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Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital Autor: Michael Procopio Aula 13 3 de Dezembro de 2020 1 140 AULA 13 CRIMES CONTRA A VIDA SUMÁRIO CRIMES CONTRA A VIDA .......................................................................................... 1 SUMÁRIO ................................................................................................................. 1 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS .................................................................................. 3 2. OS CRIMES CONTRA A VIDA ................................................................................ 3 3. HOMICÍDIO ........................................................................................................ 4 3.1 HOMICÍDIO SIMPLES ..................................................................................................... 7 3.2 HOMICÍDIO PRIVILEGIADO ........................................................................................... 8 3.3 HOMICÍDIO QUALIFICADO ............................................................................................ 9 3.4 HOMICÍDIO QUALIFICADO: FEMINICÍDIO ................................................................... 15 3.5 HOMICÍDIO DOLOSO MAJORADO ............................................................................... 21 3.6 HOMICÍDIO CULPOSO ................................................................................................. 22 4. INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO OU AUXILIO AO SUICÍDIO OU A AUTOMUTILAÇÃO 26 5. INFANTICÍDIO .................................................................................................. 33 6. ABORTO .......................................................................................................... 34 6.1 AUTOABORTO E ABORTO CONSENTIDO ...................................................................... 34 6.2 ABORTO SEM CONSENTIMENTO DA GESTANTE ........................................................... 35 6.3 ABORTO COM CONSENTIMENTO DA GESTANTE .......................................................... 36 Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 2 140 6.4 ABORTO MAJORADO .................................................................................................. 36 6.5 ABORTO LEGAL .......................................................................................................... 38 7. QUESTÕES ....................................................................................................... 41 7.1 LISTA DE QUESTÕES SEM COMENTÁRIOS ................................................................... 41 7.2 GABARITO .................................................................................................................. 60 7.3 LISTA DE QUESTÕES COM COMENTÁRIOS .................................................................. 60 7.4 QUESTÃO DISSERTATIVA ........................................................................................... 97 8. DESTAQUES DA LEGISLAÇÃO E DA JURISPRUDÊNCIA ........................................ 98 9. RESUMO ......................................................................................................... 120 Crimes contra a pessoa ...................................................................................................... 120 Homicídio .......................................................................................................................... 120 Induzimento, Instigação ou Auxílio ao suicídio ................................................................ 131 Infanticídio ......................................................................................................................... 135 Aborto ................................................................................................................................ 136 10. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 139 Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 3 140 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS Nesta aula, iniciaremos o estudo da Parte Especial do Código Penal, que traz os crimes em espécie. Tudo o que estudamos até aqui – é importante frisar – é imprescindível para a compreensão de cada uma das infrações penais, razão pela qual, se alguma matéria não foi compreendida, recomendo que retorne e reforce a sua aprendizagem. Para a análise dos crimes em espécie, utilizaremos o conhecimento dos institutos tratados pela Parte Geral do Código Penal, além de adotarmos a classificação dos crimes, abordada na última aula. A Parte Especial se inicia pelos crimes contra a pessoa, que são numerosos e demandam um estudo mais prolongado. Por isso, nesta primeira aula, estudaremos apenas os crimes contra a vida. Esta aula será composta pelos seguintes capítulos: Os crimes contra a vida são aqueles que, quando dolosos, são da competência do Tribunal do Júri. Portanto, temos mais uma razão didática para seu estudo separado. Veremos os crimes de homicídio; de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio ou a automutilação; infanticídio e aborto. Espero que a aula seja didática e abrangente. Nosso estudo, como sempre, deve ser aprofundado, para que a prova nos pareça leve. Realmente desejo que a modificação do tema, com o início da Parte Especial, renove a motivação e o entusiasmo, mesmo porque os crimes em espécie são matérias mais ligadas ao nosso dia a dia, inclusive em filmes, seriados e noticiários. Vamos aos estudos. 2. OS CRIMES CONTRA A VIDA Os crimes contra a vida estão inseridos no Título I, denominado “Dos Crimes Contra a Pessoa”. Dentro de referido título, estão tratados mais especificamente no Capítulo I, sendo, portanto, os primeiros crimes previstos pelo Código Penal. Para alguns, essa precedência indica a importância da vida no nosso ordenamento jurídico, que é o núcleo e o princípio de todo o Direito. Os crimes contra a vida Homícidio Induzimento, Instigação ou Auxílio ao Suicídio ou a Automutilação Infanticído Aborto Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 4 140 A vida tutelada pelos crimes previstos no Capítulo I do Título I do Código Penal é tanto a extrauterina quanto a intrauterina. São os crimes contra a vida o homicídio; o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio; o aborto e o infanticídio. Referidos delitos, se dolosos, são da competência do Tribunal do Júri, nos termos do que dispõe o artigo 5º, inciso XXXVIII: XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; A Constituição previu, portanto, a competência do Tribunal do Júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, o que é a competência mínima de referido órgão jurisdicional. A lei pode estender sua competência para outras hipóteses, como ocorre no caso dos crimes conexos. Vistas essas notas introdutórias, passemos ao estudo de cada um dos delitos contra a vida. 3. HOMICÍDIO O crime de homicídio está previsto no artigo 121 do Código Penal, sendo denominado, por Nelson Hungria, de “o crime por excelência”. É a morte de um ser humano (vida extrauterina) por outro. Referido dispositivo legal prevê as figuras do homicídio doloso simples, do homicídio doloso privilegiado, do homicídio doloso qualificado, do feminicídio, do homicídio culposo, do homicídio culposo majorado, do homicídio doloso majorado e do feminicídio majorado. Vejamos seu teor: Homicídio simples Art. 