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CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 1 DIREITO PENAL II - DANIEL NICORY CADERNO DE NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES TEORIAS DA AÇÃO 1) TEORIAS DA AÇÃO NA TRADIÇÃO FILOSÓFICA ARISTOTÉLICA. (Páginas 25 do link: PRADO, Daniel Nicory do. “No mundo dos autos: uma teoria da narrativa judicial” https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/25031). . Um dos campos mais importantes da Filosofia, a ética, estuda a ação humana para compreender qual seria a ação humana correta. Discussão do que é certo e do que é errado fazer. Isso ainda não se trata de uma discussão jurídica entre o que é punível ou não, ilegal ou legal, pois essas questões variam no espaço e ao longo do tempo. . Pode haver em algumas áreas um descasamento parcial entre o que o direito aceita e o que a moral aceita. . Contudo, tanto o direito, a moral, a gramática, as convenções artísticas, a religião, são todos sistemas de regulação de alguma coisa, essas normatividades. - NORMA não do ponto vista da lei cientifica, mas como previsão de um comportamento devido/previsão e valoração dele como certo e errado, se refere ao comportamento ao humano. . Todas essas normas (moda, religião etc.) dirigem-se aos seres humanos/ao comportamento humano voluntário, que são capazes de compreender a norma e agir conforme ela. – Cachorro/gato são capazes de entender determinados comandos e sanções a determinados comportamentos, mas isso não é norma jurídica. Isto porque, o Direito não trata de qualquer comportamento, mas sim do COMPORTAMENTO HUMANO VOLUNTÁRIO. – = o que o Direito Penal chama de CONDUTA. . Conduta: ação ou omissão. . Chamamos de “Teorias da Ação” e não “Teorias da Conduta”, pois ao falar de AÇÃO estamos falando da ideia de comportamento dentro de um juízo pré-jurídico que é fazer algo voluntariamente, de maneira mais independente. Por outro lado, ao se falar em omissão, que é deixar de fazer algo, deixar de praticar a ação devida, a ideia de omissão tá sempre mais próxima da ideia de normatividade (só posso falar de omissão quando deixo de fazer algo que era devido). https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/25031 CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 2 . Isso gera algumas dúvidas a respeito da origem da “OMISSÃO”. Os primeiros filósofos do Direito Penal vão falar da omissão como INÉRCIA/relaxamento corporal. . Teoria da ação consegue ser mais facilmente fracionada com uma dimensão pré- jurídica do que a omissão. . Omissão é deixar de praticar a ação devida. Por isso, estudando a ação eu consigo trazer também pra omissão. . Só posso chamar alguém de omitente (aquele que omite) quando eu analiso/defino uma conduta devida (o que deveria ser feito e não foi), que deve estar prevista em algum lugar/sistema. – EXEMPLO: explosão do Líbano, para eu dizer que eles omitiram no trato com o material explosivo de forma inadequada, eu preciso identificar o que poderia ter sido feito e se eles poderiam ou não ter feito essa conduta devida; – EXEMPLO: China sonegando informações cruciais pra comunidade internacional no início da quarentena sobre o CORONAVÍRUS. Contudo, não posso punir todos os órgãos do mundo como responsáveis por não conseguirem impedir a disseminação da doença. Porém, além dos comportamentos absolutamente incontroláveis nessa pandemia, existem também existem comportamentos omissivos ou ativos que pioraram as consequências do que já era um problema. - EXEMPLO: um país que não tem verba para compra de respiradores e que então nessa pandemia do COVID-19 não compra. O chefe executivo não pode ser punido com omissão, pois ele não tinha como comprar. Porém, em um segundo caso como quando ele deixa de passar a verba que ele recebeu pra compra desses equipamentos, é possível responsabilizar pessoas por não terem impedido um prejuízo diante do que concretamente era possível fazer. A) A TELEOLOGIA EM ARISTÓTELES: . Telos = finalidade. . Ação humana é dirigida para uma finalidade. Essa direção da ação para uma finalidade é o que mostra a racionalidade do comportamento. – Quando eu me comporto de uma determinada maneira, pelo menos teoricamente, estou buscando a realização de um objetivo/cumprir uma finalidade. . Aristóteles coloca o BEM como fim, dizendo que todo comportamento humano deve ser dirigido para o BEM. Mas, sabemos que isso não é verdade, porque se o bem fosse algo fácil de entender/compreender/se orientar, todos nós estaríamos desempregados. O Direito vai tratar justamente da regulação do comportamento humano diante dessas incertezas e necessidade de segurança. . NEM TODO COMPORTAMENTO HUMANO, PORTANTO, É VOLTADO PARA O BEM (QUALQUER QUE SEJA O SENTIDO DE BEM COMPREENDIDO). . Aristóteles vai dizer que a forma mais básica de comportamento, que até os animais tem, é o comportamento voluntário (animal ou humano) que busca evitar a dor e buscar o prazer. – Relacionado com o instinto de sobrevivência: preservar-se do CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 3 sofrimento, ter prazer e seguir em frente do pela reprodução. Só que nem toda busca do prazer a curto prazo é o que lhe faz bem a longo prazo; e o comportamento doloroso no agora pode fazer bem no futuro. – Vai demonstrando a racionalidade do pensamento, na medida em que se consegue projetar no tempo as consequências. – Pensando assim a longo prazo, consegue se separar meios fins, planejando o tempo em etapas e planejas as ações, o que vai afastando da pura impulsividade de sobrevivência (buscar prazer e evitar dor) para algo que é bom no longo prazo. – FALANDO DO AGENTE. . Mas, o agente não vive sozinho e sim em sociedade. Então, há ainda a possibilidade de um comportamento prazeroso para o agente e danoso para os demais. . Segundo Aristóteles, não mandamos em nossos desejos, só podemos controlar nossa ação frente a essa vontade. – Se tenho um desejo que é danoso para o outro e compreendo ser errado, eu não posso deixar de querer, mas consigo deixar de fazer. Posso não conseguir mudar o que desejo, mas posso mudar o que eu faço. - Qual seria a importância da educação? O que molda o sujeito a enxergar prazer em fazer bem e enxergar dor em fazer o mal. . EXEMPLO: vegetarianismo e veganismo - se pensarmos que o ser humano enquanto espécie mata outras espécies para se alimentar delas, o que sobressai e diferencia essa postura do ser humano dos outros animais é o tipo de sofrimento que o ser humano faz para adquirir esse alimento. É um alimento barato (dada as formas como é feito o abate) e gostoso. Mas, se mudamos nossa postura de pensamento (vegetarianismo e veganismo), com o tempo filosoficamente compreendo a dor do outro (animal) e mudo a postura. . O prazer pode ser ensinado/educado/modificado, embora tenha também uma base instintiva diante de uma situação concreta (pois, nesse caso, só poderíamos controlar a ação). . Aristóteles sabe que o desejo não é em si incontrolável, que pode ser educado, modificado; diz também que diante de um caso concreto o desejo não é controlável, mas que podemos controlar a ação. Por isso ninguém é punido simplesmente por cogitar o crime, mesmo que a gente chegue a um futuro onde podemos prever o que a pessoa vai fazer, a cogitação não pode ser punida. . A ação vive nesse capo: diante de um desejo compreendo se aquilo é bom ou mau e optamos por agir ou omitir. Nessa escolha de meios, o próprio Aristóteles vai dizer que acabamos escolhendo pelo que é mais fácil e eficaz. . Aristóteles tem algumas discussões sobre voluntariedade e involuntariedade que não são correspondentes exatamente ao que o Direito trata como tal. Algumas coisas que Aristóteles trata como involuntárias, para o Direito são voluntárias. – Para Aristóteles os conceitos de voluntariedade e involuntariedade estão ligados à vontade livre e isenta de erro e coação. CADERNO DIREITO PENAL II -2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 4 . Comportamento humano dirigido a um fim, e este não pode ser, segundo Aristóteles, puramente satisfazer um desejo, realizar o prazer e evitar a dor. 2) A AÇÃO SOCIAL EM MAX WEBER (SÉCULO XIX). . O comportamento humano em sociedade – que é o que importa para o Direito. . Weber irá trazer 4 formas de ações (duas racionais e duas não irracionais). . Contudo, o fato destas 2 ações não serem racionais, não tira delas o caráter voluntário. . AÇÃO INSTRUMENTALMENTE RACIONAL: ação que busca a satisfação de um interesse. – O indivíduo age de acordo com o necessário para a realização do seu próprio interesse, independentemente de ser certo ou errado. . AÇÃO VALORATIVAMENTE RACIONAL: ação que tem um objetivo de cumprir um dever. – Será sempre legal. – Ação baseada no que é certo, ainda que possa prejudicar o interesse pessoal. . Uma ação pode cumprir as duas funções acima. – Exemplo: professor dando a aula tem tal dever de exercer a atividade de lecionar num determinado horário, e também a satisfação de realizar a docência. . AÇÃO EMOCIONAL (VOLUNTÁRIA, MAS IRRACIONAL): ação guiada pelos afetos e não por um cálculo de vantagens e desvantagens. Não significa que agir emocionalmente é errado, mas não foi feito ponderações das consequências. – É o ato impulsivo, voluntário, com pouca reflexão sobre a produção do desejo. . AÇÃO TRADICIONAL (VOLUNTÁRIA, MAS IRRACIONAL): aquela ação em que eu sigo o que a sociedade sempre fez. Na ação valorativamente racional o sujeito compreende