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solu??es sentidos12/Relacionar_Recordar.docx Sentidos 12, Relacionar/Recordar Cenários de resposta Página(s) Cenário de resposta 349 2. O aluno poderá focar aspetos como: Introdução: As obras dos autores em questão ilustram diferentes perspetivas do sentimento amoroso. Desenvolvimento: Lírica camoniana: presença do amor neoplatónico, sentimento idealizado que permite ao poeta o acesso ao Bem; este reflete também sobre as pulsões físicas do amor, mostrando a necessidade da experiência física (tensão patente no soneto “Transformase o amador na cousa amada”); O ano da morte de Ricardo Reis: tema associado à personagem Reis, que mantém relacionamentos diferentes que correspondem a visões distintas do amor: com Lídia, vive um amor físico, sem assumir nenhum tipo de sentimento emocional (o que fica patente nos diferentes encontros ao longo da obra e na atitude de indiferença de Reis face à gravidez de Lídia); com Marcenda, a relação ilustra um tipo de amor contemplativo, incapaz de se concretizar (as personagens não conseguem tornar o sentimento real ou físico – entre eles aconteceu apenas a troca de um beijo e um pedido de casamento pouco convicto). Conclusão: As obras evidenciam diferentes perspetivas do amor, tanto do ponto de vista reflexivo como experiencial. 3. a. Representação da mulher na literatura Tópicos que o aluno poderá abordar: − Mulher na poesia trovadoresca: donzela que vive em ambiente rural, caracterizada pela sua simplicidade e pela naturalidade, espontaneidade dos seus sentimentos (ex.: “Ondas do mar de Vigo” e “Bailemos já todas três, ai amigas”). − Mulher na lírica camoniana: mulher, representante da realidade extraterrena, marcada pela perfeição física e moral, capaz de elevar o poeta a outra dimensão (ex.: “Ondados fios de ouro”). − Mulher no conto “George”: mulher que possui a ânsia de liberdade desde jovem; no presente, vive reconfortada com o seu êxito como pintora e com as repercussões financeiras que este lhe traz. É, contudo, inconstante no amor e de personalidade complexa (muda constantemente a cor dos cabelos, não possui nada de seu, mora em casas alugadas, desfaz-se dos livros; nada possui do passado, com exceção de uma fotografia sua quando jovem) e receia o seu futuro de solidão e degradação física. b. A crítica da literatura Tópicos que o aluno poderá abordar: As obras denunciam aspetos negativos que corrompem a sociedade: − Os Lusíadas: o poeta denuncia o poder do dinheiro e a corrupção que ele traz, associada à traição e à mentira. − “Sermão de Santo António”: Vieira denuncia também a ganância e a traição associadas à busca do poder material, representadas alegoricamente por meio do polvo ou do voador. − Os Maias: o poder do dinheiro é perspetivado criticamente como não sendo garantia de elegância ou de autenticidade, o que fica patente nos episódios que denunciam o provincianismo de uma sociedade que não conhece os comportamentos a adotar numa corrida de cavalos ou num sarau literário. c. A reflexão existencial Tópicos a abordar pelos alunos: A reflexão existencial está presente em diversos autores, que procuram uma resposta filosófica para encontrar o caminho de uma existência que se possa revelar significativo para o ser humano ou que possa constituir uma resposta para as dúvidas e angústias inerentes ao próprio facto de existir: − Alberto Caeiro: defende uma vida simples, ao ritmo da Natureza, onde a razão e o pensamento não têm lugar porque trazem a tristeza e a infelicidade ao ser humano (ex.: “O guardador de rebanhos”). − Ricardo Reis: advoga uma vida pautada pelo estoicismo e pelo epicurismo que permitem ao ser humano minimizar a dor provocada pela consciência da morte pela redução ao mínimo das suas consequências (ex.: “Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio”). − Álvaro de Campos: sustenta, na segunda fase literária, uma vida pautada pelo excesso das sensações como forma de aproveitar ao máximo a existência, procurando as sensações limite, indo até além do que é humano (ex.: “Ode triunfal”). − Antero de Quental: manifesta uma angústia existencial, assumindo um tom desiludido e uma postura pessimista perante a fragilidade humana (ex.: “Nox” e dúvida perante a ação de Deus). 1 solu??es sentidos12/Unidade 1 - Fernando Pessoa, Poesia do ort?nimo.docx Sentidos 12, Unidade 1 – Fernando Pessoa, Poesia do ortónimo Cenários de resposta Página(s) Domínio / texto Cenário de resposta 26 Compreensão/Expressão Oral 1.1. a. Situação político-social − Assassinato do rei D. Carlos e do príncipe Luís Filipe. − Implantação da República a 5 de outubro de 1910. − Início da Primeira Guerra Mundial no verão de 1914 (após assassinato do arquiduque Augusto Fernando, herdeiro do trono austro-húngaro). − Portugal tenta manter-se afastado do conflito, uma vez que procura sanar as dificuldades do início da República. − Declaração de guerra a Portugal, por parte da Alemanha, em 1917, o que obriga o país a entrar no conflito. − Golpe militar (1917) leva Sidónio Pais ao poder. − Fernando Pessoa acredita ver em Sidónio Pais a personificação do regresso de D. Sebastião. − Golpe militar de 28 de maio de 1926 e instauração da Ditadura Militar. − Nomeação de Oliveira Salazar como ministro das Finanças. − Agitação política a nível europeu durante a década de 1930. − (Acontecimentos sumariados após 1935 – Segunda Guerra Mundial, Guerra Colonial e a Guerra Fria, anos dourados do cinema, o advento da televisão…) b. Movimentos estético-culturais, objetivos e formas de divulgação − Publicações de Fernando Pessoa: A Águia, O Jornal, República, Renascença, O Raio… − Publicação, em 1915, do 1.º número da revista Orpheu e consequente polémica (discussão entre a admiração e o escárnio, o atrevimento e a vanguarda de uma nova geração: Fernando Pessoa e Álvaro de Campos, Mário de Sá-Carneiro, Almada Negreiros, Amadeo de Souza-Cardoso, Santa-Rita Pintor – a geração do Orpheu). − Almada Negreiros sintetiza, No Ultimatum futurista às gerações portuguesas, a crítica: “o povo completo será aquele que tiver reunido no seu máximo todas as qualidades e todos os defeitos: coragem, portugueses, só vos faltam as qualidades”. − O Modernismo (estética, autores). − Publicação do segundo Orpheu. O escândalo repete-se. − Em Paris, a depressão de Sá-Carneiro acentua-se e, depois de intensa correspondência com Fernando Pessoa, põe termo à vida, em abril de 1916. Morrem, pouco depois, Santa-Rita e Souza-Cardoso. O Modernismo sobrevive, mas dispersa-se em múltiplas direções e Fernando Pessoa segue o seu próprio caminho. − O Modernismo tem o segundo fôlego com a revista Presença. Logo nos primeiros números, José Régio reconhece Fernando Pessoa como mestre da nova geração. c. Dados biográficos de Fernando Pessoa − Nascimento no Largo de S. Carlos no dia 13 de junho. − Torna-se órfão de pai aos 5 anos; pouco depois morre o irmão Jorge com meses de idade. A mãe casa com o cônsul português em Durban e a família parte para a África do Sul. − Fernando Pessoa cresce, estuda e escreve sempre que pode, em português ou inglês, na língua que o poema falar, e cria os seus primeiros heterónimos. − Regressa a Portugal, com cerca de 17 anos. − Frequenta a Faculdade de Letras, torna-se empregado de escritório e traduz cartas comerciais. − Muda de casa constantemente e publica um pouco por toda a imprensa. − Amizade com Mário de Sá-Carneiro, um génio precoce que na adolescência já traduzia Goethe e Schiller, filho de famílias abastadas da alta burguesia. − Depois da morte do padrasto, a mãe e os irmãos de Fernando Pessoa regressam a Portugal e instalam-se no n.º 16 da rua Coelho da Rocha. Fernando Pessoa fixa-se, finalmente, na casa onde viverá até ao fim da sua vida. − Relação (“desjeitada” e relativamente curta) com uma jovem de nome Ofélia Queirós. − Perde a mãe em 1925 e entrega-se cada vez mais ao álcool. Vive obcecado com a sua obra e tem constantes crises depressivas. Por isso, a reaproximação a Ofélia Queirós volta a terminar pouco tempo depois do reatamento. − Publica o seu primeiro livro de poesia em português, em 1934: Mensagem. A obra é premiada pelo Secretariado da Propaganda Nacional, mas Pessoa falta à cerimónia. − Morre a 30 de novembro de 1935. d. Heterónimos pessoanos − Cria os primeiros heterónimos, Chevalier de Pas, com cerca de 6-7 anos de idade, e Alexander Search. − Criou, numa só noite, três heterónimos: o mestre, Alberto Caeiro; o médico e classicista, Ricardo Reis e o engenheiro futurista, Álvaro de Campos. Eram três personalidades distintas, com uma história própria, qualquer deles candidato a melhor poeta do seu tempo. − Terá inventado, ao longo da vida, mais de 70 heterónimos. Mas os três que ali nasciam eram mais que estilos de escrita. − Fernando Pessoa “viveu” com Bernardo Soares durante 20 anos, escrevendo na sombra quase doentia (aparece sempre que Pessoa está cansado ou sonolento. É um semi-heterónimo porque, não sendo a personalidade a dele, é uma mutilação dela). e. Particularidades genéricas do Livro do desassossego − Publicado em 1982. − Bernardo Soares, o semi-heterónimo, é o autor desse livro. − Caracterizado como um livro interminado, um livro impossível, sobre o qual os intervenientes destacam o hibridismo (valter hugo mãe), a surpresa, ideias intensas que se entrechocam. − Composto por mais de mais de 500 textos escritos à solta, sem um sentido concreto, sem princípio, nem meio, nem fim que refletem a solidão profunda de quem vive em sonho. − Livro traduzido em várias línguas. f. Intervenientes: profissões e opiniões Jerónimo Pizarro: editor e investigador − Considera Pessoa um dos maiores autores do século XX e afirma que Portugal é praticamente o único país que no século XX desafiou o grande autor e grande épico da literatura – Camões. Fernando Cabral Martins: professor na Universidade Nova de Lisboa − Diz que houve toda uma euforia de marchandise em torno do Pessoa que ganhou um peso cultural específico. − Fernando Pessoa é sozinho o modernismo português. José Eduardo Agualusa: escritor − Afirma que há muitos brasileiros que estão convencidos que Fernando Pessoa era brasileiro, tal como Eça de Queirós, que foi mais lido no Brasil do que em Portugal. − Pessoa é um génio que consegue ir além dos limites normais. Carlos Coelho: especialista em criação e gestão de marcas − A marca Fernando Pessoa é uma das primeiras linhas do património endógeno do país. Ele tinha muitos “eus” e isso é também característico da marca. Inês Pedrosa: diretora da Casa Fernando Pessoa − Fernando Pessoa é um ícone gráfico. − O facto de Fernando Pessoa escrever sob vários nomes, e de criar polémicas consigo próprio, mostra que ele não acreditava em movimentos, não acreditava em rebanhos em sentido cultural nem em sentido político. Ele ultrapassou muito a questão da época e é por isso que continua tão atual. − A pátria de Pessoa era Lisboa. Carlos Amaral Dias: psiquiatra − Destaca a presença de uma avó maníaco-depressiva que pode ter tido grande impacto na vida de Pessoa. Evidencia, ainda, o facto de, em Pessoa, se verificar a procura de um génio imaginário, alguém com quem se pode falar, dialogar, que corresponde a um duplo, a um “eu” que somos “nós próprios”. valter hugo mãe: escritor − Pessoa não foi um génio, foi cinco ou seis génios. Seria um ser humano esdrúxulo, eventualmente um louco. − É absolutamente fascinante perceber que o escritor máximo do Modernismo português poderia ser o escritor máximo do nosso pós-Modernismo. Ainda estamos muito longe de o esgotar. António Cícero: poeta − Pessoa devia chamar-se Fernando Pessoas. − Refere que quando Pessoa criou um poema como Mensagem, tal como Homero com a Ilíada, fez uma coisa memorável que muda a própria língua portuguesa e Portugal. 26 Escrita 1. Proposta de planificação do texto: Introdução: A genialidade de Pessoa e o impacto cultural que teve. Desenvolvimento: Breves referências biográficas: data e local de nascimento; partida para a África do Sul; regresso a Portugal e entrega à escrita; a criação de três grandes heterónimos e de um semi-heterónimo; revistas em que colaborou com destaque para o Orpheu, seus colaboradores e intenções. Conclusão: Reforço da incomparável genialidade de Fernando Pessoa, o único que igualou ou suplantou Camões. 27 Leitura 1. O autor nutre grande admiração por Fernando Pessoa, considerando-o a maior personalidade literária de Portugal e um poeta genial. Fundamenta a sua opinião com as afirmações de académicos de renome internacional, como Harold Bloom ou Eduardo Lourenço. 2. Esta publicação dará a conhecer a obra de Fernando Pessoa ao público em geral e fá-lo-á de forma cientificamente correta. A preocupação de usar textos fixados e trabalhados por alguns dos maiores especialistas pessoanos e editados por uma editora de referência como a INCM são aspetos que lhe conferem credibilidade e fiabilidade. 3. Trata-se de um artigo/texto de apreciação crítica, que se baseia na análise de uma publicação e que expressa o ponto de vista do autor. Este faz juízos de valor sobre vários aspetos, visíveis em afirmações como “Pessoa é a maior personalidade literária de Portugal” (l. 20), “A oportunidade de ler ou reler Fernando Pessoa, prefaciado por alguns dos maiores especialistas e amantes da sua obra, é um privilégio” (ll. 28-29), que evidenciam marcas de subjetividade, confirmadas na linguagem valorativa utilizada. 28 Informar 1. Os dois textos destacam o tom dramático da poesia do ortónimo, tom que resulta da encenação, do fingimento, de que se reveste a criação poética e/ou artística. Esta implica o abandono das emoções ou, melhor, a sua intelectualização. 29 Educação Literária 1. A poesia passa por diferentes etapas quer ao nível da produção quer ao nível da receção. Assim, o ponto de partida da produção é a sensação (“a dor sentida”); segue-se a dor recriada, transformada pela imaginação, originando uma síntese, ou seja, uma nova dor. É a esta última que o leitor acede, o que significa que o processo de receção se distancia dos dois inerentes à produção. 2. O poema pode dividir-se em três partes, correspondendo a cada uma das quadras, em que são apresentados conceitos diferentes. Na primeira estrofe é possível efetuar uma subdivisão, atendendo a que o verso 1 apresenta a ideia-chave que será explicitada nos versos seguintes (a tese de que o fingimento é inerente ao ato criativo). Na segunda quadra, confirma-se que o leitor não acede à dor do poeta, até porque a dor foi metamorfoseada. Na última quadra distingue-se o coração da razão, para evidenciar o engano a que os sentimentos conduzem e que o poeta terá de abandonar forçosamente, dado ser-lhe exigido o uso da razão. 3. Neste poema, Fernando Pessoa esclarece o modo como a poesia se constrói, afirmando que “o poeta é um fingidor” (v. 1). Implicitamente, defende a ideia de que a criação artística é um processo intelectual que se afasta do mero mimetismo. 4. O texto A refere especificamente o título e alguns versos do poema pessoano; o texto B faz referência ao fingimento como algo implícito à criação poética. No fundo, ambos os textos descodificam, em parte, a tese “o poeta é um fingidor” apresentada no poema “Autopsicografia”. 29 Expressão oral 1. Resposta de caráter pessoal. No entanto, os alunos poderão abordar/desenvolver os seguintes tópicos: − o tema do diálogo é o sentido da existência humana; − a necessidade de saber “por que existimos” parece não ser importante para o interlocutor de Mafalda seja porque nunca se questionou sobre o assunto seja porque a existência é um fim em si mesma, não necessitando, portanto, de explicação; − embora a personagem Mafalda apresente um ar “reflexivo” e, de certa forma, “apreensivo”, o seu interlocutor ostenta uma atitude bastante descontraída face à complexidade do tema; conclui-se que Filipe atribui pouca importância à questão; − entre o sujeito poético de “Autopsicografia” e o interlocutor de Mafalda são notórias as diferenças: à atitude reflexiva e à intelectualidade de Pessoa, opõe-se a superficialidade e a leviandade intelectual de Filipe, que se mostra ansioso pela resolução do “problema”, não importando a resposta que irá obter. 30 Educação Literária 1. Fingir, segundo o sujeito poético, é sentir com a imaginação; mentir será, por isso, sentir apenas, usar unicamente o coração, os sentimentos. 2. O coração é o ponto de partida para a imaginação, ou seja, o poeta parte do que sente, mas recria o sentimento através da razão, afastando-se, assim, do que inicialmente sentiu. No fundo, é a imaginação que distancia o artista do homem comum. 3. O verso significa que aquilo que está além do mundo terreno, o que se encontra no mundo superior, a que se acede por meio do intelecto, é o que o poeta deve alcançar, até porque esse é o espaço da perfeição. 4. Sendo a escrita um ato artístico, que exige o recurso à imaginação, percebe-se a necessidade de se afastar daquilo que “está ao pé” (v. 12) – as sensações imediatas, os sentimentos, pois estes enleiam, enganam. 5. Com a interrogação, o sujeito poético está a conferir um estatuto de menoridade ao leitor, comparativamente ao artista, pois este precisa de usar a imaginação. Por isso, ironicamente, ordena que o leitor se limite a sentir, como se visse nele a incapacidade de usar a razão. 6. Trata-se de um poema composto por três quintilhas, todas com seis sílabas métricas. A rima é cruzada e emparelhada, atendendo ao esquema rimático: ababb / cdcdd / efeff. 7. Complemento direto. 8. “que” – conjunção subordinativa completiva; “ou” – conjunção coordenativa disjuntiva. 9. Tem valor conclusivo. 10. Oração subordinada substantiva relativa. 31 Educação Literária 1. A expressão deste desejo resulta da consciência que o "eu" tem do mal que o uso excessivo da razão produz em si próprio. Porém, esse desejo encerra um conteúdo paradoxal, porque o “eu” quer ser inconsciente como a ceifeira sem deixar de ser ele, um ser consciente. 2. A sinceridade está relacionada com a inconsciência, dado associar-se à espontaneidade e ao instinto. Já o fingimento implica o uso da razão e da consciência. Assim, o sujeito poético aspira ao impossível: ninguém pode ser inconsciente e ter consciência disso. 3. A antítese, em “alegra e entristece” (v. 9), sugere o efeito contraditório do canto da ceifeira no sujeito poético; a apóstrofe “Ó campo! ó canção!” (v. 20) e o imperativo (“entrai”, v. 22, “tornai”, v. 22, “passai”, v. 24), identificam os destinatários do apelo do "eu" e o desejo que estes o aliviem da sua dor. 4. No primeiro momento, respeitante às três primeiras estrofes, descreve-se a ceifeira e o seu canto. No segundo, relativo às três quadras seguintes, o “eu” exprime os efeitos produzidos pelo canto, revelando a sua emoção e o seu desejo de fuga ao pensamento. 5. O referente é "pobre ceifeira". 6. “no meu coração” – complemento oblíquo; “A tua incerta voz ondeando” – complemento direto. 32 Educação Literária 1. O gato age por instinto, sendo, por isso, um “Bom servo das leis fatais” (v. 5), vive só por viver, sem saber por que vive, limitando-se apenas a sentir. Ora, a comparação “brincas na rua / Como se fosse na cama” (vv. 1-2) salienta o caráter instintivo do gato, que não lhe permite ter consciência das inconveniências. 2. O sujeito poético, por ser demasiado racional, não consegue ser feliz, razão pela qual inveja o gato, que, por não intelectualizar os sentidos, acaba por viver feliz. 3. Os dois versos remetem para a complexidade e confusão interiores e para a despersonalização: ao ser muitos, o sujeito poético acaba por se desconhecer a si mesmo. 4. Sentir implica agir instintivamente; pensar exige o uso da razão, e, quando se usa a razão, deixa-se de sentir apenas. Pensar, que exige distanciamento dos sentimentos, opõe-se a sentir, atitude a que se acede natural e espontaneamente. 5. Atendendo a que todo o texto revela oposição entre o “gato” (tu) e o sujeito poético (eu), percebe-se que este jogo permite contrapor a intelectualização do “eu” e o comportamento instintivo do gato. 6.1 [A] 6.2 [D] 33 Educação Literária 1. Destacam-se as seguintes dicotomias: sentimento/pensamento; vida vivida/vida pensada; vida verdadeira/vida errada. 2. O sujeito demonstra alguma confusão interior, como se percebe pela primeira estrofe quando afirma “Tenho tanto sentimento / Que é frequente persuadir-me / De que sou sentimental”. Porém, acaba por admitir a sua racionalidade excessiva (vv. 4-5) e revela-se bastante consciente da realidade quando reconhece que todos temos duas vidas, a verdadeira e a idealizada, mas que teremos de viver a que temos. 3. A mudança da primeira pessoa do singular para a primeira do plural justifica-se pelo facto de o sujeito poético considerar que a sua situação é comum a todos nós, incluindo-se, neste aspeto no coletivo humano a que pertence. 4. A antítese é visível na oposição estabelecida entre vida “vivida” (v. 8) e “pensada” (v. 9), “verdadeira” (v. 12) e “errada” (v. 12), servindo o objetivo de evidenciar a dicotomia sentir/pensar, ilustrada pelas contradições com as quais o ser humano se confronta. 5. O texto é composto por três sextilhas, em redondilha maior, com rimas cruzada e interpolada na primeira sextilha e apenas interpolada nas restantes, como evidencia o esquema rimático abcbac / defdef / ghighi. 6. a. “Que tudo isso é pensamento” (v. 5) ou “Que não senti afinal” (v. 6). b. “ao medir-me” (v. 4) (quando me medi). c. “Mas reconheço” (v. 4). 7. Complemento indireto. 8. Coesão lexical (por reiteração): “vida” (v. 8) e “vida” (v. 9). Coesão lexical (por substituição – antonímia): “vivida” (v. 8) e “pensada” (v. 9). 34 Informar 1. a. V b. F – Pensar em excesso torna-se destruidor. c. F – O pensamento vitima aquele que o usa em excesso. d. V e. F – Fernando Pessoa foi dos que mais sofreram por ter usado o pensamento como ninguém. f. V g. V 35 Educação Literária 1. “terra de suavidade” (v. 3), “ilha extrema do sul” (v. 4), “vida é jovem”, “amor sorri” (v. 6), “palmares inexistentes” (v. 7), “Áleas longínquas” (v. 8), “Sombra ou sossego” (v. 9), “ilhas do fim do mundo” (v. 19), “palmares de sonho” (v. 20). 2. As duas primeiras estrofes espelham a esperança de que o sonho se possa realizar, como atesta o uso do advérbio “Talvez” (v. 7). A terceira estrofe, introduzida pela conjunção adversativa “Mas”, dá início ao desvirtuamento, ao desalento, com a constatação de que o pensamento anula o sonho; por isso, nessa terra (a do sonho), o bem não é duradoiro. Na última estrofe, evidencia-se a certeza de que a cura para os nossos problemas tem de estar em nós, e de que só a nossa ação nos permitirá ser felizes. 3. Na primeira ocorrência, o advérbio “ali” refere-se à “terra de suavidade” (v. 3), à “ilha extrema do sul” (v. 4); já na segunda ocorrência (última estrofe), o mesmo advérbio tem como referente o “nós”. 4. Destaca-se, logo no primeiro verso, o emprego da antítese, para salientar a oposição que se estabelece entre o “sonho” e a “realidade” − “Não sei se é sonho, se realidade” − e na última estrofe entre “mal” e “bem” − “Que cura a alma seu mal profundo, / Que o bem nos entra no coração” (vv. 21-22) −, com o intuito de realçar a inoperância do sonho e a imposição do real sobre o imaginário. Emprega-se também a metáfora ao associar a ilha ao sonho (veja-se os vv. 19 e 20), dado que os locais exóticos são considerados espaços de evasão, de fuga à realidade. 5. a. Sonho; b. Realidade; c. Mistura 6. Os deíticos de natureza pessoal e temporal estão exemplificados no pronome “nós”, nas formas verbais, no presente do indicativo, como “sei” (v. 1); o advérbio “ali” (v. 23) corresponde a um deítico de valor locativo. 7. Trata-se da coesão lexical por substituição (sinonímia). 36 Educação Literária “Tudo o que faço ou medito” 1. Na primeira quadra verifica-se a oposição entre o fazer e o meditar, o querer e o fazer, remetendo para a dualidade sonho/realidade. Percebe-se que entre o imaginado e o realizado existe um fosso, pois a ação real fica sempre aquém do que foi sonhado. 2. O sujeito poético sente repulsa de si mesmo (“Que nojo de mim”, v. 5) quando dá conta da sua incapacidade para concretizar o imaginado. Mostra-se confuso, considerando-se “um mar de sargaço” (v. 8), mas também lúcido (v. 7). A dúvida e a confusão existencial são reforçadas nos dois últimos versos, em que acentua ainda mais a ideia de angústia. 3. O verso ilustra uma metáfora que sugere a grande confusão interior em que se encontra o sujeito poético: o mar remete para a imensidão e o sargaço para o emaranhado, para a confusão. 4. O conector tem valor disjuntivo ou de alternância. 5. A oração tem valor restritivo. “Nada sou, …” 6. Através da repetição do advérbio “nada”, seguido de verbos que apontam, semanticamente, para a gradação, o sujeito poético assume uma atitude nihilista, de anulação de si mesmo e de tudo o que o rodeia. 7. Para além da anulação expressa no primeiro verso, ao longo do texto confirma-se a incerteza em que o “eu” vive, pois traz o seu ser “por ilusão”, não sabe se há de ser já que não é nada, como se comprova nos versos 2, 3 e 4. 8. No penúltimo verso está presente a oposição sonho/realidade, tornando-se visível a inutilidade do sonho e da própria inconsciência. No fundo, destaca-se a importância de ter consciência da irrealidade do sonho. 9. O último verso, que encerra um apelo, traduz a incerteza da vida do “eu”: o coração é incerto e a sombra remete para o sonho, logo para a irrealidade. 10. Predominam, ao longo do texto, sons sibilantes (/s/) e nasais (/-m/, /-ão/, /nh/), sugerindo o estado de angústia e de reflexão em que o “eu” se encontra. 37 Educação Literária 1. Fernando Pessoa viu-se impossibilitado de ser feliz porque foi sempre movido pela vontade de conhecer, recorrendo incessantemente à inteligência e procurando uma realidade suprassensível, existente apenas num mundo abstrato. 2. A verdadeira vocação do poeta foi pensar e sonhar. Com efeito, autoanalisou-se, recorrendo permanentemente ao pensamento, tentou iludir a vida através dos sonhos, mas, porque se entregou “obsidiantemente ao pensamento” e se virou “para o sonho”, acabou por se separar do mundo e não atingiu a felicidade. 3. Por “fantasmas mágicos” pode entender-se tudo aquilo que o levou a evadir-se da realidade concreta, nomeadamente o sonho e o pensamento. 4. A afirmação “O poeta dissipou os dias erguendo sonhos inúteis a um céu impassível” (ll. 30-31) aponta claramente para a inutilidade do sonho. A afirmação “a vida que iludiu sonhando” (l. 32) encerra a ideia de que o sonho foi inútil. 39 Verificar 1. a. Iterativo b. Imperfetivo c. Habitual d. Habitual e. Perfetivo f. Genérico g. Perfetivo h. Genérico i. Imperfetivo j. Iterativo k. Habitual 2. a. F b. V c. F d. V e. F f. F g. V 40 Compreensão do oral 1. Apresentação, por parte de um alargado número de cidadãos de um manifesto para solicitar a legalização da morte assistida. 2. Concorda com a prática da eutanásia? / Concorda com o referendo à eutanásia? 