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1 Última atualização: 05/08/2021 1. Introdução grupo heterogêneo de doenças hereditárias caracte- rizadas por redução ou ausência de síntese de uma ou mais ca- deias globínicas das moléculas de hemoglobina. O resultado des- sas alterações moleculares ocasiona desequilíbrio na produção das cadeias de globina provocando eritropoiese ineficaz. As talassemias possuem grande variedade de manifestações clínicas e laboratoriais, conforme a cadeia afetada. As mais fre- quentes são as talassemias do tipo alfa e tipo beta. Os pacientes com talassemia beta têm diminuição de produção de cadeias beta com relação à produção de cadeias alfa, acontecendo o in- verso nos casos de talassemia alfa. 2. Epidemiologia Hemoglobinopatia prevalente nos países banhados pelo Mar Mediterrâneo. A maior prevalência de talassemia α ocorre no Su- deste da Ásia e entre as populações originárias da costa oeste da África. As talassemias β predominam numa ampla região que in- clui bacia do Mediterrâneo, Oriente Médio, Índia e Sudeste da Ásia. No Brasil, a doença predomina entre descendentes de italianos, gregos e africanos. 3. Classificação As talassemias podem ser classificadas de forma clínica, ge- nética e molecular. A classificação clínica é a mais adotada e se divide de acordo com a gravidade. Major ou maior: forma grave dependente de transfusão; Minor ou menor: assintomáticas e possuem o traço talassê- mico; Intermedia: apresenta maior variabilidade clínica; Portadores silenciosos: possuem o gene talassêmico, porém com parâmetros clínicos e hematológicos normais. A molécula de hemoglobina (Hb) é composta por 4 cadeias globínica e 4 grupos heme. No início do desenvolvimento intraute- rino, as Hb embrionárias são substituídas pela Hb fetal (HbF) e pos- teriormente pela HbA, após o nascimento. As Hb normais são constituídas por um par de cadeias alfa, combinadas com um par de cadeias não alfa. → HbA (constituída por 2 cadeias alfa e 2 cadeias beta); → HbA2 (constituída por 2 cadeias alfa e 2 cadeias delta); → HbF (constituída por 2 cadeias alfa e 2 cadeias gama). As talassemias α são classificadas em dois grupos: talasse- mias α0 e talassemias α+. A talassemia α0 pode ser resultado da deleção de dois genes alfa (alfa1 e alfa2). A talassemia α+ resulta de um único gene inativado por deleção, sendo menos frequente essa forma. As talassemias β também são divididas em dois grupos: ta- lassemia β0 e talassemia β+. Diferentemente das alfa-talassemias, as beta-talassemias raramente são ocasionadas por deleção gê- nica e sim por mutações que podem afetar as funções do gene beta. Nas talassemias β0, não há produção de cadeia beta globí- nica. Já nas talassemias β+, existe produção, porém em níveis re- duzidos. 4. Fisiopatologia A deficiência de síntese de uma ou mais cadeias globínicas tem duas consequências: desequilíbrio de produção entre as ca- deias alfa e não alfa e síntese diminuída de hemoglobina. A gravi- dade da anemia é determinada pelo grau de desequilíbrio da sín- tese de cadeias globínicas. • há redução de cadeias α em relação as cadeias beta na vida fetal, consequentemente, ocorre que as cadeias β livres se agrupam em tetrâmeros (beta4). A hemo- globina constituída por este tetrâmero é denominada hemo- globina H (HbH), é instável e se precipita formando corpos de inclusão. Esses corpos de inclusão são removidos pelo sistema reticulo endotelial (SRE) resultando em anemia. Na fase intrauterina, as cadeias que sobram são as ca- deias gama que se agrupam formando tetrâmeros gama4 ou Hb Bart’s. As Hb Bart’s e HbH são ineficientes no transporte de oxigênio, por isso precipitam dentro do eritrócito, cau- sando a destruição precoce da célula dentro da medula (eri- tropoiese ineficiente). • ocorre diminuição da produção de ca- deias β, o que acarreta um excesso de cadeias α. As cadeias α são insolúveis e precipitam nos precursores eritrocitários, acarretando a maturação defeituosa e destruição celular, principalmente intramedular. As células anormais que não são destruídas na medula óssea e caem no sangue periférico são removidas rapidamente pelo baço e pelo fígado. O baço aumenta gradativamente e exacerba a anemia pela hemodi- luição. A anemia grave resultante desse processo estimula a produção de eritropoetina, causando expansão da medula óssea e hematopoese extramedular. Essa expansão leva a anormalidades esqueléticas e alterações metabólicas diver- sas. A hematopoese acelerada induz sinalização para au- mentar a absorção de ferro no nível intestinal. A ferroportina e a hepcidina são proteínas críticas na regulação dos meca- nismos de absorção e movimentação do ferro pelo orga- nismo. Esse processo, associado a sobrecarga de ferro iatro- gênica, secundária ao tratamento transfusional ao longo da vida, leva à hemocromatose tecidual e suas complicações. 