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TEMA: A IMPORTÂNCIA INDÍGENA NA FORMAÇÃO DO BRASIL CONTRIBUIÇÃO INDÍGENA E AFRICANA NA FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO CONTRIBUIÇÃO INDÍGENA E AFRICANA NA FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO Todos os direitos reservados à Editora Grupo UNIASSELVI - Uma empresa do Grupo UNIASSELVI Fone/Fax: (47) 3281-9000/ 3281-9090 Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2011. Proibida a reprodução total ou parcial da obra de acordo com a Lei 9.610/98. Rodovia BR 470, km 71, n° 1.040, Bairro Benedito Caixa postal n° 191 - CEP: 89.130-000. lndaial-SC Fone: (0xx47) 3281-9000/3281-9090 Home-page: www.uniasselvi.com.br Contribuição Indígena e Africana na Formação do Povo Brasileiro Centro Universitário Leonardo da Vinci Conteudista Thiago Rodrigo da Silva Reitor da UNIASSELVI Prof. Hermínio Kloch Pró-Reitora de Graduação a Distância Prof.ª Francieli Stano Torres Pró-Reitor Operacional de Ensino Graduação a Distância Prof. Hermínio Kloch Diagramação e Capa Eloisa Amanda Rodrigues Revisão: José Roberto Rodrigues Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 1A Importância Indígena na Formação do Brasil 1 INTRODUÇÃO A importância da presença indígena na formação da sociedade brasileira contemporânea é uma das principais temáticas que as crianças aprendem nas escolas de primeiras letras. O dia 19 de abril é comemorado nos anos iniciais do Ensino Fundamental e mesmo na pré-escola, quando as crianças usam cocares feitos de papel nas cabeças e aprendem que o índio vive nu, tem várias mulheres e foi muito importante para a vida brasileira, pois dele vêm muitos hábitos cotidianos, como tomar banho todo dia e dormir na rede, além de parte de nossa alimentação. Outra questão que se aprende nos bancos escolares, mas em geral nos anos fi nais do ensino básico, é que muitos dos nossos topônimos têm origem indígena: Maracanã, Morumbi, Paraná, Pacaembu, Paranaguá, Araguaia, etc. O Brasil é uma nação que está em um contínuo processo de formação. Isto porque somos um povo que teve como principal característica cultural a mestiçagem. Todavia, a presença negra e a presença indígena não são devidamente contempladas nos compêndios escolares de história ou mesmo nas expressões artísticas veiculadas pela grande mídia eletrônica, como o rádio, a televisão e o cinema. O indígena, neste sentido, é sempre representado longe de suas características básicas como ser humano. Podemos observar dois tipos ideais socialmente construídos no imaginário nacional sobre o índio: uma exaltação positiva (bom selvagem) ou negativa (bárbaro), em tons exagerados. Estas exaltações revelam muito do preconceito socialmente construído ao longo de séculos de história. Uma primeira visão existente e profundamente negativa sobre o indígena é a do mesmo como um bárbaro canibal e polígamo. Pois seria esta a principal característica de uma idealização conservadora: o índio como um depravado sexual e ser sem dignidade, capaz até de se alimentar de carne humana. Esta idealização conservadora, além de ver o indígena com as características já descritas, ainda a ele se atribui outras facetas antagônicas à civilização ocidental de matriz europeia. Enquanto o europeu colonizador seria progressista, trabalhador e ético, o indígena seria a antítese: preguiçoso, espertalhão, um típico mau caráter. Uma segunda visão do indígena seria a pautada no mito do bom selvagem. Um ser em perfeito contato com a natureza e ainda não maculado pelo mal trazido pela civilização ocidental. Enquanto o ser humano ocidental estaria sofrendo ou sendo agente dos males trazidos pelo progresso econômico, como a poluição, a corrupção dos valores morais, trazidos pela ganância de lucro traduzido em uma busca desenfreada por dinheiro e status, os indígenas viveriam em uma espécie de paraíso: um regime de total coletividade de bens e alimentos, sendo seu cotidiano saudável e marcado pela pureza de princípios e caráter ilibado. A principal característica do mito do bom selvagem criado em torno da vida indígena é o ideal de liberdade. Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 2 Contribuição Indígena e Africana na Formação do Povo Brasileiro FIGURA 1 – INDÍGENA FONTE: Disponível em: <http://www.fi ocruz.br/biosseguranca/Bis/infantil/ direitosdoindio.htm>. Acesso em: 20 set. 2012. O ideal de liberdade indígena, presente tanto nos discursos positivos e negativos sobre os primeiros habitantes do Brasil, afi rma que os indígenas não se submeteram à escravidão porque preferiam morrer a ser reduzidos ao papel de escravos. Enquanto o negro teria pouca capacidade de viver em liberdade (um ser passivo), o indígena seria o retrato de alguém com profunda gana de independência, constituindo um homem ativo e dinâmico. Estas são marcas perenes, na história brasileira, do contato entre a civilização ocidental e os indígenas. Desde os primeiros contatos entre os pioneiros portugueses e os indígenas, esta dupla visão, tanto do índio canibal quanto do índio bom selvagem, estava presente. Podemos citar autores dos séculos XV ao XVII que indicam esta dupla idealização em seus dois polos antagônicos. O padre jesuíta Antônio Vieira, um dos principais oradores do mundo barroco ibérico seiscentista, possui sermões nos quais defende a necessidade de se catequizar o indígena, recompensando com o reino dos céus para aqueles que da catequese indígena, direta ou indiretamente, fi zessem parte. O Espírito Santo, que hoje desceu sobre os apóstolos e os ensinou, para que ensinassem ao mundo, desça sobre todos vós e vos ensine a querer ensinar ou deixar ensinar aqueles a quem deveis a doutrina, para que eles por vós e vós por eles, Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 3A Importância Indígena na Formação do Brasil conseguindo nesta vida (tão caro vos custa) a graça, mereçais gozar na outra com grandes aumentos a glória. (VIEIRA, 1959, p. 152) Por outro lado, o padre jesuíta Fernão Cardim, autor do livro História das Gentes e das Terras do Brasil, cuja primeira edição é datada do século XVI, afi rma a visão dos indígenas como canibais, descrevendo em pormenores o ritual. Morto o triste, levaram-no a uma fogueira que para isto está prestes, e chegando a ela, em lhe tocado com a mão dá uma pelinha pouco mais grossa que véu de cebola, até que todo fi ca mais limpo e alvo que nem um leitão pelado, e então se entrega ao carniceiro ou magarefe, o qual lhe faz um buraco abaixo do estômago [...]. (CARDIM, 2009, p. 197). Mesmo decorridos alguns séculos, a presença indígena na sociedade brasileira é incompreendida, sendo presente a permanência de estereótipos como os relatados nos textos acima descritos. Estas visões antagônicas são ainda presentes no debate a respeito das demarcações das reservas, como também nas discussões dos profi ssionais universitários das ciências humanas, e revelam o quanto a permanência de mitos a respeito dos indígenas é útil para os mais distintos posicionamentos políticos e acadêmicos. Porém, ao invés de reduzirmos o debate a estes pontos, ou seja, a visão positiva e negativa do indígena, nos permitiremos repensar algumas “verdades cristalizadas” sobre o indígena na sociedade brasileira, desmentindo certos mitos sociais, em especial o da ausência de escravidão indígena. A escravidão indígena foi uma constante realidade no Brasil até o século XIX. A escravidão foi muito presente nos extremos sul e norte da América Portuguesa. Em São Paulo de Piratininga e São Vicente, os bandeirantes foram os principais promotores de tal cativeiro. Pois muitas das entradas ao interior, vencendo a Serra do Mar, tinham como principal função abastecer as cidades coloniais do Brasil Meridional com os indígenas cativos (RIBEIRO, 2005, p. 98- 105). Na região amazônicaa presença indígena é culturalmente muito marcante. Em relação à utilização da mão de obra