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Fisiologia do Exercício Autor: Mauricio de Sant’ Anna Jr. Doutorando em Ciências Médicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Mestre em Ciências da Atividade Física pela Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO), Especialista em Atividade Física e Promoção da Saúde pela Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO), Especialista em Fisioterapia Respiratória pelo Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional / Associação Brasileira de Fisioterapia Cardiorrespiratória e Fisioterapia em Terapia Intensiva (COFFITO / ASSOBRAFIR), Professor do Centro Universitário Plínio Leite e Coordenador do Curso de Fisioterapia. É autor e coautor em diversas publicações científica nacionais e internacionais e revisor dos periódicos Journal of Physical Therapy e Journal of Cardiothoracic Surgery. Copyright© 2013 by Instituto Cristina Martins Projeto Gráfico e Diagramação: Simone Luriko Saeki Todos os direitos reservados. É permitida uma (01) cópia impressa deste material exclusivamente para o aluno matriculado neste curso. Para solicitar materiais educativos e inscrever-se em outros cursos, entre em contato com: Instituto Cristina Martins. e-mail: instituto@institutocristinamartins.com.br Home-page: www.institutocristinamartins.com.br 3 OBJETIVOS DE APRENDIZADO Após a leitura deste capítulo, você deverá estar apto a: Citar as principais fontes bioenergéticas. Descrever os processos de formação de energia pelos sistemas anaeróbico alático, anaeróbico lático e aeróbico. Reconhecer o processo de formação do ácido lático e indução à fadiga. Identificar os principais mecanismos de ativação de células satélites. Reconhecer as principais alterações cardiovasculares, agudas e crônicas, oriundas da realização do exercício físico. Citar as formas de exercício que podem reduzir o risco de doenças do sistema cardiovascular. Descrever os mecanismos envolvidos na formação da circulação colateral e redução de fatores de risco cardiovascular. Reconhecer as principais alterações ventilatórias oriundas da realização do exercício físico. Citar as principais repercussões agudas do sistema respiratório, frente ao exercício físico. Identificar os mecanismos responsáveis pela fadiga muscular ventilatória. Reconhecer as interações entre o processo bioenergético e as alterações promovidas no sistema musculoesquelético, cardiovascular e respiratório que ocorrem durante o exercício físico. Fisiologia do Exercício Mauricio de Sant’ Anna Jr. 4 Fisiologia do Exercício INTRODUÇÃO O exercício físico é um comportamento básico ao homem. Durante sua execução, são desencadeados importantes ajustes neurais, humorais, cardiovasculares, respiratórios, endócrinos e metabólicos. O objetivo é garantir a homeostase do organismo, diante da grande demanda energética exigida pela musculatura esquelética em atividade (1). Na antiga Grécia, o exercício físico era realizado na forma de ginástica e significava “a arte do corpo nu” (1,2). Era usado como treinamento para a guerra. A partir do século XIX, surge na Europa o exercício físico na escola, em forma de ginástica, jogos e dança. O momento deu início a novos métodos. Atualmente, o exercício físico pode ser entendido como uma situação que retira o organismo de sua homeostase. Ele promove alteração fisiológica em virtude do aumento instantâneo da demanda energética da musculatura exercitada. E, consequentemente, do organismo como um todo. O mecanismo provoca aumento de liberação de calor e modificação intensa do ambiente químico muscular e sistêmico (1,2). Durante a realização do exercício de natureza aeróbia, ocorre, de forma aguda, um comportamento característico em relação às respostas cardiovasculares. Há aumento da pressão arterial (PA) e do consumo miocárdico de oxigênio, traduzido pelo duplo-produto (2,3). As respostas ocorrem de forma diretamente proporcional à intensidade do exercício. Há, também, respostas pulmonares (ventilatórias), como o aumento da frequência respiratória, do volume corrente, da ventilação alveolar e do volume minuto. As alterações otimizarão o processo de difusão (4,5,6). Todos os fenômenos que envolvem as respostas cardiovasculares, ventilatórias, musculares e outras, só são viáveis em virtude dos complexos sistemas energéticos do organismo. Esses sistemas são capazes de manter o funcionamento do corpo em condições adequadas, assim como no exercício leve ou intenso (7). A complexidade bioquímica e funcional dos sistemas geradores de energia merece ser discutida minuciosamente. Assim, será possível, posteriormente, compreender melhor os efeitos oriundos da realização regular de exercício físico (7). FONTES ENERGÉTICAS PARA CONTRAÇÃO MUSCULAR E EXERCÍCIO FÍSICO (BIOENERGÉTICA) O organismo humano necessita de energia para andar, correr, trabalhar e, até mesmo, durante o sono. A produção de energia é uma condição sine qua non para que o organismo continue a desempenhar as mais diversas tarefas e funções (2). Todo trabalho biológico (contração muscular, transmissão nervosa, síntese tecidual, produção hormonal, circulação sanguínea, digestão, entre outros) depende, basicamente, do fornecimento contínuo de energia. Portanto, para manutenção da vida, há necessidade constante de produção de energia. Assim, há garantia permanente do equilíbrio fisiológico, denominado homeostase (5). A energia que o corpo necessita é extraída, diariamente, dos alimentos, que contêm carboidratos, gorduras e proteínas. A energia liberada durante a desintegração do alimento não é utilizada diretamente para realização de trabalho. Ela é transformada em um composto químico, denominado adenosina trifosfato (ATP). Por esse motivo, a nutrição adequada é o alicerce para o desenvolvimento físico. A boa nutrição proporciona tanto o combustível para o trabalho biológico quanto às substâncias químicas para extrair e utilizar a energia potencial contida nesse combustível (5,6). Os alimentos apresentam elementos essenciais para a síntese de novos tecidos e reparo das células existentes. Os nutrientes são divididos em dois grupos (7): 1) aqueles que são capazes de produzir energia, denominados de macronutrientes (carboidratos, lipídeos e proteínas) e 2) os que participam do processo metabólico, facilitando a transferência de energia. Além da água, estes são os micronutrientes (vitaminas e minerais). O grande propósito do processo metabólico denominado de respiração é transformar os nutrientes, na presença de CO2 e H2O, para a liberação de ATP. Após este processo, a energia química é convertida em várias outras formas, como: mecânica (contração muscular e motilidade gástrica), elétrica (impulsos nervosos), térmica (produção de calor interno). Além disso, participa como matéria prima de novos compostos biológicos (hormônios, síntese e reparação tecidual). O ATP é armazenado em todas 5 Fisiologia do Exercício as células, inclusive nas musculares. Todo o trabalho biológico só ocorre a partir da energia liberada pela desintegração (hidrólise) desse composto (8). A produção de energia requer processos tanto aeróbicos quanto anaeróbicos. A razão é haver quantidade limitada de ATP pronta nas células musculares. Isso obriga o organismo a utilizar, regenerar e produzir novos ATP constantemente, para manter a contração muscular e outras atividades biológicas, assim como o exercício físico (9). A principal fonte de armazenamento e liberação de energia para a contração muscular é o ATP. O músculo estriado esquelético produz ATP para sustentar a contração muscular a partir da combinação das seguintes vias metabólicas (10): 1. Via ATP–CP (transferência do fosfato da creatina fosfato: da CP para a ADP). Esta via também é chamada de anaeróbica alática (AA); 2. Via glicolítica (degradação anaeróbica da glicose). A via também é denominada de anaeróbica lática (AL); 3. Via oxidativa (degradação aeróbica da glicose, deácidos graxos e de aminoácidos na mitocôndria). A via também é conhecida como aeróbica (AE). Na prática, nenhum tipo de exercício ou atividade física utiliza uma única via metabólica para a produção da ATP. O que ocorre é o predomínio de uma determinada via, dependendo da intensidade do exercício. SISTEMA ANAERÓBICO ALÁTICO (AA) OU ATP-CP O sistema AA, ou ATP-CP, é capaz de gerar energia durante movimentos rápidos e vigorosos em poucos segundos (máximo de 10 segundos). Não depende de uma longa série de reações químicas. E não depende que o O2 captado pela respiração seja transportado até os músculos em contração (11). O ATP-CP está presente nos músculos. A última ligação dos dois últimos fosfatos tem alta concentração de energia. Quando a ligação do ATP é rompida pela ATPase, há liberação de energia. Esta une as proteínas contráteis dos músculos (actina e miosina) e resulta em contração muscular. O ATP rompido transforma- se em ADP + Pi (fosfato inorgânico). Para que o novo composto transforme-se em ATP novamente (ressíntese), a CP (fosfato creatina) deve ser quebrada pela ação da enzima creatina cinase, liberando energia que une o ADP + Pi em ATP. Ao ser quebrada, a CP transforma-se em C + Pi (creatina simples + fosfato inorgânico). Para que a C + Pi volte a ser CP, é necessário que o ATP formado dentro da mitocôndria (no ciclo de Krebs1,2), seja quebrado pela enzima ATPase e libere energia para a ressíntese da CP (12). A produção limitada de energia por esse sistema ocorre em função da pouca quantidade de ATP e CP disponíveis nos músculos. E também devido ao processo de ressíntese da CP, que é extremamente demorado, comparado à velocidade das reações de produção de energia pelo sistema. No organismo humano há, em média, cerca de 80 a 100g de ATP prontos para serem utilizados, enquanto há em torno de 320 a 600g de CP. A recuperação desse sistema se dá em 70% em 30 segundos e em 100% dentro de três a cinco minutos (9,10). SISTEMA ANAERÓBICO LÁTICO (AL) OU VIA GLICOLÍTICA No sistema AL, ou via glicolítica, a glicose é o único nutriente capaz de produzir ATP anaerobicamente. O processo ocorre no sarcoplasma pela via anaeróbica. Inicialmente, o glicogênio presente no músculo é convertido em glicose. Em seguida, quando esta é quebrada, há geração de duas moléculas de ATP que corresponde a 5% da capacidade de uma molécula de glicose de produzir ATP + ácido pirúvico. Se o ácido pirúvico encontrar O2 insuficiente, como ocorre neste sistema de produção de energia, o resultado é a formação de ácido lático (13). O ácido lático em alta concentração inibe a contração muscular3. E o exercício será interrompido. Após o exercício, durante o repouso ativo e passivo, o ácido lático formado e acumulado é ressintetizado em glicose, no fígado. Denomina-se ácido lático quando a concentração analisada está localizada no músculo. Quando a concentração é sanguínea, a nomenclatura correta é lactato. A ressíntese do glicogênio muscular é mais rápida durante as primeiras horas de recuperação, alcançando 1 Parte do metabolismo dos organismos aeróbicos (que utilizam oxigênio da respiração celular), como a fermentação lática, onde o piruvato é o receptor final de elétrons na via glicolítica, gerando lactato. 