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BLOQUEADORES NEUROMUSCULARES Os bloqueadores neuromusculares (BNM) são amplamente utilizados nas anestesias balanceadas, ou seja, induzida por múltiplas drogas para induzir inconsciência, relaxamento muscular e analgesia com o mínimo de efeitos colaterais. Toda vez que um paciente necessitar de imobilidade completa durante o ato cirúrgico são empregadas essas substâncias. Os BNM são substâncias que exercem ações SOMENTE na periferia (não sendo isentos de efeitos adversos), promovendo um relaxamento completo da musculatura esquelética e são desprovidos de ação anestésica e hipnótica. Curarização: referência a um paciente que está sob ação de um BNM. Um BNM é importante para: ➔ Facilitar a intubação oro-traqueal ➔ Diminuir a tensão muscular ➔ Permitir toracotomias ➔ Permitir a ventilação mecânica ➔ Permitir cirurgias oftálmicas ➔ Reduzir a CAM (concentração alveolar mínima) dos halogenados (anestésicos gerais) As dificuldades encontradas na realização do bloqueio são: ➔ Dificuldade de avaliação do plano anestésico ➔ Efeitos adversos indesejáveis ➔ Difícil reversão em certos casos Fisiologia da placa motora A junção neuromuscular depende da liberação de acetilcolina que se liga a receptores da placa motora desenvolvendo o potencial de ação de placa motora que se propaga com decremento (vai perdendo amplitude quando se aproxima da membrana eletro excitável do sarcolema, que vai depender da amplitude do potencial de placa motora). Se ele é um potencial com decremento quando ele chegar ao local de ação ele pode não ter amplitude para atingir o limiar de excitabilidade do sarcolema (membrana plasmática do músculo esquelético), porém, no geral, esse potencial de placa motora é um potencial com amplitude cerca de 3x maior que o necessário para estimular a membrana eletro excitável. Os receptores nicotínicos da placa motora são diferentes dos que existem na sinapse neuronal e nos gânglios autônomos, que são os nicotínicos neuronais. O alvo dos BNM são os nicotínicos musculares (heterodímero). A principal diferença entre o nicotínico neural e o muscular são as subunidades as quais o NT vai se ligar. Os nicotínicos musculares são receptores que apresentam duas unidades que se ligam a acetilcolina e os bloqueadores neuromusculares possuem afinidade específica para essas duas unidades. No neurônio colinérgico, a acetilcolina é sintetizada e armazenada em cisternas que se reconfiguram para formar vesículas preenchidas de acetilcolina, que serão liberadas na fenda sináptica do neurônio motor. Depois de realizar sua ação sobre o neurônio pós sináptico, ela é degradada pela acetilcolinesterase em acetato + colina. Essa colina é recuperada para que uma enzima chamada colina acetil transferase ligue ela a acetilcoenzima A e restaure a acetilcolina para recomeçar o processo. Várias substâncias podem interferir nessa terminação colinérgica de placa motora, por exemplo os anestésicos locais que bloqueiam canais de sódio (necessário para a despolarização da terminação nervosa que proporciona o influxo de cálcio, fundamental para o ancoramento na membrana e liberação por exocitose das vesículas na fenda sináptica). Os BNM são substâncias que se ligam ao receptor da acetilcolina na placa motora e impedem a geração do potencial de placa motora. TIPOS DE BNM Vários aspectos estruturais diferenciam os agentes bloqueadores neuromusculares competitivos dos despolarizantes. Os fármacos competitivos são moléculas relativamente volumosas e rígidas, enquanto os fármacos despolarizantes em geral têm estruturas mais flexíveis que possibilitam rotações das ligações livres. Os antagonistas competitivos ligam-se ao receptor nicotínico na placa motora e bloqueia a ligação da ACh. Quando o fármaco é aplicado diretamente na placa motora de uma única fibra muscular isolada, a célula muscular torna-se insensível aos impulsos nervosos motores e à ACh aplicada diretamente; entretanto, a região da placa motora e as demais áreas da membrana da fibra muscular conservam sua sensibilidade normal à despolarização mediada pelo K+ e à estimulação elétrica direta. Os agentes bloqueadores neuromusculares mostram potências variáveis na produção de bloqueio ganglionar. Assim como ocorre na placa motora terminal, o bloqueio ganglionar é revertido ou antagonizado pelos fármacos anti-ChE. O pancurônio causa menos bloqueio ganglionar nas doses clínicas habituais. Atracúrio, vecurônio, mivacúrio e rocurônio são ainda mais seletivos. Em geral, a preservação das respostas reflexas cardiovasculares é desejável durante a anestesia. O pancurônio tem ação vagolítica (inibe a ação do nervo vago) com taquicardia subsequente, provavelmente decorrente do bloqueio dos receptores muscarínicos. Entre os fármacos despolarizantes, o suxametônio raramente causa efeitos atribuíveis a bloqueio ganglionar em doses que produzem relaxamento neuromuscular. Entretanto, efeitos cardiovasculares são observados em alguns casos, provavelmente causados pela estimulação sucessiva dos gânglios vagais (evidenciada por bradicardia) e simpáticos (refletida por hipertensão e taquicardia). 