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: CIÊNCIA, CULTURA E ARTE

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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA 
DO RIO DE JANEIRO - CAMPUS NILÓPOLIS 
 
 CURSO BACHARELADO EM PRODUÇÃO CULTURAL 
 
 
 
 
DULCE DE BARROS GASPAR 
 
 
 
 
UNINDO PONTAS: CIÊNCIA, CULTURA E ARTE – 
UM ESTUDO EM INSTITUIÇÕES DE SAÚDE MENTAL DO 
RIO DE JANEIRO 
 
 
 
 
 
 
IFRJ – CAMPUS NILOPÓLIS 
 2016 
 
 
 
 
DULCE DE BARROS GASPAR 
 
 
 
UNINDO PONTAS: CIÊNCIA, CULTURA E ARTE – 
UM ESTUDO EM INSTITUIÇÕES DE SAÚDE MENTAL DO RIO 
DE JANEIRO 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso, como requisito 
parcial para a obtenção do grau em Bacharela em 
Produção Cultural do curso correspondente 
ofertado pelo Instituto Federal de Educação, 
Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro Campus 
Nilópolis. 
Orientadora: Professora Doutora Maylta Brandão 
dos Anjos. 
 
 
 
 
 
 
IFRJ – CAMPUS NILÓPOLIS 
2º SEMESTRE/2015 
 
 
 
INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO 
RIO DE JANEIRO - CAMPUS NILÓPOLIS 
 
DULCE DE BARROS GASPAR 
 
UNINDO PONTAS: CIÊNCIA, CULTURA E ARTE – UM ESTUDO EM 
INSTITUIÇÕES DE SAÚDE MENTAL DO RIO DE JANEIRO 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de 
Bacharel em Produção Cultural do Instituto Federal Rio de Janeiro 
– Nilópolis, como requisito parcial para obtenção do grau de 
Bacharela em Produção Cultural. 
 
Aprovado em______de________________2016. 
Conceito:________________ ( ______________________) 
BANCA EXAMINADORA 
_________________________________ 
Orientadora Profa. Dra Maylta Brandão dos Anjos - IFRJ 
_________________________________ 
Profa. Ms. Gabriela Ventura - IFRJ 
____________________________________ 
Profa. Esp. Suéle Maria Lima - IFRJ 
________________________________ 
Suplente Profa. Ms. Beatriz Meirelles PUC – RIO 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
A Deus, com seu plano de amor, Senhor da minha vida, que pelo seu amor me 
sustentou para realização dessa pesquisa. 
À minha orientadora Professora Maylta Brandão dos Anjos. Um anjo que Deus na 
sua infinita sabedoria e bondade me presenteou com sua paciência, carinho e grandes 
ensinamentos me auxiliando em todas fases dessa nova descoberta, minha mestra 
sempre. 
À minha família, razão da minha existência. Em especial, à minha mãe Mirian, meus 
filhos Anderson e Thiago, pelo apoio necessário nas horas incertas. 
 À Beatriz, minha Bia, que foi paciente com meus medos. 
Ao meu irmão Washington sem o qual a pesquisa de campo seria mais complicada. 
À Adriel e Sandra, que estiveram presentes com palavras de conforto espiritual. 
Aos meus Professores do IFRJ, que através de seus ensinamentos me levaram ao 
mundo novo de conhecimentos. Em especial Marcos Aurélio Passos Louzada e 
Fernanda Delvalhas Piccolo, por seus abraços nos momentos necessários. A Suéle 
Maria de Lima pelo cuidado, sempre! 
Aos meus amigos do IFRJ com destaque para Cláudia Pinho (minha companheira de 
todas as horas), Marcia Tranhaque, Maria José (Graça), Ester Antunes, Laura Gomes, 
Alcineide Lopes, Anderson Matos, Alessandro Almado, Virginia Lys, Ruth Maciel, 
Jocélia Chagas, Julianas, Águida, Pâmella, Carlos, Geysa Passos, Márcio Salles, 
Gleice Queli, Vicentinho, Jefter Paulo, Amnon, Alexandre, Tadeu Elvis e Hugo. 
Em especial Neli Almeida e Rafael Almada. 
À toda equipe do CAPS Lima Barreto e do Hotel da LouCura.. 
A todos que de forma direta ou indireta, fizeram parte dessa trajetória. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“E não sede conformados com este mundo, mas sede 
transformados pela renovação do vosso entendimento, para que 
experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de 
Deus.” 
 Romanos 12:2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
https://www.bibliaonline.com.br/acf/rm/12/2+
 
 
RESUMO 
 
 
Este trabalho apresenta um estudo cujas temáticas ciência, cultura e artes se unem 
em experimentos artísticos, científicos e culturais como promotores da saúde mental. 
O cenário consiste no Instituto Municipal de Saúde Mental Nise da Silveira, Engenho 
de Dentro, Rio de Janeiro. Analisa-se como a arte pode amenizar os efeitos das 
doenças emocionais. O intuito é de buscar entre os temas trabalhados as pontas que 
constituem possibilidades de união para o processo da melhor constituição dos 
sujeitos. Tem seu aporte mais forte na práxis de Nise da Silveira, que estudou o uso 
das artes como terapia, acreditando ser o afeto um dos caminhos para cura e maior 
ressignificação dos sujeitos institucionalizados. Assumimos a metodologia da 
pesquisa participante como procedimento realizado por meio de uma integração entre 
os diversos tipos de clientes do grupo que realiza oficinas, utilizando experimentos 
artísticos e científicos, mantendo um diálogo e envolvendo todos participantes como 
sujeito do conhecimento. A abordagem do tratamento da pesquisa foi qualitativa e 
buscou em fontes diretas a atribuição de significados das visões dos entrevistados 
com questões abertas nas oficinas. As falas colhidas foram interpretadas tendo por 
base informações teóricas que nos levou a reconhecer a união, nada sutil, que existe 
entre a ciência, como dimensão da descoberta sistematizada acerca do tratamento 
especificado da mente; da cultura, como modo de ação, de fazer e de possibilidades 
de libertação e consolidação de uma prática autônoma; da arte como expressão de 
novas percepções e emoções, trazendo para o campo da cultura novas imagens, 
músicas, danças e significados de beleza que nascem da condição dos clientes da 
instituição nos seus valores estéticos. Assim, a ciência, a cultura e a arte, formam 
novas habilidades que perfazem a busca de outra condição social dos clientes numa 
vida que o recomponha como sujeito de intensa criatividade, afeto e alegria, que 
ameniza as dores, emocionais ao mesmo tempo em que promove uma melhor 
comunicação na sociedade. 
 
Palavras-chave: Ciência; Cultura; Arte; Sociedade; Saúde Mental. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
This paper presents a study whose theme science, culture and art come together in 
artistic, cultural and scientific experiments as mental health promoters. The scenario 
consists of the Municipal Institute of Mental Health Nise da Silveira, Engenho de 
Dentro, Rio de Janeiro. it looks at how art can mitigate the effects of emotional 
illnesses. The aim is to seek among the themes discussed tips that are union of 
possibilities for the process in the best constitution of subjects. It has its strongest 
contribution in practice Nise da Silveira, who has studied the use of the arts as therapy, 
believing it to be the affection of the paths to healing and increased redefinition of 
institutionalized subjects. We assume the methodology of participatory research as a 
procedure performed through an integration between the various types of group of 
customers who conducts workshops using artistic and scientific experiments, 
maintaining a dialogue and involving all participants as a subject of knowledge. The 
treatment approach of the research was qualitative and sought to direct sources 
assigning meanings of the views of respondents with open questions in the workshops. 
The collected speeches were interpreted based on theoretical information that led us 
to recognize the union, unsubtle, that exists between science and size of the 
systematic discovery to the specified treatment of the mind; culture, such as mode of 
action, of doing and possibilities of liberation and consolidation of an autonomous 
practice; Art as an expression of new perceptions and emotions, bringing to the field 
of culture new images, songs, dances and beauty meanings that arise from the 
condition of the Bank's customers in their aesthetic values. Thus, science, culture and 
art, form new skills that make up the pursuit of other social condition of customers in 
life that recompose as the subject of intense creativity, affection and joy, which eases 
the pain, emotional at the same time promotesbetter communication in society. 
 
 
Keywords: Science; Culture; Art; Society; Mental Health. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE SIGLAS 
 
CAPS: Centro de Atenção Psicossocial 
CPN; Centro Psiquiátrico Nacional 
HL: Hotel da Loucura 
IMSMNS: Instituto Municipal de Saúde Mental Nise da Silveira 
MII: Museu de Imagem do Inconsciente 
NCC-SMSRJ: Núcleo de Cultura, Ciência e Saúde da Secretaria Municipal de Saúde 
do Rio de Janeiro 
RJ: Rio de Janeiro 
UNESCO: Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 01:. ................................................................................................................. 22 
Figura 02: .................................................................................................................. 22 
Figura 03:. ................................................................................................................. 54 
Figura 04:. ................................................................................................................. 55 
Figura 05: .................................................................................................................. 55 
Figura 06 ................................................................................................................. 56 
Figura 07 ................................................................................................................ 56 
Figura 08 ................................................................................................................. 58 
Figura 09 ................................................................................................................. 58 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
Capítulo 1 – 
 Introdução...............................................................................................................13 
 
Capítulo 2 – 
 Metodologia: Um Caminho De Registro, Análise e 
Propositiva ............................................................................................................. 17 
 
Capítulo 3 - 
 Breves Conceitos Acerca Da Ciência, Da Cultura E Da Arte ............................. 25 
3.1 - Ciência na sua base ......................................................................................... 25 
 3.1.1 - A poesia e a ciência: um veículo da arte ...................................................... 27 
 3.2 - Enunciado sobre cultura .................................................................................. 28 
3.3 - Arte e cultura .................................................................................................... 33 
 
