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Metabolismo do Ferro, Anemias Megaloblásticas e Anemia Falciforme

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Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
Metabolismo do Ferro 
O ferro faz parte do grupo heme 
Sendo um metal pesado, o ferro livre é quase insolúvel 
e bastante tóxico, e por isso durante todo o seu ciclo 
metabólico está sempre ligado a proteínas de 
transporte ou funcionais 
Mais de dois terços do conteúdo de ferro do organismo 
encontra-se incorporado à molécula de hemoglobina. 
Assim, a hemoglobina é a principal forma funcional de 
ferro no organismo e também seu principal depósito, e 
por isso a anemia é a manifestação clínica mais 
proeminente da carência de ferro. 
No homem, cerca de 2 g de ferro estão presentes na 
hemoglobina, enquanto que, em mulheres, esse valor 
corresponde a 1,7 g. 
A mioglobina tem uma estrutura muito semelhante à 
hemoglobina, sendo no entanto um monômero e não 
um tetrâmero, e funciona como uma proteína para 
depósito de oxigênio nos músculos, de onde o O2 é 
liberado durante o exercício Presente em todas as 
células dos músculos esquelético e cardíaco, o 
organismo humano contém um total de cerca de 300 
mg de ferro na mioglobina. As demais formas de ferro 
funcional nos tecidos (citocromos e enzimas) 
representam 0,5% do total de ferro do organismo 
Além da hemoglobina, o organismo armazena ferro em 
diferentes tecidos sob formas de ferritina e 
hemossiderina. 
A ferritina, proteína presente no citoplasma da maioria 
das células, tem importante papel na estocagem do 
ferro. É composta por 24 subunidades, com dois 
subtipos denominados H (cromossomo 11q) e L 
(cromossomo 19q). A ferritina H é um pouco maior 
que a ferritina L e tem ação ferroxidase importante. A 
maior parte da ferritina sintetizada é usada na 
estocagem do ferro, entretanto pequena quantidade é 
secretada e liberada no soro (feritina sérica), 
quantidade essa que se correlaciona com o estoque 
total de ferro no organismo. Por isso, a dosagem de 
ferritina plasmática é um exame importante para 
avaliar os depósitos de ferro no organismo 
A hemossiderina, corresponde a um agregado 
heterogêneo de ferro, componentes do lisossomo e 
outros produtos da digestão intracelular. Ela restringe-
se aos macrófagos da medula óssea, do fígado e baço. 
O ferro do depósito e aquele liberado pela destruição 
das hemácias são reutilizados para síntese de 
hemoglobina 
O deposito de ferro na medula óssea revela um a três 
grânulos no citoplasma de eritroblastos (denominados 
“sideroblastos”). Esses depósitos medulares e os 
sideroblastos desaparecem por completo na deficiência 
de ferro 
Principais proteínas envolvidas no metabolismo do 
ferro 
 
 
Dieta e absorção de ferro 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
Em geral é absorvido 0,5-2,0 mg/dia, quantidade que 
compensa as perdas, principalmente resultantes da 
descamação de células, crescimento e, no caso das 
mulheres, das perdas sanguíneas menstruais 
A facilidade com que o tubo intestinal absorve o ferro 
depende da forma como ele está presente no alimento. 
O ferro na forma heme, presente em carne e fígado, 
representa um terço do ferro da dieta, sendo muito 
mais facilmente absorvido. Essa absorção é realizada 
por uma proteína HCP1. Já a absorção do ferro dos 
vegetais (ferro inorgânico ou ferro não heme) é menos 
eficiente, dependendo bastante de vários fatores, como 
a presença de outras substâncias (fosfatos, oxalatos, 
aminoácidos livres) e produção de ácido clorídrico 
pelo estômago 
Uma dieta bem equilibrada contém 10-20 mg de ferro 
por dia, dos quais cerca de 10% é absorvido 
O ferro é absorvido na 
borda em escova das 
células epiteliais dos vilos 
intestinais do duodeno. 
Para sair do lúmen 
intestinal e atingir o 
plasma, o ferro precisa 
atravessar duas membranas 
da célula epitelial: a 
membrana apical e a 
basolateral. 
O transporte do ferro pela 
membrana apical do 
enterócito é realizado pelo DMT1, capaz de transportar 
outros metais divalentes (zinco, cobre, cobalto). Como 
o ferro inorgânico está primariamente presente na dieta 
na forma oxidada (Fe3+, ferro férrico) não 
biodisponível, para ser transportado pelo epitélio 
intestinal necessita ser reduzido a Fe2+ (ferro ferroso) 
pela DcytB (Duodenal cytochrome B), redutase férrica 
associada à membrana apical do enterócito 
 
Uma vez no citoplasma do enterócito, o ferro tem dois 
possíveis caminhos a seguir: pode ser armazenado 
como ferritina na própria célula ou pode atravessar a 
membrana basolateral para chegar até o plasma. A 
proporção de ferro que segue cada uma das vias 
(absorção para o plasma ou armazenamento no 
enterócitos como ferritina) é deter minada quando a 
célula é formada nas criptas do epitélio intestinal. Nas 
células das criptas, a proteína HFE e o receptor de 
transferrina (TfR) formam um complexo HFE-TfR que 
modula a capacidade absortiva do enterócito que 
futuramente irá migrar para os vilos intestinais e se 
tornar uma célula de absorção 
**Quando a dieta é rica em ferro, e consequentemente 
a quantidade de ferritina no interior do enterócito está 
elevada, o complexo HFE-TfR inibe a capacidade 
absortiva de ferro do enterócito. Esse fenômeno é 
conhecido como bloqueio mucoso 
Anternativamente ao caminho descrito a cima, o ferro 
do citoplasma do enterócito pode atravessar a barreira 
basolateral, pela ação cooredenada da ferroportia e a 
hefaestina, duas proteínas de membrana. 
A ferroportina é o único exportador celular de ferro, 
tem papel central na homeostase sistêmica desse metal 
e está presente na mucosa duodenal, nos macrófagos, 
hepatócitos e trofoblastos sinciciais da placenta 
A hefaestina, tem a função de oxidar o Fe2+ a Fe3+, 
permitindo seu transporte pela transferrina 
 
