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133 Cinema, a arte das imagens Acompanhe a sequência de imagens a seguir, do clássico filme Psicose, de Alfred Hitchcock: uma moça entra no chuveiro; o jato de água esguicha; a moça se delicia com a água. Através da imagem difusa da cortina do box, vemos que alguém abre a porta do banheiro e caminha em direção ao chuveiro; repentinamente, a cortina abre e revela a silhueta de uma senhora empunhando uma faca; a moça grita. Não vemos a faca atingindo a moça, mas vemos o sangue escorrendo na banhei- ra, a reação da moça, a cortina que arrebenta na tentativa de se segurar à vida e, finalmente, seu olhar inerte enquanto a água corre. Mais do que entendermos o que aconteceu – um assassinato –, estamos impactados pelo terror e pela tragédia da situação. Vivemos essa experiência através da arte do cinema. D iv ul ga çã o P ar am ou nt P ic tu re s. D iv ul ga çã o P ar am ou nt P ic tu re s. D iv ul ga çã o P ar am ou nt P ic tu re s. D iv ul ga çã o P ar am ou nt P ic tu re s. Sequência do assassinato no chuveiro do clássico Psicose, de Alfred Hitchcock, 1960. O cinema é a arte das imagens em movimento, acompanhadas ou não de som. Isso significa que uma história ou uma ideia que se pretenda transformar em um filme terá que ser pensada, em primeiro lugar, em imagens. O mestre Alfred Hitchcock (1899-1980), ao criar a cena descrita acima, sabia muito bem disso. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 134 Então como é o processo de transformar uma história ou uma ideia em uma sequência de imagens em movimento denominada filme? É isso o que nós vamos estudar neste capítulo. Como o cinema é uma arte muito trabalho- sa, envolve a participação de muitas pessoas e pode ser muito cara, tudo tem que ser muito bem planejado. E todo filme começa com um roteiro. Roteiro Como um livro, o roteiro conta por escrito a história ou a ideia do filme. Mas, diferente- mente do livro, a princípio não será publicado e vendido em livrarias. Será impresso apenas para servir como um guia do trabalho de todos os que participam da realização do filme: di- retor, produtor, atores etc. Carrière e Bonitzer apresentam uma definição ampla do papel do roteiro em um filme: Geralmente, ao final de cada filmagem, encontram-se roteiros nas latas de lixo do estúdio. Ali estão rasga- dos, amassados, sujos, abandonados. Raras são as pessoas que guardam um exemplar, mais raras as que os encadernam ou os colecionam. Dito de outra maneira, o roteiro representa um estado transitório, uma forma passageira destinada a se metamorfosear e a desaparecer, como a larva ao se transformar em borboleta. [...] objeto paradoxal: de todas as coisas escritas, o roteiro é a que contará com o menor núme- ro de leitores, talvez uma centena, e cada um desses buscará nele o próprio alimento: o ator, um papel; o produtor, um sucesso; o diretor de produção, um percurso inteiramente traçado para a fixação de um plano de trabalho. [...] só o diretor cinematográfico vai lê-lo totalmente, a ele retornando sem cessar como a um posto de socorro onde tudo se encontra, espécie de lembrete, sem falhas, às vezes chamado de Bíblia. (CARRIÈRE; BONITZER, 1996, p. 11) Estamos falando, portanto, de uma obra es- crita, mas com uma característica muito peculiar: um roteiro já é um filme. É o primeiro estágio de um filme. Dessa forma, a linguagem literária, por melhor que seja, não é a apropriada para um roteiro. Um texto “bem escrito” não resulta necessariamente em uma boa cena. O roteirista é muito mais um cineasta do que um escritor. E quanto mais o próprio filme estiver presente no texto escrito, maior as chances de termos em mãos um bom roteiro. Assim chegamos direto ao ponto: um roteiro deve nos fazer ver o filme em nossa mente. Por- tanto, algumas formas usadas constantemente na descrição de situações ou narração de histó- rias não são adequadas a um roteiro cinemato- gráfico. Para compreendermos um pouco essa diferença, tomemos a descrição de uma situação e vejamos como ela seria transformada em um roteiro de forma adequada. descrição da situação (linguagem literá- ria): O nascimento do cinema Em uma noite agitada de inverno em Paris, aconteceu a primeira sessão pública do cinematógrafo dos irmãos Lumière no porão do Grand Café. O evento foi um suces- so, com lotação esgotada. O público ficou deslumbrado com a novidade: a projeção de imagens da cidade em movimento. Causou especial alvoroço na plateia a imagem de um trem, que avançou em direção ao pú- blico e... passou! Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 135 roteiro (linguagem cinematográfica): CENA 1 – EXT. FRENTE DO GRAN CAFÉ – NOITE Rua movimentada de Paris, noite. Os lampiões iluminam a calçada, repleta de pedestres em pesados trajes de passeio. Um movimento mais intenso de carruagens e pessoas concentra-se em frente a uma marquise iluminada, onde se lê “GRAND CAFÉ”. O clima é festivo. Vemos senhores e damas descendo de suas carruagens e entrando no café. Ao lado da entrada, vê-se um grande cartaz com a foto de dois senhores de bigode e o enun- ciado “AUGUSTE & LOUIS LUMIÈRE”. No mesmo cartaz, lê-se em destaque: “CINEMATOGRAPHE”. CENA 2 – INT. PORÃO DO GRAND CAFÉ – NOITE AUGUSTE, um dos senhores de bigode cuja foto vimos no car- taz, faz os últimos ajustes em uma máquina. Ela está colocada no meio de um pequeno salão repleto de cadeiras voltadas para uma parede branca. As últimas cadeiras vagas são ocupadas. Os lampiões são apagados e a sala fica escura. O senhor de bigode aciona a máquina, que projeta um retângulo de luz na parede branca. Repentinamente, imagens dos portões de uma fábrica sur- gem no retângulo iluminado. A expressão de alguns espectadores se altera. Os portões da fábrica se abrem e os operários saem. Os espectadores estão estupefatos, incrédulos, acompanhando o movimento das imagens com os olhos. Alguns aplaudem. De re- pente, a imagem muda. Vê-se uma estação de trem, com pessoas andando para lá e para cá. Um trem se aproxima. Expressões de expectativa surgem no rosto de alguns espectadores. O trem se aproxima. A plateia fica mais inquieta. Uma senhora segura o braço do marido. O trem chega mais perto. Alguns espectadores gritam, outros levantam. AUGUSTE se levanta. AUGUSTE Calma, por favor! Está tudo bem. Na tela, o trem passa. Silêncio geral. Risos. Aplausos. Observando a transformação acima, percebemos algumas exigências da linguagem cinema- tográfica, em relação à forma de linguagem e à estrutura. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 136 sobre a forma de linguagem • A primeira exigência é que em um roteiro pouco é dito. Tudo deve ser mostrado ou sugerido. Cada informação – como “uma noite agitada de inverno em Paris”, “o evento foi um sucesso” e “causou especial alvoroço na plateia” – precisa encontrar uma ou mais imagens que nos contem essas pequenas células da história toda. Claro que poderíamos colocar no roteiro alguém saindo da sessão e comentando: “Esse evento foi um sucesso! Foi a primeira sessão do cinematógrafo? Puxa, incríveis essas imagens em movimento! E o trem?!...”. No entanto, não é preciso ser um crítico de cinema para perceber que essa seria uma opção bem questionável. Em segundo lugar, uma imagem sempre acontece no presente. Portanto, sua descrição deve estar no presente. Se, em uma história cinematográfica, algo importante aconteceu no passado, então (1) vimos esse acontecimento há pouco no filme como presente; (2) alguém conta no presente esse acontecimento; ou (3) vemos o acontecimento em flashback, também no presente. Em terceiro lugar, para que todos os lei- tores possam “ver o filme em suas men- tes”, as descrições devem ser na terceira pessoa, de forma clara e objetiva. Dessa forma, concluímos que a lingua- gemdo roteiro cinematográfico deve sugerir imagens que contem a história, no presente e na terceira pessoa. sobre a estrutura • Um filme é dividido em cenas. Uma cena, na definição de Michael