Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 1 – Aula FUNDAMENTOS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL E NO MUNDO 1. ORIGEM DO DIREITO DO TRABALHO: Esse primeiro ponto de nossa abordagem serve para situar o estudante no mundo do Direito do Trabalho. Ele é necessário como introdução aos demais aspectos que serão enfrentados neste semestre. O Direito tem uma realidade histórico-cultural, não admitindo o estudo de quaisquer de seus ramos sem que se tenha noção de seu desenvolvimento dinâmico no transcurso do tempo. À luz da história, podemos compreender com mais acuidade os problemas atuais. A concepção histórica mostra como foi o desenvolvimento deste disciplina, além das projeções que podem ser alinhadas com base no que se fez no passado, inclusive no que diz respeito à compreensão dos problemas atuais. Não se pode, portanto, prescindir de seu exame. É impossível ter o exato conhecimento de um instituto jurídico sem se proceder a seu exame histórico, pois se verifica suas origens, sua evolução, nos seus aspectos políticos ou econômicos que o influenciaram. Ou seja, o Direito do Trabalho surge da combinação de um conjunto de fatores, os quais podem ser classificados em três grupos específicos: fatores econômicos, fatores sociais, fatores políticos. Evidentemente que nenhum deles atua de modo isolado, já que não se compreendem sem o concurso de outros fatores convergentes. 1.1 Fatores econômicos – aparecimento da indústria; Fatores sociais – ascensão de uma nova classe ao poder; Fatores políticos – se a mudança atingiu a constituição política e a forma de governar. Portanto, é impossível, conhecer o Direito do Trabalho sem conhecer o seu passado. A palavra Trabalho vem do latim tripalium, que era uma espécie de instrumento de tortura de três paus ou uma canga que pesava sobre os animais. 1.2. Evolução Mundial - da escravidão e da Servidão. Da escravidão. Inicialmente, o trabalho foi considerado na Bíblia como castigo. Adão teve de trabalhar para comer em razão de ter comido a maça proibida. 2 Para obter alimentos, inicialmente, dado o primitivismo de sua vida, depois, em face do imperativo de se defender de animais ferozes e de outros homens, o ser humano iniciou a fabricação de armas e instrumentos de defesa. Das lutas travadas entre as tribos decorria que os vencedores destruíam os vencidos para comê-los (antropofagia - canibalismo) ou para se livrarem dos incômodos que poderiam representar. Concebeu-se a ideia de que os vencidos, ao invés de serem destruídos, poderiam ser utilizados nos trabalhos. Os mais valentes aprisionavam um maior número de inimigos e não apenas os utilizava no trabalho, mas os vendia ou trocava. O vencido era patrimônio do vencedor. A escravidão entre os egípcios, os gregos e os romanos, atingiu grandes proporções. Aos escravos eram dados os serviços manuais exaustivos não só por essa causa como, também, porque tal gênero de trabalho era considerado impróprio e até desonroso para os homens válidos e livres. Aristóteles pregava que para ser culto era necessário ser rico e ocioso e que isso não seria possível sem a escravidão. (Estar ocupado é estar em estado de não-ócio, é negar o ócio. Daí o termo negocio). 1.2.1 Na Grécia, Platão e Aristóteles entendiam que o trabalho tinha sentido pejorativo. Envolvia apenas a força física. A dignidade do homem consistia em participar dos negócios da cidade por meio da palavra. Os escravos faziam o trabalho duro, enquanto os outros poderiam ser livres. A escravidão se estendeu pelos tempos medievais até a idade moderna com o subjugo do índio e do negro e subsiste até os nossos dias. A primeira forma de trabalho foi à escravidão, em que o escravo era considerado apenas uma coisa, não tendo qualquer direito, muito menos trabalhista. O escravo, portanto, não era considerado sujeito de direito, pois era propriedade do dominus. Nesse período, constatamos que o trabalho do escravo continuava no tempo, até de modo indefinido, ou mais precisamente até o momento em que o escravo vivesse ou deixasse de ter essa condição. Entretanto, não tinha nenhum direito, apenas o de trabalhar. 