Capítulo 4 – 
Abordando As Artes Cênicas No Tratamento Psiquiátrico – A Saúde Como 
Elemento De Liberdade .......................................................................................... 38 
 4.1 - Artes cênicas e tratamento psiquiátrico: um encontro entre Boal e 
 Nise ...................................................................................................................... 38 
 4.2 - Arte, tratamento, inconsciente, saúde e loucura: um passeio em Nise ...................... 41 
 4.3 - O interno, o cliente e o hóspede: o que fala a literatura ................................... 43 
 
Capítulo 5 - O Cenário E Sua História: O Hotel Da Loucura Em Foco ................ 48 
 
 
 5.1 - Arte e poesia no cenário da LouCura ............................................................... 50 
 5.2 - Da palavra escrita, à poesia. Da palavra interpretada, ao teatro ..................... 51 
 
Capítulo 6 - A Pesquisa E Sua Análise .................................................................. 54 
 
 6.1 - A entrada no cenário: primeiras impressões e novas visitas ............................ 54 
 6.2 - As falas, a loucura e o encantamento pela análise da pesquisa ..................... 62 
 6.2.1 - A fala do sujeito 1 .......................................................................................... 63 
 6.2.2 - Breve análise da fala do sujeito 1 ................................................................. 67 
 6.3.1 - Falas do sujeito 2 ......................................................................................... 69 
 6.3.2 - Breve análise da fala do sujeito 2 ................................................................. 71 
 
7-Considerações Finais .......................................................................................... 74 
 
Referências Bibliográficas ..................................................................................... 78 
 
Anexos ..................................................................................................................... 82 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Nada tenho. 
Nada me pode ser tirado. 
Eu sou o ex-estranho, o que veio sem ser chamado e, 
gato se foi sem fazer nenhum ruído. 
Paulo Leminski 
 
 
 
http://pensador.uol.com.br/autor/paulo_leminski/
13 
 
INTRODUÇÃO 
 
Este trabalho, para além de uma escrita acadêmica, cumpre um enlevo de 
trazer em análise e pesquisa um projeto que trabalha com temáticas caras e 
constitutivas do humano e, entre tantos experimentos artísticos e científicos faz um 
destaque para o que acontece no Teatro de DioNises desde 2011 às quartas-feiras 
na Praça de Arpoador. Este Teatro influiu e redundou para que em 2012 acontecesse 
a fundação do Hotel da LouCura (HL) no Instituto Municipal de Saúde Mental Nise da 
Silveira IMNS, Engenho de Dentro, Rio de Janeiro. Nesse espaço, hoje, se destaca o 
uso das artes cênicas. Nas oficinas de teatro o objetivo maior é amenizar as dores 
das doenças emocionais e ao mesmo tempo promover uma melhor comunicação 
entre o psicótico e a terapia. O intuito desse trabalho é investigar como se dá a 
articulação entre a ciência, cultura e arte como uma porta que se abre ao mundo do 
cliente ou hóspede do HL, conferindo a ele, cliente, maior possibilidade de colocação 
como sujeito de ação no mundo. 
Não poderia deixar de registrar que essa história iniciou em 1946, no Hospital 
Psiquiátrico Pedro II, Engenho de Dentro, quando Nise da Silveira, a psiquiatra, 
escritora, pensadora, cientista e acima de tudo pioneira na luta antimanicomial, abriu 
um espaço de pinturas para experimentos em busca de uma comunicação não verbal 
com os pacientes. Nise estudou o uso das artes como terapia, acreditando que o afeto 
era um dos caminhos para cura das doenças emocionais. 
Os ensinamentos de Nise são adotados no Hotel da LouCura, onde todas as 
semanas se realizam oficinas e os clientes são convidados, de forma livre e afetiva a 
participar. Todos os participantes destas oficinas assumem um trabalho em que são 
considerados iguais, sejam médicos, técnicos, visitantes ou pacientes. Não há 
distinção e ou hierarquização entre os que ali estão. 
Há cinco anos o médico com formação em imunologia, ator, pesquisador 
cultural, fundador e Coordenador do Núcleo de Cultura, Ciência e Saúde da Secretaria 
Municipal de Saúde do Rio de Janeiro - NCC-SMSRJ, Vitor Pordeus, junto a diversos 
agentes culturais, aplicam entre outras oficinas a oficina do teatro, onde exploram o 
14 
 
uso das artes cênicas como instrumento de organização coletiva. Segundo Pordeus 
“o objetivo final é promover a extinção de todos os manicômios e, o Instituto Nise se 
transformaria em uma Universidade Popular, com cursos abertos para sociedade.” 
(Revista Galileu.globo.com) 
A partir da definição do tema temos como objetivo geral da pesquisa verificar 
de que maneira os efeitos das artes podem contribuir no Hotel da LouCura para 
promover uma melhor comunicação entre o cliente e a terapia da expressão artístico 
cultural.Os objetivos específicos são: avaliar como as artes cênicas podem unir ciência, 
cultura e arte; observar os ensaios artísticos que acontecem no intuito de amenizar as 
doenças emocionais. 
Nossa justificativa se faz presente a partir da crença de que trabalhar com uma 
pesquisa que envolve temáticas estimulantes desperta olhar representativo sobre um 
grupo social. Pesquisar assuntos diferenciados nos leva a pensar e conhecer o estado 
da arte de propostas que rompam com o tratamento segregador a quem possui baixa 
estabilidade emocional e cognitiva, tornando esse estudo desafiador por si só. 
A Produção Cultural é vista por muitos como o ato de realizar eventos culturais 
e ponto final. Entretanto ao decorrer do curso deparamos com inúmeras 
possibilidades. O Produtor Cultural precisa estar articulado entre outras coisas com a 
ciência, saúde e arte, este foi um dos motivos pessoal que levou a escolha do tema. 
Como afirma Sarkovas, em entrevista no estúdio Cine e Vídeo ( 2010): 
“ Hoje, felizmente, tem um processo de profissionalização não artística na área 
cultural brasileira. Um bom gestor cultural tem uma capacidade de ampliar a 
efetividade da ação cultural.” 
Sendo um projeto que busca demonstrar a sensibilidade do encontro da arte, 
da ciência e da cultura, em um espaço alternativo, que trabalha com vidas e que tem 
no “afeto” um elemento referencial na melhora da autoestima dos portadores de 
doenças emocionais, essa pesquisa se traduz na lógica das humanidades. De acordo 
com Gullar (Folha de São Paulo 27/02/2005) 
15 
 
... o elemento fundamental das realizações e das concepções de Nise da 
Silveira era o afeto, o afeto pelo outro. Foi por não suportar o sofrimento 
imposto aos pacientes pelos choques que ela buscou e inventou outro 
caminho, no qual, em vez de ser vítima da truculência médica, o doente se 
tornou sujeito criador, personalidade livre capaz de criar um universo mágico 
em que os problemas insolúveis arrefeciam. 
 
Diante de limitações, devemos pensar em Nise como a “psiquiatra rebelde“. 
Segundo Ferreira Gullar, Nise foi uma mulher bem a frente de seu tempo, sem deixar 
de ser sensível. Por isso, com sua sensibilidade sempre pronta para entendimento e 
doação ao outro, Nise introduz o mundo da cultura à arte perpassando pelo afeto e 
pelo mundo científico. Essa pesquisa se justifica na máxima de que “cuidar do outro é 
cuidar de mim”. E Nise sabia bem disso, cuidando do outro, deu a si o melhor dos 
presentes, a consciência formadora dos melhores valores e correspondência de suas 
boas ações e construções. Esta pesquisa, de forma despretensiosa pretende, para 
além do cumprimento de um trabalho de formação acadêmica, ser um registro e voz 
para aqueles que estigmatizados em sua condição, buscam a liberdade e o espaço 
de ser e de criar no sentido do reconhecimento de serem sujeitos, pessoas, seres 
pensantes que expressam sua arte e cultura, chancelados pela ciência, que se faz 
meta de estudos permanentes, refinando a dimensão humana e suas emoções dentro 
desse contexto; estabelecendo um elo interdisciplinar ao campo das vivências 
humanas. As relações produtivas que nascem do campo da ciência, da cultura e da 
arte redundam dos trabalhos com as dimensões emocionais que reposicionam os 
hóspedes do HL tornando-os inseridos na sociedade. 
Este trabalho foi estruturado em capítulos em que traçamos o caminho 
metodológico, apresentamos breves conceitos acerca da ciência, da cultura e da arte, 
baseado em diversos autores e abordamos as artes cênicas. Realizamos, também, 
um breve histórico sobre o cenário Hotel da LouCura com uma análise sobre seus 
experimentos artísticos e científicos. Analisamos as falas acontecidas no campo da 
pesquisa. E, por último trazemos as considerações finais como resposta final às 
inquietações apresentada.
16 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina. 
Cora Coralina 
 
 
 
17 
 
 
 
CAPÍTULO 2 
 
METODOLOGIA: UM CAMINHO DE REGISTRO, ANÁLISE E PROPOSITIVAS. 
 