A absorção de ferro é regulada em três pontos 
principais: 
 Modulação da absorção provocada pela quantidade 
de ferro ingerida, chamada bloqueio mucosos 
**No entanto, com grandes doses de ferro, como doses 
farmacológicas ou intoxicações exógenas, esse bloqueio é 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
superado, e a quantidade absorvida é proporcional à 
ingerida. 
 Regulação pelo estoque de ferro pela hepcidina 
(peptídeo secretado pelo fígado). Essa regulação se 
faz pelo controle de expressão da ferroportina. A 
ligação da hepcidina à ferroportina resulta na 
internalização desta última e perda de sua função 
**Sobrecarga de ferro reduz a absorção, enquanto que a 
carência promove maior absorção de ferro 
**Assim, em situações de sobrecarga de ferro ou 
inflamação, observa-se a elevação da hepcidina, e a 
liberação de ferro a partir de enterócitos, fígado e 
macrófagos encontra-se reduzida, pois muita 
ferroportina será internalizada e perdera sua função. 
Por outro lado, a presença de deficiência de ferro, 
anemia ou hipóxia, situações em que a hepcidina 
encontra-se diminuída, a expressão de ferroportina 
estará aumentada e ocorrerá mais liberação de ferro 
das células intestinais 
 Regulação hematopoética, ou seja, a absorção é 
modulada de acordo com a necessidade de 
eritropoese 
**A eritropoese acelerada aumenta a absorção de 
ferro, independentemente do depósito corporal de 
ferro. Esse processo parece ser mediado pela 
Eritropoetina (Epo) e pelo GDF15 (Growth 
Differentiation Factor 15). A Epo suprime a expressão 
da hepcidina pela regulação negativa das vias STAT3 
e SMAD. O GDF15 também tem ação supressora da 
expressão da hepicitina 
Transporte de ferro 
Após atravessar o enterócito, o ferro chega ao plasma 
onde se liga à transferrina. A transferrina pode receber 
ferro dos enterócitos e dos depósitos, e pode liberá-lo 
para os depósitos, para os eritroblastos, para o 
músculo, para a síntese de mioglobina, ou para 
diferentes tecidos para a síntese de enzimas e 
citocromos. A captação do ferro ligado à transferrina é 
intermediada pelo TfR, que pode ocorrer de duas 
formas: TfR1 ou TfR2. 
OTfR1 é amplamente expresso na maioria das células, 
enquanto o TfR2 é restrito a hepatócitos, células da 
cripta duodenal e células eritroides, sugerindo que o 
TfR2 desempenhe um papel mais especializado no 
metabolismo do ferro 
Entrega do ferro aos tecidos 
A ligação do TfR1 com a transferrina carregada de 
ferro desencadeia a invaginação da membrana celular, 
mediada pela clatrina, e formação de endossomos 
contendo o complexo transferrina/TfR1, seguida de 
alterações conformacionais das proteínas, liberação e 
redução do ferro para Fe2+. O Fe2+ é então 
transportado através da membrana endossomal pela 
DMT1. No citoplasma, o ferro é incorporado à 
protoporfirina para síntese do heme (nos eritroblastos) 
ou retido na forma de estoque (ferritina/hemossiderina 
nas células não eritroides). Nesse meio tempo, os 
endossomos retornam as proteínas, apotransferrina e 
TfR1, à superfície celular para serem reutilizadas. 
 
Excreção e perdas de ferro 
Não existe mecanismo fisiológico de excreção de 
ferro, que é conservado pelo organismo com grande 
eficiência 
Aproximadamente 1 mg de ferro (menos de 1 
milésimo do total do organismo) é perdido 
diariamente, por via fecal (ferro presente nas células 
descamantes do epitélio), descamação da pele, do 
epitélio urinário e perspiração. Em mulheres, a 
menstruação normal leva à perda de 30-60 mL de 
sangue por mês, correspondentes a cerca de 15-30 mg 
de ferro por mês. 
 
 
 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
Anemia por deficiência de Ferro 
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, 
anemia é um problema de saúde pública global, que 
afeta o estado de saúde, a capacidade laborativa e a 
qualidade de vida de cerca de 2 bilhões de pessoas, 
cerca de um terço da população mundial. 
Epidemiologia 
A deficiência de ferro (DF) é responsável por 75% de 
todos os casos de anemia 
Estima-se a prevalência de DF em até 45% das 
crianças até cinco anos de idade, e de até 50% nas 
mulheres em idade reprodutiva 
Cerca de 500 milhões de mulheres e até 60% de 
gestantes apresentam anemia por deficiência de ferro 
É muito mais prevalente em estratos sociais mais 
baixos, nos grupos de menor renda, e na população 
menos educada 
Etiologia 
 
 
Fisiopatologia 
O corpo de um indivíduo adulto bem nutrido e 
saudável contém de 3 a 4g de ferro. O éritron (órgão 
descontínuo, porém único, formado pelo somatório de 
eritroblastos, reticulócitos e hemácias) é o maior 
compartimento funcional de ferro do organismo, 
contendo de 60 a 70% do total de ferro. O restante do 
ferro corporal está distribuído nos hepatócitos e nos 
macrófagos do sistema reticuloendotelial (SRE), que 
atuam como órgão de depósito. 
**O SRE é responsável por fagocitar células senescentes, 
catabolizar Hb para restaurar o ferro e devolve-lo à 
transferrina para nova utilização. 
A deficiência de ferro surge a partir do desequilíbrio 
entre a ingesta, absorção e situações de demanda 
aumentada ou perda crônica (anemia ferropriva) 
Anemia ferropriva é bastante frequente em recém-
nascidos, crianças, adolescentes e mulheres em idade 
fértil, gestantes e lactantes. 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
O ferro dietético consiste de ferro heme e não heme. 
Ferro heme está presente em alimentos de origem 
animal e é excelente para ser absorvido. O ferro não 
heme é encontrado em produtos de origem vegetal e 
não é muito bem absorvido. 
Quadro Clínico 
As queixas costumam ser leves, pois a anemia se 
instala de maneira insidiosa, gerando adaptação, e há 
pacientes completamente assintomáticos. Pode-se 
observar 
 Palidez cutaneomucosa 
 Fadiga 
 Baixa tolerância ao exercício 
 Redução do desempenho muscular 
 Perversão alimentar ou pica (desejo de comer gelo, 
sabão, terra, argila) 
 Baqueteamento digital 
 Coiloníquias (unhas em colher) 
 Atrofia das papilas linguais 
 Estomatite angular 
 Disfagia (formação de membranas esofágicas ou 
síndrome de Plummer-Vinson) 
Diagnóstico 
Hemograma. Disponível para rastreio da anemia 
ferropriva, mas incapaz de detectar DF sem anemia. 
Frequentemente observa-se: hipocromia, icrocitose, 
aumento do RDW e plaquetose 
Coloração do tecido medular pelo corante de Perls. 
Padrão ouro. Avalia estoques de ferro na medula óssea. 
É um 
exame 
invasivo 
 