2 O ciclo de Krebs é uma via anfibólica. Ou seja, tem reações catabólicas e anabólicas , com o objetivo de oxidar a acetil coenzima A, obtida da degradação de carboidratos, ácidos graxos e aminoácidos a duas moléculas de CO2. 3 O acúmulo de ácido lático, resultante de um exercício intenso, provoca dor aguda ou imediata. Assim que o exercício é interrompido, a dor é aliviada. Quando a atividade física é realizada acima da nossa capacidade, pode provocar dor em vários músculos no dia seguinte (dor tardia). É o resultado de microlesões nas fibras musculares. 6 Fisiologia do Exercício 39% em duas horas e 53% em cinco horas. A ressíntese completa do glicogênio muscular requer um período de recuperação de 24 horas (12,13). SISTEMA AERÓBICO (AE) OU OXIDATIVO No sistema AE, a geração de energia ocorre pela via aeróbica. O processo inicial é semelhante ao sistema AL, onde a glicose é quebrada e produz ATP (ainda no sarcoplasma) + ácido pirúvico. Este, ao encontrar O2 suficiente, é deslocado para o ciclo de Krebs e sofre alteração química, resultando em eliminação de CO2. O gás é eliminado na expiração. Ou seja, há remoção de íons hidrogênio (H+) e elétrons, que entram no sistema de transporte de elétrons e sofrem outras modificações. Uma molécula de glicose no sistema AE produz 36 a 39 ATP. Há uma ordem de utilização de nutrientes pelo sistema AE. Primeiramente, é oxidada a glicose (glicólise). Posteriormente, são usadas as gorduras (aerobiose) e, por último, são utilizadas as proteínas (proteólise) (14). FISIOLOGIA DAS FONTES AERÓBICAS DE ATP Na presença de oxigênio, 1 mol de glicogênio é transformado completamente em CO2 e H2O, liberando energia suficiente para a ressíntese de 39 moles de ATP. As reações do sistema do O2 ocorrem dentro da célula muscular, e ficam confinadas em compartimentos subcelulares especializados, denominados mitocôndrias. O músculo esquelético é repleto dessas organelas. As reações do sistema aeróbio podem ser divididas em três séries principais: glicólise aeróbia, ciclo de Krebs e sistema de transporte dos elétrons (14). A capacidade, ou propriedade, da mioglobina ou da hemoglobina de ligar-se ao O2 está relacionada a uma unidade não peptídica, um grupo heme. Muitas proteínas necessitam de unidades não peptídicas específicas. Essas unidades são denominadas de grupos prostéticos. Uma proteína fora de seu grupo prostético característico é denomina apoproteína. O grupo heme constituí- se por um componente orgânico e por um átomo de ferro (Fig. 1). A parte orgânica, protoporfirina, é constituída por quatro anéis pirrólicos. Os quatro pirróis estão ligados por pontes de metano, para formar um anel tetrapirrólico (15). O átomo de ferro no grupo heme liga-se aos quatro nitrogênios na parte central do anel protoporfirínico. O ferro caracteriza-se por formar duas ligações adicionais, uma em cada lado do plano do grupo heme. Os pontos de ligação são denominados de quinta e sexta posição de coordenação. O átomo de ferro pode estar no estado de oxidação ferroso (+2) ou férrico (+3), além das formas correspondentes da hemoglobina (ferro-hemoglobina e ferri-hemoglobina). Acredita-se que somente a ferro-hemoglobina, o estado de oxidação +2, é capaz de ligar-se ao O2. A mesma nomenclatura aplica-se à mioglobina4. As subunidades e da hemoglobina apresentam a mesma estrutura. Porém, surgem novas propriedades de grande importância biológica quando diferentes subunidades juntam-se, com o objetivo de formar um tetrâmero. Comparada à mioglobina, a hemoglobina é uma molécula mais complexa e susceptível. Ela transporta H+ e CO2, além do O2. As suas propriedades de ligação ao O2 são reguladas por locais separados e não adjacentes. A hemoglobina é, portanto, uma proteína alostérica, diferente da mioglobina. A diferença é expressa de três maneiras: 1. A ligação do O2 à hemoglobina promove captação de mais O2 à mesma molécula. O O2 tende a ligar-se cooperativamente à hemoglobina. Este mecanismo não ocorre na mioglobina; 4 É uma proteína globular dos vertebrados. No homem, é formada por uma cadeia de 153 aminoácidos. Apresenta peso molecular de 16.700 daltons. É uma das proteínas mais simples que transporta O2. Fig. 1 Representação do átomo de ferro ligado aos quatro átomos de nitrogênio. 7 Fisiologia do Exercício 2. A afinidade da hemoglobina para o O2 depende do pH e do CO2 (Fig. 2). Tanto o H + como o CO2 promovem a libertação do O2 ligado. Reciprocamente, o O2 promove a libertação de H+ e CO2; 3. A afinidade entre o O2 e a hemoglobina também é regulada por fosfatos orgânicos (2,3-difosfoglicerato). Isso leva a uma menor afinidade da hemoglobinapara o O2, comparada à mioglobina. A mioglobina não apresenta qualquer alteração na ligação do O2 e do CO2. Com isso, tem efeito pouco apreciável. Na hemoglobina5, a acidez aumenta a libertação de O2. Baseado em conceitos fisiológicos, a redução do pH faz com que haja deslocamento da curva de dissociação do O2 para a direita, diminuindo a afinidade pelo O2. O aumento da concentração de CO2 (o pH constante), reduz concomitantemente a afinidade pelo O2. Nos tecidos em rápida metabolização, como o músculo em contração, são produzidas altas concentrações de CO2 e ácido. A elevação dos níveis de CO2 e H + nos capilares do tecido metabolicamente ativo promove a libertação de O2 da oxihemoglobina. O mecanismo foi descrito por Christian Bohr, em 1904 (16). E passou a ser conhecido, desde então, como “efeito Bohr”. Portanto, a oxihemoglobina6 do tecido muscular funciona como reserva de O2. A mioglobina do tecido muscular é capaz de armazenar O2. Quando há falta ou redução de O2, (ex.: em exercício intenso), o O2 armazenado é libertado para ser utilizado na mitocôndria do músculo, para síntese de ATP (17). SISTEMA AERÓBICO E METABOLISMO DE GORDURAS A gordura armazenada representa a fonte corporal mais abundante de energia potencial. A produção de energia é quase ilimitada. Representa cerca de 90.000 a 110.000kcal. A reserva corporal de energia na forma de carboidratos é inferior a 2.000kcal. A energia produzida para realização do trabalho muscular é oriunda, principalmente, da oxidação do glicogênio muscular e da glicemia. E dos ácidos graxos livres oriundos dos triglicerídeos (TG). As reservas de TG, em um homem adulto, estão nos adipócitos (17.500mmol), músculo esquelético (300mmol) e no plasma (0,5mmol). A energia total armazenada nos TG é 60 vezes maior do que no glicogênio. A quebra de lipídeos, no adipócito ou intramuscular, a ácidos graxos livres (AG) e glicerol ocorre em virtude de um processo denominado lipólise. A lipólise é um processo lento. E é estimulada em exercícios de intensidade baixa a moderada. O aumento do fluxo sanguíneo, observado nesse tipo de exercícios, desencadeia estímulo à lipólise. A consequência é o aumento na captação de AG livres pelas células musculares. Há relação inversamente proporcional entre a intensidade do exercício e a quantidade de AG liberados no plasma. À medida que a intensidade do exercício aumenta, diminui a quantidade de AG liberados para o plasma. Apesar de atividades com intensidades leve a moderada acarretarem a mobilização predominantemente de lipídeos como fonte de energética, o gasto energético total é significativamente inferior aquele gerado pelas atividades de alta intensidade, quando comparado o mesmo tempo de exercício. Quanto maior a intensidade da atividade, maior será o gasto energético, em função da capacidade do carboidrato produzir energia mais rapidamente. Cada grama de lipídeo é capaz de produzir 9kcal, enquanto cada grama de carboidrato produz 4kcal. No entanto, em uma atividade de alta intensidade, a mobilização de carboidratos será tão grande que a produção de energia por unidade de tempo será maior do que os lipídeos poderiam 5 A hemoglobina é uma metaloproteína que contém ferro presente nos glóbulos vermelhos (eritrócitos) e que permite o transporte de oxigênio pelo sistema cardiovascular. 6 Nos glóbulos vermelho do sangue encontra-se um pigmento, a hemoglobina, que lhes confere a cor característica. Nos pulmões a hemoglobina combina-se ao O2, dando origem ao composto denominado Oxiemoglobina. Essa ligação porém é considerada instável e quando o sangue atinge os tecidos e se desfaz a ligação e o O2 é cedido para as células, para ser usado na respiração. Fig. 2 Curva de dissociação da hemoglobina. Efeito do pH e da concentração de CO2 na afinidade da hemoglobina ao CO2. Adaptado de West, 2010. 