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Terapeuta Acrobata - Nina Vasconcelos Guimarães

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1 
 
 
 
MICHAEL WHITE: UM TERAPEUTA ACROBATA 
 
 Nina Vasconcelos Guimarães1 
 
Resumo 
 
Inicio este artigo estabelecendo uma diferença entre os movimentos estruturalista e pós-
estruturalista, como também exploro os pressupostos epistemológicos da terapia narrativa 
de Michael White. Escrevo sobre o conceito de desconstrução de Derrida, a terapia 
enquanto ação política de Michel Foucault, a concepção de mente social de Jerome Bruner 
e me estendo pela prática clínica do autor. Enfatizo a externalização do problema, as 
conversações de re-autoria e re-membramento, além de expor a importância de elevar o 
setting com as denominadas testemunhas externas, todas metáforas narrativas que 
representam o trabalho terapêutico criativo desse teórico. 
 
 Palavras-chave: narrativa; linguagem; estruturalismo e pós-estruturalismo. 
 
 
Abstract 
 
In this article the author presents the difference between structuralism and pos-structuralism 
movements and explores the epistemological principles of the Michael White´s narrative 
therapy. She quotes Derrida´s concept of deconstruction as political action, by Michael 
Foucault, Jerome Bruner´s concept of social mind and extends to the clinical practice of the 
author. She continues emphasizing the problem externalization, the conversations of re-
authoring and re-membering, highlighting the setting with external witness, everyone 
narrative methaphors that represents the 
creative work of this author. 
 
Key words: narrative; language; structuralism and post-structuralism. 
 
 
 
 
1 Psicóloga, Terapeuta de Família, Mestra em Família na Sociedade Contemporânea (UcSal-Ba). Professora e Supervisora dos 
cursos de Graduação da Faculdade Ruy Barbosa (FRB – Salvador-Ba) e Co-Diretora do Instituto Humanitas de pesquisa e 
intervenção em sistemas humanos (Salvador - Ba). 
 
 
 2 
Da Modernidade à Pós-Modernidade 
 
“Toda a palavra, sobretudo a palavra da política ou mesmo da 
ciência, é uma palavra que sai de uma fonte de poder. Um poder a 
gera e ela enuncia, queira ou não, um lugar do poder, porque o 
simples classificar, estabelecer o certo e o errado, o alto e o baixo, o 
quente e o frio, o selvagem e o civilizado, o homem e a mulher, já 
contem um ato de poder. Já é um gesto de quem, de algum modo, 
se sente capaz de ordenar o mundo. Ordenar o mundo da natureza, 
o mundo da vida, o mundo humano”. (Carlos, Rodrigues Brandão, 
2006 apud Barthes, 1979 p. 67). 
 
Segundo Gergen e Kaye (1998), a era modernista, nas ciências, esteve comprometida com 
a elucidação empírica das essências, visando estabelecer corpos de conhecimento 
sistemático e objetivo que favorecessem previsões exatas baseadas nas relações de causa 
e efeito, como também na obtenção de domínio futuro. Para o modernista, a sociedade era 
regida pelo conhecimento empírico (linguagem científica) obtido através de uma 
observação que refletia, mapeava e representava o mundo. As narrativas eram estruturas 
de linguagem, geradas por códigos cientificistas que funcionavam como transmissores de 
conhecimento objetivo. As expostas pelos clientes não eram exatas, portanto, indignas de 
confiabilidade, contrárias às científicas que tinham a aprovação profissional. Dentro desta 
perspectiva moderna, a narrativa do cliente era destruída a partir das perguntas e 
redefinições do terapeuta, além de substituída pela versão do profissional. 
 
A modernidade, também caracterizada pelo Estruturalismo e a famosa “Revolução 
Científica”, prosperou como um período em que vários povos na Europa começaram a 
acreditar que o universo e tudo que havia nele poderia ser compreendido pelas leis 
(estruturas) que governavam os fenômenos físicos, enaltecendo a exploração científica 
objetiva, como a única válida e universal. Foi um período de avanços significativos nas 
ciências físicas, promovendo invenções e tecnologias que se difundiram e transformaram o 
mundo (Russel & Carey, 2004). 
 
As ideias “estruturalistas” seguiram influenciando as ciências sociais e outras disciplinas 
(como a antropologia, lingüística, sociologia, psicologia e terapia familiar). Seu olhar se 
debruçava sobre as estruturas internas essenciais das pessoas, das famílias, das 
sociedades, das culturas e da linguagem, impondo que o indivíduo fosse estudado da 
mesma forma que os objetos – dentro de uma ótica imparcial. No campo dos estudos 
literários, esse movimento repercutiu num conjunto de critérios objetivos para a análise e 
num novo rigor intelectual. 
 3 
Na psicologia, as ideias estruturalistas defendiam o conhecimento da “verdade” sobre uma 
pessoa, “descascando” as camadas do seu self - em algum lugar, encontrar-se-ia o self 
interno, compreendido como a “verdade” da identidade da pessoa. O comportamento do 
indivíduo era influenciado por estas estruturas fundamentais. 
 
Segundo Russel e Carey (2002), o estruturalismo propiciou aos terapeutas e a outros 
profissionais acreditarem que sua função era conhecer as “verdades” emocionais e 
psicológicas sobre os clientes, interpretando e diagnosticando o comportamento 
manifestado, relacionando-o com o funcionamento do self, da psiquê interna da pessoa. O 
tratamento seguia a partir de alguma descrição do dilema trazido pelo cliente. 
 
Segundo as autoras supracitadas, é possível reunir alguns pressupostos estruturalistas: 
 
 O objetivo da investigação é pesquisar “estruturas profundas” ou “verdades 
essenciais” sobre as pessoas; 
 
 Tais “verdades essenciais” são investigadas objetivamente; 
 
 É a “estrutura profunda” (isto é, o self interior) que molda a vida; 
 
 Nossas idéias, nossos problemas e nossas qualidades estão vinculadas a algum 
self interno; 
 
 Nossas identidades são fixas, essenciais e consistentes – encontradas em nossos 
selves interiores. 
 
Uma das críticas severas dirigidas a esta versão modernista de terapia diz respeito ao 
cuidado e à preocupação excessiva com o indivíduo, negligenciando as condições culturais 
com as quais as dificuldades psicológicas podem ter uma relação significativa. Embora as 
terapias modernas e pós-modernas coincidam no objetivo final de autonomizar a pessoa e 
empoderá-la para a assunção de suas características auto-realizadoras, aqui no 
modernismo esse projeto terapêutico ainda se baseia na existência de uma ontologia 
mentalista (o ego) e o processo se dá através tanto da avaliação racional quanto da 
experiência emocional do paciente, associada a uma imagem modernista de 
“funcionamento pleno” e indivíduo “bom”. O “ser humano saudável” consistia em uma 
“receita” legitimada por uma cultura e reforçada pelos processos terapêuticos. 
 
