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Talassemias • Grupo heterogêneo de afecções genéticas da síntese de hemoglobina- redução na produção de uma ou mais cadeias polipeptídicas de globina – (desenvolvimento de anemia microcítica e hipocromia); • Classificação: alfa, beta, delta, delta beta e gama delta beta; • Talassemia (anemia de Cooley): anemia altamente incidente na região do mar mediterrâneo, que havia sido descrita por Cooley e Lee, em 1925, em crianças descendentes de italianos, gregos e sírios; Características observadas por Cooley: anemia hemolítica grave com aumento no volume do fígado e baço, alterações ósseas, resistência osmótica dos eritrócitos aumentada e leucocitose; • Estima-se em 270 milhões de portadores, dos quais 80 milhões possuem mutações para a beta talassemia; • No Brasil: tanto a alfa quanto a beta talassemia tem alta incidência; • Definida laboratorialmente por: estudos hematológicos, eletroforese de hemoglobina, quantificação de hemoglobinas A2 e fetal; • Combinações entre genes talassêmicos com Hb S, produzem grande diversidade clínica dessa doença genética, com variações que causam desde a morte fetal intraútero até situações assintomáticas; • Obedece ao modelo de herança Mendeliana, caracterizado pela falta de sintomas clínicos nos heterozigotos e gravidade clínica nos homozigotos; • Clinicamente talassemias podem ser classificadas: maior, intermédia, menor e mínima; Beta talassemia • As beta talassemias resultam na diminuição das cadeias de globina beta; • O gene beta – responsável pela síntese da globina beta, está localizado no braço curto do cromossomo 11 (11p15.4); • Nas beta talassemias, o excesso de cadeias alfa pode combinar-se com cadeias delta e gama, contribuindo para o aumento das hemoglobinas A2 e fetal; • A porcentagem de Hb A2 apresenta-se elevada em cerca de 95% dos casos de beta talassemia. Talassemia Alfa • Descrita pela primeira vez nos Estados Unidos e na Grécia uma nova hemoglobina rápida que denominaram de Hb H, com características instáveis, formando corpúsculos de inclusões nos eritrócitos e visualizados quando submetida à incubação com corantes vitais; • A Hb H tem afinidade ao oxigênio 10 vezes maior do que a Hb A; • Os portadores da doença de Hb H, apresentavam anemia significativa, hipocromia, microcitose e poiquilocitose, diminuição da fragilidade osmótica (“cabe mais água dentro o eritrócito”), reticulocitose e presença de Hb H nos eritrócitos e em eletroforese; • Desequilíbrio entre as sínteses de globina alfa e beta, a globina beta continua sendo sintetizada normalmente e, por isso, a “sobra” de globinas beta livres se juntam para formarem tetrâmeros de globinas beta, resultando a Hb H; • Quanto maior a queda de síntese de globina alfa, maior será também a concentração de Hb H; • As talassemias alfa podem ter duas causas de origem: hereditária e adquirida: Formas hereditárias: são as mais comuns e atingem, pelo menos, 20% da população brasileira dos quais 17% são assintomáticos e com valores hematimétricos (Hb, Ht, VCM e HCM) normais; 3% tem discretos graus de anemia microcítica e homocrômica; e 1:5.000 pessoas é portadora da doença de Hb H; Formas adquiridas: são secundárias a um processo patológico primário, por exemplo: doenças linfo e mieloproliferativas, anemia sideroblástica (acúmulo de ferro nos eritroblastos – bloqueio na inserção de ferro na Hb), entre outras. • Classificação: são diferenciadas e classificadas de acordo com o número de genes alfa lesados; • Pessoa sem talassemia alfa: com seus quatro genes alfa funcionantes (a ,a /a ,a ), sendo dois genes alfa de um cromossomo 16 e dois do outro cromossomo 16, provenientes um do pai e outro da mãe; • A lesão que acomete o gene alfa é denominada por deleção, que tem o significado científico de destruído ou eliminado; • Essas deleções podem atingir parte do gene alfa, diminuindo a sua síntese de globina alfa, e é por isso