8 Fisiologia do Exercício produzir. Uma estratégia frequentemente utilizada por educadores físicos, com o objetivo de aumentar o gasto energético total e, consequentemente, o favorecimento do emagrecimento, é o treinamento intervalado. Nesta estratégia ocorre variação na intensidade do exercício realizado. O objetivo é viabilizar a execução em intensidades mais altas, em vários períodos durante a sessão de atividade física. Ao final da sessão, um maior gasto energético total pode ser alcançado. Outra estratégia é o treinamento contínuo em intensidade mais alta, em uma sessão de exercício não muito longa. Assim, o indivíduo poderá apresentar maior gasto energético em menor tempo. Porém, esse tipo de estratégia deve ser utilizada, única e exclusivamente, em indivíduos fisicamente capacitados. O processo final da lipólise consiste em três moléculas de AG e uma de glicerol, que serão migradas para circulação sanguínea. O glicerol será, então, transportado para o fígado. E passa a ser o precursor da gliconeogênese. Na corrente sanguínea, os ácidos graxos ligam-se à albumina. Esta proteína será responsável por transportá-los até o músculo ativo. Porém, nem todos os AG são utilizados como fonte energética. Caso não sejam necessários para produção de energia, os AG poderão ser reesterificados a TG. A reesterificação pode ocorrer tanto no adipócito como no fígado. Durante a realização do exercício, a reesterificação é suprimida à medida que a lipólise é acelerada. Ao mesmo tempo, as concentrações séricas de AG ligados à albumina apresentam aumento significativo. O sistema nervoso simpático e a adrenalina são os grandes estimuladores do processo da lipólise. O hormônio do crescimento, o cortisol e o hormônio estimulador da tireóide também apresentam papel importante no processo. Por outro lado, a insulina é o grande inibidor da lipólise. Sendo assim, o aumento da glicemia pela administração de carboidratos, antes ou durante a atividade física, pode alterar o uso de substratos energéticos. Os TG intramusculares (TG-IM) são importantes fontes energéticas durante a realização de exercício. A mobilização dos TG-IM é mais simples, em função da proximidade das células musculares. E não é necessário o transporte via perfusional (circulação sanguínea). Os TG-IM são capazes de fornecer aproximadamente 50% dos lipídeos totais durante exercícios, com intensidade em torno de 65% do volume máximo de oxigênio. Os lipídeos presentes na corrente sanguínea são transportados por lipoproteínas. E também contribuem para a produção de energia durante o exercício. Estima-se que, em condições de repouso, 5 a 10% da oxidação dos lipídios são provenientes dos lipídeos plasmáticos. Os AG obtidos, seja pelo adipócito, pelos TG-IM ou pelas lipoproteínas circulantes, passam por uma série de etapas antes da oxidação efetiva e produção de energia. As etapas são: 1. Ativação da lipólise: conversão de TG em AG + glicerol; 2. Transporte do AG, se proveniente do tecido adiposo; 3. Captação do AG: estes são captados pela célula por meio de proteínas ligadoras de AG, presentes nas membranas das células musculares. Elas transportam os AG para o sarcoplasma; 4. Ativação no sarcoplasma: os AG podem ser reesterificados e estocados sob a forma de TG intracelulares. Ou podem ser ativados para o interior da mitocôndria. O AG destinado à -oxidação é ativado pela enzima acil CoA sintetase ainda no sarcoplasma; 5. Translocação (transporte para o interior da mitocôndria): o AG ativado é, então, transportado para membrana interna da mitocôndria pela ação da carnitina, que é uma proteína. 6. Beta-oxidação: o AG é convertido à unidades de dois carbonos, num processo denominado de beta-oxidação. Origina-se, assim, o acetil CoA. 7. Oxidação mitocondrial: é a utilização da acetil CoA no ciclo de Krebs e posterior geração de ATP pela cadeia de transporte de elétrons (fosforilação oxidativa). Para que a energia contida no AG possa ser utilizada, é necessária a presença de oxigênio. A oxidação de AG produz mais energia por átomo decarbono do que aquela a partir de outras fontes, como glicose e aminoácidos. A oxidação parcial dos lipídeos gera corpos cetônicos, que podem ser utilizados como substrato energético por tecidos como: músculos estriados esqueléticos, cardíaco e cerebral. A utilização de corpos cetônicos como fonte de energia está relacionada a momentos de privação de carboidratos. Isso ocorre em função da necessidade da acetil CoA, formada à partir da beta-oxidação dos ácidos graxos, ser dependente 9 Fisiologia do Exercício da presença do oxaloacetato para, então, formar o citrato e dar continuidade ao ciclo de Krebs. Tal situação depende, primariamente, de um equilíbrio entre a degradação lipídica e a de carboidratos. Sendo assim, quando a degradação lipídica é superior a de carboidratos, ocorre redução da disponibilidade de oxaloacetato. E, então, a acetil CoA é desviada para formação de corpos cetônicos. No entanto, os corpos cetônicos são ácidos. E o acúmulo deles no sangue não pode ser bem tolerado quando em níveis elevados. A consequência é a fadiga. Os estoques de lipídeos utilizados como fonte de energia variam em função do tipo, da intensidade e da duração do exercício. O nível de condicionamento físico é considerado fator de destaque na capacidade de utilização da gordura como fonte energética. O indivíduo treinado é mais capaz de utilizar gordura como fonte de energia, em função das inúmeras adaptações fisiológicas alcançadas pelo treinamento. Estas adaptações são: 1) aumento do número de mitocôndrias, 2) aumento da atividade das enzimas que participam do processo, 3) aumento dos estoques de TG-IM, 4) aumento da captação de AG pelas células musculares, 5) melhoria no transporte para o sarcoplasma, e 6) aumento na vascularização periférica. A disponibilidade de glicose também é considerada um regulador da utilização das gorduras como fonte de energia. Altas concentrações de glicose no meio intracelular diminuem a oxidação dos AG, pois inibem seu transporte para mitocôndria. Se há glicose disponível, a célula oxida, preferencialmente, glicose. Sendo assim, dependendo do conteúdo da refeição pré-treino e de durante a atividade, pode haver redução da oxidação das gorduras, em função do aumento da insulina. PAPEL DA PROTEÍNA NO METABOLISMO AERÓBICO O papel das proteínas no metabolismo aeróbico é considerado secundário durante o repouso. Na maioria das condições de exercício, as proteínas não desempenham nenhum papel. No entanto, na inanição, nas condições com privação de carboidratos e naquelas consideradas diferenciais de exercícios de resistência, como as corrida de longa duração, o catabolismo das proteínas pode ser significativo. As proteínas e os aminoácidos podem participar do metabolismo energético das seguintes formas: 1. Os aminoácidos, principalmente os de cadeia ramificada, fornecem seu grupo amínico ao piruvato, convertendo-o à alanina. Este processo é denominado de ciclo alanina-glicose. O transporte dos grupos amino para o fígado ocorre de forma não tóxica. Com a glicólise, há formação do ácido pirúvico. No entanto, além da possibilidade de ser convertido à lactato, ele pode, ainda, gerar a alanina. Para tal, os aminoácidos, principalmente os de cadeia ramificada, fornecem seu grupo amínico ao piruvato, convertendo-o à alanina. A enzima responsável pela conversão do piruvato à alanina é chamada de alanina aminotransferase. Após ser gerada, a alanina segue pelo sistema circulatório até o fígado, onde será desaminada e, novamente, convertida a piruvato. Este será convertido à glicose. O mecanismo favorece a manutenção das concentrações glicêmicas durante o exercício prolongado, a partir do metabolismo dos aminoácidos. Além de gerar piruvato, a alanina também é responsável pela formação de ureia, que será filtrada pelos rins e excretada na urina. 2. Os aminoácidos são consumidos e geram intermediários para o ciclo de Krebs. Quando a atividade é moderada, os aminoácidos de cadeia ramificada seguem para a mitocôndria, e fornecem intermediários para o ciclo de Krebs. Outros aminoácidos, principalmente a leucina, são degradados à acetil CoA. O consumo de aminoácidos pelo músculo favorece o funcionamento do ciclo de Krebs. A redução do conteúdo de glicogênio pode intensificar a utilização desses aminoácidos na geração de energia. Isso ocorre porque o ácido pirúvico proveniente da glicólise gera oxaloacetado, que é um importante intermediário do ciclo de Krebs. Com a redução do glicogênio há, também, diminuição do ácido pirúvico e, consequentemente, do oxaloacetato. A redução do fluxo de substratos para o ciclo de Krebs dificulta o metabolismo aeróbico. A proteólise pode, então, aumentar, com o objetivo de otimizar o ciclo de Krebs. Sendo assim, fica claro que uma dieta com baixo teor de carboidratos favorece a degradação proteica. Já a ingestão adequada de carboidratos antes 10 Fisiologia do Exercício e durante o exercício prolongado ajuda a reduzir o catabolismo de proteínas. Além do conteúdo de glicogênio, o aumento da degradação de proteínas no tecido muscular durante o exercício pode ocorrer devido a: 1) diminuição da energia destinada à síntese, 2) duração da atividade, 3) ação dos hormônios glicocorticoides e 4) redução dos níveis plasmáticos de insulina. Já durante o período pós atividade há aumento da síntese de proteínas. O fato sugere que o período de recuperação é direcionado, preferencialmente, para a síntese de proteínas. Sendo assim, as recomendações da ingestão de nutrientes no pós treino, em geral, tem o objetivo de otimizar a síntese e reduzir a degradação proteica. A Fig. 3 apresenta um esquema da integração metabólica dos macronutrientes. RECUPERAÇÃO DOS SISTEMAS APÓS O EXERCÍCIO Imediatamente após um exercício, o consumo de oxigênio (VO2) diminui rapidamente. Este processo é descrito, por alguns autores, como sendo a fase de recuperação rápida do O2. Posteriormente, ocorre a fase de recuperação