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COMUNICAÇÃO E PSICOLOGIA Gabriela Felten da Maia Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever funções psicológicas. Explicar o processo de comunicação de massa. Analisar os efeitos da comunicação de massa nos processos psicológicos. Introdução A sociedade contemporânea emerge enquanto sociedade de comunica- ção, aspecto que produz profundas transformações sociais e culturais que merecem compreensão em uma reflexão sobre a forma como os sujeitos são constituídos nesse contexto. O advento de diferentes meios técnicos de comunicação de massa proporcionou novas formas de interação, bem como de relação dos sujeitos consigo mesmos e com os outros. Neste capítulo, você vai ver o que são funções psicológicas e como elas se relacionam com a produção dos sujeitos a partir da mediação so- cial. Além disso, vai ver uma reflexão sobre os processos de comunicação de massa para articular a produção das subjetividades em um contexto de sociedade de comunicação. 1 Funções psicológicas As funções psicológicas superiores, funções mentais que caracterizam o comportamento consciente dos seres humanos, como atenção, percepção, memória, sensações, unidades funcionais, pensamento e linguagem, são entendidas como superiores porque se diferenciam dos mecanismos mais elementares de ordem biológica, como os refl exos e processos automáticos. O desenvolvimento dessas funções não é dado a priori nem é universal, já que o cérebro é compreendido como um sistema aberto, com plasticidade para ser moldado ao longo do processo histórico e desenvolvimento individual. Essa perspectiva de compreensão das funções psicológicas é herdeira da reflexão vyigotskiana, conforme Tosta (2012), que as considera constituídas ao longo da história social, na medida em que os indivíduos se constituem a partir das condições concretas da vida, isto é, nas relações sociais, para que ultrapassem a condição de natureza. Os indivíduos, então, entendidos como constantemente em processo de construção, necessitam da interação para a sua humanização e para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, consideradas eminentemente humanas. Lev Semenovich Vygotsky foi um psicólogo bielo-russo que desenvolveu importantes contribuições para a psicologia infantil e para a teoria da aprendizagem. Foi contempo- râneo de Jean Piaget, embora ambos tenham vivido em contextos sociais e políticos diferenciados; justamente por isso, suas obras respondem às condições sociais em que estiveram inseridos. Vygotsky procurou elaborar uma psicologia que desse conta de refletir a problemática social e econômica que vivia a União Soviética na época, depois da Revolução Comunista, em 1917. Por isso, aproxima-se da abordagem de Marx em relação ao materialismo histórico para discutir que o psicológico é constituído a partir das condições concretas da vida. Assim, é uma abordagem materialista que leva em conta a discussão marxiana de que os seres humanos, ao transformarem a natureza, transformam a si mesmos. Essa perspectiva influenciará a discussão sobre as funções psicológicas superiores (VIGOTSKY, 2007). A natureza humana, destaca Tosta (2012), é social porque é na interação, mediada por instrumentos de trabalho e linguagem, que se desenvolve. As funções cognitivas emergem a partir da ação humana sobre o mundo. Mediadas pela cultura e pela linguagem, essas funções são resultado da articulação dos signos e do trabalho humano sobre a natureza para sua transformação do mundo externo, ou seja, diante das interações sociais e da mediação semiótica. Devem ser entendidas, portanto, como processos sociais mediatizados semioticamente. Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa2 A linguagem tem um papel importante porque, por meio da atividade co- letiva, surge a necessidade de se transmitir informações, analisar e classificar os objetos com os quais se lida. Trata-se da apropriação histórico-social das experiências dos sujeitos que possibilita a transmissão do conhecimento e de habilidades desenvolvidas ao longo da história da humanidade. A relação com outros é essencial para que seja possível o desenvolvimento do psiquismo, bem como da sociedade. Há, aqui, uma compreensão ativa da cons- tituição dos sujeitos, na medida em que as forças sociais e políticas regulam as relações sociais, mas propiciam as condições para o desenvolvimento individual. Nesse sentido, com a interação entre o inter e o intrapsicológico, a mediação se torna uma chave para a compreensão da constituição das funções psicológicas, dado que a relação entre o intrapsicológico e o interpsicológico é uma relação mediada por sistemas simbólicos, conectando o indivíduo à sociedade. Aqui se tem a transformação do ser humano em um ser biológico para um ser social e histórico — um processo em que a cultura é essencial para sua constituição (TOSTA, 2012). Discussões antropológicas sobre a socialização e o desenvolvimento dos seres humanos, desde a década de 1930, já apresentavam leituras importantes às abordagens desenvolvimentistas da psicologia, destacando que muitas dessas abordagens seguiram o modelo das sociedades ocidentais para pensar a aquisição de funções psicológicas. Essas abordagens procuraram introduzir a importância de relativizar esse processo, considerando os contextos culturais como impor- tantes fatores para influenciar o desenvolvimento de determinadas habilidades, modos de expressão de emoções, gestos, comportamentos e pensamentos. Marcel Mauss foi um reconhecido antropólogo francês que, na década de 1930, desen- volveu um acalorado debate com Jean Piaget a respeito da teoria da aprendizagem deste autor, a epistemologia genética. Esse debate gerou uma breve apresentação intitulada Três observações sobre a sociologia da infância. Trata-se de uma conferência apresentada em 1937 ao Congresso de Sociologia da Infância em que são apresentadas críticas importantes, considerando a sua perspectiva de estudo dos fatos sociais como totais, isto é, as sociedades se apresentam em sua dimensão política, econômica, cultural, fisiológica e psicológica. Por isso, compreender os indivíduos e a constituição do eu, entende o antropólogo, implicaria levar em conta todas essas dimensões no processo de socialização (MAUSS, 2010). 3Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa A cultura, segundo Tosta (2012), influencia o desenvolvimento e o funciona- mento das funções psicológicas porque, em um determinado contexto social, os modos de organização da vida e as práticas sociais constituem as possibilidades do desenvolvimento. Se as funções psicológicas não estão presentes desde o nascimento, precisa-se da cultura para que se configure o aprendizado para a transformação das funções elementares em funções superiores. 2 Processo de comunicação de massa Comunicação de massa é um fenômeno que acompanha o desenvolvimento tecnológico e que possibilitou a implementação da cultura de massa na sociedade contemporânea. Com efeito, esse processo produz transformações nas formas de interação entre as pessoas, agora mediadas pelas mídias, possibilitando que haja um interlocutor em uma esfera pública a partir de uma mediação que publiciza eventos e ações para aqueles que não estavam presentes (THOMPSON, 2008). Thompson (2008) destaca que o advento da comunicação de massa proporciona uma interação mediada, em que há um processo comunicativo monológico e de sentido unilateral que cria uma situação que conecta indivíduos por meio de trocas simbólicas produzidas pelas mídias. No processo de comunicação de massa, se- gundo o autor, os fluxos comunicacionais são em sentido hierárquico e unilateral porque são conteúdos produzidos por um grupo de indivíduos, detentores dos meios de comunicação, e transmitidos a outros indivíduos, os receptores encontrados em contextos diferentes daqueleonde foi realizada a produção. Se, como destaca Mancebo (2002), a comunicação de massa em sua gênese pressupunha um viés democratizante, no contexto do desenvolvimento capita- lista, tem sido discutida a relação entre a produção de bens simbólicos com o mercado que possibilita a sua transmissão. Por isso, entre as abordagens sobre os processos de comunicação de massa, a autora delineia uma aproximação entre indústria cultural e comunicação de massa. Essa perspectiva enfatiza o caráter de doutrinação político-ideológica da indústria cultural e a manutenção do status quo em uma economia baseada no consumo, de tal modo que desvalorizaria produtos culturais pelo processo de massificação e homogeneização com o objetivo de obtenção de lucros. Os indivíduos seriam capturados nesse processo mercadológico dos bens culturais, reduzindo, desse modo, a capacidade crítica e reflexiva. A discussão acompa- nha os efeitos do fordismo e da produção em massa para compreender que a produção capitalista necessitava de novos mercados de consumo e, com isso, da “educação” das massas para o consumo dos produtos (MANCEBO, 2002). Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa4 Thompson (2008), por outro lado, opõe-se a uma perspectiva presente nessa escola porque compreende que os indivíduos não estão passivos e indiferenciados, recebendo conteúdos produzidos em uma lógica capitalista para o consumo. O desenvolvimento da indústria da mídia é efeito das diversas organizações que, desde a Idade Média, têm explorado comercialmente os meios técnicos para a produção e para a difusão de formas simbólicas. A comunicação faz parte das diferentes sociedades e épocas e, por isso, é possível encontrar ao longo do tempo variadas formas de intercâmbio e interações por meio de processos comunicacionais. A comunicação de massa, segundo o autor, diz respeito a um processo his- tórico em que emergem instituições que exploraram formas novas de registro de informação, produção e reprodução simbólica e a transição de informação e de conteúdo para uma diversidade de receptores a partir da troca monetária. É por meio do desenvolvimento da indústria da mídia que se pode contemporane- amente explorar comercialmente as inovações e a produção e difusão de formas simbólicas. Por isso, entende-se comunicação de massa como “a produção insti- tucionalizada e difusão generalizada de bens simbólicos através da fixação e da transmissão de informação ou conteúdo simbólico” (THOMPSON, 2008, p. 31). O desenvolvimento recente de tecnologias de mídia está relacionado às transformações da sociedade contemporânea, com o avanço do capitalismo, que possibilitaram o crescimento de conglomerados de comunicação, o processo de globalização e as tecnologias digitais, que produzem modificações nas formas de codificação, armazenamento, processamento e transmissão da informação e da comunicação. Como o processo comunicativo de massa coloca uma separação entre os contextos de produção e de recepção, Thompson (2008) destaca que as mensagens mediadas passam a ficar disponíveis em contextos distantes e diferentes daquele em que foram produzidas. O modelo capitalista de produção em larga escala e difusão, portanto, ampliou a disponibilidade de bens simbólicos. Para Thompson (2008), é importante atentar para a dimensão simbólica dos meios de comunicação, sendo um dos artefatos que os seres humanos utilizam para tecer as teias de significados para si. Por isso, esclarece o autor, os meios de comunicação são “uma reelaboração do caráter simbólico da vida social, uma reorganização dos meios pelos quais a informação e o conteúdo simbólico são produzidos e intercambiados no mundo social e uma reestruturação dos meios pelos quais os indivíduos se relacionam entre si” (THOMPSON, 2008, p. 19). Desenvolvendo os atributos da comunicação de massa, o autor opta por trabalhar com a ideia de comunicação mediada, mídia ou quase-interação me- diada, que se contrapõem à comunicação face a face. Essa escolha diz respeito às limitações que a expressão comunicação de massa traria para a compreensão do fenômeno comunicativo na contemporaneidade. A inovação tecnológica, 5Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa com a formação de uma rede informacional a partir da ascensão da internet, modificou, conforme destaca Thompson (2018), as formas de interação e de ação a partir da comunicação mediada por eletrônicos em ambientes on-line. A implementação de sistemas digitais de informação e as novas formas de transmissão de dados, como satélites e cabos de fibra ótica, produzem um novo contexto técnico e também flexível de circulação de informação e comunicação. Seria a interação mediada on-line, “orientada para uma mul- tiplicidade de outros destinatários — é de muitos para muitos, e não de um para um” (THOMPSON, 2018, p. 20). Esses processos de interação produzem