A metodologia como um caminho de registro, análise e propositivas, nos traz a 
firmeza conceitual da ciência que é vista como possibilidades que se usam para o 
desenvolvimento de conhecimento, do saber especificado, apropriado, testado e 
experimentado. Essa ciência nascida da metodologia alimentará a prática médica e a 
prática do tratamento psicanalítico nas suas dimensões emocionais. Observando 
esses fatos no Hotel da LouCura, inferimos que a ciência e os novos arranjos que 
acontecem nos espaços do tratamento das emoções alimentam a prática médica, 
estabelecendo um elo interdisciplinar ao campo das vivências humanas. 
Portanto, essa pesquisa trata de questões que são oriundas da fundação do 
“Museu de Imagem do Inconsciente”, que surgiu a partir de trabalhos realizado em 
atelier da “Seção de Terapêutica Ocupacional do Centro Psiquiátrico Nacional, sob a 
direção da psiquiatra Nise da Silveira desde 1946”. 
Nesse trabalho, a autora nos chama atenção para construção de uma 
transformação social com o uso da arte e da ciência “no Brasil na primeira metade do 
século XX que possibilitou que a ideia do inconsciente manifestado nas expressões 
artísticas fosse incorporada tanto no meio artístico quanto no científico”. Tal fato levou 
a uma transformação iniciada por Nise em uma época onde tratamentos aplicados às 
“doenças mentais eram hegemônicos” não havia interesse para desenvolver uma 
prática artística no auxilio ao tratamento psiquiátrico. Portanto, a arte ocupou o lugar, 
primeiramente destinado à ciência, de incentivar e respaldar a expressão artística dos 
alienados de Engenho de Dentro. 
Para empregar um método, um caminho metodológico que refinasse e 
chancelasse a nossa análise, fomos a campo, e sabendo que estamos no mundo de 
relações humanas cada vez mais complexificadas, fomos consolidadas e aportadas 
numa metodologia que desse conta de nossas ansiedades e refinasse e sofisticasse 
18 
 
 
 
os nossos olhares para as cenas. Nessas, as várias dimensões foram experimentadas 
com as emoções devidas aos pesquisadores. 
Pelo percurso metodológico frisamos aqui que as relações de pesquisa são 
ressignificadas e reposicionam os sujeitos que estão inseridos no campo de análise. 
O cenário estudado é o Hotel da LouCura. Cenário que antes era uma antiga 
enfermaria abandonada no terceiro andar do Instituto Nise da Silveira e se converteu 
num espaço de arte e cultura em que não se prescinde do conhecimento da ciência, 
muito antes o fortifica alimentando novas práticas que reconceituarão novos fazeres, 
regulamentando práticas mais humanizadas. 
É nesse cenário que todos os “hóspedes” são benvindos na convivência entre 
artistas, pesquisadores e médicos que ali também se “hospedam” para conviver com 
os hóspedes internos, ainda internados por problemas psiquiátricos e emocionais. 
O HL possui alguns quartos com beliches que abrigam cerca de 30 hóspedes, 
possui salas para reuniões, ateliê e biblioteca. As paredes são ornadas por poesias, 
pensamentos, desenhos, grafites, pôsteres e frases. São realizadas oficinas 
terapêuticas, organizadas em reuniões dos agentes culturais, toda a semana na 
perspectiva de fazer com que cada hóspede se sinta e seja efetivamente parte da 
sociedade, rompendo os estigmas, preconceitos e ignorâncias acerca da condição 
desses sujeitos que, pela via de suas novas relações com o outro, com a arte, com a 
cultura, com a ciência e o mundo diminuam a sua relação de dependência e prisão 
emocional. 
Vimos que por meio de uma metodologia do afeto, esses nas suas funções 
artísticas e culturais realizavam um trabalho que os apropriavam e os faziam estar 
inseridos na sociedade por via das suas percepções, visões de mundo colocadas nas 
inscrições das artes cênicas. Assim, colocamos às claras o local deestudo para a 
conquista de uma melhor saúde mental. 
Para o desenvolvimento deste estudo foi necessária uma pesquisa bibliográfica 
em livros, artigos científicos, documentos eletrônicos, entre outros na busca de 
conhecimentos sobre doenças emocionais, conceitos e histórico da ciência, cultura e 
arte além do uso das artes cênicas como experimento artístico e científico. 
19 
 
 
 
Assim, a metodologia, nos proporcionou por meio da participação o mais 
estreito entendimento da necessidade de diminuição da medicalização por via da 
ciência e da arte. Por isso, assumimos a metodologia da pesquisa participante. A 
explicativa, por sua vez, é a de que esse método identifica os fatores que colocam 
determinado fenômeno da realidade social aprofundando o conhecimento da 
realidade, da situação e do momento, explicando o porquê das coisas, explica os fatos 
de forma acadêmica. Estuda um cenário problema e através do experimento de 
tentativa e erro, identifica e explica o que contribuiu para a ocorrência do fenômeno. 
Entendemos a pesquisa participante investida nessa narrativa como um 
procedimento importante que apresenta a dimensão humana e a interlocução entre 
elas ao correr da análise de forma mais consubstanciada. De acordo com Gil (2002 
p.55) “a pesquisa participante, assim como a pesquisa-ação, caracteriza-se pela 
interação entre pesquisadores e membros das situações investigadas”. 
Assim continua Gil: 
 
A pesquisa participante, por sua vez, envolve a distinção entre ciência popular 
e ciência dominante. Esta última tende a ser vista como uma atividade que 
privilegia a manutenção do sistema vigente e a primeira como o próprio 
conhecimento derivado do senso comum, que permitiu ao homem criar, 
trabalhar e interpretar a realidade, sobretudo a partir dos recursos que a 
natureza lhe oferece. (2002 p.56). 
Desta forma, a pesquisa participante foi realizada através da integração entre 
os diversos tipos de clientes que forma o grupo que realiza atividades em conjunto, 
mantendo um diálogo que envolveu os participantes como sujeito do conhecimento. 
A abordagem do tratamento da coleta de dados da pesquisa foi qualitativa e 
buscou uma fonte direta para atribuição de significados. Foram dois entrevistados, 
funcionários do Hospital que abriga o HL e que possuem relação com ele. 
 As questões foram abertas e tentaram captar a percepção que os sujeitos da 
pesquisa tiveram em decorrência dos temas da pesquisa. Como afirma Brandão, 
buscamos trabalhar na perspectiva de que: 
20 
 
 
 
A pesquisa deve ser um ato criativo e não um ato de consumo. A descoberta 
coletiva da vida através da fala; do mundo através da palavra não deve servir 
apenas para que os educadores obtenham um primeiro fotos. Deve servir 
também para criar um momento comum de descoberta 
(BRANDÃO,1981.p.14). 
O problema foi direcionando a pesquisa para as áreas de ciência, cultura e arte 
e ainda como pesquisa participante sendo esta com análise geral sobre as opiniões 
dos sujeitos com vistas, também, aos experimentos artísticos e científicos. 
O interesse pelo tema aconteceu a partir da experiência dentro deste universo. 
Em 2013, como bolsista - estagiária nas oficinas de música no CAPS – Centro de 
Atenção Psicossocial - Lima Barreto em Bangu- RJ, que é um serviço público de saúde 
mental. Dentro da Reforma Psiquiátrica, que visa cuidar das pessoas em sofrimentos 
psíquico, fora do hospício, ou seja na convivência da família e em sociedade. Onde, 
tive a oportunidade única, de fazer parte da produção do Show “Juntos e Misturados”. 
Participando das reuniões de produção, para elaboração do projeto e roteiro das 
apresentações. Executado contatos em busca de parcerias , obtendo a cessão do 
espaço, para ensaios semanais e apresentação, confirmação de participações de 
nomes com expressões no cenário artístico brasileiro. 
Um show de variedades com teatro dança e música, cujos ensaios foram 
realizados no local da apresentação: a “Praça do Conhecimento” que aceitou fazer 
uma parceria e seus funcionários prestaram uma atenção toda especial ao grupo. 
Os preparativos se tornaram uma verdadeira produção cultural movida pelo 
amor, cujo objetivo foi á inserção das pessoas portadores de transtorno mental nos 
espaços sociais, culturais promovendo a cidadania e ressocialização onde todos 
participaram: os funcionários, os bolsistas, os familiares e os personagens principais 
desse show, os usuários. O trabalho foi realizado com administração, gestão, e 
cuidado que era revelado a cada etapa executada. 
Os usuários cantando e encenando, grupos e duplas formados por familiares, 
técnicos e bolsistas. A voz da princesa Fiona oficializava o inicio do show, com a 
presença da atriz Fernanda Crispim, dubladora oficial da personagem, seguida da 
21 
 
 
 
apresentação da “Boneca de Piche”. O teatro não podia faltar com o cara da Lapa, 
revelando como atores três usuários da oficina, outra parte teatral ficou por conta das 
garçonetes, a interpretação nesta vez ficou por conta de familiares e estagiarias. 
 Homenagem ao “velho guerreiro Chacrinha” com direito a chacretes, bacalhau, 
Luiz Gonzaga – Rei do Baião com o “ Xote das Meninas” e “Domingos e CIA“, banda 
musical, composta por usuários e familiares, que acompanhou as atrações do evento. 
Finalizando o show um grupo convidado: ”Loucura Suburbana” ao som da musica: 
“Loucos Somos Todos Nós”. 
 Valem registrar um acréscimo significativo no grupo de música dos usuários, 
assim chamados os pacientes, na oficina de música. Transformamo-nos em atores, 
diretores, produtores, figurinistas, coreógrafos, roteiristas, contras-regra e 
apresentadores para realização deste show. Maravilhoso, magnífico é pouco para 
expressar a alegria de poder participar da produção de um show de variedades, mas, 
acima de tudo de um show de valor à vida, onde juntos e misturados nos 
emocionamos, nos conhecemos e realizamos um show onde todos eram 
simplesmente seres humanos. 
22 
 
 
 
Folder do Show: Juntos e Misturados 
Figura 01 Folder/Frente 
 
 
Figura 02 / Folder/verso 
 
 
23 
 
 
 
Por fim, a metodologia empregada se consubstancia numa ciência que aqui é 
vista como processo e possibilidades que se use fortaleça o desenvolvimento do 
conhecimento, do saber especificado, apropriado, testado, experimentado. É 
importante perceber que a ciência nascida da metodologia alimentará a prática médica 
e a prática do tratamento psicanalítico nas suas dimensões emocionais. Assim, a 
ciência e os novos arranjos que acontecem nos espaços do tratamento das emoções 
alimentam a prática médica, estabelecendo um elo interdisciplinar ao campo das 
vivências humanas. 
Como estamos no mundo de ciência e dinamicidade dela, as relações 
produtivas estabelecidas nas instituições são ressignificadas e reposicionam os 
sujeitos que estão inseridos no campo vivencial. Os hóspedes do HL tem nas suas 
funções artísticas e culturais o trabalho que os apropriam e os fazem estar inseridos 
na sociedade. 
A metodologia, sobretudo as que se pretendem participativa e/ou participante, 
pode, por meio do registro e da participação, auxiliar no pensamento que constitui 
maior capacidade do agir dos sujeitos da pesquisa com autonomia, como sujeito livre 
capaz de escolher seus próprios fins. Pessoas morais livres, porque as escolhas 
significam que somos sujeitos soberanos e livres, ação forte e inspiradora nessa 
máxima de tratamento que tem a tríade ciência cultura e arte como laços que vão 
formar as novas identidades sociais dos hóspedes do HL. 
 
