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A cópia do material didático utilizado ao longo do curso é de propriedade do(s) autor(es), não podendo a contratante vir a utilizá-la em qualquer época, de forma integral ou parcial. Todos os direitos em relação ao design deste material didático são reservados à Fundação Getulio Vargas. Todo o conteúdo deste material didático é de inteira responsabilidade do(s) autor(es), que autoriza(m) a citação/divulgação parcial, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. Adicionalmente, qualquer problema com sua turma/curso deve ser resolvido, em primeira instância, pela secretaria de sua unidade. Caso você não tenha obtido, junto a sua secretaria, as orientações e os esclarecimentos necessários, utilize o canal institucional da Ouvidoria. ouvidoria@fgv.br www.fgv.br/fgvmanagement 3 Ética Comercial SUMÁRIO 1. PROGRAMA DA DISCIPLINA ........................................................................... 4 1.1 EMENTA ............................................................................................................ 4 1.2 CARGA HORÁRIA TOTAL .......................................................................................... 4 1.3 OBJETIVOS ........................................................................................................ 4 1.4 CONTEÚDO PROGRAMÁTICO ..................................................................................... 4 1.5 METODOLOGIA .................................................................................................... 4 1.6 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO ....................................................................................... 4 1.7 BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA .................................................................................. 4 CURRICULUM VITAE DO PROFESSOR ................................................................................. 5 2. TEXTOS PARA ESTUDO .................................................................................... 6 2.1 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA ÉTICA ......................................................................... 6 2.1.1 FILOSOFIA DA MORAL E CIÊNCIA DA MORAL ............................................................... 6 2.1.2 DEFINIÇÕES SOBRE ÉTICA .................................................................................... 6 2.1.3 MORAL, MORALIDADE, AMORALIDADE E IMORALIDADE ................................................... 6 2.1.4 TEORIAS ÉTICAS ............................................................................................... 7 2.1.5 PROBLEMAS MORAIS E PROBLEMAS ÉTICOS ................................................................ 8 2.1.6 CONTROLE ÉTICO .............................................................................................. 9 2.1.7 CÓDIGO DE ÉTICA E CONDUTA PROFISSIONAL ...........................................................10 2.2 ÉTICA E NEGOCIAÇÃO ...........................................................................................14 2.3 ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS ......................................................................17 2.4 A REALIDADE PRÁTICA ..........................................................................................18 2.5 VENDEDORES EM GUERRA ......................................................................................24 2.6 TOLERÂNCIA ZERO PARA AS MENTIRAS DO VENDEDOR ......................................................29 2.7 MINICASOS .......................................................................................................34 2.8 CASOS ............................................................................................................36 2.9 MICHAEL SANDEL E AS PEQUENAS CORRUPÇÕES EMPRESARIAIS ..........................................39 2.10 TEXTOS SUSTENTABILIDADE .................................................................................44 4 Ética Comercial 1. PROGRAMA DA DISCIPLINA 1.1 Ementa Aprendizado moral. Princípios Fundamentais da Ética. Teorias Éticas. Ética nas Organizações. Moral da Integridade e Moral Oportunista. Código de Ética Corporativo. Ética em Vendas. Cultura Corporativa. Responsabilidade Social. 1.2 Carga horária total 12 horas/aula. 1.3 Objetivos Discutir a importância da ética nas organizações e para a força de vendas. Identificar o clima ético no trabalho. Destacar a importância de se definir valores como caminho para a tomada de decisões estratégicas. Analisar dilemas éticos em vendas. Discutir sobre a necessidade de um Código de Ética em Vendas. 1.4 Conteúdo programático A questão ética nas Organizações. Dilemas éticos que acompanham a força de vendas e como encará-los. A importância da cultura ética corporativa e seu reflexo na ética comercial. Situações do dia-a-dia em vendas. Clima ético no trabalho: como estimulá-lo. 1.5 Metodologia Exposição dialogada, discussões em grupo e dinâmicas. 1.6 Critérios de avaliação A nota da disciplina será baseada em prova individual e sem consulta. 1.7 Bibliografia recomendada ARIELY, Dan. A mais pura verdade sobre a desonestidade. Rio de Janeiro: Elsevier. BAZERMAN, Max H. &TENBRUNSEL, Ann E. Antiético, eu? Rio de Janeiro: Elsevier. SANDEL, Michael. Contra a perfeição. São Paulo: Civilização brasileira. SANDEL, Michael. Justica. São Paulo: Civilização brasileira. THIRY-CHERQUES, Hermano Roberto. Ética para executivos. Rio de Janeiro: Editora FGV. ZAJDSZNAJDER, Luciano. Ética, estratégia e comunicação. Rio de Janeiro: Editora FGV. 5 Ética Comercial Curriculum vitae do professor LUÍS ROBERTO MELLO atua há 18 anos como consultor e instrutor nas áreas de Estratégia, Marketing, Vendas e Recursos Humanos. Neste tempo atendeu a diversas organizações nacionais e multinacionais, com ou sem finalidade lucrativa, de vários portes, tais como: Algar, Banco do Nordeste, Bradesco Seguros, BR Distribuidora, Casa & Video, Correios, Fetranspor, Hospital Tacchini, Lojas Renner, Oi, Petrobras, Rioônibus, Saint-Gobain Abrasivos, SHV Gás, Suzano, Telefônica Empresas, TIM, Usiminas, Vale, entre outras. Desde 2000 é professor convidado das cadeiras Planejamento Estratégico, Gestão de Marketing, Gerência de Vendas, entre outras, em instituições de renome. Mestre em Administração pela EBAPE/Fundação Getulio Vargas – RJ; possui MBA em Gestão Estratégica de Serviços pela Escola de Pós-graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas – RJ; e é Graduado em Administração (com ênfase em Marketing) pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – RJ. 6 Ética Comercial 2. TEXTOS PARA ESTUDO 2.1 Princípios Fundamentais da Ética 2.1.1 Filosofia da Moral e Ciência da Moral Historicamente, a Filosofia sempre foi o campo de estudo da Ética, que por sua vez tinha como foco a moral, o dever a cumprir, a qualificação do bem e do mal, tendo como preocupação a melhor conduta na coletividade. A partir da ética filosófica, calcada na especulação racional, na teologia e no pensamento preocupado com a natureza, surgiu a ética científica. Sua importância é a constatação das diversas morais históricas, por vezes contraditórias e, em alguns grupos, coexistentes. A ética científica não julga e não prejulga, mas percebe códigos de honra das comunidades. Portanto, a ética filosófica está voltada para a reflexão e a introspecção, enquanto a ética científica observa os fatos. Srour (2000) também percebe a Ética nessas duas ramificações: filosófica e científica. De caráter normativo, a primeira ocupa-se em prescrever princípios perenes e universalmente legítimos para a condução da vida em grupos sociais. De qualidade analítica, a segunda dirige sua atenção para explicar a existência de várias morais construídas e modificadas historicamente, como fruto da interação social dosagrupamentos humanos. 2.1.2 Definições sobre Ética Ética, do grego ethikos, é definida por Vázquez (1985:12) como “a teoria ou a ciência do comportamento moral dos homens em sociedade”. A Ética, nesta visão, tem como foco o próprio comportamento, a ação humana, e não reações que dela decorrem. Assim, por exemplo: quando um colaborador desobedece às regras de sua organização, mesmo que seja para beneficiar um grande número de pessoas, que reagem positivamente, este fato não é relevante, pois esse profissional será julgado por seu comportamento de rebeldia. Portanto, a ética está voltada para a atuação do homem, tal como é ou deveria ser, o que possibilita considerar que ela gera normas e regras produtoras do bem, com o intuito de orientar as condutas humanas em suas relações sociais e organizacionais. 