lenta do O2 (11). O O2 armazenado na mioglobina auxilia a difusão do O2 do sangue para as mitocôndrias. Durante a fase de recuperação rápida, as reservas de O2-mioglobina são refeitas por meio do O2 consumido imediatamente após o exercício. Já as gorduras são reconstituídas apenas indiretamente, pelo reabastecimento de carboidratos (glicose e glicogênio) (12). A maior parte da reserva de ATP utilizada pelo músculo durante o exercício é restabelecida poucos minutos após o exercício (Quadro 1). Porém, para que o processo ocorra de forma adequada, é necessária a presença de O2 que, nesse momento, encontra-se disponível na circulação sanguínea (12). A total recuperação das reservas de glicogênio após o exercício pode levar alguns dias (Quadro 2). E depende de dois importantes fatores: 1) o tipo de exercício realizado e 2) a quantidade ingerida de carboidratos alimentares durante a recuperação. O meio mais rápido, utilizado para reconstrução do ATP, é o sistema ATP–CP. Durante a contração muscular, entretanto, a quantidade de ATP produzida por essa via é muita pequena. E pode ser utilizada por período de aproximadamente 6–10 segundos. Outra via de reconstrução rápida da ATP é a via glicolítica. Esta degrada a glicose até ácido pirúvico, Fig. 3 Integração metabólica dos nutrientes. Fonte: adaptado de Biesek S, Azen L, Guerra I. Estratégias de nutrição e suplementação no esporte. Ed Manole, 2005; e Lancha Jr, AH. Nutrição e metabolismo aplicados à atividade física. São Paulo. Ed Atheneu, 2004. 11 Fisiologia do Exercício e produz aproximadamente 2–3 moléculas de ATP. A glicose chega à célula muscular pela corrente sanguínea. E tem entrada facilitada pela ligação estabelecida entre as proteínas transportadoras de glicose (GLUTs). O GLUT–4 é a proteína transportadora de glicose expressa no tecido muscular esquelético, cardíaco e adiposo (18). Na célula muscular, cerca de 10 a 15% da quantidade total do GLUT-4localiza-se no retículo sarcoplasmático. Durante o exercício, grande parte dos GLUTs armazenados no retículo sarcoplasmático migra para o sarcolema, aumentando a captação da glicose pela célula muscular (19). As duas vias de ressíntese do ATP, a ATP-CP e a glicolítica, têm grande importância na contração muscular, principalmente enquanto ainda não existe O2 disponível. Porém, cabe ressaltar que a glicólise anaeróbica apresenta, como produto final de suas reações, o ácido lático. E este limita a continuação da atividade física por períodos prolongados (14). A via oxidativa é a mais eficiente na produção de ATP e requer a utilização de O2 mitocondrial (Quadro 3). Apenas por essa via ocorre produção de ATP a partir de ácidos graxos. A produção de ATP pela via oxidativa envolve a interação entre dois mecanismos metabólicos: 1) ciclo de Krebs, 2) cadeia de transporte de elétrons. Nos exercícios prolongados, com duração superior a 10 minutos, a ressíntese do ATP para a manutenção da contração muscular passa a ser, predominantemente, pelo metabolismo oxidativo. MUSCULATURA ESTRIADA ESQUELÉTICA E EXERCÍCIO O exercício físico é um desafio diferente para o músculo. Ele envolve o aprimoramento muito mais do suprimento de energia ao músculo do que de seu tamanho (20). Os músculos contêm células de tecido conjuntivo, endoteliais dos vasos sanguíneos e processos neuronais. Mas quase todo o tecido consiste de grandes células musculares altamente diferenciadas. Os componentes da célula muscular recebem nomes especiais: membrana (denominada sarcolema), citoplasma (denominado sarcoplasma) e o retículo endoplasmático liso do retículo sarcoplasmático (20). O sarcolema é uma membrana delgada. Embaixo dela estão situados os núcleos celulares. Uma pequena porcentagem desses núcleos é representada por células satélites (CS), que podem ser fontes importantes de regeneração muscular após uma lesão (21). As células satélites são indiferenciadas e mononucleadas, cuja membrana basal está em continuidade com a membrana basal da fibra muscular. Elas fazem parte de uma população de células com grande atividade mitogênica. Contribuem para o crescimento muscular pós- natal, o reparo de fibras musculares danificadas e a manutenção do músculo esquelético adulto. Adiante, essas células tão essenciais para a regeneração muscular, serão elucidadas (21, 22). O sarcoplasma contém mioglobina, tecido adiposo, glicogênio, fosfocreatinina, ATP e centenas Quadro 1. Tempo de Recuperação do Sistema ATP-CP Tempo % 30seg 70 1min 80 2 a 3min 90 5 a 10min 100 Fonte: adaptado de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Exercise Physiology: Energy, Nutrition and Human Performance, 2008 Quadro 2. Tempo de recuperação de alguns processos bioquímicos pós exercício Processo Tempo Recuperação das reservas de O2 do organismo 10 a 15seg Recuperação das reservas anaeróbio nos músculos 2 a 5min Eliminação do ácido lático 30 a 90min Ressíntese das reservas intra-musculares de glicogênio 12 a 48h Recuperação das reservas de glicogênio no fígado 12 a 48h Fonte: adaptado de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Exercise Physiology: Energy, Nutrition and Human Performance, 2008 Quadro 3. Substrato energético e produção energia. Vias Substratos Utilização de O2 Produção de ATP Creatina Fosfato (ATP – CP) Creatina Fosfato Não Pouquíssima e limitada Glicólise anaeróbica Glicogênio (glicose) Não ± 2 – 3 Via oxidativa Glicogênio, gorduras e proteínas Sim ± 36 – 38 Fonte: adaptado de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Exercise Physiology: Energy, Nutrition and Human Performance, 2008. 12 Fisiologia do Exercício de filamentos proteicos, chamados miofibrilas (23). As miofibrilas são organelas cilíndricas onde estão localizadas as unidades contráteis denominadas sarcômeros. Estes também serão discutidos adiante. As miofibrilas frequentemente estendem-se ao longo de toda extensão da célula e ocupam a maior parte de seu volume. Elas são formadas pela fusão de diversas células mesenquimatosas de pequenas dimensões, chamadas mioblastos. Estes permanecem juntos das miofibras maturas. E, em seguida, a uma lesão muscular, podem proliferar e fundir-se, formando novas células musculares. O retículo sarcoplasmático regula o fluxo do íon cálcio, necessário para a realização rápida dos ciclos de contração e relaxamento. Consiste em uma rede de cisternas do retículo endoplasmático liso, que envolve grupos de miofilamentos, separando- os em feixes cilíndricos (24). Os túbulos T são de chamados túbulos transversos. Ou seja, eles correm transversalmente à miofibrila. São responsáveis pela propagação do impulso nervoso desde o sarcolema até as porções mais profundas da fibra e pela contração uniforme de cada fibra muscular. Em cada lado do túbulo T há uma cisterna terminal do retículo sarcoplasmático. Este complexo é conhecido como tríade (24). Os filamentos proteicos estão organizados dentro das miofibrilas e são constituídos de dois filamentos, um mais fino, chamado actina, e um mais espesso, a miosina. A proteína actina é composta de moléculas globulares, unidas para formar uma dupla hélice. Está envolvida química e mecanicamente no processo de contração muscular. E é constituída de mais duas outras proteínas importantes, a tropomiosina e a troponina. Já a miosina tem minúsculas projeções proteicas em cada extremidade que se estendem na direção dos filamentos de actina. Devido a tal condição, recebe o nome de ponte cruzadas e, juntamente com os filamentos de actina, desempenham papel muito importante na contração. A matriz extracelular é uma mistura de componentes. Inclui fibras proteicas (colágeno e elastina), glicoproteínas simples e complexas (proteoglicano) da matriz e líquido tecidual. Na matriz extracelular está localizada a lâmina basal muscular, que contém a laminina, colágenos dos tipos IV e V, e proteoglicano de sulfato de heparina. Os invólucros externos de tecido conjuntivo do músculo consistem, principalmente, de fibrilas de colágeno tipo I (21). ORGANIZAÇÃO MUSCULAR Cada músculo tem uma origem superior (cabeça) e uma inserção inferior. A parte volumosa entre elas (ventre muscular) forma a porção contrátil ativa. As células musculares individuais são envolvidas por uma camada de tecido conjuntivo (lâmina basal), juntamente com as fibras de colágeno delgadas e irregularmente dispostas, chamadas de endomísio. Grupos de células musculares esqueléticas formam os fascículos (feixes de 150 fibras) (25). Os fascículos, por sua vez, são revestidos por uma bainha de matriz mais espessa, composta, principalmente, de fibras de colágeno e fibras elásticas, denominadas perimísio. Envolvendo a parte externa do músculo, há uma bainha periférica mais densa de tecido conjuntivo fibroso, o epimísio. Este tem um papel vital na transferência de tensão muscular, através do tendão para o osso (25). As três camadas de tecido conjuntivo são constituídas, principalmente, por fibrilas de elastina e colágeno. Estas têm a função fundamental de manter as fibras musculares unidas, para que a força de contração gerada por cada fibra, individualmente, atue sobre o músculo inteiro. Também servem para permitir que os vasos sanguíneos penetrem no músculo, e forme uma rica rede de capilares. A fáscia muscular é caracterizada como uma bainha elástica de contenção. Está em continuidade com os tendões e aponeuroses musculares, formando um sistema interligado, adaptado à transmissão de tensões mecânicas (26). IRRIGAÇÃO SANGUÍNEA O tecido muscular é recoberto por uma rede extensa de pequenos vasos sanguíneos (capilares). Há, em média, 3.000 vasos por mm, em um corte transversal. Quando o músculo está em repouso, 95% dos capilares ficam fechados. Porém, durante a atividade física, eles se abrem de forma progressiva, com o objetivo de assegurar amplo suprimento sanguíneo para o tecido ativo (27). Esses vasos penetram no epimísio, passam entre os fascículos muscularesno interior da matriz e ramificam-se repetidamente em numerosas arteríolas, capilares e vênulas. Formam extensas redes dentro e ao redor do endomísio. Dessa forma, cada fibra passa a receber um bom suprimento sanguíneo recém- oxigenado, proveniente do sistema arterial. Ao meso tempo, processa a remoção dos produtos nocivos, como CO2, através do sistema venoso (27). 