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Tatyane Ferreira Odontologia 4. PSICOLOGIA DA INFÂNCIA: DESENVOLVIMENTO COGNITIVO, AFETIVO, MORAL E PSICOSSEXUAL Aspectos psicológicos do atendimento odontológico na infância Dentistas que atendem crianças, além de serem habilitados no uso dos procedimentos técnicos, devem estar preparados para lidar com o seu comportamento, porque é muito frequente as crianças não colaborarem para que o tratamento seja realizado (BRANDENBURG; HAYDU, 2009). Sendo assim, controlar o comportamento de crianças durante o tratamento odontológico é um dos grandes desafios para os dentistas. A falta de cooperação infantil em odontopediatria é um tópico de debate entre pesquisadores, que buscam explicações como medo, ansiedade e experiências aversivas para o fato. Pesquisas de análise do comportamento em contextos de odontopediatria fornecem evidências de que os estímulos aversivos, com função de operações estabelecedoras, alteram o valor de outras contingências presentes no contexto odontológico, como o reforço positivo ou a distração, sendo essa uma possível razão para a dificuldade do manejo de comportamentos não colaborativos das crianças (BRANDENBURG; HAYDU, 2009). A adesão ao tratamento no contexto odontológico inclui submeter-se a tratamentos profiláticos e cirúrgicos. No entanto, algumas crianças dificultam o atendimento do dentista ao apresentarem comportamentos como choro, gritos, movimentos corporais. Estes são denominados comportamentos não colaborativos por atrasarem ou impedirem o procedimento odontológico, exigindo do dentista alteração da rotina da consulta (BRANDENBURG; MARINHO-CASANOVA, 2013). Os estímulos que provocam desconforto, como a imobilização, e os que são dolorosos estabelecem seu término como reforçador e evocam comportamentos como empurrar, movimentos do corpo e da cabeça, e o choro. Alguns desses comportamentos são inicialmente respostas reflexas eliciadas por aqueles estímulos, mas, ao produzirem a interrupção do procedimento odontológico, são reforçados negativamente, adquirindo a função operante e caracterizando-se como respostas de fuga. Os eventos aversivos que Tatyane Ferreira Odontologia evocam esses comportamentos de fuga adquirem então a função de operações estabelecedoras, que estabelecem o seu término como reforço (BRANDENBURG; HAYDU, 2009). Além disso, os estímulos dolorosos são, normalmente, precedidos por estímulos que inicialmente são neutros, como, por exemplo, a sensação do esfregar o algodão ao fazer a anestesia tópica, o odor de materiais odontológicos, o som do sugador de saliva, a presença do dentista. Após o emparelhamento de um ou mais desses estímulos neutros com o estímulo doloroso, como a injeção, o estímulo neutro adquire a função de estabelecer o seu término como um reforçador negativo e passará a evocar respostas de esquiva. O estímulo neutro passa, então, a ter a função de operação estabelecedora condicional (BRANDENBURG; HAYDU, 2009). Conforme pesquisa realizada, foi indicado que as crianças com maiores dificuldades comportamentais e emocionais, de acordo com a avaliação dos acompanhantes, apresentaram também menos colaboração ante a situação de tratamento odontopediátrico, segundo a avaliação dos alunos (CARDOSO; LOUREIRO, 2008). Segundo resultados mostrados por Brandenburg e Haydu (2009), sugere-se que comportamentos de se movimentar muito, de chorar, de reclamar e de empurrar fazem com que os dentistas interrompam o procedimento odontológico, o que aumenta a probabilidade de ocorrência desses comportamentos no futuro. A não-colaboração caracteriza-se em comportamentos de fuga ou de esquiva do estímulo doloroso ou do estímulo que foi emparelhado com estímulos dessa natureza, isto é, há uma operação estabelecedora, que é o estímulo aversivo que estabelece o seu término como reforço (reforço negativo). Além disso, é possível que os brindes ou brincadeiras tenham poder reforçador enfraquecido para o comportamento colaborativo por serem apresentados com atraso, ou seja, somente após o final da consulta. Existe, ainda, a possibilidade de não terem valor reforçador nenhum, porque as crianças que frequentam ambientes odontológicos, de forma geral, não têm privação de brinquedos. A maioria das crianças tem brinquedos disponíveis o tempo todo em suas casas, e as brincadeiras são parte das atividades rotineiras em escolas de educação infantil e ensino fundamental. A atuação do psicólogo junto ao comportamento infantil envolve sempre o trabalho com pais. Na área da saúde, tanto no âmbito médico quanto no odontológico, não é diferente. Ao tratar da promoção da saúde infantil, da prevenção de doenças ou da adesão ao tratamento, é necessário que o profissional compreenda o papel dos pais e busque reeducar o comportamento dos mesmos para que possa atingir objetivos