Autores como Gergen e Warhus (2001), como também Gergen e Kaye (1998) defendem 
que a mudança pós-moderna propõe um desafio à concepção modernista de narrativa 
científica, questionando as concepções tanto da patologia quanto da cura, assim como o 
 4 
status irreparável do terapeuta enquanto autoridade científica e suas narrativas 
estandarizadas, assumindo outras possibilidades disponíveis na cultura, diferentes da visão 
única adotada até então. Essa hierarquia tradicional é substituída por uma escultura 
compartilhada por terapeuta e cliente que oferece contornos para um futuro caleidoscópico 
de alternativas distintas daquela limitada do presente, considerando-se que qualquer versão 
adotada está imersa em uma cultura e dela não pode se dissociar. 
 
As práticas construcionistas rompem com as premissas tradicionais a respeito do 
conhecimento, da pessoa e da natureza do “real”, privilegiando um total relativismo das 
expressões de identidade. Convida-nos a uma multiplicidade de versões de realidade 
situadas histórica e socialmente. Essas versões existem nas conversações, mas não 
devemos nos “filiar” a nenhuma delas. Desta forma, o cliente, vulnerável, é encorajado a 
acreditar numa multiplicidade de entendimentos do self, porém,nenhum deles assume o 
status de verdadeiro. Como dizem Gergen e Kaye (1998), “a ênfase pós-moderna está na 
flexibilidade da auto-identificação, mas isto não implica simultaneamente que o indivíduo 
seja um charlatão ardiloso” [...] O self somente é constituído como um subproduto das 
relações (p. 217). 
 
O Pós-Estruturalismo, por outro lado, movimento difundido desde 1960, influenciou outros 
campos de conhecimento como a filosofia crítica, a antropologia cultural, a linguística, a 
teoria literária e a sociologia. Sempre difícil de se impor enquanto pensamento, já que se 
contrapunha ao “imperialismo” estruturalista moderno, o pós-estruturalismo apresenta como 
principais expoentes que influenciam a terapia narrativa de Michael White, os filósofos 
franceses Michel Foucault e Jacques Derrida, que serão melhor explorados no decorrer 
deste artigo. 
 
A pós-modernidade enfatizará as perspectivas dialógicas/múltiplas referendadas pelo texto 
e pela narrativa. O colorido proposto por seus autores mais proeminentes (ANDERSEN, 
1987,1991; BOSCOLO et al, 1978; SELVINI el al, 1980; GOLISHIAN & ANDERSON, 1987, 
1990; LYNN HOFFMAN, 1988, 1990; WHITE & EPSTON, 1990) permitiu um salto que 
resultou em mudanças significativas. As estruturas universais deram lugar ao multiverso e 
as famílias passaram a ser consideradas como sistemas sociais orientados pela linguagem, 
geradoras de significados e em estado de desequilíbrio. O modelo hierárquico que enaltecia 
o terapeuta enquanto expert cede lugar a uma responsabilidade mais igualitária. Como 
afirma Lax (1998), 
 
 “o eu é concebido não como uma entidade reificada, mas como uma 
narrativa; o texto não é algo a ser interpretado, mas um processo em 
evolução; o indivíduo é considerado dentro de um contexto de 
sentido social, e não como uma entidade intrapsíquica. E o 
 5 
conhecimento científico ou o que seria considerado como fatos 
inegáveis a respeito do mundo dá lugar ao conhecimento narrativo 
com uma maior ênfase colocada sobre as crenças comuns a 
respeito de como o mundo funciona” (p. 87). 
 
Russel e Carey (2004), sustentadas em ideias pós-estruturalistas, compreendem que: (1) 
as nossas identidades não são fixas, mas estão sempre num processo de criação; (2) os 
terapeutas ajudam seus clientes a criarem e re-criarem suas identidades; (3) estas são 
construídas na relação com os outros, daí a importância de trazer para a terapia 
testemunhas que relatem situações semelhantes aos dilemas apresentados pelos clientes; 
(4) reconhecer que as identidades são construídas socialmente, significa admitir que 
nossas vidas são influenciadas pela história, pela cultura, pelo gênero, pela sexualidade, 
classe e por outras relações mais amplas de poder; (5) não podemos conhecer a “verdade” 
sobre a identidade das pessoas; (6) as compreensões do terapeuta nunca são objetivas, 
neutras ou isentas de valor. Isto força o profissional a revisar suas perspectivas, impedindo-
o de impor suas idéias ao cliente; (7) é importante manter-se em alerta quanto àquilo que 
não se encaixa no “normal”. 
 
As autoras (idem) levantam questionamentos a respeito do terapeuta pós-estruturalista que 
é convidado a: 
 
 Ajudar as pessoas (quando relevante) a pararem de mensurar suas vidas de 
acordo com o que certas normas sociais dizem sobre como a vida deveria ser; 
 
 Indagar sobre sua prática profissional – sua “objetividade”, “perícia” e 
“interpretações”; 
 
 Questionar ideias dadas como certas e suposições que podem ser apoiadas 
através da linguagem usada em terapia; 
 
 Considerar que histórias, rituais e outros aspectos representativos são relevantes 
para a compreensão do processo da terapia; 
 
 Externalizar idéias, problemas e qualidades do cliente em conversações na terapia. 
 
 Aceitar seriamente que cada conversação na terapia moldará a identidade (até 
certo ponto) de ambos – a pessoa que nos consulta e o próprio terapeuta 
 
 Refletir, do começo ao fim, como podemos envolver testemunhas no trabalho que 
está sendo desenvolvido no contexto da terapia; 
 6 
 Considerar como as histórias dos clientes moldam suas vidas e o quanto a terapia 
favorece a descrição de historias saturadas que constroem suas identidades. 
 
 
Hermenêutica e Construcionismo Social 
 
“Sem Duvida, é o leitor que captará e traduzirá em construções 
próprias as ideias da obra; e é, a partir de então – momento sagrado 
– que tais ideias deixam de ser patrimônio exclusivo do autor para 
passar a formar parte do universo de conhecimento do leitor”. 
(Cebério & Watzlawick, 1998 p. 13). 
 
Segundo Anderson (1999), “a hermenêutica filosófica contemporânea e o construcionismo 
social veem os sistemas humanos como entidades complexas integradas por indivíduos 
que pensam, interpretam e compreendem” (p. 72). Ambos questionam os princípios 
tradicionais de análise do ser humano baseados em pré-concepções de um discurso 
modernista, que perpetua a noção de metáforas universais a serem descobertas. 
Confrontam o conhecimento e a verdade como sendo construídos a partir de uma 
hierarquia – o terapeuta se sobrepondo ao cliente, pois consideram que esses limites 
impedem a apreciação da complexidade humana. 
 
As duas correntes compartilham uma perspectiva compreensiva de um sentido que não é 
imposto, mas sim, construído por indivíduos que interatuam e conversam até que venham à 
tona significados e interpretações variados de experiências de vida, incluindo as 
identidades. Nesse processo, a linguagem desempenha um papel fundamental. Para 
Gergen (1990 apud Anderson, 1999), “tanto os construcionistas sociais como os 
hermeneutas questionam que o entendimento pode refletir, revelar ou ser revelado” (p. 73). 
 