13 Fisiologia do Exercício COMPOSIÇÃO QUÍMICA Aproximadamente 75% do músculo esquelético são representados por água e 20% por proteínas. Os 5% restantes são constituídos por sais inorgânicos e outras substâncias, incluindo fosfatos de alta energia, ureia, ácido lático, cálcio, magnésio, fósforo, sódio, potássio, cloreto, várias enzimas, aminoácidos, lipídeos e carboidratos. As proteínas musculares mais abundantes são a miosina (aproximadamente 60%), a actina e a tropomiosina. Além disso, cerca de 700mg da proteína conjugada mioglobina, são incorporados em cada 100g de tecido muscular (28). FIBRAS MUSCULARES Os tipos de fibras são uma consideração importante na área do metabolismo muscular e consumo de energia. São divididas em: Fibras de Contração Lenta Estas também são chamadas de fibras musculares oxidativas ou fibras do tipo I. Geram energia predominantemente para ressíntese de ATP, por meio do sistema aeróbico, para a transferência de energia. Elas se caracterizam pela quantidade relativamente baixa de miosina ATPase, menor capacidade de manipular o cálcio e baixa velocidade de contração. Contêm numerosas mitocôndrias relativamente volumosas, as quais são necessárias para alimentar o metabolismo aeróbico. Portanto, as fibras de contração lenta são resistentes à fadiga e bem apropriadas para o exercício aeróbico prolongado. Fibras de Contração Rápida Estas também são chamadas de fibras do tipo II. São subdivididas em tipo IIa7, tipo IIb8 e tipo IIc9. As fibras musculares de contração rápida têm alta capacidade para a transmissão eletroquímica dos potenciais de ação, alto nível de atividade de miosina ATPase, e nível rápido de liberação e captação do cálcio. A velocidade intrínseca de contração e elaboração de tensão dessas fibras é três a cinco vezes maior do que aquela das fibras de contração lenta. O processo metabólico, encontrado no interior do músculo esquelético, sofre alterações em resposta ao treinamento com exercícios. Todas essas adaptações resultam em maior capacidade de gerar ATP, conforme descrito anteriormente, no processo bioenergético. EFEITO DO EXERCÍCIO FÍSICO DE NATUREZA AERÓBICA NO SISTEMA MUSCULAR 1. Maior conteúdo de mioglobina. A principal função da mioglobina é o fornecimento de oxigênio da membrana celular para as mitocôndrias, onde é consumido. O seu conteúdo no músculo esquelético aumenta substancialmente, em até 75% a 80%, após o treinamento de endurance. Essa resposta é específica, pois aumenta somente nos músculos que participam do treinamento (28). 2. Melhor oxidação de carboidratos (glicogênio). O músculo treinado exibe maior capacidade de oxidar carboidratos. O exercício eleva a capacidade do músculo em fracionar completamente o glicogênio, na presença de O2, para CO2, H20 e ATP. As principais adaptações subcelulares que contribuem para que as células musculares desenvolvam a capacidade de realizar essa tarefa são: aumento no número, tamanho e área superficial nas membranas das mitocôndrias do músculo esquelético e aumento no nível de atividade e/ou na concentração das enzimas que participam do ciclo de Krebs e do sistema de transporte de elétrons (29). Além da maior capacidade do músculo oxidar o glicogênio, também há aumento da quantidade de glicogênio armazenado no músculo, após o treinamento. O músculo esquelético humano contém, normalmente, de 13 a 15g de glicogênio por quilograma de músculo. Após o treinamento, essa quantidade aumenta 2,5 vezes (30). 3. Enzimas. Em relação ao melhor maquinismo estrutural para a respiração celular, há capacidade muito aumentada de gerar ATP aerobicamente, por meio da fosforilação oxidativa. Essa maior capacidade reflete o aumento, em aproximadamente duas vezes, da concentração de enzimas do sistema aeróbico. Isso representa elevação da quantidade total de material mitocondrial. Essas alterações permitem que o indivíduo aumente a capacidade aeróbica durante o exercício prolongado, sem acúmulo de lactato (31). 4. Melhor oxidação de gorduras. A oxidação de lipídeos para CO2, ATP e H2O aumenta após o 7 Tipo IIa: vermelha, conhecida como fibra de contração rápida intermediária pelo fato de sua capacidade de contração rápida estar combinada à capacidade moderadamente bem desenvolvida para a transferência de energia, tanto aeróbica quanto anaeróbica. È a fibra rápida oxidativa-glicolítica. 8 Tipo IIb: branca, tem o maior potencial anaeróbico e constitui a “verdadeira” fibra rápida-glicolítica. 9 Tipo IIc: normalmente é uma fibra rara e indiferenciada, que pode participar da reinervação ou da transformação das unidades motoras. 14 Fisiologia do Exercício exercício. Partindo do princípio que a gordura funciona como a principal fonte de combustível para o músculo esquelético durante o exercício de endurance, a maior capacidade de oxidação é uma vantagem definitiva que irá aprimorar o desempenho (23). O aumento da capacidade dos músculos treinados mobilizarem, transportarem e oxidarem as gorduras ocorre no exercício submáximo. A elevação da lipólise resulta do maior fluxo sanguíneo dentro do músculo treinado e da maior quantidade das enzimas que mobilizam e metabolizam as gorduras. 5. Maior capilarização e aumento do fluxo sanguíneo local. A microcirculação do músculo esquelético é aprimorada com o exercício aeróbico. As fases alternadas de contração e relaxamento produzem, na musculatura esquelética, um verdadeiro “coração periférico”, pela ativação da bomba muscular. Isso melhora, de forma sistêmica, a eficiência mecânica e aumenta a tolerância ao esforço (23, 27). O aumento na relação capilar para a fibra contribui para uma adaptação positiva, que gera maior interface para a permuta de nutrientes e de gases metabólicos durante o exercício. 6. Alterações nas fibras musculares. Com o treinamento de endurance, o potencial aeróbico global do músculo esquelético aumenta igualmente, tanto nas fibras do tipo I quanto nas do tipo II. As diferenças inerentes na capacidade oxidativa entre os tipos de fibras não são alteradas pelo treinamento. EFEITO DO EXERCÍCIO FÍSICO DE NATUREZA ANAERÓBICA NO SISTEMA MUSCULAR Três efeitos importantes dos exercícios físicos anaeróbicos são observados no sistema muscular: 1. Aumento dos níveis dos substratos anaeróbicos em repouso. Há aprimoramento em 28% da força muscular, acompanhado pelo aumento significativo, em repouso, de ATP, creatina livre e glicogênio. 2. Aumento da quantidade e da atividade das enzimas-chave que controlam a fase anaeróbica do fracionamento da glicose. Esse efeito ocorre nas fibras de contração rápida. 3. Aumento da capacidade de gerar altos níveis de lactato sanguíneo durante o exercício explosivo. Esse efeito aumenta a tolerância à dor. FISIOLOGIA DA LESÃO MUSCULAR As lesões musculares são as mais comuns, as menos compreendidas e as mais inadequadamente tratadas. E, devido a tal significância, a adequação dos procedimentos provenientes do conhecimento fisiológico influenciará, sobremaneira, na recuperação dos tecidos lesionados. A identificação da patogenia, para que se possa propor uma técnica mais efetiva e específica, possibilita a reabilitação total da lesão muscular (22, 23, 24). Crisco et al (29) classificam as lesões traumáticas quanto às alterações que os músculos são submetidos. Elas são caracterizadas em intrínsecas, originadas pela própria atividade física, e em extrínsecas, originadas por fatores externos, golpe direto ou força brusca. A seguir estão apresentadas as respostas fisiológicas do tecido à lesão e a maneira pelaqual os vários tecidos se recuperam. FASE DE RESPOSTA INFLAMATÓRIA Quando o tecido sofre uma lesão, inicia-se imediatamente o processo de recuperação. E as células no local produzem mensagens neuro-humorais, que têm o objetivo de restabelecer a integridade dos tecidos. Há alteração metabólica e liberação de matérias que iniciam a resposta inflamatória. A consequência é a vermelhidão, o edema, a dor à palpação e o aumento da temperatura. Essa é a reação inflamatória, base do processo de cicatrização, cuja ocorrência é muito importante para o reparo dos tecidos. Fronteira (32) define a inflamação como o processo pelo qual leucócitos, outras células fagocitárias e exsudatos são levados ao tecido lesado. O objetivo é proteger, localizar ou desfazer-se dos subprodutos da lesão por meio da fagocitose. Estabelece-se, assim, o cenário para o reparo. Na fase de resposta inflamatória, ocorrem efeitos vasculares locais, distúrbios nas trocas de fluidos e migração de leucócitos do sangue para os tecidos. A seguir, é detalhado o processo inflamatório. 1. Reação vascular. Inclui o espasmo vascular, a formação do tampão de plaquetas, a coagulação do sangue e o crescimento do tecido fibroso. Imediatamente após a lesão, há vasoconstrição das paredes vasculares, que dura aproximadamente 5 a 10 minutos. Esse espasmo pressiona os revestimentos endoteliais, produzindo anemia local. Esta é rapidamente substituída pela hiperemia na área, em consequência da vasodilatação. O aumento 15 Fisiologia do Exercício do fluxo sanguíneo é transitório, e ocasiona diminuição do fluxo nos vasos dilatados que, então, progride para a estagnação e estase. 