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos. Caso de diminuição de pena § 1º Se o agente cometeo crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Homicídio qualificado § 2º Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 5 140 IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Pena - reclusão, de doze a trinta anos. Feminicídio VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino: VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição: Pena - reclusão, de doze a trinta anos. § 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: I - violência doméstica e familiar; II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Homicídio culposo § 3º Se o homicídio é culposo: Pena - detenção, de um a três anos. Aumento de pena § 4º No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. § 6º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. § 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental; III - na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima; IV - em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I , II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 .” Temos algumas características referentes ao crime de homicídio, em suas diferentes modalidades: Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 6 140 Objeto jurídico: vida humana extrauterina. Objeto material: a pessoa contra a qual recai a conduta. Núcleo do tipo (ação nuclear): “matar”. Forma de realização típica: crime de ação livre. O crime de homicídio pode ser: Comissivo. É a regra. Omissivo impróprio: quando há, de modo amplo, a posição de garantidor. Em relação à vítima, qualquer ser humano (vida extrauterina) pode ser sujeito passivo. Há, entretanto, normas especiais em relação à vítima: Se praticado contra Presidente da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do STF pode configurar o crime do art. 29 de Lei 7.170/83. Crime doloso praticado contra menor de 14 anos: incide a causa de aumento de pena do § 4º do art. 121 do CP. Cometido com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso: art. 1º da Lei 2.289/56. contra a mulher, por razões da condição de sexo feminino: configura-se a forma qualificada denominada de feminicídio. contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição: há incidência da forma qualificada, chamada pela doutrina de homicídio funcional. O elemento subjetivo, na modalidade dolosa, é a intenção de matar, denominado de animus necandi ou occidendi. O dolo é extraído das circunstâncias do fato. Por exemplo, quem dispara vários projéteis de arma de fogo em direção à cabeça da vítima, em princípio, queria matá-la, diversamente de quem dá uma facada na mão do ofendido. É possível a ocorrência da aberratio ictus ou erro sucessivo (dolo geral), situações estudadas na aula sobre erro no Direito Penal. Sobre a consumação, é necessário o resultado naturalístico consistente na morte da vítima, de modo que o delito é classificado como material. A morte pode ser considerada nos seguintes aspectos: Morte clínica: parada cardíaca e respiratória. Morte biológica: destruição molecular. Morte encefálica ou cerebral: paralização cerebral. Este é o critério adotado pela Lei 9.434/97, a Lei de Transplante de Órgãos, no caput do seu artigo 3º, o que pode ser utilizado na interpretação sistemática para a consumação do homicídio: Art. 3º A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 7 140 A tentativa é possível, pois se trata de crime plurissubsistente. Admite-se tentativa inclusive em caso de dolo eventual. A tentativa pode ser perfeita (acabada ou crime falho) ou imperfeita (propriamente dita). Pode, ainda, ser branca (incruenta) ou vermelha (cruenta). A classificação geral do crime de homicídio é a seguinte: Crime comum. Crime de dano. Crime material. Crime instantâneo de efeitos permanentes. Crime simples (protege apenas um bem jurídico). Crime plurissubsistente. Pode ser doloso ou culposo. Crime de ação penal pública incondicionada. 3.1 HOMICÍDIO SIMPLES Homicídio, em sua forma simples, está previsto no caput do artigo 121 do Código Penal: Homicídio simples Art. 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos. Como já mencionado, o núcleo do tipo é o verbo “matar”. Como elementar do crime, há ainda o termo “alguém”, que pode ser traduzido por pessoa viva. Refere-se à vida extrauterina, não abrangendo o feto, cuja vida é tutelada pelo crime de aborto. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, a intenção de matar. Exige-se o chamado animus necandi, isto é, a vontade livre e consciente do autor de matar outro ser humano que deve estar, por óbvio, vivo. A pena prevista no preceito secundário do tipo penal é de reclusão, de seis a vinte anos. O crime de homicídio simples é hediondo se praticado em atividade de grupo de extermínio, nos termos da primeira parte do inciso I do artigo 11º da Lei 8.072/90: Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio,ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e VIII);(...) Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 8 140 3.2 HOMICÍDIO PRIVILEGIADO O homicídio privilegiado consiste em uma causa de diminuição de pena ou minorante, no caso de o agente ter cometido o crime orientado por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. Neste caso, o juiz, na terceira fase da dosimetria, deve proceder à diminuição da pena, utilizando a fração de um sexto a um terço. § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Sobre a escolha da fração, o juiz deve se guiar pela influência que o motivo teve, a própria relevância do motivo para o autor ou, ainda, a intensidade da injusta provocação da vítima e o grau de abalo emocional causado no réu: “(...) CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ART. 121, § 1º DO CP. PRIVILÉGIO. FRAÇÃO DE REDUÇÃO. IDONEIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS. 1. A escolha da fração de redução de pena deve ser aferida com base nas circunstâncias fáticas que levaram ao reconhecimento do homicídio privilegiado, especialmente "o grau emotivo do réu, além da intensidade da injusta provocação realizada pela vítima. (REsp 1475451/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 21/03/2017, DJe 29/03/2017) (...)” (AgRg no AREsp 806586/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 07/03/2018). O motivo de relevante valor social consiste no interesse coletivo, naquela causa que diz respeito a toda a comunidade. Um exemplo é o sujeito matar o traidor da pátria. O motivo de relevante valor moral, por sua vez, é o interesse individual do agente, como a compaixão. Alguns autores entendem que há cabimento desta hipótese de privilégio no caso de eutanásia, de um paciente terminal que não quer mais prolongar sua existência e que está sofrendo bastante. Menos polêmico é o cabimento do motivo de relevante valor moral no pai que mata o estuprador da própria filha. Já o chamado homicídio emocional é aquele cometido sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida de injusta provocação da vítima. São seus requisitos1: Domínio de violenta emoção: o agente deve agir dominado por uma forte emoção, não configurando a minorante a emoção leve nem a efêmera. Reação imediata: conforme se nota da expressão “logo após”, a reação do agente deve ocorrer em seguida à provocação injusta. Injusta provocação da vítima: a provocação da vítima deve ser injusta, podendo ser até indireta, voltando-se a terceiros ou a animais. Quanto ao chamado homicídio emocional, é importante recordar que a emoção não exclui a culpabilidade, nos termos do que dispõe o artigo 28, inciso I, do Código Penal: 1 Não confundir com os requisitos da atenuante do artigo 65, III, b, do CP, que se aplica a qualquer delito: “influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima”. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 9 140 Art. 28 - Não excluem a imputabilidade penal: I - a emoção ou a paixão; (...). Portanto, a emoção e a paixão não são excludentes da culpabilidade. Deve-se ressalvar, contudo, a hipótese de a situação se tornar patológica, o que pode configurar doença a impedir que o agente compreenda o caráter ilícito do que fez ou que ele se comporte conforme tal entendimento. Segundo a doutrina majoritária, configurada alguma das hipóteses do homicídio privilegiado, a redução da pena é obrigatória. As circunstâncias do homicídio privilegiado são subjetivas e, portanto, não se comunicam aos demais agentes. Cuida-se de circunstâncias previstas para a configuração da causa de diminuição de pena, de ordem subjetiva, razão pela qual não são comunicáveis, conforme a regra do artigo 30 do Código Penal. É possível que o homicídio seja privilegiado e qualificado, desde que a qualificadora seja objetiva. Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “(...) 3. O reconhecimento da figura privilegiada constante no § 1º do art. 121 do CP, de que o réu agiu sob violenta emoção, após injusta provocação da vítima, por ser de natureza subjetiva, é compatível com as qualificadoras de ordem objetiva, como na hipótese, do emprego de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido. Precedentes.(...)”