2.1.3 Moral, Moralidade, Amoralidade e Imoralidade De acordo com Vázquez (1985:49), a moral é “um conjunto de normas, aceitas livre e conscientemente, que regulam o comportamento individual e social dos homens”. De outro ângulo, Srour (2000:29), compreende a moral como “Um feixe de normas que as práticas cotidianas deveriam observar e que, como discurso, ilumina o entendimento dos usos e dos costumes”. A moral é o conjunto de comportamentos validado pelo grupo social ao longo da sua vivência. A Ética diferencia-se da moral, por seu conteúdo explicativo, no âmbito de ideias que definem certo e errado, justo e injusto, bem e mal, e outras posições opostas que prescrevem e moldam as ações humanas. Assim, ao estudar as morais, a Ética desdobra as possibilidades para as ações concretas dos indivíduos, confrontando-as com os modelos sociais vigentes. A moral compreende normas e comportamentos, abrangendo as regras morais em si e suas práticas efetivas. A necessidade de diferenciar o teórico e o prático colocou a moral no patamar dos princípios e normas, enquanto que a moralidade passou a significar a 7 Ética Comercial materialização das normas morais nas relações sociais, por meio de atos concretos (Vázquez, 1985). Assim, a moralidade é caracterizada quando você afeta os outros com suas ações ou decisões. Por outro lado, a relação social é classificada como amoral, no caso de não existir qualquer regra prévia para a prática de um ato específico, ou não haver ninguém atingido por ele. Já a imoralidade é a prática de comportamentos proibidos ou contrários aos recomendados pela moral. Por exemplo, é uma amoralidade a prática de exercícios físicos sozinho na sua residência, mas se você aproveitar a oportunidade para dar exemplo de preservação da saúde para seus liderados isso simboliza um ato moral, porque o comportamento passa a ser revestido de um caráter social positivo. Esta mesma prática passa a ser imoral, caso a liderança em pauta incentive o uso de substâncias estimulantes prejudiciais à saúde; com isso, o ato torna-se socialmente negativo (Srour, 2000). 2.1.4 Teorias Éticas Entre as várias abordagens sobre a Ética, duas contribuições de Max Weber são aqui privilegiadas: a ética da convicção e a ética da responsabilidade, mencionadas por Srour (2000), apresentadas na Figura 1. Figura 1 – Teorias Éticas Deontologi a (deveres) Convicção Princípio Leis morais Normas universais Esperança Ideais Valores universais Teleologia (fins) Responsabilid ade Finalidade Propósitos Bondade dos fins Utilitarista Consequências Máximo bem para o maior número de pessoas Fonte: Srour, 2000:281. Ética da Convicção No entendimento de Srour, a ética da convicção está fundamentada no cumprimento do dever e as ações praticadas são respaldadas por normas e valores previamente estabelecidos. Esta ética “é deontológica - deón em grego - estudos dos princípios e fundamentos da moral, ou tratado dos deveres” (Srour, 2000:280). Este tipo de ética abriga duas ramificações: a do princípio e a da esperança. A primeira é dirigida pela obediência às normas morais, cujo lema é respeite as regras, haja o que houver. Enquanto que a segunda é guiada por valores, ideais com base na fé incondicional, em que a máxima principal é: o sonho antes de tudo. Em ambos os casos, não importam os efeitos ou consequências das decisões tomadas. Teoria Ética Fundamento s Justificaçã o Abordagem 8 Ética Comercial Nas organizações, a ética da convicção está presente em todos os momentos, porque é exigida uma obediência absoluta à legislação, normas e regras escritas, ou mesmo aos costumes consagrados pela prática. Esse esforço organizacional de fazer cumprir as regras, haja o que houver, induz os funcionários à busca pela eficiência. Assim, desenvolve-se a ética da convicção porque as atenções ficam voltadas para o como fazer as coisas, ou seja, para o processo. Em caso de descumprimento das normas e diretrizes burocráticas há punições previstas em diversos graus. Vendo de outro ângulo, para ser promovido o funcionário passa a ter um sonho antes de tudo: cumprir fielmente as regras. Tem-se, então, a combinação perfeita para a produção de um colaborador aparentemente insensível aos efeitos de suas ações sobre o cidadão ou cliente. Na verdade, ocorre o contrário: ele é completamente sensível só que aos possíveis efeitos negativos que seus atos podem provocar em si próprio. Assim, impera a satisfação do interesse do colaborador, que é o de não ser punido, como fundamento para alcançar promoções. Ética da Responsabilidade A ética da responsabilidade é “teleológica - télos em grego - estudo dos fins humanos, em que a obrigatoriedade de uma ação deriva de sua finalidade ou de suas consequências prováveis” (Srour, 2000:280). Esta teoria abraça a ideia de que você se torna responsável por aquilo que faz. Você imagina os impactos que seus atos podem provocar, depois avalia e escolhe a opção que trouxer mais resultados positivos para a comunidade. A palavra de ordem é o maior benefício para a comunidade ou dos males, o menor. Nesse contexto, reveste-se de importância a discussão do papel do poder público frente às situações emergentes derivadas do grande desenvolvimento biotecnicocientífico experimentado nos últimos 40 anos, entre eles: a engenharia genética, os transplantes de órgãos e a agricultura transgênica. Aqui também cabem duas vertentes: a utilitarista e a da finalidade. A primeira busca garantir que as decisões gerem o máximo de benefício para a maior quantidade possível de pessoas. Como se pode perceber, há uma tentativa de combinar eficácia com o sentimento de justiça. Já a vertente da finalidade preconiza: alcance os objetivos, a qualquer preço, pressupondo que a bondade dos fins justifica os meios utilizados (Srour, 2000). 2.1.5 Problemas Morais e Problemas Éticos Os problemas morais são relativos à prática e localizados em cada situação específica, podendo afetar uma ou algumas pessoas. Já os problemas éticos abordam reflexões teóricas sobre comportamentos morais, são abrangentes e sempre atingem a comunidade como um todo. Por exemplo, a definição do que é bom é um problema ético. No entanto, estabelecer o que o indivíduo deve fazer em determinada situação para que ele possa ser considerado bom é um problema moral. Por exemplo, no plano ético é bom respeitar a vida, já no plano moral um indivíduo é bom quando não ultrapassa sinal de trânsito na condição de vermelho. Também é bom o ser humano que é solidário com idosos doentes e necessitados. Solução Ética dos Problemas Para se chegar à solução ética de qualquer problema, em primeiro lugar é necessário que desde a identificação do problema até a avaliação da solução as decisões sejam 9 Ética Comercial fundamentadas em normas éticas. Uma questão não terá solução ética, se os dados que permitiram a identificação de suas causas tiverem sido roubados, ou adquiridos de forma ilícita. Em segundo lugar,é de fundamental importância obedecer ao princípio do bem- comum, de forma que a decisão respeite os limites da lei e que também o interesse da comunidade seja rigorosamente preservado. A solução de preservar o bem comum pode ser produto de um esforço ético, mas causar prejuízos à organização. Por exemplo, o gerente que desvia recursos alocados para a segurança industrial com o objetivo de investir na saúde dos colaboradores, provavelmente estará deteriorando as condições materiais da estrutura envolvida com a segurança industrial, dessa forma fazendo crescer os riscos de acidentes. Assim, a organização fica exposta aos rigores da lei e a danos em sua imagem perante os demais colaboradores e a comunidade em geral. Por isso, os gerentes devem buscar a melhor solução possível que combine o respeito às regras e o máximo de bem para as partes interessadas na organização. 2.1.6 Controle Ético Pessoas diferentes vivenciando uma mesma situação podem tomar a mesma decisão moral, por motivações diferentes. Isso acontece porque o controle ético pode ser interno ou externo, assunto que veremos a seguir. Controle Ético Interno Esta é a postura adotada pelos administradores orientados por uma filosofia humanista, tendo em vista que os instrumentos de controle interno relacionam-se a características da personalidade - valores, caráter e integridade. Isto não desautoriza nem reduz a abrangência de códigos éticos. Muito pelo contrário, esses componentes servem para orientar moralmente os profissionais, nos casos em que as orientações legais - códigos - não existem ou são inadequadas. É interessante frisar que alguns colaboradores já têm essas características, que podem, certamente, ser desenvolvidas em inúmeros outros. Estágios individuais de desenvolvimento do julgamento moral A natureza do controle ético interno resulta do estágio de desenvolvimento do julgamento moral no qual se encontra a pessoa. Segundo Ferrell (2001:95), Kohlberg desenvolveu um modelo de desenvolvimento cognitivo moral composto de seis estágios, a seguir reduzidos a três por Ferrell e comentados. 1- Estágio de Interesses imediatos, castigo e obediência A pessoa estabelece o certo como obediência a padrões, regulamentos, normas, leis e autoridade. O bem e o mal estão relacionados com quem detém o poder e também considera aquilo que serve às necessidades imediatas. Não julga exclusivamente com base em regras e autoridade superior, avalia suas ações considerando o equilíbrio nas trocas. Ex. 1 - Um vendedor pode não receber um presente porque o regulamento da empresa não permite. Entretanto, pode decidir receber o presente desde que avalie que ninguém tomará conhecimento do fato. Ex. 2 - A propina deve ser proporcional ao benefício alcançado pelo não pagamento de multas ou taxas. Por outro lado, a recompensa deve ser proporcional aos riscos que o outro assume para deixar de fazer corretamente o seu trabalho. 10 Ética Comercial 2- Estágio de conformação às expectativas da maioria ou de algum grupo de referência importante. Aqui a pessoa considera o cumprimento de regras e também o bem-estar da maioria. Ex. Um gerente de produção cumprirá a ordem para acelerar a linha de produção se acreditar que isso vai garantir o emprego de todos. 