reconfigurações da esfera pública, agora entendida como midiática, porque, a partir da comunicação de massa, a publicidade de eventos que acontecem em diferentes localidades se torna aces- sível aos indivíduos. Conforme Mancebo (2002), algumas perspectivas sobre a comunicação de massa destacam que o volume intenso de informações inibiria a capacidade das pessoas em convertê-las em conhecimento e, então, em parti- cipação política e coletiva, enquanto testemunhas passivas dos eventos. Haveria, então, uma preocupação com o conformismo e a resignação política das pessoas. Para Thompson (2008), o acesso a esse material passa a constituir uma reflexividade, em que os indivíduos tomam o acesso aos conteúdos novos em seu cotidiano, discutindo-os. Esse processo é resultado da globalização da comunicação, que altera a relação tempo-espaço que interconecta diferentes pessoas em contextos distintos ao longo do globo. Assim, há uma grande diversidade de produtos das mídias que estão disponíveis para uma grande diversidade de pessoas, as quais, no entanto, não são receptores passivos, absorvendo acriticamente a infinidade de conteúdos veiculados. A compreensão do processo comunicativo implica considerar que, embora não haja uma relação de parceria entre os produtores e receptores, há um pro- cesso estruturado de transmissão simbólica. Portanto, ainda que assimétrico, o processo comunicativo contém possibilidades de interação e agência dos sujeitos sobre os modos como se relacionam com o conteúdo. Essa perspectiva objetiva romper com um olhar que considera a comuni- cação de massa como homogeneizadora e manipuladora. Como diz Mancebo (2002), a mass media geraria um conhecimento e, consequentemente, uma maior consciência da diversidade, bem como a produção de localismos e a acentuação das diferenças. Tal leitura, alerta, não implica desconsiderar as relações geopolíticas em jogo na comunicação, mas considerar que há outras formas de apropriação dos produtos culturais e distintos modos de resistência daqueles que vivem em contextos de exploração econômica. Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa6 Nesse sentido, os processos de comunicação de massa são analisados enquanto massificantes e por abrirem novos campos de interação e ação que fogem ao controle prévio de uma indústria cultural. Esses processos coexistem e devem ser levados em conta em uma reflexão sobre o lugar da mídia na sociedade contemporânea, bem como sobre as transformações empreendidas pelo seu desenvolvimento ao longo do tempo. 3 Comunicação de massa e processos psicológicos Os processos de comunicação de massa, então analisados como massifi cantes, abrem novos campos de interação e ação que fogem ao controle prévio de uma indústria cultural. Esses processos coexistem e devem ser levados em conta em uma refl exão sobre o lugar da mídia na sociedade contemporânea, bem sobre como as transformações empreendidas pelo seu desenvolvimento ao longo do tempo. Os seres humanos são relacionais e constituídos a partir de processos interativos e comunicacionais.Produzem teias de significação que propiciam trocas simbóli- cas e, desse modo, a atribuição de sentidos para as ações realizadas. A produção simbólica realizada pelos meios de comunicação também age sobre os indivíduos, produzindo maneiras de pensar a ação devido à inserção dos meios técnicos de comunicação no cotidiano, como rádio, televisão, tablet, smartphone, entre outros. Os meios técnicos de comunicação têm reconfigurado a percepção e a subjetividade dos indivíduos, e os estudos em psicologia a respeito das mí- dias têm produzido diferentes leituras sobre seus efeitos. Enquanto produção capitalista, a comunicação de massa foi discutida como produção de sentidos ideológicos e estéticos que levariam a uma alienação e a baixo padrão cog- nitivo nos indivíduos consumidores. Abordagens alternativas têm apontado que a comunicação produz desejos, percepção e sensibilidades que levam aos modos de governo, mas também possibilidades de resistência e formas de ação e interação que escapam da ideia manipulatória da abordagem anterior (PORTO, 2003; GUATTARI; ROLNIK, 1986). No estudo sobre os efeitos das mídias, considerando as funções psicológicas e sociológicas, foram desenvolvidas diferentes discussões com o intuito de avaliar o impacto das mídias na conduta e o consumo dos conteúdos pelos indivíduos. São abordagens que consideram as gratificações e a satisfação de necessidades individuais, a cognição, a produção das subjetividades ou os processos de incorporação. 7Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa Um estudo realizado na década de 1970 apresenta importantes contribui- ções sobre as funções psicológicas da mídia. Trata-se da pesquisa de Katz, Gurevitch e Haas (1973), centrada na satisfação dos usuários, situando-os como participantes, ainda que parcialmente, dos conteúdos selecionados. A partir da pesquisa, buscou-se agrupar as necessidades que os usuários consideraram importantes, identificar as contribuições dos diferentes meios técnicos da comunicação para a satisfação dessas necessidades e, por fim, realizar uma comparação dessa satisfação em relação a outros meios que não são da mídia. A pesquisa constitui um campo de estudos que entendia os consumidores da mídia como atores ativos, que buscam os conteúdos com o intuito de al- cançar gratificações. Conforme Porto (2003), essa discussão carecia de uma perspectiva sociológica porque abstraia o debate sobre as necessidades de uma análise da inserção do uso das mídias no funcionamento do sistema social e, portanto, de um contexto mais amplo de relações sociais. A incorporação da psicologia cognitiva no estudo sobre a mídia contribuiu para o desenvolvimento de modelos de estudos sobre o processamento da informação. O objeto de estudo foca na forma pela qual as pessoas processam, atentam e memorizam a informação veiculada pela mídia. Esse enfoque trata o conteúdo da mídia como informação, o que leva a desconsiderar a forma como esse conteúdo é simbolizado pelas pessoas (PORTO, 2003). Abordagens alternativas têm procurado pensar como a produção de sub- jetividades no capitalismo constitui um aspecto importante para pensar os efeitos das mídias sobre os sujeitos. As subjetividades, como apontam Guattari e Rolnik (1986), vêm sendo produzidas em larga escala a partir da lógica da produção capitalista, quando se produz formas de estar no mundo, tais como formas de expressão, de sentir e perceber o mundo. A subjetividade é um processo coletivo e político produzido por uma infinidade de vetores, para além de uma perspectiva psicologizante, isto é, individual e unitária do psicológico. Trata-se de um processo dinâmico de constituição dos sujeitos implicados em processos coletivos e heterogêneos que envolvem mediações humanas e não humanas. Os processos subjetivos, nesse sentido, não estão calcados em instâncias egóicas, mas em processos coletivos, eminentemente políticos, sociais e culturais. Guattari e Rolnik (1986) entendem que esses processos são tanto extraindi- viduais, como a mídia, a tecnologia, entre outros, quanto intrapessoais, como percepção, sensibilidade, afeto, representação, memória, sistema fisiológico, entre outros. A partir dessa perspectiva, afasta-se de uma concepção puramente Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa8 psíquica da subjetividade para compreender o entrecruzamento de diferentes vetores que se agenciam e produzem formas múltiplas de existência. Como entendem, há uma captura desde dentro, da produção do desejo, da percepção, do pensamento, etc., a partir da cognição, da linguagem e das emoções. Desse modo, a produção de signos a partir da lógica capitalista, especialmente por meios da comunicação de massa e das tecnologias digitais, aprofunda o processo de constituição dos sujeitos. O advento da comunicação de massa, segundo Deleuze (1992), marca a constituição de um novo regime de poder que produz novas formas de subjeti- vação, dado que se desloca das relações disciplinares para formas de controle disperso. As observações do autor possibilitam compreender que os meios técnicos da comunicação de massa consolidam uma nova forma de governo. Por isso, aponta que a sociedade contemporânea pode ser compreendida como sociedade de controle ou sociedade de comunicação. Esse regime de poder é visível em diferentes contextos da vida a partir da difusão de bens simbólicos que vão produzindo, conforme Guattari e Rolnik (1986), sujeitos