 
 
 
 
 
 
 
24 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para 
reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e 
está em todas. 
Como o panteísta se sente árvore (?) e até a flor, eu sinto-mevários seres. 
Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente, como se o meu ser 
participasse de todos os homens, incompletamente de cada (?), 
por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço. 
 
 Fernando Pessoa 
http://pensador.uol.com.br/autor/fernando_pessoa/
25 
 
 
 
CAPÍTULO 3 
BREVES CONCEITOS ACERCA DA CIÊNCIA, DA CULTURA E DA ARTE. 
 
3.1. Ciência na sua base 
Um dos conceitos considerado mais abrangente da ciência é o de Ander-Egg 
(1978. p.15), em que diz que “A ciência é um conjunto de conhecimentos racionais, 
certos ou prováveis, obtidos metodicamente, sistematizados e verificáveis, que fazem 
referência a objetos de uma mesma natureza”. 
Fala, ainda, da relação entre ciência e conhecimentos que pode ser de forma 
ampla ou uma maneira mais particular. Como é sabido, desde o começo dos tempos, 
o homem busca interpretar o mundo e busca explicação dos acontecimentos do seu 
dia á dia, onde o conhecimento é adquirido através de estudos que juntos a métodos, 
traz interpretações e possíveis resultados. Por via do empírico e dos experimentos 
nasce o que conhecemos por ciência 
De acordo com Trujillo, (1974). ( Aput, MARCONI e LAKATOS, 1991.p.80 ): 
“A ciência é todo um conjunto de atitudes e atividades racionais, dirigidas ao 
sistemático conhecimento, com objetivo limitado, capaz de ser submetido à 
verificação”. 
A ciência pode se considerada como fruto de uma metodologia que trata de 
estudar os fenômenos que há entre o céu e a terra. De uma forma mais ampla e por 
muito tempo a ciência também expressa à necessidade da resposta de um problema 
que possui sua hipótese e método de análise reconhecidos. 
Há também uma argumentativa de que ao tentar entender o sentido do mundo 
estamos fazendo ciência. Desde a antiguidade, quando a ciência era conhecida como 
filosofia natural o método empírico era a primeira base. O que se produzia como 
26 
 
 
 
ciência na Idade Média era limitado às investigações da Igreja Católica, onde o 
conhecimento era produzido por meio da filosofia. 
No Renascimento, a revolução científica trouxe novas ideias e modificações 
dos conceitos sobre a Natureza, o Homem e o Universo. Na Ciência Moderna se 
considerava como ciência o que era traduzido em racionalismo, por via dos 
experimentos, ou seja, quantificável como científico, tendo o método próprio para 
chegar a uma realidade absoluta. Esta visão racional provocou o isolamento dos 
grandes cientistas em laboratórios na busca de respostas exatas. Analisando o 
Universo como uma máquina, em comparação ao funcionamento dos relógios a 
ciência moderna prosseguiu. Mas, quando teve seus conceitos submetidos à prova, 
não resistiram. Chegamos assim a uma crise, que a partir de Albert Einstein, cria-se 
e fortalecesse nova teoria. Nessa nega-se, assim, a existência de tempo e espaço 
absolutos. 
Em resposta a esta crise surge um novo movimento científico, que passa a 
utilizar diversos métodos para o estudo de fenômenos, já não considerando a 
separação do objeto e do sujeito, passando a pensar que o objeto é uma continuidade 
do sujeito, admitindo-se que não existem verdades absolutas, onde podemos 
considerar as incertezas como um elemento de entendimento para o estudo do 
mundo. Chegamos a uma Ciência contemporânea ou Nova Ciência que, segundo 
Santos (1988), configura-se numa ciência pós-moderna. Assim, 
 A ciência pós-moderna é uma ciência assumidamente analógica que 
conhece o que conhece pior através do que conhece melhor. Já mencionei a 
analogia textual e julgo que tanto a analogia lúdica como a analogia 
dramática, como ainda a analogia biográfica, figurarão entre as categorias 
matriciais do paradigma emergente: o mundo, que hoje é natural ou social e 
amanhã será ambos, visto como um texto, como um jogo, como um palco ou 
ainda como autobiografia. (p. 46) 
O autor nos faz refletir a respeito da identidade da ciência moderna que dá 
oportunidades de experimentos. Assim como foi possível descobrir as ciências 
naturais seria possível descobrir as ciências sociais como uma forma de ampliar as 
ciências naturais. De tal modo, continua Santos (1988, p.46), “Jogo, palco, texto ou 
27 
 
 
 
biografia, o mundo é comunicação e por isso a lógica existencial da ciência pós-
moderna promover a situação comunicativa". 
Temos nas analogias uma forma de codificação na qual se tem questionado, 
experimentado, descoberto, para que a humanidade entenda melhor o mundo em que 
vive sobre pontos de vista diferentes, vivendo uma época criativa e produtiva em 
busca de soluções para problemas propostos. Sendo, a ciência elemento de 
descoberta e reposição dos sujeitos no mundo. É campo de dinamicidade, mudança 
e de novas configuração. Por isso não é estanque, imutável e reta. Necessita, assim, 
de vários veículos para que se mantenha no campo da constante transformação 
humana. A poesia pode ser um dos seus veículos na transcrição da arte. 
 
3.1.1 A poesia e a ciência: um veículo da arte 
Moreira (2002.p.17) assinala que: “Ciência e poesia pertencem à mesma busca 
imaginativa humana, embora ligadas a domínios diferentes de conhecimento e valor.” 
Só que a ciência faz essa busca através de métodos científicos com seu conjunto de 
regras produzindo conhecimentos, a poesia pelo contrário. Seu lado é onde o poeta 
faz uso de um método próprio que o incentiva a falar de seu mundo para o mundo, 
que não lhe dá a lógica das certezas ou refutações, mas um constante caminhar nas 
dúvidas. Segue Moreira: 
 A visão poética cresce da intuição criativa, da experiência humana singular 
e do conhecimento do poeta. A Ciência gira em torno do fazer concreto, da 
construção de imagens comuns, da experiência compartilhada e da 
edificação do conhecimento coletivo sobre o mundo circundante. (2002.p.17). 
Poesia faz parte do mundo da emoção, a ciência do mundo da razão. Temos 
na poesia a forma de relatar momentos íntimos, momentos singulares de experiência 
poética que libertam com o uso das palavras e das construções das ideias. Sendo 
estas as matérias primas dos poetas, mesmo quando rompem com as normas da 
gramática, porém com estética que a obra exige. No texto científico, a preocupação 
fica por conta da forma tradicional da gramática sem efeito emocional. Mas, tanto a 
28 
 
 
 
poesia, quanto a ciência, inicia com o pensamento, promovendo ao homem asas para 
voar. 
Pelo meio da poesia as raízes para o conhecimento são formadas. Poesia para 
demonstrar sonhos, ciência para estudar a realizações dos sonhos. Em Moreira: “As 
aproximações entre Ciência e poesia revelam-se, no entanto, muito ricas, se olhadas 
dentro de um mesmo sentimento do mundo.” É esse sentimento de curiosidade e 
intensidade que envolve as duas na singular necessidade de descobertas e 
pronunciamentos da escrita. 
 
3.2. Enunciado sobre cultura 
Começo este conceito com uma definição de cultura, no entanto há um leque 
de opções, tornando uma definição exata de cultura como algo difícil a se concluir, a 
se fazer e colocando o tema sempre num campo grande de visões. A origem da 
palavra Cultura segundo o que Bosi (1992), vem do latim, da palavra colo e significa 
cultivar no sentido de agricultura “cultura do campo”, é um termo que nos leva a pensar 
em futuro, algo que estar por acontecer. Essa ideia caminhou até que outro fenômeno 
urbano aconteceu. 
Nesse, não poderíamos deixar de lembrarmos a importância da cultura grega 
para o desenvolvimento cultural. Os gregos usavam a palavra “Paideia” para definir 
conhecimentos, os romanos por sua vez não queriam usar este termo por ser uma 
palavra estrangeira. Assim traduziu por cultura, ampliando o significado de material 
para intelectual. 
 Partindo da consideração de cultura como o que é culto, encontramos as artes, 
os conhecimentos, os costumes, as aptidões, os hábitos, a moral e as leis, ou seja, 
consideramos o que a esses pontos está ligado e faz parte da formaçãode uma 
sociedade. Cada lugar tem sua própria cultura que sofre influência em vários fatores. 
Estando a Cultura, em constante desenvolvimento, com influências de novos 
29 
 