indígena, esta foi a principal força de trabalho nas chamadas reduções. As reduções eram um tipo de aldeia que fi cava sob a jurisdição de uma ordem religiosa. Os jesuítas foram os principais religiosos na missão catequética na colônia luso-brasileira e foram muitas as polêmicas que envolviam os religiosos e os colonos sobre o cativeiro indígena. Em especial, pelos religiosos possuírem uma teologia elaborada na Península Ibérica no século XVI e que negava ser cristão escravizar índios. Em 1561 houve a denominada grande querela entre o intelectual Sepúlveda e Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 4 Contribuição Indígena e Africana na Formação do Povo Brasileiro o frei Bartolomeu de Las Casas. “O frei dominicano defendia a liberdade dos nativos americanos, enquanto Sepúlveda era favorável à utilização dos indígenas como escravos a serviço da colonização” (HOFFNER, 1977, p. 74). Porém, a importância do indígena para a formação do Brasil não se deu apenas como braço cativo ao trabalho. A própria colonização do território só foi possível devido a um complexo sistema de alianças realizadas entre os indígenas e os portugueses, denominado pelo antropólogo Darcy Ribeiro (2005) como “cunhadismo”. O “cunhadismo” foi uma forma de aliança entre as tribos indígenas e o colonizador português, na qual um português se casava com uma mulher indígena e assim possibilitava, aos lusitanos, aliados nas guerras coloniais. Sendo o exemplo típico a Confederação dos Tamoios, na qual lusos e franceses se aliaram a tribos distintas visando dominar a Baía de Guanabara. FIGURA 2 – RITUAL INDÍGENA FONTE: Disponível em: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/indios-brasileiros / populacao-indigena-3.php>. Acesso em: 20 set. 2012. Na época da colonização portuguesa, o idioma mais falado no território do Brasil meridional era a denominada língua geral. Esta era uma normatização do idioma tupi-guarani realizada pelos religiosos catequistas, com o objetivo de evangelizar os indígenas. “Grande parte dos bandeirantes, responsáveis pela penetração no interior do território, não falava português, mas sim a língua geral” (RODRIGUES, 1985, p. 41). A língua portuguesa se tornou o idioma falado no Brasil devido a um decreto do Marquês de Pombal, no documento denominado Diretório dos Índios do Grão-Pará e Maranhão, que também atingiu as reduções do sul da colônia portuguesa. Através deste documento, a jurisdição sobre os indígenas Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 5A Importância Indígena na Formação do Brasil saiu da tutela dos religiosos e passou para o domínio do Estado português. Entre as disposições do novo documento legal estava a obrigatoriedade de se ensinar a língua portuguesa aos indígenas. Este é um dos principais dados que os estudiosos atribuem à infl uência indígena na formação do português falado no Brasil. Uma importante visão que devemos ter sobre os indígenas é que os mesmos não foram um grupo único. Assim como na Europa existem diversas famílias linguísticas, como os idiomas latinos, nórdicos ou eslavos, por exemplo, entre os nativos americanos o mesmo ocorre. Existem quatro troncos linguísticos entre os indígenas brasileiros. Os indígenas do tronco tupi-guarani habitavam o litoral e foram aqueles com os quais os portugueses tiveram o primeiro contato no processo de colonização. A língua geral provinha de uma variante do tupi-guarani. A guerra era uma presença na vida indígena colonial. Por vezes, as guerras tinham funções sociais específi cas, como no caso dos Tupinambás, em relação à conquista de mulheres da tribo vizinha e do estabelecimento de solidariedades. Existia também um ritual de paz denominado Kuarup, no qual se realizavam festividades, danças, trocas de presentes e alianças realizadas através de casamentos entre membros de tribos distintas (FERNANDES, 2005). Com o processo de independência e a constituição do Império do Brasil, a situação dos