1. Despolarizante: são aqueles que produzem seus efeitos a partir da despolarização sustentada da placa motora. Só existe um representante atual que é a succinilcolina (uma molécula que apresenta uma associação de 2 moléculas de acetilcolina). A succinilcolina tem a capacidade de se ligar ao receptor, promover abertura dos canais de sódio e manter o receptor despolarizado, tornando essa célula insensível a qualquer estímulo - seja ele elétrico ou químico. Possuem duas fases: ● Fase 1: ocorre a despolarização da membrana por uma descarga inicial (pode desenvolver miofasciculação seguida de uma paralisia flácida que permanece durante todo o tempo que a substância está ativa); ● Fase 2: constitui uma situação de dessensibilização, onde a succinilcolina permaneceu ligada muito tempo e esse receptor se encontra com baixa afinidade para acetilcolina, fazendo com que ela não se ligue mais a esse receptor. Contudo, essa “insensibilidade” volta à medida que esse receptor é reconfigurado, restaurando a sensibilidade pela acetilcolina. A ação inicial desses fármacos é despolarizar a membrana abrindo os canais da mesma maneira que acontece com a ACh. Entretanto, eles persistem por mais tempo na junção neuromuscular, principalmente porque são resistentes à AChE. Desse modo, a despolarização é mais prolongada, resultando em um período breve de excitação repetitiva que pode provocar excitação muscular transitória e repetitiva (fasciculações). O bloqueio do canal de ACh se dá na configuração aberta, então ocorre uma despolarização inicial seguida do bloqueio da transmissão neuromuscular e da paralisia flácida (denominado de bloqueio de fase I). O aumento progressivo das concentrações do suxametônio e com o decorrer do tempo, o bloqueio pode converter-se lentamente do tipo despolarizante fase I para o tipo não despolarizante, fase II. A fase II, ao contrário da fase I, é caracterizada por uma repolarização sustentada que aumenta de acordo com a infusão prolongada e aumento da dose, podendo ser inibida ou antagonizada por anticolinesterásicos (apesar de não recomendado). A resposta muscular dessa fase também é a paralisia flácida. As ações pré-sinápticas dos agentes competitivos podem tornar-se significativas com a estimulação repetitiva em alta frequência, porque os receptores nicotínicos pré-juncionais podem ser envolvidos na mobilização da ACh a ser liberada pela terminação nervosa. 2. Competitivo: são aqueles cujos efeitos advém da inibição competitiva pelo receptor nicotínico, impedindo a despolarização da placa motora. São subdivididos em bloqueadores de estrutura química derivada da isoquinolina e dos esteróides. Mecanismos de ação: a) Ligaçãodos bloqueadores aos seus respectivos locais de ação, o mesmo ponto onde a acetilcolina se liga. b) Bloqueio de receptor pré sináptico nicotínico. c) Bloqueio do orifício central onde há permeabilidade de sódio e potássio capaz de gerar o potencial de placa motora. Os compostos isoquinolínicos são representados pelo atracúrio, cisatracúrio e mivacúrio. São mais suscetíveis à hidrólise no plasma e causam liberação de histamina em doses que não promovem alterações hemodinâmicas. Quando a dose apropriada de um fármaco bloqueador competitivo é injetada por via intravenosa, a fraqueza motora progride para paralisia flácida total. O bloqueio se inicia com os músculos dos olhos, do maxilar e da laringe, relaxam antes dos músculos dos membros e do tronco. Em seguida, há paralisia dos músculos intercostais e, por fim, o diafragma é paralisado e a respiração cessa. Em geral, a recuperação dos músculos ocorre em ordem inversa à da paralisia e, desse modo, o diafragma geralmente é o primeiro músculo a recuperar sua função. A duração do bloqueio vai depender do tipo e característica do bloqueador que está sendo utilizado. Quando é utilizado um bloqueador despolarizante, essa fasciculação acontece até um minuto após a