que tragam benefícios para a criança (BRANDENBURG; MARINHO-CASANOVA, 2013). Tatyane Ferreira Odontologia Até porque, segundo análises obtidas em estudo, mães podem exercer função de estímulos antecedentes e consequentes para o comportamento infantil no momento do atendimento odontológico, estabelecendo condições para o comportamento da criança de se autocontrolar e de seguir regras (BRANDENBURG; MARINHO-CASANOVA, 2013). Fato comprovado diante de pesquisa realizada em que se afirma que em relação aos acompanhantes, pôde-se verificar que as crianças cujos acompanhantes apresentaram indicadores de elevado medo diante do tratamento odontológico apresentaram mais dificuldades em colaborar com os procedimentos de tratamento odontológico quando comparadas às crianças cujos acompanhantes apresentaram ausência de indicadores de medo odontológico. As crianças cujos acompanhantes apresentaram indicadores de presença de estresse obtiveram médias significativamente maiores em todos os níveis de procedimentos odontológicos, quando comparadas às crianças cujos acompanhantes não apresentaram indicadores de estresse, sugerindo associação de menor colaboração com a situação de tratamento odontológico e a presença de estresse por parte acompanhante (CARDOSO; LOUREIRO, 2008). Diante disso, segundo estudo, os dados acerca do medo odontológico mostraram que 25,5% dos acompanhantes-mães apresentaram indicadores de alto medo diante do tratamento. A presença de indicadores de medo nos acompanhantes-mães foi associada a maiores dificuldades de colaboração por parte das crianças com o tratamento odontológico, de acordo com avaliação dos alunos. Supõe-se assim que os sentimentos e as atitudes dos acompanhantes - em geral, mães - em face do tratamento odontológico possam influenciar a percepção da criança ante a situação de atendimento. Neste sentido, destaca-se o papel dos acompanhantes enquanto modelos para as crianças (CARDOSO; LOUREIRO, 2008). Cabe ressaltar, ainda, que para a maioria das crianças, realizadas em estudo, a problemática é de natureza anti-social, caracterizando dificuldades externalizadas no meio de forma direta pela agressividade e oposição, apontando para um padrão comportamental pouco socializado e adaptado (CARDOSO; LOUREIRO, 2008). As situações mais difíceis enfrentadas pelos odontopediatras são aquelas em que as crianças, principalmente as mais novas, não colaboram com a realização do tratamento, chorando, gritando, movimentando a cabeça e o corpo, e fazendo tentativas de sair da cadeira. Esses comportamentos de não colaboração são, geralmente, atribuídos ao medo, a traumas, a condições fisiológicas ou a outros fatores inerentes ao indivíduo, sendo dado pouco valor para os eventos presentes no ambiente odontológico. Sendo a própria posição da criança na cadeira odontológica e o fato de a criança ter que ficar imóvel com a boca aberta por períodos Tatyane Ferreira Odontologia prolongados são condições com alto grau de aversividade, principalmente para crianças (BRANDENBURG; HAYDU, 2009). Sendoassim, é importante pontuar que para Possobon (2003), em relação a sua pesquisa, a não realização do tratamento enquanto a criança não colaborou, reforçou as manifestações dos comportamentos de não - colaboração, aumentando sua frequência ao longo das sessões. Para o analista do comportamento, esses eventos ambientais, que são classificados com base em suas funções comportamentais em estímulos eliciadores, estímulos reforçadores, estímulos punidores, operações estabelecedoras e estímulos discriminativos, são tão relevantes quanto possíveis fatores herdados, e devem ser considerados para se fazer uma análise apropriada do comportamento das crianças (BRANDENBURG; HAYDU, 2009). Além disso, o risco de a criança apresentar problemas comportamentais na situação de tratamento odontológico é maior nas crianças que apresentam problemas comportamentais segundo a avaliação do acompanhante e também naquelas cujos acompanhantes apresentam manifestações de estresse e alto medo odontológico (CARDOSO; LOUREIRO, 2008). Sendo assim, segundo Moraes (2004), seus resultados obtidos permitem alegar que é possível, através de uma análise funcional, identificar distintas classes de comportamentos e variáveis controladoras dos comportamentos envolvidos na interação odontopediatra criança; e as condições de saúde bucal, o plano de tratamento, o grau de medo e o nível de colaboração das crianças podem ser considerados como categorias que estabelecem condutas profissionais padronizados. Entende-se que o choro ou os movimentos são comportamentos eliciados ou parte de repertório aprendido em resposta à presença de estimulações aversivas. Tal aprendizado envolve condições ambientais das quais os pais fazem parte. Isso indica que não se pode apenas responsabilizar as crianças por