Buscar

A Defesa na Produção Antecipada de Provas Uma leitura constitucional do artigo 382, § 4º, do novo CPC - Migalhas

Prévia do material em texto

MIGALHAS DE PESO
A Defesa na Produção Antecipada de Provas - Uma
leitura constitucional do artigo 382, § 4º, do novo
CPC
Francisco Laux , Felipe Roberto Rodrigues , Ricardo Aprigliano , William Santos Ferreira , Elias Marques de Medeiros Neto e Giovani
Ravagnani
Dispositivos que tratam das hipóteses de antecipação da prova representam avanço do novo CPC.
quarta-feira, 14 de setembro de 2016
0
1. Notas introdutórias 
Os dispositivos que tratam das hipóteses em que admitida a antecipação da prova, mesmo que
desvinculada das hipóteses de urgência, representam um dos avanços mais paradigmáticos do
novo CPC (lei 13.105/15 - NCPC). 
Para além da hipótese prescrita para os casos de urgência, quando existente o fundado receio de
impossibilidade de verificação dos fatos quando da propositura de demanda voltada à declaração
do direito material, os itens de direito previstos nos arts. 381 e seguintes do novo ordenamento
processual civil vêm a consagrar entendimento doutrinário que há certo tempo afirma a existência
de um direito autônomo à prova, desconectado do periculum in mora; desvinculado, ainda e ao
menos exclusivamente, da atividade de valoração por quem detém o poder jurisdicional na hipótese
específica1 e com reconhecimento que a prova pode ter vários destinatários, que não apenas o juiz
de direito, já que devem ser considerados destinatários da prova todos aqueles que dela podem
fazer uso, aliás, o capítulo "das provas" no CPC/73 iniciava no art. 332 descrevendo, objetivamente,
que "todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste
Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos...", enquanto o CPC/15 em seu art. 369
didaticamente ressalta: "As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como
moralmente legítimos....", o que destaca a prova como um "direito da parte", o que externa um
protagonismo das partes no âmbito probatório que se correlaciona com o direito autônomo à prova,
afastando o vínculo, praticamente indissociável, que se apresentava da prova com a valoração
judicial. 
Em relação aos arts. 381 e seguintes, a inovação tem o mérito de privilegiar o alcance de soluções
autocompositivas. Possibilitar às partes a valoração de elementos de prova e o alcance de soluções
com base em um suporte fático satisfatório, que enseje a obtenção, na maior amplitude possível, de
tudo aquilo e exatamente aquilo a que fazem jus, representa um dos objetivos primários da nova
codificação processual civil. 