3- Estágio dos princípios O indivíduo adota comportamentos que busquem o bem para a sociedade e para as pessoas. “O dever, o respeito pela autoridade e a manutenção da ordem social tornam-se os pontos mais importantes”. Vai além de normas, leis e autoridade de grupos e pessoas. Ex 1 - Investir além dos limites da lei na proteção ao meio ambiente. Ex 2 - Busca justiça, igualdade, verdade, transparência etc. O modelo de Kohlberg sugere que o estágio de desenvolvimento moral da pessoa influencia no seu julgamento e comportamento éticos. Daí ser possível o indivíduo mudar seu processo decisório ético, em função de educação adquirida por meio de experiências pessoais e profissionais. Também é de suma importância que haja garantia de punição para aqueles que desobedecem a regulamentos. Para isso é indispensável um código de ética, auditorias éticas periódicas e um comitê de ética independente. Controle Ético Externo Os mecanismos utilizados para exercer o controle ético externo são instrumentos legais, códigos e regulamentos administrativos. Neles estão estabelecidos os limites aceitáveis para os comportamentos de servidores públicos e empregados da iniciativa privada. Por exemplo, estão regulamentados os recebimentos de doações, o uso de materiais de escritório, as regras para resolução de conflitos de interesse e a possibilidade de possuir outros vínculos empregatícios. De outra parte, o Código Penal abrange os comportamentos ilegais, tais como: suborno, extorsão e desfalque. Os castigos para quem violar essas regras são: advertência, suspensão, demissão e detenção. 2.1.7 Código de Ética e Conduta Profissional Diante da necessidade de delimitar os campos e formas de atuação de seus colaboradores e parceiros, as organizações vêm reunindo seus documentos sobre ética na forma de um código. No Brasil, esses códigos começaram a se popularizar a partir da década de 90. Assim, Arruda (2002), ao comparar os Códigos de Ética de 17 organizações brasileiras, constata, entre outros tópicos, a valorização das condutas corretas, num esforço para reprimir ações ilícitas e comportamentos danosos, que possam dificultar bons relacionamentos com os vários públicos. Além de preocupações com as leis vigentes relacionadas ao trabalho, à sociedade e ao ecossistema. Moreira (2002:33) se expressa sobre o mesmo tema, como você pode observar a seguir: O Código de Ética tem a missão de padronizar e formalizar o entendimento da organização empresarial em seus diversos relacionamentos e operações. A existência do Código de Ética evita que os julgamentos subjetivos deturpem, impeçam ou restrinjam a aplicação plena dos princípios. 11 Ética Comercial De maneira geral, os códigos de conduta ética criam normas que dizem respeito ao governo, aos acionistas, clientes, fornecedores, empregados, concorrentes, à propaganda e à comunidade. Essas normas tratam de comportamentos que produziram o bem para a organização e para todas as partes interessadas, com isso promovendo relacionamentos sustentáveis. Vejamos adiante essas relações com alguns exemplos de comportamentos: Relações com acionistas: respeito aos acionistas minoritários; “jogo limpo” sobre percentuais de participação, quando de aquisições e fusões; equilíbrio na indicação e eleição do Conselho de Administração; transparência na apresentação da realidade financeira da empresa. Relações com público interno: nos processos de recrutamento e seleção, evitar a discriminação por raça / credo/ idade / sexo / preferência sexual / deficiência não impeditiva; não permitir nenhuma forma de exploração do trabalho infantil; nas relações de trabalho, combater as várias formas de assédio moral, as agressões à saúde e integridade do trabalhador; transparência nos critérios adotados na avaliação e promoção de colaboradores; remuneração, benefícios e participação nos resultados sem favorecimentos; respeito à privacidade, evitando controle sobre ligações telefônicas, e-mails, etc; procedimentos éticos frente a demissões, buscando a recolocação interna / externa, levando em conta os anos de dedicação, etc. Relações do colaborador com a empresa: respeito às normas de sigilo profissional, normas relativas às reproduções, segredos industriais, etc; postura adequada quando estiver representando a empresa em contatos externos; recusar brindes de terceiros que tenham negócios com a empresa; zelo pelo material, equipamentos e instalações usadas; respeito pelas normas internas de segurança patrimonial, acesso a locais restritos; respeitoàs condições que constam do contrato de trabalho e regras internas (horários, relacionamentos, uso de equipamentos, etc). Relações com clientes: não efetuar práticas comerciais do tipo venda casada; venda de produtos / serviços não condizentes com o que foi contratado; propaganda enganosa que sugere vantagens inexistentes; recusa a prestar auxílio no pós-venda; não cercear a liberdade de consumidor, obrigando-o a consumir somente produtos com a marca da empresa. Relações com fornecedores: não extorquir vantagens ou impor condições injustas e inadequadas; exigência de adoção de padrões igualmente éticos, tanto de terceiros como de fornecedores; negociação sempre que surgirem situações de conflito (quantidades, prazos, etc.); 12 Ética Comercial não fazer uso do poder econômico para obter vantagens sobre fornecedores de menor porte; cumprimento das obrigações contratuais. Relações com concorrentes: não permitir a divulgação de fatos, dado o risco de cometer danos irreparáveis e difamatórios; evitar relacionar-se com funcionários ou ex-funcionários para obtenção de informações privilegiadas, contratação para enfraquecimento do quadro profissional e outras práticas assemelhadas; rejeitar atos ilícitos (sabotagem, roubo de documentos, etc.) ou que caracterizem concorrência desleal. Relações com políticos e órgãos públicos punir ações comprometedoras relativas à sonegação fiscal, fraudes em pagamento de impostos, etc; criar e manter regras de conduta que balizem os relacionamentos com órgãos públicos e políticos; doação de verbas para campanhas políticas dentro da lei e por meio de critérios muito transparentes. Relações com o meio-ambiente: avaliações constantes sobre os riscos de impacto ambiental do processo produtivo, transportes, etc; adoção de medidas de não-agressão ao meio ambiente, bem como que promovam a reposição de recursos naturais renováveis; medidas preventivas e planos contingenciais para conter acidentes ecológicos. Relações com a comunidade: prestar auxílio, tanto material como gerencial, para demandas sociais da região; incentivar e dar apoio efetivo ao trabalho voluntário dos colaboradores; critérios para distribuição de verbas, produtos e serviços para entidades sociais, hospitais, escolas, etc.; incentivo às atividades culturais / folclóricas, bem como à proteção do patrimônio histórico da região. Como implantar um Código de Ética na Empresa Como toda conduta de negócio, também a ética deve ser trabalhada na forma de estratégias e políticas que se materializem num plano de ação que preveja as principais etapas abaixo discriminadas: 1) Comprometimento da direção Todos os gerentes devem estar conscientes e informados sobre questões morais que estão embutidas nas decisões a serem tomadas, sob pena de desacreditar todo o Programa. Neste aspecto, a integridade moral da alta administração se refletirá numa liderança ética a ser seguida como modelo social, segundo Bandura. 13 Ética Comercial 2) Adoção de sólidas e convergentes políticas éticas Antes de ser adotada, toda decisão deve passar por uma análise que mostre o quanto ela é convergente (ou não...) com os valores éticos expressos pela empresa. Assim, apoiar a transferência de uma unidade poluidora para uma área afastada sob a alegação que gerará renda e riqueza para a comunidade é uma grande hipocrisia. 3) Realinhamento dos Subsistemas de RH No processo de seleção de novos funcionários, a empresa tem de buscar pessoas com fortes princípios morais, prática que assume importância ainda maior quando se tratar de contratação de novos gerentes. Já no processo de integração, a ênfase em torno de comportamentos éticos deverá ser ponto central, bem como nos treinamentos oferecidos. Qualidade de Vida no Trabalho, medidas preventivas de acidentes, cargos e salários compatíveis, igualdade de oportunidades, tratamento respeitoso são alguns dos procedimentos a serem valorizados. 4) Educação / treinamento em ética Deve existir uma sistemática de educação, treinamento e desenvolvimento de colaboradores, de forma a disseminar a conduta ética por toda a empresa, incluindo cursos, palestras, estudos de casos, etc. 5) Elaboração e implantação de um código de conduta ética De modo a tornar a questão da ética mais concreta e passível de discussão, bem como evitar encaminhamentos inadequados, surge a necessidade de materializar esses procedimentos num Código de Conduta Ética. A distribuição do Código de Conduta é uma alternativa para dar ciência a todos os empregados sobre a existência do credo corporativo que defina o grau de responsabilidade da empresa para com todos seus públicos: acionistas, colaboradores, clientes, fornecedores, governo, sociedade em geral. Concluindo, um Código de Conduta nada mais é do que o coroamento de um amplo processo de diagnóstico sobre as práticas de uma empresa em relação aos seus vários stakeholders. Trata das novas e velhas “regras do jogo”, dos limites entre o que é permitido e o que passa a ser proibido, doa a quem doer. Por essas razões, uma empresa que aja dentro dos princípios éticos que ela mesma tenha validado dentro de um processo de discussão com seus vários segmentos, acaba por adquirir vantagens competitivas de inestimável valor nos dias de hoje. 6) Criação de conselhos de ética Um conselho formado por pessoas de conduta ilibada, indicadas pela direção da empresa e eleitos pelos empregados é o instrumento utilizado para analisar os casos de desvios de conduta e execução de auditorias. A pessoa em julgamento deve ter amplo direito de defesa, já o julgamento deve ser realizado em função de provas concretas e critérios claros e a punição deve assumir um caráter educativo, servindo de exemplo para todos os empregados. O conselho tem um papel fundamental que é o de identificar causas que facilitaram práticas antiéticas e