 
 
pensamentos de acordo com o desenvolvimento do ser humano dentro da sociedade, 
trazemos em autores alguns conceitos de cultura. De acordo com Brandão: 
... cultura é e está, portanto, nos fatos através dos quais nos apropriamos do 
mundo natural e o transformamos em um mundo humano, assim como nos 
gestos e nos feitos com que nós criamos a nós próprios ao passarmos de 
organismos biológicos a sujeitos sociais, ao criamos socialmente nossos 
próprios mundos e ao dotá-los e a nós próprios-nossos diversos seres, 
nossas múltiplas vidas e nossos infinitos destinos... (2009, p.718). 
Para Brandão, o ser humano precisa criar e recriar o mundo, transformando-o. 
Desta forma do mundo da natureza para um mundo cultural há análises diferenciadas 
e trabalhos diversificados. Cultura é criação, o homem não só vive somente da cultura 
herdada, com o que apreende com seus antepassados, mas, sobretudo porque é 
também um ser criativo. 
Laraia (2001, p.30), quando fala a respeito do desenvolvimento da cultura 
afirma que “A cultura desenvolveu-se, pois, simultaneamente com o próprio 
equipamento biológico e é, por isso mesmo, compreendida como uma das 
características da espécie”. 
Nem sempre temos certeza se as nossas escolhas são as melhores, isto se faz 
presente na nossa cultura principalmente na antropologia moderna que tem como uma 
de suas missões é reconstruir conceitos de cultura por conta das suas variáveis 
reconstruções. Com afirma Laraia (2001:280) 
Uma das primeiras preocupações dos estudiosos com relação à cultura 
refere-se a sua origem. Em outras palavras, como o homem adquiriu este 
processo extra-somático que o diferenciou de todos os animais e lhe deu um 
lugar privilegiado na vida terrestre? 
O assunto relacionado a conceitos antropológico sobre cultura é nada mais 
nada menos do que tema principal no último século. Assunto este que se apresenta 
de forma investigável referente ao conceito de cultura. 
De acordo com Da Matta (1981.p.02), “quando um antropólogo social fala em 
cultura, ele usa a palavra como um conceito-chave para a interpretação social”. Assim 
30 
 
 
 
sendo, a cultura pode ser analisada por vários aspectos, segundo o objeto e objetivo 
que se pretende debruçar. 
Existem estudos que trabalham a cultura sem levar em conta os conceitos 
sobre cultura, nas dimensões antropológicas e sociológicas. O que nos soa como algo 
que ficará partido numa análise mais sistêmica e definidora do campo conceitual de 
cultura. 
Neste momento apresentamos um conceito que nasce dentro de uma proposta 
maior de contextualização. É a definição da Unesco - Organização das Nações Unidas 
para a Educação, Ciência e Cultura. Em sua Declaração a Unesco, reafirma: 
Cultura deve ser considerada como o conjunto dos traços distintivos 
espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam um grupo 
social ou uma sociedade que se abrange, além das artes e das letras, os 
modos de vida, as maneiras de viver juntos, (UNESCO 2002, p.2). 
A cultura é um conjunto de símbolo e valores que dá sentido a um grupo social 
que pode ter como referencias o desenvolvimento social e desta forma interfere e cria 
expressões culturais e suas múltiplas dimensões. Para Da Matta (1981.p.02) ela é: “... 
um mapa, um receituário, um código através do qual as pessoas de um dado grupo 
pensam, classifica, estudam e modificam o mundo e a si mesmas. ” 
Pensemos em cultura não apenas com seus diversos conceitos, mas como algo 
que faz parte do universo de grupos diferenciados com seus saberes que podem ser 
intelectuais, costumes, artísticos, afinal nossos aprendizados começam a partir da 
convivência de um com o outro, na troca de olhares e observação, como confirma 
Freire (2001.p.259) “É que não existe ensinar sem aprender e com isto eu quero dizer 
mais do que diria se dissesse que o ato de ensinar exige a existência de quem ensina 
e de quem aprende.” 
Ninguém é tão infante que não tenha nada para ensinar, nem tão adulto que 
não tenha nada para aprender. Mesmo hoje no mundo de tecnologia a necessidade 
do ato de ensinar. Ensinar é uma missão dos adultos e aprender a necessidade dos 
infantes que juntos formam uma comunidade, um grupo, onde aluno é professor e 
31 
 
 
 
professor é aluno ambos intermediados pela cultura da liberdade de pleno ser para de 
si saber. 
É nessa perspectiva do conhecer que a ciência é mais profundamente pensada. 
E surge uma pergunta: “Quais são os usos sociais da ciência? “ Essa é uma das 
perguntas que Pierre Bourdieu (1997.p.17-29), faz em seu trabalho “ Os usos sociais 
da ciência”. E é nesse uso social que questões temáticas como a desse trabalho, 
ganha profundidade. É por conta dessas apropriações que outras discussões a 
respeito dos diversos papéis da ciência, diante da sociedade são realizadas. 
Bourdieu (1997) levanta a discussão que acontece em torno da noção de 
campo cientifico, que, de acordo com o autor se aplica no “universo intermediário entre 
autonomia total e submissão às leis sociais”, desta forma a aplicação da ciência em 
campo acontece com características políticas, ligada aos atos institucionais e ao poder 
específico com uma variação de acordo com a posição do sujeito e sua influência no 
campo de atuação. 
Fazendo uma reflexão a respeito do uso social da ciência, Bourdieu (1997) 
apresenta uma teoria sobre noção de campo de atuação na produção e reprodução 
da “ciência, da arte, da literatura, etc”. Para um grupo de pensadores ao interpretar 
um texto, se determina, ao mesmo tempo em que se compreende a produção cultural 
com uma determinada autonomia, apresentando uma visão semiótica em relação à 
ciência. Sendo o texto o único instrumento de conhecimento em qualquer campo da 
ciência, transmite uma teoria de que a ciência é uma instituição sem interferências 
externas. 
Um segundo grupo de pesquisadores defende a teoria da necessidade 
introduzir o texto em um contexto social. A maioria defende a ideia da interpretação 
dos textos com a realidade seja de um mundo social ou com o mundo econômico 
O texto perfaz um caminho que integra o fazer cientifico e artístico como 
linguagem humana. 
32 
 
 
 
Bourdieu nos faz viajar por um universo intermediário onde esse universo é 
formado por produtores e difusores do conhecimento ao qual o autor chama de 
“campo literário, artístico, jurídico ou cientifico.” E nessa viagem o autor nos apresenta 
uma estrutura social como o campo científico que determina certo grau de autonomia 
com o meio, onde uma ciência possa gozar de uma liberdade relativa sobre pressões 
externas que venha sofrer a respeito do que se pesquisa e do que se publica. 
Na ciência e no campo científico, existem forças e lutas que podem ser 
transformadas ou conservadas. A partir daí, Bourdieu reflete as questões politicas e 
econômicas e sua influencia no capital científico, conferindo ao pesquisador um 
reconhecimento de quem tem mais autonomia por quantidade e qualidade da 
produção científica. 
Sendo o campo científico um objeto de luta, o autor faz uma comparação dessa 
luta a um jogo onde suas práticas têm sempre como alvo a autoridade e prestígio. 
Seguindo uma ética profissional um problema é com regras elaboradas nesse jogo, 
que está sempre de acordo com o jogador que está no poder, gerando assim uma 
disputa desigual, dessa forma os sujeitos fazedores do mundo estão sempre 
contagiados pelo percurso de suas vidas. 
Bourdieu afirma que existem duas formas de capital científico, uma ligada aos 
cargos e posições que é o capital politico, o outro um capital científico puro que é o 
prestígio através do reconhecimento acadêmico, no entanto, o autor considera muito 
difícil reunir esses dois tipos de capital. O capital científico requerolhares humanos, 
não prescinde dele, assim no campo da análise, se torna extremamente particular 
para que se adquiram os traçados do conhecimento. E é justamente nessa 
interlocução que as compreensões dos fenômenos humanos, naturais e sociais 
acontecem à bem da sociedade, a bem da inclusão, a bem do humano na sua arte e 
cultura. 
3.3. Arte e cultura 
Sendo a arte um campo tão amplo, será possível definir o que é arte? Segundo 
a revistaliteraria.com.br, “a palavra arte vem do latim e significa; técnicas e habilidades 
33 
 
 
 
para valores estéticos”, que tem diversas representações, seja através da música, da 
pintura, da dança, no teatro, no audiovisual, da literatura, da poesia. 
A Arte está para estética, assim como o artista está para o público. A estética 
está ligada à beleza para representar um mundo inspirador. O artista demonstra com 
suas emoções e ideias um saber diferenciado em cada obra que apresenta ou 
representa ao seu público. 
Segundo Coli (1995.p.8) “...artes, são certas manifestações da atividade 
humana diante das quais nosso sentimento é admirativo, isto é, nossa cultura possui 
uma noção que denomina solidamente algumas de suas atividades e as privilegia.“ 
A arte pode ser vista sempre como uma relação entre o mundo e o ser humano; 
o fazer e a transformação; a realidade e o conhecimento, transformando em atividades 
representativas através do fazer artístico. 
No decorrer da sua história a arte vem ganhado espaço para experimentos e 
pesquisas através das quais podemos discutir e interpretar o próprio mundo que 
vivemos. A partir daí, as necessidades de ações inovadoras do campo das artes é de 
extrema importância para que trabalhos em instituições que tem como aporte as 
emoções e cognições se fazem cada vez mais relevantes. 
Portanto, compreender a arte como uma área de conhecimento, como social, 
histórica e cultural é trazer a arte para o domínio da cognição. Nessa direção, 
o conceito de arte também está ligado à cognição como um dos elementos 
de manifestação da razão, pois existe na arte um conhecimento estruturador, 
que permite a potencialização da cognição. (SILVA; ARAÚJO, 2007.p.11) 
Viajar pela história da arte é ter contato com um dos aspectos mais relevantes 
da produção humana, em que os experimentos e encantamentos nos despertam 
emoções, através das quais podemos construir uma visão mais ampla em um 
processo cultural, criando espaços para manifestações das artes em busca de 
desenvolvimento sociais. 
É importante criarmos espaços e afirmarmos esses espaços que consolidam 
as manifestações de arte como uma linguagem para tecer cidadania, saúde, lucidez, 
34 
 