representado por a + ; • Deleção atinge integralmente o gene alfa, bloqueando totalmente a síntese de globina alfa, representa-se pôr a 0 . • Síndromes alfa talassêmicas são classificadas em: portador “silencioso” (ou talassemia alfa mínima), traço alfa talassêmico (ou talassemia alfa menor), doença de Hb H (ou talassemia alfa intermédia) e hidropisia fetal; • Portador “silencioso”: é o tipo mais comum entre as talassemias alfa e se deve à deleção de apenas um gene alfa (-, a /a ,a ). O portador é assintomático, e embora o volume corpuscular médio (VCM) se apresente como discretamente microcítico (VCM < 80), a morfologia eritrocitária é geralmente normal com microcitose em algumas células; • O diagnóstico laboratorial do portador silencioso de talassemia alfa requer uma série de informações: discreta microcitose, com valores de Hb (g/dL) próximo do limite inferior da normalidade, não-responsiva ao tratamento com ferro, história familiar, e identificação da Hb H em pelo menos um dos testes: eletroforese ou pesquisa citológica; • Traço alfa talassêmico: se deve à deleção de dois genes alfa (-,- /a ,a ) ou (-,a /-,a ). Os portadores, apesar de serem normais sob o ponto de vista clínico, reclamam de fraqueza, cansaço, dores nas pernas e palidez; • Apresentam microcitose com alterações da morfologia eritrocitária e discreto grau de anemia (Hb: 11 a 13g/dL, VCM e HCM diminuídos); • A análise eletroforética: Hb H com concentrações próximas de 2%. Doença de Hb H • Causada pela deleção de três genes alfa (-,-/-,a ); • Forma moderadamente grave de talassemia, caracterizada por anemia microcítica e hipocrômica, hemoglobina total variável entre 8 e 11g/dL, aumento do baço e do fígado, e em alguns casos observa-se deformidades similares às que ocorrem na talassemia beta intermédia; • A Hb H intra-eritrocitária é facilmente identificada pela sua presença em vários eritrócitos em um mesmo campo microscópico; • A doença de Hb H é rara no Brasil; Precipitados intra-eritrocitários de Hb H em sangue de portador do traço alfa talassêmico Hidropisia Fetal • Forma mais grave de todos os tipos de talassemias (alfa e beta), pois é uma forma letal; • É uma situação comum no Extremo Asiático, sendo, entretanto, esporádica no Brasil; • As crianças recém-nascidas afetadas pela deleção dos quatro genes alfa (-,-/-,-) apresentam anemia muito grave, com hemoglobina inferior a 7g/dL, eritroblastose fetal, edema, grande aumento do baço e do fígado, e morte com poucas horas após o nascimento; • Eletroforeticamente, a concentração de Hb Bart’s, está entre 80 e 100%, e a Hb H entre 10 e 20%; • é importante destacar que as hemoglobinas H e Bart’s apresentam alta afinidade pelo oxigênio, tornando sua liberação para as células e tecidos muito lenta e dificultosa, e como resultado causa anoxia tecidual; • Esse processo é mais grave e proporcional ao número de genes alfa afetados; • Os graus de hemólise e de anemia também estão na dependência da quantidade de Hb H precipitada nos eritrócitos. Talassemia Alfa -Adquirida • São de causas não-genéticas: geralmente se expressam como se fossem doenças de Hb H; • Associação com doenças hematológicas: eritroleucemia, doenças linfo e mieloproliferativas crônicas e agudas, e anemia sideroblástica; • Apresentam pontos comuns: corpos de Hb H intra-eritrocitários, concentrações de Hb H por eletroforese variável entre 10 e 60% e redução da síntese de globina alfa; • Um segundo tipo de talassemias alfa adquiridas está associado ao retardo mental. Talassemia Beta • Talassemias beta são mais heterogêneas do que as do tipo alfa; • Caracterizam-se por uma alteração quantitativa da síntese de globinas beta e são classificadas como talassemias beta zero (ou talassemia b 0 ) quando não há síntese de globinas, e talassemias beta mais (ou talassemia b + ) quando há alguma taxa de síntese; • Consequentemente as globinas alfa, que são sintetizadas normalmente, acumulam-se nos