indígenas se agravou, pois a principal ordem que trabalhava diretamente com os índios, a Companhia de Jesus, havia sido expulsa das terras dominadas por Portugal por um decreto pombalino. Além disto, o papa Clemente VII extinguiu a Ordem dos Soldados de Jesus. Os jesuítas foram substituídos por padres da Ordem do Oratório. Porém, os oratorianos não tiveram o mesmo destaque dos seguidores de Santo Inácio de Loiola (BOXER, 2002). O Império promoveu uma imigração em massa de colonos europeus trazidos das mais diferentes regiões da Europa, como os alemães, italianos e espanhóis. Muitas das colônias formadas no Brasil Meridional e que foram povoadas por europeus não ibéricos e seus descendentes foram criadas em terras antes ocupadas por indígenas. No sul do Brasil foi comum a presença da fi gura do bugreiro, o homem encarregado de matar índios para a colonização do território. Uma das principais formas do bugreiro provar seus homicídios era cortar a orelha do cadáver indígena. Esta prática comum no século XIX contrasta com a absorção que a literatura fez do indígena. Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 6 Contribuição Indígena e Africana na Formação do Povo Brasileiro FIGURA 3 – ÍNDIOS FONTE: Disponível em: <http://portalamazonia.globo.com/new-structure/view/scripts/ noticias/noticia.php?id=80592>. Acesso em: 20 set. 2012. O romantismo foi uma corrente literária dos novecentos que tinha no nacionalismo uma das suas principais ideologias. Uma corrente de origem europeia e vinculada à reorientação social dos Estados Nacionais da Europa após a era napoleônica. Os ideólogos literatos românticos tinham nos cavaleiros medievais uma forma de exaltação da coragem, da bravura e do patriotismo. Heróis como a francesa Joana D’arc e o espanhol El Cid eram rememorados. Como o Brasil não teve uma Idade Média, fez-se uma vinculação destes “nobres ideais morais” dos cavaleiros andantes com os indígenas. Assim, muito do chamado romance indigenista, que teve em I-Juca Pirama, de Gonçalves Dias, e nos romances Iracema e O Guarani, ambos da autoria de José de Alencar, seus principais títulos, eram adaptações à brasileira do nacionalismo europeu. José de Alencar foi senador do Império e dono de escravos. Com isto, podemos pensar que a idealização do indígena servia como modo ideológico de se manter as relações sociais de exclusão que caracterizaram o Brasil no século XIX. A situação do indígena durante o Brasil Império é atualmente alvo de estudos de teses universitárias nas ciências humanas, que tentam suprir a lacuna de informações sobre a atuação social das tribos indígenas. Muitas das revoltas sociais do período regencial, como a Balaiada e a Cabanagem, tiveram ampla participação de índios desenraizados de suas tribos originais. Também é provável a participação indígena na Guerra do Paraguai. Porém, são estudos novos, que ainda estão passando pelo crivo acadêmico e que lançam novas luzes sobre a importância deste segmento social. Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 7A Importância Indígena na Formação do Brasil A condição indígena mudou radicalmente de aspecto com o advento da República, pois os sucessivos governos republicanos demonstraram uma conduta distinta na relação com os indígenas daquelas dos tempos da Colônia e do Império. Um marco fundamental da alteração da relação entre indígenas e o Estado Nacional Brasileiro foi a Missão Rondon. Cândido Mariano da Silva Rondon foi um militar de carreira do Exército que em vida atingiu o posto de Marechal. Sua contribuição para a causa indígena é inestimável e começou quase ao acaso. Em 1898 foi incumbido, como ofi cial, de levar os cabos telegráficos do Rio de Janeiro para Cuiabá, a capital de seu Estado natal, o Mato Grosso. Porém, para realizar a expedição em pontos até então pouco explorados do sertão, teve de entrar em contato com diversas tribos indígenas. Porém, ao invés de matar os indígenas, como era usual, Rondon