 
 
 
 
 
Mielograma. Observa-se hiperplasia eritrobácita com 
displasias morfológicas 
Dosagem de Ferritina Sérica. Está diretamente 
relacionada com a concentração de ferritina 
intracelular e, portanto, com o estoque corporal. 
**Deficiência de ferro é a única condição que gera 
ferritina sérica muito reduzida. 
Valores normais ou elevados não excluem DF, pois a 
ferritina é uma proteína de fase aguda. 
Transferrina. Tem capacidade de ligas, 
simultaneamente duas moléculas de ferro. Sua 
produção é regulada pelo ferro corporal, aumentando 
quando os estoques estão exauridos. Pode ser dosada 
diretamente ou por avaliação da Capacidade total de 
Ligação de Ferro 
Tratamento 
O tratamento da DF consiste na reposição oral ou 
venosa. No entanto, é mandatória a investigação da 
causa e sua pronto correção 
Com doses adequadas de ferro suplementar observa-se 
recuperação rápida da anemia por DF na maioria dos 
pacientes. O sinal mais precoce da resposta é o 
aumento da contagem de reticulócitos, que atinge seu 
pico entre o 5º e o 10º dia de tratamento 
Oral 
Dose ideal: 180 a 200mg de ferro elementar/dia para 
adultos e 1,5 a 2mg de ferro elementar/dia para 
crianças, dividida em 3 a 4 tomadas, preferencialmente 
de estômago vazio, ou 30 minutos antes da refeição. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
**Forma Ferrosa é a mais bem absorvida que a 
férrica 
**Pacientes em uso de antiácidos e inibidores da 
bomba de prótons recomenda-se a reposição com 
doses maiores por mais tempo 
A prevalência de efeitos colaterais é de até 30%, 
notadamente no TGI: pirose e dor epigástrica, náuseas, 
vômitos, empachamento, dor abdominal em cólica, 
diarreia e obstipação. 
O paciente deve ser informado de que é esperada 
mudança de cor nas fezes, e que os efeitos colaterais 
melhoram com o tempo 
Recomenda-se manter doses terapêuticas por cerca de 
quatro meses após a resolução da anemia 
Parenteral 
Deve ser indicada em situações especiais 
 