aplicação do bloqueador despolarizante, seguida de paralisia flácida e, quando o paciente tem uma AChE plasmática normal dentro de 5 a 8 min após aplicação e retirada do bloqueador, o paciente tem recuperação completa do movimento muscular. Quando é usado anestésico geral + BNM pode-se utilizar ⅕ da dose da anestesia. Quanto a duração do bloqueio: ➔ Longa duração (d-Tubocurarina, pancurônio e doxacúrio): início da ação entre 4 e 6 min e duração de até 180 min. ➔ Intermediária (vecurônio e atracúrio): início da ação entre 2 e 4 min e duração de até 90 min. ➔ Curta duração (mivacúrio e rapacurônio): início da ação entre 1 e 3 min e duração de até 30 min. ➔ Ultra curta (succinilcolina): início da ação entre 1 e 1,5 min e duração de apenas 6 min. Monitorização dos efeitos relaxantes musculares Ocorre por um aparelho chamado trem de 4 pontos/estímulos, onde é colocado 4 eletrodos no trajeto do nervo ulnar e é estimulado 4 vezes o neurônio motor a 2 Hz. Na ausência de qualquer medicamento é possível observar a amplitude normal da contração do polegar. Quando houver: ● BNM competitivo: quando é aplicado o teste o 1° estímulo tem amplitude quase total e os próximos decaem até desaparecer. Se aplicar neostigmina (bloqueador de AChE que mantém muita acetilcolina na placa), não haverá mais atenuação da amplitude. TOF= 4/1 (análise da amplitude do 4° estímulo sobre a amplitude do 1° estímulo). TOF= 0,15-0,25: TOF= >0,9: indicação de recuperação do BNM. Isso indica que a amplitude do 4° estímulo está muito próxima a do 1° estímulo. É o momento que pode extubar o paciente. ● BNM despolarizante: observa-se durante a fase 1 contrações de amplitude que se mantém no 1° teste, porém são menores dos que as observadas no indivíduo controle. Já na fase 2 apresenta-se contrações de amplitude iguais às anteriores que vão decaindo com o tempo. Caso haja aplicação de neostigmina não é observada nenhuma resposta devido à dessensibilização dos receptores, mesmo que a concentração de acetilcolina na fenda seja aumentada. Essa diminuição de contração possivelmente se deve ao fato de que a acetilcolina não consegue, uma vez despolarizada pela succinilcolina, reverter a succinilcolina ligada ao seu receptor. Fármacos competitivos ➔ Compostos isoquinolínicos (liberam histamina e a maior parte da metabolização não é hepática nem renal) 1. Atracúrio Apresenta uma latência pequena; não tem efeito acumulativa, ou seja, a aplicação de doses subsequentes não aumenta o nível de bloqueio; seu metabolismo é através da eliminação de hoffman e esterases plasmáticas (independente de funções hepática e renal, apenas cerca de 20% da dose aplicada chega até esses tecidos); e seus efeitos sistêmicos consistem em broncoconstrição (devido a pequena liberação de histamina), não é observado mudança na FC e pode haver uma queda de PA, mas rapidamente retorna aos seus níveis normais devido ao reflexo barorreceptor. Possui interação medicamentosa com o tiopental sódico, que inativa o atracúrio devido ao pH básico criado por ele. 2. Cisatracúrio É mais potente que o atracúrio; causa uma liberação ainda menor de histamina; metabolismo também se dá pelo mecanismo de hoffman e pelas esterases; caso o paciente possua insuficiência renal o medicamento não se acumula, devido a pequena passagem dele pelos rins. Possui interação medicamentosa com as cefalosporinas, que inativa o cisatracúrio quando os dois medicamentos são feitos pela mesma via de administração. 3. Mivacúrio Possui uma duração muito curta, o que o torna ideal para procedimentos rápidos; é uma mistura de isômeros que é hidrolisado pela colinesterase plasmática (pacientes que apresentam uma colinesterase atípica apresentam efeitos muito prolongados, devido a incapacidade da enzima em degradar o BNM); possui uma liberação de histamina suficiente para causar hipotensão no paciente. Possui interação medicamentosa com bambuterol, que prolonga o bloqueio neuromuscular. ➔ Compostos esteroidais (não promovem liberação de histamina e são metabolizados em um órgão-alvo) 1. Pancurônio Possui uma latência grande, porém sua duração é longa; cerca e 30% é metabolizado no fígado em 3-hidroxipancurônio e 3,17-hidroxipancurônio, 10% excretado pela bile e 90% pelos rins; seus principais efeitos sistêmicos são aumento de FC e PA decorrentes do bloqueio M2 e aumento na liberação de NORA; cuidado ao utilizar em cardiopatas e se possível evitar utilizar em nefropatas (devido a alta excreção renal). 