3. a. Isabel Ruivo b. O direito à vida está inscrito no património da Humanidade; a morte faz parte da vida e isso exige uma reflexão na sociedade. c. Deputado e apoiante do manifesto d. Rui Nunes e. Médico e presidente da Associação Portuguesa de Biomédica f. Eutanásia é um conceito muito abrangente e “vago” e pode ser mal aplicada como no caso da adolescente belga. g. Médica especialista em cuidados paliativos h. A eutanásia não acaba com o sofrimento: a eutanásia acaba com a vida (não é um tratamento médico). i. Os cuidados paliativos como solução para o sofrimento não são conhecidos, ou são inacessíveis à maioria da população. j. Eutanásia não tem que ver com uma escolha individual; ela põe em causa a autonomia (dá-se autonomia ao médico e não ao doente). 4. De entre os argumentos da posição contrária à prática da eutanásia, o mais persuasivo parece ser o que refere o perigo de aquele ato se tornar “a pedido”. Este argumento torna-se forte dada a possibilidade de refutação a que está sujeito: até que ponto a pessoa que “deseja” a prática da eutanásia estará na posse de todas as faculdades para tomar tal decisão? Esta é uma prática irreversível! O argumento que pode assumir relevância na defesa da eutanásia é a possibilidade que esta prática dá de uma morte com dignidade, evitando o risco da dependência total relativamente a alguém. 5. Este debate é pertinente para a abordagem do tema da eutanásia dada a informação que disponibiliza à audiência. Os intervenientes são especialistas na área da medicina (cuidados paliativos e biomédica) e deputados da Comissão de Ética. Na defesa das suas posições, apresentam argumentos, sustentados em exemplos concretos, que ajudam a esclarecer a opinião pública sobre o tema em causa. 6. O moderador apresenta o tema, os intervenientes e gere as várias intervenções de modo a garantir a imparcialidade do tratamento do tema. Solicita intervenções concisas ou sintetiza ideias para melhor condução e compreensão das ideias defendidas. Respeita e promove o princípio de cortesia entre os vários interlocutores. 41 Expressão oral 1. Resposta de caráter pessoal. Contudo, devem ser apresentados os seguintes argumentos: − a possibilidade de a mentira evitar o sofrimento; − a mentira “inofensiva” enquanto motivadora para a autoestima; − … OU − a mentira nunca se coaduna com a honradez; − a mentira como causadora de graves problemas; − … 41 Escrita 1. Resposta de caráter pessoal. No entanto, os alunos poderão referir que: − se, por um lado, pôr fim à vida é considerado um ato condenável, pelo menos numa perspetiva cristã, por outro, há filosofias que preconizam que seja o ser humano a conduzir o seu destino; − o sofrimento é algo que afeta não só a pessoa mas também quem a rodeia, daí haver correntes de opinião que defendem que em casos extremos se possa pôr fim à vida; − a decisão poderá caber a quem está a sofrer, caso a pessoa seja maior, esteja consciente e seja essa a sua vontade. 42 Educação Literária 1. A repetição da palavra “memória” e do possessivo “meus” concorre para acentuar a importância que o sujeito poético dá, no presente, ao passado que agora reconstrói por não o ter valorizado outrora. 2. Através da memória, o “eu” regressa ao passado e, no presente, lamenta ter perdido aquela “história” personalizada nos contos de fadas. A recordação traz memórias que contrastam com os cansaços do presente e justificam o apelo final: “Torna-me aos dias felizes / E deixa chorar quem riu.” (vv. 11-12) Estes últimos versos ilustram de forma significativa a oposição passado/presente. 3. O sujeito poético admite estar em sofrimento, referindo-se à dor causada pela perda “daquela história”, aos seus “cansaços ateus”, e almeja regressar aos dias felizes porque, se agora chora, no passado “riu”. 4. O presente de dor, desencadeado pelo uso excessivo da razão, leva o sujeito poético a evocar o tempo em que a razão não o atormentava. Esse era o tempo da infância, conotado com o tempo de ouro em que o ser humano experiencia a felicidade. Os contos de fadas são a metáfora da infância, na medida em que espelham um mundo de fantasia, de liberdade, e lembram as primeiras explicações para muitos dos enigmas do mundo. Contudo, a última página, que instituía o final feliz que povoava os contos de fadas, fora rasgada. Talvez seja essa a razão do seu choro. 5. A personificação está presente no papel que o “eu” atribui à memória (invocada por meio do vocativo), responsabilizando-a por ações que são única e exclusivamente da responsabilidade do ser humano. 6. “memória” – vocativo; “daquela história” – complemento do nome. 7. O referente é o sujeito poético (enunciador). 8. Coesão lexical (substituição). 9. Valor imperfetivo. 10.1 [B]. 43 Educação Literária 1. As dicotomias presentes são passado/presente, jovem/adulto, sonho/vida real. Por intermédio delas, o sujeito opõe o passado ao presente, dado que o sonho deu lugar à estranheza em face da vida. 2. No passado, ainda que a vida fosse má, parecia-lhe serena; hoje a vida é estranha e “a pena, ou a mágoa, ou o cansaço” (v. 9) impõem-se. 3. Os canteiros do jardim remetem para a beleza, para a harmonia e para a fragilidade que caracterizam os momentos felizes do passado. O verbo pisar, por seu lado, adquire um valor disfórico, sugerindo o facto de o presente anular o passado. 4. A adjetivação − “má” (v. 3), “serena” (v. 3) – permite caracterizar a vida do “eu” no passado; a enumeração, com recurso ao polissíndeto, em “a pena, ou a mágoa, ou o cansaço” (v. 9), reforça o estado de espírito negativo do sujeito poético no momento presente. 5. Orações subordinadas adverbiais temporais – “Quando era jovem” (v. 1); “quando tinha pena” (v. 1); oração subordinada adjetiva relativa restritiva – “Que me visita o ser” (v. 8). 6. Valor disjuntivo. 7. Conversão. 44 Educação Literária 1. Na primeira estrofe há um jogo temporal entre passado e o presente, em que o primeiro se reflecte no segundo. Com efeito, o “eu” traz para o presente as recordações do passado, em particular o jardim e a fantasia de outrora, e admite que no futuro também não saberá o que foram essas vivências anteriores. 2. Os versos parentéticos correspondem às presumíveis respostas da ama, o interlocutor direto do “eu”, que é símbolo do passado e o único que poderia dar as respostas que o “eu” procura, graças à relação e ao conhecimento que tem desse passado, agora revisitado. 3. A cor salientada é o azul, particularmente o “azul do céu” (v. 7), que simboliza a pureza, a inocência, o que está além da realidade, que, por sua vez, se associam à infância, ao sonho e à imaginação típicas das crianças. Contudo, estão subjacentes outras cores na referência às “Flores de tantas cores…” (v. 13), que, simbolicamente, sugerem a alegria mas também a fragilidade. 4. As aproximações devem-se ao facto de o sujeito poético ser do género feminino e de, no final de cada estrofe, existir um verso que funciona como uma espécie de refrão e que representa a resposta da ama. Portanto, tanto o caráter dialogal, como a centralidade da figura feminina e a presença do refrão são aspetos que remetem para as cantigas de amigo. 5. A anáfora permite realçar o modo carinhoso como a “ama” trata o sujeito poético. Simultaneamente, reitera o vocativo e a apóstrofe. 6. Oração subordinada substantiva relativa. 7. Como marcas deíticas, surgem as formas verbais no presente e no pretérito perfeito que contêm marcas temporais e pessoais (“Conta-me” e “fui”), bem como pronomes (“me”). Por outro lado, também a expressão “Esse dia” configura uma marca temporal, e [esse] “jardim” uma marca deítica de natureza espacial. 45 Informar Idealização da infância 1. Texto A 1. Texto B Justificação A infância é cor, música traído pela vida cisão da sua existência convocada por estímulos exteriores realização do prazer visual e auditivo Heterónimos Tentativa de reencontrar a simplicidade e inocência da infância 2. A infância foi idealizada não só porque essa é a tarefa do poeta mas também porque Pessoa se autopenaliza por a ter abandonado, restando-lhe recriá-la pela imaginação. 3. Pessoa cria os heterónimos como forma de reencontrar a simplicidade e a inocência próprias da infância. 46 Informar 1. a. Poemas “rimados” (l. 1); “verso curto, de número de sílabas par ou ímpar” (ll.1-2); “concisão da quadra ou da quintilha” (l. 2). b. “linguagem selecionada mas simples” (ll. 4-5); “vocábulos de cariz romântico ou simbolista mas um núcleo de palavras nuas e correntes” (ll. 5-6); “expressão é límpida, a sintaxe sem pregas obscuras” (l. 11); associação de “um substantivo e um adjetivo contraditórios ou qualificam o mesmo substantivo com dois adjetivos antitéticos: ‘alegre e anónima viuvez’” (ll. 21-23). c. “antíteses, paradoxos, jogos de conceitos e palavras” (ll. 16-17); “repetição da mesma palavra ou palavras homónimas ou afins” (l. 25). 48 Leitura 1. [C] 2. [D] 3. [B] 4. [A] 5. [C] 6. O deítico pretende reforçar a importância, nas memórias da narradora, do espaço a que se refere – o pátio na casa transmontana. 7. “as velhas histórias” (l. 43) 8. Verbo principal intransitivo. 9. “a quem quiser habitá-las com o seu amor e a sua fantasia” (ll. 49-50). 10. Complemento direto. 49 Escrita − O filme data de 2014 e é a adaptação do romance homónimo de Lisa Genova. − A história mostra o sofrimento e a infelicidade de uma psicóloga (e da sua família) que, precocemente, é afetada pela doença de Alzheimer. − Destacam-se as vivências do quotidiano e o modo como, sistematicamente, até em tarefas mais básicas, o recurso à memória é importante e fulcral, e de que forma esse quotidiano é afetado quando não conseguimos recordar-nos de informações essenciais. − Apesar de a maioria das cenas decorrer em interiores, o filme ganha com a seleção de belos espaços exteriores, nomeadamente jardins e praias onde decorrem algumas filmagens. − A realização é cuidada, e são frequentes os planos da protagonista em que as expressões faciais denunciam apreensão perante os avanços da doença. 51 Verificar 1. [D] 2. [A] 3. [A] 4. [B] 5. [D] 6. [C] 7. [A] 12 solu??es sentidos12/Unidade 2 - Fernando Pessoa, Heter?nimos e Bernardo Soares .docx Sentidos 12, Unidade 2 – Fernando Pessoa, Heterónimos e Bernardo Soares Cenários de resposta Página(s) Domínio / texto Cenário de resposta 58 Compreensão do Oral 1. a. Luís Castro b. Orienta a conversa fazendo perguntas. c. Mariana Gray de Castro: investigadora das Universidades de Oxford e Lisboa d. Clara Riso: diretora da Casa Fernando Pessoa 2. a. V b. F − A diretora da Casa Fernando Pessoa faz inicialmente uma síntese biográfica de Fernando Pessoa. c. F − O estudo é sobre Ricardo Reis e a sua relação com Alberto Caeiro. Relativamente às obras de Reis e de Horácio, Nuno Amado considera-as semelhantes na forma, mas não no conteúdo. d. V e. V f. F − O estudioso considera que essa explicação deve ser relativizada dada a extensão da obra que Pessoa diz ter sido escrita numa noite em 1914. 3. a. perspetiva b. argumentos 59 Informar 1. Ambos os textos exploram a questão da heteronímia de Fernando Pessoa, procurando explicitar esse conceito. 2. É no segmento pessoano citado que se vê essa consciência, concretamente em “que não são minhas, ou, se o são, o não conheço” (ll. 7-8). 3. Texto A – A “conjugação e cruzamento de vozes dialogais” (ll. 1-2); “o heterónimo (o outro) se distingue do ortónimo (o eu) […] tem uma identidade autónoma, com características psicológicas e ideológico-culturais próprias” (ll. 11-14); Texto B – “outros nomes, nomes diferentes de uma mesma pessoa” (ll. 3-4); “Na verdade, a ideia de ‘heterónimo’ corresponde a um desejo de desdobramento sem identidade: é exatamente uma representação, através de diferentes personagens, de diversas faces da mesma individualidade original, ou, então, a expressão de diferentes conceitos da vida de uma mesma personalidade” (ll. 10-14). 62 Informar 1. a. Histeroneurastenia e tendência para a despersonalização e simulação. b. Nasceu em 1889, em Lisboa. Tinha estatura média e olhos azuis, era loiro e frágil. Fez apenas a instrução primária e não exerceu qualquer profissão, tendo vivido de pequenos rendimentos, no campo, com uma tia-avó. Escrevia mal português. c. Surgiu “por pura e inesperada inspiração” (ll. 93-94). d. Nasceu em 1887, no Porto. Era baixo, forte, seco e moreno. Foi educado num colégio de jesuítas e recebeu uma formação latinista e semi-helenista. Foi médico e viveu no Brasil para onde se expatriou por ser monárquico. Escrevia com correção, mas era exageradamente purista. e. Surgiu de “uma deliberação abstrata” (l. 95). f. Nasceu em 1890, em Tavira. Era alto, magro, um pouco curvado, branco e moreno. Usava o cabelo apartado ao lado e monóculo. Recebeu uma educação vulgar de liceu, mas acabou por se formar em engenharia, primeiro mecânica e depois naval, em Glasgow, na Escócia. Escrevia razoavelmente. g. Surgiu de “um súbito impulso para escrever” (l. 96). h. Bernardo Soares, um semi-heterónimo que se parece em muitas coisas com Álvaro de Campos, correspondia a uma mutilação da personalidade do seu criador e, por isso, a sua prosa era igual à dele. i. Aparecia quando Fernando Pessoa estava cansado e sonolento. 64 Informar 1. a. C − “o verso livre e branco […] por vezes quase tocando a prosa” (ll. 4-6). b. B − “não quer saber de passado nem de futuro […] Vive feliz como os rios e as plantas” (ll. 4-5 e l. 7). c. A − “Ora Alberto Caeiro surge, precisamente, no momento em que era mister. Compelido a vencer o seu paulismo – isto é, a expressão genuína do seu subjetivismo lírico” (ll. 5-7). d. C − “e o que surpreende é a manutenção do mesmo tom, manso e fluente, com repetições insistentes” (ll. 8-9). e. B − “O certo, porém, é que é autor de poemas; e começa aqui o paradoxo da sua poesia” (ll. 12-13). f. C − “tem entre si e a Natureza o objeto do amor que lhe interceta a perceção pura” (ll. 12-13). g. B − “É sintomático da qualidade do seu espírito que o conteúdo da sensação lhe seja indiferente, que sublinhe o ato de ver” (ll. 18-20). h. A − “O súbito aparecimento de Alberto Caeiro, mostrando-lhe […] que a poesia […] tem de começar por ser a expressão sincera de estados de espírito sinceros” (ll. 15-16). i. D − “satisfaz-se calmamente com o manejo hábil de um número reduzido de vocábulos […] compensam de algum modo a falta de rima” (ll. 2-6). 65 Educação Literária 1. Atendendo a que o bucolismo consiste na exaltação da ruralidade, da ingenuidade e da simplicidade dos costumes, elogiando a beleza da Natureza e da vida campestre, pode percecionar-se no poema a alegria do sujeito poético que aceita a ordem natural das coisas: alude a vários elementos rurais e expressa o desejo de comunhão com a terra, as montanhas, as planícies, os rochedos e a erva. 2. O “eu” considera que as dualidades devem ser encaradas com naturalidade. Por isso, refere que a felicidade e a infelicidade devem coexistir para se poder ser natural (vv. 5-7); também na Natureza tem de haver dias de sol e de chuva (vv. 8 e 9); e o sentir e o pensar são inerentes ao ser humano, portanto têm de ser encarados normalmente. 3. O verso “E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre” (v. 18) evidencia que se deve aceitar a morte porque o dia também morre. Assim, fazendo o ser humano parte do Universo, a morte não pode causar estranheza, tal como está inscrito no último verso. 4. Alberto Caeiro é considerado o menos culto dos heterónimos, aquele que aceita calma e placidamente a ordem do mundo, que usa um vocabulário simples, limitado e repetitivo, aproximando-se da prosa no que se refere à forma e ao ritmo. Formalmente, verifica-se nos seus poemas uma grande irregularidade estrófica e métrica, para além da ausência da rima. Todos estes aspetos estão presentes no texto: o vocabulário é simples e repetitivo; as comparações recorrem a termos comuns; os versos não apresentam rima e evidenciam uma enorme variedade de sílabas métricas e as estrofes são irregulares. 5. Oração subordinada substantiva completiva. 6. Sujeito. 66 Educação Literária 1. O verso que melhor evidencia a importância dos sentidos para apreender o real é “Sei isto porque os meus sentidos mo mostram” (vv. 19 e 21). Aqui se percebe que graças aos órgãos sensoriais o “eu” conhece a realidade, reafirmando que só acredita naquilo que os seus sentidos lhe mostram, ou seja, só crê no que é real. 2. O sujeito poético identifica-se com a Natureza, pois ambos têm uma existência real, ambos se definem do mesmo modo – “Sei que a pedra é a real” (v. 17); “Sei que sou real também” (v. 20) – percebendo-se que, perante esta identificação, não será necessário acrescentar mais nenhuma informação, pois nada mais será necessário: “Que mais há a dizer?” (v. 33). 3. A anáfora presente ao longo do poema permite pôr em relevo as ideias simples que o sujeito poético tem e defende, bem como a sua ingenuidade e o tom coloquial usado. A anáfora espelha também a necessidade que o “eu” tem de convencer e/ou convencer-se da importância do conhecimento adquirido pelos sentidos e pelo contacto concreto com a realidade. 4. A interrogação retórica assume um caráter provocatório e tem o intuito de fazer o leitor refletir acerca dos sentidos ocultos que se procuram nas coisas. No fundo, com a interrogação final, o sujeito poético expõe a sua filosofia de vida, que consiste em amar o natural e em sentir-se mais um dos elementos que integram a Natureza e o Universo, criticando, indiretamente, os que veem ou querem ver além da realidade. 67 Educação Literária 1. O sujeito poético transforma os pensamentos em sensações (“os meus pensamentos são todos sensações”), anulando a oposição entre sentir e pensar, dando primazia ao sentir e à apreensão da realidade pelas sensações. O sentido das coisas obtém-se pelas sensações, por isso “Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la” (v. 7). 2. Quando o “eu” afirma “Penso com os olhos e com os ouvidos” (v. 4), “E com as mãos e os pés / E com o nariz e a boca” (vv. 5-6), percebe-se uma hierarquização das sensações, de acordo com o grau de conhecimento que elas permitem atingir. Assim, segundo o sujeito poético, a realidade é primeiro apreendida pela visão e pela audição, depois pelo tato (“as mãos e os pés”, v. 5) e, por fim, pelo olfato e pelo gosto. 3. O pensamento surge objetivado no verso “E comer um fruto é saber-lhe o sentido” (v. 8), em que se confere ao pensamento um estatuto concreto e em que ele é submetido ao primado da sensação, neste caso do gosto. 4. O sujeito poético mostra conhecer a realidade pelos sentidos e só estes lhe permitem alcançar a verdade. Por isso, o contacto direto com a Natureza é o que lhe permite abraçar a realidade, tal como se depreende dos versos 11-14. 5. A tristeza do sujeito poético resulta do gozo excessivo proporcionado pelas sensações e pelo contacto com a Natureza. Porém, o “eu” aceita essa tristeza com naturalidade, uma vez que provém do excesso de felicidade, a qual resulta da relação direta com a realidade (“Sinto todo o meu corpo deitado na realidade”). 6. Justifica-se pela oração introduzida por uma conjunção subordinativa “quando”. 7. “dia” 8. Derivação por sufixação 67 Escrita 1. Introdução: Caeiro, o heterónimo considerado o mestre. Desenvolvimento: Vive em permanente contacto com a Natureza (bucolismo) e apreende a realidade através dos sentidos, recusando questionar a existência do que o rodeia e aceitando a ordem natural do mundo, como a chuva e o sol, a felicidade e a infelicidade. No poema, o sujeito poético identifica-se com um guardador de rebanhos e com o próprio rebanho. Na imagem, destaca-se o pastor que, no meio do seu rebanho, contempla a Natureza, comungando daquela realidade que o faz feliz, tal como acontece ao sujeito poético. Conclusão: Espécie de compensação para o subjetivismo do criador, que viveu atormentado pela racionalidade excessiva. 69 Aplicar 1. [A] – [4]; [B] – [5]; [C] – [2]; [D] – [1]; [E] – [2]; [F] – [3]; [G] – [5]; [H] – [4]; [I] – [1]. 1.1. [A] – “foi” [B] – “Pensa-se” [C] – “Tens de” [D] – “importantíssima” [E] − “Não se deve” [F] – “Podem” [G] – “É provável” [H] – “Acredito” [I] – “Achei interessante” 2. a. “felizmente já vai sendo corrente entre nós”. (ll. 10-11) b. “Uma obra como esta deve ser lida por estudantes e estudiosos”. (l. 5) c. “A obra História crítica da literatura portuguesa, composta por nove volumes está finalizada.” (ll. 1-2) d. “talvez não naquelas que se preocupam apenas com a ´espuma (editorial) dos dias’”. (ll. 7-8) 70 Leitura 1. a. V b. F c. V d. V e. F f. V 71 Compreensão do oral 1. a. V b. F – São apresentados aspetos biográficos. c. F – Afirma-se que foi o pioneiro. d. V e. V f. F – Adota uma atitude de tranquilidade em face do destino e da vida. g. V h. F – Por detrás da aparente calma de Reis está a inquietude de conhecer e de se realizar. i. V j. V k. F – Os símbolos por ele utilizados remetem para a brevidade da vida. l. V m. F – O código de conduta visa ensinar a viver entre o gozo dos prazeres e atenuação do sofrimento. n. V o. F – Reis acredita que os deuses são irreais e reais: irreais, porque não são realidades; reais, porque são abstrações concretizadas. p. V q. V r. F – Hermes é o deus da comunicação, o mensageiro, a divindade dos limites, o deus das encruzilhadas, dos ladrões e do comércio. s. V t. V 71 Expressão Oral O aluno poderá referir: − a sensibilização para o estudo do autor; − a possibilidade de obter informação de uma forma mais rápida e motivadora; − o acesso a imagens e a informação mais variada, como alguns poemas do autor em análise; − o confronto entre a informação veiculada no documento vídeo e outra resultante de estudos críticos e analíticos; − … 72 Educação Literária 1. O poema apresenta como assunto o convite endereçado pelo sujeito poético a Lídia, a mulher amada, para que ambos vivam uma relação tranquila, que não envolva sentimentos fortes, de modo a evitar o sofrimento que a morte pode provocar a cada um deles, permanecendo apenas, depois dela, uma memória suave. 2. O verso parentético funciona como um aparte no qual o sujeito poético parece intensificar o pedido que dirige a Lídia, embora tente banir, depois, esse mesmo desejo de união. Com efeito, o “eu” tem consciência da inutilidade desses momentos pontuais, dada a fugacidade da vida e o seu fim inexorável, condição que afeta todos os mortais. 3. A apóstrofe presente em “Lídia” (verso 1) está ao serviço do apelo endereçado pelo “eu” à sua companheira. Este apelo é reforçado pelo recurso ao imperativo (“Vem”, v. 1) e ao conjuntivo com valor exortativo (“fitemos”, “aprendamos”, v. 2), pois o sujeito poético pretende persuadir o seu interlocutor a aceitar as suas propostas. 4. A gradação está presente na sequência “te arda ou te fira ou te mova” (v. 26), na qual se encontra também uma enumeração, e pretende realçar os efeitos cada vez mais intensos que decorrerão da morte do sujeito; a metáfora ocorre em expressões como “Nem fomos mais do que crianças” (v. 28) e “pagãos inocentes” (v. 24), sugerindo a inocência ou a pureza de comportamentos. 5.1 O “rio”, recorrente ao longo do poema, remete para o fluir da vida, o caminhar inexorável para a morte. O “Fado” evidencia a força superior aos próprios deuses. As “flores” no regaço sugerem a fragilidade e o desapego dos bens materiais. A “sombra” e o “barqueiro sombrio” são ambos símbolos da morte. A “sombra” representa a transição da vida corpórea para a anímica, estando essa transição figurada no “barqueiro sombrio”, Caronte, que fazia a travessia do rio Estiges, levando os mortos para o Além. 6. Palavras como “aprendamos” (v. 2), “pensemos” (v. 5), “lembrar-te-ás” (v. 25) e “memória” (v. 31) têm um valor que semanticamente se associa ao uso do intelecto, da racionalidade. 7. A fugacidade da vida e a iminência da morte são as maiores preocupações do sujeito poético, daí que ele insistentemente recuse as grandes paixões e preocupações e o justifique com a necessidade de evitar o sofrimento quando a morte chegar. O pedido para desenlaçarem as mãos é revelador desse medo. 8. Na primeira parte, que corresponde às duas primeiras estrofes, o sujeito poético manifesta o desejo de gozar o momento presente na companhia da sua amada, sentando-se à beira do rio e fitando-o de mãos enlaçadas. A segunda parte (estrofes 3 a 6) é o momento em que o “eu” pede à amada para desenlaçarem as mãos, porque devem evitar-se as grandes paixões (amor ou ódio), permanecendo simplesmente sentados “ao pé um do outro”, amando-se tranquilamente. É na terceira parte (duas últimas estrofes) que o sujeito poético justifica a renúncia aos fugazes prazeres da vida, afirmando que, não sendo “mais do que crianças” (v. 28), os dois evitarão o sofrimento causado pela antevisão da morte, conservando a serenidade. 9. O classicismo é visível, a nível temático, na crença nos deuses e na mitologia pagã, na crença no destino, na utilização de símbolos que remetem para a consciência da brevidade da vida e a inexorabilidade da morte. A nível formal, a preferência pela ode, pela sintaxe alatinada e pelo vocabulário impregnado de termos latinizantes, com recurso à anástrofe, à gradação, à metáfora. 10. Lídia é elevada à categoria de musa, sendo que a expectativa do sujeito lírico é a de que ela seja platonicamente distante, alheia, descomprometida e, à sua semelhança, espetadora do mundo. 11. a. estamos, fica, deixa, regressa, vai, vale, passamos, levantam, dão, cremos enlaçamos, beijamos b. lembrar-te-ás, terei, ser-me-ás c. fitemos, aprendamos, enlacemos, pensemos, desenlacemos, gozemos, amemo-nos, colhamos, suavize, arda, fira, mova d. levares e. tivesse, quiséssemos 12. a. Oração subordinada substantiva completiva. b. Oração subordinada adjetiva relativa restritiva. 12.1. Complemento direto. 74 Educação Literária 1. − viver sem inquietações, aceitando o destino (“Segue o teu destino”, v. 1); − não se questionar sobre o sentido da vida, vivendo em desprendimento e em tranquilidade (“Vê de longe a vida. / Nunca a interrogues”, vv. 16-17); − limitar-se a viver simplesmente, sem desejar mais do que o que se tem (“Viver simplesmente”, v. 13). 2. A realidade está dependente do destino, por isso pode ser ou não aquilo que se espera. Nós somos sempre iguais e seremos o que quisermos ser, desde que nos limitemos a alcançar apenas o que nos está reservado. Efetivamente, encena-se uma vivência, uma vez que se obedece a códigos de conduta e a princípios ou a orientações que limitam uma vivência verdadeira, autêntica, mas de mera contemplação e de aceitação, obedecendo a regras sociais ou outras que nos são impostas. 3. O sujeito poético afirma que a resposta para a vida está “além dos Deuses”, mas também nos aconselha a imitá-los (“Imita o Olimpo”, v. 22). Logo, acima de nós estão os deuses, e acima de ambos está o destino, numa lógica destino – deuses – homens. 4. Ao querer viver calma e placidamente, sem nada questionar, o “eu” revela a consciência da mortalidade e abdica dos prazeres: adota, assim, uma postura típica do estoicismo, uma escola filosófica que crê na força determinista do destino e nos aconselha a aceitá-lo (“A resposta / Está além dos Deuses”, vv. 19-20). Já a encenação da mortalidade está subjacente ao conselho que o "eu" dá para que nos limitemos a viver e a ver de longe a vida, sem a interrogar, uma vez que a morte é iminente e irreversível. 