propor correções para suas eliminações de modo permanente. Finalizando, o Código de Conduta estabelece regras permanentes para orientar o comportamento de indivíduos e grupos, muitas vezes agindo em locais separados geograficamente. Assim sendo, as decisões e ações são alinhadas para uma direção 14 Ética Comercial comportamental única. A isto se deve acrescentar que o comprometimento das pessoas com os objetivos organizacionais é uma exigência ética, razão pela qual, não se pode deixar de perceber a força integradora das normas éticas nas organizações. Após a concepção de um código de conduta ética, impõe-se a questão da fiscalização de seu cumprimento, para evitar que caia em desuso. Entende-se que tal ação envolve o cidadão, o servidor público e o empregado do setor privado, e um instrumento de análise. Eles são discriminados a seguir: O cidadão, que deve exigir do servidor público e do empregado do setor privado um comportamento ético exemplar. Porém, caso não seja atendido faz-se necessário que as autoridades responsáveis pela fiscalização sejam cientificadas. Torna-se fundamental que o público não se renda às dificuldades porventura criadas com o objetivo de vender facilidades. Até porque, só há corruptos quando existem corruptores. O servidor público e o empregado do setor privado, que devem primar pela realização de trabalhos com alto padrão ético, buscando a moralização na prestação de serviços à sociedade. Também se espera que o servidor e o empregado fiscalizem as ações de seus colegas e superiores. Um instrumento para analisar e julgar denúncias de comportamentos antiéticos, sem o qual de nada adiantará a fiscalização de servidores e empregados, principalmente na atualidade, quando a tendência é ampliar os níveis da delegação de poder. O código de conduta ética estabelece regras permanentes para orientar o comportamento de indivíduos e grupos,muitas vezes agindo em locais separados geograficamente. Assim sendo, as decisões e ações são alinhadas para uma direção comportamental única. A isto se deve acrescentar que o comprometimento das pessoas com os objetivos organizacionais é uma exigência ética, razão pela qual, não se pode deixar de perceber a força integradora das normas éticas nas organizações. À vista disso, é imprescindível a criação de conselhos de ética para, após o exercício do amplo direito de defesa, julgar e punir, aquelas pessoas que não adotem uma linha de conduta ética. 2.2 Ética e Negociação JB Vilhena “Ética é o estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de classificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto.” Dicionário Aurélio Nos dias atuais, muito se tem falado sobre ética. Mas pouco se tem feito para tornar mais éticas as negociações conduzidas em nome de empresas que juram tê-la como um de seus principais valores. Enganar o cliente, prometer o que não pode ser cumprido, omitir informações estratégicas são comportamentos estimulados explicita ou implicitamente por muitos gestores. Acho este assunto inesgotável. É por isso que neste artigo vou privilegiar apenas um dos inúmeros sistemas classificatórios existentes: o que correlaciona ética com legalidade. 15 Ética Comercial Para conferir o tema sob esse prisma, vou utilizar uma matriz proposta por Lewicki que indica quatro possibilidades básicas de comportamento: Os que não são éticos nem legais Os que são éticos, mas não são legais Os que são legais, mas não são éticos Os que são legais e éticos segundo um grupo específico Ou, se formos olhar de forma matricial: Ético Não ético Legal ético/legal não ético/legal Ilegal ético/ilegal não ético/ilegal Então vejamos: 1o. caso: comportamento não ético/ilegal Vamos começar por um exemplo radical de comportamento que não é ético nem legal: a propina. Infelizmente várias empresas acham que, para vender em certos mercados, somente “dando uma bola para o comprador”. Em primeiro lugar, não acredito que isso seja verdade, uma vez que vejo empresas sérias vendendo para clientes que tem a fama de “boleiros”. Tenho certeza que essas empresas não empregam a tática suja da propina. Se sua empresa tem algo de realmente bom e diferente para oferecer e todo o mercado reconhece e deseja essa diferença, dificilmente um comprador corrupto conseguirá justificar para seus clientes internos a compra do produto concorrente. Por outro lado, é óbvio que se há corrupto, há corruptor. Ambos são apenas as duas faces de uma mesma moeda podre. Se sua empresa estimula ou faz “vista grossa” para esse tipo de comportamento, das duas uma: mude a ou mude de empresa. 2o. caso: comportamento ético/ilegal Como sabemos, a informação pode ser considerada como um dos principais fatores que influenciam o comportamento ético nas negociações. Sob essa perspectiva, ocultar algumas informações da outra parte com a qual estamos negociando, normalmente é considerado uma atitude eticamente aceitável. Mas dependendo da legislação, podemos ir parar nas barras do tribunal por agir de acordo com essa ética. Como exemplo, basta lembrar que até passado bem recente, os automóveis saíam com defeitos e somente aqueles que procuravam as concessionárias para denunciá-los eram atendidos. Hoje os fabricantes são os primeiros a anunciar falhas nos seus carros, fazendo recalls até mesmo de veículos recém-lançados, se necessário for. Por quê? Porque é muito mais caro limpar a mancha de uma reputação do que mantê-la ilibada. Sua empresa estimula os vendedores a exagerar nas “qualidades” do produto? Promete entregar o que notoriamente não tem condições de produzir? Cuidado, o código de defesa do consumidor é uma realidade e existem inúmeras jurisprudências definindo os limites legais da ação das empresas. 3o. caso: comportamento não ético/legal Dissemos acima que a propina é antiética e ilegal. Pergunto: quando uma empresa farmacêutica convida um médico e sua família para participar de um congresso no exterior, custeando todas as despesas do “doutor” - e garantindo-lhe luxos e mordomias que nada tem a ver com a melhoria da qualidade da medicina praticada por aquele profissional – ela 16 Ética Comercial está agindo de forma ilegal? Não. Está sendo ética? Do meu ponto de vista não, uma vez que está se beneficiando de um poder financeiro que a maioria das suas concorrentes não tem. Concordo que a questão é polêmica, pois será que devemos nos ver impedidos de fazer alguma coisa porque nosso concorrente não teria condições de também faze-la? Minha opinião está expressa algumas linhas acima, mas você, o que acha? 4o. caso: comportamento ético/legal Muitas empresas desenvolvem um código de ética interno. Algumas tornam-no explícito, outras praticam-no tacitamente. Aquelas que tornam público seu código de ética interna, submetem-se ao julgamento de seus clientes, concorrentes e da sociedade. São empresas que cumprem as leis e querem o melhor para si e para os outros. Mas há aquelas que não submetem seus princípios a ninguém. Para dar um exemplo, parece haver um código tacitamente aceito pela força policial de alguns estados brasileiros que autoriza, institucionaliza e referenda a aceitação de suborno – chamado por alguns de “presentinho” – sob certas condições. Todos sabemos que, pela lei da cadeia, estupro não tem perdão e alcaguete tem que morrer. Lá dentro ninguém discorda dessa “lei”, pois faze- lo significa ser condenado a morte (ou, no mínimo, espancamento). Alguns políticos – e até membros do judiciário – defendem o “direito” do MST invadir terras classificadas por ele mesmo como improdutivas. Nunca vi o governo federal descontar os dias parados de seus funcionários grevistas, embora a lei determine que isso seja feito. Nosso querido Betinho aceitou dinheiro da contravenção e justificou seu ato dizendo que isso era melhor do que deixar mais um miserável passar fome. Muitas empresas estimulam a competição e o conflito entre suas equipes de vendas, dão tratamento discriminatório a clientes de mesma categoria, estimulam seus vendedores a prometer o que não vão poder cumprir, fazem o jogo do “esperto” e praticam o tempo todo a “lei de Gerson”. Embora se digam éticas, se comportam de forma absolutamente individualista. Além disso, criam suas próprias leis, impondo-as sem discutir ou negociar. Conclusão Para as empresas que adotam o primeiro comportamento que descrevi – práticas antiéticas e ilegais – há pouco esperança de sobrevivência. Para ficar no exemplo citado, empresas que só vendem porque dão “bola” para seus clientes não obtém o respeito de seus concorrentes, de seus funcionários e dos demais clientes. É mudar ou morrer logo. As que adotam o segundo comportamento – práticas consideradas éticas, mas ilegais – vivem no fio da navalha. Não são acusadas pelos “tribunais” da ética (conselhos profissionais, órgãos de classe), mas gastam o pouco lucro que geram pagando advogados para defendê-las de clientes mais esclarecidos quanto a seus direitos. Para elas a questão é se vale a pena correr o risco – algumas acham que sim, pelo simples prazer da aventura. Lembremo-nos que os tributos que pagamos não retornam em termos de produtos e serviços e isso nos faz pensar que são injustos. Mas o governo não pensa assim e, se descobrir que você é um sonegador, vai tentar te levar para as barras do tribunal. No terceiro grupo – ações antiéticas, mas legais – há farto espaço para o que chamo de picaretagem legalizada. Não estou, com isso, dizendo que os laboratórios farmacêuticos sejam todos picaretas (alguns são, é verdade). Mas, para ficar no exemplo, foram eles que popularizaram a expressão BO (bom para otário). Mas, na minha opinião,é no quarto grupo que “mora o perigo” pois, embora haja empresas que são transparentes e cumpridoras da lei, há as obscuras e que criam suas próprias leis. 17 Ética Comercial Incluem-se aí desde os taxistas que roubam seus clientes, dando voltas desnecessárias pela cidade – mas o fazem para “defender o leite das crianças lá em casa” – até as Encol da vida, que deixaram um enorme número de “sem teto” e com dívida por aí. Essas são as empresas que querem “levar vantagem em tudo”, que só negociam usando táticas sujas, que tripudiam da inteligência do cliente, que riem da honra e que... infelizmente conseguem nossa complacência e por isso se mantém vivas por muito tempo. 