 
Carência de Folatos ou Vitamina B12- 
Anemias Megaloblásticas 
As alterações morfológicas do sangue e da medula 
óssea são similares, sendo conjuntamente conhecidas 
pela denominação de anemias megaloblásticas. 
Embora a anemia seja a manifestação mais 
proeminente, essas doenças têm em comum uma 
redução seletiva na síntese de DNA e, 
consequentemente, as alterações se estendem a outras 
linhagens hematopoéticas como leucócitos e plaquetas, 
e a outros locais com grande proliferação celular como 
intestino delgado, língua e útero 
Fisiopatologia 
A hematopoese normal compreende intensa 
proliferação celular, que por sua vez implica a síntese 
de numerosas substâncias como DNA, RNA e 
proteínas; em especial, é necessário que a quantidade 
de DNA seja duplicada exatamente. Tanto os folatos 
como a vitamina são indispensáveis para a síntese da 
timidina, um dos nucleotídeos que compõem o DNA, e 
a carência de um deles tem como consequência menor 
síntese de DNA 
Os folatos participam dessa reação na forma de N5-
N10-metilenotetraidrofolato, que cede um radical -
CH3 (metil) à desoxiuridinamonofosfato (dUMP), 
transformando-a em timidinamonofosfato (dTMP) que, 
por sua vez, será incorporada ao DNA. A vitamina 
B12 participa indiretamente nesta reação, funcionando 
como coenzima da conversão de homocisteína em 
metionina, transformando simultaneamente o 5-
metiltetraidrofolato em tetraidrofolato, a forma ativa 
de folato que participa da síntese de timidina 
Resumindo!! O folato participada síntese de timina 
que é incorporada no DNA e, para isso, o folato 
precisa estar em sua forma ativa. A vitamina B12 
funciona como coenzima para tornar esse folato ativo 
Na ausência de vitamina B12, o folato vai se 
transformando em 5-metiltetraidrofolato, uma forma 
de transporte do folato, inútil para síntese da timidina e 
do DNA. 
A síntese inadequada de DNA tem como consequência 
modificações do ciclo celular, retardo da duplicação e 
defeitos no reparo do DNA. Por outro lado, **a síntese 
de RNA não está alterada, pois a timidina não é 
necessária para sua síntese; não há, portanto, redução 
da formação de proteínas citoplasmáticas e do 
crescimento celular 
O quadro morfológico do sangue periférico e da 
medula óssea é idênticos nas deficiências de folatos ou 
de vitamina B12: dissociação de maturação nucleo-
citoplasmática, produzindo células de tamanho 
aumentado e com alterações morfológicas 
características. No entanto, uma parcela considerável 
dessas células morre na própria medula óssea, antes de 
completar o desenvolvimento 
 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
Manifestações Clínicas 
A principal manifestação clínica é a anemia; apesar de 
plaquetopenia e neutropenia ocorrerem com 
frequência. 
A deficiência da síntese de DNA afeta a divisão celular 
em outros tecidos em que há rápida multiplicação, em 
especial os epitélios do tubo digestivo, originando 
queixas de diarreia, glossite (ardência, dor e aparência 
vermelha da língua, “língua careca”), queilite e perda 
do apetite. 
**Pode ser encontrada discreta a moderada 
esplenomegalia. 
A deficiência de vitamina B12 determina ainda uma 
degeneração do cordão posterior da medula espinhal. 
O quadro resultante, denominado “degeneração 
combinada subaguda da medula espinhal”, inclui 
sensações parestésicas dos pés (formigamento ou 
picada de agulhas), pernas e tronco, seguidas de 
distúrbios motores, principalmente dificuldades de 
marcha, redução da sensibilidade vibratória, 
comprometimento da sensibilidade postural, marcha 
atáxica, sinal de Romberg, e comprometimentos das 
sensibilidades termoalgésica e dolorosa “em bota” ou 
“em luva”. 
Tríade clássica de deficiência de B12: 
 Fraqueza 
 Dor na língua 
 Parestesias 
São também comuns manifestações mentais 
**A deficiência de folato não causa envolvimento do 
sistema nervoso, mas a deficiência durante a gravidez 
aumenta a incidência de defeitos de tubo neural em 
recém-nascidos 
Causas de Carências 
Como a anemia por carência de ferro, as anemias por 
deficiências de folatos ou vitamina B12 resultam de 
uma disparidade entre a disponibilidade e a demanda. 
A anemia é o ultimo estádio das deficiências 
nutricionais, surgindo quando as reservas orgânicas 
esgotaram-se em virtude do balanço negativo 
No caso da vitamina B12, os depósitos são suficientes 
para manter eritropoese por 2 a 5 anos após haver 
cessado a absorção, enquanto que as reservas de 
folatos são suficiente apenas para 3 ou 4 meses. 
As causas de carência podem ser classificadas em: 
 Menor ingestão de nutriente 
 Menor absorção intestinal 
 Defeitos do transporte ou metabolismo 
 Aumento da excreção ou das perdas 
 Aumento das necessidades fisiológicas ou 
patológicas 
Causas de carência de vitamina B12 
Dieta. Dieta. A vitamina B12 existe primariamente em 
alimentos de origem animal, não sendo encontrada em 
frutas e vegetais. As necessidades diárias são ínfimas 
(0,5-2 g/dia) 
Absorção. A absorção de vitamina B12 ocorre 
predominantemente no íleo terminal e depende de uma 
glicoproteína produzida pelas células parietais da 
mucosa gástrica, denominada “Fator Intrínseco” (FI). 
O complexo de vitamina B12/FI é captado pelos 
receptores das células epiteliais do íleo e a vitamina 
B12 é absorvida. 
O tipo mais comum de carência de vitamina B12 é 
representado pela Anemia Perniciosa, doença de 
natureza provavelmente imunológica, em que ocorre 
atrofia e inflamação crônica da mucosa gástrica 
(gastrite atrófica), levando à ausência concomitante de 
fator instrinseco e da secreção de ácido clorídrico, com 
consequente má absorção da vitamina B12. O 
diagnóstico de anemia perniciosa implica a presença 
de anemia megalobástica por carência de vitamina B12 
associada a gastrite atrófica, demostrada por exame 
anatomo-patológico obtido por biopsia endoscópica. 
Existem dois tipos básicos de gastrite: gastrite do tipo 
A (autoimune), que envolve o fundo e o corpo do 
estômago, poupando o antro, associada à anemia 
perniciosa; gastrite do tipo B (não imune), que 
compromete o fundo, o corpo e o antro. A gastrite do 
tipo A, além de estar associada à anemia perniciosa, 
envolve a presença de anticorpos contra células 
parietais e contra fator intrínseco, acloridria, níveis 
séricos reduzidos de pepsinogênio e níveis elevados de 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
gastrina. Por outro lado, na gastrite do tipo B, 
geralmente causada pela infecção pelo Helicobacter 
pylori, não ocorrem os fenômenos de autoimunidade e 
os níveis de gastrina são reduzidos pela destruição das 
células do antro 
Transporte e metabolismo. No plasma, a vitamina B12 
é transportada conjugada a duas proteínas 
denominadas transcobalamina I e II. A maior parte da 
vitamina B12 do plasma (cerca de 80%) está ligada à 
transcobalamina I, que tem um turn-over muito lento, 
sendo essencialmente inacessível aos tecidos; por isso, 
deficiência congênita de transcobalamina I e associada 
a baixos níveis séricos de vitamina B12, sem 
manifestações clínicas. Por outro lado, a pequena 
percentagem de vitamina B12 ligada à transcobalami II 
tem um turn-over muito rápido, e sua ausência 
congênita produz uma forma rara de anemia 
megaloblástica 
Outas causas. Gastrectomia total, Pacientes com 
obesidade mórbida, tratada cirurgicamente com curto-
circuito gástrico, pessoas idosas, etc 
Causas de carência de folatos 
A causa mais comum de carência de folatos é 
representada por dieta inadequada, por vezes associada 
a uma condição em que aumentam as necessidades 
diárias, habitualmente a gravidez ou o crescimento. De 
fato, a anemia megaloblástica da gravidez e a anemia 
megaloblástica do lactente são os dois tipos mais 
frequentes dessa deficiência 
Outras causas comuns são alcoolismo, idade avançada, 
doenças intestinais associadas à má aborção, pobreza e 
desnutrição. Em geral, deficiências de folato são 
resultantes da associação de mais de um mecanismo. 
Dieta. As principais fontes de folato na alimentação 
são os vegetais frescos, fígado e frutas; o cozimento 
excessivo pode remover ou destruir grande 
porcentagem do folato dos alimentos. As necessidades 
mínimas diárias são cerca de 50 g na criança e 100 g 
no adulto, e a quantidade mínima recomendada na 
dieta do adulto é de 400 g 
A carência alimentar do folato é observada em grupos 
de risco, como em indivíduos que subsistem com 
dietas inadequadas devido à pobreza e desnutrição, 
sendo geralmente acompanhadas de deficiência de 
ferro e proteína, em alcoólatras, em idosos, 
principalmente os institucionais, que se alimentam 
apenas de chás e bolachas, em indivíduos que se 
submetem a dietas rigorosas, e em crianças, em 
especial entre 2 a 18 meses de idade. 
Absorção. A má absorção de folatos pode ser causada 
por doenças intestinais crônicas com diarreia, como a 
doença celíaca, o espru tropical e a enterite regional, 
drogas como os anticonvulsivantes (difenil-
hidantoínas, primidona, carbamazepina, fenobarbital) e 
álcool. 
Aumento das necessidades. A demanda de ácido fólico 
aumenta em pessoas com intensa proliferação celular e 
a síntese de DNA, tais como: portadores de dermatites 
crônicas exfoliativas, anemias hemolíticas crônicas, 
neoplasias, gravidez e nos dois primeiros anos de vida. 
**Excluindo a má nutrição em crianças, a causa mais 
comumde anemia megaloblástica é a deficiência de 
folatos da gravidez, que ocorre em geral no 3º 
trimestre 
Erros inatos. Os erros inatos do metabolismo do folato 
são raros e compreendem a má absorção do folato 
Diagnóstico de Anemia Megaloblástica 
O diagnóstico é feito com base nas alterações 
características do sangue periférico e da medula óssea. 
Para o diagnóstico correto, em geral, três são as 
abordagens nesses pacientes: 
 A primeira é reconhecer se a anemia 
megaloblástica está presente 
 A segunda é distinguir entre as deficiências de 
vitamina B12 e folato; 
 A terceira é a determinação da causa. 
As manifestações megaloblásticas das deficiências de 
vitamina B12 e de folatos são clinicamente 
indistinguíveis a não ser pela história recente (ao redor 
de seis meses) na deficiência de folato e mais 
prolongada (três anos ou mais) na deficiência de B12. 
Além das manifestações de anemia (fraqueza, palidez, 
dispneia, claudicação intermitente) são importantes os 
sintomas gastrintestinais e as alterações da boca e 
língua. Graus variados de palidez, com pele cor de 
limão (combinação de palidez com leve icterícia) são 
comuns. 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
Hematologia 
Tutoria 1 
Uma das manifestações clássicas da anemia perniciosa 
é a perda de papilas da língua, que fica lisa, brilhante e 
intensamente vermelha (“língua careca”). 
**O quadro neurológico que acompanha a deficiência 
de vitamina B12 auxilia na diferenciação 
Avaliação Laboratorial 
Sangue periférico. Os principais achados são anemia 
macrocítica, leucopenia, trombocitopenia, 
acompanhados de anisocitose (eritrócitos de tamanhos 
diferentes), macrocitose com macro-ovalócitos, 
poiquilocitose (aumento do número de hemácias de 
formato anormal), e granulócitos polissegmentados. 
A contagem de reticulócitos é normal ou baixa, mas o 
cálculo do índice de reticulócitos corrigido indica 
anemia hipoproliferativa 
Resumindo!! Pancilopenia (diminuição das três 
linhagens de célula) associada a macrocitose. 
As principais alterações no esfregaço do sangue 
periférico são: 
 Eritrócitos: Macro-ovócitos, poiloquilocitose 
com esquistócitos, dacriocitos, corpúsculos de 
Howwel Jolly, anel de Cabot, eritoblastos, e 
até megablastos 
 Granulócitos: Hipersegmentação nuclear, com 
presença de neutrófilos segmentados 
 Leucócitos: Leucopenia com neutropenia, 
podendo os leucócitos chegar até abaixo de 
2.000/μL 
 Plaquetas: Trombocitopenia com 30.000 a 
100.000 plaquetas/μL 
Medula óssea. Há intensa hiperplasia da medula óssea, 
com acentuada hiperplasia da linhagem eritroide, que é 
composta por megaloblastos: eritroblastos mais 
volumosos que o normal, com núcleos com estrutura 
mais granular e menos condensada. Além disso, há 
grandes quantidades de aberrações citológicas, como 
megaloblastos gigantes ou com núcleos polilobulados, 
binucleado 
As alterações na série branca são representadas 
principalmente por mielócitos e metamielócitos de 
volume aumentado, contendo núcleo gigante. O ferro 
medular está aumentado em virtude da eritropoese 
ineficaz e geralmente há grande número de 
sideroblastos, mas só raramente há sideroblastos em 
anel. 
Dosagem de Vitaminas. Dosagem das vitaminas. Esses 
testes compreendem as dosagens de vitamina B12 
sérica, folato sérico e folato eritrocitário. Na 
deficiência de folatos, tanto o folato sérico quanto 
eritrocitário estão diminuídos, enquanto que os níveis 
de vitamina estão normais ou aumentados. Na 
deficiência de vitamina B12 os níveis de cobalamina 
estão geralmente baixos e os de folato normais. 
Entretanto, níveis subnormais ou mesmo normais de 
vitamina B12 podem ocorrer em indivíduos com 
carência, em especial idosos. 
Identificação da causa. A forma mais direta e simples, 
atualmente, de identificar a anemia perniciosa é a 
realização de endoscopia gástrica com biópsia nos 
pacientes em que se revela uma anemia megaloblástica 
com baixos níveis de vitamina B12. 
**Se houver sinais de gastrite atrófica, o diagnóstico 
provável é de anemia perniciosa 
O teste de Schilling avalia indiretamente a absorção de 
vitamina B12 e consiste na ingestão oral da vitamina 
B12 marcada, seguida de medida da vitamina radiativa 
excretada na urina no período de 24 horas após a 
ingestão oral: baixa excreção significa que pouca 
vitamina foi absorvida. 
Tratamento 
A mais importante medida no tratamento dessas 
anemias consiste em identificar a causa e removê-las, 
se possível. 
Nos casos em que há concomitância com carência de 
ferro, o tratamento deve ser simultâneo, caso contrário 
não haverá recuperação completa dos níveis de 
hemoglobina. 
Tratamento da carência de vitamina B12 
A anemia perniciosa deve ser tratada com vitamina 
B12 por via parenteral por toda a vida, uma vez que o 
defeito de absorção é irreversível 
**Por exemplo, injeções de 5 mg semanais no 
primeiro mês, seguidas de injeções de 5 mg mensais 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
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**Pacientes idosos com atrofia gástrica e má 
absorção por dificuldade de dissociação da vitamina 
B12 do alimento e vegetarianos beneficiam-se 
preventivamente com doses orais da vitamina em torno 
de 50 g/ dia (doses maiores podem ser usadas sem 
efeitos indesejáveis) 
Tratamento de Carência de Folato 
Correção da dieta, aumentando a ingestão de verduras 
Ácido fólico por via oral na dose de 5 mg/dia até que a 
causa da carência tenha sido removida. 
Resposta ao tratamento 
A melhora subjetiva acontece em 48 horas, com o 
restabelecimento da hematopoese normal 
A contagem do reticulócitos aumenta até atingir o pico 
no 5o-8o dia, e sua elevação é proporcional ao grau de 
anemia. A hemoglobina e o hematócrito começam a 
melhorar já na primeira semana, e a hemoglobina deve 
atingir o seu valor normal em cerca de um mês 
 