75 Educação Literária 1. O sujeito poético condena não só os que têm os olhos postos no passado, porque “Veem o que não veem” (v. 2), mas também os que fitam o futuro, pois “veem / O que não pode ver-se”(vv. 3-4). Assim, percebe-se que, para o sujeito poético, estes comportamentos são ilusórios e condenáveis, o que o leva a demarcar-se e a perguntar “Porque tão longe ir pôr o que está perto” (v. 5). 2. Como se depreende da crítica feita a “uns” e a “outros”, o sujeito poético faz a apologia do presente, uma vez que construir a existência em função do passado ou do futuro é não viver. Apesar da brevidade do presente, é nele que o homem se realiza e é nele que pode alcançar a felicidade, daí que o conselho seja “Colhe / O dia, porque és ele” (vv. 7-8). 3. As formas verbais no presente servem o propósito de enfatizar o momento atual e delimitar unidades temporais mais restritas, de forma a estabelecer uma homologia entre o tempo presente e o ser humano. É como se o ser humano se diluísse no próprio tempo e fosse ele o tempo: “No mesmo hausto / Em que vivemos, morreremos. Colhe / O dia, porque és ele”. Remete ainda para a intemporalidade dos conselhos dados pelo “eu”. 4. Como marcas clássicas evidenciam-se o carpe diem (aproveita o dia), a consciência da efemeridade da vida e a eminência da morte, o caráter moralista, recorrendo-se ao imperativo. Ao nível estilístico, destaca-se a isometria (regularidade métrica) e a regularidade estrófica, as construções sintáticas alatinadas (recurso às anástrofes e ao hipérbato), o uso da primeira pessoa do plural. 5. A passagem da nuvem branca parece ser inútil, uma vez que o sujeito poético afirma que ela é “fugidia” (“inútil nuvem fugidia” – v. 2) e que apenas ergue instantaneamente um “sopro arrefecido” entre os campos. Além disso, a sua inutilidade acaba por se tornar ainda mais evidente nos efeitos nefastos que produz no “eu”. 6. A passagem da nuvem suscita no “eu” poético uma espécie de autoanálise que o leva a comparar esta passagem à ideia que povoa a sua alma e lhe enegrece a mente, revelando que a racionalização excessiva lhe traz sofrimento e dor, dado que a ideia é perturbadora, altera a sua tranquilidade, tal como a nuvem branca produz efeitos negativos na terra pela sua passagem, ainda que breve. 7. A personificação é suscitada pela utilização do adjetivo “Solene” para caracterizar a nuvem e a sua passagem, conferindo-lhe um estatuto humano e, por isso, desencadeando efeitos concretos no sujeito poético. A anástrofe é também visível nos versos 1 e 2, uma vez que a ordem direta seria “A inútil nuvem branca fugidia passa solene sobre a fértil terra”. O objetivo é destacar, primeiro, as características do objeto que vai ser alvo da descrição do “eu” porque são elas que refletem as suas atitudes. A aliteração é visível, por exemplo, no verso 4 em que o som /r/ (“um sopro arrefecido”) sugere o barulho produzido pela passagem da nuvem bem como o efeito negativo que ela produz no sujeito poético. 75 Escrita 1. A imagem apresenta um rosto indefinido e o contorno de um chapéu colocado numa cabeça que, imediatamente, associamos a Fernando Pessoa. No lugar do rosto está um espaço, uma espécie de rua cercada de muros altos, com portas laterais à direita, com um fundo escuro. À esquerda, no muro, está uma janela que, pela cor clara, parece deixar ver o espaço exterior. Nesta rua encontram-se figuras humanas masculinas, dispostas num plano que vai do particular para o geral, sendo que há três silhuetas mais percetíveis e uma, ao fundo, menos clara. Parece representar-se nesta imagem a fragmentação daquele que vive os heterónimos na sua mente, ou seja, a figura de Fernando Pessoa que, como sabemos, povoou a sua vida de outros “eus” ou outros seres, mais autênticos que ele próprio. Por isso, facilmente se identificam os seus três principais heterónimos na posição mais próxima, sendo que o que se encontra mais distante tanto pode ser o seu semi-heterónimo Bernardo Soares como o próprio Pessoa. Este tipo de representação da heteronímia pessoana é bastante sugestiva, dado que permite perceber que os heterónimos são representações mentais mas também configurações autênticas daquele que se “outrou” e viveu várias entidades. (196 palavras) 76 Informar 1.1 [B] 1.2 [C] 1.3 [A] 78 Compreensão do Oral 1. a. sentir; b. fragmentado; c. sensações; d. novo; e. humanidade; f. deuses; g. emoção; h. infância; i. técnica; j. nenhuma; k. desejou; l. esqueceu; m. deprimido; n. moderno; o. metafísicas; p. sonhos; q. abarcar; r. sentido; s. contemporâneo; t. moderno; u. inefável. 79 Informar 1. [A] − [6] [B] − [4] [C] − [9] [D] − [2] [E] − [10] [F] − [7] [G] − [12] [H] − [8] [I] − [5] [J] − [3] 86 Educação Literária 1.1 O sujeito poético encontra-se num ambiente fabril, afirmando “À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábrica”. (v. 1) 1.2 O “eu” estabelece uma relação contraditória com esse ambiente. Se, por um lado, parece apreciar a beleza da fábrica, por outro, essa realidade provoca-lhe dor: “À dolorosa luz” (v. 1). 2.1 O sujeito poético afirma que tem os lábios secos (v. 10) e que lhe arde a cabeça (v. 12). Este mal-estar parece ser causado pelos movimentos “em fúria” e pelos “ruídos” que soam “demasiadamente de perto” (v. 11). 2.2 Para este estado de alucinação concorrem sensações gustativas (“Tenho os lábios secos”, v. 10), auditivas (“ó grandes ruídos modernos, / De vos ouvir demasiadamente de perto”, vv. 10-11), táteis (“E arde-me a cabeça”, v. 12) e visuais ("e olhando os motores", v. 15), que são a “expressão de todas as […] sensações” daquele que elogia a contemporaneidade de forma alucinante. 2.3 Uma nova conceção de Belo é preconizada pelos modernistas e é visível nestas estrofes de Álvaro de Campos. Com efeito, depois de fazer referência aos barulhos típicos da modernidade e da sociedade industrializada, o “eu” vai avaliar positivamente os seus efeitos, afirmando que estes funcionam como “um acesso de carícias ao corpo numa só carícia à alma” (v. 26); por outro lado, também os versos 32 e 33 expressam uma euforia que resulta de ver beleza onde tradicionalmente se via o feio, como é o caso de sentir “os perfumes de óleos e calores e carvões” (v. 31). 3.1 Atendendo a que a modernidade também apresenta aspetos perversos, o “eu”, enquanto ser totalizante, dá conta de tudo o que faz parte integrante dessa modernidade. Por isso, o “eu” enumera vários tipos sociais e personagens da era industrial, revelando o seu interesse por todas as realidades e sensações que o cercam. Desta forma se justifica a enumeração dos diferentes tipos sociais como “comerciantes”, “vadios”, “escrocs”, “aristocratas”, “esquálidas figuras dúbias”, “chefes de família”, “cocottes”, “burguesinhas”, “pederastas”, “gente elegante que passeia”, “caixeiros-viajantes”. 3.2 Na estrofe 9 referem-se as “corrupções políticas”, os “escândalos financeiros e diplomáticos”, as “agressões políticas”, um “regicídio”. Já a estrofe 10 trata questões sociais, concretamente as diferentes notícias jornalísticas, bem como os avanços tipográficos, sendo tudo alvo de elogio, e gerador do delírio do “eu”. Porém, e apesar de todo o poema constituir um elogio à modernidade, os aspetos salientados representam também alguns dos resultados negativos da sociedade industrializada. 4.1 No poema, o “eu” elogia o belo feroz, por isso exalta tudo o que simboliza a modernidade e a era industrial moderna, ao ponto de, depois de enumerar alguns aspetos negativos, concluir: “Que importa tudo isto, mas que importa tudo isto / Ao fúlgido e rubro ruído contemporâneo, / Ao ruído cruel e delicioso da civilização de hoje?” (vv. 207-210). 4.2 A dimensão épica decorre do facto de o poema ‘cantar’ a civilização industrial, referir os pensadores da Antiguidade como responsáveis pela preparação da era moderna e exaltar as transformações operadas. 4.3 - Apóstrofe, por exemplo, “Ó rodas, ó engrenagens” (v. 5), “ó grandes ruídos modernos” (v. 10). - Anástrofe: “Só porque houve outrora e foram humanos Virgílio e Platão” (v. 20); “E falava com Aristóteles, que havia de não ser discípulo dele.” (v. 133). - Aliteração do som /f/ “Em fúria fora e dentro de mim” (v. 7), “de ferro e fogo e força” (v. 16). - Anáfora: “Por todos os meus nervos dissecados fora, / Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!” (vv. 8-9). - Enumeração: “Couraças, canhões, metralhadoras, submarinos, aeroplanos!” (v. 104); “Ó fábricas, ó laboratórios, ó music-halls, ó Luna-Parks, / Ó couraçados, ó pontes, ó docas flutuantes” (vv. 113-114). - Metáfora: “E arde-me a cabeça” (v. 12), “Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida!” (v. 181), “A luz do sol abafa o silêncio das esferas” (v. 186). - Gradação: “Rugindo, rangendo, ciciando, estrugindo, ferreando” (v. 24). - Personificação: “Do tumulto disciplinado das fábricas” (v. 39), “Progressos dos armamentos gloriosamente mortíferos!” (v. 103). - Onomatopeia: “r-r-r-r-r-r-r eterno!” (v. 5), “ Z-z-z-z-z-z-z-zz-z-z-z!” (v. 239). Impera, por isso, no poema um ritmo torrencial, feroz, vivo, onde surgem em catadupa as diferentes realidades captadas por um “eu” em plena histeria de sensações. 4.4 O sensacionismo é levado ao paroxismo, uma vez que o “eu” afirma querer sentir tudo de todas as maneiras e, extasiado, deseja “poder exprimir-[se] todo como um motor se exprime! / Ser completo como uma máquina! / Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!” (vv. 26-28), ou poder “morrer triturado por um motor / Com o sentimento de deliciosa entrega duma mulher possuída” (vv. 134-135), assumindo mesmo uma atitude sadomasoquista só para aceder a “tudo com que hoje se constrói, com que hoje se é diferente de ontem!” (v. 101). O ritmo alucinante sugere a euforia do sujeito poético e a sua quase devoção à modernidade e às transformações, boas e más, operadas pela civilização industrial em que este se insere. 4.5 O tema é a exaltação da modernidade e dos aspetos com ela relacionados, aspetos que se anteveem no título (“Ode triunfal”). A palavra “ode” significa canto elogioso, a que se acrescenta “triunfal”, que reforça ainda mais a magnitude desse elogio, que, neste caso, é dirigido à era moderna e industrial. 5. A modalidade epistémica encontra-se nas alíneas a. e d.; a modalidade apreciativa, nas alíneas b. e c.. 87 Educação Literária 1. O sujeito poético está num espaço rural, uma vez que afirma não haver ali eletricidade, vendo-se obrigado a ler “à luz de uma vela mortiça” (v. 2). Além disso, a única coisa “que estava à mão para ler” (v. 4) era a Bíblia, o que aponta para um ambiente cultural sobretudo marcado pela crença religiosa. Acresce ainda o facto de o “eu” realçar o “sossego excessivo” e de o aliar à “noite de província” (v. 7), confirmando-se, deste modo, o que vinha a ser anunciado desde o primeiro verso. 2. O sujeito poético sente-se emocionalmente debilitado, desolado, com vontade de chorar, entregando-se à reflexão e à autoanálise, levando a que “um grande mar de emoção” (v. 12) se ouvisse dentro dele. Pode dizer-se que o abatimento é agravado ou mesmo desencadeado pelo espaço e pelo tempo que o “eu” convoca: a província e a noite. Ora, o silêncio reinante e a escuridão são, normalmente, os melhores aliados da reflexão, pelo que o adensamento emotivo pode dever-se ao espaço e ao tempo. 3. As sensações que se destacam são a visual e a auditiva. A primeira é percetível no facto de se afirmar que ali não havia eletricidade, o que aponta para a escuridão, facto que é comprovado no verso “Por isso foi à luz de uma vela mortiça”. A sensação auditiva surge na referência ao “sossego” da noite, que contrasta com o “barulho” produzido no íntimo do sujeito poético (“Em torno de mim o sossego excessivo das noites de província / Fazia um grande barulho ao contrário”, vv. 7-8). 4. No verso está presente uma metáfora que sugere a enormidade, a dimensão do estado emotivo e das emoções que se apossaram do sujeito poético. 5. Como típico da modernidade, temos a referência à eletricidade e à paz reinante na província que permite perceber que contrastava com o bulício citadino a que o “eu” estaria habituado. O versilibrismo e o heteroestrofismo (verso livre e variedade estrófica, respetivamente) evidenciam-se, deixando antever o desprezo pelo rigor formal que sempre esteve associado à poesia tradicional. Como marcas temáticas de Campos, destacam-se o abatimento, a desilusão, a angústia existencial e a consciência da impossibilidade de realização por não ser nada (“Sou nada… / sou uma ficção…”, vv. 13-14), numa aproximação evidente ao ortónimo e que caracteriza a última fase de Campos. 6. Como exemplos de marca deítica temporal temos as formas verbais usadas na primeira estrofe que remetem para o passado (“não havia”, “foi”, “li”) e que se opõem às usadas na segunda e apontam para o presente (“sou”, “ando”, “manda”). Deíticos que marcam a pessoa estão presentes não só em algumas formas verbais, mas especialmente nos pronomes pessoais “eu”, “me”, “mim”. Como indiciador do espaço, evidencia-se o advérbio com valor semântico de lugar “Ali”. 7. A forma verbal “Relia-a” (v. 11), conjugada pronominalmente, ilustra a coesão referencial por anáfora, dado que o pronome pessoal aí presente retoma o antecedente “A Primeira Epístola aos Coríntios” (v. 10). 8. A coesão interfrásica é visível no verso 2, mais precisamente na utilização do conector “Por isso”, que introduz a explicação para a afirmação anterior. 9. A forma verbal permite identificar o valor aspetual habitual, porque o facto de não haver luz é uma situação recorrente num período de tempo ilimitado. 89 Educação Literária 1. O sujeito poético manifesta uma enorme angústia, um intenso abatimento, sente um mal-estar que se vem intensificando na sua alma desde que começou a ter consciência de si (vv. 9 e 1-2). O sujeito deixou de ser capaz de conter e controlar a sua angústia, que se foi acumulando ao longo dos anos, sendo o sujeito poético obrigado a exteriorizá-la em lágrimas. Sente-se perturbado, e os sentimentos negativos que o assolam deixam-lhe “pregas na alma” (v. 9) e levam-no a coisificar-se, a transformar-se em algo de indefinido (v. 8) e a desejar “endoidecer deveras” (v. 10), sugerindo a entrada num estado misto de loucura e de lucidez: “Estou lúcido e louco”. 2. O estado angustiante, marcado por uma enorme ambivalência (a lucidez e a loucura; o sentir-se e o alhear-se; a realidade e o sonho), leva o sujeito poético a evocar o passado (nomeadamente a “velha casa”, símbolo da infância perdida) e a desejar regressar a esse tempo, em que não tinha responsabilidade nem lucidez suficiente para avaliar o seu estado de espírito. No passado havia afeto, proteção, paz e tranquilidade, mas esse tempo e a situação eufórica vivida são irrecuperáveis, como se percebe pelo adjetivo “perdida”. 3. O texto é suscetível de ser dividido em quatro partes: a primeira corresponde às três primeiras estrofes, em que se verifica a descrição do estado de espírito do sujeito poético; na segunda, associada à quarta estrofe, sobressai a evocação da infância, por nesse tempo ele ter sido mais feliz; na quinta estrofe, correspondente à terceira parte, o sujeito poético regressa de novo à reflexão e à emissão do desejo de acreditar em algo, como se essa crença aliviasse a angústia mais sentida; no monóstico final, última parte, está inscrito o derradeiro pedido do “eu”, endereçado ao coração, por este ser, eventualmente, a solução para a sua dor. 4. a. As expressões “Transbordou da vasilha” (v. 3) e “pregas na alma!” (v. 9) exemplificam a metáfora e apontam para o excesso da angústia e para os efeitos que ela produz, respetivamente. b. A afirmação “que trago há séculos em mim” (v. 2) configura uma hipérbole, uma vez que dá conta da quantidade de tempo em que se sente neste estado de espírito negativo, exagerando-o para acentuar a sua dor. c. A anáfora está presente nos versos 1 e 2 (“Esta”) e também nos versos 4, 5 e 6. Enquanto na primeira situação, e através do deítico demonstrativo, se presentifica a angústia, nos versos seguintes a anáfora é reveladora do modo como ela se manifesta. d. A gradação presente em “Este quase, / Este poder ser que..., / Isto.” (vv. 12-14) ou em “Era feiíssimo, era grotesco” (v. 32) sugerem o crescendo do abatimento que pode mesmo levar à anulação do “eu”, como se depreende na sua transformação em “Isto”. 5.1 De um modo geral, a pontuação “obriga” a uma declamação marcada por um ritmo pausado que reforça o pendor reflexivo do poema (como se confirma na declamação do ator Virgílio Castelo). Particularmente, o ponto de interrogação reforça o desespero do sujeito poético; as reticências expressam a hesitação, a indefinição e a ansiedade; o ponto de exclamação traduz a emotividade que assola o “eu”; o ponto final está ao serviço da expressão da certeza dos factos enunciados; os dois pontos antecedem a explicação para a dicotomia “Estou alheio a tudo” e “igual a todos”. 6. O “eu” manifesta o desejo de encontrar uma solução para o seu drama interior que poderia passar pela crença numa “religião qualquer”, não importando qual, desde que fosse consoladora. Reafirma ainda a vontade de “crer num manipanso qualquer”, o que evidencia a necessidade de encontrar formas de ultrapassar ou atenuar a angústia que o domina. Note-se que a fé, a crença se inscreve num plano não racional e, portanto, assiste-se à subordinação da razão à emoção, uma vez que o pensamento, a sua racionalidade e lucidez são a causa do sofrimento atual, ainda que tenha consciência da impossibilidade de se libertar dessa angústia, como se percebe pela utilização do condicional “serviria” (v. 36). 7. Neste verso, o sujeito poético dirige-se ao coração, pedindo-lhe que estale pois só assim, dado que parece exprimir um desejo subtil de morte, poderá pôr fim ao sofrimento. Este coração é de “vidro pintado”, logo é frágil, não servindo, por isso, para lhe dar a força necessária para ultrapassar a angústia sentida. 89 Compreensão/Expressão Oral 1. − O orador é Richard Zenith. − O objetivo é ler e comentar um dos últimos poemas de Álvaro de Campos. − A partir de determinados versos, Richard Zenith tece alguns comentários que se prendem, por exemplo, com o facto de Pessoa afirmar não ser nada, mas também poder ser tudo. Para este estudioso, Pessoa era o poeta do nada e do tudo e, por isso, ficou sempre “entre”. − Explora ainda a afirmação que diz que “o coração é maior que o universo inteiro” e justifica-a, dizendo que realmente o coração é o ritmo da vida, é o que sente tudo, até a própria existência. Proposta de planificação da exposição oral: Introdução: Justificação e tema da intervenção (resposta à atividade do Manual, sob solicitação do professor, com o objetivo de falar de Fernando Pessoa). Desenvolvimento: Informações relativas ao orador (Richard Zenith, especialista em Fernando Pessoa e galardoado com o prémio Pessoa em 2012. Poder-se-á ainda disponibilizar o sítio: https://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/premio-pessoa-2012-para-richardzenith-1577444, onde se encontra uma notícia sobre a atribuição do referido prémio e informações mais detalhadas sobre o orador; aspetos abordados e sua importância para a compreensão da heteronímia pessoana. Conclusão: Contributos deste tipo de tarefas para o estudo de obras e pessoas. 89 Escrita Pessoa e os heterónimos (proposta de texto) A complexidade e a riqueza intelectual de Fernando Pessoa fizeram-no, desde muito cedo, imaginar “outros”, através dos quais pudesse exprimir os seus pensamentos, “dando à luz”, numa fase mais tardia, aqueles a quem deu total autonomia: Caeiro, Reis e Campos. Pessoa concedeu a estes três heterónimos uma identidade e estilos próprios, tornando-os distintos entre si e de si, demarcando-se das suas posições e anulando-se para lhes dar voz. Ao primeiro dotou-o da instintividade e primitivismo típicos de alguém pouco culto academicamente e que privilegia as sensações em detrimento do pensamento bem como a ruralidade à cidade. Ao segundo fê-lo clássico, pagão, latinista, adepto do epicurismo e do estoicismo. Ao terceiro deu-lhe a missão de ser o porta-voz do Modernismo e do Futurismo, mas também seu irmão quando chega à última fase poética. Distintos entre si, mas filhos do mesmo pai e pupilos do mesmo mestre, é normal que partilhem algumas disposições: Reis aproxima-se de Caeiro no amor à Natureza e Campos no sensacionismo. Porém, se Pessoa quis unificar a cisão do seu “eu” através dos heterónimos, essa tentativa saiu gorada pois estes estilhaçaram-no ainda mais, fazendo-o questionar a sua própria existência. (191 palavras) 90 Informar/Escrita 1. O texto reporta-se às três fases poéticas de Álvaro de Campos: a decadentista, exemplificada no poema “Opiário”; a futurista, visível em “Ode triunfal”, e a última, a pessoal, já liberta de influências nítidas. Sobre a segunda fase, a mais explorada, diz-se que ilustra a vitalidade, a estética não-aristotélica, o amor ao belo feroz, um estilo esfuziante, com recurso ao verso livre, enumerações, apóstrofes, reiterações e interjeições. Neste estilo vertiginoso, Álvaro de Campos cultivou uma personalidade que tudo integra em si e não respeita limites, elogiou as máquinas, a modernidade e a nova Humanidade. Contudo, a partir de 1916, Campos cai no abatimento, na melancolia, aproximando-se de Pessoa no ceticismo, na dor de pensar e na nostalgia da infância. Conclui-se que é na fase épica, a segunda, em que elogia as transformações decorrentes da modernidade, que Campos mais se aproxima de Whitman e mais se afasta do seu criador e dos outros heterónimos. (146 palavras) 91 Leitura 1. Trata-se de um texto de opinião em que o autor expõe o seu ponto de vista sobre o “linguajar dos mais e dos menos jovens”, baseando-se em argumentos como o facto de não ser adequado o uso de determinados termos, mostrando que a língua portuguesa é rica e que, por isso, permite uma diversidade vocabular não percecionada na atualidade. O autor recorre à ironia para fazer passar a sua mensagem de forma mais lúdica. Faz uso de uma linguagem valorativa (depreciativa) e de recursos expressivos como a comparação, a metáfora e a hipérbole. Em termos linguísticos destaca-se o uso da primeira pessoa gramatical, as frases declarativas e interrogativas, o presente do indicativo. 2. a. “stôres” (l. 11) b. “man” (l. 5)/”boy” (l. 20) c. “papava” (l. 13) 92 Educação Literária Heterónimos 1. O heterónimo que mais se afasta de Fernando Pessoa é Alberto Caeiro, uma vez que, para este, a verdade se alcança no contacto com as coisas, sem haver necessidade de as questionar. Assim, a verdade está na existência concreta. 93 Educação Literária Bernardo Soares 1. Bernardo Soares distancia-se menos do seu criador pelo facto de partilhar com ele vivências, alguns traços de personalidade e características poéticas. Por isso, Soares é considerado um semi-heterónimo. 94 Compreensão do Oral 1.1 a. V b. V c. F – É composto por cerca de 500 textos. d. F – Não há uma ação na obra. É constituída por textos independentes, sem nenhuma ligação entre eles. e. V f. F − Constitui uma reflexão sobre a alma humana. g. V h. F – Versa o desencanto que caracterizou o século. i. V 2.1 [B] 2.2 [D] 2.3 [B] 94 Informar 1.1 [D] 1.2 [A] 97 Leitura 1. [A] 2. [B] 3. [A] 4. [D] 5. [B] 6. Complemento indireto. 7. “de Cesário Verde” (l. 19). 98 Informar 1. a. Imaginário urbano: “breves episódios de rua, cenas de escritório, encontros de restaurante ou de café −, embora transfigurada por um devaneador” (ll. 3-5); “O comércio dá-lhe ainda assim bons pretextos para imaginar” (ll. 13-14). b. quotidiano: “rotina da vida quotidiana” (l. 2). c. deambulação e sonho: o observador acidental: “breves episódios de rua, cenas de escritório, encontros de restaurante ou de café” (ll. 3-4); “Amigo, como Cesário, de vaguear pela Baixa pombalina” (l. 20). 2. O Livro do desassossego é escrito em prosa poética, tem um caráter reflexivo e de devaneio. 99 Educação Literária 1. Perante a observação do espaço diurno (“ruas tristes”, l. 3), o narrador manifesta uma visão negativa que se coaduna com a sua própria tristeza (“Por ali arrasto, até haver noite, uma sensação de vida parecida com a dessas ruas.”, ll. 8-9). No entanto, é com o espaço noturno que ele se identifica, pela ausência de “bulício” que o caracteriza. A cidade é “nada”, de dia (“cheias de um bulício que não quer dizer nada”, l. 10) e de noite (“cheias de uma falta de bulício que não quer dizer nada”, ll. 10-11); o “eu”: “de dia sou nulo, e de noite sou eu.” Assim, estabelece-se um paralelismo entre o espaço diurno e noturno, mas um contraste no modo de o sujeito sentir esses espaços. 2. Soares e Cesário Verde dispõem da mesma matéria − a cidade e os seus elementos, apreendidos muitas vezes pela observação. 3. A observação do quotidiano exterior permite ao narrador manifestar o seu estado de alma, de tristeza e amargura. No entanto, ele é capaz de se distanciar desse espaço citadino e de tecer uma reflexão de teor mais racional, ao afirmar: “sobe-me da alma à mente uma tristeza de todo o ser” (ll. 16-17), que o leva a concluir acerca da sua incapacidade de ação em face dessa mesma realidade. 4. A deambulação permite ao narrador a observação atenta da cidade e a reflexão sobre os sonhos, que ele vê como externos a si próprio e que marcam o seu tédio existencial – por isso os recusa, ao afirmar “os não querer” (ll. 19-20). O barulho do elétrico e a voz do apregoador são convocados por serem também elementos externos ao sujeito. 100 Educação Literária 1. Ao deambular pela cidade, o narrador assume-se como um mero observador do quotidiano concreto e realça, na paisagem que observa, um homem que caminha à sua frente. Reparar nesta personagem dá origem a um discurso de devaneio, que adquire significações metafóricas em torno da condição humana. 2. A oposição consciência/inconsciência corresponde à oposição entre o “eu” e “os outros” – o “eu” está acordado, é consciente, enquanto “os outros” (representados pelo homem de costas, “o inconsciente a quem sigo”, l. 16) permanecem adormecidos porque são inconscientes (“não têm consciência de nada, porque não têm consciência de ter consciência.”, ll. 22-23). 3. A caracterização do espaço e das figuras que o habitam é feita através do recurso à 3.ª pessoa do singular (“Eram as costas…”, l. 4, “levava uma pasta”, ll. 5-6). Esta dá, depois, lugar à 1.ª pessoa e a um discurso subjetivo ao passar para o plano do pensamento, o que é desencadeado pela interpretação do real que o narrador observa (“Senti nele a ternura que se sente pela comum vulgaridade humana”, ll. 8-9). O segmento “Volvi os olhos para as costas do homem, janela por onde vi estes pensamentos” (l. 27) ilustra essa tendência. 