teria dito a frase símbolo de sua militância: “Morrerei se preciso, matarei jamais!” Os militares da Missão Rondon tinham métodos distintos para contatar os índios, como irradiar sons musicais com gramofones em plena fl oresta. As primeiras imagens cinematográfi cas feitas dos indígenas foram realizadas pela Missão Rondon. A missão também teve a incumbência de demarcar as fronteiras brasileiras. Isto ampliou o contato com os indígenas das regiões do Pantanal e da Amazônia (RIBEIRO, 2005, p. 147-148). Os sertanistas receberam este legado e foram capazes de ampliar o contato do dito homem branco com os nativos da terra brasileira. Os irmãos Cláudio e Orlando Villas-Boas foram os principais sertanistas brasileiros, com uma fundamental militância a favor dos índios habitantes do Parque Nacional do Xingu. O antropólogo Darcy Ribeiro também teve função destacada no estudo e no contato com as sociedades indígenas. Na década de 1950 foi o fundador e diretor do Museu Nacional do Índio, sediado na cidade do Rio de Janeiro. No ano de 1919 foi criada a primeira instituição, pelo Governo Federal, com o estrito objetivo de auxiliar o indígena. Trata-se do Sistema de Proteção ao Índio (SPI). O SPI era um órgão que teve como principal articulador Rondon. Porém, após alguns anos Rondon se afasta do órgão e o mesmo acaba sendo esvaziado. Em 1968 o SPI foi substituído pela Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão do Governo Federal que até hoje tem a função de zelar pelo bem-estar destas populações. Com o desenvolvimentismo dos anos 1960-70, as populações indígenas sofreram com um aumento da presença de “homens brancos” em locais que eram tradicionalmente fl orestas. Desde fi ns do século XIX houve uma designação para povoar o interior do Brasil comandada pelo Estado. As capitais estaduais Belo Horizonte (1895) e Goiânia (1942), além da capital federal Brasília (1960), foram cidades planejadas com a função de povoar o interior e Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 8 Contribuição Indígena e Africana na Formação do Povo Brasileiro ser ponta de desenvolvimento de áreas pouco exploradas economicamente. Nos anos 1970 os governos militares incentivaram o povoamento do Pantanal e da fl oresta amazônica, transformando estas áreas em locais de produção de gado e soja. A fl oresta e seus habitantes, as tribos indígenas, sofreram muito com a devastação e o assassinato de índios que lutavam pela demarcação das suas terras, indevidamente exploradas pelos sulistas. Com a Constituinte, em 1988, muita coisa a respeito dos indígenas mudou, pois foram criadas legislações específi cas. Porém, os indígenas continuaram a ser considerados tutela do Estado. Assim, muitos indígenas não possuem acesso à cidadania, como o direito ao voto. Um ponto polêmico é o da não obrigatoriedade dos indígenas em aprender o português. Isto é, as escolas nas aldeias devem ensinar a língua da tribo, não sendo obrigatório aos professores o ensino do idioma ofi cial do Estado Nacional Brasileiro. Em relação à busca por cidadania, durante a Constituinte de 1988 existiu um parlamentar indígena, o Juruna. Porém, acabou se tornando muito mais uma fi gura caricata do que um líder dos povos na luta por direitos e acesso à cidadania. 2 O COTIDIANO INDÍGENA NA ATUALIDADE Na atualidade o cotidiano das populações indígenas é muito diferente daqueles descritos nos relatos dos portugueses que aportaram nas terras das costas do Pau-Brasil no século XVI. Não temos necessariamente os mesmos rituais, as mesmas guerras e festas de paz que existiam nos séculos passados. Toda a expansão do Brasil rumo ao interior foi feita em contato/confl ito com as populações ameríndias. Com isto, a população indígena foi se aculturando, sendo infl uenciada por hábitos e costumes dos homens brancos, assim como o homem branco também se infl uenciou com a presença cultural indígena. O indígena de hoje possui uma vida que não se opera