Anemia Falciforme 
A anemia falciforme é um exemplo clássico de uma 
alteração mínima na estrutura de hemoglobina capaz 
de provocar, sob determinadas circunstâncias, uma 
singular interação molecular e drástica redução na sua 
solubilidade. 
Eritrócitos “peculiarmente alongados e em forma de 
foice” foram descritos pela primeira vez por Herrick, 
em 1910, no sangue de um indivíduo anêmico de 
origem africana. 
No Brasil, o primeiro registro de anemia falciforme foi 
em 1933 
Explicação Genética 
A alteração molecular primária na anemia falciforme é 
representada pela substituição de uma única base no 
códon 6 do gene da globina , uma adenina (A) é 
substituída por uma timina (T) (GAG GTC). 
A mutação pontual GAG→GTG (6-GluVal) cria o 
gene ß
S
. Todo ser humano possui duas cópias (alelos) 
do gene da ß-globina. Somente aqueles que são 
homozigotos para o gene ß
S
 (isto é, os dois alelos são 
do tipo ß
S
) desenvolvem a “doença” anemia 
falciforme. Indivíduos que herdam apenas uma cópia 
do ß
S
 em associação a outro alelo qualquer possuem o 
que se chama de “variante falcêmica” (heterozigotos 
para o gene ß
S
). 
Relação com a malária: 
A elevada prevalência do ßS em certas populações é 
explicada pelo processo de seleção natural: quando em 
heterozigose com o gene ß normal (traço falcêmico), 
ele confere uma vantagem biológica ao proteger o 
indivíduo contra as formas graves de malária! 
Quando o Plasmodium invade a hemácia portadora do 
traço falcêmico, a HbS presente nessa célula se 
desnatura de forma extremamente rápida. Tal 
fenômeno se acompanha de uma modificação 
antigênica na membrana plasmática: agregação da 
proteína banda 3. Autoanticorpos anti-banda 3, 
fisiologicamente presentes na circulação, opsonizam a 
superfície externa das hemácias parasitadas, 
aumentando a taxa de eritrofagocitose (remoção de 
hemácias pelo baço). O rápido clearance dessas células 
impede o surgimento de altos níveis de parasitemia 
Epidemiologia 
Estima-se que entre 8-10% dos negros norte-
americanos possuam pelomenos uma cópia do gene 
ßS; 
No Brasil, os dados são menos precisos, e variam 
conforme a região (fato explicado pelas diferentes 
participações do negro africano na formação da 
sociedade de cada local): a anemia falciforme incide 
em 1 a cada 500 nascimentos na Bahia, 1 a cada 1.200 
no Rio de Janeiro e 1 a cada 8.000 no Rio Grande do 
Sul. 
Fisiopatologia 
A substituição do ácido glutâmico por valina na 
posição 6 ocorre na superfície da molécula, sem 
provocar alterações significativas na sua conformação 
global. A hemoglobina S na conformação oxi é 
isomorfa à hemoglobina normal, sugerindo que a 
estrutura das duas moléculas (exceto pela substituição 
do aminoácido) são similares. 
 