4. Bernardo Soares observa o homem de costas, vê nele o homem banal, o quotidiano banal de muitos outros (“tudo isto é o mesmo que ele”, ll. 16-17), e é essa observação do real citadino que desencadeia o seu pensamento reflexivo e o leva a tecer considerações de caráter generalizante: “não têm [aqueles que passam] consciência de nada, porque não têm consciência de ter consciência” (ll. 22-23). Os segmentos: “Vejo-os a todos através de uma compaixão de consciente, os pobres diabos homens, o pobre diabo humanidade” (ll. 41-43) e “Uns inteligentes, outros estúpidos, são todos igualmente estúpidos.” (ll. 23-24) ilustram o tédio e a melancolia que esse quotidiano desencadeia nele. 5. Metáfora que tem como núcleo o verbo dormir, para definir, neste contexto, uma situação de “sonolência” (“toda a vida é um sono”, l. 35), aqui conotada com inconsciência (“vive inconsciente”, l. 34); assim, identificam-se implicitamente os homens (porque o “homem de costas” é um símbolo), por não serem fortes nem atuantes, com uma situação de inconsciência. Esta ideia é reforçada pela expressão “eternas crianças do Destino” (l. 37), já que a infância é vista como o tempo da inconsciência. 6. O “EU”, observador acidental de um “ELE” (o homem que caminha de costas à sua frente), institui-se como um “NÓS” (“eu + ele”). Este “NÓS” é apenas aparente, pois não há nada que os una. O homem adquire, de seguida, o estatuto de “personagem-tipo” – ele é visto como a síntese de TODOS OS HOMENS que o “EU” observa todos os dias –, na medida em que representa simbolicamente a massa humana sem vontade nem determinação, a “comum vulgaridade humana” (l. 9), com a qual o “eu” não se identifica, o que o leva a tecer considerações de caráter subjetivo. 7. A repetição do vocábulo “inconsciente” (l. 34) e a aliteração do /v/ imprimem um ritmo muito marcado à frase; no último parágrafo, a construção paralelística “uns”/“outros” acentua um ritmo binário que confere ao discurso uma musicalidade que, sendo mais característico da poesia, é distintiva da prosa de Bernardo Soares. 8. Valor de simultaneidade. 9. Coesão lexical por substituição (sinonímia). 10. a. Valor aspetual perfetivo. b. Valor aspetual genérico. 102 Educação Literária 1.1 Bernardo Soares põe em oposição a metafísica, aquilo que nele é qualquer coisa de espontâneo, e aquilo que é natural e que caracteriza a obra de Caeiro, acabando por referir que viver/conhecer através das sensações pode ser uma forma de purificação (“limpam-me de toda a metafísica”, l. 10). 1.2 A reiteração do verso “Sou do tamanho do que vejo” (l. 7) põe em relevo o modo como Caeiro apreende o real – através da visão – e a admiração que Soares nutre por ele (“como uma inspiração”, ll. 1-2). A citação deste verso desencadeia em Soares uma meditação de caráter existencial que realça a reflexão sobre o ser, exercendo sobre ele uma sensação de liberdade (“sou livre”, l. 13), de segurança (“com uma segurança”, l. 20), de paz e de tranquilidade (“cai a paz indecifrável”, l. 28). 2. A repetição ao nível da estruturação sintática da frase (“[…] de erguer os braços e gritar […] de dizer palavras […] de afirmar uma nova realidade […]”) e a sua extensão conferem ao texto um ritmo forte, muito marcado, que se coaduna com o estado de espírito de euforia do narrador “Tenho vontade de […]”. 103 Leitura 1. Fernando Pessoa revela ser um homem conversador, dinâmico, amante da poesia e da escrita, vivendo um período de dificuldades financeiras. 2. A existência de várias entradas, correspondentes a vários dias, demonstram a ordenação cronológica; os temas abrangem a poesia e a escrita, as amizades, os contactos pessoais e profissionais, a situação económica; a ligação ao quotidiano decorre do teor das informações dadas dia a dia e das deslocações efetuadas. O recurso ao pretérito perfeito do indicativo é uma das marcas de narratividade; o discurso pessoal é visível no uso da 1.ª pessoa nas formas verbais e nos pronomes pessoais (“eu”, “me”). 103 Escrita O diálogo entre as personagens desenvolve-se de forma monótona, abordando temas relativos à literatura (a referência a Orpheu e à escrita), mas também abordando banalidades, como o emprego modesto ou a dificuldade em andar. Esta monotonia, acentuada pelo fumo constante do tabaco, é reforçada pelo cenário escuro, degradado – quer das ruas ou das casas que se avistam da janela quer do próprio quarto onde Bernardo Soares habita. É de destacar o jogo de sombras e de luz, conferindo uma tonalidade de tristeza, visível também no rosto crispado e na dificuldade em encarar a luz ao abrir a janela do quarto. O plano das escadas dá a ideia de um labirinto, o que se coaduna com o estado de espírito da personagem, que confessa o seu desalento. Os efeitos sonoros são quase inexistentes, excetuando o barulho da porta que se fecha (o que também é representativo deste ambiente fechado e solitário) ou do chá que é servido, pondo, assim, em destaque o texto. A articulação com os fragmentos estudados é visível nas falas das personagens (Soares afirma que só consegue escrever fragmentos) e nas temáticas abordadas: o desalento, a reflexão de caráter existencial, a descrença em Deus. (197 palavras) 104 Informar 1. O recurso à imagem e a um discurso conotativo e simbólico fazem do Livro do desassossego uma obra em prosa poética: a paisagem (“as coisas” que povoam o espaço citadino) evoca imagens visuais que permitem ao autor criar uma outra realidade, um mundo imaginário. 2. O Cais de Sodré constitui uma parcela do real concreto que o sujeito observa e transfigura através da representação de imagens visuais, nomeadamente quando ali vê um pagode chinês. 3. Complemento indireto. 4. [D] 105 Educação Literária 1. O narrador considera que tudo no mundo é absurdo: o dinheiro, a procura da fama e de coisas de que não se gosta, o vestuário da rapariga, o forro dos bancos do elétrico, as atividades por detrás da fabricação dessas peças, no fundo, toda a vida da sociedade, o que ilustra as incoerências do ser humano que levam Soares a descrer nesse mundo, que considera sem sentido. 2. Através da observação do vestido da rapariga, o autor transporta-se para um outro mundo, decompondo o vestido, imaginando as fábricas, as máquinas, os operários, as costureiras, as vidas domésticas e sociais de todos os implicados na criação do vestido. Este processo de transformação do real é transmitido num registo poético em que sobressaem as enumerações (“as máquinas, os operários, as costureiras”, l. 18). 3. Reparar é assumido pelo narrador como um ato habitual, quotidiano (“conforme é meu costume”, ll. 8-9). Este olhar atento e demorado dá lugar à imaginação. “Ver” é assim sinónimo de imaginação e leva-o a outros lugares (cf. ll. 29-31), como sucede com Cesário Verde em “O sentimento dum ocidental”. 4. Para Bernardo Soares, “viver” significa “sonhar” − “Vivi a vida inteira.” (l. 32) transmite o cansaço do sujeito, por ter vivido tão intensamente pela imaginação. 5. O quotidiano urbano, a deambulação, o sonho e a transfiguração poética do real. 107 Verificar 1. a. Alberto Caeiro b. Álvaro de Campos c. Bernardo Soares d. Ricardo Reis e. Alberto Caeiro f. Ricardo Reis g. Alberto Caeiro h. Álvaro de Campos i. Bernardo Soares j. Alberto Caeiro 2. a. F − O heterónimo que apresenta uma evolução é Álvaro de Campos. b. V c. F − O poeta modernista e futurista é Álvaro de Campos. d. F − Ricardo Reis aproxima-se de Fernando Pessoa dado recorrer regularmente ao pensamento, de modo a agir de forma racional para evitar as emoções fortes. e. V f. F − A poesia de Reis apresenta regularidade estrófica e métrica, servindo-se, preferencialmente da ode. g. V h. V i. F − Caeiro vive fundamentalmente o presente, recusando o passado e o futuro. j. V k. F − O sensacionismo de Campos afasta-se do de Caeiro, uma vez que o primeiro (Campos) intelectualiza as sensações, querendo experienciá-las na sua plenitude. l. V m. V n. V o. F − Caeiro é o mestre, mas não faz qualquer juízo de valor (pelo menos nos seus poemas) sobre o Modernismo e/ou o Futurismo de Campos. 1 solu??es sentidos12/Unidade 3 - Fernando Pessoa, Mensagem.docx Sentidos 12, Unidade 3 – Fernando Pessoa, Mensagem Cenários de resposta Página(s) Domínio / texto Cenário de resposta 116 Expressão Oral 1. Tópicos de análise − As figuras representadas no Padrão dos Descobrimentos estão relacionadas com a expansão marítima; − Camões cantou os feitos lusitanos e escreveu a epopeia Os Lusíadas, em que narra a descoberta do caminho marítimo para a Índia; D. Sebastião, cujo desaparecimento alimentou um mito, foi também o rei a quem Camões dedicou a sua epopeia; D. Afonso Henriques, o Conquistador, é o responsável pela fundação e expansão do reino português; Ulisses, representado no célebre episódio do canto das sereias, é considerado o fundador de Olissipo, a futura Lisboa. − O objeto que assume proeminência é o Padrão dos Descobrimentos, símbolo do período áureo desta época; sobre o continente africano, encontra-se o símbolo heráldico do Brasão. − Os óculos estão associados a Fernando Pessoa. − O manuscrito pode representar a obra onde Pessoa irá destacar um conjunto de situações e/ou pessoas que estiveram relacionadas com os Descobrimentos, ao mesmo tempo que evoca o manuscrito de Os Lusíadas. − Globalmente, a imagem funciona como uma previsão dos textos que vão ser explorados e dos assuntos abordados na obra da autoria de Fernando Pessoa. Constitui uma espécie de pré-leitura ou de preparação para o que vai ser explorado na Unidade 3. 117 Leitura 1. O autor do texto mostra-se agradado pelo facto de, pela primeira vez, o Dia de Camões e das Comunidades ter sido celebrado pelo presidente da República junto de comunidades luso-descendentes, revelando esse apreço em afirmações como: “Foi, e triplamente muito bem: por o ser, por o ser em Paris, pelo completo e diversificado programa” (ll. 20-21); “Paris era a escolha ‘obrigatória’” quer por se tratar da cidade com mais emigrantes portugueses, quer pelo simbolismo que representa para nós. 2. A evocação de Manuel Alegre é pertinente, uma vez que o escritor se refere aos emigrantes portugueses, obrigados pelas circunstâncias políticas e sociais a abandonar o país e a fixar-se em França (cf. poema “Lusíada Exilado”). 3. O texto apresenta como tese a pertinência e as comemorações do Dia de Portugal se terem realizado junto de comunidades de emigrantes, onde Portugal também está e é. As imagens retratam o momento da chegada a Paris, em 1965, de uma vaga de emigrantes “que as circunstâncias obrigaram a deixar o País para trabalhar longe dele” (ll. 7-9). As fotografias retratam também as vivências de dificuldades naquele país estrangeiro. Assim, esta comemoração em Paris acaba por ser um tributo a todos os portugueses da diáspora, que as fotografias de Gérard Bloncourt homenageiam. 119 Informar 1. Resposta de caráter pessoal. 120 Educação Literária 1. a. Itália b. Inglaterra c. Portugal 2. Na primeira quadra é referida a Europa e faz-se uma particularização geográfica, mediante a distinção entre Oriente e Ocidente, sendo esta a região em que o poema se vai focar; na segunda apontam-se dois países europeus (Itália e Inglaterra); no final, o destaque afunila-se em Portugal. 3. No poema, a Europa surge descrita como uma mulher, considerando-se que Portugal, em termos geográficos, é o rosto do continente europeu, olhando o Ocidente. Estes aspetos podem ser verificados na ilustração que acompanha o poema. 4. O verbo jazer remete para uma Europa moribunda, que é necessário despertar da letargia em que se encontra, aspeto que surge no verbo fitar, também associado a Portugal e representa a vocação marítima dos portugueses. Percebe-se, deste modo, a afirmação “futuro do passado” (v. 11), pois o desvendamento foi futuro do passado e promete repetir-se. 5. A missão profética pressente-se na caracterização do olhar, que é esfíngico e fatal, e que aponta para uma atitude contemplativa e expectante, para o enigma e para o mistério que envolve os Descobrimentos. Além disso, este olhar, que vem do rosto que é Portugal, fita o Ocidente que é futuro do passado, depreendendo-se, assim, que este é o único país da Europa moribunda capaz de fazer renascer o Velho Continente – é essa a sua tarefa messiânica. 121 Educação Literária 1. “O mito é o nada que é tudo” porque, sendo mito, não tem existência concreta; porém, como corresponde a uma crença/ fé, pode ser tudo, dado que as crenças alimentam/dão sentido à realidade. 2. Para comprovar a tese, o sujeito poético serve-se de dois conjuntos de argumentos: (1) o Sol, um elemento da realidade física, e um elemento transcendente, Deus, que é “morto”, “vivo e desnudo”, apontando para a ressurreição e para o seu poder regenerador, apesar de não ter existência física; (2) a crença de que Ulisses aportou no local onde agora se situa Lisboa e aí terá fundado a cidade. 3. Depois de ter fundamentado a sua tese, o sujeito poético passa para a generalização, pondo a realidade na dependência da lenda, como se a primeira não fizesse sentido sem a segunda, porque é a lenda que fecunda a realidade. Sem o mito, a vida seria um vazio. 4. Uma das metáforas presentes surge na utilização do verbo “fecundar”, que, no contexto, sugere o poder regenerador do mito, a sua capacidade de dar sentido à vida e de fazer surgir a realidade. 5. Em ambos os textos, a figura simbólica de Ulisses deu sentido à vida dos portugueses porque, ao fundar a cidade de Lisboa, colocou a primeira pedra do império português. 6. “Este” e "aqui" têm referência deítica de natureza espacial; “aportou” é temporal e pessoal. 7. O pronome “(l)a” tem como referente “a realidade” e exemplifica a coesão gramatical referencial. 122 Educação Literária 1. D. Dinis escreve um “Cantar de Amigo”, uma alusão ao facto de o rei ter sido também poeta (autor de cantigas trovadorescas). Além disso, é também referido como “o plantador de naus a haver” (v. 2), numa clara menção à plantação do pinhal de Leiria por si ordenada. 2. O presente do indicativo contribui para a mitificação do herói, mostrando que, no seu tempo, foi a sua ação que preparou involuntariamente o futuro dos Descobrimentos, tornando o seu contributo intemporal. 3. Sugere-se no poema que a plantação do pinhal de Leiria teria sido preponderante para a construção dos barcos a utilizar nos Descobrimentos (“O plantador de naus a haver”, v. 2), daí que, involuntariamente, o rei tivesse preparado o futuro. 4. O poema integra a primeira parte da obra, “Brasão”, sendo o sexto poema da secção “Os Castelos”. D. Dinis foi o sexto rei de Portugal e antecede o ciclo dos Descobrimentos. Preparou o futuro, criando, no presente, condições para o alargamento do Império, que será cantado na segunda parte da obra. 5. A expressão “E a fala dos pinhais, marulho obscuro” (v. 8) contém uma personificação e sugere o caráter mítico de D. Dinis, uma espécie de intérprete de uma vontade superior, que anunciava aos ouvidos do rei um novo ciclo de conquistas. A metáfora está patente em “um trigo / De Império” (vv. 4-5) e sugere que a génese, a origem do futuro teve início em terra. No fundo, tal como o trigo é a base do pão que alimenta os povos, também os pinheiros serão a base da construção dos barcos que alimentarão os Descobrimentos. O trigo “ondula” ao sabor do vento, os barcos ao sabor das ondas. 6. a. Trovador; b. Plantador A síntese do poema revela-se pertinente, uma vez que destaca a figura de D. Dinis e as ideias-chave do poema. Associam-se a este rei duas atividades distintas, destacando-se aquela que está mais diretamente relacionada com os Descobrimentos. 123 Educação Literária 1. A matriz épica evidencia-se no tom de exaltação heroica que se depreende da evocação do fim trágico do herói, que tem uma forte dimensão histórica. 2. A primeira parte, que corresponde à primeira estrofe, apresenta a autocaracterização do sujeito poético como louco. A segunda, relativa à segunda estrofe, faz a apologia da loucura, elogiando-a e incitando outros a tomá-la, ou seja, a dar continuidade ao sonho que levou D. Sebastião ao norte de África – o de ir mais além. 3. Como consequência da concretização do sonho, orgulhosamente assumido pelo sujeito poético, este encontra a morte (“Ficou meu ser que houve”, v. 5), verificando-se a destruição física. Porém, desse fim trágico, resultaram a sua mitificação e a sua imortalidade: o sonho continua assim a fecundar a realidade. 4. O elogio da loucura é visível no repto lançado aos destinatários para que se deixem imbuir pelo sonho, que é o motor da ação. O apelo lançado assume, assim, uma dimensão nacional e universal. É pela loucura, pelo sonho, que o ser humano se distingue dos animais, da “besta sadia, / […] que procria” (vv. 9-10). 5. A anáfora, presente em “Louco, sim, louco” (v. 1), “Minha loucura” (v. 6) e em “Sem a loucura” (v. 8), permite ao sujeito poético enfatizar a ideia da loucura, uma vez que esse é o seu traço caracterizador e o motor da ação humana. A metáfora, por sua vez, também pode ser encontrada no vocábulo “loucura”, que assume aqui valores conotativos e uma dimensão positiva. Só esta força será capaz de reerguer a nação. 6. O poema é constituído por duas estrofes, de cinco versos (quintilhas). Quanto à métrica, os versos são irregulares, apresentando seis, oito ou dez sílabas métricas. A rima é cruzada e emparelhada tal como se percebe pelo esquema rimático ababb / cdcdd. 7.1 Os dois textos enaltecem a ação e a determinação do rei D. Sebastião – surge como um rei valente e dominador, que, por isso, alcançará a imortalidade. Esta dimensão mítica é expressa pela jovem Maria da obra Frei Luís de Sousa, que enaltece a sua ousadia e rejeita a possibilidade de o rei ter morrido “às mãos dos mouros”: “Não pode ser, não pode ser, Deus não podia consentir em tal” (ato II, cena 1). Maria alude ainda às profecias que transformarão esta crença num verdadeiro mito (“Pois não há profecias que o dizem? Há, e eu creio nelas”, idem). Note-se que também o verso de Pessoa (“Ficou meu ser que houve, não o que há”) remete também para a imortalidade que D. Sebastião alcançou. 124 Educação Literária 1. A realização da "obra" está, em primeiro lugar, condicionada pela vontade divina, e depois pelo sonho do homem. Cumpridas estas duas fases, a obra nascerá. 2. Deus quis que a terra fosse apenas uma e que o mar fosse um fator unificador. Para tal, seria necessário primeiro desvendá-lo para permitir a união entre continentes e povos. 3. Deus escolheu o Infante para cumprir a missão de unificação da terra através do mar. Este é, assim, o símbolo do herói, o agente da vontade divina, predestinado para o grande feito do domínio dos mares. 4. A forma verbal “Sagrou-te” é sugestiva, uma vez que semanticamente se associa à predestinação, à eleição divina, assumindo, por isso, uma conotação religiosa. Foneticamente, remete para o nome do eleito, conhecido como “Infante de Sagres” e também para a escola de navegação que este fundou e que simboliza o início da expansão marítima. 5. O apelo final é dirigido a Deus e justifica-se pelo desalento causado pelo fim do Império marítimo. Torna-se, assim, urgente um novo sonho, que potencie a construção de um império de outra ordem, mais completo porque integrará uma dimensão material e outra espiritual. 6. A gradação, presente no primeiro verso, reflete as etapas que permitirão a concretização da obra: querer, sonhar, nascer. A personificação, a sugerir a rapidez das descobertas, está presente em “E a orla branca foi de ilha em continente, / Clareou, correndo, até ao fim do mundo” (vv. 5-6). Emprega-se ainda a apóstrofe (“Senhor”, v. 12) para identificar o interlocutor e a necessidade da intervenção divina para o nascimento de um novo império. 125 Leitura 1. Um artigo de divulgação científica trata temas da área das ciências, apresentando novos dados, resultados de pesquisas efetuadas em determinados domínios. Acrescente-se que, dependendo do público a que se destina, o artigo pode assumir um caráter mais tecnicista e hermético (quando dirigido a especialistas) ou mais acessível (se destinado ao público em geral). O texto aqui apresentado tem uma natureza fundamentalmente expositiva, as ideias estão hierarquizadas, a informação é seletiva (limita-se a dar conta dos microrganismos existentes em águas termais quentes), além de apresentar rigor e objetividade lexical e de informação. 126-127 Educação Literária 1. O mostrengo apresenta-se como senhor dos mares do fim do mundo e como monstro voador, semelhante ao morcego, que voa, chia e tem um aspeto aterrador, porque é "imundo e grosso” (v. 13); mostra-se ainda arrogante e ameaçador. O homem do leme, por sua vez, revela-se, inicialmente, amedrontado e intimidado, mas, num crescendo de coragem e de determinação, mostra a sua ousadia e valentia, acabando por vencer o seu interlocutor. 2. O navegador muda de atitude quando se consciencializa de que está em representação de um povo e a cumprir a missão que lhe foi incumbida pelo seu soberano, o rei de Portugal. Trata-se, pois, de um herói simbólico, representativo de um povo – daí o caráter épico –, mas que assume simultaneamente uma posição pessoal, carregada de dramatismo, o que lhe confere a dimensão lírica. 3. O mostrengo simboliza o mar desconhecido, os obstáculos e perigos com que os marinheiros se confrontaram e o medo do desconhecido. O homem do leme é símbolo da coragem, da ousadia e da determinação do povo português, que, mesmo com medo, nunca deixou de lutar para cumprir a missão dos Descobrimentos. 4. O tom dramático que se depreende do poema resulta do diálogo que se estabelece entre os dois intervenientes e do ambiente de terror e de mistério que os envolve. A tensão entre os dois interlocutores está também patente na pontuação expressiva, nomeadamente nos pontos de interrogação e de exclamação, nas formas verbais que sugerem movimentos violentos e nas expressões que remetem para apreensões sensoriais. 5.1 Semelhanças: O mesmo objetivo → engrandecimento dos portugueses; o conteúdo épico → a luta com o mar e a coragem do marinheiro representante do povo português; o valor simbólico → perigos e obstáculos que os marinheiros enfrentaram no desvendar dos mares; o medo → as duas figuras provocam reações de terror nos marinheiros. Diferenças: Mostrengo: aspeto animal, próximo do morcego; figura que aterroriza por voar e chiar; derrotado pela coragem e determinação do marinheiro português; interlocutor: homem do leme ao serviço do rei D. João II, reinado em que foi ultrapassado o cabo das Tormentas; tom mais épico e dramático; texto mais curto, mas mais simbólico. Adamastor: aspeto humano, embora medonho; figura aterrorizadora pelo tamanho e pelo aspeto; interlocutor: Vasco da Gama, ao serviço do rei D. Manuel; tom mais lírico do que épico, sobretudo na segunda parte do episódio. 127 Compreensão do Oral 1. a. trágico/funesto/de terror b. determinação/coragem/ousadia c. homem do leme d. perigos/desastres e. “No fundo do mar” f. “Em dias cinzentos” 127 Informar 1. O autor do texto centra a sua atenção na relação intertextual que a obra Mensagem estabelece com Os Lusíadas, de Luís de Camões. Convoca, para o efeito, alguns poemas desta obra de Fernando Pessoa e cruza-os com alguns episódios da epopeia de Camões. 129 Leitura 1. a. V b. F c. F d. V e. V f. V 2. 2.1 [B] 2.2 [C] 2.3 [D] 2.4 [A] 130 Educação Literária 1. A apóstrofe inicial, presente em “Ó mar salgado”, permite interpelar e identificar o responsável pelo drama e pelo sofrimento dos portugueses envolvidos nos Descobrimentos. 2. O valor metafórico dos versos deve-se ao facto de se sugerir que o sal do mar advém das lágrimas vertidas pelos portugueses, as quais, por sua vez, simbolizam o sofrimento e a dor inerentes aos Descobrimentos. 3. As expressões que se associam ao sofrimento são utilizadas para comprovar a afirmação inicial, apresentada nos dois primeiros versos do poema. São elas: “lágrimas”, “cruzarmos” (que remete para a palavra cruz, símbolo do sofrimento de Cristo), “choraram”, “rezaram”, “noivas ficaram por casar” (devido à morte dos amados), “Bojador” (simbolizando os perigos e obstáculos encontrados), “dor”, “perigo” e “abismo”. 4. A interrogação retórica introduz e enfatiza a reflexão posterior sobre a necessidade e a utilidade dos sacrifícios. 5. A dimensão épica resulta da valorização e do entusiasmo perante a concretização do sonho e de ideais elevados, como foram os Descobrimentos portugueses, capazes de conduzir à imortalidade. A vertente lírica, por sua vez, decorre da expressão dos sentimentos do “eu” poético perante os efeitos nefastos das descobertas e também da descrição do sofrimento dos que foram afetados por este empreendimento. 130 Compreensão do Oral 1. a. Turismo de Portugal b. Portugal, situado geograficamente no local onde a terra acaba, é caracterizado como um país de marinheiros, gentes calorosas, um país de contrastes cuja riqueza é a diversidade, com uma natureza intocável; é uma nação jovem e acolhedora; é um país cheio de cor, onde o sol brilha o ano inteiro; é uma terra maravilhosa e cativante. c. Planícies sem fim; praias banhadas pelo Atlântico e pelo sol; florestas encantadas; país de artistas que deixaram a sua marca; castelos imponentes; palácios; o passado ao lado do futuro; praias intermináveis para desfrutar; vários cenários de diversão. d. Linguagem verbal e não verbal, com recurso a várias imagens, delas resultando a persuasão, alimentada pela linguagem valorativa do locutor. e. Promover turisticamente Portugal. 2. O anúncio publicitário convoca diferentes linguagens e neste sobressai a verbal e a icónica. Com efeito, o orador descreve de forma entusiástica e assertiva as imagens que vão passando, acompanhadas por um fundo musical, e que refletem as razões pelas quais Portugal é um país a visitar. Nesta argumentação, destaca-se a variedade e a beleza paisagísticas, a diversidade de atividades de lazer, a riqueza cultural e gastronómica, entre outros aspetos. O objetivo é, pois, promover turisticamente Portugal, tal como evidencia o slogan final. 131 Educação Literária 1. O tema do poema, tal como sugere o título, é a súplica a alguém (Senhor, Deus, D. Sebastião…) para que devolva ao povo português a chama que as cinzas ocultaram. 2. A noite sobrepõe-se ao dia, ao tempo da grandeza, pelo que, neste contexto, a "noite" corresponde ao abatimento, à destruição, à tristeza e ao desalento. 3. O uso da primeira pessoa do plural expressa o coletivo, o povo português aqui representado pelo sujeito poético, que assume como seu o desalento dos outros. Por isso, a sua súplica é também a dos restantes portugueses. 4. A metáfora e a personificação evidenciam a ideia de que a esperança pode ser novamente avivada, porque, enquanto há vida, há esperança. Assim, tal como o fogo quase extinto pode ser reavivado pelo vento, também o sonho pode vir a comandar de novo a ação dos portugueses. 5. O desalento é assumido pelo sujeito poético em representação dos outros, porque, no presente e após a conquista do mar, só restam o silêncio e a saudade. Porém, também sobressai a ideia de que nem tudo está perdido – com uma atitude diferente, a situação pode alterar-se, o que deixa antever a esperança, a fé na mudança. 6. O poema localiza-se no final da segunda parte (“Mar Português”), depois de ter sido apresentado o percurso glorioso da nação, que se deveu ao poder do sonho, que é preciso, agora, alimentar. 7. Complemento indireto. 