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IV – COESÃO Articulação entre as partes 1. OS MARCADORES DE COESÃO TEXTUAL Os falantes de uma língua são capazes de distinguir um texto de um aglomerado de frases. Isso não se dá por acaso. Acontece que, no interior do texto, há elementos responsáveis pela correlação entre as diferentes partes que o constituem: são os chamados índices ou marcadores de coesão textual. Esses elementos, distribuídos ao longo do texto, garantem a unidade do todo. 1.1 Coesão por retroação: os anafóricos Há certos elementos que, no interior de um texto, só adquirem sentido se forem associados a termos que já foram enunciados anteriormente. Os marcadores anafóricos são esses elementos retroativos. Exemplos de alguns marcadores de coesão textual - anafóricos: Meu cachorrinho foi levado ao veterinário. Ele está bastante doente. Esta é a minha opinião sobre o assunto. E a sua, qual é? Comprei cadernos, livros e mochila. Paguei tudo à vista. A aluna recorreu aos colegas, professor e diretor. Ninguém lhe deu crédito. São Paulo acolhe pessoas de todas as regiões. Aqui procuram uma vida melhor. Recife e Natal são cidades muito bonitas. Ambas ficam no nordeste. Antônio, José e Pedro estudam juntos desde pequenos. Os três pretendem formar-se em Medicina. Gustavo, Aluísio e Jorge passaram no vestibular. O primeiro em Engenharia, o segundo em Direito e o último no curso de Administração. Muitos pais fumam em casa. Alguns filhos o fazem também. Há anafóricos que retomam partes mais amplas do texto: Antigamente acreditava-se que existiam línguas civilizadas e línguas primitivas: línguas lógicas e línguas pré-lógicas; línguas mais evoluídas e menos evoluídas. Hoje em dia, isso não passa de crendices sem nenhuma comprovação científica. Observação importante: □ Mesmo não substitui substantivos, pronomes pessoais retos, nem pronomes relativos. Não substitui nenhuma palavra da língua. Portanto, ferem a norma culta construções como estas: “Antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra-se parado neste andar”. – Lei / DF N° 3212 de 30 de outubro de 2003 Insatisfeito, foi à diretora e pediu que a mesma lhe concedesse o abono. Corretamente: (Insatisfeito, foi à diretora e pediu que ela lhe concedesse o abono.) Ontem vi meu ex-chefe e convidei o mesmo para um cafezinho. Corretamente: (Ontem vi meu ex-chefe e o convidei para um cafezinho.) Já que o secretário executivo esteve nos visitando, entregamos ao mesmo a documentação. Corretamente: (Já que o secretário executivo esteve nos visitando, entregamos a ele (ou entregamos-lhe) a documentação.) Busque as fichas no almoxarifado e verifique se as mesmas estão carimbadas. Corretamente: (Busque as fichas no almoxarifado e verifique se elas estão carimbadas.) □ Empregamos mesmo(s), mesma(s), quando tem o sentido de “idêntico”; “em pessoa”. Não podemos continuar insistindo nos mesmos erros. Ele mesmo fez a crítica sobre a apresentação. 1.2 Coesão por antecipação: os catafóricos Assim como existem marcadores que retomam termos já citados, existem aqueles que anunciam palavras que ainda vão ocorrer na progressão do texto. Dentre os recados que eu anotei na secretária eletrônica, este era para você: o pessoal vai se encontrar no portão central da faculdade amanhã, dia 18, à 10h30. “Qualquer que tivesse sido seu trabalho anterior, ele o abandonara, mudara de profissão e passara pesadamente a ensinar no curso primário: era tudo que sabíamos dele. O professor [...]”. (Grifos nossos) São também anafóricos e/ou catafóricos os pronomes demonstrativos (este [catafórico], esse [anafórico], aquele), os pronomes relativos (que, o qual, cujo, onde), certos advérbios e locuções adverbiais (nesse momento, então, lá etc.) e os verbos ser e fazer, o pronome pessoal de 3ª pessoa (ele/ela; o/a; lhe). 1.3 Coesão por conectores Conectores, ou simplesmente conectivos, são aqueles elementos que, ao longo do texto, têm a função de estabelecer conexões entre palavras, grupos de palavras ou unidades maiores. Como esses marcadores de coesão se encarregam de conectar entre si dois membros de um texto, eles também são chamados de marcadores de relação. Falou baixo porque havia gente dormindo. Chove e faz frio. Estude bastante, ou vai querer ficar para exame? Todas as frutas se conservaram, mas o morango azedou. Insiste em fazer o curso, apesar de não ter saído bem nas provas. 