2. Servidão A servidão, o segundo fenômeno destacável na evolução do trabalho do homem, foi um tipo muito centralizado de trabalho, em que o indivíduo, sem ter a condição jurídica do escravo, na realidade não dispunha de sua liberdade. Sua base legal estava na posse da terra pelos senhores que se tornavam os possuidores de todos os direitos, numa economia que se firmava na terra - agricultura ou pecuária. Aos servos era assegurado o direito de herança de animais, objetos pessoais e, em alguns lugares, o uso de pastos, 3 mas o imposto de herança absorvia os bens dos herdeiros. Havia muitos pontos de contato entre a servidão e a escravidão. O senhor da terra podia mobilizá-los obrigatoriamente para suas guerra e também, sob contrato, cedia seus servos aos donos das pequenas fábricas ou oficinas já existentes. A servidão começou a desaparecer no final da idade média. 2.1. Num terceiro plano, encontramos as Corporações de Ofícios, em que existiam três personagens: Mestre, os Companheiros e os Aprendizes; As Corporações de Ofício surgiram na época da servidão em decorrência da concentração de massas de população na cidade, fugidos dos campos, onde o poder dos nobres era quase absoluto. A identidade de profissões obrigava a união de homens para que se assegurassem direitos e prerrogativas. O homem que até então trabalhava em benefício exclusivo do senhor da terra, tirando como proveito próprio à alimentação, o vestuário e a habitação, passara a exercer sua atividade, sua profissão, em forma organizada, se bem que ainda não gozando inteira liberdade. É que, senhor da disciplina, não só profissional, mas também pessoal do trabalhador surgia a figura do mestre. Tinha o mestre sob suas ordens não apenas aprendizes, pois lhe estavam subordinados trabalhadores, mediante rigorosos contratos nos quais o motivo não era simplesmente a "locação do trabalho" pois se submetiam às suas determinações até mesmo quanto ao direito de mudança de domicílio. Em troca, além do salário, tinha a proteção de socorros em casos de doença e lhes ficava assegurado um verdadeiro monopólio de profissão, já que só podiam exercê-la os que estivessem inscritos na corporação correspondente, e mais ainda, poderiam, um dia vir a serem também mestres. 2.1.2 Formação do Direito do Trabalho no Mundo. Revolução Industrial: Marco inicial com a criação da máquina a vapor por Thomas Newcomen, em 1712. Acarretou importantes conseqüências econômicas e profundas transformações sociais, refletindo-se no Direito. A expressão questão social não havia sido formulada antes, quando os efeitos do capitalismo e as condições da infra-estrutura social se fizeram sentir com muita intensidade, acentuando-se um amplo empobrecimento dos trabalhadores, inclusive dos artesãos, pela insuficiente competitiva em relação a indústria que florescia. 4 Também a agricultura sofreu o impacto da época, com os novos métodos de produção adotados em diversos países e com as oscilações de preços subseqüente. A família viu ser atingida pela mobilização da mão-de-obra feminina e dos menores nas fabricas. A revolução industrial produziu os seguintes fenômenos: 1º Concentração do proletariado nos grandes centros industriais nascentes; 2º A exploração de um capitalismo sem peias; 3º A triunfante filosofia individualista da revolução francesa; 4º Os falsos postulados da liberdade de comércio, indústria e trabalho, refletidos no campo jurídico na falaz liberdade de contratar; 5º Largo emprego das meias forças, trabalho do menor e da mulher; 6º Instituições de sociedades por ações; sociedades anônimas; propiciando a reunião de grandes massas de capital necessário aos empreendimentos industriais, e seu posteriordesdobramento em capitais monopolizadores (trust, cartéis e holdings); 7ºA ideia do não intervencionismo estatal. Dentre as conquistas da Revolução Industrial do século XVIII a utilização das forças motrizes distintas da força muscular do homem e dos animais foi um dos acontecimentos de maior destaque, porque permitiu a evolução do maquinismo1. Esses acontecimentos geraram um estado de miséria nunca antes visto para o proletariado e, de grande modo, determinaram a sua organização. 