A hermenêutica foi um dos primeiros questionamentos à teoria cartesiana do conhecimento, 
que separava o observador do observado. Surgiu no século XVII, como enfoque de análise 
e interpretação correta de textos bíblicos e literários onde o leitor descobria e interpretava a 
palavra escrita. A tradição hermenêutica antiga focalizava o texto e não o intérprete ou o 
questionador do texto. A partir do final do século XVIII e XIX, ela foi rompendo com essa 
tradição textual, convertendo-se em um método de interpretação e compreensão da 
conduta humana. No século XX, associada ao pensamento de Gadamer, Habermas, 
Hiedegger e Ricoeur, dentre outros, adotou um tom pós-moderno. Não há uma definição 
universal para a hermenêutica, porém, em termos gerais, ela se ocupa da compreensão e 
interpretação – um texto ou um discurso sofre influências de crenças e intenções do 
intérprete. Para Anderson (1999), “a hermenêutica não é uma tentativa de alcançar o 
significado verdadeiro ou a interpretação correta, e não deve se confundir com a explicação 
 7 
causal” (p. 74). Assim, a autora completa afirmando que “o significado de uma pessoa não 
pode ser compreendido plenamente, e muito menos reproduzido por outra pessoa [...]. 
Cada descrição, cada interpretação é uma versão de verdade [...]. A interpretação, a 
compreensão e a busca da verdade nunca acabam” (p. 74). 
 
Para Gadamer (1975, apud Anderson, 1999), o intérprete contribui para a experiência 
interpretativa e o significado emerge da fusão de horizontes entre o leitor e o texto, 
analogamente ao domínio da psicoterapia entre o terapeuta e o cliente. A compreensão 
singular que surge desse encontro não pode ser atribuída nem a um, nem a outro e todo 
ato de interpretação se situa na linguagem, na história e na cultura. Para Anderson (1999), 
“compreender é submergir no horizonte de outra pessoa, é um processo recíproco onde um 
se abre ao outro” (p. 75). 
 
Gergen (1994) critica Gadamer quanto à ênfase dada ao indivíduo e sua influência na 
interpretação. Para ele, as implicações da hermenêutica transcendem o indivíduo e 
alcançam as interações entre indivíduos. Sua insistência numa “descrição relacional”, em 
uma teoria relacional do sentido humano é um aspecto fundamental do discurso 
construcionista nas ciências sociais.O autor defende que a relação é o locus do 
conhecimento – as ideias, verdades e o próprio ser são produto das relações humanas, de 
uma comunidade de pessoas e relações. Como afirma Anderson (1999), “os significados da 
linguagem, ou seja, o significado que atribuímos às coisas, aos acontecimentos, às pessoas 
e a nós mesmos são o resultado da linguagem que usamos: do diálogo social, do 
intercâmbio e da interação que construímos socialmente” (p. 77). 
 
 
Teoria Literária 
 
“[...] Por não pretender dizer nada sobre como uma interpretação 
complexa e Teórica, por tentar apenas apreender, sabendo que 
aquilo é uma entre muitas leituras fugazes do beija-flor, do código 
genético ou do ser humano, a literatura é absolutamente realista. Ela 
se abre ao real em sua primeira existência, antes que ele seja 
explicado, codificado, interpretado, classificado”. (Carlos 
Rodrigues Brandão, 2006 apud Barthes, 1979 p. 70) 
 
A teoria literária é uma descrição dos princípios subjacentes (ferramentas) através dos 
quais tentamos compreender a literatura. Toda a interpretação literária parte de uma base 
teórica, mas pode servir de justificativa para vários tipos de atividade crítica. É a teoria 
literária que formula a relação entre o autor e a obra. Também denominada de “teoria 
crítica”, hoje vem-se transformando em “teoria cultural”, podendo ser entendida dentro da 
 8 
disciplina dos estudos literários como o conjunto de conceitos e pressupostos em que se 
fundamenta o ato de explicar ou interpretar os textos literários. A teoria literária refere-se a 
quaisquer dos princípios derivados da análise interna dos textos literários ou de 
conhecimentos externos ao texto que podem ser aplicados em várias situações 
interpretativas. 
 
Usando as diversas teorias pós-estruturalistas e pós-modernas, que frequentemente se 
utilizam de outras disciplinas além das literárias - linguísticas, antropológicas, psicanalíticas 
e filosóficas - para formar as suas percepções primárias, a teoria literária tornou-se um 
corpo interdisciplinar de teoria cultural. Tendo como premissa o fato das sociedades e do 
conhecimento humano serem, de uma forma ou de outra, constituídos de textos, a teoria 
cultural é agora aplicada às variedades destes, visando ambiciosamente se tornar o modelo 
proeminente de questionamento da condição humana. 
 
A crítica literária acabou influenciando o campo da Psicologia no que diz respeito ao 
conceito de significado, considerando o privilégio de um tipo de interpretação em detrimento 
de outro. Tradicionalmente, Gergen (1994, apud Grandesso, 2000) compartilha de uma 
visão intersubjetiva de significado em que, segundo ele, o intérprete busca, por meio de sua 
análise, capturar o significado interno do trabalho literário, equivalente ao significado 
privado que o autor tentou expressar por meio de sua obra. Portanto, nesta ótica, o 
significado refere-se à intenção do autor. Para Michel Foucault, filósofo desconstrucionista, 
que desenvolve uma noção particular sobre o poder, explorada em outra seção deste 
artigo, o autor de uma obra literária não pode ser identificado com um ser humano 
individual, mas sim, com o um sujeito sob influências da linguagem, de uma concepção de 
literatura daquele período e território em particular, com seus elementos sócio-culturais e 
históricos. 
 
Em 1950, a nova crítica literária, condizente com o pensamento moderno, convocou a 
importância do trabalho literário em si como uma unidade, defendendo a ideia de que a 
obra dizia mais sobre si mesma do que o próprio autor. 
 
Com a virada paradigmática da pós-modernidade, a teoria literária passou a enfatizar o 
ponto de vista do intérprete. De acordo com Grandesso (2000), o foco de atenção proposto 
por Gadamer se debruça sobre a participação do leitor na construção do significado do 
texto – seus sentimentos, ideologias, pressuposições e disposições cognitivas são fatores 
determinantes de uma interpretação. Diz ela, “nesse sentido, tanto a intenção do autor 
como a estrutura do texto perdem sua importância diante das disposições do intérprete” (p. 
179). 
 
 9 
A seguir, abordar-se-á um dos principais expoentes da crítica literária, o filósofo francês 
Jacques Derrida e o significado por ele proposto ao termo desconstrução. 
 
 
Derrida e a Desconstrução 
 
A desconstrução foi um termo utilizado pelo filósofo francês Jacques Derrida como método 
ou processo de análise crítico-filosófica situado dentro do movimento denominado pós-
estruturalismo. Surge como uma ruptura ao estruturalismo nos meios universitários norte-
americanos, dentro de amplos debates, sobretudo nas décadas de setenta e oitenta. 
 