https://migalhas.uol.com.br/autor/william-santos-ferreira
https://migalhas.uol.com.br/autor/elias-marques-de-medeiros-neto
https://migalhas.uol.com.br/autor/giovani-ravagnani
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/depeso/245536/a-defesa-na-producao-antecipada-de-provas---uma-leitura-constitucional-do-artigo-382----4---do-novo-cpc#comentario
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/
https://www.uol.com.br/
No interior da seção do NCPC que trata da produção antecipada de provas, todavia, há previsão no
mínimo polêmica, que, em uma interpretação literal, poderia limitar quase que completamente a
possibilidade de apresentação de argumentos de defesa no âmbito de processos nos quais
pretendida a efetivação do direito à prova. Tal disposição, inserta no art. 382, § 4º, do diploma
processual, prescreve que no processo voltado à antecipação da prova "não se admitirá defesa ou
recurso, salvo contra decisão que indeferir totalmente a produção da prova pleiteada pelo requerente
originário". A presente opinião tem o intuito de demonstrar que a referida interpretação literal não
pode - e não deve - sobreviver a uma análise sistemática do NCPC, muito menos a uma
interpretação que confira efetividade às garantias fundamentais do processo, dispostas na CF/88. É
o que se passa a demonstrar. 
2. O processo de antecipação da prova admite a apresentação de argumentos de defesa 
A tentativa de se vedar, abstratamente, a apresentação de defesa não sobrevive, no ordenamento
jurídico brasileiro, a uma leitura constitucional do processo. 
O entendimento é fundado na necessidade de se efetivar a garantia constitucional do contraditório
também no processo de produção antecipada de provas. A caracterização da sentença como a de
epílogo de um devido processo (Fazzalari) carrega dentro de si a necessidade de se conferir à parte a
possibilidade efetiva de influir no convencimento do órgão julgador. Esse é o verdadeiro sentido e
alcance do princípio esculpido no inciso LV do art. 5º da CF. As alegações apresentadas pelas
partes, portanto, detêm o poder de condicionar a decisão a ser proferida pelo magistrado. 
O pedido de antecipação enseja a constituição de um processo e, portanto, exige a observância ao
primado do contraditório, com todas as possibilidades que ele carrega. 
O que se pode aceitar é a limitação horizontal dos argumentos de defesa, em observância às balizas
que demarcam o âmbito de cognição do magistrado no processo de antecipação da prova. Uma
interpretação sistemática dos dispositivos que regem a antecipação da prova sugere que o
raciocínio é pertinente para os fins do presente estudo. Como, na antecipação, é vedado ao juiz se
pronunciar "sobre a ocorrência ou inocorrência do fato, nem sobre as respectivas consequências
jurídicas" (art. 382, § 2º, NCPC), é de se aceitar a impossibilidade de análise de argumentos de
defesa que guardem relação exclusivamente com argumentos de mérito relacionados com a futura
e eventual demanda voltada ao reconhecimento do alegado direito material. 
O processo de antecipação da prova deve admitir, nessa perspectiva, a apresentação de
argumentos de defesa relacionados à privacidade ou ao sigilo das informações, à violação do dever
de honra ou mesmo à subsistência de "outros motivos graves que, segundo o prudente arbítrio do
juiz, justifiquem" a impossibilidade de produção da prova, tal como ocorre no âmbito da exibição de
documento ou coisa (art. 404, NCPC). 
Argumentos relacionados à suspeição ou impedimento de testemunhas, caso esse seja o meio de
prova que se pretende produzir, também devem ser apreciados pelo juiz no âmbito da antecipação
da prova. 
Da mesma forma, a limitação da cognição do magistrado, no âmbito da produção antecipada de
provas, não o impede de analisar matérias de ordem pública, ou mesmo as questões cognoscíveis
de ofício, que afetem diretamente a formação da relação processual ou o direito à prova. 
https://migalhas.uol.com.br/
A descrição de possibilidades ora apresentada não tem a menor intenção de ser exaustiva, até
porque a prática provavelmente trará ao conhecimento do estudioso do direito processual situações
possivelmente mais interessantes que as ora mencionadas. 
Mas, nem mesmo a afirmação relacionada à impossibilidade de apresentação de argumentos
quanto a fatos ou as suas consequências jurídicas deve ser vista em modo absoluto. Isso se deve à
constatação de que o direito à prova não pode ser tido como algo absolutamente desconectado
daquilo potencialmente perseguido mediante a propositura da eventual demanda voltada à
declaração do direito. A hipótese é absolutamente deletéria e poderia gerar a prática do que se
convencionou chamar fishing expedition, caracterizada pela intenção velada de uma das partes de,
mediante a ameaça ou efetiva propositura de demanda infundada, ter a possibilidade de acesso a
informações a respeito das quais não teria, não fosse a litigância abusiva. Reconhecer a existência
de um direito autônomo à prova não significa, portanto, afirmar que a tutela do direito à prova não
deva guardar qualquer relação com a necessidade de demonstração de pertinência entre a prova
que se pretende obter e a situação de direito material eventual e potencialmente objeto de
demanda voltada à declaração do direito. 
Demonstrar a finalidade da prova representa ônus do qual o sujeito que demanda a antecipação da
prova não pode se desvincular(art. 382, caput, NCPC). Se o demandado detém elementos aptos a
demonstrar que a prova que se pretende obter é impertinente ao deslinde de eventual demanda
voltada à declaração do direito material, pode e deve apresentar seus argumentos, sob pena de se
possibilitar, por intermédio da antecipação, uma produção de prova que possivelmente seria
indeferida em uma situação ordinária. 
Em suma, a produção antecipada de prova sem urgência não pode ser utilizada de forma abusiva
pelo requerente, sendo certo que compete ao magistrado verificar os limites e a pertinência da
prova pretendida, a legalidade de sua produção e se os requisitos legais para a antecipação estão
presentes; podendo o requerido questionar em sua defesa se a finalidade da lei é (ou não!) atendida.
3. Conclusão 
Uma análise sistemática e constitucional do novo CPC revela que a impossibilidade de
apresentação de defesa no âmbito da antecipação da prova é dotada de aplicação limitada ao
âmbito de cognição horizontal do órgão julgador. A própria limitação a respeito da apreciação de
fatos e consequências jurídicas deles advindas deve ser vista com certo cuidado, por necessidade
de análise da finalidade da produção da prova que se pretende realizar. Espera-se que a presente
opinião auxilie e sirva de estímulo ao estudo e construção de trabalhos de maior fôlego a respeito
do tema. 
___________________ 
1 O trabalho de maior fôlego a respeito do tema foi produzido no Brasil por Flávio Luiz Yarshell
(Antecipação da prova sem o requisito da urgência e direito autônomo à prova. São Paulo: Malheiros,
2009). 
___________________ 
*Elias Marques de Medeiros Neto, Francisco Laux, Giovani Ravagnani, Felipe Roberto Rodrigues,
Ricardo Aprigliano e William Santos Ferreira são membros do Grupo de Direito Probatório do
CEAPRO - Centro de Estudos Avançados de Processo.
Atualizado em: 13/9/2016 16:36
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/
https://migalhas.uol.com.br/depeso/245536/a-defesa-na-producao-antecipada-de-provas---uma-leitura-constitucional-do-artigo-382----4---do-novo-cpc#comentario

Mais conteúdos dessa disciplina