(STJ, AgRg no REsp 950404/RS, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe 21/03/2019). Não é outro o entendimento do STF, expresso em precedente que, apesar de antigo, não foi superado por posição diversa: “(...) . A atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal admite a possibilidade de ocorrência de homicídio privilegiado-qualificado, desde que não haja incompatibilidade entre as circunstâncias aplicáveis. Ocorrência da hipótese quando a paciente comete o crime sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, mas o pratica disparando os tiros de surpresa, nas costas da vítima (CP, art. 121, § 2º, IV) A circunstância subjetiva contida no homicídio privilegiado (CP, art. 121, § 1º) convive com a circunstância qualificadora objetiva "mediante recurso que dificulte ou torne impossível a defesa da vítima" (CP, art. 121, § 2º, IV). Precedentes. (...)” (STF, HC 76196/GO, Rel. Min. Maurício Corrêa, Segunda Turma, Julgamento: 29/09/1998). O homicídio qualificado-privilegiado não é considerado hediondo, não se submetendo às disposições da Lei 8.072/90. Também é denominado homicídio híbrido. Sua não hediondez é o entendimento consolidado no âmbito do STJ: “I - Por incompatibilidade axiológica e por falta de previsão legal, o homicídio qualificado-privilegiado não integra o rol dos denominados crimes hediondos (Precedentes).(...)”(STJ, HC 153728/SP, Rel. Min. Félix Fischer, 5ª Turma, DJe 31/05/2010). 3.3 HOMICÍDIO QUALIFICADO A qualificadora é a forma do tipo penal em que se comina uma diferente pena em abstrato, com novos limites mínimo e máximo. O homicídio qualificado está previsto no § 2º do artigo 121: Homicídio qualificado Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 10 140 § 2° Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossivel a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Pena - reclusão, de doze a trinta anos. Feminicídio VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino: VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição: Pena - reclusão, de doze a trinta anos. As qualificadoras são causas especiais que determinam uma pena maior, mais gravosa. Referem-se aos motivos determinantes do crime e aos meios e modos de sua execução. A qualificadora implica em um novo limite mínimo e um novo teto para a pena abstratamente prevista, sendo que no caso a pena será de reclusão de doze a trinta anos. O homicídio qualificado é crime hediondo, tanto em sua forma tentada quanto na consumada, conforme determina o artigo 1º, incisoI, da Lei 8.072/90. Vale mencionar que a Lei 13.964/2019 modificou o teor de referido dispositivo para incluir expressamente o inciso VIII (homicídio qualificado funcional): Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e VIII); Vejamos cada uma das hipóteses de homicídio qualificado: I. Mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe. O artigo 121, § 2º, I, do CP, trata do homicídio mercenário ou por mandato remunerado. É o crime cometido mediante paga, recompensa ou por outro motivo torpe. A paga ou promessa de recompensa, para a maior parte da doutrina, deve ter natureza financeira. A discussão, entretanto, não possui relevância prática, já que, se não considerada a vantagem não financeira como paga nem como promessa de recompensa, há a fórmula de “outro motivo torpe”. O legislador previu a chamada interpretação analógica, ao, após enumerar as hipóteses de paga ou promessa de recompensa, mencionar “outro motivo torpe”. Cuida-se de expressão que deve ser interpretada com base nas situações anteriores, tomadas como paradigma. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 11 140 Há divergências sobre a paga ou promessa de recompensa ser circunstância que se comunica também ao mandante ou se deve ser limitada ao executor do crime. A matéria não está pacificada e há divergência no próprio Superior Tribunal de Justiça: “(...) 3. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é elementar do tipo qualificado, comunicando-se ao mandante do delito. (...)” (STJ, AgInt no REsp 1681816/GO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 15/05/2018). “(...) V - No homicídio, a qualificadora de ter sido o delito praticado mediante paga ou promessa de recompensa é circunstância de caráter pessoal e, portanto, ex vi art. 30 do C.P., incomunicável. Recurso especial parcialmente provido para restabelecer a qualificadora de motivo fútil na decisão de pronúncia. (...)” (STJ, REsp 1415502/MG, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 17/02/2017). O motivo torpe é o motivo repugnante, vil, abjeto, desprezível. A vingança vem sendo compreendida pelo STJ como um motivo torpe, de modo a ser o entendimento que prevalece: “(...) 2. No caso, a prisão preventiva está justificada, pois a decisão que a impôs delineou o modus operandi empregado na conduta delitiva, revelador da periculosidade do recorrente, consistente na prática, em tese, de tentativa de homicídio mediante emprego de arma de fogo, delito qualificado por motivo torpe, consubstanciado em vingança em razão de a vítima ter realizado denúncias que levaram à prisão do chefe do tráfico da localidade. Tais circunstâncias denotam sua periculosidade e a necessidade da segregação como forma de acautelara ordem pública. (...)” (STJ, RHC 90941/PE, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe 04/06/2018). Entretanto, o STJ já decidiu que a vingança pode ou não configurar motivo torpe, a depender do caso concreto: “(...) 2. Para se afastar qualificadoras da pronúncia, é fundamental que sua impropriedade seja manifesta. A vingança, per se, pode não ou representar motivo torpe - tudo a depender do caso concreto. O debate acerca dos lineamentos do recurso que impossibilitou a defesa também enseja profundo mergulho no plano fático-probatória. Desta forma, o exame de tais questões refoge aos limites de cognição do habeas corpus. (...)” (STJ, HC 126.730/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, Julgado em 10/11/2009). O STF, no julgamento da ADO 26 e do MI 473, em junho de 2019, considerou que a discriminação homotransfóbica representa, “na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”).” II. Motivo fútil. É o motivo que demonstra desproporção em relação ao crime praticado. Caracteriza-se quando o delito consubstancie razão frívola, mesquinha, insignificante. Seria como matar alguém por causa de um esbarrão acidental em uma festa. E se o crime for praticado com ausência de motivo? O homicídio é qualificado ou simples? Existe divergência doutrinária, mas o STJ entende não ser admissível a configuração do crime praticado sem motivo, o delito “gratuito”, como qualificado por motivo torpe: Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 12 140 “(...) 2. A jurisprudência desta Corte Superior não admite que a ausência de motivo seja considerada motivo fútil, sob pena de se realizar indevida analogia em prejuízo do acusado. Precedente. (...)” (STJ, HC 369163/SP, Rel. Min. Joel IlanPaciornik, 5ª Turma, DJe 06/03/2017). III. Com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum O artigo 121, § 2º, inciso III, traz alguns meios de se praticar o homicídio que qualificam o crime. O homicídio, vale lembrar, é crime de forma livre, podendo ser realizado de qualquer modo, pelo agente, que leve ao resultado morte, como golpes de faca, envenenamento ou atropelamento. Entretanto, existem alguns modos de realizar o crime que o tornam qualificado: Emprego de veneno: uso de substância tóxica ao ser humano. Só haverá a incidência da qualificadora se a vítima não souber que ingere o veneno (o veneno, neste caso, é considerado um meio insidioso, ou seja, o crime é cometido de modo que o agente não sabe que está sendo assassinado. Se for forçada a tomá-lo, ciente do que se trata, pode-se configurar o meio cruel, a depender do caso). Meio insidioso: é o dissimulado, realizado de forma sorrateira. O caso enumerado anteriormente e que serve de parâmetro para essa interpretação analógica é o emprego de veneno. O açúcar, por exemplo, pode ter efeito de veneno para um diabético com saúde muito debilitada, o que leva a se configurar como meio insidioso. Emprego de fogo.: de modo simples, é o uso de fogo, da combustão de material, para a execução do homicídio. O fogo, a depender do caso, pode configurar tanto meio cruel (a vítima ser queimada até a morte) como um