e 47% dos pais viam na internet 
uma atividade de alto risco para crianças. Havia esquemas de filtragem não obrigatórios na 
Grã-Bretanha, na Suécia, no Canadá e na Nova Zelândia, mas em 2008, quando o governo 
trabalhista australiano apresentou um complexo plano de cibersegurança, um esquema de 
filtragem de conteúdo baseado numa promessa eleitoral do primeiro-ministro Kevin Rudd, a 
oposição veio de diferentes quadrantes. Colin Jacobs, que dirigia um grupo lobista de usuários 
on-line, o Electronic Frontiers Australia, afirmou que o plano do governo envolvia mais 
interferência técnica na internet do que aquela que havia sido tentada no Irã. Houve reações 
comparáveis à dos norte-americanos em relação à aprovação pelo Congresso de uma Lei de 
Decência nas Comunicações, em 1999, impondo o uso compulsório do V-chip (ver p.282-3). 
Não se sabe quantos pais usaram o V-chip, tampouco o grau de sucesso dos esquemas de 
classificação etária, semelhantes ao utilizado na indústria cinematográfica, ou em áreas para 
adolescentes e adultos. Não está claro o que a lei podia ou devia fazer. As crianças podiam 
revelar suas preferências: eram elas os principais clientes dos parques temáticos do tipo 
Disney que logo se espalharam pelo mundo. Não se esperava que as crianças em suas casas 
assistissem aos “reality shows” televisivos, que levavam celebridades de todos os tipos a 
lugares exóticos e perigosos, fora de seu próprio mundo, que elas nunca visitariam por 
vontade própria. Esses e os “shows de talentos” também levavam não celebridades a altitudes 
estonteantes que elas nunca escalariam na “vida real”. Durante os anos 1990 e a primeira 
década do século XXI, as fronteiras entre a realidade e a realidade virtual, assim como aquelas 
entre a velha e a nova mídia, estavam mudando, como também entre os meios de 
comunicação, as fronteiras entre o experimental e o estabelecido e, na “vida real”, entre as 
responsabilidades dos pais e da comunidade. Na área cultural,as fronteiras entre “alta” e 
“baixa” cultura, entre os quadrinhos e as histórias ilustradas, já estavam sendo dissolvidas há 
décadas. O mesmo ocorria entre as disciplinas acadêmicas – história, sociologia, antropologia, 
psicologia, economia, direito, engenharia, medicina e ciências da vida. Enquanto isso, na área 
do comportamento, hábitos e vícios começaram a se confundir. Da mesma forma, nas 
“culturas das drogas” de muitas partes do mundo – expressão que continuou sendo usada no 
século XXI –, a alucinação e a psicose. Para Timothy Leary, guru das drogas na década de 1960, 
escrevendo vinte anos depois, os computadores eram “mais viciantes que a heroína”. Em sua 
maioria, os usuários da internet não poderiam ser descritos como viciados. Escrevendo sobre 
eles, Charlene Li e Josh Bernoff identificaram o que chamaram de “onda sísmica”, expressão 
muito mais antiga do que ciberespaço. Em seu livro com esse título [em inglês, Groundswell], 
eles se referiram ao “movimento espontâneo de pessoas usando ferramentas on-line para se 
conectarem, controlarem sua própria experiência e obterem o que precisam – informação, 
apoio, ideias, produtos, poder de barganha entre si”. Muitos dos usuários, mais de dois terços, 
preocupavam-se basicamente com informação e entretenimento, mas pesquisas indicavam 
que a proporção de pessoas que as obtinham por si mesmas na Web e por meio dela estava 
crescendo, acompanhando o crescimento do número de usuários da rede. A palavra “blogger”, 
ou “blogueiro”, referia-se ao usuário da internet que postava em seu próprio site informações, 
incluindo opiniões e preconceitos pessoais, da mesma forma que “fatos” e rumores não 
confirmados. Os blogs eram fáceis de criar, e o custo de “publicá-los” era baixo. Uma pesquisa 
de 2007 mostrou que 12 milhões de norte-americanos tinham um blog. Os blogueiros 
japoneses constituíam uma proporção ainda maior da população. Na Grã-Bretanha os blogs 
eram regularmente mencionados nos jornais, tanto por editores quanto por jornalistas. Muitos 
deles se viam como “jornalistas cidadãos”; alguns observadores os viam como indivíduos 
atraídos pelo escândalo e pelo discurso da conspiração. Em 2008, Hazel Blears, secretária de 
Estado para as Comunidades, definiu o “hype da mídia” e os “blogs cínicos” como igualmente 
destrutivos em relação ao discurso político saudável. Em seu discurso na Hansard Society ela 
não se referiu à presença na internet de grandes empresas que forneciam uma estrutura para 
o que os usuários agora faziam. A Microsoft tinha adquirido uma posição de liderança com o 
Windows 95 (e seu navegador, o Internet Explorer) e o Windows 98, nos anos de prosperidade 