Desconstruir um texto é fazer com que as suas palavras subvertam as próprias suposições 
desse texto, reconstituindo os movimentos paradoxais dentro da sua própria linguagem. 
Derrida propõe uma nova reflexão sobre a maneira da linguagem operar. Questionando os 
valores de verdade, de significado inequívoco e de presença, a desconstrução aponta para 
a possibilidade de escrever não mais como representação de algo, mas como a infinitude 
do seu próprio “jogo”. Nesse sentido, o filósofo se abstém da busca de qualquer significado 
através ou dentro do texto, já que o considera impossível de ser fixado – cada escolha 
pressupõe um estado de indecisão anterior. 
 
Desconstruir um texto não é procurar o seu sentido, mas seguir os trilhos em que a escrita, 
ao mesmo tempo se estabelece e transgride os seus próprios termos, produzindo então um 
desvio [dérive] assemântico de différence. Todo o signo só significa na medida em que se 
opõe a outro signo, por isso pode-se dizer que é essa condição da linguagem, que 
constantemente diferencia e adia os seus componentes, o que concede significado ao 
signo. Segundo o autor, a leitura crítica de um texto literário não objetiva um sentido único, 
mas a descoberta da sua pluralidade de sentidos. 
 
Para Derrida (1976; 1978 apud Gergen & McNamee, 1998), 
 
“a linguagem é um sistema de signos que não têm um valor positivo 
ou negativo inerente. Os valores são atribuídos a eles somente pela 
nossa produção de sentido. A existência de uma palavra 
automaticamente inclui todas aquelas distinções tanto dela mesmo 
quanto de sua relação com as outras palavras que não estão 
presentes. Assim sendo, múltiplos entendimentos estão sempre 
disponíveis através da distinção do que está presente no texto em 
relação às ideias e palavras opostas que não estão presentes. Estes 
outros entendimentos possíveis podem ser compreendidos como 
traços no texto, ‘sempre já’ disponíveis para serem invocados. 
 10 
Seguindo a perspectiva da ‘resposta do leitor’ (ver CULLER, 1982), 
estas novas distinções não são como artefatos esperando para 
serem descobertos, mas visões diferentes disponíveis para cada 
leitor a partir da perspectiva dentro da qual aquela pessoa vê o texto” 
(p. 90). 
 
Bateson e Derrida apresentam semelhanças com relação ao termo diferença: “ambos 
descrevem relações, não entidades”. A différence acrescenta outra qualidade à ideia de 
Bateson sobre diferença. Segundo Lax (1998), “Derrida propõe que existe aquilo que é dito 
e o que não é dito, e a tensão entre os dois é a différence” (p. 91). Uma nova compreensão 
surge dessa tensão. No interjogo do dito e do não dito, daquilo que está presente e do que 
não se apresenta, existe um potencial para uma nova perspectiva, pois nenhum deles 
adquire valor de objeto de realidade – ambos são, portanto, uma construção particular da 
leitura que o leitor faz do texto. Segundo o filósofo, devemos sempre buscar essa outra 
posição, ao mesmo tempo que desconstruímos o mundo como estamos habituados a 
conhecê-lo, procurando pelo inesperado que substitua a visão habitual. 
 
Levando em consideração as proposições dissimuladas ou impronunciadas do texto, as 
lacunas e contradições internas de maior sutileza podem significar algo muito diferente 
daquilo que a princípio o texto parecia querer dizer. Existem momentos em que o textonão 
pretende dizer algo específico, mas dá margem a diferentes sentidos, inclusive, versões 
distantes daquela que, inicialmente, o autor pretendia. Mostrando os efeitos de différence 
em que o sentido é constantemente diferido e distinguido, estamos diante de uma cadeia 
infinita de significados que constitui o texto. Derrida mostra que o texto pode dizer sobre 
sua própria história, deixando então entrever um novo texto que, por sua vez, está sujeito 
ao idêntico trabalho desconstrucionista que permite um retorno dialético infinito ao texto. 
 
Nessa técnica de leitura não se valida o antigo pressuposto do New Criticism dos anos 40 e 
50, de que o sentido está contido no texto e pode ser controlado, pois ele coexiste no jogo 
linguístico e deste participa, nunca garantindo o absolutismo (ou presença) de um sentido 
(ou interpretação) em relação a outros sentidos (interpretações). A intenção do autor fica 
sempre dissolvida no jogo diferencial/protelador (jogo da différence) dos significantes. 
 
Os críticos da desconstrução de Derrida têm fundamentado as suas observações, 
sobretudo no estilo hermético e excessivamente retórico do filósofo francês que se entretém 
com complexos jogos de linguagem e engenhosos conceitos, mas Derrida defende-se 
afirmando que o jogo faz parte da própria natureza da linguagem. Outra crítica a seu 
trabalho diz respeito ao grau de arbitrariedade em que a desconstrução implica: se a 
linguagem e a metafísica são estruturadas pelas diferenças não é possível fundar nenhum 
tipo de critério ou criar uma referência que sirva de orientação no processo de interpretação 
 11 
de uma obra literária, o que nos permite acreditar que tudo é aparentemente permitido e 
nada permanece, seja o sentido do texto, do autor ou a autoridade do leitor. Esta posição 
deriva de um entendimento da desconstrução como mera destruição do texto, correlação 
que os desconstrucionistas se empenham em negar. 
 
A analogia do texto com a prática clínica tem sido usada por alguns autores da pós-
modernidade, dentre eles David Epston e Michael White (1990). Essa perspectiva vislumbra 
uma posição ativa dos leitores, defendendo que cada leitura de interpretação depende da 
interação entre cliente e terapeuta – é dessa interação que surge o texto e de onde emerge 
a narrativa de uma vida. Assim, os autores afirmam que 
 
“o desenrolar do texto é sempre algo que acontece entre pessoas. 
Os clientes revelam a história de suas vidas em conjunto com um 
leitor/terapeuta específico e, portanto, este é sempre co-autor da 
história que está sendo contada. O texto resultante não é a história 
do cliente nem a do terapeuta, mas uma construção dos dois” (p. 
91). 
 
 
A Terapia Narrativa de Michael White 
 
“A ‘história’ é um passado que aconteceu e acontece sempre, 
porque isso que você diz não é o que aconteceu, mas o que está 
sempre acontecendo”. (Rubem Alves, 2006 referindo-se a 
Guimarães Rosa). 
 
Michael White, considerado um verdadeiro antropólogo terapêutico, é um dos mais 
consagrados terapeutas narrativos da atualidade. Trabalha no Dulwich Centre em Adelaide, 
Austrália, ministrando cursos de formação e aperfeiçoamento, desenvolvendo trabalhos em 
comunidades e viajando pelo mundo disseminando suas ideias. Sempre esteve interessado 
em ampliar sua teoria com estudos de áreas afins, como a antropologia, a critica literária, a 
filosofia, incluindo as leituras referentes à noção de poder, tema pelo qual demonstra 
interesse a partir das ideias do filósofo Michel Foucault. O resultado dessa diversidade é um 
modelo narrativo original e “acrobático”. 
 
