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Coerência: princípios gerais Textualidade e coerência Leia com atenção o texto a seguir: Era uma vez uma jovenzinha do sul do Brasil. Bem cedo, quando a névoa ainda cobria os cami- nhos, lá ia a menina para a escola: de um lado, levava os cadernos; de outro, a merenda. Havia estudado a noite inteira para se sair bem nas provas daquela manhã. Mas nem precisaria tanto, era uma das melhores alunas da turma e sempre estava com a matéria em dia. Os testes começaram logo, a garota resolveu todos eles e estava ansiosa à espera dos resultados. No final da manhã, a professora afixou as respostas no quadro: nossa jovenzinha acertara ape- nas uma das 20 questões. Você deve ter percebido que alguma coisa no texto não “combina” direito. Se a garota era tão inteligente e estudara tanto, por que não conseguiu se sair bem? Apesar de ser bem organizado coesi- vamente e não apresentar problemas de norma padrão, o exemplo acima não é um bom texto. Isso porque no segmento apresentado não há coerência. Mas o que é mesmo coerência? Vejamos, a seguir, uma breve definição: A palavra coerência, da mesma família de aderência e aderente, provém do latim cohaerentia (formada do prefixo co = junto com + o verbo haerere = estar preso). Significa, pois, conexão, união estreita entre várias partes, relação entre ideias que se harmonizam, ausência de contradição. É a coerência que distingue um texto de um aglomerado de fra- ses. (PLATÃO; FIORIN, 1996, p. 393) A coerência é um dos fatores para a legibilidade de um texto. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 98 | Coerência: princípios gerais Tipos de coerência Van Dijk e Kintsch (apud KOCH; TRAVAGLIA, 2001, p. 37) defendem a existência de quatro tipos de coerência: semântica, sintática, estilística e pragmática. Coerência semântica A coerência semântica está relacionada ao significado dos elementos do texto, tanto de forma local quanto global. Coerência sintática A coerência (ou incoerência) sintática é percebida quando os elementos linguísticos que formam o texto – como conectivos, pronomes etc. – não estão em harmonia. Rainha é absolvido em Vitória O líder sem-terra José Rainha Júnior foi absolvido ontem pelo Tribunal do Júri de Vitória (ES) da acusação de coautoria das mortes do fazendeiro José Machado Neto e do policial militar Sérgio Nar- ciso da Silva. Quatro dos três jurados consideraram Rainha inocente dos crimes, ocorridos em 1989. (Folha de Londrina) No exemplo anterior a expressão “quatro dos três jurados” produz uma incoerência sintática. É possível que tenha ocorrido um erro de revisão do jornal. De qualquer forma, o que foi publicado cons- titui-se como um exemplo de incoerência sintática. Coerência estilística Para Koch e Travaglia (2001, p. 38), para existir coerência estilística “um usuário deveria usar em seu texto elementos linguísticos (léxico, tipos de estruturas, frases etc.) pertencentes ou constituintes do mesmo estilo ou registro linguístico.” Coerência pragmática Finalmente, a coerência pragmática se refere ao atendimento das mesmas condições presentes em uma dada situação comunicativa; ou seja, os participantes do ato comunicativo devem “cooperar” para que ambos tenham em vista a mesma intenção. Mas quais seriam os fatores responsáveis pela coerência de um texto? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 99|Coerência: princípios gerais Fatores de coerência Beaugrande e Dressler (apud KOCH, 2004) formularam um grupo de condições responsáveis pe- la coerência. Para esses autores, os fatores seriam situacionalidade, informatividade, intertextualidade, intencionalidade e aceitabilidade. Koch e Travaglia (2001) apresentam ainda alguns outros fatores, co- mo contextualização, conhecimento linguístico (ou elementos linguísticos), conhecimento de mundo, conhecimento partilhado, inferências, focalização, consistência e relevância. É com esse conjunto de fatores que iremos trabalhar. Conhecimento linguístico (ou elementos linguísticos) O conhecimento linguístico trata do conjunto de informações relacionadas à linguagem: léxi- co, ligações sintáticas, entre outras. É necessário dominarmos a “linguagem” de um certo texto para atribuir-lhe coerência. Como acontece com os outros fatores que veremos a seguir, o conhecimento linguístico não po- de ser considerado isoladamente: ele tem que ser analisado em conjunto com os outros fatores. Conhecimento de mundo A coerência não está no texto, mas se constrói na interlocução. Por isso, um texto pode ser mais ou menos coerente – mais ou menos inteligível – de acordo com o conhecimento de mundo de cada interlocutor. O conhecimento de mundo pode ser de dois tipos: aquele adquirido pela experiência do dia a dia e o chamado conhecimento científico, que é desenvolvido por aqueles que tiveram oportunidade de passar pelos bancos escolares. Segundo Koch e Travaglia (1995), nosso conhecimento de mundo fica organizado em blocos, que se denominam modelos cognitivos. Vejamos a seguir alguns deles: Frames:::: – conjuntos de conhecimentos armazenados na memória debaixo de um certo “rótulo”, sem que haja qualquer ordenação entre eles. Exemplo: Carnaval – confete, serpentina, desfile, escola de samba, fantasia, baile, mulatas etc. Esquemas:::: – conjuntos de conhecimentos armazenados em sequência temporal ou causal. Exemplo: como pôr um aparelho em funcionamento ou um dia na vida de um cidadão co- mum. Planos:::: – conjunto de conhecimentos sobre como agir para atingir determinado objetivo. Exemplo: como vencer uma partida de xadrez. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 100 | Coerência: princípios gerais Scripts:::: – conjuntos de conhecimentos sobre modos de agir altamente estereotipados em dada cultura, inclusive em termos de linguagem. Exemplo: os rituais religiosos (batismo, casamento, missa), as fórmulas de cortesia ou as praxes jurídicas. Superestruturas ou esquemas textuais :::: – conjunto de conhecimentos sobre os diversos tipos de textos, que vão sendo adquiridos à proporção que temos contato com esses tipos e fazemos comparações entre eles. Esses modelos cognitivos vão sendo criados/construídos de acordo com nossas vivências e por isso não são idênticos para todos. Uma pessoa religiosa pode incluir no frame Natal o tópico nascimento de Cristo enquanto para outro interlocutor essa expressão pode não aparecer. Conhecimento partilhado Chamamos de conhecimento partilhado as informações comuns a produtor e receptor: só assim haverá compreensão – e, portanto, coerência. Podemos exemplificar esse fator com a ilustração a seguir: IE SD E Br as il S. A . Situacionalidade Koch e Travaglia (1995, p. 76) afirmam que a situacionalidade é o “conjunto de fatores que tornam um texto relevante para dada situação de comunicação corrente ou passível de ser reconstituída”. Ela pode acontecer da situação para o texto – em que medida a situação comunicativa interfere na produ- ção/recepção do texto – e do texto para a situação. Imagine o seguinte diálogo: – Já tá no ponto? – Já passou um pouquinho. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
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