da mesma forma que nos tempos das grandes navegações, porque a vida social e cultural se modifi cou ao longo dos séculos. Muitos eventos, como a exploração da mão de obra, a catequização e, por fi m, as demarcações de terras, ocorreram. As demarcações de terras indígenas são um grave problema social. Isto porque muitas das aldeias têm um riquíssimo subsolo, ambicionado por empresários nacionais e por companhias multinacionais. Entidades de defesa do meio ambiente das mais variadas nacionalidades também utilizam os povos indígenas como massa de manobra em suas politicagens. Assim, o indígena sofre o duplo preconceito, pois apenas serve de modo idealizado como bom selvagem ou então é o estorvo a impedir o lucro capitalista. Ao que parece, não tem serventia como aquilo que é: um ser humano que merece respeito e dignidade. Algumas populações indígenas sofrem com problemas gravíssimos e de Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 9A Importância Indígena na Formação do Brasil difícil solução, como os suicídios cometidos por jovens de tribos nos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Assim como o alcoolismo impera em algumas aldeias. Porém, existem locais nos quais o acesso às benesses governamentais, casado com lideranças competentes e responsáveis, gerou bons resultados. Tribos que possuem acesso à tecnologia, às informações do mundo globalizado e, ao mesmo tempo, mantendo as suas tradições. Algumas universidades possuem uma política de cotas para os alunos indígenas. Com isto se busca assegurar ao indígena uma forma de acesso ao Ensino Superior. Além do Governo Federal, através da Funai, existem outros órgãos que atuam nesta temática. Entre os órgãos existentes podemos citar as inúmeras Organizações Não Governamentais (ONGs), que militam de múltiplos modos no amparo a estas populações. Outros são os órgãos ligados às igrejas cristãs e que estão há muitos anos fazendo trabalhos, tanto os ainda ligados aos ideais evangelizadores quanto os adeptos dos novos conceitos antropológicos de relatividade cultural e respeito das diferenças civilizacionais. As igrejas ligadas ao ideal evangelizador, em geral, são as denominações evangélicas. Alguns exemplos são os das igrejas protestantes brasileiras (Assembleia de Deus), quanto aquelas advindas dos Estados Unidos da América (batistas, adventistas, etc.). Todavia, a Igreja Católica possui o principal órgão não governamental que lida com os indígenas e se relaciona aos novos métodos antropológicos de relatividade cultural. Trata-se do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), uma entidade que atua nas mais variadas ações em defesa dos primeiros habitantes da terra brasileira. O bispo de São Félix do Araguaia e Vale do Xingu, D. Pedro Casaldáliga, é um dos principais nomes em relação aos direitos indígenas, com forte atuação junto aos órgãos dos governos estrangeiros e brasileiros em relação à defesa das reservas indígenas. O dia a dia indígena hoje, em muitas tribos, não faz jus às representações sociais e escolares dos indígenas. O andar nu pelas matas foi substituído, em muitos casos, pelas roupas e hábitos ocidentais. Assim como a escolarização está a cada dia aumentando em relação a toda a população, e os indígenas, apesar de em grau menor, acompanham este processo geral da sociedade brasileira. A visão estereotipada está cedendo lugar a uma visão mais realista dos indígenas brasileiros. Esta visão mais realista é auxiliada com as investigações científi cas a respeito dos indígenas. 