que antecederam março de 2000, quando o índice Nasdaq chegou ao pico para depois cair. O 
presidente de sua divisão empresarial, Jeff Raikes, que se juntara a Bill Gates da Apple em 
1982, estava em melhor posição para avaliar a extensão de seu sucesso. Em 2006, ao olhar em 
retrospecto, ele observou que, se em 1982 Gates e ele tivessem previsto que haveria 500 
milhões de pessoas usando ferramentas do Microsoft Office, “iriam achar que estávamos 
malucos”. O próprio Gates discursava anualmente na Feira de Eletrônicos de Consumo de Las 
Vegas, e em 1998 observou que não acreditava que o computador pessoal fosse “a única 
ferramenta da era da informação”. “As pessoas querem informação em todos os lugares a que 
vão. Elas a querem num aparelho pequeno. No seu carro. Combinada com seu telefone sem 
fio.” Gates não mencionou então educação nem entretenimento. Tampouco sugeriu que a 
informação poderia ser transferida para a internet. Apenas dois anos depois, porém, a 
Microsoft lançou o Microsoft.net e serviços de internet. Havia, é claro, outros provedores. A 
Apple, sempre um rival tremendamente persistente da Microsoft, lançou em 2001 o seu iPod, 
que transformou o mundo da música: o adjetivo frequentemente aplicado a ele era “maneiro”. 
Seu iPhone, um telefone do tipo touch-screen, que combinava reprodutor de música, celular, 
vídeo, e-mail e internet, seguiu-se em 2008. Steve Jobs, cofundador e há muito tempo o 
principal executivo da Apple, também fazia seus discursos anuais que, juntamente com os de 
Bill Gates, delineiam a história convencional das comunicações. Em 2001 duas outras 
companhias haviam entrado no cenário da internet, Yahoo! e Google, com seus mecanismos 
de busca, a primeira criada em 1994 e a segunda em 1998. A história dos conflitos e fusões 
empresariais, subsequentemente intricada e que continua em curso, ligando economia e 
tecnologia e sempre concentrada no Yahoo! e no Google, só pode ser contada sucintamente: 
os detalhes, contudo, são tão fascinantes quanto seus resultados. Os garotos prodígios que 
fundaram o Google (figura 29), Sergey Brin, com 24 anos de idade, e Larry Page, 25, ganharam 
em 2001 a companhia de Eric Schmidt, que saíra da Novell (ver p.158), formando um 
triunvirato que em 2004 fez uma “flutuação”c de sua empresa de busca. A publicidade veio do 
fato de que antes da “flutuação” eles realizaram um leilão holandês não convencional e o 
anunciaram nas páginas improváveis de uma questionável entrevista à Playboy. Fizeram-se 
muitas comparações entre a dupla Brin e Page e seus jovens rivais, ligeiramente mais velhos, 
Jerry Yang e David Filo (figura 30), cofundadores do Yahoo!, uma sigla jocosa para “Yet 
Another Hierarchical Officious Oracle”, ou “Apenas um Outro Oráculo Hierárquico Informal”. O 
nome Google era uma corruptela de “googol”, termo matemático que significa o número 1 
seguido de cem zeros. Tanto os cofundadores do Yahoo! quanto os do Google se divertiam 
com o que estavam fazendo: diziam que Yang e Filo tinham se inspirado no computador visto 
na série de TV Jornada nas estrelas, capaz de responder a (quase) qualquer pergunta. Em 
consequência, sempre estavam prontos para fazer coisas inesperadas de formas inesperadas. 
FIGURA 29. Os fundadores do Google Inc., Sergey Brin (centro) e Larry Page (à direita). Sem a 
capacidade de pesquisa, uma internet em expansão perderia sua força. A chave para o sucesso 
financeiro do Google era sua forma de obter grandes receitas com a publicidade, 
diferentemente da busca, oferecida de graça a seus usuários. Em vez de bombardeá-los com 
anúncios que eles podiam ou não desejar, o Google os apanhava no momento em que 
encontravam na Web o que estavam procurando e então apresentava o texto publicitário 
apropriado. Os anunciantes compravam palavras-chave relevantes para determinado produto 
ou serviço, de modo que, quando e se essas palavras aparecessem numa busca, esse produto 
ou serviço ganharia uma posição mais destacada na página de resultados. O triunvirato que 
dirigia o Google, operando a partir de sua sede na Califórnia, o Googleplex, mostrou-se 
altamente adaptável. Assim ele anexou seu maior competidor independente, o grupo de 
publicidade on-line DoubleClick, e passou para a área de vídeo, adquirindo por 1,65 bilhão de 
dólares o YouTube, um site de apresentação de vídeos criado, como o próprio Google, numa 
garagem, e em 2008 lançou um novo sistema de software móvel, o Android, usando para 
divulgá-lo um anúncio numa revista em quadrinhos alemã. Havia um celular para acompanhar 
o Android, produzido em Taiwan. FIGURA 30. Os fundadores do Yahoo!, ferramenta de 
pesquisa na internet. Jerry Yang e David Filo eram dois típicos jovens pioneiros da internet. 