 
 
tranquilidade. Por sermos seres criativos temos na arte uma maneira de nos 
expressar. 
Ao olharmos a nossa volta nos deparamos com inúmeros objetos que facilitam 
as nossas tarefas diárias. Elementos que foram produzidos pela humanidade ao logo 
da história da vida. Entre estes objetos se encontram diversos artefatos que já foram 
utilizados em um determinado tempo. Objetos estes não apenas para nos servir, mas 
também para expressar nossos sentimentos em relação à vida, os quais podem 
nomear de obras de arte. São nessas expressões que os clientes e/ou hóspedes 
encontram pontos de apoio, solidez de trabalho, maiores terrenos de expressão e 
articulação das suas emoções com fazeres que solicitam sua criatividade, sua 
estética, reconhecendo singularidades sem hierarquizações ou estigmas sociais. 
Assim, Cauquelin questiona: se lançarmos um olhar no passado e trazer um 
significado para o presente, usando novos suportes, estaremos aplicando uma arte 
contemporânea? 
A arte contemporânea é sua imagem. Esse espelho oferecido aos artistas e 
no qual eles podem perceber o conjunto - o sistema - do mundo artístico 
contemporâneo reflete a construção de uma realidade um tanto diferente de 
que existia há algumas décadas. (CAUQUELIN, 2005,p.80-81) 
A representação acontece desde a pré-histórica, e ela foi e é uma forma de 
manifestação artística. Quando os homens pré-históricos representavam, cenas de 
caçar, quando um era o caçador e outro se colocava no lugar da caça, era uma 
maneira, mesmo sem saber que estavam dando inicio as artes. De acordo com 
Martins (2010, p.30) 
As imagens retidas nas paredes da caverna revelam um conhecimento que o 
homem construiu daquele mundo. [...] apropriou-se simbolicamente daquele 
mundo, capturando na representação visual algo que era dos animais 
selvagens, dando-lhes novos significados em formas simbólicas. 
A arte pode ser pensada como uma maneira de expressão da humanidade. Na 
antiguidade a arte rupestre foi uma das formas de expressão que registra em paredes 
das cavernas a história de um grupo. Os desenhos eram uma forma de manifestação 
35 
 
 
 
da própria vida criando arte. Essa inscrição atravessou vários períodos com estilos 
diferentes, chegando à arte moderna com todas as suas transformações e 
modificações. 
Desde seus primórdios, a arte transmitiu emoções, manifestando o que o 
homem possui de mais humano, estético e criativo. A arte, por meio das histórias, 
livros, esculturas imortalizou pessoas e fatos. Isto nos mostra que nos expressamos 
por diversas linguagens, principalmente, pelas diferentes representações das artes. 
Em Martins (2010, p.12) a seguinte afirmação se faz bastante emblemática: 
“Por ser um conhecimento construído pelo homem através dos tempos, a arte é um 
patrimônio cultural da humanidade, e todo ser humano tem direito ao acesso a esse 
saber”. 
A arte reconhecida como patrimônio cultural da humanidade, nos faz um 
convite para um mergulho em novas vivências e novos sentimentos, rumo a diversas 
possibilidades de autoconhecimento. Assim, continua Martins (2010, p.13) 
É por meio delas que poderemos compreender o mundo das culturas e o 
nosso eu particular. Assim, mais fronteiras poderão ser ultrapassadas pela 
compreensão e interpretação das formas sensíveis e subjetivas que 
compõem a humanidade e sua multiculturalidade, ou seja, o modo de 
interação entre grupos étnicos, em sentido amplo, entre culturas. 
No entanto, no que se refere à arte, podemos usar e criar diferentes espaços 
para o desenvolvimento das diversas linguagens em busca de novos conhecimentos 
para o bem social e humano. É nessa lógica e sentimento que a arte, como condutora 
e veículo de liberdade e saúde deve ser trabalhada junto aos sujeitos que se 
encontram em instituições de tratamento de saúde mental. 
A arte e a ciência possuem um ponto de encontro. A arte representada através 
da criatividade e interpretação é catalisadora da ciência, representada pelos 
conhecimentos. 
Mas, em que pese a concorrência entre ciência e arte, arte e ciência, as duas 
buscam através da criatividade e curiosidade o sabor do experimento em busca de 
36 
 
 
 
um novo fazer artístico e científico onde ambas são imersas de cultura, vida e gente 
que mobiliza e transforma o mundo, unindo as pontas. 
 
 
 
37 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Olha pra mim e me ama 
Não 
Tu olhas pra ti e te amas 
É o que está certo 
Clarice Lispector 
 
 
38 
 
 
 
CAPÍTULO 4 
ABORDANDO AS ARTES CÊNICAS NO TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO – 
 A SAÚDE COMO ELEMENTO DE LIBERDADE 
4.1 Artes cênicas e tratamento psiquiátrico: um encontro entre Boal e Nise 
 As artes cênicas são também conhecidas como performance, podendo ser 
apresentada em um palco, espaço onde se realiza uma representação, pode ocorrer 
em uma praça, na rua, em clubes, em jardins até mesmo em casa e por que não em 
um hotel? 
De acordo com Peixoto (1986, p.12) “o palco, ou seja, qual for o espaço de 
representação, estabelece, em nível de razão e emoção, uma reflexão e um diálogo 
vivo e revelador com a plateia”.A arte cênica não se detém a um espaço, acontece através dos sons e até 
mesmo do silêncio, onde existe uma integração do ator com a plateia em um espaço 
próprio ou alternativo. 
Qual é o verdadeiro instante do nascimento do teatro? Continua Peixoto (1986, 
p.15), “na verdade, o teatro nasce no instante em que o homem primitivo coloca e tira 
sua máscara diante do espectador”. O teatro brasileiro surgiu em “nosso processo 
civilizatório”. O teatro, a arte cênica se verga para a representação das cenas 
humanas, se verga para a interpretação. 
 A arte cênica é tão antiga quanto à humanidade. Ela existe a partir do momento 
em que o homem primitivo começa a imitar o mundo em sua volta usando uma forma 
de expressão através da interpretação, da música e da dança. 
Segundo Boal (2009, p.11), “Atores somos todos nós, e cidadão não é aquele 
que vive em sociedade: é aquele que a transforma”. Atualmente nos encontramos com 
diversas formas de representações que nos levam a conhecer experiências 
fantásticas que nos fazem pensar como a arte cênica pode contribuir para diversas 
39 
 
 
 
áreas sociais, onde o poder criador se faz presente, seja por via da arte ou por via da 
ciência. 
 Continua Boal, “Vendo o mundo além das aparências, vemos opressores e 
oprimidos em todas as sociedades, etnias, gêneros, classes e castas, vemos o mundo 
injusto e cruel. Temos a obrigação de inventar outro mundo”. E a arte recoloca a cena, 
reconstrói na cênica um sonho, uma reflexão do existir. 
Boal, em 2009, foi nomeado “Embaixador Mundial do Teatro”, foi o criador do 
“Teatro do Oprimido”, criação esta que o tornou conhecido internacionalmente como 
um condutor de transformação social, e é nesse contexto ao qual aborda a arte cênica, 
como transformadora social no cuidado com outro, amenizando os efeitos das 
doenças emocionais. Isso vem acontecendo no Hotel da LouCura na proposta de 
uma equipe comandada pelo Médico-ator Vitor Pordeus, que está usando as artes 
cênicas como uma forma de descontruir o manicômio. Como afirma Boal: “É uma 
forma de fazer política sem ser política partidária”. 
Mais do que um discurso antimanicomial o que podemos ver no espaço do 
Hotel da LouCura, criada por via das artes cênicas, é um ar de otimismo e grande 
entusiasmo invadindo o espaço em forma das artes, com uma prática do cuidado sob 
um olhar atento da equipe que trabalha com o intuito de amenizar as dores 
emocionais. 
É quando a arte, se apresenta em forma de poesia, dança, interpretação, que 
o teatro, formado na arte cênica, cuida, cura, que LouCura, “loucamente” 
propositadamente liberta. 
É no contexto de catalisar da liberdade e do tom à dignidade àqueles que 
confinados e presos estavam nos manicômios que Nise da Silveira, idealizadora de 
um trabalho novo e recente no Brasil, insere as artes como uma das propulsoras do 
tratamento humanizado. Ela nos traz uma experiência que uniu a ciência, na arte e a 
loucura, na qual se constatou a arte dos loucos. Esta experiência, introduzida como 
parte da história da psiquiatria no Brasil dá novo rumo às visões artísticas, históricas 
e culturais, ampliando a relação entre pacientes, instituição e sociedade. 
40 
 
 
 
Dias (2003) nos leva há conhecer um pouco mais o trabalho desenvolvido por 
Nise, que unindo as pontas entre ciência e artes cênicas. Nise, mesmo sendo uma 
psiquiatra com reconhecimento dentro da história da psiquiatria do Brasil, não deixou 
de receber críticas a respeito de seus trabalhos desenvolvidos da área da terapia a 
respeito da “loucura”, o que levou a psiquiatra ser conhecida e reconhecida como “a 
psiquiatra que tratou a loucura com afeto”. Recebeu críticas que poderiam ter levado 
à desconstrução da sua história, dentro da psiquiatria do Brasil. 
Como afirma Dias (2003, p.13), “A coexistência de críticas e exaltações à Nise 
da Silveira abriu a possibilidade de desconstrução do mito em torno de uma 
personagem consagrada na história da psiquiatria brasileira”. 
Trazemos Nise a essa visão particular, porque nela encontramos um aporte 
para que a arte fosse entendida como numa estratégia de cura e porque não de 
reposicionamento desse sujeito “paciente” no mundo em que ele, pela arte se 
encontra na condição de um fazer que o tornasse autônomo. A psiquiatra, 
inegavelmente, causou mudanças no mundo da pesquisa relaciona a arte à terapia 
no auxilio e na busca de amenizar os efeitos das doenças emocionais, através de 
experiência realizada na década de 40, com situação e território tão novo para as 
ações dos tratamentos psiquiátricos. 
Dias (2003, p.15-16) aponta outros experimentos artísticos no Brasil dentro da 
psiquiatria acontecido antes de1940, tal qual como Osório Cesar, psiquiatra do 
Hospital de Juqueri, em São Paulo, que publicou o seu primeiro livro sobre a 
expressão artística dos alienados em 1929. E assim prossegue “desde1923, ainda 
como estudante interno daquela instituição, Osório Cesar já se interessava naquilo 
que poderia significar as artes dos alienados”. Em comparação aos experimentos de 
Nise que ocupa o lugar de pioneira “da psiquiatria brasileira”, Dias (2003, p.138) 
relaciona o episódio ao empenho diferenciado da psiquiatra. Em outro momento a 
autora confirma: “Portanto, de acordo com a imprensa paulista, a diferença entre os 
serviços coordenados por Nise da Silveira e Osório Cesar estaria - nos próprios 
méritos artísticos dos alienados de Engenho de Dentro.” Continua DIAS (2003, p.138) 
41 
 
