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Curso PSICOMOTRICIDADE Disciplina PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO Curso PSICOMOTRICIDADE Disciplina PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO Eunice do Vale MADEIRA Fabiane MUNIZ Henrique de Carvalho PEREIRA Hildeberto MARTINS Luis Eduardo GRANATO Maria Cristina Fontes URRUTIGARAY Maria POPPE www.avm.edu.br 3 S o b re o s a u to re s Meu nome é MARIA DA CONCEIÇÃO MAGGIONI POPPE, sou psicóloga formada pela UFRJ e atuo em dois segmentos da Psicologia: a docência e a clínica. Na atividade docente, iniciei minhas atividades em 1997, aqui mesmo no IAVM, primeiramente só nos cursos de pós-graduação lato sensu na modalidade presencial. No ano de 2001, passei a fazer parte também do corpo de professores que atuam no IAVM na modalidade a distância, primeiro nos cursos de pós-graduação e, agora também, nos cursos de graduação. Eis aqui nosso encontro e minha grata satisfação! HILDEBERTO MARTINS é psicólogo, bacharel e licenciado em Psicologia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); mestre em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da UERJ; professor substituto da Universidade Federal Fluminense (UFF), no biênio 2002/2004 e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), campus São Gonçalo - Formação de Professores em 2003; professor da Universidade Estácio de Sá (UNESA); doutorando em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP). Oi, queridos! Meu nome é FABIANE MUNIZ. Sou psicóloga e sempre me interessei muito pela área da sexologia. Desde 1990 já atendia pessoas com problemas sexuais. Depois entrei na pós-graduação em sexualidade e logo em seguida no mestrado. E hoje estou aqui como professora de vocês. Grande abraço! Depois deste curso façam o de sexualidade, hein! Estou aguardando vocês! Meu nome é LUIS EDUARDO GRANATO, sou psicólogo clínico e mestre em Antropologia Social. Trabalho na rede pública de saúde e em consultório particular e dou aulas no departamento de psicologia de uma universidade particular. Meus interesses acadêmicos tratam justamente da relação entre o que se denomina como "social" e "individual", como pode ser inferido pela minha formação (psicologia e antropologia). Minha intenção não é reforçar esta divisão, mas justamente questionar e pensar as atribuições e implicações desta dicotomia. Olá, tudo bem? Sou MARIA CRISTINA URRUTIGARAY. Trabalho no IAVM desde 1996 como professora dos cursos presenciais. Já participei de alguns momentos dos cursos à distância, mas agora só chego até vocês pelas apostilas. Sou formada pela UFRJ em Psicologia. Tenho pós- graduação em Psicologia Analítica Junguiana pelo IBMR e Psicopedagogia, pela Universidade de Havana-Cuba. Também fiz meu mestrado por Cuba e me diplomei em Educação com ênfase em psicopedagogia. Como sou Analista Junguiana pela Associação Junguiana do Brasil, aproveitei e me tornei pesquisadora de imagens, imaginário e de símbolos. Trabalho com as Técnicas Expressivas e Arteterapia, e tenho dois livros publicados nesta linha de pesquisa sobre imagens, imaginário e a Arteterapia. Meu nome é EUNICE DO VALE MADEIRA, sou formada em Pedagogia pela UERJ (1968) e em Psicologia pela FAHUPE (1993), posteriormente fiz mestrado em Psicologia Escolar na Universidade Gama Filho (1987). Atualmente sou Professora Assistente da Universidade Veiga de Almeida e trabalho com os temas: motivação e afetividade. Sendo assim, meu interesse na área educacional, especificamente, de desenvolvimento humano é de longa data e vem se mantendo e consolidando cada vez mais tanto na prática docente quanto na elaboração de material escrito para os alunos. Terei muito prazer em trabalhar com vocês! Eu me chamo HENRIQUE PEREIRA, sou psicólogo clínico, atuando no Rio de Janeiro e Niterói. Obtive o título de doutor em Psicologia Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Em minha tese de doutorado examinei a psicologia analítica de Jung da perspectiva sociológica da teoria do ator-rede de Bruno Latour. Organizo e ministro cursos de extensão em psicologia junguiana e pós-junguiana. Atualmente leciono nas universidades Candido Mendes e Estácio de Sá, e no Centro Universitário de Maringá. 5 S u m á r io 07 Apresentação 09 Aula 1 Introdução à Psicologia do Desenvolvimento 27 Aula 2 Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo. 53 Aula 3 O modelo histórico- cultural de Vygotsky 83 Aula 4 Wallon e o estudo da psicogênese 105 Aula 5 Freud e as fases psicossexuais do desenvolvimento 143 Aula 6 O desenvolvimento da infância à velhice 185 AV1 Estudo dirigido da disciplina 188 AV2 Trabalho acadêmico de aprofundamento 191 Referências bibliográficas Psicologia do Desenvolvimento C A D E R N O D E E S T U D O S A p re s e n ta ç ã o Queridos alunos, mais uma vez estamos aqui com vocês. Que bom! Este caderno tem seis aulas sobre as Teorias psicológicas do desenvolvimento humano. Na primeira aula você terá a oportunidade de conhecer um pouco da história da psicologia assim como alguns conceitos básicos para que possamos, então, entrar propriamente no que nos interessa dentro da psicologia que é a psicologia do desenvolvimento. Aí começaremos o nosso passeio com os teóricos. Na segunda aula falaremos de Jean Piaget, que com toda a sua inteligência foi o primeiro escolhido para nosso percurso. Depois, na terceira aula, conheceremos Vygotsky e seus pontos de vista históricos e culturais, para depois demonstrarmos os pontos de encontros e desencontros desses dois grandes nomes da psicologia. Na quarta aula quem vem com muita emoção e afetividade é Henry Wallon. Com Wallon chegaremos a conclusão que é por causa da expressão e dos sentimentos dos outros que tentamos fazer algo para mudar o mundo a nossa volta. Por fim, na quinta aula, estudaremos o último teórico de nosso caderno, ou seja, leremos com toda sua teoria sobre neurose e sexualidade, Freud e os pontos principais da psicanálise para o nosso curso. Mas não acaba por aí não, pois na ultima aula faremos uma articulação das teorias do desenvolvimento e o seu curso. Bom estudo! O b je ti v o s g e ra is Este caderno de estudos tem como objetivos: Demonstrar a importância e a contribuição da psicologia do desenvolvimento na formação de profissionais da saúde e educação. Demonstrar a teoria epistemológia de Jean Piaget sobre como o homem desvenda o mundo, como interage com ele e como ele elabora as idéias. Demonstrar o modelo histórico-cultural de Vygotsky no que se refere ao desenvolvimento do homem. Conhecer os conceitos propostos por Wallon e sua relevância para o entendimento dos estágios do desenvolvimento no qual destaca o papel da tonicidade para integração do corpo com o meio físico e social. Provocar uma reflexão sobre alguns conceitos da psicanálise de Freud e, principalmente, sobre as fases psicossexuais do desenvolvimento. Por fim, passear pelas idades sob o olhar da psicologia do desenvolvimento. Introdução à Psicologia do Desenvolvimento Maria Poppe A U L A 1 A p re s e n ta ç ã o Nesta aula apresentaremos as origens da Psicologia Geral enquanto ciência, buscando dar um destaque especial para os estudos da Psicologia do Desenvolvimento que é o foco desta disciplina. Assim como vimos, o objetivo dessa disciplina consiste em mapear todas as fases do desenvolvimento humano e suas características particulares, abordando as mudanças e aquisições vividas em cada etapa. Embora estas sejam mais perceptíveis durante o período da infância, vale ressaltar que elas ocorrem ao longo da vida. Porém, antes de comentarmos sobre as fases do desenvolvimento e as principais contribuições de cada teoria do desenvolvimento,cabe aqui apresentar o ramo da Psicologia que se destina a estudar esse assunto, isto é, a Psicologia do Desenvolvimento. O b je ti v o s Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de: Entender a importância da psicologia na compreensão de todas as teorias de base que fundamentam o desenvolvimento humano; Saber a influência dos fatores orgânicos no desenvolvimento humano, mas destacando também o papel do meio ambiente influenciando igualmente o desenvolvimento humano; Discutir os diferentes campos de estudo da psicologia do desenvolvimento; Compreender a relevância desse tipo de estudo para a sua formação. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 10 Introdução Bem, para entendermos o que é a Psicologia do Desenvolvimento, seu objeto de estudo e maiores contribuições, precisamos definir primeiro o que ela seja. Para tal, leia o quadro abaixo que retiramos da internet, do site da Wikipédia: PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO É o estudo científico das mudanças de comportamento relacionadas à idade durante a vida de uma pessoa. Este campo examina mudanças através de uma ampla variedade de tópicos, incluindo habilidades motoras, habilidades em solução de problemas, entendimento conceitual, aquisição de linguagem, entendimento da moral e formação da identidade. Dentre as questões formuladas por psicólogos do desenvolvimento poderiamos destacar. São as crianças qualitativamente diferentes dos adultos ou eles simplesmente não têm a mesma experiência dos adultos? O desenvolvimento ocorre através de uma acumulação gradual de conhecimento ou por mudanças de um estágio de pensamento ou outro? As crianças nascem com conhecimento inato ou elas percebem as coisas com a experiência? O desenvolvimento é direcionado pelo contexto social ou por algo dentro da criança? Fonte:Wikipédia(http://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3 %A1gina_princial) Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 11 Bem, agora voltemos ao assunto que devemos iniciar nosso diálogo que é a Psicologia, ciência que deu origem ao campo de estudo da Psicologia do Desenvolvimento. O que é Psicologia? Podemos definir Psicologia como sendo o estudo científico do comportamento, onde o termo comportamento inclui todas as respostas, isto é, atos motores e respostas fisiológicas manifestas, assim como, os eventos mentais internos e subjetivos (imagens, memórias, pensamentos e sentimentos). Esses eventos podem ser externos e observáveis ou inferidos indiretamente através de relatos verbais ou indicadores fisiológicos. A inferência indireta se realiza, por exemplo: Quando se ouve uma história ou quando se lê um livro, pois imediatamente o mundo imaginário será habitado por construções próprias do ouvinte ou leitor para ilustrar os sons e palavras que compõem o relato ou a leitura; Quando se tem um aumento da freqüência cardíaca, transpiração, rubor da face e etc. que são indicadores fisiológicos, também, alimentados pelos relatos ou pelas leituras. Para que a Psicologia possa ser considerada um estudo científico é preciso que esta apresente características distintivas dessa modalidade de estudo, tais como: objetividade, repetibilidade, comunicação com outros e abordagem sistemática. Como nos aponta Lindzey, Hall e Thompson em seu livro “Psicologia” (1977), tais conceitos podem ser definidos da seguinte maneira: SÍMBOLO QUE REPRESENTA A CIÊNCIA DA PSICOLOGIA Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 12 Objetividade envolve o estabelecimento de definições que sejam precisas e inteiramente compreensíveis para qualquer pessoa adequadamente treinada, bem como, a realização de observações de tal maneira que reflitam exatamente o que existe no mundo real (objetivamente observado). Definições adequadas que permitam medir alguma coisa (estatura, dominância, inteligência, motivação e etc.) de forma que possa ser quantificada - isto é, que possam ser atribuídos a esta, números as observações por algum meio significativo e proveitoso. Desta maneira, se determina padrões, classificações e referências. A finalidade principal da objetividade é a eliminação das tendências pessoais do observador, seus preconceitos e convicções, que poderiam distorcer ou obscurecer o acontecimento ou objeto que estivesse sendo observado. Porém, não é suficiente que os dados sejam coletados de maneira objetiva. É preciso ainda que, os resultados sejam REPETÍVEIS para que se confirme a coleta de dados. Além disso, uma descoberta científica deve poder ser partilhada com outros, tanto no sentido da comunicação da descoberta, quanto na possibilidade de que a experiência seja repetida em outros laboratórios. Caso contrário, não será possível afirmar uma abrangência que é necessária ao experimento. Outro compromisso fundamental de uma disciplina científica é o de lidar com os eventos estudados de uma forma METÓDICA e ABRANGENTE. Sendo assim, um investigador não pode tratar de tópicos interessantes isolados e deixar sem resposta questões significativas que estejam relacionadas ao campo observado. Para refletir O investigador a partir de sua pesquisa relata que: uma resposta seguida de recompensa tem maior probabilidade de ocorrer novamente do que uma resposta não seguida de recompensa. Se o investigador fornecer uma adequada definição desses termos, outros psicólogos poderão observar essa mesma relação regularmente em outras ocasiões e em diferentes situações. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 13 É, então, o essencial da teoria psicológica tornar racional e sistemática a busca do psicólogo por uma compreensão do comportamento? Certamente que é! De fato, uma das principais contribuições da teoria é proporcionar tanto uma estrutura dentro da qual as descobertas existentes possam ser incorporadas e vistas em suas relações umas com as outras, quanto também um mapa daquelas questões relevantes que ainda não foram estudadas. Por exemplo, podemos saber que a esquizofrenia é caracterizada por certas deficiências intelectuais e que existe uma forte determinação hereditária desse distúrbio. Mas qual é a relação entre as deficiências intelectuais e os fatores hereditários? Em geral a tarefa do psicólogo consiste em explorar o comportamento sistematicamente - não por capricho, interesse pessoal ou mesmo modismo, mas de modo a que, eventualmente, a totalidade dos organismos que se comportam venha a ser descrita e compreendida em todos os seus aspectos. (Lindzey, Hall & Thompson, 1977, p.5) Dentro dessa perspectiva também trabalham os estudiosos do desenvolvimento, pois estes estão interessados na relação entre o tempo e a existência humana e procuram descrever e explicar sistematicamente às mudanças que ocorrem nos modos de pensar, sentir e agir nas diferentes fases da vida. Eis, então, as primeiras idéias do que podemos denominar de estudo sobre o desenvolvimento. ALGUNS FATORES QUE INFLUENCIAM O DESENVOLVIMENTO HUMANO Hereditariedade – a carga genética estabelece o potencial do indivíduo, que pode ou não se desenvolver. Existem pesquisas que comprovam os aspectos genéticos da inteligência. No entanto, a inteligência pode se desenvolver aquém ou além do seu potencial, dependendo das condições do meio que encontra. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 14 Campo de estudo da Psicologia do Desenvolvimento A Psicologia do desenvolvimento tem três objetivos que configuram o seu campo de estudo, como nos descreve Maria A. Cória-Sabini (2003) em “Psicologia doDesenvolvimento” são eles: 1º. OBJETIVO: Descrição da gênese das condutas psicomotoras, afetivas, cognitivas e sociais, e do processo de mudança dessas condutas ao longo da vida. É preciso explicar porque as modificações ocorrem e determinar os fatores, processos e mecanismos responsáveis por elas. O campo da Psicologia do Desenvolvimento é caracterizado por essas questões e conduzem tanto a estudos descritivos Crescimento orgânico – se refere ao aspecto físico. O aumento de altura e a estabilização do esqueleto permitem ao indivíduo comportamentos e um domínio do mundo que antes não existiam. Pense na possibilidade de descobertas de uma criança, quando começa a engatinhar e depois a andar, em relação a quando esta criança estava no berço com alguns dias de vida. Maturação neurofisiológica – é o que torna possível determinado padrão de comportamento. A alfabetização das crianças, por exemplo, depende dessa maturação. Para segurar o lápis e manejá-lo como um adulto, é necessário um desenvolvimento neurológico que a criança de 2, 3 anos ainda não tem. Observe como ela segura o lápis. Meio – o conjunto de influências e estimulações ambientais altera os padrões de comportamento do indivíduo. Por exemplo, se a estimulação verbal for mais intensa, uma criança de 3 anos pode ter um repertório verbal muito maior do que a média das crianças de sua idade, mas, ao mesmo tempo, pode não subir e descer com facilidade uma escada, porque esta situação pode não ter feito parte de sua experiência de vida. (Bock, 1999: 99). Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 15 quanto explicativos do comportamento humano ao longo da vida. 2º. OBJETIVO: Fatores que afetam o desenvolvimento das condutas: Tradicionalmente, os fatores responsáveis pela gênese das condutas e suas modificações ao longo da vida se apresentam divididos em fatores genéticos e ambientais. Essa divisão também aparece com outros nomes, tais como: Comportamento inato ou aprendido, comportamento instintivo ou inteligente, processos de maturação ou de aprendizagem etc. Dentro dessa visão, os determinantes do comportamento estariam divididos em duas posições antagônicas, ou seja, uma posição que defende que cada pessoa nasce com um conjunto de predisposições e que o curso do desenvolvimento será normal caso seja assegurado condições ambientais mínimas. E uma segunda posição que define o desenvolvimento humano como uma história de condicionamento (princípio que controla as ações humanas de forma causal) ou como um processo de aprendizagem social. Sabe-se hoje que essa divisão é simplista e pouco produtiva para a compreensão das interações organismo-meio, que constituem a essência do processo de desenvolvimento. A posição atual dos teóricos do desenvolvimento, no entanto, é de que os assim chamados “fatores genéticos” só podem se manifestar como respostas ao ambiente, como também os assim chamados “fatores ambientais” só podem agir sobre uma estrutura já existente que, em última análise, é a estrutura herdada. (Cória-Sabini, 2003, p.14) A observação do desenvolvimento do comportamento social do bebê no primeiro ano de vida Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 16 mostra claramente a interação entre os fatores ambientais e genéticos no desenvolvimento. Esse primeiro contato social do bebê só é possível porque ele nasce com uma série de comportamentos