2. Mediadores químicos. A histamina, a leucotaxina e o necrosin são importantes na produção e limitação da quantidade de exsudato e, consequentemente, do edema após lesão. A histamina é liberada pelos mastócitos lesados. E causa vasodilatação e aumento da permeabilidade capilar, levando ao edema das células endoteliais. A leucotaxina é responsável pela marginação, onde os leucócitos alinham-se ao longo das paredes celulares. Isso aumenta a permeabilidade celular no local e afeta a passagem do fluido e dos glóbulos brancos pelas paredes celulares. O necrosin é responsável pela fagocitose. A quantidade de edema está diretamente relacionada com a extensão do dano aos vasos sanguíneos. 3. Formação de coágulos. A lesão de um vaso rompe o endotélio e expõe as fibras colágenas, nas quais são aderidas às plaquetas. O objetivo é criar uma matriz pegajosa na parede vascular, formando um tampão. Esse tampão obstrui a drenagem do fluido linfático local, delimitando a resposta à lesão. O que precipita a formação do coágulo é a conversão de fibrinogênio em fibrina, por meio do efeito cascata, que se inicia com a liberação da molécula de proteína, a tromboplastina, pela célula danificada. A tromboplastina, por sua vez, faz a conversão da protrombina em trombina, bloqueando o suprimento sanguíneo para a área lesada. 4. Inflamação crônica. Ocorre quando a resposta inflamatória aguda não elimina o agente causador da lesão e não restaura o tecido à sua condição fisiológica normal. A inflamação crônica envolve a substituição de leucócitos por macrófagos, linfócitos e células de plasma, que acumulam-se na matriz do tecido conectivo frouxo. Os mecanismos específicos parecem estar relacionados com situações que envolvem o overuse, ou sobrecarga, em virtude de microtraumas cumulativos em uma estrutura específica. FASE DE REPARO FIBROBLÁSTICO Esta é, também, chamada de fase regenerativa. Ocorre eliminação de restos de células desvitalizadas, revascularização e proliferação de fibroblastos. A baixa concentração de oxigênio nos tecidos é um estímulo para a formação de novos capilares sanguíneos, a partir do crescimento de brotos nos vasos funcionantes, ao redor do tecido danificado. Assim, o ferimento é capaz de recuperar-se de maneira aeróbica. Em consequência do aumento da distribuição de oxigênio, há elevação do fluxo sanguíneo, que distribui nutrientes essenciais para a regeneração do tecido na área. Há formação do tecido de granulação, tecido conectivo delicado, constituído por fibroblastos, colágenos e capilares, em decorrência à decomposição do colágeno de fibrina. À medida que os capilares crescem dentro da área, os fibroblastos acumulam-se no ferimento, posicionando-se paralelos aos capilares. E sintetizam uma matriz extracelular, que contém fibras proteicas de colágeno e elastina, uma substância básica composta de proteoglicanas, glicosaminoglicanos e fluidos. Enquanto há proliferação dos fibroblastos, a força tênsil do ferimento aumenta rapidamente, na proporção da taxa de síntese de colágeno. Essa sequência normal de eventos na fase de reparação leva à formação mínima de tecido cicatricial. FASE DE MATURAÇÃO-REMODELAÇÃO Esta fase caracteriza-se pela maturação do tecido conjuntivo, pelo realinhamento ou remodelação das fibras colágenas. Estas compõem o tecido cicatricial, de acordo com as forças tênseis as quais a cicatriz é submetida. Com o aumento do estresse e da tensão, as fibras colágenas realinham-se em uma posição de eficiência máxima. E o tecido assume a aparência e a função normais, embora a cicatriz raramente seja tão forte quanto o tecido normal que foi lesado. Ao mesmo tempo em que diminui o defeito no tecido lesado, pode haver limitação do movimento e dor. DANOS CELULARES Os danos que resultam em morte celular começam com a lesão inicial, que diminui o nível de oxigênio na célula (hipóxia), devido à isquemia. A respiração aeróbica da célula fica significativamente comprometida, e reduz a geração de ATP (33). A atividade da ATPase é prejudicada, e leva à insuficiência da bomba de sódio e potássio, provocando aumento no líquido intracelular. 16 Fisiologia do Exercício O edema aumenta a chance de inflamação aguda, que dá início à produção de ácido araquidônico. Este, por sua vez, sintetiza as prostaglandinas, que ativam as terminações nervosas da dor celular, gerando a substância P , que ativa os mastócitos no citosol. A hipóxia continuada provoca dano celular irreversível, evidenciado pela vacuolização intensa da mitocôndria, pela desintegração da membrana plasmática, pelo influxo intracelular de cálcio, pelo desenvolvimento de proteínas essenciais, coezimas e ácidos ribonucleicos, e pelo vazamento acelerado de metabólitos. Nessa conjuntura, a morte celular é iminente. REGENERAÇÃO CELULAR Antes que o processo de cicatrização possa ser iniciado, os estímulos responsáveis pela lesão inicial precisam ser removidos. O processo de recuperação começa com a minimização da resposta inflamatória, que ocorre com o tecido pós lesão. O processo de regeneração obedece a uma sequência estruturada. A lesão, em seu estágio inicial, provoca a ruptura da estrutura celular. Os macrófagos e linfócitos T infiltram-se no tecido, via vasos sanguíneos. A membrana basal da célula muscular atua como guia para os mioblastos desenvolverem-se e fundirem-se. O objetivo é formar novas fibras musculares. As células satélites sobreviventes se dividem, amadurecem para mioblastos e formam novos miotubos dentro da célula muscular. E o desenvolvimento subsequente obedece à sequência embriônica. Uma nova abordagem a respeito da regeneração muscular foi apresentada por Foshini et al (34). Esses investigadores acreditam que as células satélites, encontradas em sua maioria nas fibras musculares oxidativas ou de contração lenta, possibilitem o reparo das fibras musculares danificadas, acometidas por traumas, e a manutenção do músculo esquelético adulto. CÉLULAS SATÉLITES MUSCULARES A musculatura esquelética tem grande capacidade de adaptação às demandas fisiológicas, como no crescimento, no treinamento e no trauma. As fibras musculares esqueléticas adultas são, caracteristicamente, bem diferenciadas. E esse alto potencial adaptativo é atribuído a umapopulação de células residentes no músculo esquelético adulto, denominadas células satélites (35, 36). A origem das células satélites ainda não está definida. Há uma hipótese de que elas se originem de células pluripotenciais da mesoderme dos somitos (37). Outros sugerem que elas são derivadas de células pluripotenciais de origem não somítica, como as células endoteliais (38). As células satélites musculares fazem parte de uma população de células com grande atividade mitogênica. Elas contribuem para o crescimento muscular pós- natal, o reparo de fibras musculares danificadas e a manutenção do músculo esquelético adulto. Foram assim denominadas por sua localização anatômica na periferia de fibras musculares multinucleadas maduras (27). São células indiferenciadas e mononucleadas, cuja membrana basal está em continuidade com a membrana basal da fibra muscular (39). Enquanto o tecido muscular esquelético mantém- se livre de agressões, as células satélites permanecem em estado de quiescência (repouso). Entretanto, em resposta a estímulos, como crescimento, remodelação ou trauma, as células satélites são ativadas, proliferam-se e expressam marcadores da linhagem miogênica. Neste estado, também são denominadas mioblastos. Essas células se fundem às fibras musculares já existentes ou se fundem às células satélites vizinhas, para gerar novas fibras musculares. Há evidências de que as células satélites constituem uma população bastante heterogênea. Algumas podem sofrer diferenciação imediata, sem divisão prévia, enquanto outras primeiramente proliferam, gerando uma célula filha para diferenciação e outra para futura proliferação (40). Um estudo demonstrou que apenas 50% das células satélites que proliferam entram em fase final de diferenciação, expressando a proteína miosina do desenvolvimento (41). Morfologicamente, as células satélites quiescentes diferem das ativadas por apresentarem alta relação núcleo/citoplasma, com poucas organelas, núcleo menor quando comparado com os núcleos adjacentes da fibra muscular e aumento da heterocromatina nuclear, comparada à do mionúcleo (30, 31). Quando ativadas, há redução da heterocromatina, aumento na relação citoplasma/núcleo e no número de organelas intracelulares (26, 30). Charifi et al (26) e Charge et al (30) descrevem as seguintes respostas sobre o exercício físico e as células satélites: 17 Fisiologia do Exercício 1. Hipertrofia muscular. Exercícios de resistência induzem à hipertrofia muscular por meio da ativação e da proliferação das células satélites. Há posterior quimiotaxia e fusão das células satélites às fibras musculares pré-existentes. Exercícios de estiramento também podem levar à hipertrofia muscular, com consequente aumento do número de células satélites, da área seccional da fibra e do número de mionúcleos. Investigações sugerem que exercícios frequentes podem aumentar o número de fibras musculares (hiperplasia), embora seu efeito na área seccional da fibra muscular seja pequeno. As células satélites parecem estar envolvidas nesse fenômeno. 2. Hiperplasia muscular. A hiperplasia muscular foi observada em modelos experimentais de levantamento de peso em ratos. Foram evidentes a regeneração das fibras musculares e a formação de novas miofibras (hiperplasia) no espaço intersticial. O surgimento de novas fibras musculares pode ocorrer a partir de células que expressam o antígeno CD 34, distintamente das células satélites. 3. Atrofia muscular (hipotrofia). A atrofia muscular conduz à diminuição do número de mionúcleos. Ela pode ser secundária a desnervação, nutrição deficiente ou imobilização do músculo. Em ratos pré-púberes, a imobilização de um músculo levou à diminuição do número e da capacidade proliferativa das células satélites (REF???????). Isso alterou, irreversivelmente, a remodelação muscular, fato que não ocorreu em animais adultos. Nestes, as células satélites proliferaram e repopularam o músculo hipotrófico. Quando sofreram desnervação, as células satélites aumentaram, em número, na fase aguda, para, depois, na fase crônica, ocorrer decréscimo significativo das mesmas. 