Segundo ele, ao contarmos nossas experiências, acabamos por atribuir-lhes significados, 
deste modo, a vida deve ser vista como um relato e os seres humanos como seres 
interpretantes. O autor parte do pressuposto de que interpretamos nossas experiências 
quando vivemos nossas vidas. Esta idéia é confirmada por Alice Morgan (2007), quando 
afirma que 
 12 
“como humanos, somos seres que fazemos interpretações [...]. As 
histórias que temos a respeito de nossas vidas são criadas através 
de interligação de certos eventos numa seqüência particular através 
de um período de tempo, e do encontro de uma maneira de explicá-
las ou dar-lhes sentido. Essas formas de significado formam o 
enredo da história. Nós, constantemente, damos significados às 
nossas experiências conforme vivemos nossas vidas. Uma narrativa 
é como um fio que tece os eventos formando uma história” (p. 17). 
 
O trabalho dele foi também influenciado no início pelas idéias de Gregory Bateson (1972), 
principalmente pelos conceitos de impedimentos, descrição dupla e a explicação negativa. 
Esta descreve o desenvolvimento de uma informação como algo que se desenvolve em 
uma certa direção “ao invés” de em outras. Assim, qualquer evento, comportamento ou 
discurso pode ser considerado como um “impedimento” na medida em que, uma vez tendo 
sido selecionado, faz com que outros eventos, comportamentos e discursos passem a ser 
negligenciados. 
 
Quando o problema é visto como um impedimento, White propõe separá-lo da pessoa, o 
que permite que ela passe a compreendê-lo de forma diferente do habitual. 
 
Para o autor, os problemas não estão localizados nem na pessoa (caráter intrapessoal do 
problema), nem na família (caráter interpessoal). Eles são construídos em separado das 
pessoas e das famílias e vistos como entidades únicas que as influenciam. O efeito desta 
consideração sobre o problema é que ele saia da vida das pessoas, bem como de que elas 
se unam contra ele, ao invés de serem isoladas em categorias diagnósticas que as 
patologizam. Nessa prática, White propõe a objetivação dos problemas, que se opõe à 
objetivação das pessoas. 
 
As conversas de externalização consistem, num primeiro passo, em falarmos sobre o 
problema, sobre sua história e o efeito de separá-lo enquanto identidade independente do 
cliente. Nomeia-se o problema (em separado da pessoa), mapeiam-se os efeitos do 
problema na vida dela e vice-versa, o que permite um rastreamento da história do 
problema, colocando-o num enredo. Muitas vezes é possível identificar que os problemas 
são influenciados pelas relações mais extensas de poder (classe, gênero, identidade 
sexual, etc), fato que repercute em um aproveitamento de Michael White das ideias 
desenvolvidas por Foucault. 
 
Ao situar seu modelo narrativo em um enquadre Construcionista Social, os problemas se 
situam em contextos interacionais e culturais. Para Foucault (1987), a subjetivação é um 
processo ativo do indivíduo de se autoavaliar a partir das normas vigentes e a tentativa de 
 13 
se adequar a elas, levando as pessoas a se transformarem em corpos dóceis que atuam 
independentemente de seus próprios desejos, uma vez que estão “acopladas” a uma 
padronização cultural. A noção de poder é análoga a uma tecnologia – a técnica pela qual a 
sociedade regula seus membros, segundo Strathern (2000), ao citar as ideias de Foucault 
da década de 70. A Psicologia e as psicoterapias têm um papel relevante na reprodução da 
cultura dominante, pois, enquanto profissional, o terapeuta não pode ser cúmplice absoluto 
desta. Ao mesmo tempo em que permanece dentro de uma linguagem adotada pelo 
contexto cultural, não pode estar à margem dele, devendo explorar modos de vida e de 
pensamento alternativos. Zimmerman e Diekerson (1996) se referem às ideéias de Foucault 
sobre como o poder está nas mãos daqueles cujos discursos são adotados e estabelecidos 
como padrões de normalidade. 
 
Dentro da perspectiva da narrativa, os problemas só sobrevivem quando estão sustentados 
por ideias, crenças e princípios particulares. Morgan (2007) afirma que 
 
“os atos de violência contra as mulheres e o abuso contra elas, por 
exemplo, só podem existir se eles são sustentados por ideias de 
patriarcado e domínio masculino que servem para justificar e 
desculpar essas violências. A anorexia e a bulimia nervosa só 
podem sobreviver em culturas que valorizam a magreza,onde o 
sucesso e a competência são julgados em termos da forma do corpo 
e o tamanho, e em culturas que promovem a autovigilância e o 
individualismo” (p. 53). 
 
Em seu livro Reiscribir la Vida (2002), White comenta o seu trabalho com os veteranos da 
Guerra do Vietnã. Segundo ele, o diagnóstico “elegante” de estresse pós-traumático 
legitimava a patologização desses homens que sofriam por não conseguirem se reconciliar 
consigo próprios, não suportando conviver com a memória daquilo que viram e fizeram no 
período da Guerra. O autor se preocupa em transformar um significado particular dado 
pessoalmente pelo indivíduo em um significado culturalmente construído. Ao propor o termo 
“compaixão violada”, White “brinda” uma descrição mais próxima à experiência desses 
veteranos, uma vez que enfatiza a questão do contexto, mesmo que não deixe de implicá-
los nos fatos, porém, com este diagnóstico alternativo, ele apresenta opções para uma ação 
de índole reparatória – oferece a esses homens a possibilidade de revisarem a relação com 
eles mesmos. Além disso, o autor agrega o reconhecimento civil de que a nossa sociedade, 
cabalmente, foi cúmplice ao enviar esses homens para o Vietnã. Dessa forma, considerar 
os aspectos políticos da terapia significa, de certo modo, trazer o mundo à terapia e 
transformar em político o social (White, 2002). 
 
 14 
Essas acrobacias narrativas que Michael White realiza em suas práticas clínicas terão as 
suas construções mais claras a partir do próximo tópico, quando serão explorados os 
instrumentos terapêuticos mais importantes na sequência que devem ser abordados 
durante o processo, considerando a interdependência entre eles. Além disso, vale ressaltar 
que todos os mapas seguidos em entrevistas narrativas intencionam a transformação de 
histórias pobres em densas e ricas. 
 
 
Externalização do problema 
 
A prática narrativa de externalização do problema surgiu na década de 80 a partir de 
tratamentos com crianças e tem como pressuposto básico a idéia de que a pessoa não é o 
problema, o problema é o problema. Dessa forma, a externalização não localiza o problema 
dentro do indivíduo, mas sim o vê como produto de uma cultura e uma história, socialmente 
construídos no tempo (Russel & Carey, 2004). 
 
É uma prática que permite às pessoas se separarem dos relatos dominantes que têm dado 
forma às suas relações, retomando aspectos que há muito tempo foram ignorados de suas 
experiências e que serão essenciais para o surgimento de uma leitura que divirja daquela 
habitual e dominante. Segundo Barbara Myerhoff (1986 apud White & Epston, 1993), a 
terapia inspirada na externalização de problemas facilita a ‘re-escritura’ de vidas e relações. 
 