2.3 Ética nas Negociações Comerciais JB Vilhena Uma pergunta que comumente ouço nos meus seminários e aulas é se os vendedores podem ter - durante todo o tempo - um comportamento ético nas negociações comerciais. Considero essa questão extremamente relevante e gostaria de dividir com você, leitor, algumas reflexões. Como sabemos, a ética é o estudo dos costumes moralmente considerados certos e errados. Para começar nossa reflexão, tomemos como premissas básicas três questões: Nós nos deparamos com dilemas morais todos os dias. Isso é tão verdadeiro para o vendedor como para qualquer outro profissional; Há evidências de que os vendedores querem orientações de seus gerentes para ajudá-los a lidar com problemas éticos; Também é importante compreender que a maioria dos vendedores escolhe o curso de ação ético, quando o descobre. Embora todo profissional esteja submetido a constantes dilemas morais, não parece haver dúvidas que o dia-a-dia de um vendedor inclui várias situações nas quais é possível ser antiético: A necessidade de atrair a atenção e conquistar a preferência do cliente cria a tentação de se distorcer fatos ou omitir informações relevantes. Mentiras cabais que distorçam fatos são claramente antiéticas, além de ilegais; Enfrentar uma concorrência acirrada e, às vezes, mais desenvolvida tecnologicamente, leva alguns vendedores a exagerar nas vantagens da sua oferta. Isso também pode ser antiético se a crença nesses exageros resultar em prejuízo para o cliente; A ênfase excessiva nas vantagens do nosso produto sobre os demais concorrentes provavelmente não é antiética, uma vez que representa opiniões do vendedor - e os clientes esperam que o vendedor defenda sua empresa “com unhas e dentes”; O processo de persuasão em si, embora possa envolver manipulação, provavelmente não é antiético, uma vez que tanto o cliente como o vendedor compreendem e esperam que ocorra manipulação; A prospecção pode ser antiética se, deliberadamente, o vendedor tomar clientes de um colega, mas, em alguns casos, não é antiético um vendedor levar clientes consigo ao se mudar para outra empresa; O uso de informações pessoais sobre um cliente para forçá-lo a comprar é antiético; A apresentação de informações falsas ou inexatas é objetivamente antiética; 18 Ética Comercial O comportamento antiético também pode ocorrer fora do processo de vendas em si, e inclui coisas como espionar um concorrente, sabotar os mostruários de produtos do concorrente, trabalhar em um segundo emprego no tempo pago por outro empregador ou abusar dos benefícios de viagens e diversões. A dificuldade em ser ético em vendas é justamente discernir sobre o que é certo e errado. Se considerarmos estas posições como os extremos de um continuum, observaremos que existem diversas posições que não ficam claras – não podem, a priori, serem consideradas certas ou erradas. Uma regra de grande validade nestes casos é posicionar-se no lugar da pessoa que estará sendo afetada por seu ato. Quer seja um empregador, um colega, um concorrente ou um cliente, é preciso observar a questão sob o ponto de vista do outro. Tentemos ilustrar melhor essa ideia através do exemplo de uma situação que – quase invariavelmente - ocorre nas negociações comerciais. Trata-se de duas alegações clássicas que são feitas pelo vendedor: 1a. alegação: esse é o menor preço pelo qual podemos vender esse produto; 2a. alegação: você não encontrará nada melhor (ou mais barato) no mercado. E duas alegações clássicas que são feitas pelo comprador: 1a. alegação: esse preço supera nossa percepção quanto ao valor de sua oferta; 2a. alegação: já pesquisei e encontrei outras ofertas melhores do que a sua. Sabemos que, na maioria dos casos, ambos estão mentindo. E moralmente falando, a mentira é condenável. Podemos dizer que ambos estão sendo antiéticos? Como as partes aceitam com naturalidade que o comportamento durante as negociações comerciais se paute por uma espécie de “jogo de esconde-esconde”, não há como censurar quem faz as alegações acima. Pessoalmente penso que a melhor estratégia para convencer um cliente a comprar nosso produto é mostrar como o mesmo pode agregar valor a quem o compra. Outra regra básica que procuro seguir e ensinar é que o valor das coisas não está nelas mesmas, mas sim na sua adequação a uma determinada necessidade (pense num par de óculos, que permite que o míope enxergue, mas que se for usado por alguém que não tenha problemas de visão vai fazer com que tudo fique “embaçado”) A reflexão final que propomos neste artigo pode ser sintetizada na opinião de Soldow & Thomas, importantes autores de livros sobre vendas: “embora o comportamento antiético possa levar a vendas imediatas, isso só acontece a curto prazo. Com o tempo, pessoas que costumeiramente comportam-se de maneira antiética veem sua reputação sofrer as consequências. Por outro lado, pessoas que costumeiramente comportam-se de acordo com os mais elevados padrões éticos veem suas reputações subirem. Uma reputação favorável fará mais pela criação de vendas e sucesso duradouro do que qualquer comportamento antiético”. 2.4 A Realidade Prática1 É importante que as empresas avaliem seu desempenho considerando um amplo conjunto de critérios, e não apenas os resultados financeiros. As organizações têm o poder 1 MACKEY, John & SISODIA, Raj. Capitalismo consciente. São Paulo: HSM Editora, 2013. 19 Ética Comercial não só de criar, mas também de destruir vários tipos de riquezas: financeira, intelectual, social, cultural, emocional, espiritual, física e ambiental. Quanto maior a empresa, maior o impacto exercido em todas essas dimensões. Um negócio que gera resultados financeiros, mas compromete outras formas de riqueza (que podem exercer um impacto maior sobre o bem-estar das pessoas) adiciona para o mundo um valor muito menor do que poderia. Se destruir também outros tipos de riqueza, essa organização exerce um impacto líquido negativo e pode até ser descrita como um parasita da sociedade. Um princípio fundamental do pensamento sistêmico é que não existem efeitos principais e efeitos colaterais. Tudo o que fazemos gera consequências e todas são importantes – e por isso devem ser contabilizadas. Como acontece na medicina, tendemos a rotular como “principais efeitos” o que queremos ressaltar e chamar de “colaterais” o que preferimos subestimar, muitas vezes para disfarçar um forte aspecto negativo. Com frequência, porém, os chamados “efeitos secundários” podem superar os resultados principais por causa do impacto cumulativo. Alguns resultados se manifestam de imediato, enquanto outros se revelam no futuro. Cada um, por sua vez, pode desencadear outros efeitos, que também não podem ser negligenciados. Como também acontece em outros aspectos da vida, no mundo dos negócios uma postura consciente significa assumir a responsabilidade por todas as consequências de nossos atos, e não apenas daqueles que nos afetam. Um aspecto importante do pensamento consciente é que ele permite tomar decisões atentas aos impactos positivos para todos os stakeholders,condição bem mais gratificante do que a simples determinação de retorno financeiro para os acionistas. Desempenho financeiro superior A dimensão financeira do desempenho de uma empresa depende da capacidade que ela tem de ampliar a receita e melhorar a eficiência, e as empresas conscientes se saem melhor nos dois aspectos. Estão mais alinhadas com as necessidades tangíveis e intangíveis dos clientes. Suas prioridades são claras: investir dinheiro onde ele faz a diferença (como na satisfação dos integrantes da equipe, na melhor experiência para os clientes ou na qualidade superior dos produtos ou serviços), economizando dinheiro em áreas que não agregam valor, como infrutíferas promoções de vendas, elevados índices de rotatividade de pessoal e custos administrativos decorrentes de grandes exigências burocráticas. As empresas conscientes tendem a crescer com muito mais velocidade do que seus concorrentes. Em geral, fazem isso por meio da expansão do mercado global (caso da Southwest Airlines ao longo de sua história no setor aéreo e da Starbucks e seus onipresentes cafés), além da incursão nos mercados concorrentes menos conscientes. É claro que, às vezes, empresas conscientes inauguram mercados inteiramente novos onde não existia nada antes, como são os casos da Amazon.com, no mundo da venda de livros pela Internet, e da Apple, por meio de inovações como os iPods, iTunes e iPads. Com o tempo, esperamos que o número de empresas menos conscientes diminua, provavelmente, por causa da dificuldade de competir com as organizações conscientes. O processo deve elevar a concorrência direta entre as empresas conscientes, resultando em mais inovação e maior criação de valor – o que, Além do esperado Há muitas comprovações de que as empresas conscientes se saem muito melhor sob todos os critérios importantes. 