Rabiger, é “um episódio ou sequência de eventos que geralmente acontecem em um local de- finido ou durante um período de tempo” (RABIGER, 2006, p. 31). Ou seja, em uma história ou acontecimento roteirizado, toda vez que mudamos de ambiente, é recomen- dável que a cena mude. Se há um salto no tempo, temos também uma nova cena. Em nosso pequeno roteiro, a CENA 1 se passa em frente ao Grand Café. Quando cortamos para o porão em seu interior, abrimos a CENA 2. Se, ainda no porão, déssemos um salto no tempo para ver as expressões dos espectadores no final da sessão, abriríamos uma CENA 3. Uma cena geralmente é formatada com os seguintes elementos: cabeçalho: • indicação do ambiente da cena (interno ou externo), breve des- crição do lugar da cena e período (dia ou noite); descrição das ações • : sempre em ima- gens, no presente e na 3.a pessoa; diálogos • : destacados, com o nome dos personagens e rubricas entre parênte- ses, se necessárias. Utilizando essa forma de linguagem e essa estrutura, você estará se comunicando com os realizadores do filme para que eles venham a produzir o filme que você imagi- nou. E nesse momento cabe entender um pouco melhor alguns elementos de que a linguagem cinematográfica é feita. Linguagem cinematográfica Com o roteiro em mãos, agora é a vez do diretor e sua equipe transformarem o que está no papel em um filme. Cenários definidos, atores ensaiados, luzes acesas. Chegou a hora de fazer a pergunta: “Onde coloco a câmera?” Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 137 Essa é uma decisão, em última instância, do diretor, o “contador da história” do filme. Ele é o responsável por uma etapa fundamental da realização de um filme, chamada decupagem. É quando o diretor estuda o roteiro e define como irá filmar cada cena. Ele não só respon- derá onde colocar a câmera, mas definirá com quantas imagens irá “contar a história” daquela cena. Cada uma dessas imagens, no cinema, recebe o nome de plano. Plano é um trecho de filme rodado ininterruptamente. É a unidade fundamental de um filme, aquilo que o compõe como linguagem. Por isso, vamos conhecer as possibilida- des e variáveis de um plano e perceber como cada possibilidade agrega uma ideia a qualquer imagem. Veremos as possibilidades de enqua- dramento, ângulos de filmagem e movimentos de câmera. enquadramentos • Quando falamos do enquadramento de um plano, estamos falando do seu ta- manho, ou daquilo que ele pode conter. O plano geral privilegia a paisagem ou o lugar onde os personagens atuarão, mostrando a amplitude do espaço em que estão inseridos. É muito usado para “contar” ao espectador, de forma geral, onde a ação vai se passar. Mas também pode servir para revelar a situação de personagens. Por exemplo, um plano de um personagem, visto como um pequeno ponto no meio da imensidão do deserto, pode nos sugerir a ideia da fragilidade dele frente às forças colos- sais da natureza, ou mesmo nos dar a ideia de que ele tem um longo caminho a sua frente. Para contar a história do nascimento do cinema que roteiriza- mos, poderíamos começar o filme com um plano geral da rua movimentada do Grand Café, com o objetivo de situar o lugar e o momento da ação (“Uma rua movimentada de Paris, noite.”). No plano médio nos aproximamos do(s) personagem(ns), geralmente cortando-os na altura da cintura. Cria-se um equilíbrio da presença dos personagens e do espa- ço em que estão inseridos. O espaço já não se impõe com tanta força quanto no plano geral. Conseguimos acompanhar melhor a ação, mas ainda mantemos sua relação com o ambiente, ou com seus elementos. O plano americano é uma variação um pouco maior do plano médio, cortando os personagens pelo joelho. Essa estranha forma de enquadramento popularizou-se nas cenas de duelo dos faroestes norte- -americanos (daí o seu nome), em que, além do rosto do personagem, interessa- va, aos realizadores, mostrar a arma em sua cartucheira, prestes a ser sacada. Com o primeiro plano ou close-up, aban- donamos