o sentido da norma. Diferente da ação tradicional, em que o sujeito faz porque sempre fizeram na sociedade. – O indivíduo conhece e repete sem questionar a validade da conduta. – “Sempre foi assim e faço”. . Exemplo: uma comunidade que tem como sistema de valor que na base estabeleça a supremacia racial de algum grupo étnico e discrimina outros. – Isso vai ser valorativamente racional dentro daquele mundo. Existem também os preconceitos que se perpetuam no tempo, sem que reflitamos muito sobre eles. . Quando essas racionalidades entram em conflito – As vezes o cumprimento de um dever pode ser o sacrifício de um interesse pessoal. Existem vários exemplos de sacrifício heroico em que as pessoas dão a vida para salvar outra. Será uma ação valorativamente racional (porque reconhece o dever de salvar o outro), mas que destrói o seu próprio interesse máximo (continuar vivendo). Por outro lado, existe também (de forma mais frequente) uma ação instrumentalmente racional, mas que não é valorativamente racional (satisfaço meu interesse descumprindo meu interesse para com o outro – atos ilícitos). CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 5 3) A AÇÃO SOCIAL EM JURGEN HABERMAS (SÉCULO XX): . Dá prosseguimento a essa discussão Aristotélica sobre a ação, sobre o que é o comportamento. . Sequência da base teleológica da ação: ele diz que a ação começa na 1- aparição da vontade, definição da finalidade, aplicação do conhecimento causal, escolha dos meios, definição do plano (ÂMBITO INTERNO – PLANO DA CONSCIÊNCIA, ainda que venha a existir uma comunicação com outro agente); 2 - execução do plano, produção de efeitos, realização (ou não) da finalidade (ÂMBITO EXTERNO – AQUI EXTERIORIZAMOS NOSSO ATOS). . Diante dessa base teleológica que é comum, existem 4 tipos de ações que se diferenciam de acordo com a sua forma de conexão com a sociedade. Cada um deve estar ligado a uma ideia de verdade ou de mundo. . EXEMPLO: “O que desejo cursando a disciplina de Direito Penal?” Concluir o curso, conhecimento, cumprir a grade etc. Todas as respostas exigem que seja traçada uma finalidade básica. Preciso ser aprovada na matéria (posso adquirir conhecimento independente da nota, mas preciso da aprovação como espécie de chancela do detentor de autoridade que valida sua aquisição de conhecimento por meio da avaliação). Para ser aprovado preciso acertas as questões e para isso preciso estudar por livros, aulas, textos de apoios etc. Para ser aprovado eu posso fazer valer de outras formas como colando, corrompendo o professor etc. Tudo isso sabemos porque sabemos como o mundo funciona = APLICAR O CONHECIMENTO CAUSAL. – REFLETIR QUAIS SÃO AS FORMAS DE ALCANÇAR A FINALIDADE DESEJADA. A PARTIR DISSO ADOTAMOS QUAIS ESTRATÉGIAS IREMOS SEGUIR. . A ideia de ilícito, cola, pesca varia: o professor permite prova em consulta apenas pela legislação não comentada. Tudo que fugir dessa determinação, inclusive consultar o colega será ilícito. Só que agora estamos vivendo um momento diferente fruto da pandemia mundial, e se o professor também determinasse que a prova online só poderia ser realizada com base na legislação comentada, continuaria sendo ilícita toda forma de consulta. Mas, caso ele determinasse que poderia consultar o colega, sem que isso gerasse plágio, a dimensão do que é ilícito diminuiria. – RESUMINDO: O que você pode fazer para responder a prova é algo que cada professor irá graduar de uma forma diferente. – A partir disso o aluno pensa formas de estudos, estratégias de realização, para execução do plano pra tentar conseguir os efeitos de ser ou não aprovado na matéria. . Os tipos de ações partem da definição dos MEIOS (toda são racionais): . AÇÃO ESTRATÉGICA: a única preocupação do sujeito é realizar a finalidade dele. Então, na hora de aplicar o conhecimento causal, a única coisa que ele irá avaliar é o que funciona ou não para o alcance do seu próprio interesse, não estando preocupado se pode ou não, se é lícito ou ilícito etc. – Não precisa hora nenhuma violar a lei, contudo se ele não a viola é porque tem medo de punição, avaliando que o risco da sanção é alto. – Mensagem importante não só para o praticante da ação, CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 6 mas pra quem exigiu tal postura/impôs a regra. – EXEMPLO: numa prova presencial, o professor pode impor que só haja consulta à legislação não comentada, pois é mais fácil controlar o comportamento do outro do que controlar o comportamento do outro sem o contato presencial, durante os 5 dias disponibilizados para resolução. Destarte, manter a mesma regra pra execução, o risco de ser flagrado o que o professor não quer (consultando outras formas) é muito menor. Assim, o impositor irá ter que diante dessa situação de quarentena criar outras regras, com outras possibilidades e com uma única proibição: não ter plágio. . AÇÃO NORMATIVA: o sujeito escolhe, dentro das estratégicas lícitas, o que melhor funciona para o alcance do seu próprio interesse. – No caso da prova, nesse tipo de ação, o sujeito sabe que não pode plagiar, uma vez que isso foi identificado como única proibição pelo impositor da regra. – O QUE PODE E O QUE NÃO PODE IMPORTAM. . AÇÃO DRAMATÚRGICA: o sujeito enxerga a vida como um palco e neste palco você tenta representar a forma mais fiel de si mesmo. – Avaliamos nossa própria capacidade de fazer algo. O conhecimento causal exigido é o AUTOCONHECIMENTO. ANALISO O QUE VAI FUNCIONAR OU NÃO PARA MIM – EXEMPLO: cada um tem uma forma diferente de estudar, responder a prova etc. – Respeitando o que era possível, devido e funciona. . AÇÃO COMUNICATIVA (a que Habermas considera como mais importante): o sujeito avalia de uma maneira em que o seu comportamento se oriente com o comportamento do outro pela via da comunicação. O sujeito vai enxergar toda ação como interação. – EXEMPLO: numa prova estamos interagindo com o professor ou outro corretor da prova. Irá analisar a quantidade de linhas, os tipos de consultas que valem ou não, a forma da resposta, as configurações de margem/tamanho/fonte permitidos, para que o sujeito se assegure que não irá desviar da conduta exigida. RESUMINDO: CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 7 IDEIA DE VERDADE EDE MUNDO: . Na ação estratégica o conceito de verdade como CORRESPONDÊNCIA entre os acontecimentos e a nossa descrição deles; e com a ideia de mundo OBJETIVO (mundo dos efeitos físicos/materiais/naturais). . Na ação normativa agrega ao conceito de verdade o significado de CORREÇÃO (se algo está certo ou errado, justo ou injusto, legal ou ilegal a partir de um ponto de vista normativo); conceito de mundo INTERSUBJETIVO (a norma só se forma na intersubjetividade, no mundo social construído pela sociedade). . Na ação dramatúrgica o conceito de verdade como SINCERIDADE (o sujeito pode pensar/representar o que não condiz com a realidade e pode não ser certo, mas é sincero) – PARA QUE A AÇÃO DRAMATÚRGICA VALHA TEM QUE LIDAR TAMBÉM COM A CORRESPONDÊNCIA E COM A CORREÇÃO (existe sinceridade que não é correta); e com a ideia de mundo SUBJETIVO/INTERIOR (cada cabeça é um mundo). . Na ação comunicativa o conceito de verdade é um PRODUTO DO CONSENSO entre os agentes; e conceito de mundo DA VIDA (que agrega os outros três mundos). 4) FUNÇÕES DO CONCEITO JURÍDICO-PENAL DE CONDUTA: a) FUNÇÕES DO CONCEITO JURÍDICO-PENAL DE CONDUTA: . O Código Penal não prevê o que é conduta, faz apenas uma menção muito breve a conduta designando suas modalidades (ação e omissão) e mais algumas informações sobre nexo de causalidade e algumas reflexões sobre a relação entre meios e fins e exteriorização do ato ou não. – TUDO ISSO ESPALHADO NO CÓDIGO PENAL ENTRE O ARTIGO 13 E O ARTIGO 31. . O conceito de conduta no Direito Penal tem 3 funções: CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 8 . Servir de elemento base, ou seja, deve permitir o agrupamento de todas as principais modalidades de conduta. – Ação dolosa ou omissão (Artigo 13), dolosa ou culposa (Artigo 18), tentada ou consumada (Artigo 14). . Servir como elemento de enlace, ou seja, o conceito de conduta tem que servir para enlaçar as 3 categorias do conceito analítico de crime fato (Artigos 13 a 17), ilícito (Artigo 23 a 25), típico (Artigos 18 e 19) e culpável (Artigos 20 à 22, 26 à 28). . Servir como elemento de limitação, em que definir o que é conduta se torna fundamental para compreender os casos de ausência de conduta. – Não existe previsão no código dos casos de ausência de conduta. – Só sei que uma situação x não é crime se ele não for ação nem omissão etc. b) PRINCIPAIS ESPÉCIES DE CONDUTA: . COMISSIVA X OMISSIVA: fazer algo x deixar de fazer algo (fazer algo diverso do prescrito). . DOLOSA X CULPOSA: orientada a um resultado delitivo (já orientada para um resultado ilícito) x orientada a um resultado lícito (se a escolha dos meios é destinada a um meio lícito como a conduta pode ser criminosa? Por uma má escolha dos meios ou má execução dos meios). . Exemplo: uma pessoa atrasada para chegar ao aeroporto dirigindo desesperadamente a 130km/h e no percurso mata alguém atropelado. Houve uma má execução dos meios, que gera não só o não êxito da finalidade (chegar no aeroporto) como ocasiona o ilícito (matar alguém). . Na conduta dolosa há a produção dos efeitos desejados, ao passo que na culposa não. . CONSUMADA X TENTADA: produz efeitos desejados x não produz os efeitos desejados. c) CASOS DE AUSÊNCIA DE CONDUTA: . Na ausência de conduta o sujeito não é mais agente, é paciente da conduta de outro ou de uma força da natureza. – Não se fala nem em tipicidade, está fora do âmbito do Direito Penal. . FORÇA FÍSICA IRRESISTÍVEL: que pode ser tanto uma força da natureza como uma ação humana. . EXEMPLO: Caso da pessoa que força a outra a pegar na arma e deixar uma digital como prova. . EXEMPLO: Andando na rua, alguém tomba em você e você cai em uma vitrine de uma loja causando um dano patrimonial que se for doloso é crime, e se for culposo não será. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 9 . EXEMPLO: Dirigindo um carro, alguém bate atrás de você, desloca seu carro e você atropela pedestres. – Você não cometeu nenhum crime, nem doloso nem culposo. . ATOS REFLEXOS: força da natureza é força do seu próprio corpo. . Existem movimentos corporais que não são controlados pelo Sistema Nervoso Central em resposta a um estímulo, tais como espasmos, convulsões, tosses, desmaios (exemplo da pessoa que desmaia dirigindo e fere alguém – não cometeu um crime). . Exame do martelo no joelho – se por acaso a pessoa chutar e machucar alguém, essa conduta não pode ser considerada crime de lesão corporal. . Automatismo NÃO pode ser confundido com atos reflexos. – Principalmente quem utilizar máquinas, sabe que com o tempo esses movimentos entram no “automático”, você nem percebe que está passando marcha etc. Apesar de você não refletir sobre o conteúdo do comportamento, este é voluntário, é conduta, CONFIGURA CRIME. . Atos em curto-circuito (ações emocionais no pensamento de Weber) e reações explosivas não se confundem com movimentos reflexos, pois neles existe vontade, ainda que de maneira fugaz, sendo, portanto, suscetíveis à dominação finalística. Nestes atos a velocidade com que surge o elemento volitivo é tão grande que pode ser impossível de controlar. Exemplo: a pessoa está dirigindo, um carro da uma cortada nela ela, para fugir automaticamente, acaba atropelando alguém. – Atos em curto circuito são vizinhos da inconsciência, como uma resposta emocional forte à um estímulo, ainda configura conduta, . ESTADOS DE INCONSCIÊNCIA: . Pessoa que pratica um ato durante o sonambulismo, seja ele uma ofensa moral ou uma agressão física, não há cometimento de crime. A questão é provar. . Esses casos de inconsciência não podem ser confundidos com outras coisas parecidas e que são crimes. . Embriaguez não é estado de consciência; só a embriaguez letárgica. – Embora a embriaguez não exclua a conduta, ela pode excluir o crime a depender do tipo de embriaguez. . Hipnose. – Doutrina se divide. – Se você conseguir comprovar uma hipnose completa, não configura crime. Contudo, o problema está em você conseguir provar . Sonambulismo é diferente de insanidade. – Uma pessoa portadora de um transtorno psiquiátrico e ouve uma voz dizendo a ela para matar quem está a sua frente, pois esta seria a encarnação do diabo, e ela acaba matando, ela está em uma situação de insanidade e não compreende a ilicitude da conduta, mas seu fato foi voluntário, embora não vá ser crime pela inexistência de culpabilidade. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 10 . EXEMPLO: Gerente do banco com uma arma na cabeça é obrigado a abrir o cofre. – A conduta existe, mas para verificar se foi crime ou não deve se analisar os demais pontos do conceito analítico de crime. Nesse caso ele está sob COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL, excluindo a culpabilidade. Isso mostra que a escolha dele não foi livre e não sendo livre não existe juízo de reprovação moral. d) TEORIA CAUSAL DA AÇÃO (FRANZ VON LISZT, ERNST BELING): . No século XIX começaram a se desenvolver teorias pra tentar dar autonomia científica ao Direito com relação a Filosofia. O Direito era conhecido como um campo pertencente a Filosofia e com o Iluminismo surgiu um processo de racionalização do Direito, com consequente livramento das amarras da Filosofia e tentativa de incorporação da ciência empírica no Direito. . Definem a ação como causação de uma transformação voluntária no mundo exterior. – Esse conceito de ação pretende ser puramente objetivo, como algo que é externamente observável. Isto é, para eu entender uma ação, eu não precisaria me debruçar no conteúdo da vontade do autor, pois bastaria reconhecê-la como voluntária. . A ação seria dividida em AÇÃO OBJETIVA e CULPABILIDADE SUBJETIVA. . É por causa dessa teoria que até hoje existe uma confusão muito grande entre dolo e culpa x culpabilidade de outro. . Culpaé diferente de culpabilidade. . Dolo e culpa são elementos subjetivos do comportamento. . Culpabilidade é a avaliação que se faz do comportamento para analisar se a pessoa é responsável ou não. . Na primeira Teoria da Ação, o Causualismo ou Teoria Causal da Ação, dolo e culpa eram misturados com a culpabilidade, quando hoje sabemos que o certo a fazer é avaliar o dolo e a culpa como integrante da tipicidade (já para os finalistas, CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 11 começaram a definir dolo e culpa como integrantes da própria tipicidade e a culpabilidade deixou de ser subjetiva pra ser normativa). . Críticas para essa Teoria Causal da Ação: resolve bem os casos de ausência de conduta, mas não dão conta da omissão, pois se defino a ação como transformação do mundo exterior por um movimento corporal voluntário, e isso não consegue definir a omissão. Destarte, segundo essa Teoria, teríamos a omissão como inércia/repouso/distensão corporal, e ela nem sempre se configura de tal forma, pois é também a realização de qualquer outra ação que não a devida. – Isso já serviu como argumento suficiente para derrubar essa teoria. . Quando só trata o dolo e a culpa na culpabilidade, não é possível diferenciar desde o começo o que seria uma tentativa de homicídio do que seria uma lesão corporal dolosa. . Além disso, o Causualismo tenta definir o fato típico e a antijuridicidade como puramente objetivos, sem levar em consideração os elementos subjetivos. . CAUSUALISMO: ação objetiva e culpabilidade subjetiva; omissão é “inação”. e) TEORIA FINAL DA AÇÃO (WELZEL) . Substituiu a Teoria Causal e até hoje é a teoria que nosso Código Penal adota. . Para Wezel, a ação humana é exercício de uma atividade final. A finalidade da ação baseia-se em que o homem, graças a seu saber causal, pode prever, dentro de certos limites, as consequências possíveis de sua conduta. Em razão desse saber, pode dirigir os diferentes atos de sua atividade de tal forma que oriente o acontecer causal exterior a um fim e assim o determine finalmente. . A ação é o comportamento humano voluntário conscientemente dirigido a um fim. No crime culposo, a finalidade não é criminosa, já no crime doloso, a finalidade é criminosa. . Muito parecida com a Teoria Aristotélica da Ação. . Quando o Direito Penal percebeu que não ia conseguir sobreviver sem Filosofia (metafísica e ética) ele redescobriu o que Aristóteles dizia há dois mil anos: que o comportamento ético é dirigido a uma finalidade. . CONDUTA HUMANA É UM FAZER FINAL. . Processo: determinação do fim, consideração dos meios disponíveis e seus efeitos, eleição dos meios e execução do plano. – INTER CRIMINIS. . FINALISMO: ação objetiva e subjetiva, culpabilidade normativa; omissão é ação diversa da prescrita. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 12 . Ação objetiva (mundo real): execução da ação real, dominada pela determinação do fim e dos meios na esfera do pensamento. Se, por qualquer razão, não se consegue o domínio final ou não se produz o resultado, a ação será apenas tentada. . Ação subjetiva (esfera intelectual): objetivo pretendido, meios de execução, consequências da relação meio/fim. . CRÍTICA: se refere aos crimes culposos, cujo resultado se produz de forma puramente causal, não sendo abrangido pela vontade do autor. 5) TEORIAS FUNCIONALISTAS DA AÇÃO: . O funcionalismo tenta incorporar nas Teorias da Ação, sem jogar fora todo finalismo, a relação que a sociedade tem com ela toda e com o sistema. . Funcionais por servem a um propósito específico na sociedade. . Funcionalismo de Claus Roxin é o Teleológico porque orienta o sistema penal de acordo com as funcionalidades da pena. – a missão do Direito Penal é proteger os valores essenciais à convivência social harmônica, então a intervenção mínima deve nortear a sua aplicação, consagrando como típicos apenas os fatos materialmente relevantes. . Para Roxin, só podem ser imputados ao sujeito os comportamentos que emanam do sujeito e podem ser vistos como sua personalidade. . Funcionalismo sistêmico (JAKOBS): define ação como a causação do resultado individualmente evitável. A conduta penalmente relevante é aquela capaz de produzir um resultado e, portanto, a pessoa deve abster de praticar, ou aquela capaz de evitar um resultado, e a pessoa deve praticar. 