chorarem ou se moverem, rotulando-as como “difíceis” e “teimosas”, mas podem-se buscar as relações entre indivíduo e ambiente. Esta é uma visão skinneriana otimista, pois, se a causa não está no interior da criança, e sim nas contingências, então é possível manipular as variáveis para modificar o comportamento. Dentre as variáveis manipuláveis estão os pais, que podem ser instruídos e treinados para agirem de forma mais adequada durante o atendimento odontológico, em benefício à saúde de seu filho (BRANDENBURG; MARINHO-CASANOVA, 2013). Estudo constata que, no contexto da clínica-escola, o atendimento odontopediátrico relatado no trabalho em questão mostrou o predomínio de manifestações de estresse por parte das crianças, acompanhantes e alunos, condição pouco favorecedora da aprendizagem dos alunos e de comportamentos de colaboração com o atendimento por parte das crianças, o que Tatyane Ferreira Odontologia se manifestou em procedimentos de diferentes níveis de invasão; tais características associadas às manifestações de estresse e comportamentais das crianças parecem se sobrepor à situação em si, na medida que, mesmo diante de procedimentos pouco invasivos, relacionados à baixa possibilidade de dor, observou-se pouca colaboração das crianças. Com isso, foi confirmado no estudo que interferência negativa das manifestações emocionais dos diferentes atores no comportamento de colaboração das crianças diante do tratamento odontológico, o que por sua vez acrescenta demandas à situação de aprendizagem por parte dos alunos (CARDOSO; LOUREIRO, 2008). Possobon (2003), afirma que é importante auxiliar a criança a enfrentar a situação de atendimento odontológico assim que uma interação inicial seja estabelecida com o profissional. Isto pode ser consegui do por meio da utilização de estratégias que restrinjam os movimentos da criança, associadas com procedimentos que induzam colaboração e possibilitem o enfrentamento dos eventos aversivos inerentes a situação odontológica. Dessa forma, a Psicologia, como parceira da Odontologia, poderia colaborar na reflexão e na problematização das intervenções numa postura criativa para a composição dos trabalhos consoantes com as necessidades de todos os atores envolvidos no processo saúde/doença/cuidado. Tal interlocução favoreceria a construção de espaços mais democráticos no trato com a alteridade, promovendo maior integração entre profissionais e usuários e contribuindo para a integralidade da atenção à saúde tão almejada pelo sistema de saúde (CARDOSO; LOUREIRO, 2008). Logo, “A habilidade para interagir e se comunicar com o paciente é essencial para criar uma boa relação profissional”. (MORAES, 2004, p.75). Tatyane Ferreira Odontologia Referência BRANDENBURG, Olivia Justen; MARINHO-CASANOVA, Maria Luiza. A relação mãe- criança durante o atendimento odontológico: contribuições da análise do comportamento. Estudos de Psicologia, Campinas, v.30, n.4, p.629-640, out./dez. 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-166X2013000400016>. Acesso em: 13 jun. 2017. BRANDENBURG, Olivia Justen; HAYDU, Verônica Bender. Contribuições da Análise do Comportamento em Odontopediatria. Psicologia ciência e profissão, v.29, n.3, p 462-475, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414- 98932009000300004>. Acesso em: 13 jun. 2017. CARDOSO, Cármen Lúcia; LOUREIRO, Sonia Regina. Estresse e comportamento de colaboração em face do tratamento odontopediátrico. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 13, n. 1, p. 133-141, jan./mar. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413- 73722008000100016&script=sci_abstract&tlng=pt>. Acesso em: 13 jun. 2017. MORAES, Antonio Bento Alves de et al. Psicologia e Odontopediatria: A Contribuição da Análise Funcional do Comportamento. Psicologia: Reflexão e Crítica, v.17, n.1, p. 75-82, 2004. Disponível em: <http://www.redalyc.org/pdf/188/18817110.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2017. POSSOBON, Rosana de Fátima. O Comportamento de Crianças Durante Atendimento Odontológico. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 19, n. 1, p. 059-064, jan./abr. 2003. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n1/v9n1a05.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2017. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-166X2013000400016 http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932009000300004 http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932009000300004 http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-73722008000100016&script=sci_abstract&tlng=pt http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-73722008000100016&script=sci_abstract&tlng=pt http://www.redalyc.org/pdf/188/18817110.pdf http://www.scielo.br/pdf/pe/v9n1/v9n1a05.pdf
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