a relação com o espaço e nos concentramos totalmente no persona- gem: seus pensamentos, suas reações e suas emoções. Esse plano geralmente mostra ombros e cabeça, podendo variar até um primeiríssimo plano, em que o rosto ocupa todo o enquadramento. Se o plano geral mostra o mundo externo, o primeiro plano mostra o mundo interno dos personagens, por isso é usado para acentuar a dramaticidade em determina- das situações. Já o plano detalhe mostra partes do corpo ou objetos. Como, por exemplo, um olho, uma boca, uma chave sobre a mesa ou o ponteiro de um relógio. Apresentados de forma simplificada, os enquadramentos (tamanhos dos planos) descritos acima seriam os seguintes: Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 138 PG PA PM PP PPP Plano Geral (PG). Primeiro Plano (PP). Plano Americano (PA). Primeiríssimo Plano (PPP). Plano Médio (PM). Variação de planos. IE S D E B ra si l S .A . Com esse pequeno repertório de enqua- dramentos é possível narrar situações sem palavras. Imagine a seguinte sequência de planos: plano geral de uma sala; plano médio de uma moça; plano detalhe de um relógio; primeiríssimo plano da moça; pla- no médio de uma porta. Sem dizer nada, construímos para o espectador a expecta- tiva dessa moça pela chegada de alguém. Mas há ainda outras variantes quanto ao uso da câmera. Ângulos de filmagem • Com relação ao ângulo em que a câmera mostra a cena, uma primeira opção seria o plongée. Essa palavra, em francês, significa “mergulho”. Nesse plano, o es- pectador vê a cena de cima para baixo. Com nosso olhar colocado nessa posição de “superioridade”, acentuamos senti- mentos de impotência ou inferioridade vividos pelo personagem. Em oposição, a filmagem em contra-plongée observa a cena de baixo para cima, destacando a imponência ou superioridade do perso- nagem ou objeto. A inclinação de planos também é usada como recurso para despertar a instabili- dade ou desequilíbrio de uma situação ou de personagens. Também há variações de ângulos, mostrando os personagens de perfil ou de frente. Movimentos de câmera • Um elemento único do cinema é a pos- sibilidade de movimentar o ponto de Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 139 vista de uma situação, ou seja, com o movimento da câmera é possível suscitar determinadas sensações ou ideias. Uma panorâmica é quando a câmera gira horizontalmente sobre seu eixo (ge- ralmente um tripé). Ela pode servir para acompanhar o movimento de alguém ou algo, “revelar” algo, descrever detalhada- mente elementos alinhados lado a lado, fazer-nos ver a extensão de um elemento ou estabelecer uma relação entre dois elementos distantes espacialmente. O tilt é a variação vertical da panorâmica, com as mesmas funções, mas trabalha com elementos alinhados de cima para baixo ou vice-versa. O zoom é um movimento óptico, produ- zido por um conjunto de lentes, a tele- objetiva, da câmera. Em um movimento de zoom in, nos “aproximamos” da cena; com um zoom out, nos “afastamos”. Os movimentos estão entre aspas porque a câmera efetivamente não varia sua dis- tância dos elementos. Trata-se de uma aproximação puramente óptica. Já no caso do travelling, a câmera se movimenta em relação ao objeto ou per- sonagem. A palavra em inglês quer dizer “viajando”. Conta-se que o travelling foi descoberto por um dos operadores de câmera dos irmãos Lumière quando ele filmou os canais de Veneza com o cine- matógrafo sobre uma gôndola. Hoje, o travelling geralmente é feito com a câme- ra colocada sobre um pequeno carrinho. Outro equipamento,a grua, parecida com um guindaste, permite movimentos não apenas horizontais, mas em todas as direções. E, ainda sobre a gramática da linguagem cinematográfica, vale lembrar a dica de Marcel Martin: Nunca seria demais acentuar [...] que a tela define um espaço privilegiado cujo limite deve permanecer puramente virtual, representando uma abertura sobre a realidade e não uma prisão quadrangular: o espectador nunca deve esquecer que o resto da