131 Escrita 1. Introdução: A esperança é fundamental na concretização dos sonhos e dos ideais. Desenvolvimento: − 1º argumento: sem esperança, a vida, “metade de nada, morre”, torna-se vazia e sem sentido; − Exemplo: quem que se limita a viver como “besta sadia, cadáver adiado que procria” está impedido de ser feliz e nunca alcançará a felicidade suprema; − 2º argumento: o ânimo, a fé, a crença são fatores que se associam à esperança e que permitem derrubar obstáculos e lutar pela concretização dos sonhos; − Exemplo: situações catastróficas como uma doença terminal, um sismo ou outro tipo de cataclismo podem ser ultrapassados quando a esperança acompanha quem teve ou esteve sujeito a este tipo de contrariedades. Conclusão: A importância de nunca se perder a esperança para que a vida faça sentido e valha a pena ser vivida. 132 Educação Literária 1. O sujeito poético critica a felicidade alcançada sem esforço e particularmente aqueles que se contentam com pouco, sem que o sonho os mova, considerando “triste” todo aquele que vive apenas por viver (1.ª estrofe). 2. O verso configura uma máxima através da qual se faz a apologia da inquietação, do descontentamento e do sonho como meios para ultrapassar os limites e a finitude humanas. 3. O sonho é determinante para que a vida avance e para que o ser humano se realize. Por isso, deve dominar “as forças cegas” (v. 14), ou seja, tudo aquilo que impeça o homem de sonhar e de realizar os sonhos. 4. Os quatros impérios são a Grécia, Roma, a Cristandade e a Europa. De acordo com o sujeito poético, estes serão esquecidos pelo surgimento de um novo império sob o comando de D. Sebastião, o messias redentor que, tal como sugerido pela interrogação final, não terá morrido. 5. A enumeração tem como função presentificar os quatro anteriores impérios que agora darão lugar ao quinto. A interrogação final evidencia que o mito, a fé e o sonho foram responsáveis pela grandeza dos portugueses de outrora. Uma vez que essas características ainda não desapareceram, a interrogação funciona como um incentivo, que parte da lição que os portugueses de agora deverão tirar da morte de D. Sebastião em nome de um ideal e de uma quimera. 6. O poema é o segundo da terceira parte, onde a par do desalento pelo fim do império surge a esperança na reconstrução e na afirmação da nação portuguesa, aqui projetada no mito do Quinto Império. 133 Informar 1. Logo no primeiro parágrafo do texto A, afirma-se que Portugal será a nação “onde se consumará o Quinto Império” (l. 4); no segundo parágrafo diz-se que o Quinto Império permitiria resolver oposições nacionais. O texto B apresenta a explicação que justifica o surgimento de um novo império, referindo os impérios anteriores, que se fundirão no Quinto encabeçado por Portugal, que assumirá assim uma dimensão “universal” (ll. 12-14). Posto isto, facilmente se confirma que por meio do Quinto Império se faz a exaltação de Portugal. 134 Educação Literária 1. O sujeito poético encontra-se à beira do abismo, nos limites da mágoa, tendo necessidade de se refugiar no mito de um redentor para preencher os seus “dias vácuos” (v. 6). Mostra-se, assim, convicto da vinda de um messias, embora não saiba quando. 2. Na primeira parte, correspondente aos seis primeiros versos, o sujeito poético dá conta da sua tristeza e do único alento que tem para viver; na segunda, que se inicia com a conjunção "Mas" (v. 7), o “eu” lança uma série de perguntas introduzidas por "Quando" e dirigidas a uma entidade mítica, designada por vários nomes (Rei, Hora, Cristo, Encoberto, Sonho, Senhor), e apela à sua rápida vinda, porque só assim ele se libertará da incerteza e se realizará o sonho de alcançar "A Nova Terra e os Novos Céus" (v. 12). 3. O uso sistemático das interrogações traduz o desespero e a ansiedade do sujeito poético, que interroga o seu presumível interlocutor, com o objetivo de conhecer as circunstâncias do seu regresso. 4. A “Nova Terra” e os “Novos Céus” simbolizam o novo império, uma nova realidade que será construída com a ajuda do Sonho, do Senhor a quem o “eu” se dirige. 5. O salvador da Pátria moribunda recebe no poema várias designações, todas elas de caráter místico. Sabendo-se que Fernando Pessoa foi um febroso cultor do sebastianismo e designando este redentor por “Encoberto”, facilmente se pode associar a mensagem deste texto ao culto sebástico. 6. É o único poema de Mensagem que não apresenta título. É constituído por cinco quadras com regularidade métrica, já que todos os versos têm oito sílabas. Também apresenta regularidade rimática, pois só existe rima cruzada. 7.1 No poema pessoano, o estado de desalento do poeta é despertado pela presença do “Senhor” que ele evoca; na letra da canção, o “eu” também sairá da escuridão graças à voz que chama por ele e o lembra que a noite terá fim, tal como a mágoa do sujeito poético do texto pessoano será atenuada pela convicção na vinda do redentor. As constantes interrogações visíveis no texto de Fernando Pessoa enfatizam a preocupação do sujeito que procura saber quando virá o seu salvador; o mesmo se percebe no poema da canção, quando o “eu” reafirma que procura por quem não esqueceu, pedindo apenas um sinal. 135 Educação Literária 1. A nação encontra-se numa situação de crise – indefinição política e social (v. 1); crise de valores, “Nem o que é mal nem o que é bem” (v. 9); desorientação, “Ninguém sabe que coisa quer” (v. 7). Em suma, a nação está a entristecer, a definhar, a perder o brilho de outrora. 2. Os últimos versos dão conta do estado da nação e são uma espécie de grito de alerta e de esperança que funciona como um pedido de ação: o sujeito quer que se saia da letargia e que se parta à conquista, cumprindo o sonho, o destino que foi traçado por Deus para o povo predestinado, o povo português. 3. A metáfora sugere o estado de crise em que se encontra o país. O vocábulo “nevoeiro” apresenta, assim, várias potencialidades semânticas: do oculto pode surgir a luz; quando o nevoeiro se dissipa, o Sol brilha; do nevoeiro pode surgir o salvador. Porém, o que se destaca é a letargia, a inércia e a tristeza que se abateram sobre Portugal. 4. Trata-se do poema que fecha a terceira parte – O Encoberto – e, por conseguinte, a obra Mensagem. Simbolicamente, aponta para o fim, a morte, ainda que esta não possa ser entendida como definitiva, pois dar-se-á o renascimento sugerido nos últimos versos. 5. A gradação, a que se associa a enumeração, é visível em “Ninguém sabe que coisa quer. / Ninguém conhece que alma tem, / Nem o que é mal nem o que é bem” (vv. 7-9) e sugere o estado de desnorte progressivo da nação, centrando-se inicialmente no domínio do saber, depois no do conhecer, culminando num estado de não distinção entre o mal e o bem. O mesmo efeito expressivo tem a anáfora, pois acentua o caráter negativo que paira sobre a nação, reforçado pela utilização dos termos antitéticos “Ninguém” e “Tudo”, pronomes indefinidos que intensificam a atmosfera de incerteza e de nebulosidade que a mensagem do poema veicula. 6.1 Ambas as orações (“que coisa quer”; “que alma tem”) são subordinadas substantivas completivas. 6.2 “Ninguém” é um pronome indefinido. 7. Valor imperfetivo. 136 Informar 1. Segmentos como “Fernando Pessoa pretendeu que o seu livro estivesse acima de qualquer género literário estabelecido, isto é, que, em vez de obedecer servilmente às regras que definem os modos e os géneros, fundisse ‘toda a poesia lírica, épica e dramática em algo para lá de todas elas’”, (ll. 2-5) “Mensagem é um poema épico-lírico-dramático” (l. 6), “Pessoa enaltece através deles a ação de oito heróis” (ll. 13-14) respondem ao solicitado na questão. 2. Os heróis evidenciados na Mensagem assumem todos uma dimensão simbólica, dado serem mitificados e presentificados como modelos e/ou símbolos que importa voltar a impor num Portugal moribundo como o que existia na época em que esta obra de Fernando Pessoa foi publicada. 137 Informar 1. a. No texto afirma-se que “o sebastianismo começa por ser um assunto que abrange o Quinto Império e acaba por estar subordinado a este último numa etapa de escrita cronologicamente posterior”, o que se compreende, bastando, para isso, ver o poema “Quinto Império”, em que se fala no advento desta realidade espiritual e se refere especificamente o mito sebastianista ao pôr-se em dúvida a morte do rei português. Também neste texto se diz que “Nos primeiros anos da escrita sebastianista, Pessoa refere o Quinto Império, o império definitivo e universal a ser alcançado após o regresso de D. Sebastião”, entendido como figura simbólica. b. D. Sebastião é visto como salvador, como garante da resolução do marasmo em que se encontrava a nação, construindo “o império definitivo e universal”. Mas mais importante ainda é que o rei português adquire um estatuto simbólico, ilustrando o caráter esotérico da obra pessoana. 2. A unidade estrutural de Mensagem resulta da sua tripartição, na qual se representa o ciclo da vida da nação. Com efeito, na Parte I salienta-se a dimensão profética de Portugal; na Parte II, os grandes feitos náuticos; na Parte III “profetizam-se […] as realizações futuras da pátria portuguesa”. 139 Verificar 1. [A] – [3] [B] – [4] [C] – [10] [D] – [1] [E] – [6] [F] – [7] [G] – [2] [H] – [5] 2. a. V b. V c. F – Fernando Pessoa alimenta os mitos e explora o seu valor. d. F – O Quinto Império tem uma dimensão imaterial: é um império cultural e espiritual. e. V f. V g. F – O herói, em Mensagem, tem um caráter simbólico. h. F – O tempo em que surge Mensagem é de deceção, de marasmo e de inércia, o que alimenta um tom disfórico. i. V j. V k. V l. V 9 solu??es sentidos12/Unidade 4 - Contos .docx Sentidos 12, Unidade 4 – Contos Cenários de resposta Página(s) Domínio / texto Cenário de resposta 146 Informar 1. Narrativa pouco extensa e, por isso, concentrada. As personagens são em número reduzido, havendo, geralmente, uma centralizadora que confere unidade ao conto. O espaço e tempo apresentam linearidade e surgem numa perspetiva convergente; particular exigência no que se refere ao equilíbrio da dimensão narrativa e descritiva, fruto da reduzida extensão. 147 Compreensão do Oral 1. a. F – O programa radiofónico foi transmitido por ocasião do centenário do nascimento do escritor (15 de outubro de 2011). b. F – O autor era um amante da liberdade, por isso foi oposicionista ao Estado Novo. c. V 2.1 [D] 2.2 [B] 2.3 [A] 2.4 [C] 3. [A], [E] 149 Aplicar 1. [A] – [1] e [3] [B] – [2] e [5] [C] – [4] e [6] 2.1 a. Leitura de um conto de Manuel da Fonseca no 3.º ciclo. b. Dia seguinte ao da leitura de um conto de Manuel da Fonseca no 3.º ciclo (lendo mais dois contos do mesmo autor). c. Dia anterior ao momento da enunciação (“Ontem”, dia da leitura do último conto de Manuel da Fonseca). d. Momento da enunciação. 2.2 a. Anterioridade. b. Posterioridade. c. Anterioridade. 2.2.1 a. O complexo verbal “tinha lido” remete para uma ação anterior à que ocorreu na véspera do momento da enunciação, ou seja, realizada antes do “ontem”. b. Considerando que o [D] corresponde ao momento da enunciação (“hoje”), conclui-se que o [C] é anterior a este, ou seja, reporta-se ao “ontem”, comprovado pelo uso do pretérito perfeito, exemplificado na forma verbal “li”. c. A afirmação “Depois desse primeiro contacto”, que ocorreu no 3.º ciclo, situa a ação correspondente ao [B] num tempo anterior ao do momento da enunciação, que é o do “hoje”. 2.3 Formas verbais simples: “li”, “fiquei”, “confirmaram”; formas verbais complexas: “tinha lido”, “fui ler”. 2.4 Pretérito perfeito do indicativo. 150 Informar 1. a. F – O espaço representado é o Alentejo rural, mas apresentado como palco de “conflitos e tensões” (l. 8). b. V c. V d. F – As personagens são caracterizadas pela solidão e pela angústia. 156-159 Educação Literária 1.1 Primeira parte – “Solidão”: a vida dos habitantes era monótona e triste; durante o dia os homens trabalhavam e à noite dirigiam-se para as suas casas e dormiam; António Barrasquinho passava o dia sentado à espera de atender os poucos fregueses que se deslocavam à sua venda. Segunda parte – "Convivialidade": após a chegada da telefonia, todos os habitantes se dirigiam no fim de um dia de trabalho à venda onde conviviam e ouviam notícias e canções. A – primeira parte do conto 2. António Barrasquinho (Batola) tem uma compleição física baixa, é “atarracado, as pernas arqueadas” (ll. 10-11) e veste de forma tipicamente alentejana: ‘chapeirão’, ‘o lenço vermelho amarrado ao pescoço’” (ll. 11-12). É indolente, apático, “vem dormindo lá dos fundos” (l. 2); “vem tropeçando nos caixotes” (l. 9), infeliz, solitário, alcoólico, “senta-se e começa a beber a pequenos goles” (ll. 15-16); violento, “Era o Batola, bêbado, a espancar a mulher” (ll. 46-47). A mulher é “Muito alta, grave” (l. 4), tem “um rosto ossudo” (ll. 4-5); é responsável, diligente, “abre a venda e avia aquela meia dúzia de fregueses” (l. 3); “volta à lida da casa” (l. 4); determinada, autoritária, dominadora, “é ela quem ali põe e dispõe” (l. 5). Os ceifeiros trabalham arduamente nos campos, de onde chegam exaustos do dia de imenso trabalho, “figurinhas dobradas pelos atalhos” (l. 85). O Rata, personagem evocada por Batola, é um mendigo, um agente de mudança, pois trazia o mundo à aldeia, combatendo a solidão de Batola e o isolamento de Alcaria: “Pedia de monte a monte, […] Até fora a Beja. Voltava cheio de novidades.” (ll. 54-56). 3. O relacionamento é conflituoso: ela é dominadora quando tem de tomar decisões, ativa; ele é violento quando está ébrio; ostenta uma postura passiva. 4. A ação passa-se na pequena aldeia alentejana de Alcaria, mais especificamente num microespaço que é a venda do Batola. 5. Alcaria é perspetivada como um espaço pobre, deserto, isolado, transmitindo monotonia e solidão. A venda do Batola, que comunica com os fundos da casa, caracteriza-se igualmente pela pobreza e pela desarrumação e desleixo. Destaca-se ainda o caminho que passa ao lado da venda e através do qual se estabelece comunicação com o exterior, com o mundo: “o velho caminho que vem de Ourique e continua para sul”. 6. Os habitantes eram pobres, tal como o espaço em que habitavam, estavam isolados do mundo e viviam do trabalho dos campos; o seu ritmo de vida dependia da luz do Sol e a chegada da noite trazia-lhes ainda mais solidão e mais escuridão. 7.1 Batola sentia-se abatido, solitário e desalentado com o que observava em seu redor: “para qualquer parte que volte os olhos, estende-se a solidão dos campos” (ll. 77-78), “despropósito de plainos sem fim, todos de roda da aldeia, e desertos!” (ll. 80-81). 7.2 “solitário como um desgraçado” (l. 44) e “[…] engrossa até se alongar, como um uivo de animal solitário” (ll. 95-96). Estas expressões retratam a solidão e a infelicidade dolorosa; no primeiro caso, fruto do mau relacionamento com a mulher, e, no segundo, do isolamento e da monotonia em que vive. 8.1 O espaço psicológico é perspetivado quando Batola recorda o velho amigo Rata e a novidade que este trazia de outros espaços que se afiguravam diferentes daquele onde se encontrava. No fundo, a personagem Rata comprova o isolamento a que Alcaria estava votada e a solidão dos seus habitantes: (“[…] lhe vem à ideia o velho Rata” até “por todo aquele mundo.” (ll. 53-57). 9. O modo de vida das personagens é rotineiro e monótono, comprovável pela utilização do gerúndio no complexo verbal em várias referências a Batola (“vem tropeçando nos caixotes”, l. 9; “enquanto vai passando as mãos pela cara”, l. 11), e o espaço é desolador e vasto. Estas duas características levam à perceção de que o tempo “se arrasta” e que não passa, como se verifica em segmentos textuais como “matando o tempo com longos bocejos” (l. 49) ou “No estio […] os dias do tamanho de meses” (ll. 49-50); “carregado de tristeza, o entardecer demora anos” (l. 82); “a noite […] tomba tão vagarosamente” (ll. 82-83). Apresenta-se, portanto, uma perspetiva psicológica do tempo. 10.1 As expressões encerram personificações relativas ao espaço e ao tempo e contribuem para a caracterização psicológica destas duas categorias narrativas. Dir-se-ia que são o espaço e o tempo que condicionam o comportamento dos seres humanos, que não conseguem vencer nem mudar a monotonia nem a rotina das suas vidas; tanto o que se avista (espaço) como o dia a dia (tempo) são tão deprimentes que os habitantes estão condenados ao isolamento e à letargia. A descrição das casinhas como “nuas” remete ainda para a pobreza extrema do espaço físico. B – segunda parte do conto 1.1 A rotina será alterada pela chegada de dois estranhos, o vendedor e Calcinhas, que, supostamente por terem problemas no carro, tiveram de parar. Então, o homem bem vestido aproveitou para vender uma telefonia a António Barrasquinho. 2.1 O vendedor representa o progresso. A personagem faz uso da sua capacidade persuasiva para convencer Batola a comprar uma telefonia, o que, inicialmente, não se mostra tarefa complicada. Mais difícil foi convencer a mulher de que o rádio seria importante naquele deserto. Destacam-se como características o poder de argumentação na demonstração das qualidades do rádio; o poder de persuasão, uma vez que convence a mulher a ficar com o rádio, “se não quiserem, devolvem-na” (l. 177). Na opinião de Batola, ele é “simpático e franco” (l. 120), o que acaba por contribuir para o seu engenho de vendedor. No entanto, toda a estratégia usada pelo vendedor indicia o seu caráter enganador: por um lado apresenta como razão para ter parado na venda uma avaria do carro; por outro, aceita deixar o aparelho à experiência durante um mês, mas levando consigo as letras assinadas por Batola. 2.2 O discurso direto permite, por um lado, dar destaque à personagem – o vendedor – e ao seu papel na tarefa de vender o aparelho. Por outro lado, o alargamento diegético deste passo do texto leva a que o tempo da narração seja equivalente ao tempo da ação, o que nos permite assistir à eficácia do discurso e ao modo como determina a decisão de Batola. Além disso, imprime vivacidade e transmite verosimilhança ao texto narrativo. 3. Ao decidir a compra do aparelho, desafiando a mulher, “Pronto! Quem manda sou eu!” (l. 167), Batola vai provocar várias mudanças, desde logo, a sua própria transformação, a da vida dos ceifeiros (e dos restantes habitantes da aldeia) e a alteração da relação conflituosa entre ele e a mulher. 4. Os habitantes da aldeia, que anteriormente recolhiam cedo a suas casas, passaram a vir à venda, a ouvir as notícias e as melodias, deixando, assim, de viver na solidão. A telefonia trouxe o convívio e a comunhão a Alcaria (“Um sopro de vida paira agora sobre a aldeia”, l. 198). A rádio trazia o mundo ao deserto alentejano quer através das notícias (da guerra) quer através da música. Desta forma, os habitantes da aldeia “sentem que não estão já tão distantes as suas pobres casas” (l. 199). 5.1 Barrasquinho mostra-se animado, lúcido, responsável (“começou a levantar-se cedo e a aviar os fregueses”, l. 212); conversador, interessado, ansioso por notícias (“é, de todos, o que mais vaticínios faz sobre as coisas da guerra.”, ll. 213-214). 6. As notícias de guerra dadas pelas emissões de rádio permitem localizar a ação no período da Segunda Guerra Mundial: “notícias da guerra!...” (l. 139) e “aquela voz poderosa fala de cidades conquistadas, divisões vencidas, bombardeamentos, ofensivas.” (ll. 201-202). 7. Apesar de a ação do conto se prolongar por um mês, os momentos centrais são o dia da chegada do vendedor, que traz consigo o rádio, e o dia em que termina o período experimental (que corresponderá à reconciliação de Batola com a mulher). Podem salientar-se, ainda, as referências às noites de todo o mês porque correspondem, num primeiro momento, à letargia habitual, por oposição ao posterior período de vitalidade da aldeia, motivado pelas audições radiofónicas. 8. Ao contrário da morosidade da passagem do tempo na primeira parte do conto, provocada pelo isolamento de Alcaria, na segunda, a mudança no modo de vida das pessoas, o convívio que ocorre à noite à volta da telefonia, dá a ideia aos habitantes de que não estão isolados, transmite a sensação de que, afinal, o tempo passa rápido: “o fim do mês caiu de surpresa em cima da aldeia da Alcaria.” (ll. 222-223). 9.1 Por um lado, atendendo à brevidade narrativa, característica do conto, trata-se de uma questão de economia narrativa. Ao reportar o discurso da personagem, o narrador tem a possibilidade de introduzir um adjetivo – “apressado” − mostrando uma oposição relativamente à atitude por ela assumida durante a venda do aparelho. 10.1 O fim deste mês poderia significar a devolução do aparelho, tal como impusera a mulher de Batola. Essa possibilidade representaria o regresso à solidão, à miséria, à vida dura e monótona do trabalho rural e o fim da “convivialidade”. No fundo, nada mais esperaria aquela população do que a solidão da noite e uma vida pouco digna enquanto seres humanos: “[…] saíram da venda mudos e taciturnos. Fora esperava-os o negrume fechado. E eles voltavam para a escuridão, iam ser, outra vez, o rebanho que se levanta com o dia, lavra, cava a terra, ceifa e recolhe vergado pelo cansaço e pela noite…” (ll. 226-229). 11.1 Chegado o momento de devolver o rádio, é a mulher de Batola que, com ar submisso, sugere ao marido que não devolva o aparelho: “− Olha… Se tu quisesses, a gente ficava com o aparelho:” (ll. 245--246). Esta personagem, autoritária e arrogante no início da ação, aparece transformada, após um mês de ausência. Perdeu a postura dominadora e apresenta “uma quase expressão de ternura” (l. 244) após perceber que, afinal, viviam num deserto e só aquele aparelho permitiria uma ligação ao “mundo”. 12.1 Pela análise do conto, pode associar-se a ideia de “cinzas” à primeira parte, em virtude da ausência de vitalidade dos aldeãos, do seu quotidiano “cinzento” e desconsolado, fruto da solidão em que viviam naquele “deserto”. O “fogo” corresponderá à segunda parte, que descreve a mudança operada na aldeia pela telefonia. Assiste-se a “um sopro de vida”, que leva os habitantes de Alcaria (homens, mulheres, crianças, namorados, …) à venda do Batola todas as noites para ouvir “as notícias da guerra” e “as melodias que vêm de longe”. No fundo, das cinzas renasceu o fogo! C – globalidade do texto 1. a. Anterioridade. b. Simultaneidade. c. Posterioridade. 2. Modalidade deôntica, valor de obrigação. 3. a. Predicativo do sujeito. b. Sujeito. 4. a. Derivação não afixal. b. Derivação por sufixação. 5. Valor temporal. 6. Orações coordenadas assindéticas. 7. “lavra”, “cava”, “terra”, “ceifa” e “recolhe”. 8. Coesão gramatical referencial (uso anafórico de pronomes). 9. a. Sonorização e metátese. b. Vocalização. 159 Compreensão/Expressão Oral 1.1 a. F − Tem havido sempre crescimento. b. F − Cerca de três quartos das fotografias tiradas são divulgadas na Internet. c. V d. F − A rotina diária, desde o acordar até ao deitar, é o "alvo" preferido da fotografia. e. V f. V g. V h. F − Apesar de se tirarem mais fotografias digitais, elas não terão a longevidade das “de papel” e, portanto, perder-se-ão mais facilmente, e com elas a memória de tais momentos. 2.1 Resposta de caráter pessoal. No entanto, poderão ser desenvolvidos os seguintes tópicos: − as características, as origens e os interesses dos membros mais antigos da família, os antepassados; − a construção da história de cada geração da família e o modo como esta se desenvolve; − as festas de família e o reforço dos laços familiares; − a evolução física, as diferentes fases de crescimento e as mudanças que sofremos desde que nascemos. 160 Informar 1. [A] – [5] [B] – [7] [C] – [2] [D] – [6] 161 Informar 1. a. Relação marcada por oposições − ela é diligente, trabalhadora, sossegada, mas ativa; Batola é indolente, passivo, apático. Conhecemos o nome, apelido e alcunha da personagem masculina; da mulher, nem o nome. b. Relação de amizade e convivência enquanto foi possível a Rata “viajar” e trazer as novidades. Na doença do mendigo, Batola é solidário com o amigo, mas “nem trocavam palavra” (l. 21); contudo, a morte do antigo mensageiro agudiza a solidão de Batola. c. Relação de oposição no que se refere à “produtividade” e à “dureza da vida”. Batola é preguiçoso e os ceifeiros trabalham todo o dia arduamente. Os homens são desprovidos de bens e Batola usa um fio de ouro no colete; os homens sentem a solidão e a falta de esperança e Batola tem consciência dessa condição dos seus conterrâneos. No entanto, tanto ele como os outros apresentam uma certa condição animalesca. 164-165 Aplicar 1.1 [A], [D] e [G] – Descrição: utilização do presente, do pretérito perfeito e do pretérito imperfeito; recurso à adjetivação (“desgarradas e nuas”); recursos expressivos – personificação “casinhas […] nuas”. [B] e [F] – Narração: sequencialização de ações; recurso a marcadores espácio-temporais ("uma última vez"; “ao meter os papéis dentro da pasta”) [C] – Dialogal: alternância de interlocutores; sinais gráficos da mudança de interlocutor; recurso à pontuação (interrogações e exclamações) para simular a modulação de voz da oralidade. [E] – Explicativo: finalidade de demonstrar o funcionamento do aparelho (rodar o botão); recurso à especificidade lexical e ao presente do indicativo. [H] – Argumentativo: tentativa de convencer o interlocutor através do argumento “financeiro”; verbos no presente do indicativo. 2.1 [A] – Descritiva; presente do indicativo – “sobe que sobe”; “há de”; estruturas qualificativas: “janelas de guilhotina”, “telhados de ardósia em escama”; recursos expressivos: enumeração “de esquinas de azulejo, janelas de guilhotina, telhados de ardósia em escama”. [B] – Narrativa; marcador temporal – “No dobrar do século XIX”; sequencialização das ações; utilização do pretérito perfeito: “fracassou”, “gostou”. [C] – Explicativa; vocabulário específico – “A corrente faz girar um imã dentro de uma bobina”; explicação do funcionamento do semáforo. [D] – Descritiva; recurso a modificadores – frases relativas “que se aproxima”, “que tem corrido mundo”, “que tem morado no fundo de uma gaveta”; utilização de verbos de estado: “é vago e sem contornos”. [E] – Narrativa; utilização de verbos no pretérito perfeito e sequencialização das ações: “teve”, “casou-se”, “divorciou-se”; no entanto, de “fez loiros cabelos” até “como dantes eram” o segmento é descritivo. 167 Leitura 1. Determinantes possessivos: “Minha avó” (l. 6); “Meu avô” (l. 9); pronomes pessoais: “Não sendo eu” (l. 16); “deslocar-me” (l. 23); formas verbais na primeira pessoa do singular: “tenho [para contar]” (l. 23); “reparei que” (l. 24). 2. Em primeiro lugar, a não coincidência entre o tempo da escrita e o do acontecimento evocado, conforme se vê nas múltiplas referências ao passado, por oposição ao presente, conforme os segmentos textuais: “Não sendo eu então, e até hoje” (l. 16); “caberia aqui […] se não fosse outra a história que tenho para contar” (ll. 22-23); “Fossem estes meus avós […], e eu admitiria, hoje” (ll. 32-33). Em segundo lugar, o recurso à memória, visível em vocábulos como “recordação” ou “lembrança”. 3. O desafio subtil do avô quando chegava a casa, à tardinha, depois do trabalho e a “proibição” da avó transformaram “o fruto proibido” em “fruto apetecido”. 