6) A CAUSALIDADE NA TRADIÇÃO HUMANÍSTICA: - DAVID HUME: . Nexo de causalidade = relação entre causa e efeito. No Direito Penal é o resultado entre a relação conduta (causa) e resultado (efeito). . Hume vai falar que a causalidade é percebida pela conjunção constante entre dois fenômenos. – “Onde há fumaça, há fogo.” . Elemento da precedência temporal da causa: a causa tem que vir primeiro que o efeito, para então ser causa deste. – CAUSA PRIMEIRO E EFEITO DEPOIS. . A relação de causalidade está relacionada com a conjunção entre os fenômenos. Quando existe essa conjunção, o filósofo investiga quem é a causa e quem é o efeito. É possível se pensar em causalidade olhando para o passado, ao tentar entender o CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 13 que aconteceu, ou em termos de antecipação das consequências dos atos. Para saber o que aconteceu é necessário reconstruir a sequência dos atos; para achar quem é o responsável é necessário saber quais as capacidades preditivas dos potenciais causadores. - ÉMILE DURKHEIM: . Reciprocidade entre causa e efeito – existência de um ciclo vicioso (a causa alimenta o acontecimento, que alimenta a causa). Só é possível distinguir causa e efeito por termos cronológicos, o problema é saber até onde retroceder para achar o responsável. - MAX WEBER: . Causalidade adequada: vai indicar que esta causa adequada é aquela que reúne mais condições de produzir o efeito. . Necessidade de usar a imaginação para supor como os fatos teriam se desdobrado se uma das causas fossem retiradas. Utilizando o método de exclusão de causas, imagina-se que um comportamento não aconteceu e, se o resultado final continuar acontecendo, esse comportamento não é causa; se o resultado não acontecer mais, esse comportamento é causa. . A + B + C = D ----------- A + C = D? Se sim, B não é causa, se não, B é causa. - PAUL RICOUER: . Se baseando em Weber, ele vai dizer que não consegue determinar como seria exatamente nas leis naturais uma certeza de que o resultado vai seguir a causa. 7) O RESULTADO DA CONDUTA: . As condutas podem ter dois tipos de resultados: o naturalístico (transformação do mundo exterior) e o jurídico (ofensa ao bem jurídico). . No crime material o resultado naturalístico é necessário para consumação. – Crimes como homicídio, furto, roubo, em que o resultado (morte ou subtração de bem material) são indispensáveis para considerar o crime consumado. . Nos crimes formais, o resultado naturalístico é previsto, mas desnecessário para a consumação. – São aqueles que preveem o resultado, mas não exigem a ocorrência deste para consumação do tipo. – CORRUPÇÃO ATIVA (uma pessoa que oferece propina para um funcionário público, comete crime de corrupção ainda que o funcionário não aceite). . Nos crimes de mera conduta, não precisa e nem prever no tipo penal o resultado naturalístico, pois pode nem acontecer. Não existe tentativa. - Exemplo: porte ilegal CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 14 de arma (posso não ter machucado ninguém, nem mesmo ter mostrado para ninguém). . Já o resultado jurídico TODO CRIME TEM, pois ele é a ofensa ao bem jurídico protegido. Essa ofensa pode ser por dano ou perigo. – Quando o crime é de dano significa que ele causa uma transformação no mundo; de perigo, ele não destrói/deteriora o bem jurídico protegido, mas coloca em risco.. Pode haver conduta prevista em lei como crime COM resultado naturalístico e SEM resultado jurídico? Eu posso ter conduta prevista em lei como crime COM resultado naturalístico e SEM resultado jurídico SIM, mas ela NÃO será crime. – Caso da insignificância penal - Ou seja, tem resultado naturalístico (transformação do mundo exterior, pela inversão da posse de um objeto) mas não tem resultado jurídico (o valor do objeto é insignificante e, portanto, o ato não é penalmente relevante). 8) NEXO DE CAUSALIDADE: . Nos delitos de resultado deve-se indagar a respeito da existência de um nexo de causalidade entre a ação do agente e o resultado produzido. Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido (conditio sine qua non). . Todo fator que contribui, de alguma forma, para a ocorrência do evento é causa desse evento. Causa, para essa teoria, é a soma de todas as condições, consideradas no seu conjunto, produtoras de um resultado. . Em oposição a teoria de Weber, temos a Teoria da Equivalência das causas (conditio sine qua non) que é a adotada pelo direito brasileiro: qualquer causa, mesmo que não seja a mais adequada/importante, que interfira na produção do resultado, é tratada como causa = pode haver multiplicidade de causas. – Isso é irrelevante em causas mais simples, mas ao falar de situações como explosão em Beirute, rompimento da barragem de Brumadinho etc. eu irei encontrar várias causas. . O Direito brasileiro adota essa Teoria da Equivalência das causas, por causa dessas situações mais complexas, pois têm-se nela sum conjunto de causas, que sozinhas não produziram resultados, mas somadas produzem. – Para saber se o resultado ocorreria ou não, temos que utilizar o juízo hipotético de exclusão (tira a causa em questão e ver se o resultado teria ocorrido ou não). – CADA COMPONENTE É CAUSA, E CADA CAUSADOR É RESPONSÁVEL. – CONCAUSAS. . Risco do regresso ao infinito das causas: preciso de um controle que é feito pelo próprio sistema de justiça. – O controle se dá quando analiso se aquela pessoa cometeu um risco permitido ou não. – PROCURA-SE LIMITAR O ALCANCE DESSA TEORIA, PARA QUE ELA NÃO LEVE AD INFINITUM A PESQUISA DO QUE SEJA CAUSA. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 15 . KELSEN: A causalidade realmente é infinita, não tem ponto inicial nem terminal, mas a imputação jurídica tem. . Superveniência das causas – a pessoa pretendia matar a outra, disparou, mas não sabíamos se o socorro ia ser eficiente ou não, mas a vítima morreu pelo acidente de trânsito com a ambulância – quem atirou responde por tentativa. – TUDO DEPENDE DA CAUSA MORTE (exemplo: se a causa morte envolve hemorragia pelo disparo, eu respondo; se a causa morte por outro lado for traumatismo craniano em virtude do acidente de carro, respondo como tentativa). . Superveniência da causa relativamente independente: exclui o nexo causal, a pessoa só responde pelo ato praticado – Tentativa de homicídio, e não homicídio consumado. - LOCALIZAÇÃO DO DOLO E DA CULPA NO TIPO PENAL: . Toda conduta que não for orientada pelo dolo ou pela culpa estará na seara do acidental, não podendo configurar crime, situando-se fora, portanto, do alcance do Direito Penal material. Uma pessoa pode ter dado causa e determinado resultado, e não ser possível imputar-lhe a responsabilidade desse fato, por não ter agido nem dolosa nem culposamente, isto é, não ter agido tipicamente. - CAUSAS ABSOLUTAMENTE INDEPENDENTES: . Causas preexistentes, concomitantes ou supervenientes à conduta podem auxiliá-la na produção do evento ou produzi-lo de maneira total, absolutamente independente da conduta que se examina. Para saber se a conduta contribuiu para a produção do evento, faz-se o juízo hipotético de eliminação. Se for, a causalidade da conduta é excluída. . Exemplo: quando alguém, pretendendo suicidar-se, ingere uma substância venenosa e, quando já está perto de morrer, recebe um ferimento, que não apressa sua morte, que não determina e nem a teria causado. Nesse caso, o ferimento não é causa resultado da morte. - SUPERVENIÊNCIA DE CAUSA RELATIVAMENTE INDEPENDENTE QUE, POR SI SÓ, PRODUZ O RESULTADO: § 1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou. . Responde por tentativa. . Quando alguém coloca em andamento determinado processo causal pode ocorrer que sobrevenha, no decurso deste, uma nova condição que, em vez de se inserir no fulcro aberto pela conduta anterior, provoca um novo nexo de causalidade. Embora se possa estabelecer uma conexão entre a conduta primitiva e o resultado final, a segunda causa, superveniente, é de tal ordem que determina o acontecimento do resultado, como se tivesse agido sozinha, pela imprevisibilidade da sua ocorrência. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 16 . EXEMPLO: uma pessoa, que foi ferida por “A”, é levada ao hospital para ser medicada, mas a ambulância que a conduz envolve-se em um acidente de trânsito, projetando a vítima, que bate a cabeça no meio-fio da calçada e morre. Nesse caso, a segunda causa, superveniente e relativamente independente, produziu, por si só, o resultado morte. - RELEVÂNCIA CAUSAL DA OMISSSÃO: . O crime omissivo consiste sempre na omissão de determinada ação que o sujeito tinha a obrigação de realiza-lo e que podia fazê-lo. . Omissão = ação diversa da prescrita. . Existem dois tipos de omissão: . Omissão imprópria (temos garantidor – dever de cuidado, proteção ou vigilância prevista no Art. 13, PAR 2º, do CP. O agente responde como se tivesse produzido o resultado (por isso, comissivo por omissão). –UM DESCONHECIDO VER uma criança se afogando numa piscina rasa tem o dever de ajudar principalmente quando isso não confere prejuízo/perigo próprio, MAS algumas pessoas tenham mais dever ainda quando diz respeito aos pais/salva-vidas etc. ENTÃO RESPONDE POR HOMICIDIO DOLOSO. . Omissão própria (não é garantidor – dever de solidariedade mínima prevista em alguns tipos específicos do CP no Art. 135 e da legislação extravagante no Art. 13 da Lei 10.826/2003). O agente responde pela própria omissão. – RESPONDE POR OMISSÃO DE SOCORRO QUALIFICADA pela morte quando uma criança morre afogada numa piscina rasa e a pessoa no lugar de UM DESCONHECIDO (não garantidor) deixa de prestar socorro. – . Em ambas tenho o descumprimento de dever = solidariedade. . ARTIGO 13 CP: Relevância da omissão: § 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (pais, tutores, curadores etc.) – responsabilidade contratual ou informal (criança que vai passar o FDS na casa do amigo, e então os pais do amigo assumem a responsabilidade). b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; ( exemplo: pessoa que convida a criança para um ambiente