meio de que pode resultar perigo comum (incêndio de um edifício, expondo a vida de moradores, vizinhos e transeuntes a risco de morte). Emprego de explosivo: é a execução do homicídio por meio de substância explosiva, como dinamite. Meio de que possa resultar perigo comum: é aquele pode atingir um número indeterminado de pessoas. A interpretação deve ser feita, de forma analógica, com atenção nos meios anteriormente enumerados de emprego de fogo e de explosivo. Emprego de tortura: é o grande tormento ou suplício causado à vítima. O agente tem a vontade livre e consciente de matar a vítima e emprega método de tortura para intensificar o seu sofrimento, como por cobrança de dívida de drogas. Não confundir com o delito de tortura com resultado morte, em que o agente constrange alguém, com emprego violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental, com alguma finalidade específica, ou quando submete alguém, com emprego de tais meios, a um intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo ou medida de caráter preventivo (art. 1º, caput e § 3º, da Lei 9.455/97). Meio cruel: é a forma de se praticar o delito que aumenta o sofrimento da vítima sem necessidade. O exemplo a ser utilizado como parâmetro é o emprego de tortura. IV. À traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido. O inciso IV traz formas de execução do crime queo tornam mais gravoso e, por isso, qualificado. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 13 140 Traição: é o ataque súbito, inesperado e desleal. É o caso do amigo que chama a vítima para conversar em seu sítio, dizendo que tem problemas íntimos e privados, e lá se aproveita de sua distração para disparar projéteis de arma de fogo e causar sua morte. Esta circunstância pressupõe uma relação de confiança entre autor e vítima. Emboscada: é a tocaia, a ocultação do agente para a prática do crime. Como exemplo, podemos imaginar o atirador que espera a vítima na beira da estrada, atrás de um arbusto, e atira sem que ela possa sequer saber quem a matou. Dissimulação: é o fingimento, é a ocultação do desígnio do autor. É o sujeito que finge, por exemplo, precisar de ajuda, deitando-se na porta da casa da vítima e fingindo gemer de dor, e a esfaqueia quando ela se aproxima para ajudá-lo. Outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa da vítima: cláusula de interpretação analógica, que tem como parâmetros todas as outras circunstâncias acima enumeradas. A doutrina dá como exemplo o caso do crime cometido com elemento surpresa. V. Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime. Conexão teleológica: é o crime que é praticado para assegurar a execução de outro crime. Caso do sujeito que, durante a execução do crime de estupro, é surpreendido por terceiro e o mata, para que ele não impeça sua atividade delitiva. Conexão consequencial: é a infração penal praticada para assegurar a ocultação, vantagem ou impunidade de outro crime. O sujeito rouba um grande banco e, meses depois, é reconhecido pelo gerente em uma reunião da escola em que os filhos de ambos estudam. Então, comete homicídio contra ele, para garantir sua impunidade Em qualquer dos casos, o outro crime pode ter sido praticado ou não pelo próprio agente. Ele pode ter a intenção, por exemplo, de evitar que sua namorada seja presa ou que seu pai perca a vantagem adquirida por meio de um roubo. VI. contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição: Cuida-se de recente alteração legislativa, levada a efeito pela Lei 13.142, de 2015. Busca-se punir de forma mais rígida o crime cometido contra um agente de segurança pública ou um familiar seu, se o móvel do delito envolver referida função pública ou a condição pessoal de cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até o terceiro grau. O que se protege é a própria função pública, e não a pessoa do agente ou da autoridade. Pode-se denominar este crime qualificado de homicídio qualificado funcional. A qualificadora não abrange crimes cometidos Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 14 140 contra agentes ou autoridades aposentados, que foram deixados de fora pelo legislador2. sendo que parte entende ser possível, desde que o delito seja praticado em decorrência da função3. Vale destacar que se o crime for cometido contra um dos agentes citados no inciso VII do parágrafo segundo do artigo 121, mas sem qualquer conexão com sua função pública, o crime será simples. Por exemplo, se um delegado da polícia federal discute com o vizinho por causa do muro que divide os respectivos imóveis, eventual homicídio praticado pelo último não será qualificado pela circunstância em estudo. Temos um caso de referência aos artigos 142 e 144 da Constituição Federal, que tratam, respectivamente, das Forças Armadas e da Segurança Pública. Vejamos o que diz o caput do artigo 142 e o caput e § 8º do artigo 144: Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. (...) Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. (...) § 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei. (...) § 10. A segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas: I - compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, além de outras atividades previstas em lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana eficiente; e II - compete, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos respectivos órgãos ou entidades executivos e seus agentes de trânsito, estruturados em Carreira, na forma da lei. 2 No mesmo sentido: MASSON, Cleber. Direito Penal: parte especial (arts. 121 a 212). Vol. 2. 12 ed. São Paulo: MÉTODO, 2019, p. 45. 3 CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal. Parte Especial (arts. 121 ao 361). 12 ed. Salvador: Editora JusPODIVUM, 2020, p. 70-71. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 15 140 Além disso, o inciso VII menciona os integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública ou contra o cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau de qualquer dos agentes e autoridades descritos. Deste modo, o crime será qualificado se for cometido contra as seguintes pessoas: Militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica (Forças Armadas); Agentes e Autoridades da Polícia Federal; Agentes e Autoridades da Polícia Rodoviária Federal; Agentes e Autoridades da Polícia Ferroviária Federal; Agentes e Autoridades das Polícias Civis; Agentes e Autoridades das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares; Agentes e Autoridades das Guardas Municipais; Agentes de trânsito; Cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau de qualquer dos agentes ou autoridades acima descritos. A qualificadora se configura se o agente ou autoridade for vítima do crime no exercício da função, por exemplo em uma missão policial, ou em decorrência da função, como no caso de um sujeito que foi preso por operação chefiada por delegado e depois o mata, por vingança. Se forem vítimas de um homicídio os familiares dos agentes e autoridades enumerados acima, o delito será qualificado se praticado em razão dessa condição, como no caso de pai de policial que é morto em represália pela atuação firme do seu filho no combate ao tráfico de entorpecentes na cidade. Os familiares abrangidos são o cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau. São parentes consanguíneos até terceiro grau: os ascendentes (pais, avós e bisavós), os descendentes (filhos, netos e bisnetos) e os colaterais (irmãos, tios e sobrinhos). Não estão incluídos no texto legal os parentes por afinidade (sogro, sogra e cunhados) nem o parentesco civil (como o filho adotivo). No caso do filho adotivo, temos notável falha legislativa. Entretanto, de acordo com o princípio da legalidade e do seu corolário, o da reserva legal, não se pode ampliar uma lei penal que torna a situação do réu mais gravosa, razão pela qual não se mostra possível a inclusão de tais parentes na norma que se extraido inciso VII ora estudado. De todo modo, é preciso acompanhar a jurisprudência que se formará. 