4. A ação passa-se em 1933, um ano depois de Salazar ter chegado à Presidência do Conselho em Portugal, ou seja, nos primórdios do Estado Novo. Na Europa, assiste-se à subida de Hitler ao poder, o que virá a originar a Segunda Guerra Mundial. 5. O isolamento do Ribatejo – o Século era o único jornal que chegava à Azinhaga; o analfabetismo dos avós e a pouca instrução dos restantes familiares; a fotografia do chanceler austríaco Dollfuss a assistir a um desfile de tropas e a constatação de que era “baixinho”. 6. a. LEGERE > leger > leer > ler – apócope, síncope e crase (por ordem); b. Palatalização. 7. Parassíntese. 8. Modalidade epistémica com valor de certeza. 9. Complemento do nome. 167 Escrita Sugere-se o seguinte plano: Introdução: referência à necessidade de o ser humano guardar momentos importantes da sua vida. Desenvolvimento: – relevância desses momentos para preservar, por exemplo, os laços afetivos que o unem a outras pessoas; − pertinência da memorização das aprendizagens efetuadas no percurso de vida e evolução do ser humano. Conclusão: a memória é fundamental para o crescimento psicoemocional e social do ser humano. 168 Compreensão do Oral 1.1 a. Nascimento (em Lisboa). b. Casamento com Urbano Tavares Rodrigues. c. Permanência em França. d. Morte (em Lisboa). 1.2 Escritora e colaboradora em jornais e revistas. 1.3 Tanta gente, Mariana − estreia literária (1959); As palavras poupadas – prémio Camilo Castelo Branco; Os armários vazios; Flores ao telefone; Seta despedida; A flor que havia na água parada. 2. [A] – [3] [B] – [6] [C] – [8] [D] – [7] [E] – [2] [F] – [4] [G] – [9] [H] – [10] 3. Pelo discurso, facilmente se infere um relacionamento de enorme cumplicidade, amizade e amor entre o casal. São evidentes as marcas emotivas no seu discurso, sobretudo pelo recurso às marcas não verbais: emotividade do discurso, semblante alegre, … 169 Informar 1. a. F – Só são póstumas as obras A flor que havia na água parada e Havemos de rir? b. F – É um marco graças à técnica narrativa evidenciada. c. V 169 Escrita 1. Da obra da autora constam textos narrativos, textos dramáticos e poéticos. No entanto, são os primeiros que maior relevância assumem e destes destaca-se a primeira obra, Tanta gente, Mariana…, pois aí são já visíveis aspetos técnico-estilísticos e temáticos que viriam a caracterizar a obra da escritora. A sua escrita, límpida, mas consistente, apresenta-nos uma visão desencantada da vida e da condição humana e versa temas como a solidão, a morte ou a passagem do tempo. (75 palavras) 174-175 Educação Literária 1.1 A personagem chama-se George e caminha numa rua longa, mas familiar, uma vez que é a “rua onde George volta a passar depois de mais de vinte anos” (ll. 3-4). 2.1 A construção do retrato faz-se, aparentemente, com apelo à memória. O rosto da jovem vai surgindo aos poucos e vai ganhando contornos mais definidos à medida que vai ficando mais presente. Inicialmente é desfocado, “vago e sem contornos” (l. 12), como se se tratasse de uma mancha. Vai ganhando, depois, feições, ainda que “incertas”. Ao ficar mais próximo, destacam-se os olhos largos, semicerrados, a boca fina e os cabelos lisos escuros “sobre um pescoço alto de Modigliani” (ll. 21-22). 2.2 As sensações visuais dominam a construção do retrato, tal como se de uma pintura se tratasse, desde a descrição dos vestidos, “claros, amplos” (l. 9), ao seu movimento e à composição do rosto, “vago e sem contornos” (l. 12), “pincelada clara” (ll. 12-13), “mancha pálida” (l. 16), “olhos largos” (l. 20) e “pescoço alto” (l. 21). Existe também o recurso à sensação auditiva na referência à voz “real e viva” (l. 17). 3. Simbolicamente, estas alusões dão conta do desdobramento da personagem, comprovável pelo movimento dos vestidos (que são muito semelhantes), pela fotografia que George tem guardado ao longo da vida, e que constitui o seu único “fetiche”, e que é, afinal, a imagem “da mais nova”, e, por fim, pela voz que se mantém clara como no passado, apesar de todas as perturbações da vida de George. Todas estas referências indicam que se trata de uma recordação e não da realidade, o que se comprova por meio da expressão “nesse tempo, dantes, não sabia quem era Modigliani”. 4. Ironia, uma vez que pretende evidenciar as diferenças culturais entre George, que era conhecedora de literatura, cinema e pintura, e os seus pais, que ela considera quase ignorantes, o que acaba por influenciar a sua decisão de partir. 5. A interrogação pretende reforçar a inconstância e o caráter plural de George, ideia que percorre todo o parágrafo. Em primeiro lugar, as várias transmutações físicas, evidenciadas na mudança da cor dos cabelos, sem, contudo, se aproximarem da cor primordial; em segundo lugar, as vivências amorosas (“Teve muitos amores”, l. 36, “casou-se, divorciou-se”, l. 37) e o movimento físico que caracteriza a sua vida, “partiu, chegou, voltou a partir” (l. 38). 6. George desloca-se à vila após a morte dos pais, para vender a casa que herdou. Esta ação originou o reencontro da mulher adulta com a jovem que foi no passado (“cujo nome quase quis esquecer, quase esqueceu”, ll. 8-9), mas de quem nunca se tinha libertado (guardou sempre a sua fotografia), o que acabará por suceder agora, já que o frágil elo que ainda a ligava ao passado (a casa) se quebrou, afastando por completo Gi (“o esquecimento desceu sobre ambas”) e o espaço natal (“Árvores, casas e mulher acabam agora mesmo de morrer”, ll. 123-124). 7.1 Ambos ambicionam coisas diferentes da vida. Carlos pretende “criar” raízes na vila; construir uma casa, o que poderá ser entendido com obtenção de estabilidade e fixação ao local. Gi, por seu lado, pretende ver o mundo, partir, vontade que não concretizará se tiver a casa; por isso, vive em casas arrendadas, não estando presa a pormenores: a casa alugada é a certeza de “rua nova à espera dos seus pés” (l. 48). 8.1 A velocidade do comboio associada à simbologia do termo “fugir” significa o corte radical com o passado. Quebrado o laço umbilical com o berço materno – a casa –, nada mais a ligará a quem foi. 9.1 O processo de construção é semelhante ao da figura feminina mais jovem, Gi. A figura vai-se criando “aos poucos como um puzzle gasoso, inquieto, informe”, até se corporizar, neste caso, numa “mulher velha” (l. 136). 10. O discurso direto evidencia a personagem e a relevância da sua voz; o diálogo entre o presente, George, e o passado, Gi, funcionando como uma analepse através da qual são revelados aspetos do passado da personagem e confirmadas algumas informações do presente – vive em Amesterdão. Já no confronto com o futuro, a personagem autoassume o seu receio da passagem do tempo e as repercussões que isso terá no plano pessoal (“cheguei à ignomínia de pedir […] retratos da minha família”, ll. 156-157) e profissional (“um dia vai reparar […] que as mãos lhe tremem”, ll. 165-166). 11. As três fases da vida humana aparecem fragmentadas e são corporizadas pela memória e pela imaginação, estando representadas no nome que a personagem vai assumindo ao longo dos tempos: Gi, uma jovem de 18 anos, repleta de sonhos e de projetos, que anseia abandonar a terra natal para os cumprir. George, adulta, no apogeu da vida, tem 45 anos, pintora bem-sucedida, “já com nome nos marchands das grandes cidades da Europa”, mulher independente a todos os níveis – financeiro, profissional, amoroso. Georgina, precursora do futuro de George, antevendo os temores emocionais, anuncia a solidão (“vivo tão só”) e o envelhecimento físico. 12. A viagem física de George dá origem a uma viagem interior. Desta forma, por um lado, dá-se o reencontro com o seu passado e a revisitação, através da memória, desse tempo e dos sonhos que a povoavam e a impeliam a partir; por outro, através de uma idealização, é possível antever o envelhecimento físico e a solidão causadas pelo desprendimento emocional em que George vive. Comprova-se, assim, prevalência do espaço psicológico. 13. O nome da personagem, aparentemente masculino, dever-se-á à sua maneira de ser, mulher independente, liberta, também no campo amoroso, e com vontade de vencer no mundo da pintura, isto é, uma mulher que é o oposto das suas contemporâneas e conterrâneas, muito mais dedicadas a tarefas ditas ou consideradas mais apropriadas às mulheres. 14. Trata-se de um conto em virtude da concentração espacial e temporal. A história desenrola-se em dois espaços: numa rua (da vila natal de George) e no comboio que leva a personagem de regresso a Amesterdão. Decorre num curto período de tempo: correspondendo ao curto diálogo de George com o seu “eu” do passado e à antevisão do “eu” do futuro. E a ação é única: uma viagem interior da pintora. Está também presente uma personagem única. 15.1 Descritiva – recurso à adjetivação/estruturas qualificativas – “pesada e espessa e dura”; “[aragem] macia e como que redonda”. Narrativa – sequencialização de ações – “Andam lentamente”; “onde George volta a passar”; “perdeu a bússola”. 16. “bibelots” – empréstimo; “guarda-chuva” – composição morfossintática (palavra + palavra). 17.1. b e c 17.2 b. abdica/renuncia/prescinde; c. disponível/por perto 18. coesão gramatical referencial; interfrásica – uso do conector adversativo. 175 Expressão Oral 1. A tela de Klimt representa três figuras femininas: uma mulher idosa, uma jovem e uma criança, todas nuas. Esta representação poderá querer evidenciar o ciclo da vida (a infância, a idade adulta e a velhice), mostrando a passagem do tempo e a sua influência no ser humano. A mulher idosa encontra-se de perfil, com os cabelos a tapar-lhe o rosto, apresentando as consequências físicas da passagem do tempo: seios caídos, flacidez e deformações que se espalham por todo o corpo. Ao lado, está uma jovem mãe, com cabelos ruivos, cujo aspeto físico não revela ainda a passagem do tempo, uma vez que os seios são firmes e a pele não se apresenta envelhecida; segura ternamente uma criança adormecida nos braços, denotando tranquilidade e segurança, reforçadas pela existência de um manto que envolve as duas figuras. (fonte consultada: http://www.unicamp.br/chaa/eha/atas/2009/TERRA,%20Manan%20-%20VEHA.pdf) 175 Escrita 1. Proposta de desenvolvimento do texto: − A imagem de Klimt pode ilustrar o presente, o passado e o futuro de George. − A figura mais velha será o retrato que Georgina coloca perante os olhos de George – a inevitável influência da passagem do tempo. − A mulher adulta será a fase do presente da pintora – a beleza e a fecundidade. − A criança representará a fase mais jovem de George, a ingenuidade de Gi, o passado e a maturação do espírito e dos sonhos. 176 Informar 1. [D] – [B] − [A] – [C] 177 Informar 1. a. F – Afigura-se como um momento introspetivo sobre a existência humana. b. V c. F – A foto serve de modelo aos seus autorretratos, mas é uma forma de lhe recordar a sua imagem quando jovem. 179 Leitura 1.1 [B] 1.2 [B] 1.3 [D] 1.4 [B] 1.5 [C] 1.6 [A] 1.7 [B] 181 Verificar 1. a. F. A ação decorre na década de 1940 (durante a Segunda Guerra Mundial). b. V c. F. O comportamento e o modo de agir de Batola revelam que a personagem sofre com o isolamento da terra. d. F. Antes da chegada da rádio, a mulher de Batola toma as decisões e dirige a vida pessoal e profissional do casal. e. F. As novidades são contadas a Batola na venda. f. F. Na primeira parte do conto não existe vida social; todos se recolhem nas suas casas com o cair da noite. g. V h. F. A rádio foi mais importante, já que permitiu aos habitantes de Alcaria o contacto com o mundo exterior; saber as notícias do país e do mundo e também ouvir música. i. F. O conto apresenta concentração espácio-temporal da ação. 2. [A] – [3] [B] – [5] [C] – [6] [D] – [2] [E] – [4] [F] – [8] 8 solu??es sentidos12/Unidade 5 - Poetas contempor?neos .docx Sentidos 12, Unidade 5 – Poetas contemporâneos Cenários de resposta Página(s) Domínio / texto Cenário de resposta 188 Compreensão do Oral 1. a. Favorável à atribuição do Prémio Nobel a Dylan. b. Uma canção pode ser uma obra de arte. c. As canções de Dylan, tal como a literatura, transmitem emoções, falam-nos de nós próprios; persiste, no entanto, a dúvida de que tenham uma dimensão superior. d. Indiferente à atribuição do prémio. e. A vontade de premiar o melhor escritor não é a primeira prioridade da Academia Sueca. f. O letrista é um poeta, um poeta é um escritor, e o que Dylan faz é literatura, mas Bob Dylan não é um dos melhores poetas do mundo. g. A atribuição do Prémio Nobel não é uma coisa muito importante, tendo em conta que alguns dos maiores escritores (Tolstoi, Joyce, Gorki e Kafka) nunca o receberam. 2. Resposta de caráter pessoal. 188 Expressão Oral 1. Resposta de caráter pessoal. Contudo, pode desenvolver o seguinte tópico: − a arte permite estimular a criatividade, desenvolver a comunicação, contribuir para o alargamento de horizontes culturais, promover a aceitação da diferença, contribuindo, assim, para a formação integral do indivíduo. 189 Compreensão do Oral 1. a. V b. F – Preocupa-se com a essência dos homens e com a essência das coisas c. V d. V e. V f. V g. F. – O 25 de Abril fê-lo sentir-se feliz, mas acabou por perceber que esse mundo já não era o dele, o que aumentou o seu sofrimento. 189 Informar 1. A Natureza adquire na poesia de Torga uma centralidade inquestionável, o que constitui um vetor de tradição literária. Por outro lado, os ideais humanistas que manifesta são simultaneamente os ideais de uma geração confrontada com as questões que o mundo envolvente coloca ao ser humano, o que confere à sua obra um caráter atual e universal. 190 Educação Literária 1. A relação que se estabelece é de companheirismo, empatia, cumplicidade, pois o sujeito poético apresenta o negrilho como um ser que com ele dialoga, o inspira e lhe revela o mundo. 2. Os versos retomam a conotação de vida, aliada ao negrilho, já expressa no verso anterior. A referência à noite e à madrugada sugere a passagem do tempo, associando a esta a referência à “luz do sol aceso ou apagado”. Ambas remetem para estados de alma opostos. Infere-se, portanto, que a referida árvore é uma presença constante na vida do poeta. 3. O tom da primeira estrofe é declarativo, como se se tratasse de um excerto informativo. Na estrofe seguinte, os vocativos e as exclamações conferem ao poema um tom apelativo, e por isso mais emotivo. 4. Os recursos presentes são: a. personificação; b. apóstrofe e metáfora; c. apóstrofe e personificação. A personificação está presente ao longo do poema, pois a conotação de vida é um traço intrínseco ao negrilho. A apóstrofe e a metáfora surgem a reforçar a alteração de tom, juntamente com a pontuação, pois conferem ao texto um caráter de canto ao negrilho. 5. A temática da Natureza é recuperada (cf. cantigas de amigo e lírica de Camões), sendo esta apresentada frequentemente como confidente do sujeito poético. Neste poema, tal tema assume um caráter inovador, na medida em que o negrilho (a Natureza) é um modelo para o poeta, que nele(a) encontra inspiração para os seus versos. 6. O poema é constituído por duas septilhas; o primeiro verso de cada estrofe é branco e os restantes rimam entre si – rima emparelhada e cruzada, segundo o esquema abbcdcd / effghgh. 7. a. Valor temporal de anterioridade; valor aspetual perfetivo. b. Valor temporal de simultaneidade; valor aspetual habitual. 191 Educação Literária 1. A forma verbal “Recomeça” encontra-se no modo imperativo, com valor de incitamento, exortação. 2. As reticências transmitem a ideia de continuidade, reforçando o valor do prefixo “re-”. 3. As consoantes sibilantes e os versos curtos imprimem ao poema um ritmo lento, que se coaduna com a serenidade que o sujeito poético advoga: “Sem angústia e sem pressa.” (v. 3) 4. Nos versos aludidos as formas verbais estão no presente do conjuntivo, pois constituem um conselho relativo ao valor da persistência e do esforço na construção de um projeto futuro. 5. Este verso transmite uma ideia oposta à filosofia de Ricardo Reis, na medida em que o heterónimo defende o carpe diem e a busca da felicidade com tranquilidade, ao invés da exortação à ação, ao combate e ao inconformismo, que constitui a mensagem do poema. 6. Sísifo é o símbolo do esforço incessante, representado pelo sacrifício no rolar da pedra até ao cimo da montanha, mas foi também o construtor da cidade de Corinto, o que permite inferir que o título do poema condensa a ideia de inconformismo, de incentivo à procura de liberdade e de luta pela concretização dos sonhos. 7.1 “És homem, não te esqueças!” (v. 18). 7.2 O poema é um “hino à condição humana”, na medida em que valoriza o sonho e a liberdade enquanto valores a defender, e constitui uma exortação ao espírito de resistência e de insubmissão do ser humano, simbolizado no esforço de superação inferido pela retoma sucessiva da tarefa, por parte de Sísifo. Trata-se de um tema abordado, por exemplo, em Os Lusíadas, nomeadamente nos cantos I e VI, em que o poeta reflete sobre a insegurança e sobre a efemeridade da vida humana (canto I); reflete sobre o verdadeiro valor da glória e as formas de a conquistar: com esforço, sofrimento, perseverança e humildade − em tom didático, o poeta afirma ainda que os portugueses não devem deixar-se dominar pela ociosidade, e defende o esforço como forma de alcançar recompensas futuras (canto VI, est. 95-99). 8. Ambas as reproduções podem funcionar como uma ilustração do conteúdo do poema. Na pintura de Ticiano, a postura da figura humana, em primeiro plano, reveladora do esforço que o transporte da enorme pedra implica e do sofrimento que isso acarreta (visível no pormenor dos músculos em esforço), por um lado, e os tons escuros, em plano de fundo, por outro, sugerem a dureza do caminho a que o poema alude e a persistência necessária para levar a cabo tamanha tarefa. Também a imagem de Steven Allen ilustra o esforço e a persistência, na medida em que poderá representar a luta de um indivíduo, tentando dar um rumo diferente ao mundo, assumindo a sua diferença relativamente aos outros, uma massa homogénea e indiferenciada (sugerida pelos capacetes amontoados). 192 Informar 1. [C] 192-193 Educação Literária 1. O poeta surge como um ser revoltado e assume uma atitude de protesto perante aquilo que descobre acerca das características do mundo em que vive, onde nenhuma ação (“cantar”, “chorar”, “gritar”, “fugir”, “morrer”, “matar”) se concretiza, porque este universo está permanentemente controlado (vv. 3-4, 7-8, 11-12). Está, pois, inconformado com este mundo! 2. As conjunções transmitem a oposição entre a vontade de agir e a impossibilidade de o fazer. 3. “Ninguém” refere, implicitamente, toda a sociedade. A expressividade do seu uso reside no facto de introduzir um efeito de generalização que permite inferir que todos estão amordaçados e, por isso, impedidos de se exprimir e de agir. 4. A estrutura paralelística do poema acentua as oposições referidas, pondo em destaque a distância entre o ideal que se defende e a realidade, o que constitui a razão de ser da revolta do eu lírico. 5. Todos esses versos são introduzidos pela figura do fantasma, entidade abstrata que reforça, respetivamente, a ideia de medo, de ausência de perspetivas e de insatisfação, acentuando, desta forma, o caráter obstaculizante do fantasma. 6. Na última estrofe, o poeta amaldiçoa a sociedade em que vive, que encara como prisão, que o oprime e o leva à inação, razões que justificam a sua revolta. 7. Trata-se da metáfora “sepultura de grades cinzeladas” e da aliteração do som /v/ em “ver a vida”. A metáfora reforça a ideia de morte; a aliteração incute um tom mais vivo e forte ao verso, por se tratar de uma consoante forte (o que se coaduna com a revolta do eu lírico) e, ao destacar uma expressão que se anula (“ver a vida que não temos”, v. 15, é não ver) reforça essa mesma ideia de morte. 8. “Dies irae” significa ‘ira de Deus’, logo, o título anuncia o desespero, a revolta, a desilusão e o protesto do sujeito poético face ao mundo que o rodeia. 194 Informar 1. Para Torga, fazer poesia é um processo de entrega total, de trabalho criativo, um misto de esforço e de inspiração, daí a ausência de referência ao rigor da linguagem. O poeta estabelece uma identificação entre poesia, vida e liberdade, o que justificará a sua paixão pela criação artística. 195 Educação Literária 1. O “tesoiro sagrado” é aquilo que o sujeito poético procura – trata-se de uma busca de si próprio, da sua própria essência, reconhecendo que tem alma de poeta e que, por isso, é através dos seus versos que encontrará as respostas que procura. 2. Tal como o oiro representa o que há de mais valioso, a procura que o sujeito lírico executa é também aquilo que para o ser humano tem mais valor, daí o título “Prospeção” – procura, análise, investigação do seu próprio íntimo. Destaca-se o facto de esta “prospeção” ser contínua e sistemática (“Cavo, / Lavro, / Peneiro”, vv. 10-12), pois a busca do poeta pré-existe aos seus versos. 3. As formas verbais referidas dizem respeito ao trabalho artesanal, árduo, campestre, e simbolizam a procura incessante. São versos bastante expressivos pelo facto de serem constituídos apenas por um vocábulo e que representam a ação da prospeção. 4. A comparação com o deserto e a referência à nudez complementam-se, na medida em que nos permitem inferir que o poeta busca a sua própria essência poética, o "tesouro sagrado" a que alude na primeira estrofe. 5. Este poema constitui uma espécie de metáfora da poesia como “trabalho”. A criação poética é vista como um trabalho árduo e constante sobre a palavra, o que implica pesquisa, esforço, mas também uma busca interior, no sentido de procurar atingir a essência da poesia. O conceito de arte poética como “esforço” é veiculado nos textos referidos, donde se conclui que o poema confirma a teoria apresentada nos textos informativos. 6. Os olhos são frequentemente apelidados de “espelho da alma”, o que se coaduna com a temática do poema − a busca de si próprio, um olhar sobre o seu próprio íntimo: Prospeção. No entanto, este espelho é falso, pois constitui uma inversão, representa o espaço exterior, um céu com nuvens, sereno e azul, e não o interior; é uma espécie de convite a olhar para o mundo de forma diferente, o que evidencia a irrealidade e não a realidade. 196 Leitura 1. Miguel Torga é um escritor brilhante (“prestidigitador da palavra escrita”, l. 11, um “mestre”, l. 15), a quem o autor confere um caráter quase divino (“recriou a vida e a iluminou”, l. 11; “escuto a oração”, l. 15). 2. O tema da reflexão é o facto de ainda não ter sido atribuído o Prémio Nobel a Miguel Torga. O autor não só considera que Torga é merecedor do prémio que lhe foi atribuído, o Prémio Camões, como estranha que não lhe tenha sido ainda atribuído o Prémio Nobel, devido às qualidades da sua obra. 3. O predomínio da primeira pessoa e do presente do indicativo deve-se ao facto de se tratar da manifestação de um ponto de vista pessoal acerca de um acontecimento marcante para o “eu”, que ele presentifica através da rememoração. 4. Trata-se de uma memória, devido à presença do discurso de primeira pessoa, em que se faz um relato retrospetivo de um acontecimento vivenciado pelo próprio autor. 5. − No âmbito da acentuação: “prêmio” (prémio); “acadêmicos” (académicos). − Ausência do determinante artigo antes do determinante possessivo: “lendo seu discurso” (l. 13); “nossa língua” (l. 25). − Colocação do pronome pessoal complemento antes do verbo: “eu me pergunto” (l. 17); “E o faço” (l. 24). 197 Informar 1. A criação poética é um exercício de aperfeiçoamento da linguagem, como se se tratasse de um trabalho manual (por isso, a mão é frequentemente o símbolo da criação poética). O poeta recusa o sentimentalismo mas também uma poesia de pendor racionalista; defende que a poesia deve valorizar a ligação entre o Homem e a Natureza. 198 Educação Literária 1. O “Tu” significa para o sujeito a esperança e o amor, e tem sobre ele um efeito de otimismo e de alegria. Para esta leitura contribui o sentido conotativo de vocábulos como “luz”, “fonte”, “madrugada”, “perfeita” e “doirada” e a repetição expressiva do vocábulo “esperança”. 2. Na segunda estrofe, o “eu” lírico assume que criou os seus versos para o “tu” que evoca, versos que considera serem imperfeitos e de angústia, ao contrário do caráter luminoso do “tu”. Assim, os versos 6 e 9 transmitem a oposição entre a negatividade dos versos que o “eu” produz e a luz que emana do “tu”. 3. Depois de reconhecer o absurdo das palavras que criou, o sujeito poético refere-se aos seus versos como sendo limitados (“que não podem ser mais nada”), justificando, assim, o facto de os depor aos pés do “tu” invocado, apresentando-o, desta forma, como fonte de inspiração para a criação poética. 4. A madrugada é, em Eugénio de Andrade, símbolo de nascimento, promessa de plenitude, logo, fator de esperança. No poema, “esperança” e “madrugada” são atributos do “tu”. Pode-se, então, inferir a superioridade do “tu” relativamente ao “eu”, ideia que é reforçada pelo destaque dado aos dois vocábulos no primeiro e no último versos. 5. Beber representa, na poesia de Eugénio de Andrade, a forma plena de comunhão; assim, neste contexto, marcará a relação entre o “eu” e o “tu”, uma vez que está associado aos olhos (“meus olhos bebem”) e são estes que possibilitam a união dos dois amantes. 6. O “Tu” é apresentado como a Musa inspiradora do poeta, uma figura superior, responsável pela sua criação artística: “ Tu és a esperança onde deponho / meus versos que não podem ser mais nada.” (vv. 10-11) 199 Educação Literária 1. O sujeito poético considera que as “palavras”, ao contrário do que sucedia no passado, em que elas eram obedientes e lhe causavam alegria (“dançavam / à minha roda”, vv. 12-13), são agora ariscas, esquivas, indomáveis e não o respeitam. 2. A alteração decorrerá do envelhecimento do poeta (“não respeitam a minha idade”, v. 5), do facto de já não saber escolher as mais apropriadas, como admite nos versos finais, ou ainda do facto de as palavras se terem cansado do controlo excessivo do poeta. 3. Os versos evidenciam a tendência perfecionista do sujeito ao tentar controlar as palavras, isto é, os mecanismos da criação poética. 4. Trata-se da metáfora, cuja expressividade reside no facto de o vocábulo “lume” se apresentar conotado com “vida”, estabelecendo-se, assim, uma identificação entre a palavra, a poesia, e a própria vida. 5. “Desamparadas, inocentes, / leves” ilustram o comportamento das palavras no passado a que o poema “Agora as palavras” alude, quando elas se deixavam dominar pelo poeta, ao contrário do modo como se comportam no presente, em que não se deixam moldar. 6. A criação poética é encarada de forma disfórica − o poeta relaciona-se de forma quase conflituosa com a sua poesia, consequência da tensão entre a sua vontade de trabalhar as palavras e a incapacidade de o fazer (“escapam-se por entre / as mãos”, vv. 16-17). 200 Informar 1. Terra e mãe são vocábulos que ilustram temáticas recorrentes na poesia portuguesa, nomeadamente em autores como Camões, Caeiro, Cesário Verde, Bocage, e Fernando Pessoa, Florbela Espanca e Antero de Quental, respetivamente. 