 
 
“Além da própria visão da psiquiatra do Rio de Janeiro, para quem a arte era um meio 
de revelação do inconsciente e, por isso mesmo, era um meio de cura das doenças 
mentais e de investigação do processo psicótico.” 
No percurso histórico de Nise, na década de 50 vemos acontecer a 
transformação de ateliês de pinturas, em um museu. Por isso, trazer Nise e Boal para 
o tratamento psiquiátrico apoiado nas artes, nos revela o poder de ligar “arte, loucura 
e ciência. ” 
4.2. Arte, tratamento, inconsciente, saúde e loucura: um passeio em Nise 
Dias (2003), ao falar de arte, tratamento, inconsciente, saúde e loucura iniciam 
com uma informação a respeito de uma publicação do ano 1949, do crítico de arte 
Antônio Bento, denominada “A Arte e o Inconsciente”, na qual a autora considera as 
palavras do crítico de caráter esclarecedor. A trazemos para esse contexto: 
 Já se sabe a importância do papel que o inconsciente representa na arte 
moderna. Aliás, isso não acontece apenas nos domínios da literatura e das 
artes plásticas. Na filosofia como nas concepções políticas, as forças 
irresistíveis do inconsciente derrubaram a razão de seu pedestal. O apreço 
dado, nesta primeira metade do século, às doutrinas de Freud veio 
demonstrar que a ciência hoje já não acredita no mito do homem governado 
pela razão. Aliás, na filosofia esse movimento não é novo. Possui raízes 
antigas, tendo começado a ampliar-se depois de Schopenhauer e Nietzsche. 
(...) Essa verificação é talvez a maior contribuição dos tempos modernos à 
cultura, que deverá, possivelmente, se orientar para um humanismo 
irracionalista, em oposição ao humanismo da Renascença glorificador 
incondicional da suposta grandeza e dos poderes onipotentes da razão. Era 
natural, diante disso, que na arte moderna dominassem também as forças do 
irracional. E foi isso exatamente o que aconteceu. Daí, o interesse que os 
críticos e os artistas mais conscientes dos 20 problemas estéticos emprestam 
aos desenhos das crianças e dos alienados. (BENTO apud DIAS: 2003, p.18) 
 
 A autora traz a estimativa “entre arte e loucura”, e afirma : 
A aproximação entre arte e loucura será, então, analisada considerando-se a 
apropriação do conceito de inconsciente, postulado por Freud na virada do 
século XIX para o século XX, e utilizado por intelectuais, médicos e artistas 
ambientados na cultura ocidental.( DIAS: 2003, p. 20) 
42 
 
 
 
De modo brevee conclusivo a idealização de Nise da Silveira, consiste em um 
caminho encontrado entre a arte e ciência, loucura e psiquiatria, numa terapêutica. 
Dias (2003) nos acaricia com a história contada por Nise da Silveira (1996, p.38) a 
respeito da terapia ocupacional nos anos 40, onde nos é informado sobre a existência 
de um “setor de praxiterapia” isto “na Colônia Juliano Moreira” em meio a tanta 
arbitrariedade nos hospitais que compunham “Centro Psiquiátrico Nacional em 1944”. 
Seguindo ainda de acordo com Nise, “quem primeiro introduziu a terapêutica 
ocupacional no CPN foi o Dr. Fábio Sodré, em 1944, na seção Waldemar Schiller, do 
Hospital Pedro II (HP)”. Nesta ocasião Nise colaborou com o Dr. até o momento da 
transferência do médico, quando Nise é convidada para organizar algumas atividades 
ocupacionais, no início da década de 1950, na Seção Terapêutica Ocupacional. 
Dias nos leva ao conhecimento de estudos realizados por Melo (2001), Gulla 
(1996), Bezerra (1995), que salientaram tanto o merecimento quanto o empenho de 
Nise de Silveira para com obtenção do êxito que os experimentos realizados em 
Engenho de Dentro tiveram. A autora ressalta “a importância desse momento, pois 
para eles foi aí que iniciou a querela de Nise da Silveira com a psiquiatria tradicional”. 
Como diretora da “Seção de Terapêutica Ocupacional”, Nise implantou uma 
metodologia revolucionaria e inovadora que “foi destacada por Bezerra (1995, p.158) 
como um mundo totalmente ignorado pelos médicos”. A autora continua a falar através 
de Nise: “De acordo com Nise da Silveira (1994, p.13), mais que quaisquer outras 
atividades, a expressão livre através do desenho, pintura e modelagem revelou-se de 
grande interesse científico por permitir melhor acesso ao mundo interno do 
esquizofrênico”. Dento deste contexto a autora (p.57) faz a seguinte pergunta “Como 
era possível que esquizofrênicos crônicos, após longos anos de internação, 
manifestassem intensa exaltação da criatividade?” E nos responde pela fala de Gullar 
(1996, p.20), a produção naqueles ateliês surpreendeu não apenas pela grande 
quantidade (o que refletia o interesse dos pacientes por essas atividades) como pelo 
poder expressivo e mesmo artístico das obras. 
43 
 
 
 
Segundo Dias (2003, p.100): “Tanto para Osório Cesar quanto para Nise da 
Silveira a “inspiração artística” vinha das mais profundas camadas do inconsciente.” 
A autora segue relatando pensamentos de Nise e Osório a respeito da inspiração 
artística. “Segundo Osório Cesar (1951, p.54), a inspiração artística podia ser atribuída 
a uma espécie de visão interior do artista como se este estivesse sonhando acordado”. 
Estando de acordo com Nise da Silveira (1949) que também apontou semelhanças 
entre a experiência vivida nos sonhos, nos delírios e nas manifestações artísticas. 
4.3 O interno, o cliente e o hóspede: o que fala a literatura 
Iniciamos este subcapítulo com os estudos de Goffman (1974) acerca dos 
manicômios, prisões e conventos que carregam o mesmo estigma das prisões. O 
autor escreve sua obra como resultado de uma pesquisa que teve seu início através 
de um trabalho de campo realizado por um período de um ano em um hospital em 
Washington, objetivando, no primeiro momento, perceber o “mundo social dos 
internos” nesse tipo de instituição para doentes mentais. É aí que nas raízes desse 
elã buscamos a proximidade de nossa temática com o que o autor contribui como 
referência de nossa análise, ou seja, as instituições de saúde mental. 
Goffman (1974), acreditando que pessoas aprisionadas estabelecem uma 
visão particular em relação à vida e a aproximação com o outro, nos faz ver que essa 
é uma maneira de adquirir conhecimento a este mundo particular. Obteve por via dos 
“dados etnográficos” sua inclusão no mundo dos internos. E como observador 
concluiu suas críticas a partir de uma análise sociológica, dando um rumo 
completamente interdisciplinar e dialogal à questão dos limites institucionais e da 
formação desses limites nas categorias humanas: loucos, presos e celibatários. 
O autor apresenta em quatro artigos a sua análise do enclausuramento 
institucional. Assinala nas características das instituições totais o que é viver dentro 
de tais instituições, utilizando como exemplos os “hospitais para doentes mentais e 
prisões” que encarceram e estigmatizam ao invés de libertar quem já está oprimido, 
por sua condição, carrega elementos dessa prisão. O estudo do autor nos apresenta 
resultados sobre conceitos de instituição total, tal qual como: 
44 
 
 
 
 Uma instituição total pode ser definida como um local de residência e 
trabalho ante um grande número de indivíduos com situação semelhante, 
separados da sociedade mais ampla por considerável período de tempo, 
Ievam uma vida fechada e formalmente administrada.” (GOFFMAN,1974, 
p.11) 
 
 Para Goffman (1974, p.16), “Toda instituição conquista parte do tempo e do 
interesse de seus participantes e lhes dá algo de um mundo; em resumo, toda 
instituição tem ·tendências de fechamento”. Essas instituições tem uma maneira 
fechada de funcionar, excluído o internado do seu mundo original, com a intenção de 
uma integração total aos ensinamentos internos. Mesmo que a proposta seja 
libertária, contra hegemônica e excludente, ainda assim, existe um mecanismo, que 
limita o contato entre o internado e o mundo exterior, trazendo assim resultados na 
estrutura do interno participante à organicidade da instituição que o “molda” nos 
padrões adotados pelas instituições. 
Dentro do contexto apresentado acima, Goffman (1974:17) acredita que: “Uma 
disposição básica da sociedade moderna é que o indivíduo tende a dormir, brincar e 
trabalhar em diferentes lugares, com diferentes co-participantes, sob diferentes 
autoridades e sem um plano racional geral”, quando isso não acontece, um outro 
padrão é reestabelecido e nesse uma série de situações não previstas aparecem na 
limitação e adequação das ações dos sujeitos sociais. 
Dessa forma, os internados tendem a seguir um mecanismo imposto pela 
instituição. Continua Goffman (1974). 
O aspecto central das instituições totais pode ser descrito com a ruptura das 
barreiras que comumente separam esferas da vida. Nessa forma a instituição 
exerce uma maneira dramática de transformar socialmente o eu impondo 
suas regras a serem seguidas pelos internados. (p.24) 
 