Outras atividades incluíam o Google Maps e o Google Earth. Alguns de seus mapas atendiam 
usuários sem acesso a um atlas (havia resistência a eles). O Google Book Search permitia que 
os usuários baixassem ou lessem na tela uma ampla gama de romances e outros textos. 
Críticos franceses do Google, que temiam sua influência sobre a cultura francesa, 
contraditoriamente queixavam-se de que a escolha dos livros e textos favorecia a Grã-
Bretanha e os Estados Unidos, e afirmavam que o Google não devia se meter com a literaturafrancesa. Como o Google frequentemente foi notícia entre 2004 e 2008 – e não somente nas 
páginas de negócios dos jornais –, houve assuntos que chegaram às manchetes, como o 
anúncio, em 2008, de que a rainha Elisabeth II, que fez seu primeiro discurso de Natal 
televisionado em 1957, tinha um espaço próprio no YouTube e o usaria, juntamente com a 
televisão e o rádio, em sua mensagem de Natal de 2008. Esse elo britânico interessava a 
Schmidt, que discursou na conferência de 2007 do Partido Conservador britânico, quando 
deixou claro que para ele ainda havia um negócio inacabado: queria construir uma empresa 
Google dez vezes maior que a então existente. Para completar o quadro, Schmidt era então 
não apenas o executivo-chefe do Google, mas membro da diretoria da Apple. Em 2008 o site 
mais visitado, tanto na Grã-Bretanha quanto nos Estados Unidos, foi o Google. O Yahoo!, 
contudo, ainda liderava os rankings dos sites de busca em todo o mundo. A Microsoft, que 
vinha em terceiro, respondendo por 12,8% das buscas, fez então uma audaciosa oferta para 
adquirir o Yahoo!, levando o Google a acusá-la de tentar estabelecer “monopólios de 
propriedade” com seus pacotes de software Windows e Office. O Yahoo! rejeitou a oferta, 
contudo, criando considerável turbulência em suas próprias fileiras e entre seus acionistas, 
particularmente depois de a Microsoft retirar a oferta. “Ninguém está comemorando esse 
resultado”, afirmou Yang. “Vivemos e trabalhamos num mundo competitivo e a Web só vai se 
tornar mais competitiva.” Mas Yang não conseguiu encontrar outro parceiro e anunciou que 
renunciaria ao cargo de diretor-executivo assim que a diretoria encontrasse um sucessor. 
Havia empresas novatas na Web no período coberto por este capítulo, as mais bem-sucedidas 
desenvolvendo o que logo se veio a chamar de sites de rede social. Seu sucesso provou que 
muitos usuários não buscavam isolamento, mas interação: queriam fazer contato com outros 
usuários no ciberespaço. Uma das novas companhias que tiveram mais êxito no atendimento a 
esse impulso comunitário era o Facebook, fundado em 2004 por Mark Zuckerberg, que em 
2008 tinha 161 milhões de membros, dos quais 18,4 milhões na Grã-Bretanha. Zuckerberg, que 
ainda tinha pouco mais de vinte anos, pensava em termos globais com tanta naturalidade 
quanto a Microsoft, o Yahoo! e o Google. “O crescimento é nossa prioridade”, afirmou ele num 
encontro anual de grandes tecnólogos e investidores da internet realizado em São Francisco 
em 2008. Outra empresa representada no encontro, a Myspace, estava explicitamente 
interessada na “comunidade on-line”, da mesma forma que a My Society, que ajudava a 
operar sites de uso comunitário. O Myspace tinha sido fundado em 2003 por Chris de Wolfe e 
seus parceiros, mas fora adquirido dois anos depois por Rupert Murdoch como parte de uma 
transação maior. O cinema, em que Murdoch estava pessoalmente interessado, enfrentava 
problemas distintos em função da internet, e de início as companhias cinematográficas não 
estavam dispostas a exibir filmes novos on-line. A música, porém, enfrentava problemas ainda 
maiores, pois a música on-line provocava, como tinha acontecido com o rádio, problemas de 
pirataria. Na Grã-Bretanha, a Lei de Direitos Autorais e Marcas Registradas (Delitos e 
Observância) de 2002 aumentou as penas para roubo de direitos autorais e ampliou os 
poderes de busca e apreensão da polícia, mas essa medida irritou muitos usuários de telefones 
celulares e era difícil de aplicar. Para o Times de Londres, em 2002, nunca tinha havido um 
desrespeito mais flagrante pelo direito autoral: “a nova tecnologia, a internet e o mercado 
global significam que qualquer um pode reproduzir e distribuir material protegido por direito 