sob medida para a ordem capitalista. Desse modo, compreendem que a mídia atua a partir da mediação de processos de subjetivação. Entre as formas de controle, Deleuze (1992) destaca o publicitário, dado o seu papel na produção do desejo inscrita na incitação ao consumo. Essa forma, assim como outras, dispersa-se pelo meio social por intermédio de diferentes dispositivos e em diferentes campos da vida. Em contrapartida, Pereira (2006) entende que, na compreensão das di- nâmicas de comunicação das novas mídias, é preciso considerar a corporifi- cação, isto é, o corpo como um dos agentes que compõe práticas subjetivas e culturais. A partir desse aspecto, torna-se possível refletir sobre como as novas mídias têm alterado formas de percepção e experiências estéticas, bem como a afetividade e a sensorialidade que produzem novas conexões neurais a partir dos processos comunicacionais mediados. Tal compreensão possibilita ver como o corpo age diante de estímulos e sensações propiciados pela mediação das mídias. Com isso, entende que: [...] é a capacidade de um corpo processar sons, imagens, sinais gráficos, texturas táteis, dentre outros estímulos sensoriais, como uma experiência para qual o corpo possui, conquistado através de um aprendizado, um repertório de significados, ações, emoções ou respostas relacionadas, capaz de organizá-lo frente à experiência em questão. A sensorialidade deve ser entendida, assim, como uma espécie de memória corporal a partir da qual as experiências sines- tésicas ganham orientação e sentido, guiando as ações que o corpo apresenta frente a tais experiências (PEREIRA, 2006, p. 98). 9Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa Essa perspectiva, como coloca o autor, está preocupada em apontar como os aspectos materiais dos meios de comunicação afetam a produção das afetações psicossomáticas e como, então, o corpo também participa na produção das tecnologias de comunicação. Como se observa, no estudo dos efeitos das mídias sobre a produção dos sujeitos, há múltiplas abordagens em debate e desenvolvimento no campo da comunicação. Contemporaneamente, tem-se focado a partir dos estudos das materialidades dos meios de comunicação a relação entre corpo e técnica para pensar a produção tanto dos processos comunicacionais quanto dos sujeitos não apenas como usuários, mas ativos produtores das tecnologias. DELEUZE, G. Conversações. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992. GUATTARI, F.; ROLNIK, S. Micropolítica: cartografias do desejo. Rio de Janeiro:Vozes, 1986. KATZ, E.; GUREVITCH, M.; HAAS, H. On the use of mass media for important things. American Sociological Review, New York, v. 38, a. 2, p. 164-181, 1973. MANCEBO, D. Globalização, cultura e subjetividade: discussão a partir dos meios de comunicação de massa. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 18, n. 3, p. 289-295, 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ptp/v18n3/a08v18n3.pdf. Acesso em: 28 jan. 2020. MAUSS, M. Três observações sobre a sociologia da infância. Pro-Posições, Campinas, v. 21, n. 3, p. 237-244, 2010. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pp/v21n3/v21n3a14. pdf. Acesso em: 28 jan. 2020. PEREIRA, V. A. Reflexões sobre as materialidades dos meios: embodiment, afetividade e sensorialidades nas dinâmicas de comunicação das novas mídias. Revista Fronteiras, São Leopoldo, v. 8, n. 2, p. 93-101, 2006. 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No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. THOMPSON, J. B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis: Vozes, 2008. TOSTA, C. G. Vigotski e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Revista Perspectivas em Psicologia, Uberaba, v. 16, n. 1, p. 57-67, 2012. Disponível em: http:// www.seer.ufu.br/index.php/perspectivasempsicologia/article/view/27548. Acesso em: 28 jan. 2020. VIGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psico- lógicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 2007. Leituras recomendadas BENEDICT, R. Padrões de cultura. Petrópolis: Vozes, 2013. MEAD, M. Sexo e temperamento. São Paulo: Perspectiva, 1999. 11Aspectos psicológicos e processo de comunicação de massa
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