201 Educação Literária 1. Fonte e rio são elementos que permitem a associação deste “deus verde” à Natureza: o corpo de Green God surge associado à graciosidade das fontes e à serenidade do rio. Ambos os vocábulos contêm o sema da água, símbolo de vida, o que faz deste deus um deus vivo, criador. 2. É um deus que emana vida, pois os seus passos criam ervas, o seu corpo, troncos (“cresciam troncos dos braços”, v. 9), sorri e dança quando passa, criando uma atmosfera de encantamento. 3. Sendo a fonte a metáfora do corpo, conotada com a pureza do mundo natural, e a flauta o símbolo da música e da poesia (a flauta pastoril), Green God é, assim, apresentado como um deus que encarna a Natureza e a domina (o processo de vegetalização do seu corpo atesta o seu caráter telúrico), mas também um deus ligado às artes da música. Aliás, as referências à dança e ao ritmo põem em destaque a beleza mágica de Green God. A melodia que a flauta toca pode ser entendida como uma referência implícita ao deus Pã, ou mesmo a Orfeu, conferindo, assim, um caráter divino ao deus verde. 4. Ao nível formal, o poema possui um ritmo musical, conferido pela regularidade métrica e da rima, pela expressividade das consoantes sibilantes (“nasciam dos passos”, “cresciam troncos dos braços”), dos sons fechados, frequentemente nasais (“tremia”, “sabia”, “das fontes quando anoitece”). No plano semântico, destaca-se a expressividade do vocabulário evocativo das artes (“dança”, “dançar”, “ritmo”, “melodia”, “tocava”, “flauta”). Desta forma, evidencia-se a coerência interna entre o conteúdo e a forma do poema. 5. A tradição literária manifesta-se no tratamento do tema da natureza (ou mesmo no bucolismo, visível na presença da flauta), recorrente na literatura desde a poesia dos trovadores. O contemporâneo está representado na forma inovadora como o poeta aborda esse tema clássico, dando-lhe um tratamento, por assim dizer, ecológico. 6. A musicalidade é uma das características mais relevantes da obra deste poeta, conferida, por exemplo, pela expressividade das sonoridades, das aliterações, pelo ritmo muito marcado da maioria dos poemas. “Green God” é ilustrativo dessa ligação da poesia à música, mas também da ligação do Homem à Natureza, daí o recurso a uma linguagem simbólica (“rio”, “fontes”). Também no poema “Tu és a esperança, a madrugada”, a linguagem adquire novos significados, nomeadamente através do recurso a metáforas, imagens, valores simbólicos, como é o caso dos vocábulos “mãos”, “água”, “terra” ou “luz”, entre outros. 203 Educação Literária 1. O sujeito poético considera que traiu a mãe porque cresceu e deixou de ser a criança que a mãe guarda na memória (o “retrato adormecido”, v. 4), e encontrou outras seduções, representadas pelos “leitos” (v. 7) e pelas “noites rumorosas” (v. 8). 2. O vocativo identifica o destinatário do poema e, por isso, cria uma espécie de diálogo, que é simultaneamente uma reflexão do próprio “eu”. 3. O caráter infeliz do amor que os une deve-se à dificuldade da mãe em compreender e aceitar que o filho cresceu e, consequentemente, alargou o seu mundo, o que implicará o seu afastamento e emancipação. 4. O retrato da moldura representa a imagem estática e imutável que a mãe guarda do filho. As “rosas brancas” simbolizam a pureza e a inocência da infância. 5. As rosas constituem uma metáfora da infância, daí ser pertinente a sua referência no poema: o sujeito lírico afirma o seu apego à infância e lamenta que a mãe desconheça esse facto, pois essa é a razão do seu sofrimento. Para além da metáfora, está presente a aliteração, que confere lentidão ao texto e se coaduna com a valorização da vida afetiva e emocional por parte do sujeito. 6. Constitui um apelo ao diálogo e introduz um argumento que poderá apaziguar a infelicidade da mãe. 7. As rosas e a voz da mãe são os elementos rememorados pelo eu lírico e que, no final do poema, se mantêm como símbolos do passado para cada um deles (a mãe guardará as rosas; o filho, a lembrança da voz da mãe quando ela lhe contava as histórias infantis). 8. Este verso constitui uma despedida, traduzida pela expressão “Boa noite”, e nele estão implícitas as ideias de movimento e de espaço sem limites, que podem ser conotadas com uma atitude de libertação do sujeito lírico, de tentativa de alargamento do seu mundo, sugerida pelo vocábulo “aves”. 9. O sujeito poético assume-se como alguém que afirma a sua personalidade, que defende o seu direito a escolher e a construir o seu caminho de vida, recusando a proteção da figura materna, mas sem perder os valores da família e as memórias da infância. 10. Os verbos encontram-se no imperfeito do conjuntivo, o que exprime um desejo, uma possibilidade. 203 Escrita 1. Em primeiro plano encontram-se duas figuras, mãe e filho, comunicando afetuosamente, numa carícia mútua. A figura robusta da mãe está sentada no chão e debruçada sobre o filho, envolvendo-o com os braços, as mãos, e o sorriso. Num plano de fundo, uma linha separa o azul do céu, do amarelo do chão, cores primárias que põem em destaque o volume do corpo da mãe. As pregas do vestido, em cinzento azulado, reforçam o movimento circular que a imagem sugere e que acentua a envolvência dos dois corpos, reforçada pela luz que incide sobre eles e transmitindo a ideia de proteção e segurança, enfatizada pela excessiva dimensão dos pés. A pintura relaciona-se de forma contrastiva com “Poema à mãe”, na medida em que a proteção aceite e requerida pela criança, visível na posição dos braços e das mãos, esticados em direção à mãe, é recusada pelo sujeito poético, que deseja libertar-se da excessiva proteção materna. Por outro lado, a felicidade que se evidencia na pintura contrasta com o amor infeliz que caracteriza a relação mãe-filho, no poema de Eugénio de Andrade. (180 palavras) 205 Aplicar 1. [A] – [3] A mesma contextualização temporal, a mesma temática: a partida e a separação. [B] – [4] A mesma temática – o fingimento artístico. [C] – [1] A mesma temática – as características físicas do Adamastor/Mostrengo e as dificuldades e os perigos que os marinheiros portugueses enfrentaram. [D] – [2] A mesma descrição e o mesmo contexto – no caso de Pessoa, aplicado ao Infante D. Henrique; no caso de Saramago ridiculariza-se D. João V. 2. [A] – [3] Paródia [B] – [4] Alusão [C] – [1] Alusão [D] – [2] Paródia 206 Compreensão do Oral/expressão Oral 1. Para Ana Luísa Amaral, a escrita de um poema é algo que envolve muita paixão e que ela considera ser um misto de prazer e de angústia. A autora tenta que a sua obra não seja reflexo da sua biografia e recusa que a sua poesia seja feminista. 206 Informar 1. Ana Luísa Amaral, por ser do sexo feminino, manifesta, de um modo geral, preocupações com as questões que afetam as mulheres, abordando temas como a emancipação feminina e o direito à igualdade; de forma particular, preocupa-se com aspetos relativos ao caráter maternal. Além disso, ostenta uma poesia musical, que explora as potencialidades da língua. 207 Educação Literária 1. Estas referências constituem a síntese dos desejos do sujeito poético em relação à sua filha, caso não esteja presente para os cumprir. Serão esses “princípios/valores” que a filha deve aprender e valorizar na vida – a alegria, o otimismo, o amor e o sonho. 2. Estas alusões simbolizam aspetos materiais do quotidiano que são desvalorizados na vida que o sujeito poético ambiciona para a filha, por oposição aos que são positivamente conotados (canto, fantasia, amor e sonho). 3. “Preparar para a vida” consiste em valorizar o amor, o sonho e a fantasia, e é esse o desejo do sujeito lírico (valor conferido pelo presente do conjuntivo). As contas de somar adjectivadas como “erradas” e as batatas “esquecidas”, no final do poema, representam a vitória desses valores, pois demonstram a desvalorização do quotidiano material, banal e rotineiro e justificam a felicidade e o deslumbramento do sujeito, “mais tarde”, lá no céu”. 4. A referência à viagem de avião ilustra a representação do contemporâneo; a figuração do poeta reside essencialmente na visão que a poeta tem da educação, pois o poema apresenta um tom emancipatório relativamente ao papel tradicional da mulher na sociedade/na vida doméstica. 208 Educação Literária 1. Os versos realçam a ideia de que um anjo desceu à terra – o que anuncia a ligação entre os planos divino e terreno. O conteúdo dos parênteses indicia a evolução do pensamento do eu lírico acerca daquilo que relata: primeiro, a dúvida "(terá descido?)", depois a certeza "(há provas mais)". 2. Presença de uma personagem (o anjo) que pratica uma ação (a descida à terra, e suas consequências). O caráter narrativo é evidente também no avanço temporal da ação através das formas verbais no pretérito perfeito: “Um anjo aqui desceu” (vv. 1, 11), “aqui ficou” (v. 12), “aqui [...] adormeceu” (v. 16), “ele acordou” (v. 21), “viu” (v. 22). 3. O anjo perde a noção da sua existência divina (“aos poucos esquecendo tempos dantes”, v. 18), optando pela vida na terra (“aqui ficado”, v. 16), onde adquire traços humanos (“o anjo adormeceu, / sonhando com estações e com instantes”, vv. 16-17). 4. Trata-se da enumeração e do polissíndeto (“ter nome, e sede, e fome”). A enumeração revela o caráter humano do anjo; o polissíndeto, pela repetição, acentua essa mesma humanidade. 5. O anjo, que vai adquirindo humanidade ao longo do poema, no final torna-se verdadeiramente humano, por opção: “viu que era bom” (v. 22). O tema é, então, a dessacralização do divino. 6.1 Em ambos os poemas, o divino torna-se humano; no poema de Caeiro, é o Menino Jesus que desce do céu, também cansado de aí viver. No entanto, em Caeiro o paganismo é mais acentuado, pois infere-se que a criança que é o “Menino Jesus” existe dentro de cada um de nós. 6.2 A interligação entre o plano humano e o plano divino é um tema frequente na literatura portuguesa, nomeadamente em Os Lusíadas, no episódio “A Ilha dos Amores”. 7. O poema é constituído por três quintilhas e duas quadras; os versos são decassilábicos e predominantemente brancos. 209 Educação Literária 1. O título anuncia uma referência à História de Portugal, caso D. Inês não tivesse sido assassinada, imaginando o envelhecimento do par amoroso. O título antevê, assim, a coexistência de um plano real e de um plano imaginário. 2. A relação amorosa do rei D. Pedro com D. Inês de Castro, e respetivas consequências (trágicas) para a História de Portugal, é um tema recorrente na literatura portuguesa: note-se o episódio de Inês de Castro presente n’Os Lusíadas, cujos primeiros versos são lidos por Madalena na primeira cena de Frei Luís de Sousa. 3. O caráter inovador decorre das referências constantes ao quotidiano de velhice do par amoroso, constatando-se a passagem do tempo tanto no corpo como na alma dos eternos amantes. Por outro lado, nota-se uma relação menos intensa, menos apaixonada. O par é, pois, desprovido da sua condição de sensualidade e de realeza (que está presente no imaginário dos leitores), aproximando-o da vivência do comum plebeu. As maleitas da velhice, a base do desenvolvimento do poema, conferem ao texto um tom grotesco e cómico, que contrasta com a seriedade que o assunto histórico normalmente impõe. 4. As palavras da personagem tornam o discurso mais vivo, dão mais credibilidade à apresentação do par amoroso como pessoas vulgares, descendo do seu estatuto de realeza. 5. Os versos referidos remetem para a cerimónia de beija-mão após a coroação de D. Inês (já morta) como rainha, que faz parte do imaginário popular. 210 Educação Literária 1. O vocábulo “soneto” remete para a tradição clássica, nomeadamente para Petrarca e Camões; “a fingir” envia-nos para a temática do fingimento artístico em Pessoa, confirmada na penúltima estrofe: “ou seja, na mentira que é o verso, / ou seja, na mentira do que mostro.” (vv. 15-16). 2. Tal como o verbo integrado no título indica (“fingir”), o soneto não segue as regras formais deste género – duas quadras e dois tercetos. A poeta demonstra, desta forma, ter consciência de que não se trata de um soneto “a sério” e alerta o leitor para esse jogo de desrespeito pelas regras formais, sobre o qual se reflete ao longo do próprio poema. Assim, o texto ilustra a subversão para a qual o conteúdo aponta. Além disso, o soneto é “científico”, o que não se coaduna com as temáticas tradicionais dos sonetos – é “científico” por se abordar a “ciência” da subversão da tradição: “dar o mote ao amor, glosar o tema, / e depois desviar. Isso é ciência!” (vv. 19-20); a linguagem é coloquial, o que constitui também um afastamento da tradição literária, para além de destacar a despreocupação do poeta com a rima. 3. O verso parentético reproduz uma marca de coloquialidade que ilustra o afastamento da tradição literária, uma vez que não corresponde ao registo de língua requerido por esta forma poética. 4. a. O recurso à terceira pessoa do plural do futuro do indicativo (“Dir-me-ão”) funciona como um contra-argumento: o “eu”, ao justificar a sua teoria (necessidade de subverter a tradição), entra em diálogo com os leitores, e antecipa, assim, uma resposta à reação daqueles que poderão não partilhar da sua opinião. b. O valor explicativo da expressão que constitui a anáfora enfatiza uma das ideias-base do poema: o fingimento. 5. Neste poema, a poeta esboça uma arte poética em que tradição e subversão dessa mesma tradição convivem de forma harmoniosa, assumindo, para além disso, que a poesia é também fingimento, aqui denominado como “mentira”. 6. Todas as estrofes são quadras e os versos são decassilábicos e quase exclusivamente brancos (rimam apenas os dois versos que se situam no meio do poema – vv. 10-11). 211 Informar 1. As principais linhas temáticas são a pátria, o presente histórico, a defesa da liberdade, a revisitação da História. A obra de Camões, de Torga, de Sophia e a dos trovadores medievais são as principais referências que Alegre recupera. 212 Educação Literária 1. Ao longo do poema, opõe-se implicitamente o futuro ao presente, a ação à passividade. Em face do momento presente de opressão, apresenta-se reiteradamente, através da anáfora (“É possível”), a hipótese de um futuro diferente. 2. A referência a “chão” e a “astros” traduz a oposição terra/céu, que, no contexto do poema, ilustra a vida vivida (submissa, envergonhada, sem ânimo) e a vida sonhada, aquela que será possível ter se se agir nesse sentido – uma vida com dignidade e livre, como metaforicamente indicia a ação de olhar para os astros. 3. Os últimos versos ilustram a importância do conteúdo do poema, na medida em que remetem para um “tu”, aquele a quem o poema se dirige, e estabelecem a condição para a ação: − ter vontade de cantar e de dizer “não”, ou seja, de pôr fim à situação experienciada para assim “viver de pé” e “ser livre livre livre.” 4.1 O recurso ao imperativo (”canta”; “grita”), ao presente do conjuntivo com valor também de imperativo (“não tenhas”; “não deixes”) e à tripla repetição do adjetivo “livre” no último verso, acentuam a dimensão exortativa do texto. 5. O título anuncia o conteúdo do poema através do vocábulo “hino”: é um canto, um desafio à ação, em consequência da denúncia de uma situação que se considera injusta; os versos de Camões convocam a temática da mudança, que constitui o desafio que é lançado pelo poeta. Assim, o poema transmite uma mensagem de libertação, um apelo à construção de um futuro coletivo, ideia que é enfatizada nos dois últimos versos, ao estabelecerem um paralelismo entre liberdade e condição humana. 6. “Canto” remete para a escrita camoniana, e “armas” aponta para a ação, o que nos envia para a tradição literária, nomeadamente para a epopeia Os Lusíadas (que se assume como um “canto” e se refere à ação épica dos portugueses). Para além disso, o poeta revela-se um ser empenhado socialmente, uma voz consciente, correspondendo ao conceito de “poeta engagé”, o que comprova a presença do tópico figurações do poeta. 7. Sujeito. 8. Modalidade deôntica com valor de obrigação. 213 Educação Literária 1. O canto (representado pela “guitarra”) é fantástico porque é fruto da fantasia, do mito, e é “doente” porque conota incapacidade. Assim, o mito sebastianista é apresentado como algo negativo. 2.1 Os nomes referidos apontam para a oposição passado/presente, na medida em que “desastre” e “loucura” caracterizam el-rei D. Sebastião e Alcácer Quibir (a batalha foi um desastre devido à loucura do rei) e “aventura” refere-se ao presente − “aqui à mão”− aqui tão perto. 2.2 A ocorrência da primeira pessoa do singular verifica-se apenas uma vez e é substituída pela segunda pessoa do plural, “vós”, no apelo lançado. Recorre-se, ainda, à primeira pessoa do plural, “nós”, pois não é o individual que é valorizado no poema. 3. Os recursos são a aliteração do som /v/ e a personificação, que sugerem o som do vento e que conferem musicalidade ao texto, tornando o verso melódico. 4. Constitui um apelo (implícito no ato de tocar a rebate) à união do país, uma vez que se pretende proclamar a morte do rei e, por conseguinte, do mito em torno dele. 5. A poesia é encarada como uma forma de intervenção social, uma arma, representada pelo “punhal”. Essa necessidade de intervenção advém do contexto social e político da produção do poema [Estado Novo], o que confirma a presença do tópico “representações do contemporâneo”. 6. O título anuncia a ideia de luta contra “el-rei”, que é enfatizada pelo verbo “enterrar”, que conota o seu fim. O facto de o verso estar repetido comprova o caráter circular do texto. 7. O poema transmite uma mensagem de inconformismo, ideia que poderá ser também sugerida pela imagem, pelo facto de o casaco estar vestido ao contrário, numa atitude que poderá ser entendida como desafio às regras estabelecidas. No entanto, a atitude de convicção do sujeito poético contrasta com o humor da imagem, sugerido pelas mãos, que poderão representar o caráter multifacetado de Jean Cocteau (poeta, dramaturgo, designer, ator, encenador). 214 Educação Literária 1. O mote é constituído pelos dois primeiros versos. 2. As oposições deixar/levar e amor/dor constituem um jogo de palavras e de sentidos que está na base da construção do poema – levar o amor e deixar a dor é o desejo do sujeito poético. 3. O poema é estruturado em quadras, constituídas por versos de sete sílabas métricas (redondilha maior), com rima emparelhada, rica e toante nos versos 1 e 2 da primeira estrofe, cruzada, pobre e consoante nos versos 6 e 8, interpolada, rica e consoante nos versos 9 e 12, cruzada, rica e consoante nos versos 14 e 16. 4. O jogo de palavras anteriormente referido, que acaba por ser também um jogo de sonoridades, a rima e os versos curtos são os elementos que conferem ao poema um ritmo dançante. 5. O poema desenvolve-se na linha da tradição literária de Camões, pela recuperação do mote e pelo próprio tema explorado por Camões, e das cantigas de amigo, pelo ritmo. O verso de redondilha maior constitui também uma recuperação da métrica de Camões e dos poetas medievais. 6.1 É a paráfrase, pois trata-se da recriação do texto camoniano. 215 Educação Literária 1. Os dois vocábulos surgem com semas comuns, pois ambos conotam perigosidade (“E mar. Amar: as coisas perigosas.”, v. 8) e intensidade (“Amor ardente.”, vv. 2 e 5 e “o mar ardente”, v. 13). 2. A anáfora “Contar-te” introduz os desejos de partilha de sentimentos e de experiências do sujeito poético, com o “tu”. O advérbio transmite o modo como ele deseja contar as suas experiências: lenta e vagarosamente. Assim, infere-se que essa partilha se pretende serena e pausada. 3. O ritmo é lento, conferido pela anáfora, pela repetição do advérbio, pois é constituído por sons nasais, pela recorrência dos vocábulos “mar” e “amar”, pelos sons abertos, e pela rima. 4.1 As referências a “mar”, “as misteriosas / maravilhas do verbo navegar” (vv. 6-7) e ao “desembarcar nas ilhas misteriosas” (v. 12) conotam os perigos do mar e simultaneamente o amor e as contrariedades que dele possam advir, pelo que é possível estabelecer uma relação intertextual com a epopeia de Camões, nomeadamente com os versos transcritos, em que se referem os perigos do mar. Por outro lado, o “Amor ardente” (v. 5) poderá remeter para a poesia lírica do mesmo poeta. Além disso, a estrutura formal, o soneto, é um elemento clássico da poesia camoniana. 219 Verificar 1.1 Miguel Torga a. V b. F − Nem sempre; depende dos poemas. c. V d. V e. F − Tem uma dimensão sagrada. f. F − É o poema “Sísifo” e não “Dies irae”. g. V 1.2 Eugénio de Andrade a. V b. F − Metáfora. c. V d. F − Não crê no deus divino e transcendente. e. F − É recorrente ao longo da sua obra. f. V g. F − Irregularidade métrica e estrófica. 1.3. Ana Luísa Amaral a. V b. V c. F – A sua poesia caracteriza-se pela irregularidade estrófica. d. V e. F – O amor e o sonho são temáticas valorizadas recorrentemente. f. V g. F − A sintaxe invulgar não facilita a leitura dos seus textos. 1.4. Manuel Alegre a. V b. F – A obra de Manuel Alegre é inseparável da sua biografia, do tempo em que viveu. c. V d. F − A sua poesia tem forte carga interventiva. e. V f. F – Manuel Alegre considera que o mito de D. Sebastião deve ser enterrado porque promove a acomodação e o conformismo. g. V 12 solu??es sentidos12/Unidade 6.1 - Jos? Saramago, O ano da morte de Ricardo Reis .docx Sentidos 12, Unidade 6.1 – José Saramago, O ano da morte de Ricardo Reis Cenários de resposta Página(s) Domínio / texto Cenário de resposta 226 Compreensão do Oral 1. a. Durante o seu velório, José Saramago teve ao seu lado o Memorial do convento, livro oferecido por Eduardo Lourenço e com o qual foi cremado. b. Ribatejo c. Povo (camponeses) d. Serralheiro e. Funcionário administrativo f. Desenhador g. Tradutor h. Diretor adjunto do Diário de Notícias i. Inscrição no Partido Comunista. j. Decisão de viver da literatura, após ter ficado desempregado. k. Casamento com Pilar. l. Polémica com o governo português por este ter tomado a decisão de afastar O evangelho segundo Jesus Cristo da lista de candidatos ao prémio literário europeu. m. Atribuição do Prémio Nobel da Literatura. n. Terra do pecado o. Os poemas possíveis p. Levantado do chão q. Memorial do convento r. A jangada de pedra 226 Expressão Oral 1. Poderão ser abordados, entre outros, os seguintes aspetos: − As citações remetem, estrutural e estilisticamente, para o texto presente na contracapa de Memorial do convento, estabelecendo-se assim uma relação de intertextualidade. − As citações dão-nos conta da naturalidade do escritor, de marcos importantes na sua vida (como a data de nascimento, a atribuição do Prémio Nobel e a relação com Pilar del Rio), das várias atividades que exerceu, com destaque para a criação literária, e do facto de ser um homem e um autor controverso. − A vida de Saramago como uma história a ser contada, num tom oralizante (“Era uma vez”), tomando o autor como protagonista. 227 Leitura 1. O texto versa sobre a tentativa de evangelização de que Saramago foi alvo e da pena que sentiu em não ter “oferecido” o seu Evangelho aos dois jovens. 2. O tom irónico é visível no recurso aos diminutivos com sentido depreciativo (“vestidinhos”, “risquinhas”, “malinha”) e nas expressões valorativas (“como bons candidatos ao martírio” ou “de pena por esta alma perdida”). 3. Além de espelhar o tom sarcástico, típico de Saramago, o texto evidencia o ateísmo visível em muitas das obras do escritor. 4. O tom coloquial é visível, por exemplo, no facto de o narrador se servir de expressões populares como “e lá foram pregar a outra freguesia”. 5. Sendo a obra de Saramago O evangelho segundo Jesus Cristo censurada pela Igreja, por questionar um conjunto de dogmas cristãos, o narrador lembra-se de que deveria ter oferecido aquele livro aos “jovens” para os dissuadir da sua missão apostólica. 6. Antítese que contrapõe a visão cristã, identificada com as “verdades eternas”, à visão do narrador, assumidamente ateu. Por isso, ele declara que a mensagem bíblica não passa de uma mentira otimista. 7. [A], [C], [D], [F] 8. O advérbio “cá” apresenta valor deítico espacial na medida em que “posiciona” o “eu” no local onde recebeu a visita dos dois missionários, ou seja, a sua casa. 9. Apresenta progressão, obedece à regra da não contradição e espelha a continuidade de sentido. 228 Informar 1. O estabelecimento de relações intertextuais constitui-se como um marco inquestionável da obra, evidente não só no facto de duas das personagens serem figuras destacadas da literatura portuguesa, e que, entre outros aspetos, se debruçam sobre a sua própria criação literária mas também pela evocação sistemática de outros autores, como Camões, e de outros textos, estabelecendo-se, desta forma, um “diálogo intenso” de Saramago “com os nomes maiores da literatura portuguesa”. 2.1 A epígrafe em questão sintetiza a forma como o heterónimo Ricardo Reis se posicionava em relação ao mundo, nomeadamente no que diz respeito aos conceitos de estoicismo e epicurismo. Segundo o poeta, nada justificava qualquer esforço, paixão ou dor, porque o destino já estava traçado, cabendo, pois, a cada um, saber aceitá-lo com indiferença. Situando Ricardo Reis no cenário desfavorável de 1936, Saramago pretende pô-lo à prova, de forma a perceber até que ponto a máxima pela qual, poeticamente, o heterónimo sempre se regeu se mantinha inalterável. 229 Leitura 1. a. F – Foi durante a Primeira República que o país viveu uma enorme instabilidade política. b. V c. F – A burguesia apoiava o regime. A propaganda e a repressão visavam o controlo dos mais desfavorecidos e de alguns intelectuais que estavam contra o sistema. d. V 2. Este texto configura-se como uma exposição, uma vez que prevalece o caráter demonstrativo que pretende elucidar sobre um determinado tema, e também porque nele predomina um discurso objetivo. 230-231 Educação Literária 1. a. Lisboa b. Marcenda c. paralisada d. Fernando Pessoa e. Lídia f. Fernando Pessoa g. a vida e a morte h. a Conspiração i. o comunismo j. na PVDE − Polícia de Vigilância e Defesa do Estado k. Marcenda l. no Alto de Santa Catarina m. do Adamastor n. Marcenda o. uma carta p. com Lídia e com Marcenda q. Victor r. que se casem s. que não seriam felizes t. Fátima u. Marcenda v. abortar w. em não voltar mais x. revoltar y. morreu z. acompanhá-lo 236-237 Educação Literária 1. Em 1936, vivia-se, em Portugal, um regime ditatorial, liderado por Oliveira Salazar, que acumulava os cargos de presidente do Conselho e de ministro das Finanças. No geral, a população era partidária desse sistema político, conforme atestam a posição dos sindicatos e a grande adesão de jovens à Mocidade Portuguesa. Havia, no entanto, quem se opusesse e tentasse derrubar o regime. É o caso de alguns marinheiros, entre os quais, Daniel, o irmão de Lídia, que tentaram liderar uma revolta, mas sem êxito. 2. Salazar, descrito como um homem inteligente, sábio e com uma força extraordinária, surge como o protótipo do dirigente político, que administrava o país de forma exemplar e que promovia a ordem pública. Internamente era considerado o protetor do povo, o pai, o salvador da pátria. Externamente é apresentado como um modelo a seguir. Esta visão eufórica de Salazar resultava, sobretudo, de artigos encomendados à imprensa, pagos pela propaganda nacional. 