autoral, a partir de sua cama, com equipamento adquirido numa loja tradicional de produtos 
eletrônicos”. Como sempre, tecnologia e economia andavam juntas, mas essas questões 
envolviam compositores e intérpretes, juntamente com empresas, da mesma forma que a 
longa e amarga greve dos roteiristas de Hollywood em 2007. No mundo dos negócios da 
música, a EMI, uma grande companhia, com uma longa e brilhante história, que se inicia com a 
Gramophone Company (ver p.207-8), passou por uma série de problemas antes e depois de 
ser adquirida, em 2007, pela Terra Firma, um fundo de ativos privados dirigido por Guy Hands 
(1959-), que tentou deixar claro não estar procurando popularidade, mas eficiência. Ele 
reconhecia a força das atividades de edição da EMI e o esplendor histórico de seu catálogo, 
mas questionava se ele estava atraindo novos e adequados talentos. Preocupados com essa 
abordagem, vários artistas criativos bem conhecidos saíram da EMI, que, em outras divisões 
que não a de edição, deixou de ser lucrativa. Nesse contexto, a indústria como um todo havia 
tido problemas na maioria de seus setores antes e depois da aquisição da EMI pela Terra 
Firma. Assim, na televisão, o programa Top of the Pops, que já estivera no topo do ranking, 
desapareceu das telas em 2006 e, olhando para um período anterior na história da música 
pop, do outro lado do Atlântico a própria sobrevivência dos antigos prédios, muito filmados, 
da Tin Pan Alley, em Nova York, lar original das partituras musicais, era ameaçada por seus 
administradores. Entretanto, em 2008, apesar da depressão que atingia o mundo dos 
negócios, havia esperanças de que a indústria musical britânica estivesse “dobrando a 
esquina” após travar uma batalha perdida por toda a década contra a pirataria, uma 
consequência da digitalização. Apesar da ubiquidade da “música de graça”, a produção de 
“pacotes” de música gravada e de dispositivos técnicos para tocá-la, procedimento em que a 
Apple foi pioneira, mostrou-se frequentemente uma estratégia de marketing bem-sucedida. A 
música em formato MP3,um formato popular para download de música da internet para ser 
posteriormente tocada em PCs e celulares, era “legítima” do ponto de vista jurídico, e em 2008 
mais de 700 mil espectadores estavam baixando programas da BBC de todos os tipos, não 
apenas música, todos os dias, por meio de seu novo serviço de iPlayer. A história do iPlayer 
remonta a 2002 com o lançamento de uma rádio on-line que tornou possível mudar o tempo 
de escuta para “alcançar” ou repetir à vontade. O direito autoral tinha sido uma grande 
preocupação das indústrias do cinema e da música quando confrontadas pela internet, e 
também o era dos colégios e universidades. Na educação, contudo, havia mais boa vontade e 
dificuldades mais fáceis de enfrentar, em particular nos países em desenvolvimento distantes 
da Europa e dos Estados Unidos, incluindo países asiáticos em que a música era 
frequentemente pirateada. Eles muitas vezes conseguiam recursos por meio de organizações 
não governamentais e fundações internacionais privadas. Assim, em 2007, na África, Quênia, 
Burundi e Madagascar obtiveram 83 milhões de dólares do Banco Mundial para ajudar a 
estabelecer redes de banda larga de alta velocidade. Lá, como em outros lugares, os 
estudantes foram mais rápidos em perceber o que poderiam fazer com a rede mundial do que 
seus professores. Um relatório Horizon de 2008, produzido pela New Media Convention em 
colaboração com o chamado Educause Learning Institute, observava que os alunos haviam 
“abraçado tecnologias sociais como o Facebook e outras plataformas similares [observe-se o 
novo uso de uma velha palavra que tem atrás de si uma história tanto política quanto teatral] 
em números sem precedentes, mas essas tecnologias continuam sendo um mistério para 
muitos nos campi. Ferramentas de webware com evidente potencial no campo educacional 
estão tendo a mesma recepção”. O número de siglas utilizadas nas empresas de tecnologia de 
comunicações podia ser, por si mesmo, uma barreira ao acesso imediato não apenas nos 
países em desenvolvimento, mas houve alguns nomes bem escolhidos, associados à

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