5. Quadro Clínico, Diagnóstico e Tratamento – TALASSEMIA ALFA – Pouco diagnosticadas na prática clínica, pois necessitam de diagnóstico molecular, o qual é pouco disponível nos serviços de saúde. Inclui quatro apresentações clínicas, conforme a alte- ração genética apresentada no cromossomo 16: • resulta da ausência dos 4 genes alfa, é a mais devastadora de todas as talassemias. Como o feto não produz cadeias alfa, sua hemoglobina con- siste quase completamente de Hb Bart’s (gama4). O paciente apresenta prematuridade, palidez e edema, em geral, o neo- mato morre após o nascimento. O diagnóstico pode ser feito técnicas de análise do DNA em células do líquido amniótico. • ocorre grande variação da gravidade da doença, presença de anemia, esplenomegalia e alterações ósseas. A anemia é hipocrômica e microcítica, com variação da Hb entre 7 e 10 g/dL. A HbH pode ser identificada por ele- troforese ou pela coloração supravital de sangue com azul brilhante de cresil. Em geral, não há necessidade de tratamento, sendo aconselhável orientar sobre evitar o uso de drogas oxidantes pelo risco de crise hemolítica. Em alguns casos, podem ser ne- cessárias transfusões sanguíneas e a esplenectomia está in- dicada em casos de hiperesplenismo. • condição benigna caracteri- zada por quadro clínico assintomático, com níveis de hemo- globina normais ou discretamente reduzidos. A anemia, quando presente, é hipocrômica e microcítica. O diagnóstico 2 Última atualização: 05/08/2021 é difícil e circunstancial. Não há necessidade de tratamento, sendo indicado acompanhamento ambulatorial regular. • a deleção de um único gene alfa não causa anormalidades clínicas ou hematológicas, sendo detectada apenas pela demonstração da alteração gênica em análise de DNA. As deleções de um ou de 2 genes são as- sintomáticas e não requerem tratamento. – TALASSEMIA BETA – O quadro clínico das beta-talassemias reflete o efeito quanti- tativo da mutação presente em cada caso sobre a síntese da be- taglobina. A talassemia beta abrange três apresentações clínicas, conforme a alteração genética ocorrida no cromossomo 11: • forma mais grave de talassemia beta. Ocorre retardo de crescimento, anemia grave e esple- nomegalia, com eventual hiperesplenismo, osteoporose e ou- tras alterações esqueléticas associadas à expansão da me- dula óssea e à sobrecarga de ferro decorrente da combinação de aumento da absorção intestinal e transfusões de sangue. O fígado, o coração, o pâncreas, a hipófise e outras glândulas endócrinas são os principais locais de deposição excessiva de ferro, a qual causa lesão progressiva e insuficiência desses ór- gãos. O quadro clínico típico só ocorre, atualmente, na cri- ança tratada de forma inadequada. O hemograma inicial mostra anemia microcítica e, inten- samente, hipocrômica, com numerosos eritroblastos circu- lantes. Homozigotos para beta0 apresentam HbA2 e HbF, com ausência de HbA. O tratamentobaseia-se em transfusão sanguínea para manter níveis de Hb superiores a 10 g/dL, acompanhado de efeitos favoráveis sobre o crescimento e a atividade física, re- dução da hiperplasia da medula óssea e, como consequência, redução ou ausência de deformidades ósseas e de espleno- megalia. Controlar a sobrecarga de ferro com terapia que- lante. Em alguns casos há posição do transplante de medula óssea com propósito curativo. • caracteriza-se por anemia hemolítica de gravidade variável que não requer transfusões crônicas. Possui amplo espectro de manifestações que va- riam desde uma condição próxima à da talassemia major até uma doença com poucos sintomas. As manifestações clínicas predominantes são esplenomegalia, redução da massa mus- cular, úlceras crônicas nas pernas e alterações faciais. O cres- cimento de grandes massas de tecido hematopoiético extra- medular pode causar sintomas compressivos como massas paravertebrais intratorácicas. A concentração de Hb varia, geralmente, de 6 a 9 g/dL, com as características morfológi- cas típicas das talassemias. A composição de hemoglobinas é variável, com aumento de HbA2 e quantidades de HbF que dependem do grau de deficiência de síntese causada pela mutação presente em cada caso. Não requer tratamento transfusional, exceto, em circuns- tâncias especiais. Hiperesplenismo é frequente, causando de- pendência transfusional que é, geralmente, revertida pela es- plenectomia. O tratamento com hidroxiureia pode aumentar a HbF e ser benéfico em alguns casos. • quadro mais comum na prática clínica, também recebe o nome de traço beta-talassêmico. Apresenta-se assintomática, associada a alterações na mor- fologia dos eritrócitos com pequena ou nenhuma anemia hi- pocrômica e microcítica (Hb em torno de 10 g/dL). O diagnós- tico é ocasional em exames de rotina, sendo o principal diag- nóstico diferencial é a anemia ferropenêmica. Não requer tra- tamento.
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