Para externalizar um problema, White utiliza o conceito de Bateson de “dupla descrição” ao 
inserir um método de “questionamento de influência relativa”. Neste, o terapeuta aponta 
duas descrições sobre o mesmo evento: (1) que influência o problema tem sobre a vida da 
pessoa, de seus familiares e demais relacionamentos; e (2) que influência tem a pessoa ou 
a família na narrativa do problema. É nesta segunda descrição, menos usual e mais 
criativa, que se encontra a fonte para o surgimento de uma história alternativa que fuja da 
versão saturada dominante. 
 
As perguntas de influência relativa são feitas ao cliente para que ele possa experimentar 
um mundo de flutuações, contrário àquele fixo e estático onde compreendia seus 
problemas como intrínsecos a si mesmo. Com essas perguntas, as pessoas encontram 
possibilidades novas e oportunidades de atuar com flexibilidade. 
 
Algumas intervenções terapêuticas facilitam a externalização, dentre as quais, quando se 
propõe que os adjetivos sejam substituídos por substantivos que o cliente se auto-impõe. 
Por exemplo, ao se referir como uma pessoa deprimida, o terapeuta passa a substituir este 
adjetivo usado pelo cliente por um substantivo, questionando-o “Há quanto tempo esta 
depressão está te influenciando?”. Uma outra maneira de externalizar o problema consiste 
 15 
em questionar o cliente convidando-o a personificar seu problema, criando um espaço que 
seja útil para ele revisar a relação que tem estabelecido com o mesmo. Ex: uma cliente 
psicótica com crises repentinas de alucinação visual e auditiva pode ser convidada a 
externalizar “D. Crise”. O terapeuta prossegue o tratamento entrevistando D. Crise: Em que 
momentos D. Crise lhe visita? Quem mais se incomoda com a visita de D. Crise em sua 
família? Ela mora em sua casa ou é uma hóspede temporária? Todas essas questões 
permitem que o cliente se perceba como alguém que não é, em si, o problema, mas sim, 
está com esta dificuldade e conta com o terapeuta para combatê-la. 
 
Segundo White e Epston (1993), as práticas associadas à externalização de problemas 
fomentam uma sensação nova de regência da própria vida no cliente, sensação esta que 
lhe permite assumir responsabilidade para investigar novas possibilidades e experimentar 
uma nova capacidade de intervir sobre seu mundo. 
 
 
Re-autoria 
 
“dizer algo, sobretudo dizer com beleza –ou com ternura, com 
saudade, com emoção – significa, de alguma maneira, ressuscitar 
aquilo que já não existe mais. Ou, ainda, trazer para perto o que está 
longe [...]”. (Carlos Rodrigues Brandão, 2006 p. 57). 
 
Uma das razões mais frequentes das pessoas procurarem por terapia é o fato de 
assumirem concepções negativas de si mesmas – considerarem-se inúteis, perdedoras, 
deprimidas, infelizes, ou seja, quando concluem ser uma identidade problemática. 
Os fatos que ocorrem em nossas vidas terão uma maior ou menor relevância a depender 
de como os interpretamos. Quando nos sentimos culpados de algo desagradável ocorrido e 
acreditamos que isso sempre acontece conosco, damos um amplo significado ao fato. 
Contrariamente, o mesmo evento pode passar despercebido quando acreditamos que 
estamos sendo injustiçados, pois não nos consideramos comprometidos com o mesmo. 
 
De acordo com Russel e Carey (2004), a prática de re-autoria parte do pressuposto de que 
nenhuma história trazida pelo sujeito é totalizante, no sentido de abarcar tudo que ele é ou 
representa. Desta forma, ao acreditarmos que há sempre espaço para contradições e 
inconsistências, cabe ao terapeuta ir em busca de um repertório mais amplo de histórias 
estocadas que intercedam a favor do indivíduo e da imagem saturada que ele “carrega” de 
si. As autoras consideram que somos seres multi-historiados, logo, nossa identidade não 
pode ser representada por uma única história. 
 
 16 
Para White e Epston (1993), as histórias moldam a identidade das pessoas e necessitam 
de alguns elementos para que se configurem: primeiro, um evento, segundo, que ele esteja 
organizado numa seqüência temporal e, por fim, que se desenvolva ao redor de uma trama 
ou de um tema. Quando qualquer destes elementos não está presente, não existe história. 
 
É função do terapeuta se manter em alerta frente ao discurso do cliente a tudo aquilo que 
possa contrapor a versão dominante trazida por ele, que o empobrece e o adoece. O 
elemento que distoa da versão dominante e é garimpado pelo terapeuta denomina-se 
acontecimento extraordinário. São acontecimentos que contrariam o discurso dominante, 
estão fora do território da história-problema, verdadeiros lampejos “amortecidos” que, de 
repente, com auxílio terapêutico, dão luminosidade à vida do cliente, oferecendo histórias 
alternativas que comprometem e transformam a concepção que o cliente em sofrimento tem 
de si mesmo (Russel & Carey, 2004). 
 
A partir de uma exploração detalhada de um acontecimento que, a priori, era amorfo e 
esquecido, mas que, com a investigação, torna-se “luminoso” e “significativo”, o terapeuta 
busca associá-lo a outros eventos para que, dessa união, surja uma história preferida. Se o 
acontecimento extraordinário permanecer isolado e desconectado de outros eventos, não 
permitirá que surja material consistente que possa compor histórias alternativas.Após localizar um acontecimento extraordinário e associá-lo a outros eventos que possam 
se unir ao redor de um tema, é chegada a hora de nomear a história alternativa. Depois de 
nomeá-la, a atenção se volta para espessá-la – tornar mais “densa” uma história que era 
“fina”. 
 
White (1993; 2002) estrutura a narrativa em dois cenários de acordo com Bruner (1986): o 
cenário de ação, que trata da seqüência temporal, como os temas se apresentam no 
passado, presente e futuro dentro de uma trama relacional com determinados efeitos 
morais e comportamentais; e o cenário de identidade, que consiste nas interpretações e 
significados atribuídos a estes temas – está relacionado aos meios pelos quais o cliente 
produz resultados inéditos e diz respeito às preferências, desejos, metas, intenções, valores 
e crenças das pessoas. Este último grupo pode ser considerado como um compromisso 
que se transforma em “estilo de vida”. 
 
Vale ressaltar que Jerome Bruner (1950 apud Correia, 2003), um dos maiores expoentes 
dos estudos de construção de significados, dá ênfase ao papel da cultura enquanto sistema 
fundador do pensamento, contexto a partir do qual a mente se constitui e funciona. Falar 
dele significa nos remetermos ao conceito de mente social que, segundo o autor, nada mais 
é do que considerar a mente como constituída por uma cultura que organiza e interpreta a 
 17 
vida, reconhecendo, portanto, que os seres humanos produzem significados mediados por 
uma cultura na qual estão inseridos. 
 
Para o autor (idem, ibidem), as narrativas são fontes valiosas de dados para o estudo da 
mente e seguem alguns princípios universais: (1) suas estruturas temporais não seguem os 
relógios, mas sim, as ações humanas mais importantes; (2) é fácil avançar ou retroceder no 
tempo quando se trata de narrativas; (3) as ações implicam em estados intencionais, 
crenças, desejos e valores; sendo assim, não são determinadas pelo princípio de causa e 
efeito; (4) não possuem uma única interpretação, uma vez que sempre dão margem a 
questionamentos; (5) abrem espaços à contestação, negociam-se outras versões para as 
histórias; e, por fim, (6) têm que romper com o canônico para valer a pena serem contadas. 
 