 
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A polimerização da hemoglobina S é o evento 
fundamental na patogenia da anemia falciforme, 
resultando na alteração da forma do eritrócito e na 
acentuada redução de sua deformabilidade 
Todas as hemácias contendo predominantemente 
hemoglobina S podem adquirir a forma falciforme 
clássica após a desoxigenação, em decorrência da 
polimerização intracelular da desoxi-Hb S, processo 
normalmente reversível após a reoxigenação. No 
entanto, a repetição frequente desse fenômeno provoca 
lesão de membrana em algumas células, fazendo com 
que a rigidez e a configuração em foma de foice 
persistam mesmo após a reoxigenação. Assim, esses 
eritrócitos, denominados genericamente “células 
irreversivelmente falcizadas” ou células densas, retêm 
permanentemente a forma anormal, mesmo na 
ausência de polimerização intracelular de hemoglobina 
Em decorrência da sua acentuada rigidez, as células 
irreversivelmente falcizadas tem vida-média reduzida e 
contribuem significativamente para anemia hemolítica 
dos pacientes. 
O quadro clínico depende da ocorrência de lesões 
orgânicas causadas pela inflamação e da obstrução 
vascular e das chamadas “crises de falcização”. Nos 
períodos entre as crises, a “fase estável”, os pacientes 
evoluem praticamente assintomáticos, a despeito da 
anemia persistente, com níveis de hemoglobina 
variáveis, mas, em geral, ao redor de 8 g/dL. 
Vaso-Oclusão Capilar 
Atualmente, acredita-se que o fenômeno vaso-oclusivo 
compreende um processo com várias etapas que 
envolve interações de hemácias, leucócitos ativados, 
células endoteliais, plaquetas e proteínas do plasma. A 
liberação intravascular de hemoglobina pelas hemácias 
fragilizadas, além da vaso-oclusão recorrente e dos 
processos de isquemia e reperfusão, leva a dano e 
ativação das células endoteliais da parede do vaso. 
Como consequência há indução de uma resposta 
inflamatória vascular e adesão de células brancas e 
vermelhas à parede dos vasos sanguíneos. Tal fato, 
associado a uma redução na biodisponibilidade de 
Óxido Nítrico (NO) no interior do vaso e ao estresse 
oxidativo, pode ocasionar, em alguns casos, uma 
redução no fluxo sanguíneo e, finalmente, a vaso-
oclusão. 
Acredita-se que existam duas etapas sucessivas: 
1. Adesão de hemácias ao endotélio das vênulas pós-
capilares (em geral formas jovens de hemácia, 
como os reticulócitos), lentificando o fluxo 
sanguíneo local; 
2. Impactação e empilhamento de hemácias a 
montante, inicialmente as ISC (mais viscosas e 
menos deformáveis) e posteriormente hemácias 
não afoiçadas. A estase sanguínea subsequente 
produz hipóxia e acidose, o que faz o afoiçamento 
se generalizar criando a obstrução microvascular 
propriamente dita, que culmina em isquemia 
tecidual. 
A adesão de hemácias ao endotélio pode ocorrer 
espontaneamente, mas sabemos que ela é modulada 
por fatores exógenos como infecções, desidratação, 
exposição ao frio e diversas outras formas de 
“estresse” (incluindo o estresse emocional). Tais 
fatores não só aumentam a chance de polimerização da 
HbS como também estimulam diretamente a resposta 
inflamatória, sobrepondo-se ao estímulo inflamatório 
crônico promovido pela hemólise intravascular 
constante. 
A agudização do estado inflamatório crônico “ativa” 
ainda mais as células endoteliais, aumentando 
transitoriamente a exposição de moléculas 
adesiogênicas em sua interface com o sangue – um 
verdadeiro “estopim” para que um grande número de 
hemácias fiquem presas na microcirculação! 
A isquemia tecidual evidentemente irá produzir focos 
de necrose nos órgãos envolvidos. A disfunção 
orgânica na anemia falciforme apresenta um curso 
crônico e progressivo, pois a vaso-oclusão capilar 
constante somam-se episódios intermitentes de 
agravamento. Curiosamente, a isquemia localizada 
também estimula a disfunção endotelial sistêmica: 
mediadores inflamatórios, liberados pelos tecidos 
infartados, exercem efeitos sistêmicos (à distância) que 
modificam a biologia vascular de todo o organismo! 
Assim, podemos afirma que a vaso-oclusão repetitiva 
da microvasculatura é um fator adjuvante que, junto à 
hemólise intravascular ininterrupta, produz inflamação 
sistêmica e disfunção endotelial! 
Manifestações clínicas 
 