20 Ética Comercial O livro Empresas feitas para vencer, de Jim Collins, é o mais vendido de todos os tempos. Nas últimas oito décadas, aproximadamente, Collins avaliou o universo das organizações de capital aberto e identificou onze que atendiam ao seguinte critério: cresceram pelo menos três vezes mais do que a média do mercado durante um período de catorze anos. A obra analisa como e por que essas onze organizações passaram de um desempenho médio para essa condição excepcional. Duas perguntas importantes são: quem são essas empresas e será que elas merecem a qualificação de “feitas para vencer”? A seleção inclui nomes como Circuit City, Fannie Mae e Wells Fargo. Antes de falir, a Circuit City tomou iniciativas questionáveis, como a demissão de colaboradores experientes e a substituição por profissionais remunerados com salários menores. A Fannie Mae foi atingida em cheio para crise financeira do final da década de 2010 e a Wells Fargo receber US$ 25 bilhões a título de socorro do governo norte-americano em 2008. Mas, o que mais impressiona é que a lista das “feitas para vencer” inclui a Altria (antes Philip Morris). Qual foi o impacto líquido da Philip Morris, maior empresa de cigarro do mundo, durante grande parte do século passado? Seu impacto no mundo foi positivo, neutro ou negativo? É óbvio que, diante de uma avaliação ampla, o impacto se mostra fortemente negativo: a cada ano, morrem 6 milhões de pessoas em decorrência de doenças associadas ao fumo e a expectativa é que 1 bilhão tenham o mesmo destino neste século. A expectativa média de vida de um fumante é cerca de uma década e meia menor do que a das demais pessoas e os sistemas de saúde gastam por volta de US$ 650 bilhões no tratamento de doenças decorrentes do tabagismo. Não há como esconder esses números. A maioria das empresas do setor não se limita a atender a demanda existente, mas se esforça para criar novos consumidores, décadas após a comprovação de que o cigarro é altamente prejudicial à saúde. A partir de uma visão mais ampla do ponto de vista da sociedade, essa empresa torna o mundo melhor sob algum aspecto? Claro, algumas pessoas trabalham nela e os investidores gostam de recolher bons retornos. Mas, a qual custo? Se a empresa fosse obrigada a contabilizar todos os custos externalizados para a sociedade, o desempenho financeiro seria tão bom? Achamos que não. A origem do lucro é um fator importante. Uma definição bem mais ampla do que faz de uma empresa um grande negócio é a que considera o valor total que ela gera, não apenas a riqueza financeira que chega aos investidores, mas todos os tipos de riqueza já citados, e para todos os stakeholders. Um grande negócio melhora a saúde geral e o bem-estar da sociedade. Ajuda a trazer maior prosperidade e realização a todas as partes envolvidas e sua própria existência enriquece o mundo. Estes são critérios bem melhores na hora de avaliar a grandeza de um empreendimento. É importante ressaltar que todas essas considerações, no final das contas, se manifestam no desempenho financeiro. Nos últimos quinze anos, as companhias relacionadas como exemplos de sucesso em Empresas feitas para vencer só apresentaram um desempenho ligeiramente superior ao do mercado e ficaram bem atrás das empresas conscientes avaliadas no livro O segredo das empresas mais queridas. Nos últimos dez, cinco e três anos, as organizações citadas em Empresas feitas para vencer tiveram resultados significativamente inferiores aos do mercado. Vale lembrar que elas foram apontadas como “vencedoras” em períodos diferentes, mas acreditamos que aquelas que de fato merecem o título deveriam resistir ao teste de tempo e manter resultados excepcionais. 21 Ética Comercial Explicações para um desempenho superior Como as empresas conscientes proporcionam resultados financeiros superiores ao mesmo tempo em que criam outras formas de riqueza e bem-estar para todos os stakeholders, incluindo a sociedade? A explicação envolve os seguintes fatores: elas atingem níveis elevados de vendas porque se destacam ao criar valor para os clientes; em geral, operam com margens brutas menores do que poderiam e, ainda assim, atingem margens líquidas maiores do que as concorrentes de estrutura tradicional. Com o tempo, as empresas conscientes criam uma reputação de excelência e crescem com mais velocidade. Atraem uma clientela mais leal, colaboradores mais comprometidos e fornecedores de qualidade superior, além de gerar uma apreciação maior da comunidade em que atuam. Tudo isso também ajuda a lucrar mais e a receber maior valorização em relação aos resultados. Mais vendas A explicação mais imediata para o melhor desempenho nas vendas das empresas conscientes é maior aceitação por parte dos clientes. As empresas conscientes contam com maior apreço dos consumidores, que não se sentem apenas satisfeitos, mas admiram e elogiam a empresa. Em consequência, conseguem melhores resultados nas vendas. Elas superam as médias dos setores em que atuam de acordo com critérios como venda por área e retorno por integrantes da equipe. Quando uma empresa gera mais ganhos em uma base comparável de ativos do que a concorrência, pode pagar salários melhores e ainda permanecer competitiva. Tem início um ciclo virtuoso: uma equipe bem remunerada e com verdadeira paixão pelo trabalho e por servir as pessoas é decisiva para a criação de uma experiência superior para o cliente. A empresa atinge maior economia de escala e consegue melhorar a proposta de valor ao consumidor. Com o tempo, a combinação resulta na atração de um número cada vez maior de clientes, o que permite pagar bons salários e atingir uma maior economia de escala. As empresas conscientes são essencialmente mais competitivas. Não se trata da competitividade obtida a partir da pressão sobre equipes estressadas com incentivos ou ameaças, mas da que resulta do estado positivo das pessoas dedicadas, comprometidas com a criação da excelência, de inovações e do apreço pelo que fazem – um tipode energia capaz de mover montanhas. Existem alguns exemplos de varejistas conscientes e de suas habilidades superiores em gerar mais renda e melhor eficiência operacional: As vendas por pé quadrado do varejista Wegmans são 50% superiores à média do setor e atingem margens operacionais estimadas em 7,5%, o que corresponde a quase o dobro dos resultados dos concorrentes. Como a maioria das empresas conscientes, a Wegmans remunera bem os colaboradores, oferece benefícios generosos até para quem trabalha em horário reduzido e garante treinamento extensivo. A Costco gera vendas de cerca de US$ 140 milhões por loja e US$ 1 mil por pé quadrado. O Sam´s Club, seu concorrente, gera US$ 78 milhões e US$ 586, respectivamente, e o BJ´s Wholesale Club produz US$ 54 milhões e US$ 500. Com um índice de vendas bem mais alto por colaborador, a Costco pode oferecer bons salários, o que contribui para um desempenho excepcional. A varejista de móveis Jordan vende uma média de US$ 950 por pé quadrado ao ano (a média do setor é US$ 150). Consegue reconfigurar seu estoque treze vezes por ano, índice também bem superior às médias do setor. 22 Ética Comercial A miragem das margens A maioria das empresas tenta maximizar sua margem bruta recorrendo a fornecedores baratos e usando seu poder de barganha para forçá-los a oferecer preços cada vez mais baixos. Muitas vezes trabalham com fornecedores que precisam lutar para manter a rentabilidade e não podem se dar ao luxo de investir na melhoria da qualidade ou em inovação. As empresas conscientes, por outro lado, são bastante seletivas com os fornecedores. Priorizam a parceria com organizações inovadoras, preocupadas com a qualidade e que também atuam de forma consciente. Esses fornecedores são bem pagos e, por sua vez, remuneram melhor seus fornecedores e colaboradores. A maioria das empresas também se esforça para minimizar os custos com a folha de pagamento, sobretudo no que se refere à remuneração dos funcionários da linha de frente, e não são nada generosos com a oferta de benefícios, como seguro-saúde. Preferem empregar profissionais temporários sempre que possível, mantendo-os dentro de um regime que não obrigue a empresa a cumprir maiores benefícios. Também costumam proporcionar um mínimo de treinamento aos membros da equipe e encaram a alta rotatividade como um fato inevitável. As empresas conscientes, por outro lado, garantem boa remuneração às equipes da linha de frente (às vezes, bem acima da média do setor) e são generosas com os benefícios. Como seus custos diretos são maiores do que poderiam ser, a margem bruta de um empreendimento consciente é tipicamente menor do que seria se adotasse a mentalidade de maximização. Os próximos itens na aferição de resultados relacionam-se com as vendas, custos gerais e administração e é aí que os investimentos feitos nas pessoas, no aumento da qualidade e em culturas conscientes fazem a diferença. As empresas tradicionais desperdiçam suas margens brutas altas duramente adquiridas com gastos pesados em marketing, despesas gerais de gestão, honorários de advogados e altos níveis de premiação de executivos. Investem em altos custos de treinamento e recrutamento como forma de conter a alta rotatividade da equipe. Os colaboradores são, em regra, desmotivados e improdutivos. A qualidade do produto é muitas vezes deficiente, o que resulta em baixa lealdade por parte dos clientes e alto índice de devolução. Menos gastos com marketing As empresas conscientes em geral gastam menos em publicidade e marketing – e o investimento que fazem é abordado de forma diferente. Isso ocorre porque elas contam com uma legião de clientes satisfeitos e encantados, que as promovem com lealdade e paixão. Algumas chegam a investir entre 10% e 25% da média de gestos do setor, o que constitui uma enorme economia (os custos com publicidade subiram mais rápido do que outras áreas e passaram a representar uma das maiores despesas para a maioria das empresas). O Whole Food Market, por exemplo, destina ao marketing apenas cerca de 