3 PRODUÇÃO CIENTÍFICA SOBRE A TEMÁTICA INDÍGENAA produção científi ca brasileira sobre a temática indígena é vasta e está ainda em processo de expansão. A maior parte dos estudos é realizada Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 10 Contribuição Indígena e Africana na Formação do Povo Brasileiro por antropólogos, seguidos em menor monta pelos sociólogos e historiadores. As fontes de estudo são variadas, dependendo da disciplina do conhecimento à qual o pesquisador está vinculado. Em relação aos indígenas históricos, como os dos primeiros anos do Brasil Colonial, as principais informações sobre os indígenas são aquelas retiradas dos relatos de viajantes que estiveram no Brasil nos séculos XVI, XVII e XVIII. Existem muitas crônicas históricas sobre a vida indígena na colônia. A Carta de Pero Vaz de Caminha, a Relação do Piloto Anônimo, a História do Brasil de frei Vicente Salvador, o Tratado das Terras e Gentes do Brasil, de Fernando Cardim, a História da Província de Santa Cruz, de Pero de Magalhães Gândavo, a História da América Portuguesa, de Sebastião da Rocha Pitta, e os Sermões do Padre Antônio Vieira, são alguns exemplos destas informações sobre os indígenas. As fontes de informação sobre o indígena brasileiro durante o Império são as que estão sob a guarda dos arquivos públicos. Por vezes, certidões de batismo e casamento das igrejas em que se reconhecem alguns indícios, as listagens dos recrutamentos militares e congêneres. No século XX, além da documentação produzida pelos departamentos estatais específi cos, como SPI e Funai, existem inúmeros relatos etnográfi cos dos antropólogos. Os antropólogos brasileiros e estrangeiros realizam os chamados trabalhos de campo. Trata-se de visitas às aldeias, nas quais os pesquisadores passam por um processo de aculturação, vivendo de acordo com os hábitos e costumes dos indígenas. Neste trabalho eles escrevem um relato diário, em um caderno, no qual apontam suas experiências e abordam as questões relativas às observações sobre o cotidiano, as diferenças e as semelhanças culturais com os indígenas. Neste sentido, os relatos antropológicos auxiliam na compreensão das diferentes nações. A sociologia utiliza dos relatos antropológicos e históricos em seus estudos com os indígenas. Porém, o sociólogo realiza em geral o trabalho de gabinete, não tendo uma vinculação direta com o relato etnográfi co. Por sua vez, os historiadores trabalham tanto com os índios históricos quanto com os do presente, utilizando as entrevistas de história oral, nas quais gravam as falas dos indígenas sobre temas do interesse da pesquisa a ser realizada. Muitos dos estudos realizados pelas ciências humanas sobre os indígenas foram publicados em livros. Podemos citar alguns exemplos: A função social da guerra na sociedade tupinambá, do sociólogo Florestan Fernandes, é um clássico sobre o tema. Os índios e a civilização e O Processo Civilizador, de autoria de Darcy Ribeiro, são livros importantes. Na atualidade, Viveiros de Castro possui importantes trabalhos na área. Pierre Clastres, em O Infortúnio Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 11A Importância Indígena na Formação do Brasil do Guerreiro Selvagem, é um exemplo de estrangeiro que trabalhou na área. Em relação aos indígenas do sul do Brasil, Sílvio Coelho dos Santos escreveu trabalhos importantes. John Manoel Monteiro, nos Segredos Internos, abordou as questões sobre a escravidão indígena. Manoela Carneiro da Cunha organizou o principal livro da atualidade. Trata-se da História dos Índios do Brasil, uma obra coletiva, em que muitos dos principais pesquisadores retratam a história dos indígenas brasileiros desde as remotas épocas coloniais até o presente. Muitos outros pesquisadores trabalharam com a temática, porém estes são alguns dos principais títulos para os que desejam aprofundar seus conhecimentos. A importância do conhecimento sobre eles é fundamental. Os indígenas são importantíssimos na atualidade brasileira e merecem maior respeito e consideração por parte da sociedade brasileira. Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 12 Contribuição Indígena e Africana na Formação do Povo Brasileiro AUTOATIVIDADE 1 Leia a afi rmação do antropólogo Darcy Ribeiro (2005, p. 58) e responda: “O europeu que, forçando a tradição bíblica, fi zera do deus dos hebreus o rei dos homens, agora tinha que incluir aquela indianidade pagã na humanidade do passado, entre os fi lhos de Eva expulsos do paraíso, e do futuro, entre os destinados à redenção eterna”. Qual a diferença entre as posturas das igrejas cristãs no atual relacionamento das mesmas com as tribos indígenas? 