realidade continua a existir alhures e pode a todo momento entrar no campo da câmera; o imobilismo e a rigidez da composição interna da imagem são, portanto, inimigos perigosos da osmose dialética que deve existir entre ela e a totalidade do universo dramático. (MARTIN, 2003, p. 55) Ou seja, cada enquadramento é um recorte da realidade da história que o diretor escolhe mostrar, mas ele pode contar com a imaginação do espectador para criar em sua mente aquilo que a imagem não mostra, mas sugere. É o que em cinema recebe o nome de elipse. Quantas vezes já vimos imagens simi- lares a esta: um pedestre está em uma esquina; escutamos o som de freios e uma batida; através da expressão do pedestre percebemos a gravidade do acidente. Bons diretores sabem que, na maioria das vezes, a melhor imagem é aquela que o espectador cria em sua mente, basta um “empurrãozinho” da imagem na tela. Com este repertório básico e suas infi- nitas variações, realizadores criativos inventam constantemente formas de contar histórias cheias de vida, surpre- sas e revelações. Para exercitarmos o uso desses elementos de linguagem cinematográfica, tomemos o nosso pe- queno roteiro da primeira sessão dos Lumière e vejamos como ele poderia ser decupado. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 140 decupagem • (Linguagem cinematográfica): CENA 1 – EXT. FRENTE DO GRAND CAFÉ – NOITE PLANO 1 – PLANO GERAL (PG) de uma rua movimentada de Paris. PLANO 2 - PANORÂMICA (PAN) em PLANO GERAL (PG) dos lampiões e pe- destres na calçada, terminando em um PG da fachada do GRAND CAFÉ. PLANO 3 – PLANO AMERICANO (PA) de senhores e damas descendo de suas carruagens. PLANO 4 – PG da entrada, fechando em ZOOM IN até um PLANO DETALHE (PD) do cartaz com a foto dos Lumière e do cinematógrafo. CENA 2 – INT. PORÃO DO GRAND CAFÉ – NOITE PLANO 1 – PLANO MÉDIO (PM) de AUGUSTE dando os últimos ajustes no cinematógrafo. PLANO 2 – PG do pequeno salão com as cadeiras voltadas para a pa- rede branca. PLANO 3 – PM de duas pessoas sentando em duas cadeiras vagas. PLANO 4 – PD dos lampiões sendo apagados. PLANO 5 – PG da sala que fica escura. Imagens dos portões de uma fá- brica surgem na tela. PLANO 6 – PM da expressão de alguns espectadores. PLANO 7 – PG da tela mostrando os portões da fábrica se abrindo. PLANO 8 – Primeiro Plano (PP) de um espectador estupefato. PLANO 9 – PP de uma senhora incrédula. Sons de aplausos. PLANO 10 – PG da tela: um trem se aproxima. PLANO 11 – PM de dois espectadores com expressões de expectativa. PLANO 12 – PG da tela: o trem continua se aproximando. PLANO 13 – PG da plateia: alguns espectadores se levantam. PLANO 14 – PG da tela: o trem está próximo. PLANO 15 – PM de uma senhora que segura o braço do marido. PLANO 16 – PM de AUGUSTE, que diz: “Calma, por favor!...” PLANO 17 – PG da tela: o trem passa. Silêncio geral. PLANO 18 – PG da plateia. Risos. Aplausos. Perceba como cada plano precisa estar bem identificado para não ser esquecido na hora da gravação. Note, também, como o número de planos aumentou e eles ficaram mais curtos conforme cresceu o suspense. A aceleração da montagem, na visão desse diretor, deu força à expectativa da situação. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 141 Essa é a forma por trás de todos os filmes que nos encantam, divertem e comovem. É sobre essa forma que muitos artistas, ao longo do último século, colocaram sua alma e criatividade, fazen- do nascer obras de arte que nos permitem viver experiências enriquecedoras e inesquecíveis. Cenas marcantes do cinema O duelo final do western Três Homens em Conflito, 1966. D iv ul ga çã o C on ti ne nt al . D iv ul ga çã o E m br af ilm e. Pixote, 1981: uma imagem vale mil palavras. D iv ul ga çã o M G M . A magia do cinema permite o salto temporal em 2001: uma Odisseia no Espaço, 1968. A pura magia de E.T. o Extraterrestre, 1982. D iv ul ga çã o U ni ve rs al . D iv ul ga çã o H or iz on P ic tu re s. A genialidade de roteiro e interpretação em Sindicato de Ladrões, 1954. D om ín io p úb lic o. Tempos Modernos, 1936: poesia e significado. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 142 Uma boa história, uma boa equipe, um bom elenco e uma decupagem marcante nos condu- zem a momentos incríveis, como as cenas finais de Os Suspeitos (Bryan Singer, EUA, 1995), O Sétimo Selo (Ingmar Bergman, Suécia, 1956), Oito e Meio (Federico Fellini, Itália, 1963), Três Homens em Conflito (Sergio Leone, Itália, 1966), Um Estranho no Ninho (Milos Forman, EUA, 1975), Thelma e Louise (Ridley Scott, EUA, 1991), Rashomon (Akira Kurosawa, Japão, 1950), Pixote (Hector Babenco, Brasil, 1981) e A Festa de Babette (Gabriel Axel, Dinamarca, 1987). O osso que se transforma em espaçona- ve em 2001: uma Odisseia no Espaço (Stanley Kubrick, Inglaterra, 1968), a revelação de família em Segredos e Mentiras (Mike Leigh, Inglaterra, 1996), a dança de Gene Kelly em Cantando na Chuva (Gene Kelly e Stanley Donen, EUA, 1952), as máquinas engolindo Carlitos em Tempo Mo- dernos (Charles Chaplin, EUA, 1936), a conversa de Robert de Niro com o espelho em Taxi Driver (Martin Scorsese, EUA, 1975), a separação do casal em Desencanto (David Lean, Inglaterra, 1945), a conversa dos irmãos em Sindicato de Ladrões (Elia Kazan, EUA, 1954) e o voo da bici- cleta em ET, o Extraterrestre (Steven Spielberg, EUA, 1982). São momentos que nos relembram que vivemos na Era do Cinema. Para saber mais O tempo no cinema e as novas tecnologias (MOURÃO, 2009) A história do cinema nos mostra que o modelo de linguagem narrativo clássico ins- tituído por Griffith, predominou no decorrer da evolução da produção cinematográfica. Um cinema com estrutura narrativa linear e naturalista, demonstrando respeito pela imagem captada pela câmera. No entanto, desde os primórdios, o cinema também se preocupou em desenvolver gêneros a partir dos quais pudesse expressar suas várias possibilidades de linguagem. Assim, ao lado dos irmãos Lumière, produtores de filmes com estruturas narrativas relativamente simples, temos Georges Méliès que, fasci- nado pela então nova tecnologia, transforma seus filmes em verdadeiras experiências de linguagem usando efeitos de imagem como substituição de objetos a partir de interrup- ções da câmera ou sobreimpressão feita com a própria câmera, os chamados trick effects. O objetivo é sempre o de criar uma ilusão próxima à ideia da magia. [...] Se para alguns teóricos […] o cinema deveria exprimir a realidade do mundo regis- trando a espacialidade dos objetos e o espaço que eles ocupam, sem uso de artifícios e respeitando sua unidade, para outros teóricos como S. M. Eisenstein, por exemplo, o cinema está baseado na montagem, que surge como necessidade ideológica uma vez que organiza os códigos para transformá-los em um meio de expressão cinematográfica. Dessa manei- ra, aquele cinema baseado na simples ação dá lugar a um cinema de ideias. Nessa perspectiva, é na montagem que encontramos a imagem do tempo uma vez que, o tempo cinematográfico sendo uma representação indireta, depende da organi- zação das imagens e sons para que ele se constitua. Quando Orson Welles realiza Cidadão Kane (Citizen Kane, 1940) e, logo a seguir, surgem os filmes do neorrealismo italiano no período do pós-guerra, já se elaborava importantealteração na tradição narrativa e de representação Griffthiana em favor de um percurso que, pode-se dizer, vai do naturalis- Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 143 mo ao realismo. Em Orson Welles temos a mistura de estilos diferentes (do jornalístico- -documental ao expressionismo), a noção de fragmento (o filme constituído por blocos narrativos e sequências independentes), a preocupação em registrar o tempo interior da ação em sua integridade (plano-sequência), o desenrolar de duas ações diferentes no mesmo plano (profundidade de campo), a narrativa em espiral fechando-se num círculo em oposição à linearidade teleológica de causa-efeito. Com as novas tecnologias, ampliam-se os