e capacidades, embora esses elementos sozinhos não sejam suficientes. Essa primeira relação social também depende de experiências e condições que a criança encontra no ambiente, tais como: estímulos, cuidados, atenção, afeto. Portanto, as características da primeira relação social, bem como o seu desenvolvimento posterior, são o resultado da interação organismo- meio; não são nem inteiramente pré- programadas (genéticas), nem resultantes apenas de aprendizagem (ambientais). (Cória-Sabini, 2003, p.14) 3º. OBJETIVO: Identificação de estágios ou fases no desenvolvimento: Todas as pesquisas realizadas no campo do desenvolvimento apontam semelhanças na forma de pensar, agir e sentir de indivíduos dentro de uma mesma faixa etária, além de apontar que há variações ao longo das idades. Essas descobertas possibilitaram o emprego de conceitos tais como estágios, períodos, fases para descrever o desenvolvimento humano. Sendo assim, o desenvolvimento se dá por estágios ou etapas que se diferenciam pela qualidade da cognição, do comportamento, das relações afetivas, etc. A identificação das mudanças que ocorrem ao longo do desenvolvimento humano serviu para estabelecer um referencial na avaliação do progresso individual, além do que as expectativas de comportamento para cada idade acabaram se tornando um sistema de controle de conduta individual. O termo “controle” pode ser empregado, uma vez que Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 17 instituições como a escola e a família passam a adotar como referência os parâmetros estabelecidos pelos estudiosos para comparar comportamentos e exigir atitudes frente a determinadas situações. Assim agindo, não somente produzem expectativas como também conflitos que influenciam os aspectos emocionais no desenvolvimento global que também comparecem no espaço escolar. Algumas teorias contribuíram com conceitos importantes para o conhecimento dos processos envolvidos no desenvolvimento e, embora, essas teorias apresentem enfoques distintos existem princípios que são comuns a todas. Dentre estes destacam-se: A transição de um estágio para outro se dá dentro de um processo de integração e não pela justaposição de etapas estranhas entre si; A ordem de sucessão dos estágios é constante; As idades que delimitam um determinado estágio podem variar dentro de certos limites. Maria A. Cória-Sabini (2003) aponta três motivos para que esse aspecto normativo das teorias tenha sido bem aceito por profissionais e por leigos. O PRIMEIRO MOTIVO é que a existência de normas a respeito do desenvolvimento possibilita a criação de condições ideais para o aparecimento ou avaliação de certas condutas, estabelecendo pontos referenciais formais ou informais na vida social. O SEGUNDO MOTIVO baseia-se no fato de que as normas podem ser tomadas como um referencial EXEMPLO: Produtos e serviços que são oferecidos a partir de pesquisas realizadas para atingir um determinado público ou faixa etária. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 18 para uma auto-avaliação, ou seja, a existência de um referencial definido, comum a uma determinada fase, pode auxiliar a minimizar as crises e propiciar melhor adaptação aos desafios ambientais. E o TERCEIRO MOTIVO é que a existência de normas oferece referencial para pesquisa. Várias teorias admitem a existência de estágios e de inter- relação entre eles, essas teorias estimularam várias pesquisas que investigaram as etapas, os processos ou mecanismos que determinam a sucessão dos estágios e a relação entre eles. Esses estudos investigaram os aspectos emocionais, cognitivos e sociais do desenvolvimento. Dentre as teorias voltadas para o estudo do desenvolvimento humano duas exerceram influência decisiva: A teoria de Jean Piaget (abordando a dimensão cognitiva) e a Psicanálise (abordando a dimensão emocional-afetiva). Porém, não há uma teoria que dê conta do desenvolvimento em todas as suas dimensões, na medida em que as teorias acabam por privilegiar um aspecto em detrimento de outros. Fica claro, então que: ...Para entender o comportamento de um indivíduo particular, em qualquer etapa do seu desenvolvimento, é necessário conhecer não apenas as mudanças cognitivas,sociais, emocionais e biológicas que ocorrem, mas também qual o impacto que cada uma delas pode ter sobre as outras. O EXEMPLO: A conversa entre mães que têm filhos adolescentes, a troca de experiências, faz com que estas tenham maior serenidade para lidar com a tão falada “crise da adolescência”. Uma vez que, o isolamento nessas situações gera mais ansiedade, assim como outros sentimentos que se identificam com fracasso e ineficiência na relação com os adolescentes. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 19 desenvolvimento é um processo unitário e individual. (Cória-Sabini, 2003, p.18-19) Torna-se fundamental o conhecimento das diferentes teorias e abordagens uma vez que, nenhuma delas compreende o conjunto da complexidade humana. O desenvolvimento de cada criança é multideterminado, ainda que, os estudos procurem encontrar aspectos comuns e universais, pois é dessa forma que a ciência se organiza. Um pouco de história Antes de chegarmos a apresentar as principais contribuições de cada teoria do desenvolvimento precisamos pensar de que forma teve início a investigação sobre o desenvolvimento. Por onde começaram os pesquisadores? Quais os aspectos históricos envolvidos no nascimento da Psicologia do Desenvolvimento? Podemos dizer que as idéias de Darwin (1809- 1882) sobre a evolução das espécies e do comportamento serviram de estímulo para que os pensadores pudessem perceber a criança como fonte de informação sobre a natureza humana e que a investigação sobre o desenvolvimento humano teve seu início pelo estudo da infância. Mas o conceito de infância foi sempre o mesmo? A criança sempre foi vista como um indivíduo que precisa ser cuidado, protegido e orientado? Não. Por incrível que pareça, até o século XVII a criança era considerada um adulto em miniatura, ou seja, acreditava-se que os sentimentos, as ações e o raciocínio de uma criança eram constituídos dos mesmos elementos básicos daqueles dos adultos e essa concepção era determinante no tratamento que a sociedade dava as crianças (Ariès, 1981). Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 20 Sabe-se que até o século XVII as crianças só recebiam tratamento especial até os sete anos e, depois disso, elas eram inseridas na comunidade dos adultos e passavam a desempenhar as mesmas atividades que eles. E nas famílias mais abastadas? Será que a criança era vista da mesma forma? Sim, nessas famílias, também, não era dispensado nenhum tratamento especial. Como nos mostra Maria A. Cória- Sabini em Psicologia do Desenvolvimento: ...Era comum que as crianças começassem a escolarização aos quatro ou cinco anos de idade. O ensino esforçava-se para ser enciclopédico e para desenvolver as faculdades mentais de atenção, memória, abstração etc. Por isso era árduo e difícil. O método empregado era a repetição em voz alta das informações dadas pelo mestre. Como ninguém dava importância à compreensão no processo de aprendizagem, não se questionava a dificuldade dos assuntos ensinados, nem se prestava atenção às diferenças individuais. As classes eram compostas com elementos de todas as idades. Assim, ninguém se espantava ao ver meninos de sete anos e jovens de dezoito recitando juntos uma lição. (2003, p.23) A partir do século XVII, o conceito de infância vai se transformando, alguns pensadores começam a defender a idéia de que a mente da criança é diferente da mente do adulto, a igreja afasta as crianças dos assuntos ligados ao sexo, alegando a inadequação dessas vivências para formação do caráter e da moral dos indivíduos e estabelece-se o ensino graduado e a formação de classes com crianças da mesma idade. As EXEMPLO: As crianças que pertenciam às classes menos privilegiadas trabalhavam no campo, vendiam nos mercados e aprendiam um ofício. Dica da professora Você deve estar se perguntando: Essas mudanças ocorreram ao mesmo tempo nas classes baixas e na burguesia? Não. A gradativa mudança no conceito de infância, a percepção da criança como um indivíduo em formação, que necessita de cuidado, proteção e orientação era exclusiva dos aristocratas e dos burgueses. A classe baixa, até o século XIX, fazia pouquíssima distinção entre crianças e adultos, submetendo, inclusive, suas crianças as mesmas faltas legais que os mais velhos. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 21 famílias começam a se preocupar com os assuntos e ações que possam prejudicar a formação moral de seus filhos. Dois aspectos foram fundamentais para que a sociedade mudasse o tratamento dispensado as crianças, foram eles: O grande número de crianças que não sobreviviam à infância; O crescimento da burguesia. Com isso, a infância passa a ser considerado um período importante do desenvolvimento, momento de formação do caráter e da moral. A criança ganha um lugar diferenciado na família e a família acaba por assumir a responsabilidade pelo pleno desenvolvimento dos seus filhos. Com a evolução do conceito de infância surgem os primeiros estudos no campo do desenvolvimento infantil (décadas de 1920 e 1930). Nesse momento, os investigadores buscam obter um padrão normativo para o desenvolvimento físico, motor e social do ser humano. E de que forma se deram? Como eram esses estudos? Os estudos baseavam-se na observação das atividades de bebês nos seus primeiros anos de vida e buscavam responder perguntas, como: Com que idade o bebê consegue sentar sem ajuda? E andar? Quando aparece o primeiro sorriso social? EXEMPLO: Proibição a participação das crianças em festas públicas e orgias. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 22 O que percebemos é que esses estudos intencionavam descrever e articular as mudanças de comportamento de acordo com a idade e com as variações existentes entre crianças de uma mesma faixa etária, possibilitando, assim, a criação de padrões de desenvolvimento. Este tipo de pesquisa é chamado de descritivo. Nas pesquisas descritivas a idade é a variável mais importante, e as descrições são, primariamente, sobre diversos comportamentos que caracterizam um determinado nível de desenvolvimento.As tabelas normativas resultantes desses estudos representam uma contribuição muito importante e até hoje proporcionam conhecimentos úteis para pediatras, pais e educadores. (Cória-Sabini, 2003, p.24 e 25) Você deve estar se perguntando: Para que serve uma tabela que aponte o comportamento esperado em cada idade? É simples: Embora saibamos que o desenvolvimento de cada criança é multideterminado e que isso possibilita variações no tempo de aquisição das aprendizagens, esta pode estabelecer níveis, estágios de desenvolvimento, que ofereçam o conhecimento de um padrão de normalidade esperado para cada faixa etária, facilita a identificação de problemas e a aplicação de medidas para enfrentamento dos obstáculos percebidos. Por Exemplo: Uma mãe chega ao pediatra preocupada porque sua filha de três anos ainda não fala. Ela diz: Doutor, tenho observado, na pracinha que eu freqüento, que todas as crianças com mais de dois anos e meio estão falando, e minha filha ainda não fala nem mamãe, será que ela tem algum problema? Para refletir Como o pediatra poderia avaliar fidedignamente essa criança se não tivesse conhecimento dos estágios do desenvolvimento infantil? Nesse caso, não seria útil a utilização das escalas de desenvolvimento? Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 23 Como nos aponta Clara R. Rappaport (1981) em Psicologia do Desenvolvimento: ...A partir da elaboração destas escalas, de certa forma, o desenvolvimento de cada criançapoderia ser medido e comparado com o que se esperava para a sua faixa de idade ou com o comportamento considerado “normal”. (Rappaport, 1981, p. 2) E mais: Fica claro então que o psicólogo do desenvolvimento, através da pesquisa (descrição precisa dos fenômenos comportamentais individuais ou em situação de interação social) e da teorização (tentativa de explicar e integrar os dados das pesquisas num todo coerente e unitário), oferece subsídios para a compreensão: a) Do processo normal de desenvolvimento numa determinada cultura. Isto é, conhecimento das capacidades, potencialidades, limitações, ansiedades, angústias mais ou menos típicas de cada faixa etária; b) Dos possíveis desvios, desajustes e distúrbios que ocorrem durante o processo e podem resultar em problemas emocionais (neuroses, psicoses), sociais (delinquência, vícios, etc.), escolares (repetência, evasão, distúrbios de aprendizagem) ou profissionais. (Rappaport, 1981, p.4) Com isso, percebemos que a Psicologia do Desenvolvimento enriquece o trabalho de profissionais na medida em que seus estudos permitem circunscrever as habilidades, capacidades e limitações de cada faixa etária nos vários aspectos da personalidade, sejam eles: motores, emocionais, intelectuais e etc. Tais informações viabilizam a criação de programas escolares, esportivos, recreativos, assim como de metodologias de ensino, adequadas a idade cronológica e a escolaridade. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 24 Agora que já apresentamos a Psicologia do desenvolvimento, seu alcance e objetivos e mostramos os aspectos históricos implicados no seu nascimento, cabe falarmos aprofundadamente das teorias do desenvolvimento que compõe o seu corpo teórico. Destacaremos as importantes contribuições de Piaget, Vygotsky, Wallon e Freud. Bem, mas antes de iniciarmos essa nova etapa, proponho a você a realização de exercícios que busca fixar o conteúdo dado e também estimular a reflexão a respeito do tema trabalhado. Vale destacar que, o desenvolvimento humano deve ser entendido como uma globalidade, mas, para efeito de estudo este tem sido abordado a partir de quatro aspectos básicos, são eles: Aspecto físico-motor – se refere ao crescimento orgânico, à maturação neurofisiológica, à capacidade de manipulação de objetos e de exercício do próprio corpo. Exemplo: a criança leva a chupeta à boca ou consegue tomar a mamadeira sozinha, por volta dos 7 meses, porque já coordena os movimentos das mãos; Aspecto intelectual – é a capacidade de pensamento, raciocínio. Por exemplo, a criança de 2 anos que usa um cabo de vassoura para puxar um brinquedo que está embaixo de um móvel ou o jovem que planeja seus gastos a partir de sua mesada ou salário; Aspecto afetivo-emocional – é o modo particular de o indivíduo integrar as suas experiências. É o sentir, A sexualidade faz parte desse aspecto. Exemplos: a vergonha que sente em algumas situações, o medo em outras, a alegria de rever um amigo querido; Aspecto social – é a maneira como o indivíduo reage diante das situações que envolvem outras pessoas. Por exemplo, em um grupo de crianças, no parque, é possível observar algumas que espontaneamente buscam outras para brincar enquanto outras permanecem sozinhas. Todas as teorias do desenvolvimento humano partem do pressuposto de que esses quatro aspectos são indissociados, mas elas podem enfatizar aspectos diferentes, isto é, estudar o desenvolvimento global a partir da ênfase em um dos aspectos. (Bock, 1999: 100) Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 25 EXERCÍCIO 1 O que é Psicologia e qual a importância de estudá-la em seu curso? ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ EXERCÍCIO 2 Quais são os principais objetivos da Psicologia do Desenvolvimento? Descreva-os. ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ EXERCÍCIO 3 A psicologia do desenvolvimento estuda o ser humano em seus diferentes aspectos. São eles: ( A ) Cognitivo, emocional e social; ( B ) Emocional, social e físico; ( C ) Cognitivo, emocional e físico; ( D ) Emocional, cognitivo, motor, físico e social; ( E ) Culturais, políticos e filosóficos. Aula 1|Introdução à psicologia do desenvolvimento 26 EXERCÍCIO 4 A espécie humana se humaniza e se transforma em pessoa portadora de uma história através do(a): ( A ) Cultura; ( B ) Evolução genética; ( C ) Relação parental: ( D ) Modelo de mundo aspirado; ( E ) Inteligência. RESUMO Vimos até agora: A definição de Psicologia e seus fundamentos científicos, que permitem validar uma observação com critérios e repetições de experimentos; A caracterização do desenvolvimento humano que recebe influência de diferentes fatores hereditários, orgânicos, maturacionais e ambientais, e assim, marcam o conjunto das diferenças individuais tão ricas na experiência docente; O campo de estudo da Psicologia do Desenvolvimento que integra a gênese das condutas globais da criança e todo seu processo de mudanças, os fatores que afetam o desenvolvimento de condutas e a identificação de estágios no desenvolvimento; Uma breve história da Psicologia do Desenvolvimento com considerações sobre a visão da infância que teve influências históricas, culturais e sociais. Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo Eunice do Vale Madeira A U L A 2 A p re s e n ta ç ã o Nesta aula o nosso convidado é Jean Piaget. Jean Piaget foi um epistemólogo suíço que por mais de quarenta anos realizou pesquisas com crianças. A teoria de Piaget revolucionou a compreensão que se tinha a respeito do desenvolvimento intelectual. Ele explicou o desenvolvimento mental do ser humano no campo do pensamento, da linguagem e da afetividade.Piaget postulou que o desenvolvimento cognitivo se realiza em estágios e com isso ele demonstrou que a natureza e as características da inteligência mudam significativamente com o passar do tempo. Além disso, relacionou o desenvolvimento cognitivo à maturação e a experiência, ou seja, ele acreditava que as características biológicas da criança impõem alguns limites na ordem e rapidez em que as competências cognitivas emergem, embora acreditasse que a experiência ativa com o mundo era decisiva para o desenvolvimento cognitivo. Sendo assim, maturação e experiência não podem ter papéis isolados no desenvolvimento. A exploração e atuação no meio ambiente por parte da criança propiciam um desenvolvimento cognitivo melhor. O b je ti v o s Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de: Conceituar os principais tópicos propostos por Piaget; Discutir sobre as fases do desenvolvimento da inteligência; Reconhecer que a concepção de Piaget sobre a influência do ambiente é determinante na construção da inteligência; Saber que para Piaget as teses sobre o inatismo da inteligência estão superadas; Fazer uma relação entre a teoria Piagetiana e seu curso. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 28 Introdução Nesta aula, você conhecerá um pouco do pensar humano. O pensamento é uma coisa à toa, mas como é que a gente voa quando começa a pensar… Entender como o Homem desvenda o mundo, como interage com ele, como elaboraidéias que o auxiliam a ser um construtor de seu “habitat”, sempre foi motivo de pesquisa entre pensadores, cientistas e filósofos. Entre eles, um nome se destaca: Jean Piaget, biólogo, epistemólogo, nascido em Neuchâtel, Suíça, no ano de 1896 e falecido em 1980. Desde menino, o interesse científico de Piaget era notório. Ainda jovem e com pouco tempo de formado, interessou-se pela magia do pensamento humano. Seus estudos que configuraram a Teoria da Epistemologia Genética, ainda, são considerados como um dos pilares para o conhecimento do desenvolvimento cognitivo, até mesmo nos meios científicos. Piaget significa para a inteligência o que Freud representa para a afetividade. (Dolle) A teoria de Piaget é tão simples que somente um gênio a poderia ter concebido. (Einstein) Para Piaget, o homem é um sistema aberto. A resposta do ambiente contribui para um processo constante de reorganização mental, auto-regulando-o. Sua visão teórica é interacionista: o Homem é produto de uma bagagem genética que se desenvolve no meio social. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 29 Trabalhou inicialmente com dois psicólogos franceses - Binet e Simon (escala de inteligência) - e se interessou pelas respostas erradas, concluindo que tais respostas eram consideradas erradas por serem analisadas a partir do ponto de vista do adulto. "As respostas infantis têm uma lógica própria". Sua grande busca sempre foi entender a gênese das estruturas lógicas do pensamento da criança, como se organizam suas ações inteligentes. Sua pergunta é: como se dá o conhecimento? O conhecimento não procede nem da experiência única dos objetos nem de uma programação inata pré-formada no sujeito, mas de construções sucessivas com elaborações constantes de estruturas novas. (Piaget, 1976) Para Piaget, o desenvolvimento psíquico é semelhante ao desenvolvimento orgânico, tem uma direção - equilíbrio progressivo. Em sua ótica a inteligência é uma adaptação na busca do equilíbrio entre o organismo e o meio. Ela é construída através do contato com o meio e as experiências vividas - AÇÃO. Elementos da teoria piagetiana Como se pode perceber, Piaget concebe o ser humano enquanto um ser que se constrói na relação com o meio – um ser que aprende na relação sujeito- objeto. Vejamos alguns elementos de sua teoria: Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 30 HEREDITARIEDADE O indivíduo herda: Estruturas biológicas; Um organismo que amadurece em contato com o meio ambiente; Capacidades cujo desenvolvimento depende do meio ambiente. ADAPTAÇÃO Adaptação é a forma adequada para se lidar com situações novas. Acontece por dois processos: assimilação e acomodação. E de que forma, por meio de que processos ocorre essa adaptação do organismo às exigências do meio? Os seres humanos interagem continuamente com o ambiente, organizando suas vivências e formando novas estruturas organizacionais em resposta a novas experiências. Esse processo de adaptação ocorre através de dois processos complementares: ASSIMILAÇÃO E ACOMODAÇÃO (grifo nosso). (Conger,J.J.; Huston,A .C.; Kagan,J. Mussen, P.H., 1990, p. 240). ASSIMILAÇÃO – É o processo de incorporação dos desafios e informações do meio aos esquemas mentais existentes, ou seja, se refere aos esforços realizados pelo indivíduo para lidar com o ambiente, buscando ajustá-lo às estruturas já existentes no organismo. Assimilação é a tentativa de solucionar uma situação, utilizando uma estrutura mental já formada. É semelhante à assimilação biológica. (Exemplo: alimento conhecido X alimento novo). Dica da professora Neste ponto devemos lembrar que, Piaget como biólogo foi fortemente influenciado pela tese Darwinista da evolução das espécies. “Piaget licenciou-se em 1915, em ciências naturais, com uma tese em biologia sobre moluscos. Tais estudos permitiram- lhe incorporar as discussões decorrentes da teoria da evolução de Darwin” (COSTA, 2001) Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 31 Acomodação - É a tentativa de solucionar uma situação nova buscando novas maneiras de agir, considerando as propriedades do objeto. Consiste em diferenciar cada vez mais, refinadamente, os esquemas de ação para os adaptar melhor às condições cambiantes do campo de atividade, contribuindo, ao mesmo tempo, para a criação de esquemas novos. O sujeito se constrói como sujeito enquanto constrói o objeto. Os processos de acomodação levam o sujeito a estabelecer relações de objetividade com o mundo. Ao estruturar o objeto, a criança estrutura a si mesma enquanto sujeito. Quanto mais o mundo adquire coerência, mais ela própria se torna coerente. ACOMODAÇÃO é o processo de criação ou mudança de esquemas mentais em conseqüência da necessidade de assimilar os desafios ou informações do meio. Através da acomodação, os conceitos são mudados em resposta às exigências ambientais. A acomodação é o complemento da assimilação. Usemos um exemplo para ilustrar melhor os processos de assimilação e acomodação: Para uma criança de cinco anos todo animal que tiver bico, tiver asas e voar é considerado uma ave. Ao visitar a fazenda do seu tio se depara com um avestruz e o ASSIMILA ao seu conceito de ave. Porém fica intrigada porque o avestruz é muito maior do que as aves que ela já viu e seu tio lhe contou que avestruz não voa. Ela se pergunta: Será que avestruz é uma ave? (ISSO A COLOCA NUM ESTADO DE DESEQULÍBRIO). Ela pode ACOMODAR novas informações sobre o avestruz e com isso alterar seu conceito de ave ou Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 32 ainda formar um novo conceito diferente de ave - formar um conceito (avestruz), o que permitirá que ela reconheça um avestruz quando o vir. Essa acomodação a deixará por um tempo em estado de equilíbrio ou estabilidade cognitiva. ... Piaget supôs que todos os organismos lutam pelo equilíbrio. Quando o equilíbrio cognitivo é perturbado – por exemplo, quando alguma coisa é encontrada – os processos de assimilação e acomodação funcionam de modo a restabelecê-lo. O estabelecimento do equilíbrio é, às vezes, chamado equilibração. A Assimilação e a Acomodação quase ocorrem juntas. A criança primeiro tenta entender uma nova experiência, usando velhas idéias e soluções (assimilação); quando elas não funcionam, a criança é forçada a mudar sua estrutura ou entendimento do mundo (acomodação). (Conger,J.J.; Huston,A .C.; Kagan,J. Mussen, P.H., 1990, p.241). Durante toda a vida haverá interação entre os processos de assimilação e acomodação. Todas as adaptações cognitivas são resultantes desses processos, em função dessa constância Piaget chamou esses processos (assimilação e acomodação) de INVARIANTES FUNCIONAIS. É importante ressaltar que embora os processos de assimilação e acomodação sejam invariáveis, as estruturas mentais se formam e são modificadas ao longo da vida. ESQUEMA Unidade estrutural básica de pensamento ou de ação e que corresponde, de certa maneira, à estrutura biológica que muda e se adapta. Agir é coordenar esquemas entre si. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 33 O bebê ao nascer possui reflexos e sensação. Ele age através das funções tônica e de motilidade e estabelece uma comunicação tônico-afetiva. Essa é a primeira forma de comunicação do ser humano. Por esse processo, o bebê vai organizando suas sensações e utilizando intencionalmente seus reflexos. Exemplo - Reflexo de preensão - O bebê, ao nascer, agarra tudo que for colocado na palma de sua mão. Com a maturação biológica e com estímulos do ambiente, a criançadesenvolverá um ESQUEMA DE PREENSÃO que associado ao olhar lhe permite trazer o objeto que está no seu alcance para junto de si (exemplo: colocar a chupeta na boca). EQUILÍBRIO Segundo Piaget, o desenvolvimento cognitivo é explicado através de quatro fatores que, ao se processarem, permitem tal desenvolvimento. São eles: Maturação - É o crescimento fisiológico das estruturas orgânicas hereditárias. Experiência Física - Possibilita o conhecimento físico através da observação. DESENVOLVIMENTO MENTAL X DESENVOLVIMENTO ORGÂNICO * Equilibração das estruturas cognitivas (inicialmente esquemas sensoriais-motores). * Equilíbrio orgânico * Diferentes possibilidades de interagir com o ambiente em diferentes faixas etárias. Dica da professora O reflexo de preensão é uma situação simples que podemos observar no cotidiano de uma criança. Procure analisá-lo sob a perspectiva piagetiana da próxima vez! Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 34 Ex.: a bola rola; o vidro quebra; o gelo derrete na água, a areia não. Conhecimento lógico-matemático - A partir daí, a criança constrói relações lógicas. Ex.: Enfileirar 10 pedras. Contar em diferentes direções. Refazer o desenho e contar novamente. Descoberta de que a soma independe da ordem. Transmissão social - informações contraditórias ou desafiadoras. Equilibração - É o processo que produz coordenação entre a acomodação e a assimilação. Coordena e regula os três fatores anteriores, fazendo surgir estados progressivos de equilíbrio. Obs.: Esses estados não são permanentes. A criança, ao nascer, inicia seu processo de equilibração sucessiva e progressiva por meio do desenvolvimento das estruturas da inteligência. Isto ocorre em quatro períodos distintos, cuja ordem é fixa. Em cada período, o indivíduo tem um modo típico de se relacionar com o mundo, determinado por uma estrutura mental característica que possibilita uma forma particular de raciocínio. O processo de equilibração O processo de equilibração sucessiva se caracteriza em cada um dos seguintes períodos: Quer saber mais? O conceito de equilíbrio, Piaget foi buscá-lo na Física, onde todo corpo tende a busca de uma homeostase ou estado de equilíbrio. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 35 Período da inteligência sensório-motora (0 - 2 anos); Período da inteligência simbólica ou pré- operatória (2 - 7 anos); Período da inteligência operatória concreta (7 - 11/12 anos ); Período da inteligência operatória formal (a partir de 11/12 anos com patamar de equilíbrio entre 14/15 anos). I - PERÍODO SENSÓRIO-MOTOR (0-2 ANOS) CONQUISTA DO MUNDO (evolução psíquica) Percepção Movimentos Esse período se desenvolve em três estágios: 1) Dos reflexos. Características: Melhoria da interação através de exercício; Impulsos instintivos alimentares. 2) De organização das percepções e hábitos. Exemplos: Sucção sistemática do polegar; Virar a cabeça em direção ao ruído; Seguir um objeto em movimento. 3) De inteligência senso-motora. Inteligência prática (anterior à organização do pensamento); Importante Quantos mitos e crendices foram superados com esses estudos. Pois foi confirmada a existência da herança biológica dos reflexos e da discriminação de sensações que contribuem para o desenvolvimento do bebê. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 36 Manipulação de objetos em lugar de palavras e conceitos (esquemas de ação). Ex.: pegar uma vareta para alcançar um objeto; procura de objeto fora do campo da percepção (coberto com um lenço - mais ou menos 1 ano). Nesse estágio, dois processos fundamentais ocorrem: Construção de categorias e de objetos. Ao categorizar, a criança aprende a agrupar objetos por atributos. Ex.: separar carros de bolas. Construção da causalidade e do tempo. Aos 2 anos, a criança estrutura a noção de espaço (ligada ao movimento) - um espaço geral que compreende os outros, caracterizando as relações dos objetos entre si. Causalidade - É a relação entre um resultado empírico e a ação que o atraiu (esquema causal). Ex.: Descobrir que, puxando um cordão, o brinquedo se movimenta. Manifestação de sentimentos elementares ou afetos perceptivos ligados à própria atividade. Ex.: prazer, dor, agradável, desagradável, interesse pelo próprio corpo etc. Obs.: Todos os aspectos enumerados são diretamente influenciados e, ao mesmo tempo, influenciam na afetividade e inteligência. Dica de leitura Para brincar com o tempo, utilize com seus alunos o livro Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. Lewis Carroll foi um professor de matemática, inglês, que se tornou famoso com este livro. A sua primeira tradução para o português foi feita por Monteiro Lobato por volta de 1930 é uma das obras- primas da literatura infantil mundial. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 37 Exemplificando: Uma criança de dez meses vê, por acaso, uma valise no canto oposto da sala. Fixa o olho no objeto. Começa a deslocar-se em direção a ele. Faz todo o sacrifício imposto por um deslocamento desajeitado – arrastando-se, esbarrando nos móveis e paredes- enquanto consegue avistar a valise. Se em um dado momento, perdê-la de vista, em função de um anteparo, sua atenção se voltará para um outro objeto interessante que esteja ao seu alcance e visível no seu novo campo visual, dedicando sua atenção e movimentos corporais a esta nova imagem, esquecendo-se do objetivo do deslocamento anterior (Furth, 1986). Como podemos perceber, neste exemplo, a criança demonstrou vários conhecimentos práticos. Foi capaz de fixar seus sentidos e a orientação do corpo em coisas que lhe atraíam o interesse e mostrou-se capaz de coordenar essa habilidade com eficiência. Entretanto, não foi capaz de um comportamento mais estável em relação ao primeiro objetivo de alcançar a valise. Sua atenção mostrou-se inteiramente dependente da ação. II - PERÍODO PRÉ-OPERACIONAL (2 - 7 ANOS) Este é um período marcado pelo aparecimento da linguagem, capacidade de reconstituir ações passadas (narrativa) e antecipar ações (representação mental), o que causa profundas mudanças tanto na área afetiva quanto cognitiva. É também um poderoso agente de socialização, da organização do pensamento (interiorização da palavra) e de experiências mentais (interiorização da ação). Dica da professora Importante identificar que nesse período o mundo que existe para a criança é o mundo percebido. O objeto deixa de existir quando não alcançado mais pelo campo visual. Observe crianças, ainda menores, que choram na ausência de seus cuidadores, mesmo que por breve período de tempo. A existência do objeto é em tempo real, pois não há condições de fixação, na memória daquele objeto. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 38 Tais mudanças não são bruscas, elas ocorrem em transformações lentas e sucessivas. É preciso que a criança reconstrua o objeto, o espaço, o tempo, as categorias lógicas de classes e de relações no plano da representação. Entretanto, é preciso ressaltar que esta é uma representação simbólica, uma vez que a criança não pensa propriamente, mas vê mentalmente o que evoca, no plano do egocentrismo intelectual, pois sua inteligência ainda não é reversível e ela ainda opera no concreto. Ela transporta o mundo para sua cabeça, transformando o real ao sabor de suas necessidades e desejos. Esse períodose subdivide em dois estágios: a) Estágio Pré-Conceitual (2 - 4 anos). A criança opera em nível de representação simbólica (imitação); Pensamento egocêntrico (não é capaz de se colocar no lugar do outro). É a indiferenciação entre o ponto de vista próprio e os pontos de vista dos outros ou entre a atividade própria e as transformações do objeto. É um fenômeno inconsciente. É uma absorção do eu nas coisas e nas pessoas com indiferenciação, uma vez que atribui ao outro qualidades provenientes de si ou da perspectiva particular em que está envolvido. A criança não relativiza por ausência de descentração. O egocentrismo confunde aparência com realidade, manifestando-se na representação que a criança faz de si no mundo. Animismo - presume que todos os objetos estão vivos - Provém de uma assimilação das coisas à própria atividade. Linguagem egocêntrica – sem a preocupação de comunicação com o outro. Para pesquisar Piaget fala do egocentrismo em dois níveis: intelectual e social. Procure pesquisar e diferenciar estes conceitos. Dica da professora Observe crianças em creche, há pouca socialização. As brincadeiras são isoladas, seu universo imaginário é grande suficiente para falar com animais, objetos e “amigos fantasmas”. Assim como, tudo que está ao seu alcance é “SEU”, puro egocentrismo. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 39 Raciocínio transdutivo - o raciocínio vai do particular para o particular. É a justaposição de elementos sem vinculá-los. A criança não estrutura suas idéias em conceitos, como o adulto, mas em pré-conceitos. São particulares no sentido em que evocam realidades igualmente particulares, possuindo um correlato simbólico próprio de cada criança. Ex.: Conta-se que uma criança de três anos, em dia de verão ensolarado, estranhou ao ver sua mãe com óculos escuros de grandes lentes. Esta, percebendo, tirou-o. E a criança, abrindo um largo sorriso exclamou: “- Agora você é minha mãe!”. Outra situação interessante é a da criança que, em viagem com a sua família, tendo visto uma barata na garagem de sua casa ao entrar no automóvel e, coincidentemente avistando outra barata que passava pelo chão do local para onde fora, exclamou: “- Ela também veio!” Finalismo - tudo tem um porquê; Artificialismo - As coisas foram construídas (as montanhas crescem - os lagos foram escavados) São esquemas de assimilação egocêntrica; Imitação diferida - É a formação de um símbolo mental de algo que a criança vê e mais tarde imita. b) Estágio Pré-Lógico ou Intuitivo (4 - 7 anos). Raciocínio pré-lógico (baseado em experiências perceptuais). A criança considera a imagem mental em toda sua concreticidade e a organiza mentalmente, sem conseguir utilizá-las em outros lugares de sua organização Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 40 mental. Exemplo: O objeto não pode ter duas funções. Se a mão se chama Maria, mais ninguém poderá ser Maria também. E diz ao coleguinha: “A minha mãe que é Maria, a sua mãe não é Maria, ... não é.” Ao final deste período, a criança se encontra em fase intermediária de não conservação e conservação. É o início das ligações entre estados e transformações, tornando possível pensá-las sob a forma reversível. Centração - enfoque em apenas um estado de uma situação (volume, comprimento, etc.) Obs.: Aos 5 anos a criança não considera altura e largura. Por exemplo: Ao lhe mostrar dois objetos semelhantes às figuras acima, um vazio e