4. Envelhecimento. A eficiência das células satélite em proliferar e se diferenciar é dependente da idade do indivíduo. Quanto maior a idade, menor a capacidade de proliferação e de diferenciação das células satélites. REGULAÇÃO HEMODINÂMICA E SISTEMA CARDIOVASCULAR EM CONDIÇÕES DE REPOUSO O sistema cardiovascular (SCV) pode ser definido como tubular, hermeticamente fechado, por onde circulam humores. Sua principal função é o transporte de oxigênio e nutrientes para todo organismo, além de participar do processo de termorregulação, homeostática e transporte de hormônios. O SCV é composto por uma rede tubular ampla (vasos sanguíneos e linfáticos), além de um órgão propulsor tetra cavitário (coração) (42). Os vasos sanguíneos que compõe o SCV apresentam diferenças funcionais e morfológicas. As artérias de grande calibre têm maior capacidade elástica, quando comparadas às veias. Isso ocorre em virtude da maior quantidade de elastina em sua túnica média. Já as artérias de médio e pequeno calibre apresentam túnica íntima mais espessa, além de terem maior quantidade de musculatura lisa e inervação autonômica. Isso reflete no seu papel na microcirculação (43). Artérias consideradas de grande calibre, como a aorta, as pulmonares e as ilíacas, em virtude da grande quantidade de elastina, apresentam maior expansibilidade durante a ejeção ventricular (44). As veias e as vênulas diferenciam-se mais em relação ao tamanho do que à estrutura e função. Ambas apresentam paredes finas e túnica média, composta de musculatura lisa e colágeno. As veias de médio e grande calibre têm, em seu interior, um sistema composto por válvulas, denominadas vênulas, que têm a função de auxiliar no retorno venoso (43). As diferenças funcionais entre artérias e veias podem ser visualizadas na Fig. 4. O SCV destaca-se por ter três importantes características: 1) o coração, que funciona como uma bomba; 2) o sistema arterial, que funciona como um sistema de resistência; e 3) o sistema venoso, que funciona como um sistema de capacitância. CORAÇÃO O coração é um órgão muscular oco (músculo estriado cardíaco), dividido em quatro câmaras, sendo dois átrios e dois ventrículos. Por esse motivo, descreve-se o coração como um órgão tetracavitário. O coração localiza-se posterior ao osso esterno, acima do músculo diafragma e entre os pulmões, 18 Fisiologia do Exercício em um espaço denominado mediastino (Fig. 5). Ele encontra-se envolto por uma estrutura em forma de saco, denominada pericárdio, que o separa das demais estruturas mediastinais. Quanto a estruturas funcionais do coração, destaca-se: endocárdio (membrana que envolve o coração no seu interior), miocárdio (músculo cardíaco propriamente dito) e pericárdio (membrana que protege e separa-o de outras estruturas no tórax). Em sua estrutura muscular, o coração apresenta membranas vazadas, denominadas discos intercalares. A função é fazer com que o potencial de ação seja conduzido, de forma homogênea, para todo o tecido cardíaco. Com isso, possibilita a ocorrência de uma contração homogênea, denominada sincício funcional. A irrigação do coração é realizada pelas artérias coronárias direita e esquerda. A artéria coronária direita é dividida em interventricular anterior e posterior. A artéria coronária esquerda é dividida em descendente anterior, circunflexa e marginal, cada qual com suas subdivisões. O coração é responsável por desempenhar o papel de bomba pulsátil do sistema cardiovascular. Ele é composto por dois átrios e dois ventrículos. Os átrios têm a principal função de serem bombas de escorva para os ventrículos. O átrio direito apresenta pressão que varia de 0-8mmHg. E o átrio esquerdo, de 0-12mmHg. Os ventrículos são as cavidades responsáveis por ejetarem o sangue paraas duas principais circulações. O ventrículo direito apresenta pressão que varia de 0-30mmHg. É responsável por fazer com que o sangue que retorna das veias cavas seja ejetado para as artérias pulmonares. E, assim, possa atingir os pulmões, sofrer o processo de hematose e, então, retornar pelo tronco das veias pulmonares até o átrio esquerdo. Esse Fig. 4 Calibres, espessuras endoteliais e parietais, tecido elástico, muscular e fibroso dos componentes vasculares do sistema cardiovascular. Biofísicamente, os maiores calibres aumentam a condutância e diminuem a resistência. Esta relação é inversa nos vasos de calibre menor. A maior quantidade de tecido elástico tende a auxiliar na dissipação da onda sistólica e na impulsão anterógrada do sangue na diástole. O gradiente muscular caracteriza maior vasoatividade, enquanto o gradiente fibroso caracteriza maior proteção parietal à deformação. Fonte: adaptado de Bufton, 1966. Fig. 5 Localização do coração em vista posterior, anterior, lateral direita e esquerda. Fonte: adaptado de Netter. Atlas de Anatomia Humana. 19 Fisiologia do Exercício fenômeno é denominado pequena circulação. Já o ventrículo esquerdo, que recebe o sangue oxigenado advindo dos pulmões, apresenta pressão que, em condições de normalidade, varia de 0-130mmHg. A sua responsabilidade é bombear sangue para todos os órgãos e sistemas do organismo. Baseando-se no conceito da mecânica dos fluidos, o que faz com que o sangue seja impulsionado pelo sistema vascular, após sair do coração, é o gradiente pressórico. Isso porque a aceleração de um fluxo ocorre em virtude da diferença de pressão. O coração funciona, basicamente, por meio de três tipos de energia: química, elétrica e mecânica. 1. Energia química. A energia química do coração envolve o processo de produção de adenosina trifosfato (ATP). O ATP gerado pela musculatura, por via mitocondrial (cadeia respiratória), é proveniente do metabolismo dos ácidos graxos e glicose, por via aeróbica. Em condições normais, para obtenção de energia mecânica, o coração utiliza 60% de ácidos graxos e 40% de açucares. E ainda tem a possibilidade de utilizar ácido lático em períodos de anaerobiose. O ATP assim formado constitui a fonte para energia mecânica, após ser hidrolisado pela ATPase miosídica. 2. Energia elétrica. A energia elétrica do coração envolve o processo de despolarização e repolarização da musculatura cardíaca. Está diretamente relacionada ao potencial de ação dos miócitos. A musculatura cardíaca funciona como um sincício, de forma que, quando um miócito despolariza-se, esse potencial de ação propaga-se para todos os demais. Em condições normais, os potenciais de ação só podem ser conduzidos do sincício atrial para o sincício ventricular por meio de um sistema especializado, denominado sistema de condução (44). O sistema de condução é composto por células cardíacas especializadas, que têm pouca ou nenhuma função contrátil. Fazem parte desse sistema: nódo sinusal (SA), feixes internodais, nódo atrioventricular (AV), feixes de His e fibras de Purkinje. O nódo SA localiza-se na parede lateral superior do átrio direito, próximo ao orifício de entrada da veia cava superior. Morfologicamente, caracteriza-se por ser uma pequena fibra achatada em forma de elipse, com cerca de 3mm de largura e 15mm de comprimento. É capaz de despolarizar-se a uma frequência de 60-80 batimentos por minuto, em virtude de sua alta permeabilidade aos cátions (Na+ e Ca+). É também conhecido como o marca-passo cardíaco fisiológico. Os feixes internodais localizam-se entre o nódo SA e o nódo AV. O nódo AV situa-se posteriormente à parede septal do átrio direito e adjacente ao orifício do seio coronariano. É capaz de gerar uma frequência de 40-60 batimentos por minuto. Os feixes de His emergem do nódo AV até chegarem às fibras de Purkinje, que produzem uma frequência de 15-40 batimentos por minuto. A energia elétrica é, então, convertida para energia mecânica (44). 3. Energia mecânica. A energia elétrica é convertida, então, em energia mecânica, que pode ser dividida em duas: cinética e pressórica. Por meio desta, as câmaras ventriculares conseguem sobrepor as pressões aórtica e pulmonar. Com isso, gera a abertura das válvulas semilunares aórtica e pulmonar no final da fase de contração isovolumétrica do ciclo cardíaco para, posteriormente, realizarem a ejeção (45). O ventrículo esquerdo ejeta sangue ritmicamente na aorta, que se distende enquanto a pressão arterial sistólica (PAS) aumenta. Na diástole ventricular é cessado o influxo. Porém, em virtude do efeito elástico, as paredes arteriais continuam a impulsionar o sangue para os capilares. Isto diminui a pressão arterial progressivamente, até a próxima contração ventricular. A pressão arterial sistólica é fisicamente traduzida como: PAS=VO x Ve/D (VO=volume ejetado; Ve=velocidade de ejeção e D=distensibilidade do vaso). A pressão arterial diastólica é traduzida como: PAD=RVP x FC (RVP=resistência vascular periférica e FC=frequência cardíaca) (46). SISTEMA NERVOSO AUTONÔMICO O sistema nervoso autônomo (SNA) consiste de duas principais divisões anatômicas: simpático e parassimpático. A sua inervação anatômica para o coração é formada por um grande número de nervos mistos, que contêm fibras simpáticas e vagais. Estas passam ao longo da artéria aorta, artéria pulmonar e veia cava, e alcançam as câmaras cardíacas, o sistema de condução e as artérias coronárias (47, 48). 