3.4 HOMICÍDIO QUALIFICADO: FEMINICÍDIO O feminicídio é uma modalidade do crime de homicídio qualificado que possui nomen iuris específico, isto é, uma nomenclatura própria trazida pela própria lei. Está previsto no artigo 121, § 2º, VI, do CP: Homicídio qualificado § 2° Se o homicídio é cometido: (...) Feminicídio VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino: Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 16 140 (...) Pena - reclusão, de doze a trinta anos. Percebam que a qualificadora exige que o crime tenha sido cometido por razões da condição de sexo feminino. Por isso, a doutrina aponta que não se trata de femicídio, ou seja, de crime específico em que a mulher é a vítima. É imprescindível que haja motivo ligado à condição de sexo feminino, o que é tratado pelo § 2º-A do artigo 121: § 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: I - violência doméstica e familiar; II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Portanto, teremos o crime denominado feminicídio quando for cometido por razões de condição de sexo feminino, ou seja, por razão de gênero. Referidas razões estarão presentes nos seguintes casos: I. violência doméstica e familiar A interpretação de “violência doméstica e familiar” deve ser feita de forma sistemática, considerando todo o sistema normativo de proteção da mulher, especialmente a Lei Maria da Penha. A Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, que, nos termos do seu preâmbulo, cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; dentre outras providências. Visa a combater a violência praticada contra a mulher, devido a sua maior fragilidade, decorrente de anos de tratamento desigual e de sua própria condição físico-biológica, que muitas vezes a deixa em situação de vulnerabilidade na sociedade. Prova disso é o número de mulheres assassinadas ou agredidas em seus próprios lares, local que deveria ser seu refúgio e local de paz. Dentre as hipóteses de configuração da violência doméstica e familiar contra a mulher, há a prática de conduta, omissiva ou comissiva, baseada no gênero, que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, desde que ocorra no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da família ou envolva qualquer relação íntima de afeto. A Lei 11.340/2006, em seu artigo 5º, traz as circunstâncias que caracterizam a denominada violência doméstica e familiar contra a mulher, o que atrai a incidência de seus regramentos: Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 17 140 III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. II. menosprezo ou discriminação à condição de mulher Essa hipótese de homicídio praticado por razões de condição do gênero feminino se liga ao menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Menosprezo é o sentimento de repulsa ou de desprezo. Menosprezar alguém por sua condição de mulher é buscar diminuir o seu valor enquanto ser humano em virtude de tal qualidade, é depreciar tal condição. Discriminação contra a mulher é “toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo”. É o que prescreve o artigo 1º da Convenção para Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher, CEDAW, 1979, ratificada pelo Brasil em 1984. Trata-se do caso de alguém que mata uma mulher por menosprezar a sua condição, considerando que ela, por exercer o mandato de deputada, está em uma posição que deve ser ocupada apenas por homens. É um típico exemplo de menosprezo, desdém ou desvalorização acerca da condição de mulher. Também há crime praticado por razões de condições de sexo feminino se o indivíduo buscar discriminar uma mulher, por sua condição. Ou seja, é dar um tratamento diferenciado para a mulher sem que essa diferenciação possua uma adequada razão para o discrímen45. Imaginem que um professor universitário não aceita orientar alunas, mas devido à insistência de uma delas e um comando da reitoria, seja obrigado a aceitar uma estudante como sua orientada. Inconformado, mata-a por sua discriminação, por entender que seu tratamento deve ser diferenciado apenas por ela ser mulher, não podendo fazer parte dos seus orientados. A qualificadora do feminicídio apenas se refere à violência contra a mulher, o que exclui os crimes cometidos contra transexuais. Apesar de ser evidente que tais pessoas são vítimas frequentes de crimes cometidos em razão de sua condição e que necessitam também de proteção, é vedada a analogia em norma penal incriminadora. Deste modo, por consequência do princípio da legalidade, bem como da decorrente necessidade de reserva legal, não há como se estender o termo usado pela lei, “mulher”, a outras pessoas que não sejam as que possuam a condição genética de sexo feminino, mesmo que possuam identificação com o gênero feminino. A violência, portanto, deve se referir ao gênero feminino. Ademais, a vítima deve ser do sexo feminino, sendo que a doutrina já aponta a necessidade de que o sexo seja feminino do ponto de vista genético, como 4 Entende que é possível a incidência do crime no caso de aposentados: CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal. Parte Especial (arts. 121 ao 361). 12 ed. Salvador: Editora JusPODIVUM, 2020, p. 71. 5 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2017. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 18 140 já explicitado. Rogério Sanches Cunha defende posição diversa, entendendo que incide a lei penal para a transexual identificada civilmente como mulher6. Uma das hipóteses de feminicídio é o caso de um uxoricídio cometido por violência doméstica. Uxoricídio é o assassinato da esposa pelo próprio marido. Apesar de vários doutrinadores entenderem que o feminicídio tem natureza de qualificadora de caráter subjetivo, o Superior Tribunal de Justiça considera a violência doméstica uma circunstância de natureza objetiva, razão pela qual entende possível a sua cumulação com a circunstância do motivo torpe: “(...) 2. O Tribunal a quo decidiu em conformidade como entendimento desta Corte superior, porquanto, tratando-se o motivo torpe (vingança contra ex-namorada) de qualificadora de natureza subjetiva, e o fato de a vítima e o acusado terem mantido relacionamento afetivo por anos, sendo certo, que o crime se deu com violência contra a mulher na forma da Lei n° 11.340/2006, ser uma agravante de cunho objetivo, não se pode falar em bis in idem no reconhecimento de ambas, de modo que não se vislumbra ilegalidade no ponto. (...)” (STJ, AgRg no REsp 1741418/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 15/06/2018) “(...) 2. A jurisprudência desta Corte de Justiça firmou o entendimento segundo o qual o feminicídio possui natureza objetiva, pois incide nos crimes praticados contra a mulher por razão do seu gênero feminino e/ou sempre que o crime estiver atrelado à violência doméstica e familiar propriamente dita, assim o animus do agente não é objeto de análise (...)” (STJ, AgRg no REsp 1454781/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 19/12/2019) A configuração da qualificadora do feminicídio afasta a agravante genérica do art. 61, II, f, CP, sob pena de bis in idem. Referido texto legal prevê o seguinte: Circunstâncias agravantes Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: (...) II - ter o agente cometido o crime: (...) f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; (...) Deste modo, o feminicídio não é compatível com o reconhecimento de referida agravante. Há causas de aumento de pena específicas para o feminicídio, as quais estão previstas no parágrafo sétimo do artigo 121. São as hipóteses, portanto, de feminicídio majorado: § 7o A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; 6 CUNHA, Rogério Sanches. Ob. Cit., p. 66-67. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 19 140 II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental; III - na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima; IV - em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. As alterações realizadas pela Lei 13.771, de 19 de dezembro de 2018, foram destacadas. Há, portanto, as seguintes majorantes: Feminicídio praticado durante a gestação ou nos 3 meses posteriores ao parto: há maior vulnerabilidade da mulher em razão de sua condição de grávida ou de recuperação pós-parto, tornando maior o desvalor da conduta. No caso, não há jurisprudência consolidada ou uma posição firmada na doutrina de forma sólida sobre a questão da gestação. Entendo que pode haver só a majorante, se o aborto não acontece e não há desígnio autônomo. Se o feto ou embrião morre, entendo haver concurso formal entre aborto sem consentimento da gestante e o feminicídio majorado. Se o feto/embrião morre e o agente também queria a interrupção da gravidez, o concurso formal é impróprio. Não entendo haver bis in idem, pois aqui se protege a vulnerabilidade maior da mulher na tutela da sua vida extrauterina (vulnerabilidade que acontece tanto na gestação quanto nos meses iniciais após o parto, incluído o chamado “período de resguardo”), enquanto no aborto se protege a vida intrauterina. Vítima menor de 14 anos, maior de 60 anos, com deficiência ou que seja portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental: são exemplos de sujeito passivo com maior dificuldade de resistência, o que, tal como no caso de vítima gestante, torna pior o desvalor da conduta típica. Em se tratando de vítima portadora de doenças degenerativas, o plural parece indicar que o sujeito passivo deve ter mais de uma enfermidade, o que não deve prevalecer. A interpretação deve ser de que a vítima possui uma doença degenerativa ou mais, desde que apresente a limitação ou a vulnerabilidade em decorrência do seu estado de saúde. Na presença física ou virtual de descendente ou ascendente da vítima: matar a vítima na presença de seus pais, filhos ou outros ascendentes ou descendentes torna o desvalor da conduta muito maior. A norma teve sua redação alterada para incluir expressamente a incidência da majorante no caso de “presença virtual”. Deste modo, se os filhos da vítima presenciarem o crime por meio de uma chamada de vídeo (por exemplo, por Skype), incidirá a majorante. em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006: as medidas protetivas previstas na chamada Lei Maria da Penha e mencionadas no artigo são: “I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 20 140 b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; (...)” Logo, se tiver sido imposta uma dessas medidas acima mencionadas e o agente a descumprir, cometendo o delito de feminicídio, incidirá a majorante. Atenção: não são todas as medidas protetivas que, se violadas, ensejam o aumento de pena do crime. Cumpre, então, sistematizar a natureza das qualificadoras, conforme o entendimento jurisprudencial. A relevância reside, por exemplo, na compatibilidade ou não com o privilégio, que possui natureza subjetiva e só incide no caso de a qualificadora ter natureza objetiva. Vejamos: Qualificadora Natureza I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; Subjetiva II - por motivo fútil; Subjetiva III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; Objetiva IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; Objetiva V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Subjetiva VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino Objetiva VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição Divergência: Objetiva7 Subjetiva8 Mista9 (objetiva quando o agente estiver na função, subjetiva 7 Sustentamos ser subjetiva anteriormente e, com a definição do STJ sobre feminicídio, entendemos haver uma tendência a se considerar objetiva. 8 Considerando ser subjetiva a natureza: MASSON, Cleber. Direito Penal: parte especial (arts. 121 a 212). Vol. 2. 12 ed. São Paulo: MÉTODO, 2019, p. 47. 9 CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal. Parte Especial (arts. 121 ao 361). 12ª ed. Salvador: Editora JusPODIVUM, 2020, p. 71-72. Michael Procopio Aula13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 21 140 quando decorrer de sua função ou envolver familiares) 3.5 HOMICÍDIO DOLOSO MAJORADO Há causas de aumento de pena, ou majorantes, referentes aos crimes de homicídio doloso. Estão previstas na parte final do parágrafo quarto e no parágrafo sexto do artigo 121 do Código Penal: Aumento de pena § 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. (...) § 6o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. São duas, portanto, as majorantes do crime de homicídio doloso: Homicídio praticado contra pessoa menor de 14 anos ou maior de sessenta anos Há a causa de aumento de pena quando se trata de homicídio doloso e a vítima for menor de 14 anos ou maior de 60 anos de idade. Como estudamos quanto ao tempo do crime, o crime se considera praticado ao tempo da ação ou da omissão típica, em razão de o Código Penal ter adotado a teoria da atividade. Deste modo, é este o paradigma para se verificar a idade da vítima, ou seja, devemos considerar quantos anos ela possui ao tempo da conduta delitiva. Em decorrência do princípio da culpabilidade, nosso Direito Penal não aceita a responsabilidade objetiva. Por isso, o agente deve ter conhecimento sobre a idade da vítima, também ao tempo de sua conduta, para que referida majorante possa incidir. A pena, presente essa majorante, deve ser aumentada de 1/3 (um terço) na terceira fase da dosimetria. Homicídio praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio Temos também homicídio doloso majorado quando é praticado por milícia privada, atuando sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. Milícia privada é a reunião de pessoas, sejam civis ou militares, que buscam atuar com violência ou grave ameaça e pretexto de devolver a paz pública, mormente em comunidades carentes. A milícia pratica ingerência na área de segurança pública, utilizando-se da força, que é monopólio do Estado. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 22 140 Grupo de extermínio é a reunião de pessoas que praticam assassinatos, tendo como vítimas as pessoas marginalizadas ou consideradas indesejadas pela sociedade. Consideram-se justiceiros, podendo também ser civis ou militares. Configurada tal majorante, o juiz deve aumentar a pena, na terceira fase da dosimetria, pela fração de um terço até metade. A doutrina diverge quanto ao número de agentes necessários para configuração da milícia privada ou do grupo de extermínio. Há o entendimento de que se deve adotar o número de três ou mais pessoas, a exemplo do delito de associação criminosa. Há, ainda, a posição de que o parâmetro deve ser o crime de organização criminosa, com a exigência de quatro ou mais pessoas. Ainda não há posicionamento do Superior Tribunal de Justiça a respeito. O STJ, nos casos já apreciados, tem entendido que a atividade de milícia privada ou grupo de extermínio demonstra maior gravidade, sendo justificativa aceitável para a segregação cautelar dos réus: “(...) 3. A decisão que decretou a prisão preventiva do paciente e o acórdão que a ratificou apontaram a existência de prova da materialidade do delito e fortes indícios de autoria, e demonstraram satisfatoriamente a necessidade da medida extrema, em razão da gravidade concreta e do modus operandi das condutas criminosas, praticadas no contexto de organização criminosa formada por policiais e agentes de segurança privada, com características de grupo de extermínio, o que reforça a periculosidade do paciente e respalda a custódia antecipada para garantia da ordem pública. (...)” (STJ, HC 365092/MT, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 08/11/2016). 3.6 HOMICÍDIO CULPOSO O homicídio também é punível se praticado a título de culpa, isto é, imprudência, negligência ou imperícia. Em virtude de a culpa em sentido amplo integrar o tipo, que não pode esgotar todas as formas de se praticar o homicídio culposamente, considera-se, de forma majoritária, que o tipo penal é aberto. Entretanto, dada a definição mínima da conduta, a doutrina e a jurisprudência aceitam referido modelo de tipo culposo. O homicídio culposo está previsto no parágrafo terceiro do artigo 121 do Código Penal, podendo ser praticado por meio de conduta comissiva ou por meio de omissão imprópria: Homicídio culposo § 3º Se o homicídio é culposo: (Vide Lei nº 4.611, de 1965) Pena - detenção, de um a três anos. Há hipóteses de homicídio culposo majorado, ou seja, com causa de aumento de pena. Estão previstas na primeira parte do parágrafo quarto do artigo 121 do CP: Aumento de pena § 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 23 140 doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. As causas de aumento de pena, incidentes no caso de homicídio culposo, são as seguintes: Se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício O homicídio culposo é majorado quando há inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício. É a hipótese denominada de culpa profissional. No caso da majorante, o agente possui o conhecimento da técnica, mas a ignora de forma deliberada. Portanto, só incide em caso de o agente ser habilitado para a profissão, conforme entende a doutrina majoritária. Existe bis in idem em relação ao elemento subjetivo (imperícia) e à majorante (inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício? O STJ vem apontando ser possível delinear diferença entre a culpa, como elemento subjetivo, e a inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, como circunstância majorante: “(...) 