20% da média do setor, e desse total, 90% é gasto nas lojas em vez de nos escritórios de apoio geral. Além disso, a maioria desse montante está relacionado a atividades de serviço ligadas à comunidade. Empresas conscientes se beneficiam da melhor forma de promoção que existe não só da parte de seus clientes, mas também dos colaboradores, fornecedores, comunidades e meios de comunicação. O Google e o Starbucks são outros exemplos de empresas que gastam relativamente pouco em marketing, mas ganharam grande sucesso e adoração por meio de sua abordagem consciente. As empresas conscientes também se beneficiam com a explosão das mídias sociais, pois utilizam-nas para atender os clientes em vez de tentar persuadi-los. Ainda que gastem 23 Ética Comercial mais nesta área, os custos globais com marketing podem ser menores, pois não precisam fazer tanta publicidade paga, maior fonte de gasto da maioria dos budgets. Em geral, também não precisam trocar tanto seus produtos ou tomar medidas para atender clientes insatisfeitos. Rotatividade menor, envolvimento maior Uma empresa consciente toma muito cuidado para contratar pessoas cujas paixões pessoais estejam em harmonia com a finalidade da organização. Em geral, o índice de rotatividade é mais baixo, o que significa uma economia importante com contratação e treinamento de novos colaboradores. O índice de turnover na The Container Store, empresa sempre presente nos rankings de melhor lugar para trabalhar, por exemplo, costuma ser de um dígito, sendo que no setor em que atua esse índice anual muitas vezes supera os 100%. Os colaboradores dessas empresas costumam ser leais, experientes, apaixonados, cheios de energia, criativos, envolvidos e extraordinariamente produtivos. O Starbucks é outro bom exemplo e, ao estender os benefícios de cobertura de saúde para funcionários que trabalham em regime parcial (gastando mais com cuidados com a saúde do que com café), os colaboradores saem ganhando. Os clientes ganham ao serem atendidos por profissionais mais dedicados, como baristas que se lembram de seus nomes e dos detalhes de suas preferências. Custos administrativos menores Uma empresa consciente tem menores custos administrativos, pois está sempre atenta para eliminar despesas que não acrescentam valor – para isso, utilizam ideias vindas dos colaboradores e da equipe de fornecedores. Também se preocupa com as despesas essenciais, como os custos com saúde, não por meio de cortes esquemáticos, mas da busca de maneiras criativas de chegar a uma dinâmica em que todos ganham. O Whole Food Market, por exemplo, vem reduzindo esses gastos por meio de uma variada gama de iniciativas de bem-estar, que vão muito além daquelas promovidas pelas organizações convencionais. Não se trata de apenas reduzir custos, mas de cuidar e transformar vidas durante esse processo. Empresas conscientes, em geral, contam com burocracias e estruturas de gestão menores, portanto, mais enxutas do que as tradicionais. Criam sistemas em que as pessoas certas desempenham as tarefas certas e contam com um elevado grau de autonomia. A maioria dos membros da equipe está envolvida ativamente na criação de valor real para os clientes, e não no “gerenciamento” de colegas. Essas empresas são projetadas para primarem pela autogestão, automotivação e auto-organização. Na maioria das empresas conscientes, os líderes seniores são pagos modestamente em relação a seus pares em outras organizações. O Whole Foods Market adota uma política pela qual ninguém pode receber mais do que dezenove vezes o salário médio dos colaboradores em tempo integral, mesmo quando a proporção vigente nas grandes empresas de capital aberto tenha variado entre 350 e 500 vezes nos últimos anos. Nas organizações conscientes, a única maneira de os executivosganharem é elevar o salário médio de todos os membros da equipe. Como resultado da alta confiança entre todos os stakeholders, os custos legais ficam bem abaixo dos níveis considerados normais. As organizações conscientes de fato entendem seus clientes, desenvolvem produtos excelentes (em grande parte graças ao nível superior de seus fornecedores) e não recorrem a táticas de venda forçada. Em consequência, a taxa de devolução de seus produtos também é comparativamente inferior. 24 Ética Comercial A melhor maneira de ganhar É muito difícil competir com uma empresa que efetivamente utiliza as sinergias criadas com a interdependência com os stakeholders e incentiva a expressão da energia criativa em geral adormecida na maioria das pessoas. Muitos empreendimentos fracassam porque não conseguem atingir um grau de inovação, cooperação ou colaboração suficientemente alto. Quase sempre surge um concorrente com maior grau de espírito de equipe, cooperação, colaboração e interdependência, e a organização menos eficaz não consegue competir de forma consistente. Basta olhar para o grande sucesso do Trader Joe, Whole Food Market, Wegmans, Publix e HEB: estes varejistas de alimentos com estrutura mais consciente estão crescendo e prosperando, enquanto os que ainda seguem o paradigma tradicional de negócios lutam pela sobrevivência. Na verdade, as empresas conscientes já estão começando a assumir uma cota significativa do mercado em muitos setores, e não só no varejo de alimentos. A Southwest Airlines já foi uma operadora pequena e inexpressiva, mas hoje é uma das companhias aéreas mais rentáveis e valiosas dos EUA. O capitalismo consciente tem tudo para triunfar porque se baseia em níveis mais elevados de inovação, colaboração e cooperação, e a tendência é que o mercado acabe eliminando as empresas que não forem suficientemente conscientes. 2.5 Vendedores em Guerra Punhaladas pelas costas, trapaças, roubalheiras... Quando a economia está retraída, alguns representantes de vendas fazem qualquer coisa para fechar um negócio. Assim, eles prejudicam toda equipe e os resultados de sua empresa. Reportagem Sales & Marketing Management. Sinopse Anda difícil vender? É em momentos como estes que certos gerentes de vendas incentivam a competição agressiva – e sem ética – em suas equipes. Não são poucos os profissionais de negócios no Brasil que conhecem um caso de vendedor desesperado que faz qualquer coisa para garantir sua comissão, desde trair os colegas até fechar acordos fraudulentos. O mesmo está acontecendo nos Estados Unidos, como mostra esta reportagem. De acordo com uma pesquisa realizada nesse país, aumentou a competição entre as equipes de vendas, e também cresceu a disputa entre os vendedores de uma mesma equipe, que se lançam em brigas por território e por potenciais clientes. O pior é que, quando tais artimanhas funcionam e as vendas fluem, muitos gerentes fazem “vista grossa” para conflitos internos e práticas antiéticas. Os especialistas ouvidos nesta reportagem alertam para o grande perigo desse comportamento em médio e longo prazo: os clientes vão embora assim que percebem que a sobrevivência se tornou mais importante que o serviço. O quadro da página final traz orientações para resolver o problema. A reportagem é de Christopher Stewart, da Sales & Marketing Management. Steve Schiffman não sabia o que representava perigo maior: as piranhas que nadavam no aquário da mesa do presidente ou o agressivo e traiçoeiro pessoal da força de vendas da empresa de informática que ele fora visitar. 25 Ética Comercial Schiffman, presidente e fundador da firma de consultoria em vendas DEI Management Group, de Nova York, Estados Unidos, esteve no escritório desse cliente potencial em Long Island no início de 2013 e lá presenciou o que descreve como horrendo caso de disputa interna em uma equipe de vendas. “Era realmente um desespero”, diz ele. “Havia 40 vendedores lutando com unhas e dentes entre si diariamente. Se alguém mencionava um cliente potencial em público, todos, sem exceção, iam atrás da mesma oportunidade.” As pessoas também roubavam informações sobre clientes de cima de mesas alheias, relata. “Se um representante ouvia um colega cotando um preço, ligava para o cliente mais tarde para oferecer um preço inferior.” No final do expediente, os vendedores trancavam as gavetas de suas mesas com cadeado. A rotatividade de profissionais era astronômica. Os funcionários eram demitidos caso não atingissem suas metas e a companhia perdia muito dinheiro. Schiffman, que acabou por não incluir essa empresa entre seus clientes, diz que, de maneira perversa, o presidente parecia fazer parte dessa destrutiva cultura. Seu cartão de visita falava por si: seu título era chief executioner officer (uma variação da denominação chief executive officer, com a mudança de “principal funcionário executivo” para “principal funcionário executor”). Embora esse seja um caso extremo, histórias sobre gerentes de vendas que incitam culturas altamente agressivas não são novidade, especialmente quando a economia não vai bem. Conforme secavam os “poços” dos Estados Unidos que transbordavam com oportunidades de venda na década de 2000, muitos vendedores passaram a adotar uma postura de luta pela sobrevivência. Como afirma um gerente de vendas, “os representantes sempre são competitivos entre si. Saem à caça para matar. No entanto, nessa economia, estão prestes a virar açougueiros – abatem até seus semelhantes”. De acordo com uma pesquisa sobre gerentes de vendas, realizada nos Estados Unidos pela S&MM/Equation Research com cerca de 300 entrevistados, 50% disseram que a competição entre as equipes de vendas aumentou perceptivelmente nos últimos três anos por causa da morosidade da economia. Também cresceram as disputas entre vendedores quanto à atuação e oportunidades de venda nesse período, segundo 38% dos entrevistados. Jeff Hostetler, diretor de marketing e vendas da Tele-Optics, empresa de telecomunicações de Kingsport, Tennessee, observou esse tipo de ambiente e isso o preocupa. “Em uma economia em dificuldades, e sem o gerenciamento adequado, os representantes de vendas certamente farão qualquer negócio para pôr comida dentro de casa”, diz ele. “Pense numa matilha de lobos brigando por um pequeno pedaço de carne. Os vendedores matarão não só uns aos outros, como também a empresa.” Culpa pelas disputas É claro que existem muitos profissionais de vendas éticos no mercado que, mesmo em situações difíceis, jamais apunhalariam um colega pelas costas. Então quem são esses vendedores que fazem qualquer coisa pra fechar um negócio? Muitos especialistas culpam os novatos na profissão, que entraram nas equipes durante o boom da década de 2000. “Há alguns anos, muitos entraram nessa área porque era fácil”, diz Jeff Thull, presidente da Prime Resource, firma de consultoria de Minneapolis. “Gostavam do fato de poder ganhar muito dinheiro com pouco esforço. Porém, quando a economia piorou, tiveram de mudar de marcha e começar a procurar clientes e a fazer visitas. Só que não possuíam as habilidades necessárias para isso, então se viram obrigados a agir com base em seus ‘instintos animais’.” 