Este fato, segundo o autor, pode ser constatado no hospital para doentes 
mentais, e como forma de esclarecimento descreve o mundo do internado nas suas 
inserções e não inserções sociais. 
45 
 
 
 
Goffman (1974, p.18) afirma que “O novato chega ao estabelecimento com uma 
concepção de si mesmo que se tornou possível por algumas disposições sociais 
estáveis no seu mundo doméstico. ” 
 Isso nos mostra que quando o novato chega à instituição traz com ele uma 
referência social familiar que na instituição entrará em um processo de “mortificação 
do eu”, de acordo com o autor: “O seu eu é sistematicamente, embora muitas vezes 
não intencionalmente, mortificado”. (GOFFMAN, 1974, p.24) 
A constituição das instituições que abrigam os iguais, que os reintroduzem a 
um novo sistema e lógica institucional; acontece a partir do momento que a cultura 
trazida das várias referências do convívio e do eu não é aceita. É aí que começa uma 
perda de identidade onde o interno passa a seguir regras impostas pela instituição, 
causando assim o começo “pelos quais o eu da pessoa é mortificado”, é nesse 
aspecto que o trabalho de Nise é inovador e mais próximo aos internos ao tentar 
romper com a lógica imposta aos manicômios e a partir dos trabalhos artísticos e 
culturais, que na contramão da mortificação do eu, pela via da expressão artística, 
trazem para um cenário de ressignificação e recolocação esse eu, no qual o sujeito 
em tratamento e/ou interno não se sinta um paciente exilado de si, mas sim um 
hóspede entreamigos e seus iguais. 
Nessa sintonia a busca da expressão e da saúde por via da arte, poesias, 
esculturas, pinturas, artes cênicas, músicas, desaprisiona o internado e pode o tornar 
autônomo no seu fazer, ainda que a mortificação do eu seja um caminho quase 
inevitável na lógica que impera nas instituições. 
A saída dos internos da instituição depois de uma internação significa um 
retorno ao convívio social, cuja sociedade exige do internado que passou por este 
processo um novo padrão social e cultural. Goffman (1974) apresenta também uma 
visão da equipe da instituição, em que aponta, neste sistema, uma administração que 
fica entre o fazer e o dizer que faz. 
Assim diz o autor: 
46 
 
 
 
Os processos de admissão talvez pudessem ser denominados "arrumação" 
ou "programação", pois, ao ser "enquadrado", o novato admite ser 
conformado e codificado num objeto..., desta forma a equipe impõe um 
padrão que influência na obediência dos internados onde os objetivos da 
instituição serão mantidos. (GOFFMAN,1974, p.26) 
 
 
 Em uma tentativa de amenizar as mortificações existe um sistema de 
permissão, onde as três formas existentes são: as “regras da casa, a obediência às 
regras e os prêmios a quem obedece às regras”. 
O autor apresenta: 
A construção de um mundo em torno desses privilégios secundários é talvez 
o aspecto mais importante da “cultura dos internados”, Equipe dirigente e 
internados, mantém uma relação solidária apesar da distância social que leva 
a uma integração limitada seguindo uma ordem de papéis, onde existe um 
compromisso institucional com a rotina de atividades a serem executadas. 
(GOFFMAN, 1974, p.59) 
 
Por fim, há sempre nas razões mais reais e contundentes nos contextos sociais, 
nas instituições totais, na concretude das relações um aporte de outros caminhos que 
podem acenar outro sentido de lógica e análise, assim, é nesse sentido que a arte 
pode libertar e promover saúde. A arte pode desenvolver uma “cultura ambiental” 
carregada com sentimentos de recolocação nos cenários e, mediante a um 
pensamento de volta à convivência social externa, os sujeitos presos a um estigma 
institucional podem, por via das expressões artísticas, tentar romper com o estigma 
da doença e se colocarem como um diferente igual nas suas necessidades, nadando 
contracorrente às lógicas impostas no padrão prisional das instituições 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Quero para mim o espírito desta frase, 
transformada a forma para a casar com o que eu 
sou: Viver não é necessário; o que é necessário é 
criar. 
Fernando Pessoa 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
http://pensador.uol.com.br/autor/fernando_pessoa/
48 
 
 
 
CAPÍTULO 5 
O CENÁRIO E SUA HISTÓRIA: O HOTEL DA LOUCURA EM FOCO 
O Hotel da LouCura está localizado, no Instituto Municipal de Saúde Mental 
Nise da Silveira, Engenho de Dentro, bairro da zona norte do Rio de Janeiro. Fundado 
em julho de 2012, em um espaço que antes fora usado como enfermarias e 
consultórios do Instituto, estavam ocupado por sucatas de macas e cadeiras. Esse 
espaço assumiu um lugar de arte e cultura. Com a ideia de promover a arte como 
tratamento para doenças emocionais, levantando uma bandeira de inclusão, não 
apenas como uma reflexão cultural e científica a respeito da loucura, mas também um 
basta aos estigmas das doenças mentais. 
No cenário do HL artistas, pesquisadores e médicos podem se hospedar para 
conviver com pacientes internados por problemas psiquiátricos e participarem das 
atividades ofertadas nos espaços do HL para todos seus clientes. De acordo com 
Pordeus (2014, p.37), o Hotel da Loucura surgiu: 
Dentro do Instituto Nise da Silveira, que é um complexo psiquiátrico de oito 
mil metros quadrados, ...Agente ocupou e ali a gente fez o Hotel da Loucura, 
pintamos paredes, lavamos banheiros, desenhamos, cantamos pulamos, e 
nesse primeiro ano a gente expandiu para outra enfermaria. 
 O espaço do Hotel da LouCura é composto por nove quartos, que são usados 
em congressos, três banheiros coletivos, três cozinhas comunitárias, três salões para 
administração de oficinas, duas salas de reuniões, uma biblioteca (Baruch de 
Spinoza), um chalé de arte, um spa , com aparelhos de ginástica, uma horta, além de 
salas administrativas. 
Há cinco anos o ator, psiquiatra, pesquisador cultural, Fundador e Coordenador 
do Núcleo de Cultura, Ciência e Saúde da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de 
Janeiro, Vitor Pordeus, junto a diversos agentes cultural, realizam atividade culturais 
seguindo os ensinamentos de Nise da Silveira adotados no Hotel da LouCura. 
Vitor Pordeus se baseia no método da Dr. Nise da Silveira, de cujo, trabalho 
conheceu em 2009, quando assumiu o cargo de coordenador da pasta Cultura e 
49 
 
 
 
Saúde do Rio de Janeiro, em uma visita ao IMNS em Engenho de Dentro através do 
Museu de Imagem do Inconsciente, MII. Considera o trabalho da Nise uma verdadeira 
revolução nos tratamentos psiquiátricos com uma exploração ao mundo interno dos 
portadores de doenças emocionais. 
Vale destacar algo a respeito da Nise, que além de ser intelectual de família 
culta, aos 22 anos se forma em medicina. Depois de um ano e meio presa como 
subversiva onde assiste torturas, quando sai declara “eu saí com mania de liberdade”, 
com este pensamento chega ao hospital de Engenho de Dentro, depara-se com 
portadores de doenças mentais vivendo como presidiários e tratados a base de 
eletrochoque. Com sua personalidade forte e ao mesmo tempo, com conhecimentos 
científicos, se recursou a usar tal tratamento por acreditar que “a criatividade que todo 
mundo tem, exercita as possibilidades de se transformar”, a partir deste momento ela 
dá início ao que é hoje o MII. 
 De acordo com Lou (2014,p.37) “A Dra. Nise da Silveira representa para a 
Psiquiatria o que Paulo Freire representa para Educação”. A maior referência de 
transformação e humanidade refinada. 
São diversas as atividades apresentadas e desenvolvidas no HL, entre elas, a 
montagem e oficinas de teatro, oficina do corpo e expressão corporal, oficinas com 
plantas medicinas; de pintura; roda dialógica de som; música e ateliê, ocupa Nise e 
os cursos de psicopatologia. Pordeus (2014) relata em uma entrevista para a revista 
Lero: 
 
A gente trabalha fundamentalmente no Hotel da Loucura com teatro, então 
no caso de uma crise psicótica o que a gente faz é abrir uma roda e começar 
uma oficina. ... No caso de violência mesmo, a gente contém a pessoa no 
chão e deixa a fúria se esgotar depois conversa, vê o que aconteceu e a 
pessoa vai se colocando. Então a gente não usa medicamento. O 
procedimento que nós desenvolvemos a partir de experiência encontrada na 
psiquiatria contemporânea é esse mesmo, colocar no chão, esperar a fúria 
passar e dramatizar, esse conteúdo, o máximo. ... A dança mobiliza, o teatro 
é importante é a elevação poética, e é na hora que a poesia entra que você 
organiza o pensamento, que a consciência vem, a clareza, a poesia é que 
cura, (p.34) 
 
 
50 
 
 
 
Pelo relato, as artes cênicas estão sendo trabalhadas no Hotel da LouCura 
como forma de afeto que ameniza as dores das doenças emocionais. 
 De acordo com Pordeus (2014, p.36), o hotel tem uma variação das origens 
dos hóspedes entre eles pessoas que frequentam, que trabalham, pessoas que 
viveram por toda vida internada na instituição e pessoas que foram transferidas de 
outros hospitais, pessoas que nunca foram internadas, pessoas que fazem tratamento 
psiquiátrico e pessoas que nunca tiveram nem um tipo de doença emocional, mas 
estão fazendo oficinas de teatro em um espaço aberto a quem chegar. 
 No Hotel da LouCura todos os clientes são atores, doentes e terapeutas, essa 
integração contribui não só para o lado criativo, mas também para o lado efetivo 
através de uma linguagem acessível a todos. 
 
5.1 Arte e poesia

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