2.1.3 O Aparecimento do Proletariado. Segundo Georges Lefranc2, o termo proletário designava em Roma, os cidadãos de classe mais baixa. Cabe a Saint-Simon utilizar a expressão, no sentido moderno, pela primeira vez. O proletário deu bons furtos na ordem técnica e no processo de produção. Todavia, as condições de vida em que se encontrou em nada recomendam a humanidade. O proletário é um trabalhador que presta serviços em jornadas de duração que vai de 14 a 16 horas, não tem oportunidades de desenvolvimento intelectual, habita em condições subumanas, em geral nas adjacências do próprio local da atividade, tem prole numerosa e ganha salário em troca disso tudo. 1 Amauri Mascaro Nascimento – Curso de Direito do Trabalho – Ed. Saraiva – 1989. 2 Histoire du travail et des travailleurs, 1957, p. 251 5 Há, no entanto, alguns autores que comentam a plenitude psíquica do proletário: “A condição proletária, de uma maneira habitual, não alcançou fins humanitários, pelo contrario: chegou à desumanização e à despersonalização. O proletário não é um ser acabado, senão um ser diminuído”. 3.Outros fatos determinantes da organização do proletariado: 1) Salário vil; 2) O prolongamento desmedido da jornada de trabalho; 3) O livre jogo da lei da oferta e da procura; e 4) O trabalho do menor de seis, oito e dez anos, e da mulher, ambos em longas jornadas. A organização do proletariado se deu, em princípio, na clandestinidade. O movimento foi tolerado numa época seguinte e, afinal, reconhecido pela autoridade pública. Era a luta contra a miséria e o aniquilamento de uma classe. Em síntese, podemos dizer que o aparecimento do Direito do Trabalho foi obra do próprio operário e não benevolência de filantropos, dos patrões ou do Estado. Da consciência de classe nasceu um direito coletivo, antes de um direito individual do trabalho. 3.1. O Liberalismo O direito que sucede o Bill of Rights, de 1689, a Revolução Francesa e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, a Declaração da Virgínia, de 1776, e o Código de Napoleão não podia prever um problema para o qual não se destinava, qual seja a questão trabalhista, posterior no tempo. Significava uma reação contra o absolutismo monárquico e a origem divina sobrenatural do poder, partindo de uma ideia básica contratualista inspirada nos princípios sustentados por John Locke, Jean- Jacques Rousseau, Montesquieu, Voltaire, Adam Smith, Stuart Mill e tantos outros. Os maiores do Iluminismo. A concepção fundamental do liberalismo é a de uma sociedade política instituída pelo consentimento dos homens que viviam em estado de natureza e na qual cada um, sob a direção da vontade geral, vive em liberdade e igualdade e com a garantia da propriedade de tudo o que possui. O governo é simples intermediário entre o povo e a vontade geral, a qual lhe cabe dar cumprimento, com um mínimo de interferência e com o máximo empenho no sentido de assegurar a liberdade civil e política, bem como os direitos naturais, porque estes preexistem ao Estado e não se sujeitam a restrições. 6 Como consequência desses princípios, o Estado Capitalista estruturou-se com base em certas peculiaridades: soberania nacional, exercida mediante um sistema representativo; regime constitucional com a tripartição de poderes; separação entre o direito público e o privado; liberdade no sentido de não ser o homem obrigado a fazer ou deixar de fazer a não ser em virtude de lei; igualdade jurídica sem distinção de raça, sexo, crença religiosa etc.; igual oportunidade de enriquecimento; não intervenção do Poder Público; o trabalho sujeito à lei da oferta e da procura; respeito incondicional a propriedade privada etc. Portanto, nessa fase do pensamento humano predomina a ideia do individual, da plena expressão da personalidade, na libertação das faculdades de cada um para um desenvolvimento que ao Estado competiria assistir3. Amauri Mascaro diz: “Liberalismo é o movimento destinado a afirmar a personalidade humana em todas as suas manifestações e a libertá-la dos vínculos do passado e do império opressivo da autoridade e da tradição”. O liberalismo político, econômico e jurídico inspirado nos princípios que foram consagrados pela Revolução Francesa de 1789 não favoreceu o direito do trabalho, ao contrario, ensejou que se criassem mais evidentes condições de sua necessidade. A ideia da liberdade absoluta do homem na procura do seu próprio interesse, sem interferência do Estado, trouxe algumas conseqüências que devem ser relacionadas. Primeiro, a supressão das Corporações de Ofício que mediante seus estatutos elaboraram uma primeira regulamentação trabalhista. 