eritrócitos, durante a eritropoiese, causando agregação e precipitação;• Os precipitados, formados em quantidades variáveis, danificam a membrana e destroem prematuramente essas células provocando a anemia; Lesões nas membranas de eritrócitos de pessoa com talassemia beta causadas Fisiopatologia • Relacionado com o desequilíbrio que se verifica entre as sínteses de globina alfa e beta; • O excesso de globinas alfa livres se instabiliza e se precipita sob forma de corpos de inclusão nos eritroblastos; • Na medula óssea: formam os radicais oxidantes ou radicais livres; • Torna o eritrócito rígido, sem o poder natural da deformabilidade, e como consequência dificulta sua saída da medula óssea para o sangue periférico; • Eritropoiese ineficaz: situação de anemia e aumento da absorção do ferro. • Eritrócitos com os corpos de inclusões: sequestro dessas células durante a circulação nos sinusóides esplênicos – causa a anemia hemolítica, com aumento da concentração da bilirrubina indireta e da esplenomegalia; • A esplenomegalia aumenta a destruição das células do sangue, gerando a leucopenia (infecções) e a plaquetopenia (epistaxes); Anemia grave com anoxia, cardiopatias que são importantes causas de óbito na talassemia maior, hipermetabolismo com emagrecimento, febre, aumento do nível de ácido úrico e gota, e a necessidade de transfusões repetidas de sangue; • As transfusões causam o acúmulo de ferro e da ferritina, podendo ocorrer hepatopatias graves por hepatite transfusional, além de doenças transmissíveis em transfusões, notadamente a AIDS e hepatite C, e esporadicamente doença de Chagas e Sífilis; • A anoxia tem efeitos maléficos ao organismo, predispondo-o às infecções, ao aparecimento de úlceras nas pernas e à interferência na secreção de eritropoietina que promove a hiperplasia eritróide. Transplante de medula óssea • Já foram transplantados mais de 1600 pacientes com talassemia maior (maioria dos casos este tratamento tem sido realizado em pacientes com menos de 17 anos de idade, sendo que a idade ideal para a realização deste procedimento situa-se entre os 18 meses e 3 anos; • Único tipo de tratamento capaz de curar pacientes com talassemia maior; • Disponibilidade de doador: apenas 30% das crianças com talassemia maior apresenta um doador aparentado (irmão ou irmã) HLA-compatível; • Toxicidade e complicações associadas ao TMO: infecções, doença do enxerto contra hospedeiro (aguda e crônica), tempo de aplasia prolongado, sangramentos, disfunções endócrinas, risco de neoplasia secundária etc.; • Mortalidade associada ao procedimento de 7 a 15% nos centros mais experientes, incluindo pacientes de alto e baixo risco; • Melhora do tratamento de suporte: tratamento transfusional mais seguro e eficaz, novos quelantes com posologia cômoda, aumento considerável da sobrevida com tratamento conservador etc. Momentos cruciais do acompanhamento dos talassêmicos 1. Confirmação do diagnóstico; 2. Início do tratamento transfusional; 3. Início da terapia quelante; 4. Decisões quanto ao tipo e dose do tratamento quelante; 5. Problemas de adesão ao tratamento quelante; 6. Revisão anual clínica e laboratorial do paciente com talassemia; 7. Discussões acerca de decisões potencialmente complexas: indicação de esplenectomia e cirurgias de grande porte; ação diante de problemas e disfunções endócrinas, ortopédicas, cardíacas, hepáticas e de fertilidade; indicação de transplante de medula óssea; problemas psicossociais complexos. Clínica e Tratamento • Na beta talassemia: responsável desenvolvimento da anemia é a eritropoiese ineficaz com hemólise intramedular dos precursores eritroides 1) Talassemia menor ou minor (Traço talassêmico): • Observada nos indivíduos heterozigotos, em geral não causa complicações clínicas ou sintomas evidentes. Alguns indivíduos podem apresentar sinais de cansaço ou fraqueza quando submetidos a esforço prolongado ou atividade física; • No hemograma