De acordo com Bruner (2001, apud Correia, 2003), “vivemos a maior parte de nossas vidas 
em um mundo que é construído e que obedece às regras e aos recursos da narrativa” (p. 
509). Além disso, a narrativa também lida com o material da ação e da intencionalidade 
humanas – considera o significado dado pelo autor aos eventos, envolvendo, inclusive, a 
negociação de significados entre os seres humanos. Daí, Bruner (1986) referir-se ao self 
transacional – um self em negociação com os outros sociais e com a cultura. Ele situa os 
significados no reino da cultura e afirma que eles encontram na linguagem o seu veículo de 
expressividade. Assim, as entrevistas terapêuticas favorecem ao terapeuta uma 
investigação e um conhecimento dos aspectos culturais que influenciam as experiências de 
vida do cliente. 
 
Russel e Carey (2002), comentando o trabalho do mestre Michael White, descrevem uma 
hierarquia a ser seguida na aplicação do mapa (entrevista-guia) de re-autoria: (1) pergunta-
se sobre intenções e propósitos, (2) valores e crenças que apoiam isso, (3) esperanças e 
sonhos que estão associados a esses valores, (4) princípios de vida que estão 
representados por essas esperanças e esses sonhos e, finalmente, (5) os compromissos ou 
significados disso na vida das pessoas. 
 
Enquanto intervenção terapêutica narrativa, a aplicação do mapa referente às 
conversações de re-autoria dividem-se nas duas categorias supracitadas: o cenário de ação 
(eventos e ações) e o cenário de identidade (convida o cliente a refletir diferentemente do 
habitual sobre sua própria identidade e as daqueles que o cerca). Quanto ao cenário de 
ação, o cliente é convidado a falar sobre o fato ocorrido, quem estava presente, o que o fez 
agir diferentemente daquela maneira, se ele já havia agido assim antes, etc. Quanto ao 
cenário de identidade, é questionado ao cliente sobre o significado dessa guinada em sua 
vida, se alguns valores estariam associados a essa guinada, que esperanças e sonhos 
poderiam estar atrelados a esses valores, que outros momentos podem ser lembrados, 
quando esses valores foram importantes para ele, se algo do passado reflete este valor, 
 18 
que conexão poderia ser feita entre esses fatos do passado e o que hoje está acontecendo 
com ele, como ele se sente ao conectar o passado a hoje, etc. 
 
Como os problemas são geralmente muito competentes em separar as pessoas umas das 
outras, é função do trabalho de re-autoria resgatar uma re-conexão a partir da lacuna que, 
até então, foi instalada para isolar os indivíduos entre si. Quando re-construímos uma 
história de re-autoria com nosso cliente, fica evidente o quanto os “outros” recuperados em 
sua existência assumem um papel vital na história de suas vidas. Além disso, é uma prática 
que não se restringe à terapia, mas, ao invés disso, se estende para outros contextos de 
vida da pessoa, uma vez que sempre se criam e se revisam as histórias de vida, incluindo 
aqueles ao nosso redor e o contexto cultural em que vivemos. 
 
A eficácia de uma história de re-autoria pode ser selada com um documento que o cliente 
leve para casa, propiciando-lhe, assim, manter-se conectado com o trabalho desenvolvido 
na sessão. 
 
 
Re-membramento e/ou Re-associação 
 
Esta prática terapêutica utilizada por Michael White é influenciada diretamente pelos 
trabalhos desenvolvidos pela antropóloga Bárbara Myerhoff, que estudou algumas 
comunidades judias do sul da Califórnia, chegando a considerar a importância do termo re-
membering (re-membrar, re-associar), cujo significado é ressaltar pessoas importantes em 
algum momento de nossas histórias de vida que permanecem “apagadas”. Ao trazê-las à 
tona, remetemo-nos ao quanto elas foram importantes na construção de nossas identidades 
e, consequentemente, influenciaram na forma como nos percebemos. Esses indivíduos que 
apresentam status diferentes em determinados momentos de nossa existência são os 
sócios ou membros do que se denomina clube da vida. 
 
O pensamento subjacente a essa prática de re-membramento baseia-se na concepção pós-
estruturalista de que nossas identidades são tecidas pelos relacionamentos que 
estabelecemos com outras pessoas. Ela proporciona um contexto para as pessoas 
revisarem e re-organizarem os sócios de seu clube da vida. É um tipo de intervenção 
terapêutica que envolve não apenas recordar histórias estocadas, mas ainda, “re-organizar” 
os membros do clube da vida, elevando-os ou rebaixando-os. Vale ressaltar que nós, 
terapeutas brasileiros, não chegamos ainda a um consenso sobre qual seria o termo mais 
apropriado para traduzir re-membering, desta forma, temporariamente me apropriarei dos 
significados supracitados. 
 
 19 
A investigação de novos sócios ou o ressurgimento de um sócio antigo, embora esquecido, 
pode facilitar a densidade de histórias alternativas que ampliam o repertório do cliente, 
favorecendo a tomada de atitude, por parte dele, de “fugir” da versão dominante-saturada. 
 
Podemos considerar que a nossa identidade é construída e “encorpada” pelos outros; como 
eles nos vêem, como nos percebemos a partir do olhar deles sobre nós, considerando, 
portanto, que somos compostos por “múltiplas vozes”. Coerente com a visão pós-
estruturalista, Gergen (1994) escreveu que nossos relacionamentos criam nossos selves, 
ao invés de nossos selves criarem nossos relacionamentos. Esta concepção difere da visão 
estruturalista de identidade, que concebe um self essencialista no interior da pessoa, 
essência de sua natureza (self individual). 
 
Existem três circunstâncias úteis para as conversações de re-membramento: (1) quando o 
cliente se refere a alguém importante de seu passado; (2) quando se refere a uma 
habilidade ou conhecimento próprio que facilite tratar seu problema do presente; (3)quando 
ele tem uma visão negativa de si mesmo e, desse modo, a conversação funciona como 
antídoto. Ao se sentirem desanimados e desesperançosos enquanto indivíduos e com a 
vida, a prática de re-membramento proporciona a ampliação ou o resgate de sócios 
significativos que promovam imagens adversas mais positivas do que aquelas saturadas 
ressaltadas pelo cliente. 
 
As perguntas de re-membramento, muitas vezes, engatilham o começo de uma história 
alternativa, pois revelam pessoas que vislumbram um novo olhar sobre o cliente. São elas: 
De que forma essa pessoa contribui em sua vida ou proporcionou diferença na sua 
existência? A maneira como essa figura importante via e agia com você mudou sua forma 
de ser e pensar sobre si mesmo? Por que será que essa figura demonstrou interesse por 
você? O que acha que você representou/significou na vida dela e que diferença você fez 
quanto à maneira dessa figura levar a vida dela? Quem, no passado, se surpreenderia 
menos ao te ouvir falar assim? O que essas pessoas testemunharam na sua vida que 
atestasse valores, compromissos que são importantes para você? Que significado teve 
para eles perceberem isso? 
 