1.4 Coesão por operadores discursivos Existem no interior do texto certos termos que são usados para marcar uma determinada orientação que o enunciador quer dar a certas palavras ou expressões. Esses termos, que podem ser chamados de operadores discursivos, servem para produzir efeitos como retificação, explicação, exemplificação ou continuação: Muitos de nossos colegas estão no exterior. Pierre, por exemplo, está na França. Irei à festa. Isto é, se você me convidar. Prometo ir ao encontro. Ou melhor, vou tentar. Gosto de passear, além de dormir bastante. 2. A ELIPSE Muitas vezes, não temos necessidade de explicar certos termos de uma frase, pois o contexto em que ocorrem permite que eles sejam depreendidos sem esforço. É o que se costuma chamar de elipse, que também é um recurso usado para manter a coesão do texto. Ela pode ser nominal, verbal e frasal. Os convidados chegaram atrasados. Tinham errado o caminho e demoraram a encontrar alguém que os orientasse. - Aonde você foi ontem? - À casa de Paulo. - Sozinha? - Não, com os amigos. 3. A EXPANSÃO LEXICAL É muito frequente um termo vir disseminado pelo texto sob a forma de palavras sinônimas ou expressões de significado equivalente. Não se trata aqui de anafóricos ou catafóricos, palavras que só adquirem sentido quando relacionadas aos termos que recuperam ou antecipam. Na coesão pela chamada expansão lexical, uma palavra com sentido próprio é usada como sinônima de outra já citada anteriormente. A criança caiu e chorou. Também o menino não fica quieto! Uma menininha correu ao meu encontro. A garota parecia assustada. “Eis a cidade maravilhosa! A terra de Chico Buarque comemora sua grande festa dionisíaca: o carnaval”. (Grifo nosso) “O cantor Sting tem lutado pela preservação da Amazônia. O ex-líder da banda Police chegou ontem ao Brasil. O vocalista chegou com o cacique Raoni, com quem escreveu um livro”. (Grifos nossos) Gosto muito de doces. Cocada, então, adoro. O recurso de expansão lexical produz três efeitos básicos: a) evita repetições do mesmo termo, o que realmente produz um efeito enfadonho; b) cada sinônimo ou expressão equivalente vai acrescentando informações novas sobre o termo inicial; c) a escolha dos termos sinônimos marca a intenção do produtor do texto – enaltecer ou denegrir a imagem; isto é, a reação que o texto pretende criar no leitor. V – COERÊNCIA Sentido harmonioso entre as partes Um texto é coerente quando permite uma interpretação que englobe as suas partes dentro de um significado geral. Texto com coesão, mas sem coerência: Eu queria agradecer a José Irineu Marinho pela boa programação do SBT. Texto com coerência, mas sem coesão: Antônio e Eduarda casaram. Foram morar no sul. A família da noiva agradece a todos que foram à igreja e à festa. A coerência é global. É ela que faz com que o texto faça sentido para os usuários. A construção da coerência decorre de uma multiplicidade de fatores das mais diversas ordens: linguísticos, discursivos, cognitivos, culturais e interacionais. As coerências classificam-se em: 1. COERÊNCIA SEMÂNTICA Compatibilidade entre os significados dos elementos das frases em sequência em um texto (local) ou entre os elementos do texto com um todo ou com a realidade. Falta coerência em: “Surdos-mudos cantam e recebem bênção do Sumo Pontífice”. (O Estado do Maranhão) Virgem dá à luz trigêmeos. “Não negociamos o Sócrates, pois ele é insubstituível, inegociável e imprestável”. “O país vive um clima de apatia, desespero e ódio”. “O ministro era uma pessoa corretíssima, em todos os aspectos. Além disso era cavalheiro. Certa vez, almoçando com alguns traficantes da zona sul, pagou a conta de um casal que estava sentado próximo à sua mesa porque ouvira dizer que o homem havia perdido o emprego recentemente”. 2. COERÊNCIA SINTÁTICA Refere-se aos meios sintáticos para expressar a coerência semântica como, por exemplo, os conectivos, o uso de pronomes, de definidos e indefinidos etc. Falta coerência em: “A felicidade, onde existem técnicas científicas para sua obtenção, faz-se de pequenos fragmentos captados de sensíveis expressões vivenciais”. (Incoerência sintática com o uso de “onde”. A coerência pode ser recuperada construindo-se a sequência: A felicidade, para cuja obtenção não existem técnicas científicas, faz-se de pequenos fragmentos) 3. COERÊNCIA ESTILÍSTICA Um usuário deve usar em seu texto elementos linguísticos (léxico, tipos de estruturas, frases etc.) pertencentes ou constitutivos do mesmo estilo ou registro linguístico. Falta coerência em: “Prezado Antônio, neste momento quero expressar meus profundos sentimentos por sua mãe ter batido as botas”. “Senhor juiz, Vossa Excelência há de convir que é a maior sacanagem mesmo. Entretanto, estou disposto a atendê-lo, desde que o senhor não fique no mocó, dando uma de migué. Agradeço antecipadamente, até mais”. 