desses pacientes, os valores de hemoglobina estão geralmente normais ou discretamente diminuídos, embora haja microcitose, hipocromia e poiquilocitose evidentes no esfregaço sanguíneo; • Não há necessidade de tratamento específico para a talassemia menor. → Herança: heterozigoto → Valor basal da hemoglobina: 9,5-10g/dL → Sintomas: ausentes ou de leve intensidade → Transfusões: não são necessárias 2) Talassemia intermediária: • Indivíduos que apresentam quadro clínico intermediário entre as formas leves (talassemia menor) e graves (talassemia maior) da talassemia; • Nota-se grande variabilidade de sintomas e complicações nesses pacientes; • Os pacientes portadores dessa condição apresentam valores de hemoglobina entre 7 e 9g/dL, sensação de fraqueza e cansaço mais freqüente e necessidade de transfusões intermitentes (principalmente em caso de cirurgias e intensificação da anemia por outros motivos). • O tratamento consiste em suplementação com ácido fólico, monitorização cuidadosa da intensidade da anemia e possíveis complicações como a sobrecarga de ferro, osteopatia, déficit de crescimento, entre outras. → Herança: homozigoto ou heterozigoto → Valor basal da hemoglobina: 7-9g/dL → Sintomas: presentes e de moderada intensidade → Transfusões: ocasionais 3) Talassemia maior ou major • Trata-se da forma mais grave de beta talassemia; • Os indivíduos afetados dependem de transfusões de sangue regulares para sobreviverem; • Primeiros sintomas costumam surgir após o sexto mês de vida, quando a quantidade de hemoglobina fetal diminui substancialmente e a síntese de hemoglobina A1 não ocorre devido à falta de produção de cadeias beta. Repercussões da anemia crônica • Nos pacientes que não recebem tratamento transfusional adequado, a anemia intensa e persistente desde a infância pode acarretar complicações importantes como: palidez de pele e mucosas, além de icterícia; retardo no crescimento; estado hiper metabólico resultando em massa muscular deficiente, redução da gordura corporal, febre recorrente, falta de apetite e letargia; cardiopatia decorrente da intensificação do trabalho cardíaco para compensar o estado anêmico crônico; hepatoesplenomegalia; hiperplasia de medula óssea acarretando mal formações e deformidades ósseas como, por exemplo, o aumento do osso maxilar com exposição dos dentes da arcada superior e a proeminência malar causando o “achatamento” do nariz; • O aspecto radiológico do crânio, ossos longos e mãos, demonstra que a hiperplasia medular no interior dos ossos causa também o achatamento da camada cortical deles, tornando-os mais frágeis e susceptíveis a lesões e fraturas; • Aumento da absorção de ferro pelo trato gastrointestinal, por meio de um mecanismo compensatório equivocado deflagrado pela hiperplasia medular e pela anemia. → Herança: homozigoto → Valor basal da hemoglobina: <7g/dL → Sintomas: presentes e de intensidade acentuada → Transfusões: regulares → Sobrecarga de ferro: inevitável • O tratamento “standard” dos pacientes portadores de talassemia maior consiste basicamente em transfusões de sangue regulares a cada 3 ou 4 semanas, associadas ao uso dos quelantes de ferro (medicações que retiram o excesso de ferro acumulado por conta das transfusões de sangue); • Há algumas décadas, a maioria dos pacientes com talassemia maior não sobrevivia além dos 20 ou 30 anos de idade; • Com o modelo terapêutico atual, adotado na maioria dos centros especializados, é possível aumentar consideravelmente a expectativa de vida em boa parte dos pacientes, inclusive para próximo do normal; A melhora na expectativa de vida dos pacientes trouxe novos desafios terapêuticos: a avaliação da fertilidade em pacientes adultos que planejam ter filhos ou mulheres que passarão por gestação, bem como a presença de outras comorbidades típicas de idade avançada, como hipertensão arterial, diabetes, DPOC, câncer etc.
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