 
Carolina Lucchesi | Medicina UNIT 
 
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Apenas quando os níveis de HbF declinam 
significativamente aparecem os primeiros sinais e 
sintomas da doença, em geral após os seis meses de 
idade. 
Os pacientes com doença falciforme apresentam 
períodos sem manifestações clínicas, que pode ser 
interrompida por manifestações agudas, denominadas 
crises de falcização: 
Crises vaso-oclusivas. Frequência e a gravidade das 
crises variam. Os fatores desencadeantes incluem 
infecção, desidratação e tensão emocional de qualquer 
natureza. As crises dolorosas são mais frequentes na 
terceira e quarta décadas de vida, e a taxa de 
mortalidade é mais alta em adultos que as apresentam 
com maior frequência. A forma mais comum de crise 
álgica é a “crise esquelética”. As crises dolorosas 
típicas atingem principalmente ossos longos, 
articulações e região lombar. Outras regiões podem 
também ser afetadas, como couro cabeludo, face, tórax 
e pelve. Episódios agudos de dor e inchaço de mãos e 
pés (síndrome das mãos e pés ou dactilite) são 
frequentes em crianças entre seis meses e dois anos de 
idade, e extremamente raras após os sete anos de 
idade. A “crise abdominal” é causada por 
isquemia/microinfartos no território mesentérico, 
geralmente evoluindo com resolução espontânea e sem 
maiores complicações, mas pode simular abdome 
agudo (descompressão dolorosa). O tratamento é 
sintomático e, se os sinais persistirem, é importante 
afastar o diagnóstico de osteomielite. A eliminação 
completa da dor é um objetivo irreal. 
Aplásticas. Queda acentuada nos níveis de 
hemoglobina, acompanhada de níveis de reticulócitos 
reduzidos, caracterizando insuficiência transitória da 
eritropoese. Em geral, desencadeada pelo parvovírus 
B19 e ocorre, em 68% dos casos, em crianças. Em 
adultos são mais as infecções por Streptococcus 
pneumoniae, salmonelas e pelo vírus Epstein-Barr, 
além de necrose medular óssea extensa, com febre, dor 
óssea, reticulocitopenia e reação leucoeritroblástica. 
Crise megaloblástica. A insuficiência medular pode 
resultar da deficiência de ácido fólico, especialmente 
durante a gravidez. Há queda da hemoglobina 
acompanhada por um aumento do VCM (macrocitose). 
Costuma ser causada pelo esgotamento das reservas 
endógenas de folato, que duram poucos dias nos 
estados hemolíticos crônicos se o paciente não ingerir 
quantidades suficientes. Às vezes existe também um 
componente de deficiência de B12, em particular nos 
indivíduos que apresentam outros motivos. O 
tratamento é feito com hemotransfusões simples 
conforme a necessidade, aliada à reposição da vitamina 
deficitária. A profilaxia é feita com ácido fólico 1 
mg/dia. 
Crise de sequestro esplênico. Episódio agudo 
caracterizado pelo acúmulo rápido de sangue no baço. 
É definida pela queda nos níveis basais de 
hemoglobina de pelo menos 2 g/dL, hiperplasiacompensatória de medula óssea e aumento rápido do 
baço. Ocorre, em geral, após o sexto mês de vida, e 
torna-se menos frequente após os dois anos de idade. O 
baço de um falcêmico adulto é absolutamente atrófico 
e fibrosado, sem condições de albergar uma crise de 
sequestro. Cerca de 30% das crianças falcêmicas vão 
desenvolver sequestro esplênico. Em até 15% das 
vezes o episódio inicial é fatal. A taxa de recidiva é de 
50%. Após o primeiro episódio, já se indica a 
esplenectomia cirúrgica profilática. O tratamento 
agudo das crises de sequestro consiste na reposição 
volêmica com hemotransfusão. 
Crises hemolíticas. Também denominadas de crises 
hiper-hemolíticas, derivam de um incremento brusco 
na taxa de hemólise. Esse tipo de crise é raro e 
aparentemente está relacionado a infecções por 
Mycoplasma, deficiência de G6PD ou esferocitose 
hereditária associadas. A principal crise hiper-
hemolítica da AF é a Reação Hemolítica Tardia. As 
manifestações clínicas podem incluir agravamento da 
anemia e acentuação da icterícia. No entanto, antes de 
fazer o diagnóstico de crise hemolítica, devem ser 
afastadas outras causas mais frequentes de elevação 
dos níveis de bilirrubinas, como obstrução por cálculo 
de vesícula, hepatite ou falcização com colestase intra-
hepática. 
Diagnóstico 
1. Queda leve a moderada da hemoglobina e do 
hematócrito; 
2. Reticulocitose (entre 3-15%); 
3. Hiperbilirrubinemia indireta; 
4. Aumento de LDH; 
5. Queda da haptoglobina. 
 
 
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A reticulocitose provoca um aumento “artificial” do 
VCM se o portador não apresenta VCM “normal alto” 
ou francamente alto, deve-se suspeitar da coexistência 
de ferropenia. As hemácias falcêmicas são 
normocrômicas (hipocromia também sugere 
ferropenia). 
Esperam-se contagens de leucócitos e plaquetas 
aumentadas, além de elevação dos “marcadores de fase 
aguda”. 
O esfregaço de sangue periférico é relativamente 
específico, sugerindo o diagnóstico no contexto 
apropriado. Observam-se: 
 Hemácias irreversivelmente afoiçadas – as 
ISC; 
 Policromasia – indicativo de reticulocitose; 
corpúsculos Howell-Jolly – sinal de asplenia; 
 Hemácias “em alvo” – indício genérico de que 
existe uma hemoglobinopatia. 
Geralmente é confirmado por meio da eletroforese de 
hemoglobina. Outros exames capazes de confirmar o 
diagnóstico são a Cromatografia Líquida de Alta 
Performance (HPLC) e a análise genética. Os testes de 
afoiçamento e de solubilidade da hemoglobina não 
diferenciam entre AF e as variantes falcêmicas, logo, 
só podem ser usados como testes de rastreio. 
 