Ainda em relação a essa prática, é relevante mencioná-la em casos de iminência de morte 
ou quando as conversações incluem pessoas que já morreram. É interessante interrogar: 
Como o cliente deseja manter viva a memória de um ente querido falecido? Como o cliente 
que está para morrer deseja ser lembrado, que legado quer deixar e para quem? 
 
Essa união de vidas através de temas compartilhados reduz a sensação de isolamento 
experimentada pelo cliente e estabelece conexões entre a história dele e as de outras 
 20 
pessoas, favorecendo uma narrativa mais rica e mais densa para as histórias alternativas. 
Este é o aspecto principal da prática de conversações de re-membramento. 
 
Em casos em que o cliente não tem sócios proeminentes no clube de suas vidas, o 
terapeuta pode resgatar personagens fictícios por quem demonstra apreço, como autores 
de livros, animais, brinquedos, etc. O objetivo de tal prática é resgatar compromissos, 
valores e pessoas significativas na vida do indivíduo. É interessante lembrar que as 
habilidades, as promessas, os valores e os propósitos de alguém não são construídos no 
vazio, mas sim, foram modelados pela história da pessoa e seus relacionamentos com os 
outros e com o mundo (Russel & Carey, 2004). 
 
Há momentos em que é necessário renegociar, rebaixar ou até, em situações extremas, 
abolir alguém de sócio do clube da vida – esta é uma situação extrema que deve ser 
cuidadosamente avaliada. Documentos e cerimônias ajudam nessa passagem. Também 
ocorrem situações em que é necessário elevar a reputação de pessoas que estavam mal 
vistas no clube da vida e proporcionar ao cliente uma restauração na identidade dele, bem 
como de qualidades até então imperceptíveis na vida do cliente. 
 
 
Testemunha Externa 
 
A prática da testemunha externa foi fortemente influenciada pelos trabalhos da antropóloga 
Bárbara Myerhoff (1982; 1986) que introduziu o termo cerimônia de definição para 
descrever o processo pelo qual as pessoas de uma comunidade efetivamente constroem 
suas identidades. Referiu-se, inicialmente, a atividades desenvolvidas em uma comunidade 
judia, de pessoas pobres e abandonadas em Los Angeles. Os seus integrantes eram 
relativamente “invisíveis” para a comunidade mais abrangente, carecendo de reflexões 
importantes sobre suas próprias vidas. Desta forma, corriam o risco de se tornar “invisíveis” 
para eles mesmos, risco este de duvidarem de sua própria existência. Foi a partir das 
cerimônias de definição que essas pessoas “combateram” essa ameaça, uma vez que as 
cerimônias passaram a ser uma “arena para se mostrarem”, dando-lhes oportunidade de 
fazer proclamações individuais e coletivas de seu ser. Como afirma a autora (1986, apud 
White, 2002), “as cerimônias de definição abordam os problemas de invisibilidade e da 
marginalidade; são estratégias que brindam cada indivíduo com oportunidades para serem 
vistos em seus próprios termos, reunindo as testemunhas de sua existência, seu mérito e 
sua vitalidade” (p. 267). 
 
Michael White transportou as ideias de cerimônia de definição e de testemunha externa 
para o campo da terapia narrativa de forma especial e cuidadosa. As testemunhas 
externas podem ser um grupo que trabalha de acordo com a prática da equipe reflexiva. 
 21 
A testemunha externa consiste em um público convidado a participar de uma conversação 
terapêutica que pode pertencer à família ou rede social do cliente, ou ainda um 
desconhecido seu que faça parte de sua comunidade. Uma outra alternativa para este tipo 
de recrutamento consiste no terapeuta recorrer a listas de pessoas por ele atendidas 
previamente que passaram pelo mesmo tipo de problema pelo qual o cliente atual está 
vivendo. Este indivíduo pode fazer parte de apenas um único encontro ou estar presente 
regularmente nas sessões terapêuticas. 
 
Quando há mais de uma testemunha externa, especialmente quando é uma equipe 
trabalhando em conjunto, os membros da equipe se ajudam mutuamente em suas 
reflexões. Por exemplo, após uma testemunha externa ter falado, outra pode fazer algumas 
perguntas sobre o que ela/ele terminou de dizer, a fim de que o processo fique mais 
significativo. Enquanto a testemunha externa estiver falando no meio do grupo, o cliente fica 
ouvindo. Ter alguém testemunhando a conversação terapêutica pode ser muito significativo, 
especialmente se a testemunha externa ouvir e responder de maneira clara (Russel & 
Carey, 2004). 
 
Por muito tempo a prática da testemunha externa privilegiou o aspecto da curiosidade. 
Hoje, são priorizadas as metáforas de validação e a ressonância. Quando o cliente tem 
oportunidade de ouvir o relato da testemunha externa que, de alguma maneira se conecta 
com o que ele está passando, é possível fazer uma conexão entre essas duas vidas, 
remetendo-se aos temas e valores que estão sendo compartilhados. 
 
 
Considerações Finais 
 
Sem sombra de dúvida, a prática narrativa de Michael White consiste em movimentos 
“acrobáticos” que revelam originalidade, equilíbrio, ousadia e domínio de intervenções 
terapêuticas pautadas no poder generativo da linguagem. 
 
Situado no domínio linguístico novo-paradigmático, este mestre brinda na cena terapêutica 
conceitos advindos das mais distintas áreas de conhecimento – a antropologia, a filosofia, a 
teoria literária, etc. 
 
Ao fazer uma analogia entre a lacuna existente entre a proposta do autor, a expressão do 
texto e a conduta do intérprete, White compõe a construção de um processo terapêutico de 
mão dupla, de histórias alternativas que ampliem o repertório obtuso exposto pelo cliente 
em sua versão dominante e saturada do problema. Uma vez limitado em sua “miopia”, o 
terapeuta ressurge como interlocutor que ilumina a “estrada” obscura, promovendo o 
encontro do cliente com seu repertório de acontecimentos extraordinários, reposicionando-o 
 22 
em suas competências. Estes são “tesouros” recuperados que funcionam como 
ferramentas para a batalha atual, batalha esta travada contra o problema, a partir da aliança 
estabelecida entre o cliente e seu terapeuta (externalização do problema). São as 
conversações de re-autoria que propiciam esta garimpagem preciosa, associada às figuras 
significativas (clube da vida) que compõem e influenciam a construção identitária da pessoa 
do cliente. Nesse re-membramento, alguns convidados, externos ou internos à vida dele 
participam de sua terapia na condição de testemunhas externas, revelando experiências 
semelhantes e já mais elaboradas ou até superadas com relação àquelas expostas pelo 
cliente. Esse “comércio” emotivo favorece a percepção de que não estamos sozinhos em 
nossos dilemas e, assim como essas testemunhas, merecemos perceber as vantagens de 
cometermos acrobacias que disseminem um novo colorido em nossas vidas. 
 
 
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Obs: Este artigo foi publicado originalmente na Revista Pensando Famílias, 11(2), dez. 
2007; (141-164).

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