2 Leia a afi rmação do antropólogo Darcy Ribeiro (2005, p. 147) e responda: “Fundado nos princípios políticos de Augusto Comte, mas superando- os largamente, Rondon e seus companheiros estabeleceram um corpo de diretrizes que por décadas orientaram uma política indigenista ofi cial”. Por que as ações da Missão Rondon e dos sertanistas representaram uma modifi cação radical na relação do Estado brasileiro com os indígenas? 3 Leia a afi rmação do historiador José Honório Rodrigues (1989, p. 41) e responda: “O tupi era a língua doméstica, familiar e corrente dos colonos, e o português a língua ofi cial, que as crianças, mamelucos e também fi lhos de índios aprendiam nas escolas mas não falavam em casa”. O que foi o Diretório dos Índios do Grão-Pará e Maranhão? Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 13A Importância Indígena na Formação do Brasil REFERÊNCIAS ALENCASTRO, Luis Felipe de. O Trato dos Viventes. São Paulo: Cia das Letras, 2000. BOXER, Charles. O Império Marítimo Português. São Paulo: Cia das Letras, 2002. CABRAL, Sérgio. Pixinguinha: uma biografi a. Rio de Janeiro: Relmé Dumará, 2000. CARDIM, Fernão. Tratados da Terra e Gente do Brasil. São Paulo: Hedra, 2009. CARNEIRO, Edison. O quilombo dos palmares. 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Existem aquelas que se mantêm ligadas ao ideal de evangelização e outras que partem do conceito antropológico de relatividade cultural e respeito às diferenças. Entre as que se relacionam aos ideais de evangelização, podemos citar as igrejas pentecostais (Assembleia de Deus) e vindas ao Brasil com as missões norte-americanas (batistas e adventistas). O principal órgão da maior igreja cristã brasileira, a Igreja Católica, é o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e se relaciona aos novos métodos antropológicos de relatividade cultural. 2 Leia a afi rmação do antropólogo Darcy Ribeiro (2005, p. 147) e responda: “Fundado nos princípios políticos de Augusto Comte, mas superando- os largamente, Rondon e seus companheiros estabeleceram um corpo de diretrizes que por décadas orientaram uma política indigenista ofi cial”. Por que as ações da Missão Rondon e dos sertanistas representaram uma modifi cação radical na relação do Estado brasileiro com os indígenas? R.: A Missão Rondon inovou a relação com os indígenas, pois ao invés de tratá-los com violência e ser um promotor do contínuo massacre a estas populações, buscou métodos pacíficos no relacionamento com os índios. Os sertanistas, entre os quais se destacaram os irmãos Villas-Boas, continuaram o legado iniciado pelo Marechal Rondon e seus soldados. 3 Leia a afi rmação do historiador José Honório Rodrigues (1989, p. 41) e responda: “O tupi era a língua doméstica, familiar e corrente dos colonos, e o português a língua ofi cial, que as crianças, mamelucos e também fi lhos de índios aprendiam nas escolas mas não falavam em casa”. O que foi o Diretório dos Índios do Grão-Pará e Maranhão? Copyright © Editora GRUPO UNIASSELVI 2012. Todos os direitos reservados. 15A Importância Indígena na Formação do Brasil R.: O Diretório dos Índios foi um documento datado do século XVIII, expedido pelo Marquês de Pombal e que retirou a jurisdição dos indígenas, durante o Brasil Colonial, da responsabilidade das ordens religiosas, dentre as quais se destacaram os jesuítas. No lugar dos religiosos, agentes do Estado português deveriam se responsabilizar pelos mesmos. A principal consequência foi a obrigatoriedade do ensino da língua portuguesa nas aldeias, terminando assim a utilização da língua geral na maior parte do território brasileiro.
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