outro cheio de água (ambos têm o mesmo volume) e, mesmo passando o líquido de um para o outro recipiente na frente dela, ao lhe perguntar em qual cabe mais a criança não considerará a altura e a largura para responder. Poderá até dizer que são iguais, mas ao se questionar o porquê, dirá que viu todo o líquido passar de um para o outro recipiente. Pelo ensaio e erro, a criança pode chegar a uma descoberta intuitiva de relações. Irreversibilidade de pensamento - A criança não consegue reverter uma atividade, voltando atrás no raciocínio, a fim de coordenar os fenômenos previamente observados, com as circunstâncias presentes; Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 41 Ex.: “Você tem um irmão?” “Sim” “E ele tem uma irmã?” “Não” Enfoque em estados - A criança não entende o significado da transformação (conservação); Em exercícios de seriação com bastões, as respostas são intuitivas. Não faz inserções. III - OPERAÇÕES CONCRETAS (7 - 12 ANOS) Operações são ações no pensamento. É aquilo que transforma um estado A em um estado B deixando, pelo menos, uma propriedade invariante no decorrer da transformação, com possível retorno de B para A, anulando essa transformação. (Fraise e Piaget, 1979) Operações concretas. É a capacidade de raciocinar logicamente, organizar os pensamentos em estruturas coerentes e totais, e dispô-los em relações hierárquicas ou seqüenciais. (Pulaski, 1980) Exercite o pensamento de seus alunos. Segue uma sugestão, a poesia de Cecília Meireles. OU ISTO OU AQUILO Ou se tem chuva e não se tem sol ou se tem sol e não se tem chuva! Ou se calça a luva e não se põe o anel, ou se põe o anel e não se calça a luva! Quem sobe nos ares não fica no chão, quem fica no chão não sobe nos ares. É uma grande pena que não se possa estar ao mesmo tempo nos dois lugares! Ou guardo o dinheiro e não compro o doce, ou compro o doce e gasto o dinheiro. Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo... e vivo escolhendo o dia inteiro! Não sei se brinco, não sei se estudo, se saio correndo ou fico tranqüilo. Mas não consegui entender nada qual é o melhor: se é isto ou aquilo. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 42 São de duas ordens as operações que se constroem neste período: Operações lógico-matemáticas - São operações do sujeito sobre o objeto, que é visto como uma unidade a ser quantificada, seriada, classificada. Não são acompanhadas de imagem mental. Operações infralógicas - São as que se aplicam sobre um objeto situado num espaço e num tempo, nas suas relações parte-todo e nas suas relações físicas com outros objetos. Tipos de operações infralógicas CONSERVAÇÕES FÍSICAS Conservação é uma noção operatória que permite à criança compreender que alterações de forma não causam alterações de quantidade, peso ou volume. Em nível pré-operatório a criança, por não descentrar (centrar a atenção em dois ou mais estados ao mesmo tempo), não percebe a transformação, ficando presa a apenas uma forma do objeto. Conservações de quantidade a) Contínua Transvasamento de líquidos Identidade simples - “A água é a mesma, não aumenta nem diminui”. Reversibilidade; por inversão - “Se volta a água para o copo ela cabe toda”. Dica de leitura Sobre este tema, leia: GARDNER, H. Estruturas da Mente. Porto Alegre: Artmed, 2000. Dica da professora Gardner, ao formular a Teoria das Inteligências Múltiplas, tece algumas críticas ao trabalho de Piaget. No entanto, quando desenvolve sua teoria sobre a Inteligência Lógico- Matemática, reconhece que ninguém desenvolveu melhor este tema do que o próprio Piaget. A crítica de Gardner diz respeito ao fato de Piaget não haver levado em consideração as outras inteligências, que na opinião de Gardner compõem o conjunto da cognição. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 43 Reversibilidade por compensação ou reciprocidade de relações - “A taça é mais baixa mas é larga. O copo é alto, mas é estreito, é a mesma coisa”. Alteração da forma deuma porção de massa b) Descontínua Colocar, simultaneamente, com as duas mãos um grão de cada vez num copo alto e estreito e num outro largo e baixo na frente da criança. Interromper e questionar: Onde há mais grãos? 6/7 anos - É igual. 7/8 anos - Você botou um de cada vez em um e outro, então é igual. Conservação de peso Por volta de oito anos a criança já é capaz de entender que um quilograma de chumbo é igual a um quilograma de algodão, embora, em termos de quantidade física, ambos aparentem grande diferença. A criança compreende que alterações de forma não são, necessariamente, acompanhadas de alteração de peso. Conservação de volume Por volta de nove, dez anos, a criança já deve ser capaz de perceber que determinado volume permanece inalterado, mesmo quando aparentemente ocupa um espaço maior. Esta noção é alcançada quando a criança compreende que alterações de forma, posição, diferenças de peso não estão, obrigatoriamente, associadas às variações de volume. Importante No entanto, deve ser ponderada cada uma dessas experiências em função da realidade e do meio vividos pela criança. Lembremos que Piaget era suíço e em seu país não havia fome nem violência. Portanto, flexibilizar os conceitos e a evolução das crianças nas diferentes faixas etárias é tarefa fundamental de todo educador. Dica de leitura GOULART, Iris. Piaget: experiências básicas para utilização pelo professor. 14ª ed., Petrópolis: Vozes, 1998. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 44 II - CONSERVAÇÕES ESPACIAIS Conservação de comprimento Após os sete anos, a criança já é capaz de entender, por exemplo, que duas retas são iguais mesmo quando aparentemente são diferentes, como no desenho abaixo. Obs.: A conservação de comprimento é mais fácil de ser entendida do que a conservação de quantidades contínuas, volume e peso. Tipos de operações lógicas Vejamos alguns tipos de operações lógicas e o desempenho das mesmas no decorrer do processo de desenvolvimento cognitivo. I – CLASSIFICAÇÃO – É uma operação lógica em que a criança é capaz de organizar objetos em grupos de acordo com um ou mais atributos comuns a eles. Aditiva visual 5/6 anos - um atributo 8/9 anos - dois ou mais atributos Aditiva antecipatória Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 45 Ao se pedir à criança que coloque as figuras em envelopes, atendendo à mesma característica, usando o mínimo possível de envelopes, as respostas evidenciarão o nível de maturidade. Assim sendo, estruturas lógicas mais evoluídas vão caracterizar maior visão de síntese. Composição de classes A classe-inclusão é um tipo de operação de classificação na qual a criança compreende as relações entre um conjunto de objetos e seus subconjuntos, e entre vários subconjuntos. 9/10 anos - respostas corretas sobre todos e alguns. Obs.: A classe-inclusão é indispensável para a compreensão do conceito de número. Classificação multiplicativa - por volta de 8 anos A criança deve fazer classificações usando dois atributos ao mesmo tempo. Multiplicação lógica de classes - final do período operatório concreto A criança deverá ser capaz de trabalhar com duas, três ou mais variáveis, combinando-as entre si. Dica de leitura DOLLE, Jean-Marie. Para compreender Jean Piaget: uma iniciação à psicologia genética piagetiana. 4ª ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1983. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 46 II - SERIAÇÃO Nas operações lógicas de seriação, o indivíduo faz correspondências seriais. Consiste em corresponder a um conjunto de objetos de tamanhos diferentes, outros conjuntos de objetos igualmente diferentes em tamanho, seriando-os e fazendo correspondência termo a termo. Seriação simples; Seriação complexa; Transitividade - É o coroamento da operação lógica de seriação. Exemplo - Utilizando 3 conjuntos de botões (20 azuis - 25 vermelhos - 30 verdes), apresentar o azul e o vermelho, dizendo que há menos azuis do que vermelhos. Afastar o azul. Apresentar o verde junto ao vermelho. Dizer que há menos vermelhos do que verdes e questionar: Qual a cor do menor conjunto? Qual a cor do maior conjunto? Correspondências seriais - 7 anos - seriação simples III - COMPENSAÇÃO É um tipo de raciocínio que tenta restabelecer o equilíbrio de um sistema, modificando uma variável do próprio sistema ou de um sistema diferente. A criança precisa entender proporção. A partir da proporção qualitativa, chegará às proporções métricas simples. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 47 7/9 anos - proporções simples 9/11 anos - proporções complexas Vamos analisar alguns casos narrados por Furth (1990) e teremos a possibilidade de entender melhor a importância da teoria apresentada. Uma menina de nove anos de uma escola de elite passa duas horas alinhando algumas frases sobre barômetro. Sua mente está ocupada em copiar e memorizar palavras, em fixar a descrição do aspecto desse instrumento. Nessa atividade ela pensa pouquíssimo, ou quase nada, no único aspecto desse instrumento que poderia encerrar um desafio à sua inteligência – a compreensão da utilização e funcionamento do aparelho. Desta forma, seu intelecto não é adequadamente exercitado. Se esta criança tiver a oportunidade de ser estimulada a pensar fora da escola, provavelmente, terá a oportunidade de compensar tanto tempo perdido em tarefas escolares inúteis. Uma criança de cinco ou seis anos menos afortunada, que não contou no passado com um meio favorável, nem conta agora com um meio estimulante, como é o da escola descrita no caso anterior, estará jogando fora a oportunidade de estabelecer contato com a energia natural que possui e perderia o momento de trabalhar e desenvolver sua inteligência em um processo de aprendizagem construtiva. A aceitação de limitações mínimas predeterminadas para aquilo que uma criança é capaz de realizar, por parte dos professores, pais e às vezes da própria criança, tende a esti Dica da professora Atenção às considerações que estão sendo desenvolvidas nesta parte do texto. Elas são muito importantes! Marque as frases que você considera fundamentais na compreensão do que está sendo formulado. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 48 mular uma atitude passiva e a fixar critérios de expectativas prématuros e improcedentes. Tal tendência é tão injusta para a criança com altas habilidades quanto para aquelas portadoras de deficiência mental. Como vimos nos exemplos apresentados, os estímulos oferecidos ao processo de pensar, como atividades desafiadoras da inteligência, é que favorecerão o desenvolvimento do intelecto. É neste caminho que a escola precisa investir se quiser trabalhar o desenvolvimento da inteligência de seus alunos como define Piaget na seguinte frase citada por Furth, 1990, “A lógica do desenvolvimento é o desenvolvimento da lógica”. A escola precisa saber que tanto existe uma inteligência voltada para o campo musical, quanto para o campo das artes plásticas, das relações sociais e dos cálculos matemáticos. Que para desenvolvê-la, a criança e o jovem precisam contar com uma escola que não os obriguem a parar de pensar. Reconhecer que a inteligência trata de conceitos gerais, tais como: o conceito de objeto (identificando sua natureza), o conceito de classe, de relação e de raciocínio lógico e que um mesmo indivíduo poderá ter todos estes conceitos bem desenvolvidos ou apenas alguns, dependendo do estímulo ambiental que recebana escola e fora dela, é um grande passo para que as instituições educacionais atuem com mais eficiência no desenvolvimento da inteligência de seus alunos. A escola para o pensamento não deveria estar limitada a um currículo fixo. Na análise de Furth (1966), “Não haveria necessidade de completar um programa fixo, havendo tempo amplo para se atender ao desenvolvimento essencial. Se ao final de quatro Dica de leitura Sobre currículo: MOREIRA, Antonio Flavio B. Currículo: questões atuais. 1ª ed., Campinas: Papirus, 1997. SALES, Christina. O Currículo Construtivista na Educação Infantil: práticas e atividades. Tradução Vinícius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2004. ANDRADE, Rosamaria Calaes de. O Currículo ressignificado. Porto Alegre: Artmed, 2003. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 49 anos na escola elementar, uma criança não houvesse aprendido outra coisa senão usar seu intelecto nas atividades ordinárias de sua vida e da leitura, não seria este um resultado conveniente e de bons prognósticos para aprendizagens futuras? Ou ela deveria saber a data do descobrimento do Brasil, o nome dos presidentes, a conjugação dos verbos, para ser considerada bem-sucedida em seu processo de desenvolvimento intelectivo? EXERCÍCIO 1 Quem foi Piaget e qual sua contribuição para a psicologia do desenvolvimento principalmente no que se refere ao desenvolvimento cognitivo? ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ EXERCÍCIO 2 Baseado no curso que está fazendo formule uma atividade que possa trabalhar com seus alunos ou clientes utilizando os conhecimentos da teoria piagetiana. ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ Dica de leitura Sobre currículo: MOREIRA, Antonio Flavio B. Currículo: questões atuais. Campinas: Papirus, 1997. SALES, Christina . O Currículo Construtivista na Educação Infantil: práticas e atividades. Porto Alegre: Artmed, 2000. ANDRADE, Rosamaria Calaes de. O Currículo ressignificado. Porto Alegre: Artmed, 2003. Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 50 EXERCÍCIO 3 Segundo Piaget, os fatores que explicam o desenvolvimento cognitivo são: ( A ) Maturação, transmissão social e experiência física; ( B ) Experiência e conhecimento lógico-matemático; ( C ) Transmissão social, equilibração e maturação; ( D ) Equilibração, maturação, experiência e transmissão social; ( E ) Apenas o fator experiência. EXERCÍCIO 4 A teoria piagetiana afirma que o desenvolvimento do ser humano se processa através dos períodos abaixo relacionados numa ordem única: I. Período pré-operacional; II. Período operatório formal; III. Período operatório concreto; IV. Período sensório-motor. ( A ) IV, I, III, II; ( B ) I, III, II, IV; ( C ) II, III, I, IV; ( D ) III, I, II, IV; ( E ) I, II, III, IV. RESUMO Vimos até agora: Apresentação e discussão dos conceitos estruturais da epistemologia genética de Jean Piaget; Aula 2 | Jean Piaget e o desenvolvimento cognitivo 51 A resposta do ambiente contribui para um processo constante de reorganização mental, auto-regulando-o; O conhecimento não procede nem da experiência única dos objetos nem de uma programação inata pré-formada no sujeito, mas de construções sucessivas com elaborações constantes de estruturas novas; O sujeito se constrói como sujeito enquanto constrói o objeto. Os processos de acomodação levam o sujeito a estabelecer relações de objetividade com o mundo. Tais processos estão presentes durante toda a vida do indivíduo. A criança, ao nascer, inicia seu processo de equilibração sucessiva e progressiva por meio do desenvolvimento das estruturas da inteligência. Por fim, vimos a apresentação dos estágios do desenvolvimento da inteligência que segundo Piaget se organizam através de um processo interno (maturação neurológica) em contato com os estímulos ambientais e constituem as estruturas mentais; O modelo Histórico- Cultural de Vygotsky Eunice do Vale Madeira Maria Cristina Fontes Urrutigaray A U L A 3 A p re s e n ta ç ã o Nesta aula, o destaque é dado ao pensador que somente na década de 80 passou a ser conhecido nos meios educativos. Entretanto, a demora do conhecimento de sua teoria não diminui sua importância e valor. Lev Semenovich Vygotsky é conhecido como um dos principais representantes de uma escola da psicologia soviética denominada psicologia sócio-histórica. Para ele, o fundamento do funcionamento psicológico humano é cultural e, conseqüentemente, histórico. Vygotsky foi contemporâneo de Piaget, mas sua construção teórica difere bastante deste devido as influências recebidas pelo momento histórico, social e cultural que o moldou. Estamos falando de um pensador nascido na Rússia Czarista que viveu o conturbado período da Revolução Socialista e as discussões sobre as teses do materialismo dialético. Vygotsky se interessava pela formação social dos signos, neste sentido sua preocupação estava em torno da relação entre pensamento e linguagem. A linguagem que intermedia as relações sociais e forma o discurso interior em cada pessoa. Sendo assim, o funcionamento psicológico do homem é moldado pela cultura. O b je ti v o s Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de: Identificar semelhanças e diferenças entre as teorias de Piaget e Vygotsky, que fazem parte dos conceitos construtivistas; Reconhecer os principais postulados da teoria sócio- histórica, bem como sua influência no processo de desenvolvimento e aprendizagem; Destacar a importância da mediação e sua condição de realização nos espaços de aprendizagem; Dialogar sobre o processo de formação de conceitos na criança que são propostos por Vygotsky. Aula 3 | O modelo histórico-cultural de Vygotsky 54 Introdução Nesta aula vamos compreender um pouco do pensamento de LEV SEMENOVICH VYGOTSKY (Rússia - 17.11.1896 / 11.06.1934). Todo inventor, até mesmo um gênio, sempre é conseqüência de seu tempo e ambiente. Sua criatividade deriva das necessidades que foram criadas antes dele e baseia-se nas possibilidades que, uma vez mais, existem fora dele. É por isso que observamos uma continuidade rigorosa no desenvolvimento histórico da tecnologia e da ciência. Nenhuma invenção ou descoberta científica aparece antes de serem criadas as condições materiais e psicológicas necessárias para o seu surgimento. A criatividade é um processo historicamente contínuo em que cada forma seguinte é determinada pelas precedentes. (Lev. Vygotsky, apud. Veer e Valsiner, 1999) Lev. Semyonivich Vygotsky nasceu em 5 de Novembro de 1896, numa cidade provinciana da Rússia. Descendente de judeus, sofreu sanções pertinentes de uma Rússia czarista anti-semita. Portanto era fortemente identificado com as questões do povo judeu, pois estes não possuíam permissão do governo czarista para viver fora de seus guetos predeterminados nem podiam servir nas fileiras do exército por serem considerados “pessoas não confiáveis”. Em meio ao total isolamento imposto pelo governo, inclusive o sofrimento de conviver com uma “cota” para admissão de judeu em instituições de ensino superior, assim cresceu Vygotsky. Sua formação iniciou-se em Direito, pois essa carreira
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