4. COERÊNCIA PRAGMÁTICA Tem a ver com o texto como uma sequência de atos de fala. Esses são relacionados de modo que, para a sequência de atos ser percebida como apropriada, os atos de fala que a constituem devem satisfazer as mesmas condições presentes em uma dada situação comunicativa. Caso contrário, temos incoerência. - pedido / atendimento - pedido / promessa - pedido / jura - pedido / solicitação de esclarecimento / esclarecimento - atendimento ou promessa - pedido / recusa / justificativa - pedido / ameaça Falta coerência em: “A: Você me empresta seu livro de Guimarães Rosa? B: Hoje eu comi um chocolate que é uma delícia!” RELAÇÃO ENTRE COESÃO E COERÊNCIA A coesão é a ligação, os nexos que se estabelecem entre os elementos que constituem a superfície textual. É explicitamente revelada por meio de marcas linguísticas, que articulam as diferentes partes do texto. A coesão é sintática e gramatical, mas também semântica. A relação da coesão com a coerência existe porque os elementos da superfície linguística é que servem de pistas, de ponto de partida para o estabelecimento da coerência. Eles ajudam a estabelecer a coerência na interpretação dos textos, mas não são nem necessários, nem suficientes para que a coerência seja estabelecida. Coesão e coerência são fenômenos distintos pelo fato de poder haver coesão em fatos isolados e esses não formarem um todo significativo (exemplo 1); e pode haver textos destituídos de coesão, mas cuja textualidade se dá no nível da coerência (exemplo 2). 1 – Meus vizinhos viajaram para a França. A França sediou os jogos de uma Copa do Mundo. Na França fala-se francês. A França relembra sua independência em 14 de julho. 2 – O Japão sempre incentivou o esporte. A Coreia tem aprimorado o seu parque industrial. A China é um país muito povoado. Todos são países asiáticos. Portanto, um texto bem redigido apresenta, necessariamente, perfeita articulação de ideias. Para obtê-la, é necessário promover o encadeamento semântico (significado, ideias) e o encadeamento sintático (mecanismos que ligam uma oração à outra). A coesão é obtida, principalmente, pelos marcadores e pelos elementos de ligação que proporcionam as relações necessárias à integração harmoniosa de orações e parágrafos em torno de um mesmo assunto (eixo temático). Os textos acadêmicos e profissionais devem ser muito bem elaborados para que a informação não sofra alteração na sua compreensão. E, para aqueles que procuram aperfeiçoar suas possibilidades de inserção e/ou permanência no mundo corporativo, reconhecidamente competitivo, uma das necessidades é a de desenvolver a capacidade linguística na construção de textos criativos, orgânicos, com relações lógicas e argumentos convincentes. VEJAM UM EXEMPLO DE TEXTO SEM COESÃO, MAS COMO COERÊNCIA. Circuito fechado Ricardo Ramos Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo, pente. Cueca, camisa, abotoaduras, calça, meias, sapatos, gravata, paletó. Carteira, níqueis, documentos, caneta, chaves, lenço, relógio, maço de cigarros, caixa de fósforos. Jornal. Mesa, cadeiras, xícara e pires, prato, bule, talheres, guardanapo. Quadros. Pasta, carro. Cigarro, fósforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papéis, telefone, agenda, copo com lápis, canetas, bloco de notas, espátula, pastas, caixa de entrada, de saída, vaso com plantas, quadros, papéis, cigarro, fósforo. Bandeja, xícara pequena. Cigarro e fósforo. Papéis, telefone, relatórios, cartas, notas, vales, cheques, memorandos, bilhetes, esboços de anúncios, fotos, cigarro, fósforo, bloco de papel, caneta, projetor de filmes, xícara, cartaz, lápis, cigarro, fósforo, quadro-negro, giz, papel. Mictório, pia, água. Táxi. Mesa, toalha, cadeiras, copos, pratos, talheres, garrafa, guardanapo, xícara. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Escova de dentes, pasta, água. Mesa e poltrona, papéis, telefone, revista, copo de papel, cigarro, fósforo, telefone interno, externo, papéis, prova de anúncio, caneta e papel, relógio, pasta, cigarro, fósforo, papel e caneta, telefone, caneta e papel, telefone, papéis, folheto, xícara, jornal, cigarro, fósforo, papel e caneta. Carro. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Paletó, gravata. Poltrona, copo, revista. Quadros. Mesa, cadeiras, pratos, talheres, copos, guardanapos. Xícaras. Cigarro e fósforo. Poltrona, livro. Cigarro e fósforo. Televisor, poltrona. Cigarro e fósforo. Abotoaduras, camisa, sapatos, meias, calça, cueca, pijama, chinelos. Vaso, descarga, pia, água, escova, creme dental, espuma, água. Chinelos. Cobertura, cama, travesseiro.
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