3. A causa especial de aumento, prevista no art. 121, § 4º do Código Penal (inobservância de regra técnica de profissão) figura no campo da culpabilidade e, pois, para incidir, deve estar fundada em outra nuance ou fato diferente do que compõem o próprio tipo culposo, rendendo ensejo a maior reprovabilidade na conduta do profissional que atua de modo displicente no exercício de seu mister, dando causa ao evento morte. Precedentes desta Corte e do STF (RHC n. 26.414/RJ, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, Dje 26/11/2012).(...)” (STJ, HC 167.804/RJ, Rel. Min. Sebastião Júnior, 6ª Turma, DJe 23/08/2013). “(...) 1. O homicídio culposo se caracteriza com a imprudência, negligência ou imperícia do agente, modalidades da culpa que não se confundem com a inobservância de regra técnica da profissão, que é causa especial de aumento de pena que se situa no campo da culpabilidade, por conta do grau de reprovabilidade da conduta concretamente praticada.2. Não há bis in idem pelo aumento implementado com base no § 4.º do art. 121 do Código Penal, em razão de constatar-se circunstâncias distintas, uma para configurar a majorante,outra para o reconhecimento do próprio tipo culposo.(...)” (STJ, HC 231.241/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, DJe 04/09/2014). “(...) 2. O homicídio culposo por erro médico restou reconhecido pela negligência do tratamento adequado, incidindo sem bis in idem a majorante da inobservância de regra técnica, não apenas pela falta ao atendimento exigível para a situação, mas também pela realização de procedimento cirúrgico de grande porte em clínica que se sabia não possuir estrutura adequada.(...)” (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 1661283/PA, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 26/03/2019). O STF também possui precedente no sentido de que não há bis in idem no caso de homicídio culposo majorado por inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício: “Tratando-se de profissional da área de saúde (médico), a inobservância, por ele, de regra técnica de profissão legitima a exasperação da pena imponível pela prática do delito de homicídio culposo, eis que a causa especial de aumento da sanção penal prevista no art. 121, § 4º, do CP, além de não constituir “bis in idem”, justifica-se em razão do descumprimento, pelo médico, do dever de cuidado Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 24 140 e/ou da falta de diligência ou cautela que as circunstâncias do caso dele exigiam. Ocorrência, na espécie, de imperícia profissional justificadora da incidência da causa especial de aumento de pena referida no § 4º do art. 121 do CP.” (STF, RHC 129946 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, Julgamento: 08/03/2016). Se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima Há aumento de pena no homicídio culposo se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima. Para configuração da majorante, a doutrina aponta a necessidade de o agente poder prestar o socorro sem que isso implique em risco pessoal a ele. Obviamente, só haverá crime de homicídio culposo majorado pelo fato de o agente deixar de prestar imediato socorro à vítima, se ele tiver provocado a morte por imprudência, negligência ou imperícia. Se não há culpa do agente quanto à morte, o crime será de omissão de socorro. Não incide a majorante em caso de morte instantânea da vítima ou de socorro instantâneo por outrem. Por exemplo, se a vítima é atingida pela demolição de um edifício, por culpa do operário, e os bombeiros militares, no prédio ao lado, prestam imediato socorro, a majorante restará afastada. Entretanto, não cabe ao agente efetuar a avaliação sobre a utilidade ou não da prestação de socorro. Se possível prestar socorro sem risco pessoal, o agente deve fazê-lo, sob pena de responder pelo crime com a causa de aumento de pena. Neste sentido, o seguinte precedente do STF: “2. Homicídio culposo agravado pela omissão de socorro. 3. Pedido de desconsideração da causa de aumento de pena prevista no art. 121, § 4o, do Código Penal, para que se opere a extinção da punibilidade, em face da consequente prescrição da pretensão punitiva, contada pela pena concreta. 4. Alegação de que, diante da morte imediata da vítima, não seria cabível a incidência da causa de aumento da pena, em razão de o agente não ter prestado socorro. Alegação improcedente. 5. Ao paciente não cabe proceder à avaliação quanto à eventual ausência de utilidade de socorro.” (STF, HC 84380/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, Julgamento: 05/04/2005). se o agente não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante O homicídio culposo será majorado se o agente não procura diminuir as consequências do seu ato. Para alguns penalistas, o dispositivo trata exatamente da hipótese de omissão de socorro, apenas com utilização de outras palavras. se o agente foge para evitar prisão em flagrante Por fim, haverá a causa de aumento de pena se o agente, após a prática de homicídio culposo, foge para evitar a prisão em flagrante. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 25 140 Alguns doutrinadores entendem que a fuga para evitar a prisão seria inconstitucional, já que o réu não poderia ser penalizado por não ter permanecido no local aguardando sua própria prisão10. Vale mencionar, entretanto, que no julgado do recurso extraordinário 971.959 (paradigma), o STF fixou a seguinte tese: “A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97) é constitucional, posto não infirmar o princípio da não incriminação, garantido o direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão da tipicidade e da antijuridicidade.” (DJe de 31/07/2020). Deste modo, não considera a incriminação da fuga como inconstitucional, já que o art. 305 do CTB tipifica o crime de fuga do local do acidente. Perdão Judicial O artigo 121, § 5º, do Código Penal prevê a possibilidade de concessão de perdão judicial no crime culposo. Como visto, o perdão judicial é causa de extinção da punibilidade, vinculada ao princípio da desnecessidade da pena: § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. O STJ tem interpretado a norma de modo a exigir vínculo afetivo entre a vítima e o agente, de modo a se demonstrar o sofrimento que atingiu o agente: A col. 6ª Turma do STJ, ao examinar a possibilidade de aplicação do perdão judicial (§ 5º do art. 121 do CP) ao homicídio culposo no trânsito, assentou que "[A] melhor doutrina, quando a avaliação está voltada para o sofrimento psicológico do agente, enxerga no § 5º a exigência de um vínculo, de um laço prévio de conhecimento entre os envolvidos, para que seja "tão grave" a consequência do crime ao agente. A interpretação dada, na maior parte das vezes, é no sentido de que só sofre intensamente o réu que, de forma culposa, matou alguém conhecido e com quem mantinha laços afetivos.(STJ, AgRg no AREsp 1349597/SP, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 21/09/2018). “(...) Tratando-se o perdão judicial de uma causa de extinção da punibilidade de índole excepcional, somente pode ser concedido quando presentes os seus requisitos, devendo-se analisar cada delito de per si, e não de forma generalizada, como quando ocorre a pluralidade de delitos decorrentes do concurso formal de crimes. (...)” (STJ, REsp 1444699/RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 09/06/2017). De acordo com o precedente, não se estende o perdão judicial a uma vítima sem vínculo com o agente, ainda que no mesmo contexto em que tenha sido atingida uma vítima que tinha relação de afeto com ele. De todo modo, há o entendimento de que basta o vínculo com uma das vítimas, podendo o perdão judicial se estender a outra vítima, desde que atingida no mesmo contexto, pela mesma conduta culposa do agente. Isto porque o perdão judicial atinge a conduta como um todo, sendo que, no caso de concurso formal, todos os resultados estariam abrangidos. Este entendimento não tem sido adotado pelo STJ. Ademais, admite-se analogia in bonam partem para estender a causa extintiva de punibilidade para o homicídio culposo do Código de Trânsito Brasileiro. 