26 Ética Comercial “Havia pessoas entrando na área de vendas em busca de um emprego fácil, independente, com boa remuneração”, afirma Sam Reese, presidente da firma de consultoria em vendas Miller Heiman, com sede em Reno, Nevada. “Não haviam sido treinadas e provavelmente não estavam realmente interessadas em vendas como profissão. Eram apenas embusteiras.” Em parte, a culpa pelo comportamento desses vendedores sem escrúpulos é dos gerentes de vendas, dizem os especialistas. As vendas eram tão abundantes na década de 2000, que eles não deram importância ao treinamento. Quando surgia alguma questão relativa à propriedade de umaoportunidade de venda ou de uma área de atuação, ninguém se importava muito. Treinar as pessoas para trabalhar de forma eficaz – ou honesta – não era tão importante. Atualmente, com menos clientes dispostos a comprar, os embusteiros se tornam piratas. “As pessoas de sucesso estão trabalhando mais, ao passo que os menos capazes estão ficando frustrados e irados”, diz Kenneth Christian, consultor de empresas de Nova York. “Esses indivíduos usam atalhos; entram nessas batalhas porque são incapazes de fazer o trabalho.” Ric Robbins, vice-presidente regional em Colorado da Wire One Technologies, empresa da área de vídeo, viu-se obrigado, recentemente, a demitir um representante de vendas pelo uso de técnicas impróprias que causaram não só o ressentimento, mas a desconfiança dos nove integrantes de sua equipe. “Esse sujeito entrava nos escritórios das pessoas fingindo querer falar sobre algum assunto, quando o que realmente fazia era procurar nos quadros de avisos e nas escrivaninhas por dicas de oportunidades de vendas”, diz Robbins. Embora tenha tentado resolver o assunto com o funcionário, chegando até a ameaçá-lo de demissão, nada parecia convencê-lo. Continuou roubando dicas sobre oportunidades de vendas até ser demitido. Robbins diz que, nos últimos três anos, metade das pessoas que contratou revelou-se incapaz ou embusteira. Em algumas empresas, o clima de desconfiança já é regra. De acordo com a pesquisa da S&MM, mais de 50% dos entrevistados afirmaram que seus vendedores estão cada vez mais preocupados com os colegas que roubam suas contas ou suas informações sobre clientes potenciais do que se preocupavam três anos atrás. Espaço para os negócios obscuros Nessas equipes, não é somente com punhaladas pelas costas que os gerentes precisam se preocupar. Alguns representantes preferem roubar da empresa para ganhar um dinheiro extra. Steve Austin, diretor de marketing da Zacks Investment Research, em Chicago, lembra-se de um vendedor que ignorou seus cancelamentos de pedidos. Até a empresa se dar conta do engodo, cinco meses depois, o funcionário continuou a receber comissões. Austin diz que essas fraudes aumentaram significativamente nos últimos dois ou três anos. Para evitá-las, seria necessária a energia de todo um departamento, despesa proibitiva para a empresa. A prática mais comum testemunhada por Austin é de vendedores que tratam contas antigas como novas para receber uma comissão completa, que representa um montante significativamente superior ao da renovação normal. O truque é simples: o representante altera cerca de 20% de um contrato e coloca uma nova data. Ou então faz com que o cliente cancele e depois renove dois meses mais tarde, em geral com um bom desconto e outras vantagens. “É incrível”, diz Austin. “Querem que eu acredite que se esforçaram para conseguir fechar a venda, quando, na realidade, é tudo mentira.” 27 Ética Comercial Danos ao moral da equipe Invariavelmente, ao falar sobre essas práticas escusas, os gerentes trazem à baila o caso de Glengarry Glen Ross, peça teatral de David Mamet sobre um competitivo grupo de corretores de imóveis que passaram da riqueza à fome por causa do esfriamento do mercado. Quando um executivo “motivador” exige uma competição de vendas entre os profissionais de um escritório abarrotado, as apostas são altas: qualquer um que deixe de atingir sua cota perde o emprego. Acontece, porém, que os vendedores passam o dia inteiro atiçando e ridicularizando uns aos outros enquanto esperam pela “oportunidade de ouro”. E, como é típico nesse tipo de cultura de descontentamento, quando a oportunidade não aparece, eles culpam a todos menos a si mesmos. Sem dúvida, existem muitos bons vendedores no mercado, pessoas que trabalham arduamente, perseguem as oportunidades e não se misturam muito. Entretanto, são embusteiros como descritos anteriormente que fazem com que uma organização harmoniosa deixe de ser uma operação exemplar para se tornar um navio naufragando. “A causa original dessas escaramuças acaba transformando-se numa crise de autopiedade organizacional”, avisa Bill Brooks, diretor de vendas e consultoria gerencial do The Brooks Group, com sede em Greensboro, Carolina do Norte. “O problema vai bem além de lutas por território. Pode ampliar-se para todos os outros departamentos que têm algum impacto sobre os clientes, desde o pessoal de marketing que não gera oportunidades de venda até a equipe de atendimento ao cliente e os engenheiros que mantêm as contas.” O problema imediato é um escritório sem estímulo. E, se não for sanado, o problema das lutas internas pode devorar toda empresa. Como manter a paz Como fazer, então, para fomentar relacionamentos melhores – ou até amizades – entre sua equipe de vendas? Tudo começa com a comunicação. Greg Bacheller, diretor de vendas da empresa de tecnologia de informação CenterBeam, situada em San Jose, Califórnia, observou um declínio de mais de 10% em vendas em 2013 e de 30% antes disso. Havia dias em que o desespero era palpável em sua própria equipe. “Digamos simplesmente que tivemos várias conversas aqui nos últimos tempos”, diz ele. “Tive de encarar meus vendedores para que eles fizessem a coisa acontecer. Repito várias vezes para eles: ‘Isso não será fácil. Vocês precisam ser fortes’. São conversas realmente tensas.” Contudo, ao mesmo tempo, Bacheller diz que deixa bem claro que práticas escusas não serão toleradas e que toma cuidado para ajustar bem os territórios e as cotas de forma a não encorajar a competição desleal. "É preciso ser flexível”, afirma. “Todas as estratégias usadas no passado podem não funcionar mais.” Brian Norris, vice-presidente de vendas da Copy Max, em Cleveland, se esforça para conscientizar seus vendedores do fato de que não estão sozinhos. “É fundamental que os gerentes criem e estimulem as equipes para que os vendedores não se sintam sozinhos lá fora”, diz ele. “Vendas é uma atividade individual por definição. Porém, quando as pessoas se afastam demais da equipe, sentem-se menos conectadas aos colegas, e essa é a raiz dos problemas.” Para alguns gerentes, como Austin, a harmonia entre seu pessoal começa no momento da contratação. “É preciso contratar pessoas que se orgulham de quem são”, observa. “Eu gosto de ex-atletas. São imensamente competitivos como indivíduos, mas estão acostumados a jogar com os outros. Sabem que seu sucesso individual depende do sucesso da equipe.” 28 Ética Comercial As vantagens do bom clima Alguns gerentes podem sentir a tentação de ignorar essas lutas e outras práticas escusas se isso representar mais negócios no curto prazo. Contudo, não se engane: os especialistas em vendas dizem que os clientes padecerão. Representantes de vendas envolvidos em seus próprios dramas perdem a capacidade de lidar com os clientes. O bom serviço dá lugar à sobrevivência, e inevitavelmente os clientes vão bater em outra porta. Embora as pesquisas da S&MM indique que somente 16% dos entrevistados tenham admitido que as lutas internas causaram o afastamento de clientes, alguns especialistas preveem que a verdadeira perda de clientes ainda não foi sentida pelas empresas. “É uma coisa mais gradual”, diz Thull. “Pode não fazer diferença perder um vendedor, mas faz diferença perder o cliente, e isso certamente acontecerá se o pessoal de vendas estiver em guerra. Haverá muito prejuízo colateral mais adiante.” John Lederer, vice-presidente de vendas da Popkin Software, empresa de Nova York, está sempre alerta quanto a distrações internas que possam afetar seus clientes de forma negativa. “Quando ficam desesperados, os representantes de vendas trapaceiam. Podem vender o que dá mais lucro ou coisas que os clientes não necessitam. E as empresas acabam ressentidas.” No fim das contas, dizem os especialistas, os gerentes podem ter de tomar decisões difíceis.
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