e não cuida responsavelmente dela) – no momento em que a empregada leva a criança pra casa da patroa e ela aceita, ela se torna responsável também pela criança. c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. - OMISSÃO DE SOCORRO: CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 17 Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, seda omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte. IMPUTAÇÃO OBJETIVA 1 – CRITÉRIOS DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA PARA CLAUS ROXIN: . Teoria da imputação objetiva (reconhecimento de que algum nível de risco é necessário para que a vida evolua) não tem previsão no Código Penal. . Se você punir todas vezes o risco, você deixa de ter progresso. Mas, para isso, preciso estabelecer quais os tipos de riscos são aceitáveis e não responsabilizados ainda que causem prejuízos. – Risco que ninguém controla (exemplo: pandemia) X risco que você corre para buscar um resultado, sendo que foi outro agente que gerou. . De que maneira o resultado danoso ocorreu com violação do risco permitido. a) CRIAÇÃO DE UM RISCO RELEVANTE NÃO PERMITIDO: . Há algumas decisões do STJ reconhecendo a teoria da imputação objetiva no Brasil. . Exemplo: nem todo acidente de trânsito você irá punir todos os envolvidos, pois existem pessoas que estão no âmbito do risco permitido. . Determinado grau de risco que precisa ser corrido. – Direito penal deve deixar claro quando vai agir e pra quem, quando há um risco no âmbito permitido. . Identificar se a conduta praticada pelo agente infringe alguma norma do convívio social e pode ser valorada como tipicamente relevante. Se trata de uma conduta perigosa, não coberta pelo risco permitido. b) REALIZAÇÃO DO RISCO DO RESULTADO: . A teoria da imputação objetiva as vezes dá respostas diferentes para problemas já resolvidos por outras pessoas. . Exemplo: no mercado financeiro ter o prejuízo do investimento em um momento como o que estamos vivendo, que faz as ações de uma empresa caírem absurdamente, não vai ser a pessoa x que investiu a responsável criminal e civilmente, pois é um risco permitido. . Demonstrar se o resultado típico apresenta, precisamente, a realização do risco proibido criado ou incrementado pelo agente. c) RESULTADO PREVISTO PELA NORMA: . Resultado danoso deve estar previsto pela norma. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 18 . Imputação objetiva é diferente de responsabilidade penal objetiva. – Ninguém deve achar que a teoria imputação objetiva é uma expansão da responsabilidade, pois ela é em si uma restrição, pois depois de verificar tudo isso é que vou analisar se a pessoa será culpada por dolo ou culpa. . Imputação objetiva se verifica DEPOIS da relação de causalidade e antes da tipicidade. . Não se pode imputar o resultado à conduta se a norma de cuidado era insuficiente ou inadequada para evitar o resultado finalmente produzido. 2 – IMPUTAÇÃO OBJETIVA PARA GUNTHER JAKOBS: a) RISCO E COMPORTAMENTO SOCIAL: . Direito que busca tornar a vida mais previsível, o que não significa torná-la sem riscos. – Definir quais os riscos que precisam ser corridos e que nos preparemos para ele, mas também para responsabilizar o sujeito quando ele extrapola nesse risco. . Ajudar a diferenciar os riscos aceitáveis e não aceitáveis, e os que se dão na interação de um com o outro. . O risco é necessário no comportamento, já que está relacionado com a ideia de progresso material. . Quando o médico faz um tratamento ele sabe que todo tratamento traz algum tipo de risco. Mas, é uma avaliação de risco necessário para se alcançar a cura etc. b) TIPOS DE RISCO PERMITIDO: . Risco permitido pela legitimação histórica – Riscos que vão sendo corridos por uma prática de legitimação histórica, até que se deparem com um problema fruto deste, e então comecem a ponderar vantagens e desvantagens destes, para então mudar o protocolo. - Exemplo: um dos remédios mais utilizados para enjoos, depois se comprovou que possuía um alto risco de causar má formação fetal, a talidomida. - O exemplo da barragem de Brumadinho, em que se optou por uma espécie de barragem (barragem a montante) que até então não vinha causando prejuízos, formado pelo próprio rejeito mineral, mas que sendo mais vantajosa economicamente, estava suscetível a isso, tal qual aconteceu nesse episódio de Brumadinho. – SITUAÇÕES QUE NO PASSADO ERAM DITAS COMO PROGRESSO. – Exemplo: utilização de minas terrestres; outro exemplo é o cinto de segurança de dois pontos, antigamente o único cobrado, sendo que o de 3 pontos é mais seguro. . Risco permitido pela ponderação de vantagens e desvantagens – PONDERAÇÃO ENTRE OS RISCOS E OS PROGRESSOS É POSITIVO OU NEGATIVO. – Seria bom se todos os riscos permitidos fossem eleitos assim após uma ponderação entre vantagens e CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 19 desvantagens, contudo na prática a maioria dos riscos vão sendo corridos por legitimação histórica. c) POSIÇÃO DOGMÁTICA DO RISCO PERMITIDO: . Momento de verificar se existe risco proibido ou permitido depois da relação de causalidade e antes da relação de tipicidade penal. . CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 20 . Julgado importantíssimo para estabelecimento do risco permitido. . Teve o acidente marítimo, precisava de alguém para descer. – O mergulhador recebeu as coordenadas do engenheiro, e ao final ele acabou morrendo, não sabemos aqui se foi por alguma explosão/substância tóxica etc. O engenheiro foi então acusado por homicídio culposo – MAS, se o engenheiro explicou todos os riscos, deu todas as orientações e confiou no próprio mergulhador, ele não aumentou em nada os riscos que já existiam, logo ele não é responsável, mesmo que sua conduta tenha nexo de causalidade com a morte do nadador. . Discussão do nexo causal e a discussão do risco permitido. – O próprio mergulhador precisa correr riscos na execução de suas atividades. d) CASOS BÁSICOS DE RESPONSABILIDADE PARA JAKOBS: . Pela ampliação da esfera organizatória: conduta omissiva dolosa. . Pela infração de dever de cuidado: conduta omissiva culposa ou omissiva de qualquer natureza. e) EXTRAPOLAÇÃO DO RISCO PERMITIDO: . INFRAÇÃO A OUTRAS ESFERAS DO ORDENAMENTO JURÍDICO – Exemplo: legislação de trânsito, respeitar o sinal, dar preferência, não ultrapassar em lugar proibido, não se deslocar pelo acostamento, tudo isso são normas de trânsito que quando descumpridas informam ao decisor uma extrapolação do risco permitido. A questão é que mesmo após fazer tudo isso, existe a possibilidade de não ter gerado um resultado danoso, não permite que se faça presente um dos elementos da imputação objetiva. Assim, só se terá uma multa ou no máximo um crime de perigo por direção perigosa (previsto na norma penal). – Outro exemplo: uma idosa foi atropelada, o motorista cometeu crime? Se ele cumpriu todas as regras, ele estava dentro do risco permitido. . INFRAÇÃO À LEX ARTIS (regras da profissão, arte ou ofício) – Exemplo: protocolos médicos – Protocolos não existem por acaso, são extremamente necessários para que não aconteçam problemas. Determinar protocolos é reduzir o risco de CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 21 imperfeição. – Se um médico segue todo o protocolo, faz todos os exames/medicações/tratamentos necessários e ainda assim a pessoa morre, ele não será responsável pela morte do paciente. Nos casos em que o médico teve tomar alguma decisão de última hora para salvar o paciente e ainda assim ele morre, se faz necessário que se levem consideração etapas de “se existe conduta; essa conduta ter nexo de causalidade; o risco gerado pela conduta e que provocou o resultado seja proibido”, e depois disso é que se conclui se gera ou não responsabilização penal para o agente. Da mesma forma, se o mergulhador do exemplo acima tivesse seguido todo o protocolo e ainda assim causasse um dano a alguém lá embaixo ou na superfície, ele não seria responsabilizado. . INFRAÇÃO A SISTEMASDE REGULAÇÃO INFORMAL – regras costumeiras adotadas para evitar problemas, mas que são menos sofisticadas/ formalizadas do que as outras. Um exemplo seria a norma geral de imprudência. . NÃO ATIVAÇÃO DE CAPACIDADE ESPECIAIS DO AGENTE – existem situações em que a pessoa precisa ativar suas capacidades especiais e, se não fizer, irá responder por omissão. Exemplo: médico no avião que não se assume como tal no momento em que um passageiro passa mal, ele responderá por omissão qualificada. Outro exemplo, é um chefe gastronômico que experimenta as PANCS (plantas alimentícias não convencionais), que precisam de um tempo para estarem prontas para o consumo, livres das toxinas. O chefe deixa as plantas na mesa sem tratá-las, e o garçom, que também é formado como biólogo, leva para mesa sabendo que são plantas perigosas. O chefe de cozinha irá responder, mas e o garçom? Por uma interpretação a risca da teoria da imputação objetiva, ele não responde, pois só responderá quando lhe forem exigidas o uso de suas capacidades (ativação da capacidade especial exigível) e ele estava. . EXCLUSÃO DA IMPUTAÇÃO PELA CONFIANÇA PERMITIDA - Confiança permitida: o agente está autorizado a esperar que a outra pessoa vai agir dentro das regras determinadas pelo papel social/profissão dele. – Quando um enfermeiro ministra, a pedido de um médico, um medicamento e o paciente passa mal e morre, só estaria excluído no caso do enfermeiro a CULPABILIDADE, o ato seria típico/antijurídico, só não seria culpável por conta da obediência hierárquica. – A teoria da imputação objetiva exclui a própria tipicidade do ato, devido a confiança permitida em que, neste caso, o enfermeiro confiou no papel social do médico ao passar a medicação. . Um gera resultado danoso, porque confiou no comportamento do outro. ENTRETANTO, quem confiou não violou o risco. . EXCLUSÃO DA IMPUTAÇÃO PELA PROIBIÇÃO DO REGRESSO – a imputação não pode regredir até “adão e eva”. A sequência da causalidade é interminável, de Adão e Eva ao Apocalipse, mas a imputação só pode retroceder até um ponto onde se tenha vinculação subjetiva. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 22 . EXCLUSÃO DA IMPUTAÇÃO PELO ACORDO – o consentimento do ofendido pode excluir a tipicidade ou ilicitude. – Consentimento do ofendido: se alguém irá fazer uma doação de órgãos, por exemplo, isso é uma lesão corporal feita com o consentimento do ofendido. . Outro exemplo um pouco diferente são as lesões esportivas (MMA, BOXE etc.), que são por vezes tratadas como consentimento do ofendido. Consentimento: o lutador de MMA não consente que o outro lhe bata. O que ele está é de acordo com o risco, e não com o resultado. . Esse ponto 1 trata da INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA – processo penal. – Preciso pontuar quem fez o quê. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 23 RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA . O crime ambiental é o único em que há previsão expressa no direito brasileiro, de responsabilização da Pessoa Jurídica. . A Pessoa jurídica responde civilmente por qualquer dano que ela provoque. Mas, a responsabilidade penal começou a ser cogitada justamente porque ficava muito identificar quem era o autor Pessoa Física responsável por situações como a da barragem de Brumadinho. A Doutrina então foi levantando alguns empecilhos para isso. . Pessoa jurídica tem conduta? Tem vontade? Como consigo determinar isso? Nem todos os atos praticados pelas pessoas que compõem a Pessoa Jurídica, são atos da Pessoa jurídica, a questão é como restringir isso. . As vezes é mais vantagem criminalizar a Pessoa Jurídica sem o DP do que com ele. . Vontade: o crime vai ser doloso se o fim for criminoso. O crime vai ser culposo se os meios tomados forem criminosos, mesmo que o fim não seja. . Como saber a vontade da Pessoa Jurídica? Os fins que ele busca (lucro etc.). Ato de vontade de uma empresa é uma decisão de um órgão gestor da empresa. . Conduta: essa conduta tem que ser em benefício da empresa. . Culpabilidade: quando a sociedade tem uma conduta socialmente reprovável. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 24 . Punibilidade: penas aplicáveis e penas não aplicáveis. Quando uma empresa tem finalidade criminosa o Direito Penal usa a desconsideração da Pessoa Jurídica e liquidação total. . Surgiu a necessidade de construir um sistema de responsabilização da Pessoa Jurídica. Claro que só isso não é o suficiente, pois não basta está previsto só na CF. . Muito parecidas com o que seriam as sanções civis. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 25 . O Direito Penal não pode ser perpétuo na Pessoa Jurídica, assim como também não o é na Pessoa Física. . Na prática é uma pena de morte, e é como tal assim aceita, porque se considera que a empresa não existia, uma declaração de inexistência jurídica da empresa. . Na responsabilidade civil, você atinge primeiro o patrimônio da empresa e como regra preserva o dos sócios/particular, desde que a empresa tenha sido constituída legalmente e que tenha um capital apropriado para arcar com suas obrigações e nos casos de confusão/abuso você desconsidera para recuperar os lesados e consertar os abusos. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 26 . No Direito Penal, não se trata nem de desconsiderar a Pessoa Jurídica, mas de desconstituí-la, liquidá-la quando ela é uma empresa de fachada, constituída para comer o crime ambiental. . Até esse julgamento, os tribunais e o STJ entendiam que só podia se processar a Pessoa Jurídica caso se processasse a Pessoa Física também (exigia-se uma simultaneidade da responsabilização). A partir desse caso, o STF então entendeu que o Art. 225 da CF, não condiciona a responsabilização da Pessoa Jurídica a simultânea percepção da Pessoa Física. . Exemplo: No caso de Brumadinho, a Vale do Rio Doce, será ré nesse processo por crime ambiental independentemente de se ter encontrado qualquer responsável. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 27 CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 28 TIPICIDADE PENAL . Um tipo não é uma unidade, algo singular, não é um indivíduo, mas sim um conjunto de objetos, indivíduos, eventos. . Um tipo é uma abstração e uma generalização a partir de características comuns entre esses vários tipos de objetos/eventos/indivíduos. Mas, sempre que generalizo eu excluo particularidades, em nome de elementos comuns ao conjunto. Existe o risco de deixar coisas muito importantes “de fora”. . Tipo é a reunião de elementos comuns a um grupo de fenômenos. Todo tipo é dotado de generalização, redução de complexidades e representatividade. 1) TIPOS DE TIPO: . Tipo empírico (“média”): baseado na observação dos comportamentos na realidade. As características distintivas e comuns me permitem fazer uma “média”. . A depender do tipo que eu companha a média eu componho o ESTERIÓTIPO. Se é depreciativo, perjorativo, precipitado, inexato, superficial, limitante, etc. . Esteriótipo: Levam algumas caractériscas ao limite/exacerba e não evidenciam as outras. – E essas características tendem a ser perjorativas ou ao menos ríziveis. . Ó pai ó é um exemplo clássico dos inúmeros esteriótipos traçados sobre o baiano. . Tipo ideal (“modelo”): não se tem uma observação do conjunto, mas sim uma especulação sobre quais são as boas qualidadesou as qualidades ideias dos membros daquele grupo. – Se tem então o ARQUÉTIPO. . Arquétipo é o tipo perfeito. . Para se falar de Ivete, Gil, Bethânia como arquétipos baianos, seriam dizem que são os individuos reais que mais se aproximam do arquétipo. Para tal, precisaria dizer quais as características que tornam aquela figura o mais próximo deste “arquétipo”. . A legislação procura um conjunto de conjuntos sociais que são considerados indesejáveis/maléficos, e vai construir um modelo abstrato de conduta para proibi- lo. – CONSTRUÇÃO DE UMA ABSTRAÇÃO A PARTIR DA MÉDIA DE COMPORTAMENTOS, DO TIPO EMPÍRICO. – Busca tipos no que a sociedade aprova e reprova. 2) TIPO PENAL E TÉCNICA LEGISLATIVA: . Tipo penal é composto por – demoniação legal do crime (nomen juris) + descrição abstrata da conduta (preceito primário) + cominação abstrata da pena (preceito secundário). CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 29 . As penas . NOMEN JURIS (nome em negrito que vai em cima do artigo e nomeia o crime) – denominação legal do crime. . Quase todo tipo penal é encabeçado por um Nomen juris. . NÚCLEO DO PRECEITO PRIMÁRIO DO TIPO (VERBO NO INFINITIVO): é a descrição abstrata da conduta. – O núcleo propriamente dito que é no infinitivo. – Exemplo: matar, subtrair etc. . Tipo misto alternativo: . Quando o preceito primário tem mais de um verbo/núcleo. . Tipo misto cumulativo: na prática um crime com 3 condutas diferentes e cada um é um crime separado. . ABERTURA DO TIPO: todo texto precisa ser interpretado por mais claro que ele pareça ser. Mas, existe casos em que a margem de interpretação é muito grande, seja isso por intenção do legislador, ou má formação legislativa. – Essa abertura é ruim para a legalidade penal. . Gera um problema pra legalidade e dentro dessa legalidade um problema para os 3 subprincípios: RESERVA LEGAL, IRRETROATIVIDADE E TAXATIVIDADE. . Abertura do tipo é diferente de incompletude do tipo. . Os critérios de distinção entre tráfico e uso, que estão previstos no art. 28, PAR 2º, da Lei 11.343/2006 podem ser até entendidos como elementos abertos, mas eles não são "lei em branco" porque não há nenhum complemento dizendo que "até a quantidade x é uso". Em Portugal, por exemplo, é diferente, pois o uso é ter consigo quantidade de droga para até dez dias de consumo, e a média diária de consumo é determinada numa portaria conjunta dos Ministérios da Saúde e da Justiça. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 30 . LEI PENAL EM BRANCO: preceito primário INCOMPLETO o que é diferente de ABERTO, já que com o complemento, ele é fechado. . "Drogas" é um termo relativamente indeterminado, como tantos outros, mas, além disso, a lei é lei penal em branco quando ela própria diz que será complementada por outro dispositivo. - "Drogas são substâncias ou produtos capazes de causar dependência, ASSIM ESPECIFICADOS em lei ou em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União". ART. 1º, PAR 1º, DA LEI 11.343/2006. . ESTRUTURA DO PRECEITO SECUNDÁRIO: parte do tipo em que informa qual é o tipo de pena e as quantidades mínima e máximas da pena. . Podem ser penas cominadas isoladamente, cumulativamente (exemplo: reclusão de 20 anos E multa) ou alternativamente (uma pena ou outra pena). . Direitos e Pena Pecuniária são os tipos de pena. As espécies são - na privação de liberdade, reclusão, detenção e prisão simples. Nas restritivas de direitos, são prestação de serviços à comunidade, interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana. Nas penas pecuniárias, temos multa e prestação pecuniária. - Essas modalidades todas estão previstas na Constituição e nas partes gerais do Código Penal e de algumas leis extravagantes. . "Preceito secundário" é o que acompanha, nas partes especiais do Código e da Leis. Cada preceito primário de cada crime, e que preveem alguma(s) dessa(s) vária(s) espécies de pena previstas na Constituição ou na parte geral. . As medidas de segurança não estão previstas nas partes especiais, só na parte geral, e são aplicáveis (internação ou tratamento ambulatorial) em qualquer crime, quando o sujeito é reconhecido como inimputável. E a escolha entre esse tipos (internação ou tratamento ambulatorial) é feita de acordo com a pena cominada na parte especial. Coisa semelhante ocorre com as penas restritivas de direitos do Código Penal. Elas só estão previstas na parte geral, e entram como substitutivas das penas previstas os preceitos secundários, na hora da dosimetria, quando cumpridos os requisitos. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 31 CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 32 . Tipo penal expressamente subsidiário: A pena só incide se este ato não for previsto em uma modalide mais grave. . Como sei se estou diante do estupro ou diante da importunação sexual? Já que os atos sexuais não estão relacionados (embora devessem pelo menos na forma mais grava do crime), deveria se restringir o estupro ao contato genital/anal, fora dessas hipóteses não entraríamos no estupro. Mas, o legislador não fez isso. . Criou o tipo intermediário aberto de forma subsidiária, mas não fechou o tipo mais grave, o estupro. Então, ficaram dois tipos abertos. A única diferença se o ato envolveria violência ou não. 3) FUNÇÕES DO TIPO PENAL: . INDICIÁRIA: quando estamos diante de um tipo de penal, estamos diante de uma informação que um comportamento social indesejável está descrito. – Nem sempre um comportamento social indesejável é criminoso. – Um comportamento social pode ser indesejável em um contexto, e aceitável em situações excepcionais. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 33 . Matar alguém é um comportamento social reprovado, mas pode ser aceito em situações excepcionais, excludentes de ilicitude, como em legítima defesa. - Mesmo quando se exclui a ilicitude, é um comportamento que se lamenta. . Existem casos que são supralegais, embora também limitados, que não tem previsão legal para essa exclusão de ilicitude. . DE GARANTIA: indica que só os comportamentos socialmente indesejados que tenham sido tipificados podem ser punidos. 4) ELEMENTOS DO TIPO PENAL: . Subjetivos (dolo ou culpa) X objetivos (aspectos exteriores da ação): . Subjetivos: Os tipos penais são em regra dolosos (quando não dizem nada sobre si próprios). – Art. 18 do Código Penal. – O dolo é o grande elemento implícito do tipo penal. . Objetivos: circunstâncias elementares do tipo. . Matar alguém – elemento subjetivo (dolo), implícito nessa descrição. / Matar alguém – elementos objetivos (aspectos exteriores da ação) “matar” e “alguém” – verbo ou objeto. - Por exemplo, "alguém" é elemento OBJETIVO do homicídio, portanto circunstância elementar. Já "homem" não é elemento objetivo do homicídio, já que "alguém" envolve ser humano de qualquer gênero. . "Mulher" pode ser elemento objetivo de um tipo específico de homicídio qualificado, que é o feminicídio, mas, para sê-lo, exige, além disso, que se tenha ou um elemento subjetivo especial ("menosprezo à condição de mulher") ou um elemento objetivo adicional ("contexto de violência doméstica"). . Por exemplo, "recém-nascido" é uma condição muito específica, mas é objetiva porque é exteriormente observável. Já a "influência do estado puerperal" é um elemento subjetivo especial da mulher, é um estado de ânimo alterado. . Quem adquirir, trouxer consigo, guardar, tiver em depósito ou transportar drogas, para consumo pessoal, sem autorização legal ou regulamentar, aqui "para consumo pessoal" é um elemento subjetivo especial do tipo, osdemais são elementos objetivos. . Aspecto interno da ação - Cogitação, planejamento, preparação - aqui você encontra os elementos subjetivos. / Aspecto externo da ação - Execução, consumação, exaurimento - aqui você encontra os elementos objetivos. . Descritivos x normativos: CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 34 . Descritivo: são aqueles que não dependem de uma complementação legal para defini-los, valem-se apenas da linguagem comum. . Normativo: dependem de algum sistema normativo para completar sua definição. 5) TIPICIDADE FORMAL: . SUBSUNÇÃO DO FATO: quando um fato se encaixa ao conteúdo da norma, ou seja, quando possui todos os elementos do tipo. . SOLUÇÃO DO CONCURSO: . Especialidade - quando um tipo penal contém todos os elementos de outro tipo e mais um elemento especializador – Exemplo: o tráfico de drogas é especial com relação ao contrabando porque possui todos os elementos do tipo geral (importação de mercadoria proibida) mais o elemento especializador (não é qualquer mercadoria proibida, é droga) . Subsidiariedade - um tipo só incide, quando não há nenhum outro aplicável ao mesmo fato. . Consunção - crime fim absorve o crime meio. Exemplo: O crime de falsidade com relação ao crime de estelionato; O crime de violação de domicílio com relação ao crime de furto. 6) TIPICIDADE MATERIAL: avalio o conceito material de crime (ofensa relevante a bem jurídico protegido). . EXCLUSÃO PELA INSIGNIFICÂNCIA (Roxin): A questão da insignificância é que, independentemente do motivo, a ofensa é tão pequena, tão ínfima, que não justifica movimentar a máquina do Estado para punir uma coisa desimportante. – CUSTO X BENEFÍCIO. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 35 . Não justifica utilizar o DP para um ponto irrelevante. . EXCLUSÃO PELA ADEQUAÇÃO SOCIAL (Welzel): Exemplo: mãe que fura a orelha da criança para colocar um brinco, isso é lesão corporal leve, mas é. Não é considerado crime por conta da adequação social. – Tentam expandir essa teoria para outros casos. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 36 7) TIPICIDADE CONGLOBANTE: . Ideia trazida por Zaffaroni e que segundo é ele é uma aplicação da Teoria do Ordenamento Jurídico aplicada ao Direito Penal. . O Direito Penal só vai tratar como típico um comportamento quando ele não estiver determinado em outra lei. . O Direito não pode obrigar e proibir ao mesmo tempo, pois estaríamos diante de uma antinomia. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 37 INTER CRIMINIS E TENTATIVA É o itinerário percorrido pelo crime, desde o momento da concepção até aquele em que ocorre a consumação. É a cogitação, planejamento, preparação, execução, consumação e exaurimento. Exemplo: La casa de papel. 1) O PROCESSO EXECUTIVO DA INFRAÇÃO PENAL: . Cogitação: elaboração mental da resolução criminosa que começa a ganhar forma, debatendo-se entre os motivos favoráveis e desfavoráveis, e desenvolve-se até a deliberação e propósito final, isto é, até que se firma a vontade cuja concretização construirá o crime. . Planejamento: do ponto de vista intelectual, o desenho do plano criminoso. – Exemplo: pensar que arma vai usar, qual a rotina da vítima etc. . Preparação: reunião dos meios e recursos para prática do ato previsto no tipo. – Exemplo: adquirir a arma, dirigir-se até o local. . Execução: atos que dirigem-se diretamente a prática do crime. . Consumação: realizar todos os elementos previstos no tipo penal. . Exaurimento: também chamado de pós fato impunível. – Não é punível, exceto quando previsto como crime autônomo. Exemplo: lavagem de dinheiro. . Cogitação, planejamento e preparação não são puníveis, exceto quando previstos como crime autônomo. Exemplo: cogitar e planejar matar alguém, preparando-se com a aquisição e munição não configura tentativa de homicídio, mas pode configurar porte ilegal de arma, se a pessoa não possuir a devida licença. . “Art. 31 – O ajuste, a determinação ou instigação, e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado.” . Art. 14 - Diz-se o crime: Crime consumado I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal; Tentativa. II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Pena de tentativa. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 38 . Apontar a arma para alguém pode ser considerado início da execução do crime de roubo. Mas, se for olhar com um olhar mais crítico em relação ao crime de homicídio, ele só pode ser assim considerado quando a arma dispara. . Consumação é diferente de resultado. – Existem crimes que não dependem do resultado naturalístico para se consumar. . No tráfico de drogas existe o núcleo típico "vender" (que é material), o núcleo típico "expor à venda" (que é formal, e seria a tentativa do ato de vender, mesmo que ninguém compre) e o núcleo típico "transportar" (que seria o ato preparatório do núcleo típico "vender"). Esse núcleo típico "transportar" é de mera conduta. "Guardar" é mais claro ainda enquanto núcleo de tipo de mera conduta. 2) TENTATIVA . É a realização incompleta do tipo penal. Há prática de ato de execução, mas o sujeito não chega à consumação por circunstâncias independentes de sua vontade. A) ESPÉCIES: . Imperfeita: Você executa uma parte da conduta necessária para a produção do resultado, mas não realiza toda ela. Você é interrompido. – Exemplo: uma pessoa está tentando matar a outra a golpes de faca, e é interrompida por alguém, sem conseguir concluir. . Perfeita (crime falho): O agente praticou todo o ato, mas o terceiro que interferiu conseguiu evitar a consumação, salvando a vítima. – Exemplo: envenenamento de alguém e ela consegue ser salva por tratamento médico a tempo, sobrevivendo. . A conduta foi praticada inteiramente pelo agente, mas o crime não se consumou porque a vítima foi socorrida a tempo. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 39 . Pela lei, a pena da tentativa é a pena do crime consumado, reduzida de um a dois terços. A doutrina discute como quantificar essa pena quanto mais próximo o ato chegou da consumação, a pena terá uma redução menor, então ficará mais próxima da pena do crime consumado. B) CRIMES QUE NÃO ADMITEM TENTATIVA: . Tráfico privilegiado é o do art. 33, PAR. 4º, da Lei 11.343/2006, que é a causa de redução de pena quando o agente é primário, tem bons antecedentes, não se dedica a atividades criminosas nem integra organização criminosa. O STF decidiu no HC 118.533 que a modalidade privilegiada do tráfico não é hedionda. Na lesão corporal seguida de morte a pena é de 4 a 12 anos. Na tentativa de homicídio qualificado, a pena é de 4 (12 com redução de 2/3) a 20 (30 com redução de 1/3) anos. Ou seja, se o agente recebe uma pena de 6 anos de reclusão por lesão corporal seguida de morte ela é menos severa, na prática, do que uma pena de 6 anos por tentativa de homicídio qualificado porque a lesão seguida de morte não é hedionda. . A progressão de regime na lesão seguida de morte é com 25% da pena (não hediondo com violência ou grave ameaça) se o agente for primário. . A progressão de regime na tentativa de homicídio qualificado é com 40% da pena (hediondo) se o agente for primário. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 40 . Por muito tempo entendia-se o seguinte: uma pessoa foi assaltada, subtraiu-seum objeto, mas se a polícia conseguiu prender o criminoso e recuperar o objeto a vítima, não se teria crime de roubo, e o dano a vítima seria somente o psicológico. Contudo, essa súmula do STJ, o roubo já está consumado se tirou o objeto da vítima ainda que por pouco tempo. Então, para ser tentativa o objeto não pode ser subtraído da vítima. . A pena do roubo, na modalidade simples é 4 a 10 anos significa que, para o tentado, seria de 1 anos e 4 meses (4 com redução de 2/3) a 6 anos e 8 meses (10 com redução de 1/3) Sendo que existem várias majorantes para o roubo: emprego de arma branca, de arma de fogo, de explosivo, concurso de agentes. A pena máxima do roubo pode passar de 15 anos mesmo sem morte da vítima. Já o latrocínio tem pena de 20 a 30 anos. 3) INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DO INTER CRIMINIS: . O iter criminis pode ser interrompido pela vontade do próprio agente. Isso acontece em alguns casos. É o que os doutrinadores antigos chamavam de “ponte de ouro” do Direito Penal. . Desistência voluntária: nos casos correspondentes à tentativa imperfeita. . Diferença entre voluntariedade e espontaneidade. A desistência não precisa ser espontânea (pedido que a própria vítima faz ao agressor para que ele sinta remorso e desista de continuar - um agente iria realizar um assalto de celulares em um ônibus, e uma das vítimas chora dizendo que trabalhou muito para comprar, que é pobre/batalhadora etc. O agente então se compadece e desiste; ou o medo da aproximação da polícia que estava em atividade de rotina e ainda não tinha visto o ato). . A desistência voluntária ocorre no meio dos atos executórios, por isso que ela corresponde à tentativa imperfeita. Já o arrependimento eficaz ocorre depois que todos os atos executórios já foram praticados, o crime ainda não se consumou, mas o agente consegue impedir que se consume. Se a pessoa age só no exaurimento, não é arrependimento eficaz pode ser arrependimento posterior. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 41 . A pessoa vai roubar um celular, mas, ao ver que é um iPhone, facilmente rastreado, desiste e vai embora. . Bezerra da Silva: O ladrão foi lá em casa e quase morreu do coração Já pensou se o gatuno tem infarto, malandro, e morre no meu barracão Eu só tenho uma cadeira quebrada e um jornal como colchão Eu só tenho uma panela de barro e três tijolos como fogão O ladrão ficou maluco de ver tanta miséria em cima de um cristão E saiu gritando pela rua "Pega eu, que sou ladrão" . Arrependimento eficaz: nos casos correspondentes à tentativa perfeita. . O agente após ter esgotado todos os meios que dispunha, arrepende-se e evita que o resultado aconteça. Isto é, pratica nova atividade para evitar que o resultado ocorra. Não é necessário que seja espontâneo, basta que seja voluntário. No entanto, o êxito é indispensável, ou seja, se o agente não conseguir impedir o resultado, por mais que tenha se arrependido, responderá pelo crime consumado. . Exemplo: o agente dá uma facada na vítima na intenção de matar, mas ao ver a pessoa sangrando no chão, se arrepende e leva a vítima para o hospital para realizar o socorro. . Natureza jurídica da interrupção voluntária do iter criminis: . A interrupção voluntária do iter criminis exclui a própria tipicidade da conduta. – O crime tentado e abandonado não é nem se quer típico, pois para ser típico na modalidade tentada, além de iniciada a execução, a interrupção tem que ser por ato voluntario do agente e não por ato alheio a sua vontade. . Arrependimento posterior: são praticados os atos executórios, consumado o ato e o arrependimento vem no exaurimento. . No código Penal – reduz a pena nos crimes não violentos. . Nos crimes tributários, previdenciários e na lavagem de dinheiro – isenta de pena. – Um dos casos em que a própria legislação penal desiguala pobres e ricos. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 42 CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 43 . Para Nicory: “Eu diria com segurança que os pobres cometem mais furtos que os ricos, mas os ricos comentem mais fraudes tributárias do que os pobres. A questão é que a sociedade vê com maior reprovação os crimes dos pobres, e o sistema atua de forma mais enérgica nesses casos, pelo menos em regra. . O mesmo cidadão que reprova o furto não se enxerga cometendo crime quando inventa uma despesa médica falsa para pagar menos imposto se considera inclusive fazendo "justiça" porque o Estado não lhe dá nada em troca. Mas esse argumento da "boa causa" e da "autodefesa" também pode ser usado pelo pobre que furta e diz que o fez porque não teve oportunidade. A questão é que a sociedade "engole" mais o argumento do sonegador do que do furtador. 4) CRIME IMPOSSÍVEL: . Pessoa pratica o crime executório, mas é um ato que não tem chance alguma de se consumar. Isso pode ser feito de duas formas: . Por absoluta ineficácia do meio: o meio é completamente inadequado para produzir o resultado pretendido pelo agente. Exemplo: tentativa de homicídio por envenenamento com aplicação de farinha em vez de veneno. . Tentar matar alguém com uma arma que ele não sabe que é de brinquedo, ou que tá sem munição porque alguém tirou as balas ao saber que ele a usaria para o crime. . Súmula 145, STF: não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação. . Ineficácia do meio = instrumento ou modo de execução. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 44 . Por absoluta inidoneidade do objeto: famosa história do tentar matar quem estava morto. – Exemplo: uma pessoa coloca uma bomba na casa da vítima, mas antes de explodir ela já estava morta por causa de infarto. Assim, a causa mortis foi o infarto e não a bomba. O agente irá responder por crime de explosão ou algo do tipo. . Flagrante preparado: polícia tem uma informação e se prepara para pegar o criminoso. . Flagrante esperado: a polícia incita o criminoso a praticar a conduta criminosa. – Exemplo: policial que vai comprar droga. ELEMENTOS SUBJETIVOS DO TIPO 1) DOLO: . Dolo e culpa são questões discutidas ainda no âmbito da tipicidade. . Para que alguém seja visto como responsável por um crime, é preciso que se estabeleça um vínculo subjetivo com o fato: dolo e culpa. . Os crimes em regra são dolosos, mas excepcionalmente podem ser culposos. . Dolo nos leva logo a ideia de intenção. Mas, nem todo crime doloso preenche o requisito da intenção direta. CADERNO DIREITO PENAL II - 2020.2 – DANIEL NICORY NATÁLIA OLIVEIRA RODRIGUES 45 Art. 18 - Diz-se o crime: Crime doloso (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I - doloso, quando o agente quis o resultado (DOLO DIRETO) ou assumiu o risco de produzi-lo (DOLO EVENTUAL). A) ELEMENTOS: Exige-se a presença simultânea dos dois. – Elemento volitivo sem elemento cognitivo = erro de tipo; cognitivo sem o volitivo = culpa consciente. . Cognitivo: ideia de representação da realidade. – Quando o agente pratica uma determinada conduta ele tem uma certa representação da realidade. – Representação da realidade = percepção da realidade através dos órgãos de sentido, e essa entrada de informação no seu sistema nervoso a partir do que foi captado no mundo exterior compõe uma determinada imagem/representação mental de como você enxerga a realidade que está a sua frente. É essa imagem que irá guiar a sua ação = você decide se comportar de uma determinada forma. – Essa representação da realidade não envolve apenas elementos do presente, do que se descortina à sua frente, pois ela também vislumbra um olhar para o futuro. = Ao interferir naquela realidade, o que você é
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