recursos para se praticar e desenvolver essas novas formas de realismo, ou, se quisermos, de realidades. O tempo cinema- tográfico rompe definitivamente seus laços com a noção de continuidade temporal. […] nossa mente é capaz de registrar simultane- amente milhares de imagens e sons, sendo que tendemos a priorizar aquilo que nosso foco de atenção determina. Cada vez mais as novas técnicas per- mitem que o cinema proceda de maneira semelhante, chegando ao que Eisenstein desejava: “o cinema deve ser materialização do pensamento em movimento”. A interpretação visual da realidade deixa de ser somente figurativa e de sentido úni- co, passando a ser espelhamento de várias partículas elementares que coexistem e se fundem. O surgimento do vídeo, primeiro analógico e depois digital, nos coloca diante de uma ine- gável transformação das imagens e da tem- poralidade das mesmas. Não deixando de ser representação, o vídeo, diferente do cinema, é detentor de uma instantaneidade que nos aproxima do tempo real, aproximação esta permitida a partir da analogia, evidenciada pelo vídeo, entre o movimento e o tempo. Se para atingir a ideia de tempo real o cinema tem que, necessariamente, articular imagens e sons através de uma estrutura de montagem onde o conceito de continuidade narrativa, mesmo que de maneira velada, deve estar sempre presente no momento do corte, o vídeo é capaz de trabalhar as ações de maneira simultânea, sem ter que recorrer ao corte propriamente dito. A montagem clássica permite, a partir do paralelismo de imagens articuladas pelo corte, criar a sensação do enquanto isso. O plano cinematográfico se constitui como uma unidade espaçotemporal, elemento pri- mordial da linguagem cinematográfica. Já o vídeo permite dissimular a noção de começo e fim de um plano, dissolvendo dessa ma- neira, a unidade espaçotemporal. Mesmo a trucagem cinematográfica mais sofisticada não havia conseguido, até esse momento, criar imagens superpostas com tanta riqueza dramática. As novas formas de representação correspondem a uma nova relação do ser humano com a realidade. O pensamento contemporâneo está moldado por uma com- plexidade que o diferencia radicalmente da estrutura de pensamento linear dominante antes da revolução tecnológica. A evolução da informática e o avanço das telecomuni- cações determinaram uma mudança radical nas relações do homem com seu próprio mundo e, consequentemente, consigo mes- mo. É necessário estabelecer novos padrões de discussão de conhecimento. […] Dica de estudo Para quem quiser começar a colocar suas histórias em roteiros, o roteirista Hugo Moss mantém um site com dicas de formatação e escrita de roteiro. Acesse: <www.films.com. br/intro.htm>. Ali você encontrará maiores esclarecimentos sobre a linguagem do roteiro cinematográfico, a preparação da página do ro- teiro, exemplos dos termos de decupagem que estudamos e dicas gerais. Bom trabalho! Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 144 Exercícios de aplicação Em relação à forma da linguagem de um 1. roteiro cinematográfico, quais são as três exigências fundamentais? Conceitue cada uma delas. Descreva a nomenclatura da sequência dos planos abaixo.2. IE S D E B ra si l S .A . Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 145 Gabarito Exercícios de aplicação A primeira exigência é que em um roteiro 1. tudo deve ser mostrado ou sugerido. Cada informação precisa encontrar uma ou mais imagens que nos contem essas pequenas células da história toda. Em segundo lugar, uma imagem sempre acontece no presente. Portanto, sua descrição deve estar no pre- sente. Em terceiro lugar, para que todos os leitores possam “ver o filme em suas men- tes”, as descrições devem ser na terceira pessoa, de forma clara e objetiva. Plano Americano, Plano Geral e Primeiro 2. Plano (ou Close-up). Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 146 Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
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