Rastreio 
Pré-natal: Nas gestações onde existe risco de HbSS no 
concepto pode-se realizar o diagnóstico por meio da 
biópsia de vilo coriônico, coletada entre 8-10 semanas 
de gestação e submetida à análise genética. 
Neonatal: teste do pezinho 
Tratamento 
Todos os pacientes com anemia falciforme devem ser 
acompanhados por um médico hematologista. Existem 
quatro condutas básicas que comprovadamente 
diminuem a morbimortalidade. Tal conjunto de 
medidas é denominado Terapia Modificadora de 
Doença e está embasado por evidências científicas 
robustas: 
 Profilaxia contra o pneumococo; 
 Reativação da síntese de HbF; 
 Hemotransfusão; 
 Uso de quelantes de ferro. Com exceção da 
profilaxia contra o pneumococo, nem sempre 
os outros três serão indicados 
Profilaxia contra Pneumococo. A principal causa de 
óbito em crianças falcêmicas (entre 1-3 anos) é a 
infecção por germes encapsulados, com destaque para 
o Streptococcus pneumoniae (pneumococo). São 
indicados a vacinação antipneumocócica e o uso 
profilático de penicilina. 
Reativação da Síntese de Hemoglobina Fetal. Por um 
mecanismo desconhecido, a Hidroxiureia (HU) – um 
quimioterápico inibidor da ribonucleotideo-redutase – 
aumenta os níveis de HbF. Hematologicamente, ocorre 
melhora da anemia e queda na contagem de 
reticulóticos, leucócitos e plaquetas. Clinicamente, 
diminui a frequência de crises álgicas, incluindo os 
episódios de síndrome torácica aguda, além de haver 
uma redução na necessidade de hemotransfusão. 
Principais indicações: 2 ou mais crises álgicas por ano 
com necessidade de internação; presença de disfunção 
 
 
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orgânica relacionada à AF; anemia profunda com 
reticulócitos >250.000; paciente com indicação de 
hemotransfusão crônica que apresente aloimunização 
importante; prevenção secundária da STA 
Hemotransfusão. Existem duas modalidades básicas de 
hemotransfusão na AF: (1) transfusão simples; (2) 
transfusão de troca parcial (exsanguinitransfusão 
parcial). Ambas podem ser realizadas de maneira 
episódica, mas quando é necessário transfundir 
cronicamente o paciente indica-se apenas a transfusão 
de troca parcial, já que com este procedimento o risco 
de sobrecarga de ferro é menor. Os alvos de Hb e Ht 
são os mesmos: 10 g/dl e 30%. No entanto, além de 
aumentar Hb e Ht, a transfusão de troca possui uma 
vantagem adicional: redução na quantidade de HbS 
circulante. Neste procedimento, objetiva-se manter a 
proporção de HbS < 30%. As principais complicações 
transfusionais são a aloimunização, a sobrecarga de 
ferro e as infecções virais hemotransmissíveis. 
Quelação do Ferro. Indivíduos que necessitam de 
hemotransfusões repetitivas ao longo da vida estão sob 
risco de desenvolver sobrecarga de ferro 
(hemocromatose secundária). A hemocromatose, ao 
danificar múltiplos órgãos e tecidos (ex.: cirrose 
hepática, miocardiopatia dilatada, insuficiência 
pancreática) reduz a expectativa de vida. Seu 
tratamento, baseado no uso de quelantes de ferro. 
Os principais quelantes de ferro disponíveis são: (1) 
deferoxamina – utilizada pela via endovenosa ou 
subcutânea; (2) deferasirox – utilizado pela via oral. 
Indicações: ferritina sérica > 2.000 mcg/l; Fe hepático 
>2.000 mcg/g de peso a seco; história de transfusões 
por > 1 ano; RNM cardíaca e/ou hepática positiva para 
excesso de Fe. 
Terapias Adjuvantes 
Reposição de Folato e Outras Vitaminas. Reposição 
contínua de 1 mg/dia de ácido fólico (dose profilática). 
Existem evidências crescentes de que os falcêmicos 
talvez se beneficiem da reposição das vitaminas A, C, 
D e E, além de outros agentes imunoestimulantes e 
antioxidantes como zinco e acetilcisteína. 
Flebotomia. Nos raros pacientes que apresentam 
espontaneamente uma Hb ≥ 9,5 g/dl, um protocolo de 
flebotomias quinzenais pode ser instituído, visando à 
redução da hiperviscosidade. A conduta consiste na 
retirada de 10 ml de sangue/ kg de peso em 20-30min 
(com reposição de igual volume de salina isotônica), 
repetindo-se o procedimento até que um alvo de Hb 
entre 9-9,5 g/dl seja atingido 
Eritropoietina/Darbopoietina. É possível que haja 
benefício nos casos que apresentam Hb < 9 g/dl e 
contagem de reticulócitos < 250.000/ml (o que na AF 
configura uma reticulocitopenia relativa). A dose deve 
ser titulada até que se obtenham níveis de hemoglobina 
em torno de 10 g/dl (acima disso existe risco de 
hiperviscosidade). 
Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas. O 
transplante de células-tronco hematopoiéticas 
representa a única chance de CURA da AF. O 
transplante, no entanto, não é indicado de rotina devido 
à dificuldade em se obter doadores compatíveis e 
também – principalmente – devido à elevada 
morbimortalidade do procedimento em si. O 
transplante pode ser indicado nas crianças HbSS que 
têm fenótipo mais agressivo, com anemia profunda 
refratária à HU e múltiplas disfunções orgânicas 
precoces. A fonte das células-tronco pode ser a medula 
óssea ou o cordão umbilical de um doador HLA-
compatível. 
Decitabina. Evidências preliminares sugerem que 
talvez seja útil até mesmo em pacientes refratários à 
HU 
Inibidores da Desidratação de Hemácias. 
Antiplaquetáriose Anticoagulantes. 
Ácido Ômega-3. 
Terapias Experimentais. Uso de inibidores da adesão 
eritrocitária ao endotélio (ex.: imunoglobulina 
antiPSGL), estimulantes da síntese de óxido nítrico 
(ex.: glutamina) e fitoterápicos de mecanismo incerto, 
para os quais há relatos anedóticos de benefício (ex.: 
Niprisan).

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