4. Fatores concorrentes do desenvolvimento do Direito do Trabalho: 1) Ação humanitária de homens progressistas (Villeume, Roberto Oinen, Haamel, Godin, Von Bretano etc); 2) Novas doutrinas sociais e econômicas, tendentes a modificar a atitude não- intervencionista do Estado liberal clássico; 3) Colaboração da chamada escola alemã (Nagnen e Cassale), teoria de um socialismo de Estado; 4) Princípios solidaristas - Léon Bourgois, intentando fornecer base doutrinária à intervenção estatal no domínio da economia e do trabalho; 5) Doutrinas sociais da igreja, consubstanciadas nas encíclicas "Rerum Novarum", "Quadragesimum Anum", e "Mater et Magistra", afirmando a excelência de um cristianismo social e o primado do problema moral; 6) Doutrinas socialistas: marxismo e o socialismo reformista de Alexandre Millerand e Jean Jannés; 3 Amauri Mascaro Nascimento – Curso de Direito do Trabalho – Ed. Saraiva 2006. 7 7) Influências exercidas pelos Estados totalitários, (URSS) Itália e Alemanha, sobretudo no que diz respeito ao Direito do Trabalho; e 8) As grandes guerras, o Tratado de Versalhes, criação da OIT, a organização das Nações Unidas e a revolução tecnológica com sua modificação qualitativa e quantitativa da mão-de-obra. 4.1. Evolução histórica do Direito do Trabalho: Fins do século XVIII até o "manifesto comunista", em 1848, de Marx e Engels: é assinalado por escassa atividade regulamentar do Estado liberal, aponta-se para esse período: 1) Decreto Francês que regulamentou o trabalho em tipografias (1796); 2) Lei inglesa de 1802, que proibiu as crianças trabalharem mais de 12 horas por dia ou em horário noturno; 3) Lei francesa análoga à inglesa(1841); e 4) Ato de 1826 na Inglaterra, que permitiu a classe operária britânica conquistar o direito de associação. 4.1.3. Do "manifesto comunista", Em 1848, até a Encíclica “Rerum Novarum”. É marcado pela fundação da 1ª internacional; Pelo aparecimento da obra marxista de contribuição à crítica da economia política, na qual arma o proletariado com a teoria do materialismo histórico; Pela revolução francesa de 1848 e a constituição que a seguiu instituindo um direito ao trabalho de contornos imprecisos; Pela criação da comissão de Luxemburgo, da qual resultaram proposições regulamentando a duração do trabalho para adultos na França e a proibição da merchandage (intermediação de mão-de-obra); Pela abolição do delito de coalizão (1864); Pela tolerância por parte da autoridade pública das "chambres sindicales"; Pela conquista do direito de sindicalização naFrança(1884). Esse período vai da primeira das encíclicas papais, a "Rerum Novarum"(1891) de Leão XIII, de suma importância para a doutrina social da igreja com larga repercussão histórica até a 1ª guerra mundial. É marcado pela conferência de Berlim (1891), com o gênio político de Bismark formulando a idéia de seguros sociais. Acontecimentos legislativos: 8 1) Lei que institui a conciliação e a arbitragem facultativas (1892); e 2) A lei de acidentes de trabalho, provocando novas teorias sobre a responsabilidade civil e muitas outras de menor importância. *Começa com o fim da 1ª grande guerra e com o tratado de Versalhes que preconizava a adoção de princípios gerais relativos à regulamentação do trabalho. Recomendava que fossem adotados pelos países signatários. Nesse período, iniciam-se, propriamente, a atividade legislativa dos Estados em favor dos trabalhadores, obedientes àqueles novos princípios. Caracteriza-se, sobretudo, pela incorporação de medidas de caráter social aos textos das constituições em todos os países democráticos e pela intensificação da legislação ordinária em todas as nações civilizadas, abrangendo todos os aspectos da regulamentação do trabalho. 1 – Aula FUNDAMENTOS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL E NO MUNDO
Compartilhar