20 Fisiologia do Exercício O SNA é o principal meio controlador da FC e da PA, embora outros fatores possam alterá-las, como as mudanças de temperatura e o estiramento tecidual. O SNA é organizado com base no arco reflexo, onde os impulsos iniciados em receptores viscerais são enviados, pelas vias autonômicas aferentes, para o SNC. Neste são integrados em vários níveis e transmitidos, por vias eferentes, para os efetores viscerais. As vias eferentes autonômicas são divididas em: simpática e parassimpática. Ambas as divisões influenciam tonicamente o nódo SA. O sistema nervoso simpático (SNS) intensifica o automatismo. Já o sistema nervoso parassimpático (SNP) o inibe (48). Os efeitos das ativações destes dois sistemas influenciam a FC, a condução AV e a força de contração (49). As alterações da FC envolvem reciprocidade entre as divisões do SNA. Sendo assim, em condições fisiológicas, os dois sistemas, SNS e SNP, atuam simultaneamente. Há predominância de um ou de outro, com o objetivo de adequar, a cada instante, a atividade do coração à sua função primordial de bombear sangue e perfundir adequadamente todos os tecidos (48). A FC eleva-se quando há redução da atividade parassimpática e aumento da simpática (47,49). E diminui com o padrão oposto. Geralmente, o tônus parassimpático predomina nos indivíduos sadios em repouso. Os impulsos nos nervos simpáticos (noradrenérgicos) para o coração aumentam a FC (efeito cronotrópico). Já os impulsos nas fibras cardíacas vagais (colinérgicas) reduzem a FC. Os mecanismos básicos que regulam o volume bombeado pelo coração devem-se: 1) à regulação intrínseca do bombeamento, em resposta às variações do volume de sangue que flui para o coração, e 2) ao controle do coração pelo SNA. A inervação parassimpática, pelo nervo vago, é muito abundante na musculatura atrial e nódos SA e AV. E é escassa nos ventrículos. A inervação simpática se distribui extensamente pelas quatro câmaras. Os nódos, os tecidos especializados em condução e, também, o miocárdio, são muito bem inervados. A FC em repouso do adulto sadio é de aproximadamente 60 a 100 batimentos por minuto. Durante a atividade física, ela pode ultrapassar esses valores. Em atletas, a FC de repouso aproxima-se de 50 batimentos por minuto. Os nervos simpáticos que contraem as arteríolas e veias, e aumentam a FC, disparam de forma tônica. A PA é ajustada por variações na frequência dessa descarga tônica.Geralmente, há redução associada da atividade tônica das fibras vagais para o coração. O principal controle da PA é exercido por grupos de neurônios no bulbo que, algumas vezes, são denominados, em conjunto, como área vasomotora ou centro vasomotor. O coração recebe inervação motora do SNA, tanto simpático como o parassimpático. Os efeitos das ativações destes dois sistemas refletem na FC, na condução AV e na força de contração. Estes são referidos como efeitos cronotrópico e inotrópico, respectivamente. Vias Parassimpáticas Os nervos parassimpáticos originam-se no bulbo, em células situadas no núcleo motor dorsal do vago, no núcleo solitário e no núcleo ambíguo. O trato de saída cranial consiste de fibras pré-ganglionares em alguns nervos cranianos. Para o coração, é o nervo vago. Os gânglios localizam-se em íntima relação com o orgão-alvo. Os neurônios pós- ganglionares são muito curtos, quando comparados àqueles do SNS. Suas terminações nervosas são denominadas fibras colinérgicas, em analogia ao seu neurotransmissor, a acetilcolina (49). Os nervos vagos direito e esquerdo são distribuídos para diferentes estruturas cardíacas. O nervo direito afeta, predominantemente, o nódo SA. A estimulação desse nervo desacelera a atividade do nódo SA. E pode pará-lo por alguns segundos. O nervo vago esquerdo inibe, principalmente, o tipo de condução AV. No entanto, a distribuição das fibras vagais eferentes é sobreposta. Dessa forma, a estimulação vagal esquerda também deprime o nódo SA. E a estimulação vagal direita impede a condução AV. Geralmente, as influências parassimpáticas são preponderantes sobre os efeitos simpáticos no nódo SA (48). A estimulação dos nervos parassimpáticos produz três efeitos importantes sobre o coração. O primeiro é a diminuição da FC. O segundo é a diminuição em 20 a 30% da força de contração do miocárdio atrial. E o terceiro é a condução retardada dos impulsos pelo nódo AV, que alonga o retardo entre as contrações atrial e ventriculares. Durante o exercício extenuante, a FC aumenta por inibição parassimpática adicional e por ativação direta dos nervos cardioaceleradores simpáticos. A magnitude da aceleração da FC está relacionada diretamente à intensidade e à duração 21 Fisiologia do Exercício da atividade física (49). A estimulação vagal intensa e continua do coração pode interromper os batimentos cardíacos por alguns segundos. Mas, em seguida, normalmente, o coração “escapa”, com FC de 20 a 40 batimentos por minuto, cerca de 40% do normal. Vias Simpáticas As fibras simpáticas originam-se na medula espinhal. Os neurônios pré-ganglionares simpáticos têm seus corpos celulares no corno lateral da substância cinzenta dos segmentos torácico e lombar da medula, nos nervos espinhais, como trato de saída simpático toracolombar. E fazem sinapse na cadeia simpática via gânglios cervicais e paravertebrais. A partir dessa cadeia paravertebral, numerosas fibras pós-ganglionares simpáticas dirigem-se ao coração, formando uma extensa rede de terminações nervosas (50). A atividade simpática altera a FC e a condução AV bem mais lentamente do que a atividade vagal. Os principais efeitos da ativação simpática no coração normal são a elevação da FC, que facilita a condução atrioventricular, e aumento na força de contração atrial e ventricular. Esta pode aumentar o débito cardíaco por duas ou três vezes e, ainda, a pressão de ejeção. Os efeitos simpáticos sobre o coração representam mecanismos de reserva, mantidos em prontidão, para fazer com que o coração contraia com extremo vigor, sempre que for necessário. Durante a estimulação simpática cardíaca, o aumento do trabalho é acompanhado por redução na pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (50). BARORRECEPTORES Os barorreceptores arteriais são receptores sensíveis à distensão da parede arterial induzida pelas variações da PA. Estão localizados nos grandes vasos do tronco e do pescoço, mais precisamente no arco aórtico e nos seios carotídeos. São inervados por ramos de dois pares cranianos: IX (glossofaríngeo) e o X (vago) (51). Os mecanorreceptores cardiopulmonares avaliam a atividade mecânica nos ventrículos, nos átrios e nas grandes veias (52). Durante vários anos foi cogitada a possibilidade de que, durante o exercício, o barorreflexo arterial era “desligado” ou “desativado”. Porém, verificou-se que o barorreflexo é reajustado durante o exercício, tanto aeróbio com resistido (51). Isso permite aumento na PA e na FC, para manter um DC satisfatório. CICLO CARDÍACO O ciclo cardíaco é o período que corresponde aos eventos cardíacos que ocorrem de um batimento cardíaco até o próximo. É dividido em fases: sístole atrial, enchimento rápido, enchimento lento (ou diástase), contração isovolumétrica, ejeção e relaxamento ventricular isovolumétrico. O ciclo cardíaco inicia-se com a excitação atrial, denominada sístole atrial, na qual é indicada pela onda “P”, no registro eletrocardiográfico. É seguida pela abertura da válvula mitral e tricúspide, pois há aumento da pressão interna dessas câmaras. Após a abertura das válvulas, a pressão nos ventrículos torna- se maior do que a existente no interior dos átrios. O enchimento ventricular é denominado de enchimento rápido, porque o gradiente pressórico é muito favorável à passagem do sangue da cavidade atrial para a ventricular. O enchimento rápido recebe influência da perda de tensão da parede ventricular no início da diástole. Essa perda de tensão depende tanto da eficiência do processo de relaxamento muscular como da complacência da câmara. O enchimento ventricular termina com a contração atrial. Na contração isovolumétrica, a pressão interna dos ventrículos torna-se ainda maior. É o estímulo para que ocorra o fechamento das válvulas mitral e tricúspide, facilitando a ocorrência da fase de contração isovolumétrica. A ejeção ocorre, pois a pressão no interior do VD/ VE é maior do que a pressão interna, das artérias pulmonar/aorta. Isso ocorre, mesmo porque, as válvulas tricúspide/mitral encontram-se fechadas. É um estímulo para que ocorra a abertura da válvula aórtica, que faz com que o sangue migre do interior do VD e VE para o interior das artérias pulmonar ou aórtica. No relaxamento isovolumétrico, a pressão interna das artérias pulmonar e aórtica ascendente é tão grande que faz com que ocorra fechamento das válvulas pulmonar e aórtica. Isso estimula o acontecimento de um relaxamento no músculo. VOLUME DIASTÓLICO E SISTÓLICO FINAL Durante a diástole, o enchimento ventricular aumenta, normalmente, o volume de cada ventrículo em 110 a 120mL. Esse volume é chamado de volume diastólico final (VDF). Em seguida, à medida que os ventrículos se esvaziam, durante a sístole, esse volume se reduz em cerca de 70mL, o que é 22 Fisiologia do Exercício chamado de débito sistólico (DS). Os 40 a 50mL remanescentes em cada ventrículo formam o chamado volume sistólico final (VSF). A fração do VDF que é ejetada é chamada de fração de ejeção (FE). E corresponde à fração do volume de sangue recebido durante a diástole, que é ejetada durante a sístole. É determinada pela equação: FE = VS/VDF. Quando o coração se contrai com grande intensidade, o VSF pode reduzir a, apenas, 10 a 20mL. Por outro lado, no coração normal, quando o ventrículo recebe grande quantidade de sangue durante a diástole, seu VDF pode chegar a 150 a 180mL. E pelo aumento do VDF e pela redução do VSF, o DS pode aumentar até o dobro do normal. MECANISMO DE FRANK-STARLING A lei de Frank-Starling estabelece que a energia de contração é proporcional ao comprimento inicial da fibra muscular cardíaca. Com isso, quanto maior o comprimento inicial da fibra, mais eficiente é a contração. Quando o retorno venoso (RV) é relativamente grande, o coração tende a expandir-se. E, consequentemente, as fibras musculares se estiram antes de cada batimento. Segundo essa lei, quanto mais estiradas
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