10 Luiz Régis Prado justifica a majorante por razão de política criminal, em nome da eficiência da administração da justiça (Curso de direito penal brasileiro. 18 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2020, p. 406). Defendem “duvidosa constitucionalidade”: MASSON, Cleber. Ob. cit., p. 57; CUNHA, Rogério Sanches. Ob. cit. p. 80. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 26 140 Portanto, se o agente sofre as consequências da sua conduta culposa de forma tão gravosa que a sanção se torne desnecessária, o juiz pode deixarde aplicar a pena. A hipótese é denominada de bagatela imprópria. Sua natureza é de direito público subjetivo do réu. Isto é, presentes os requisitos previstos na lei, o juiz deve conceder o perdão judicial, por se tratar de direito subjetivo do réu, apesar de a norma dizer que o magistrado “pode” deixar de aplicar a pena. Com relação a eventual efeito condenatório, o STJ já sumulou o entendimento sobre a sua impossibilidade, nos termos do seu enunciado de número 18: A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório. Assim, a sentença concessiva de perdão judicial não pode servir de fundamento para reconhecimento, no caso da prática posterior de outra infração penal, da reincidência do agente, por exemplo. 4. INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO OU AUXILIO AO SUICÍDIO OU A AUTOMUTILAÇÃO O crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio era a denominação do delito previsto no artigo 122 do Código Penal, que possuía, até 26 de dezembro de 2019, o seguinte teor: Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Estudaremos a redação antiga, já que a novatio legis in pejus só alcança os fatos cometidos após o início de sua vigência. Não se pune a tentativa de se matar, mas a norma penal tutela a vida alheia, não aceitando que o agente dê a ideia, reforce o projeto ou forneça algum auxílio material para que um terceiro se mate. O sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa. Entretanto, o sujeito passivo deve ser pessoa capaz de compreensão, sob pena de se configurar o homicídio. Caso o agente induza, por exemplo, uma criança de 8 anos de idade a beber veneno, deverá responder pela prática de homicídio, já que a vítima não possuía capacidade de compreender o que estava fazendo. A conduta deve se dirigir a pessoa determinada ou a pessoas determinadas. Se a conduta se voltar a pessoas indeterminadas, a conduta passa a ser considerada atípica, segundo a doutrina dominante. Os núcleos do tipo possuem os seguintes significados: Induzimento: o agente cria na vítima a ideia. Instigação: o agente reforça uma ideia preexistente. Auxilio: o agente presta assistência material à vítima. Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 27 140 O auxílio material deve ser acessório, pois, se o agente praticar atos executórios, pode-se configurar o crime de homicídio. Por exemplo, se o agente fornece a corda para que o sujeito se enforque, temos auxílio ao suicídio. Se ele empurra o sujeito para que a corda o enforque, o crime é o de homicídio. O delito de instigação, induzimento ou auxílio ao suicídio é crime de ação múltipla, isto é, possui mais de um núcleo do tipo, sendo que basta que a conduta do agente se subsuma a um dos verbos nucleares para sua configuração. Ainda como consequência de ser crime de tipo misto alternativo, caso ele pratique mais de uma das ações nucleares no mesmo contexto, responderá por crime único. Pode ser comissivo ou omissivo impróprio, neste último caso quando o sujeito tiver o dever de garantidor. Há divergência se, no caso de colaboração moral, é cabível a conduta omissiva. Seria o caso da mãe que se cala quando a filha, de 17 anos de idade, diz que pretende se matar por ter visto uma série sobre isso e entender que é a solução para o caso. Para alguns, a mãe deveria agir, por seu dever de garante (a vítima é sua filha menor de idade), razão pela qual sua omissão configuraria o crime em estudo. O elemento subjetivo é o dolo. Não há previsão de punição de modalidade culposa. Se a vítima nem tenta se matar ou apenas sofre lesão leve, não havia crime, para a doutrina majoritária. Só há relevância penal se a vítima sofrer lesão corporal de natureza grave ou se ela efetivamente consegue se matar. Seguindo este entendimento, a tentativa não é juridicamente possível. Nelson Hungria, entretanto, defendia o entendimento de que o crime se consumaria com a própria instigação, induzimento ou o auxílio. Deste modo, a morte ou a lesão corporal de natureza grave consistiriam em condição objetiva de procedibilidade. Forma majorada O crime possuía duas causas de aumento de pena, previstas no parágrafo único do artigo 122: Parágrafo único - A pena é duplicada: Aumento de pena I - se o crime é praticado por motivo egoístico; II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. São as seguintes hipóteses: Crime praticado por motivo egoístico O motivo egoístico consiste no interesse pessoal do agente. Seria o caso de quem induz o sujeito, com classificação superior em lista de espera de concorrido concurso, a se matar. Também há a majorante no caso de indivíduo que instiga um amigo a praticar suicídio, sabendo ser um grande beneficiário do seu testamento. Vítima menor de idade ou com capacidade de resistência diminuída por qualquer causa Quanto à vítima menor de idade, como vimos, não pode se tratar de pessoa sem capacidade de compreender aquilo que faz, como uma criança. A doutrina, então, aponta algumas sugestões, como a faixa etária de 14 a 18 anos, que era mencionada no revogado artigo 224, “a”, do Código penal, atualmente Michael Procopio Aula 13 Direito Penal p/ PC-PA (Delegado) - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 28 140 adotada no crime de estupro de vulnerável. Outra possibilidade é analisar caso a caso se a vítima possuía maturidade suficiente, de acordo com a idade, para não ser facilmente influenciada em relação à eliminação da sua própria vida. Vale relembrar que, se a vítima não tinha capacidade alguma de entendimento da situação, o crime seria outro, o de homicídio. A vítima com capacidade de resistência diminuída é toda aquela que, por determinada causa, tem sua capacidade de compreensão e de não ser influenciada reduzida. É o caso da vítima enferma, alcoolizada, muito idosa etc. Alteração legislativa: Lei 13.968/2019 Com a Lei 13.968/2019, o artigo 122 passou a ter a seguinte redação: Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça: Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. A principal modificação operada, no preceito primário, foi a inclusão da participação em automutilação. Isto é, também passa a ser típica a conduta de instigar, induzir ou auxiliar alguém a praticar a automutilação. Automutilação é a conduta de causar lesões em si próprio. Vale recordar, até mesmo pelo princípio da transcendentalidade ou da alteridade, que veda a punição de condutas que não ultrapassem o âmbito de disponibilidade do agente, a autolesão, por si só, não é punida. Assim como o suicídio não é punido, o que o legislador veda é o induzimento, a instigação ou o auxílio material a que alguém suicide ou que se mutile. O crime de instigação, induzimento ou auxílio ao suicídio é de competência do Tribunal do Júri. É discutível se a nova figura, de induzimento, instigação ou auxílio a automutilação também é crime de competência do Júri, apesar de sua localização no Capítulo I, Título I, da Parte Especial do Código Penal. A conduta não se volta diretamente contra a vida, mas sim contra a integridade física, a integridade corporal e a saúde de outrem. Quanto à instigação, o induzimento e o auxílio material ao suicídio, os comentários acima, sobre a conduta típica, continuam se aplicando. Os núcleos do tipo – induzir, instigar e prestar (auxílio material) – já foram estudados acima. Ademais, também foi alterado o preceito secundário, trazendo a sanção de 6 meses a 2 anos de reclusão. A maior
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