2. Rocurônio Este apresenta a menor latência dentre os BNM competitivos; é o mais indicado para realização de intubação traqueal em sequência rápida; exerce mínimos efeitos cardiovasculares; sofre intensa recaptação hepática e excreção biliar; o uso desse medicamento é o que apresenta maior incidência de reações anafiláticas (por isso o cuidado deve ser ainda maior com pacientes atópicos) que podem ocorrer até 1h após a administração. 3. Vecurônio É estruturalmente semelhante ao pancurônio, mas seu diferencial é que não apresenta efeitos cardiovasculares. O metabolismo hepático converte esse medicamento em metabólitos ativos que são excretados na urina e na bile. Reversão do bloqueio: ● Neostigmina: realiza antagonismo competitivo com o BNM e inibe a acetilcolinesterase -> aumenta a acetilcolina na fenda. Mas esse aumento de ACh causa efeitos como bradicardia e hipotensão pois esse aumento de ACh não é exclusivo para a junção neuromuscular, ocorre em todas as terminações parassimpáticas, mas podem ser revertidos com atropina. ● Cloreto de edrofônio ● Sulfato de atropina ● Glicopirrolato. ● Sugammadex: é uma nova opção para reversão do bloqueio. Liga-se aos BNMs esteroides livres no plasma e encapsula -> impede a ligação do BNM com o receptor. Segue a ordem rocurônio > vecurônio > pancurônio. Não é recomendado em pacientes com nefropatias graves, em gestantes (pois atravessa a barreira placentária), em crianças menores de 2 anos e uso deve ser com cautela em hepatopatas. Possui interações medicamentosas com organofosforados, aminoglicosídeos, tetraciclinas, agentes inalatórios, agentes injetáveis e anestésicos locais pois aumentam o período de bloqueio. Despolarizantes ➔ Succinilcolina ou suxametônio Farmacocinética: latência pequena (cerca de 1 min), bloqueio rápido (3-5 min, pode chegar até 8) e metabolismo por esterases plasmáticas. Farmacodinâmica: causa intensa paralisia flácida de curta duração (fasciculações musculares), apnéia transitória, caso o paciente possuauma colinesterase atípica o bloqueio pela succinilcolina pode durar de 30 min a 6 horas. Efeitos colaterais: ● Bradicardia (interage com receptores muscarínicos no nodo SA e acontece mais frequentemente em crianças que utilizam doses repetidas) revertida com altas doses de atropina (muito cuidado ao utilizar a atropina em pacientes com HBP); ● Taquicardia devido a sensibilização dos receptores nicotínicos nos gânglios simpáticos; ● Aumento de pressão intra-ocular devido às contrações da musculatura extrínseca do globo ocular nos momentos que antecedem a paralisia (cuidado com pacientes com glaucoma); ● Mialgia pós operatória devido as fasciculações desordenadas, distensão com microlesões das fibras e tendões musculares; ● Hipercalemia em consequência da despolarização sustentada que mobiliza grandes concentrações de K+ para o meio extracelular (por isso se deve ter cuidado com arritmias cardíacas). Cuidado com pacientes com potássio extracelular > 4.5 mq/L -> arritmia cardíaca resultando em morte súbita; ● Bloqueio de fase 2 prolongado que pode ocorrer após altas e repetidas doses, além disso o paciente com colinesterase atípica, por metabolizar muito lentamente a droga, deve ser mantido em ventilação; ● Hipertermia maligna (raro) é uma doença causada por um defeito no receptor rianodina que faz com que o cálcio tenha dificuldade de se manter no retículo sarcoplasmático; ● Anafilaxia. Reversão do bloqueio: A fase 1 é revertida espontaneamente à medida que ocorre a metabolização da succinilcolina e a desocupação dos receptores. A fase 2 pode ser revertida com anticolinesterásicos, apesar de não ser recomendado pois pode não ter efeito nenhum como ter muitos efeitos adversos. Portanto, a reversão do bloqueio é praticamente dependente da metabolização do BNM. Parâmetros farmacocinéticos Quando são administrados bloqueadores competitivos de ação prolongada, o bloqueio pode diminuir 30 min depois em virtude da redistribuição do fármaco, embora persistam o bloqueio residual e os níveis plasmáticos do fármaco. Os fármacos de ação prolongada podem acumular-se depois da administração de doses repetidas. Os esteróides contêm grupos éster que são hidrolisados no fígado. Em geral, os metabólitos têm cerca de metade da atividade do composto original e contribuem para o perfil de relaxamento total D. Hofmann: tipo de metabolização onde não é envolvido o rim ou o fígado, ou apenas em parte. Paciente hepatopata ou nefropata: escolher sempre fármacos que não envolvam esses tecidos para sua eliminação!!
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