3.1 Ideologicamente, defendia-se que os cidadãos deviam ter acesso a uma educação básica, “sem pruridos de sabedoria excessiva” (l. 23), preferindo- -se o analfabetismo a uma educação que questionasse os valores do cristianismo ou que fomentasse a ambição material. 3.2 Negar aos cidadãos um maior conhecimento do mundo e negar o acesso à cultura e à informação era a melhor forma de garantir o conformismo e a aceitação relativamente às medidas tomadas pelo governo. De facto, um cidadão que não tenha ao seu dispor outras perspetivas, que não tenha desenvolvido um espírito crítico, é mais facilmente manipulável e controlável. 4. O narrador pretende distanciar-se da imagem que os jornais veiculam sobre Portugal e sobre os seus dirigentes, uma vez que não partilha da visão otimista de que se faz gala. Este afastamento é notório, no plano linguístico, quando usa a forma impessoal “Diz-se” (l. 1) ou quando afirma categoricamente que aquela perspetiva que está a relatar é a dos jornais: “dizem-no os jornais” (l. 1). Por outro lado, o recurso à ironia, "quer por sua própria convicção, sem recado mandado, quer porque alguém lhes guiou a mão" (ll. 1-2) contribui também para reforçar que a sua posição é diferente daquela que os jornais evidenciam. 5. No geral, o povo português vivia na miséria, mesmo tendo um trabalho e, por isso, acabava por estar dependente dos bodos que o Estado proporcionava ou da caridade dos patrões, que não garantiam um emprego com condições dignas − “Uma esmolinha senhor patrão por alma de quem lá tem.” (l. 38). Outros optavam por emigrar à procura de melhores condições de vida. 6. A propaganda era uma das melhores formas de as classes dirigentes garantirem a vigência da ditadura: os jornais transmitiam às populações a ideia da grandeza e da prosperidade do país. Os sindicatos, autênticos braços do regime, faziam circular prospetos e organizavam comícios para propagar a ideologia. A Mocidade Portuguesa era o instrumento para educar os jovens, garantindo que eram incutidos, desde muito cedo, os valores pátrios. Ao mesmo tempo, a população era globalmente reprimida através da censura, ou, particularmente, através da perseguição, ou da tortura, a cargo da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado. 7. Perante as declarações de um dirigente político que advogava que “Nunca mãe alguma, ao dar à luz um filho, pode atirá-lo para um mais alto e nobre destino do que o de morrer pela sua terra” (ll. 64-66), o narrador evoca acontecimentos futuros – a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Colonial, que conduziram milhares de pessoas à morte – para denunciar a forma displicente e desrespeitosa como o regime encarava a vida dos seus concidadãos (comparáveis a animais: “a perguntar quando desovam”, l. 67). 8. É evidente, pelo diálogo que trava com Fernando Pessoa, que Ricardo Reis, regressando a Portugal ao fim de 16 anos, não está a par da situação política de Portugal, tomando conhecimento dela apenas pelos jornais ou por conversas que vai mantendo com outras personagens, como Lídia. Neste caso concreto, Ricardo Reis opta por colocar as suas dúvidas a Fernando Pessoa, que, sabendo ler nas entrelinhas, confessa ao seu heterónimo que os meios de comunicação estão ao serviço de uma poderosa máquina de propaganda política. 9. O facto de o arcebispo de Mitilene ter declarado que Portugal é Cristo e Cristo é Portugal evidencia o apoio da Igreja ao regime. Cometendo esta blasfémia, ele abençoa o país e os seus governantes, e atribui-lhes um cunho sagrado. Por outro lado, esta era a melhor forma de garantir a adesão do povo ao regime, fazendo uso das raízes marcadamente cristãs da população portuguesa. 10.1 a. Por meio da ironia, o narrador salienta o facto de ser hábito em Portugal valorizar tudo o que é estrangeiro, em detrimento do que é nacional. b. A metáfora e a ironia presentes no enunciado servem para realçar a submissão dos portugueses ao regime e os sacrifícios e as carências experienciados pela população. 11. Vieira descreve os roncadores de forma negativa, pois muito roncam apesar da sua pequenez, querendo com isto representar a arrogância e a prepotência dos homens. De igual forma, o narrador de O ano da morte de Ricardo Reis pretende representar a altivez de algumas nações europeias, servindo-se para isso de um vocábulo que remete para a sensação auditiva – o verbo “arrotar”. 12. O narrador serve-se das relações intertextuais para trazer uma dimensão irónica ao seu relato. Assim, a. Fernando Pessoa é evocado sarcasticamente por Ricardo Reis através do último verso do poema "O Infante" (in Mensagem): “Senhor, falta cumprir-se Portugal”. É ridicularizada a prosperidade do país, quando Reis afirma ser uma pena Fernando Pessoa ter morrido tão perto da altura em que se antevia que o destino de Portugal se cumpriria – o de ser o impulsionador do Quinto Império; b. o narrador serve-se do último verso da estância 145 do canto X de Os Lusíadas, quando Luís de Camões descreve a pátria envolta numa “apagada e vil tristeza” para contrapor ironicamente a época de Camões à situação vivida em 1936, altura em que se pretendia difundir a imagem de uma nação feliz, afortunada e próspera; c. a relação intertextual estabelecida com a Bíblia (Mt, 26, 26-27) – através da recuperação das palavras proferidas por Jesus na última ceia, quando se preparava para sacrificar a sua vida em prol da humanidade ("Este é o meu corpo, este é o meu sangue", ll. 127-128) – tem como intenção salientar a forma como tantos jovens portugueses eram instruídos e instigados a sacrificarem a sua vida pela pátria (na Guerra Colonial, por exemplo). 13. Oração coordenada explicativa. 14. Sigla. 15. Situação habitual. 16.1 Deítico pessoal −“nos”; deítico pessoal e temporal − “precisamos”; deítico temporal – “pariu”. 16.2. O uso da primeira pessoa do plural justifica-se pelo facto de Fernando Pessoa estar a considerar-se parte integrante do povo português, o qual, no seu entender, precisa de explicações relativas à declaração do arcebispo de Mitilene de que “Portugal é Cristo e Cristo é Portugal”. 237 Escrita Ao contrário do que aconteceu durante a I República, em 1936 vivia-se em Portugal um período de estabilidade, centralizando-se todos os poderes no Estado, com o objetivo de promover uma sociedade una. Para isso, o regime autoritário de Salazar, que vigorava no país há dez anos, recorria à propaganda, fomentando, tão ao gosto dos sebastianistas, a imagem do presidente do Conselho como um salvador, e controlava quaisquer oponentes à ideologia por meio da repressão. (74 palavras) 238 Informar 1. a. V b. V c. F − Ainda que o narrador reproduza o relato propagandista dos jornais, fá-lo de forma irónica. Além disso, o facto de apresentar situações reais que contradizem esse discurso demonstra a sua rejeição da ideologia do Estado Novo. 239 Informar 1. Excerto 6: − conversa entre o narrador e o narratário: “hoje somos um povo muito contente, acredite” (l. 111); − intervenção do narrador através de comentários: “para que se entenda bem que não temos mais que ver com a apagada e vil tristeza de que padecíamos no século dezasseis” (ll. 109-111); Excerto 10: − estruturas morfossintáticas simples, mistura de discursos: “uma mulher gritou, Ai que é uma revolução, e largou a correr, calçada acima” (ll. 153-154). 2. Discurso direto: “Dizem que foi chamado à polícia internacional” (excerto 3, ll. 50-51). Discurso indireto: “Ficou Ricardo Reis a saber que a polícia onde terá de apresentar-se na segunda- -feira é lugar de má fama e de obras piores que a fama” (excerto 3, ll. 54-56). Citação: “Sem dúvida os sindicatos nacionais repelem com energia o comunismo” (excerto 8, l. 138). Discurso indireto livre: “Era então ali que ia o irmão de Lídia, o marinheiro Daniel, a quem nunca vira” (excerto 10, ll. 158-159). 3. Ricardo Reis perguntou: − Que barco é aquele? Teve sorte, calhou dar com um entendido: − É o Afonso de Albuquerque. 242 Expressão Oral Sugestão Proponha a divisão da turma em quatro grupos, de acordo com o número de países em análise. Recomende aos seus alunos o uso de ferramentas tecnológicas de suporte à apresentação oral (contemplando os tópicos a tratar e as imagens alusivas ao tema). Peça, antecipadamente, a planificação das apresentações e, no final, promova a auto e a heteroavaliação das intervenções dos alunos (aspetos de conteúdo e aspetos formais da apresentação). 246 Educação Literária 1. A Europa encontrava-se num período extremamente conturbado. Nota-se a completa inutilidade e incapacidade das instituições para a resolução de conflitos entre os países. Assiste-se, nestes anos, a movimentações políticas e ideológicas que estarão na base da constituição de regimes ditatoriais e que, em última análise, deflagram a Segunda Guerra Mundial. Cada um dos países cumpre negativamente para o cenário acima indicado, tal como se sintetiza: Itália − Invasão da Etiópia pelas tropas italianas. − Denúncia de atrocidades cometidas pelas tropas italianas. − Fim da guerra na Etiópia e nomeação de Mussolini como imperador da África Oriental Italiana. − Fuga do Negus para a Somália francesa. − Disponibilização, por parte de Mussolini, da força italiana na luta contra o comunismo. Espanha − Demissão do governo espanhol. − Divergências na direita espanhola. − Proclamação, pela Falange, da oposição ao comunismo. − Declaração da ilegalidade do partido fascista Falange Espanhola e prisão do seu dirigente José António Primo de Rivera. − Destituição de Alcalá Zamora da presidência da República. − Comemoração da Revolução em Espanha. − Ida para Portugal de milhares de espanhóis como refugiados. − Surgimento de um movimento revolucionário fascista, liderado pelo general Franco. − Intensificação da guerra em Espanha contra as forças de esquerda. − Apoio à revolução nacionalista de Franco concedido por um grupo de financeiros norte-americanos. Inglaterra − Nomeação de Eduardo VIII como novo rei de Inglaterra. − Denúncia por Lloyd George do favorecimento de Portugal em termos de colónias face à Alemanha e à Itália. − Desculpabilização da Itália por Winston Churchill. Alemanha − Reprovação, pela Frente Patriótica Austríaca, da ligação da Alemanha à Áustria. − Declaração de Hitler sobre o propósito da Alemanha ser um país pacifista. − Intenção alemã de ocupar a Renânia. − Invasão do território checoslovaco por forças militares alemãs. − Denúncia, por parte da Alemanha, do pacto de Locarno e ocupação da zona renana. − Idolatria de Hitler. − Declaração da união do Reich e da Igreja Católica na luta contra o comunismo. França − Demissão do governo francês. − Constituição por Sarraut de um governo de concentração republicana. − Contestação do governo pelos partidos da direita. − Vitória do socialista Blum em França. 2. Quando afirma “se tal coisa lá fizerem, tristes dias estão guardados para muita gente” (ll. 58-59), o narrador está já a prenunciar um cenário apocalíptico – o da Guerra Civil espanhola. 3. A estrutura antitética serve para contrapor duas realidades: (1) a diplomática, movida por interesses económicos e políticos; (2) a dos factos ocorridos naquele país (Etiópia): o saque de casas, a violação de mulheres e a morte de inocentes. Desta forma, o narrador pretende salientar a negligência e a indiferença dos estados pertencentes à Sociedade das Nações relativamente ao massacre perpetrado pelas tropas italianas em África. 4.1 Ao ler nos jornais os acontecimentos ocorridos em Addis-Abeba, Ricardo Reis evoca o poema da sua autoria “Ouvi contar que outrora, quando a Pérsia”, que retrata a indiferença de dois jogadores de xadrez perante as atrocidades da guerra cometidas à sua volta. É que os dois, adotando uma atitude estoica e epicurista, continuam o jogo, enquanto a população é massacrada. Desta forma, o narrador pretende denunciar a indiferença do mundo em relação ao sofrimento vivido em Addis-Abeba. Por outro lado, esta é também uma forma de o narrador demonstrar que, cada vez com mais frequência, Ricardo Reis vai colocando em causa as suas convicções, sentindo-se incomodado “com o espetáculo do mundo” (“Uma sombra passa na fronte alheada e imprecisa de Ricardo Reis, que é isto, donde veio a intromissão”, ll. 96-97). 5. O narrador evidencia a conivência da Igreja com os regimes fascistas, dada a aliança existente entre ambos. A Igreja surge como instrumento capaz de persuadir e manipular as populações. Assim, a atitude dos movimentos fascistas em Espanha é justificada pela necessidade de se restabelecer “o império da cruz e do rosário sobre o odioso símbolo do martelo e da foice.” (ll. 118-119) e, na Alemanha, a Igreja declara os comunistas como seus inimigos. 6. a. A pergunta retórica, a enumeração, a adjetivação e a ironia contribuem para acentuar a discrepância de forças existente na guerra que os italianos travaram com o povo etíope. Para o efeito, contribui o facto de se destacar que os abissínios apenas tinham ao seu dispor armas arcaicas (a lazarina, a lança ou a catana) para enfrentar o poderoso dispositivo bélico do exército italiano. b. A metáfora e a ironia servem para realçar a estabilidade e o conformismo que se vivia em Portugal, em contraste com alguns países europeus onde deflagravam as revoluções de esquerda. c. Mediante comparação de Franco com Herodes, o narrador ironiza e denuncia a falsa humanidade do general espanhol, que tenta passar a imagem de alguém que não está disposto a sacrificar o povo e a cometer atos tão atrozes como a ordem dada por Herodes para matar os inocentes. 7. Marcas de coloquialidade observadas na relação narrador/narratário: “Em terra de nuestros hermanos é que a vida está fusca” (excerto 4, ll. 14-15). Uso de ditados populares – “muito ladrar e pouco morder” (excerto 4, l. 37). 247 Leitura 1. Trata-se de um artigo de opinião, uma vez que estamos perante um texto onde é explicitado um ponto de vista, neste caso sobre o futuro da Europa, que, na perspetiva do autor, pode correr o risco de se desintegrar, caso não se democratize. Para o efeito, são apresentados argumentos e exemplos, tais como: “Novas divisões estão a aparecer visivelmente por todo o lado para onde olhamos: ao longo das fronteiras, dentro das nossas sociedades e economias e na mente dos cidadãos europeus” (ll. 3-5) ou “A perda da integridade da Europa tornou-se dolorosamente evidente no último desenvolvimento da crise dos refugiados” (ll. 6-7). Destaca-se, ainda, o uso de uma linguagem valorativa, como por exemplo, “O verdadeiro perigo não é o de nós termos um objetivo muito elevado e falharmos. O perigo real é que os europeus fixem o olhar no abismo e acabem por lá cair” (ll. 33-34). 2. O texto invoca acontecimentos políticos e sociais que marcam a atualidade: o drama dos refugiados decorrentes da guerra na Síria e os acordos estabelecido entre a Europa e a Turquia para controlar os fluxos migratórios, bem como a pressão de Bruxelas sobre a Grécia relativamente ao controlo das fronteiras; a fratura do eixo franco-alemão; a recessão económica dos países do Sul da Europa; a ameaça à solidariedade europeia por parte de alguns países da antiga União Soviética. Estes acontecimentos trazem à memória os conturbados acontecimentos políticos da década de 1930 que conduziram a Europa ao abismo da Segunda Guerra Mundial. 248 Compreensão do Oral 1. “A Europa está cercada pelo terrorismo, pelos refugiados, pelas crises económicas e financeiras”. 2. O acordo que a Europa fez com a Turquia sobre os refugiados tem condições para ser bem-sucedido? 3. a. A situação dos refugiados é muito complexa, não há uma forma simples de resolver a questão. b. O acordo separa a situação dos refugiados da dos migrantes. c. O problema dos refugiados está na sua própria origem, ou seja, nos países de onde são oriundos e que não garantem condições de vida. d. perdeu a superioridade moral, deixou de ser respeitável pelos seus valores. e. uma deportação massiva de refugiados para a Turquia com a promessa de um regresso individual. 4. Trata-se de um debate, uma vez que estamos na presença de dois intervenientes que assumem posições nem sempre coincidentes em relação ao tema. Os interlocutores servem-se de argumentos e exemplos que fundamentam as suas opiniões, e reforçam a sua posição com citações que conferem credibilidade à sua tese. É ainda evidente o respeito pelo princípio da cortesia. O moderador também desempenha um papel importante na condução da troca de opiniões (abertura do debate, apresentação do tema e da questão polémica, reposicionamento de ideias, …). 254-255 Educação Literária 1. Tal como preconizado por Fernando Pessoa, Ricardo Reis esteve emigrado no Brasil. Saramago parte deste pressuposto, mas coloca Reis a regressar à pátria, ao fim de dezasseis anos, trazendo consigo um sotaque que é percecionado pelo taxista; fisicamente, Reis apresenta-se como “um homem grisalho” (já que, tendo nascido em 1887, em 1936 teria 49 anos) e “seco de carnes” (na carta a Adolfo Casais Monteiro, Fernando Pessoa afirma que ele é um homem forte, mas seco). É poeta e regista-se como médico no Hotel Bragança (“este também é poeta, não que do título se gabe, como se pode verificar no registo do hotel, mas um dia não será como médico que pensarão nele”, ll. 190-191). Na personagem de Saramago permanecem alguns traços da filosofia de vida e do credo poético do heterónimo: é visível a sua dificuldade em tomar decisões ou avançar explicações, dado acreditar no peso do destino (“talvez porque lhe fizeram uma das duas perguntas fatais, Para onde, a outra, e pior, seria, Para quê”, ll. 28-29), bem como a sua enorme autodisciplina, evitando as paixões e a inquietude da alma (“sente também uma sombra de infelicidade passar-lhe sobre o corpo, não sobre a alma, repito, não sobre a alma, esta impressão é exterior”, ll. 74-75; “parece este homem que não tem mais que fazer, dorme, come, passeia”, ll. 186-187), e o seu rigor, enquanto poeta, nas formas estróficas e métricas (“faz um verso por outro, com grande esforço, penando sobre o pé e a medida”, ll. 187-188). A escolha de um hotel perto do rio pode também ser entendida como uma marca característica de Reis, já que este elemento é recorrente na sua poesia (veja-se, por exemplo, a ode “Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio”). 2.1 Lisboa é descrita como uma cidade “pálida”, “cinzenta” e “sombria”, imagem reforçada pela chuva que não para de cair e que torna as águas do rio “turvas de barro”, ao mesmo tempo que contribui para acentuar a tristeza do ambiente – “Chove sobre a cidade pálida”(l. 1), “os meninos espreitam a cidade cinzenta” (l. 10), “Para além dos barracões do cais começa a cidade sombria” (l. 15), “todos porejando sombra e humidade” (l. 127), “brumosa a arquitetura” (l. 87). É uma cidade cujas construções são, no geral, térreas e estão dispostas sobre colinas. As valetas e as ruas são de basalto e os passeios de calcário, o que acaba por contrastar com a envolvência sombria. Apesar de possuir praças, estátuas de figuras eminentes e construções imponentes como o Terreiro do Paço, parece, no entanto, que a cidade perdeu o seu brilho e o seu fascínio. Como em qualquer metrópole do século XX, nas horas de ponta as ruas são bastante movimentadas, quer pelo afluxo de gente que passa, quer pela constante circulação de carros elétricos, carroças ou animais de carga, quer ainda pela afluência de todo o tipo de vendedores e comerciantes que povoam o ambiente de ruídos e sonoridades diversas. 2.2 O facto de a cidade de Lisboa ser associada a cores sombrias e pálidas remete para o regime ditatorial que se vivia em Portugal, em 1936, e que se caracterizava pelo obscurantismo, pela censura e pela perseguição a todos aqueles que não eram coniventes com a ideologia salazarista e que, por isso, tentavam “rasgar as trevas” a que estavam submetidos. De facto, é por causa deste ambiente político que o narrador, a propósito da visão apagada que Ricardo Reis tem do Terreiro do Paço, se questiona “será do tempo que faz, será do tempo que é” (excerto 3, ll. 87-88). 3. A deambulação geográfica é evidente no facto de Ricardo Reis ir percorrendo a cidade de Lisboa e visitando locais como o Terreiro do Paço, a rua do Crucifixo, o Chiado, a Praça da Figueira ou o Bairro Alto. Existe também uma viagem literária, na medida em que, transitando por estes locais, Ricardo Reis e o próprio narrador vão evocando vários autores e textos da literatura portuguesa e mundial. Assim, por exemplo, quando está por debaixo das arcadas do Terreiro do Paço, Reis recorda dois versos célebres de João de Deus. Na rua do Alecrim, a propósito da estátua de Eça de Queirós, somos confrontados com a epígrafe de A relíquia e, logo de seguida, na sequência da observação da estátua de Camões, é referido um verso deste poeta. Aliás, o autor de Os Lusíadas é constantemente evocado, sempre que Ricardo Reis se depara com a sua estátua ou com a do Adamastor. Há ainda referências literárias a Dante, Miguel de Cervantes, Virgílio, entre outros. 4. Tal como na poesia de Cesário, em O ano da morte de Ricardo Reis a deambulação pela cidade de Lisboa serve de ponto de partida para reflexões diversas sobre o real circundante. Comum é também a comiseração e a identificação do narrador/ personagem com certas figuras do povo que vão sendo observadas (os homens que descarregam as sacas de feijão fazem lembrar os calceteiros do poema "Cristalizações", por exemplo). Além disso, a presença constante de Camões no percurso de Reis remete, tal como acontece em "O sentimento dum ocidental", de Cesário Verde, para a evocação de um passado glorioso, contrastante com a estagnação de um presente moribundo. Comum é também o visualismo de pendor impressionista, a convergência dos sentidos e o recurso a advérbios e a adjetivos expressivos − “vê passarem lá fora os carros elétricos, ouve-os ranger nas curvas, o tilintar das campainhas soando liquidamente na atmosfera coada de chuva” (excerto 4, ll. 104-106); “Respira-se uma atmosfera composta de mil cheiros intensos” (excerto 4, ll. 114-115); “Andam a lavar as bancadas, as ruas interiores, com baldes e agulheta, e ásperos piaçabas, ouve-se de vez em quando um arrastar metálico, depois um estrondo” (excerto 4, ll. 116-118). 5. Trata-se da metáfora que serve para salientar a confusão e a falta de organização das construções na Praça da Figueira, que surgem assim identificadas com uma grande babilónia (termo que significa cidade grande e confusa, construída sem planeamento) de ferro e vidro – os materiais usados nos edifícios. 6. Este segmento remete-nos, através da metáfora, para o conceito de intertextualidade que, muitas vezes, ocorre pela transformação do hipotexto ou pela concessão de um novo sentido (e daí a referência a “diferentes e questionadoras camadas do sentido, sedimentos removidos, novas cristalizações”, excerto 5, ll. 153-154). Além disso, esta afirmação revela-se também como uma forma de Saramago assumir a presença constante, com ou sem variantes, da evocação de outros textos em O ano da morte de Ricardo Reis. 7.1 [A] Enquanto, na epopeia, Camões põe a tónica no mar, salientando a sua importância na época áurea de Portugal – a dos Descobrimentos –, em O ano da morte de Ricardo Reis assistimos a uma inversão do sentido do verso como forma de realçar o fim desses tempos gloriosos, numa altura em que Portugal, tendo perdido o domínio dos mares, vive voltado para si mesmo. [B] A citação do primeiro verso de Os Lusíadas surge no seguimento da evocação de grandes nomes ligados à literatura universal, de que Camões é um exemplo, ainda que se tenha inspirado na Eneida, de Virgílio, e usado, ipsis verbis, o primeiro verso da epopeia romana. [C] A evocação dos versos de Os Lusíadas “Pera servir-vos, braço às armas feito, / Pera cantar-vos, mente às Musas dada” serve para confrontar a vida passada de Camões, dedicada às armas e às letras, com o momento presente, em que a sua figura é representada por uma estátua inerte, tal como inerte ficou o poeta depois da sua morte, tendo caído, muitas vezes, no esquecimento e nada podendo fazer em relação à forma como a sua imagem e a sua obra são utilizadas. [D] Estes versos do canto V de Os Lusíadas surgem a propósito da observação de Ricardo Reis da estátua do Adamastor, que de imediato recorda a trágica história de amor do gigante, vítima do engano e da cilada de Tétis. 8. Quando, no excerto 6, o narrador afirma “mas este aqui, se por estar morto não pode voltar a alistar-se, seria bom que soubesse que dele se servem, à vez ou em confusão, os principais, cardeais incluídos, assim lhes aproveite a conveniência.” (ll. 182-185) ou, no excerto 7, declara que “todos os caminhos portugueses vão dar a Camões, de cada vez mudado consoante os olhos que o veem” (ll. 204-205), está a denunciar o aproveitamento ideológico de Camões e, muitas vezes, a subversão das suas palavras por parte do regime ditatorial português. 9.1 a. Na ode “Só o ter flores pela vista fora”, de Ricardo Reis, o sujeito lírico, à maneira helénica, antevendo a morte inerente a qualquer ser humano, evoca o barco de Caronte (“barco escuro”), responsável pelo transporte das almas pelo rio Estige (“soturno rio”), em direção ao reino dos Infernos. Assim, a alusão a esse verso de Ricardo Reis, na descrição do barco onde o heterónimo viajava, não só torna mais credível a personagem Ricardo Reis como constitui um indício da sua futura caminhada para a morte. b. No poema XX de O guardador de rebanhos de Alberto Caeiro, o sujeito lírico discorre sobre a supremacia do rio da sua aldeia, em detrimento do Tejo, simplesmente por ser o rio da sua aldeia e não fazer pensar em nada, ao contrário do rio da capital que toda a gente conhece e que está associado a grandes acontecimentos históricos, como o da expansão marítima. Em O ano da morte de Ricardo Reis, a alusão ao verso serve para, de uma forma jocosa, o narrador comparar o Tejo ao Tamisa e, por conseguinte, Lisboa a Londres. c. No poema de Álvaro de Campos, o sujeito lírico confessa o seu enorme cansaço existencial. Na obra de Saramago, depois de ter decidido voltar a Portugal e de ser obrigado a optar por um alojamento, Ricardo Reis, por ser alguém que acredita serenamente no destino, acaba por se sentir invadido por um extremo cansaço: tem de tomar decisões e pode confrontar-se com situações que fogem ao seu controlo. 9.2 Alusão. 255 Escrita 1. Introdução: Apresentação sucinta do local, tendo em conta aspetos como a localização geográfica, o número de habitantes ou marcos distintivos… e exposição da opinião (positiva ou negativa) sobre a terra. Desenvolvimento: Fundamentação da opinião com argumentos e exemplos. Conclusão: Retoma da posição defendida e fecho. 257 Informar 1. a. V b. V c. F − O silêncio é representativo do clima de ameaça e perseguição que se vivia na época, em Portugal, e que limitava a liberdade de expressão e de pensamento. d. F − O espaço exterior funciona como ponto de partida e como incentivo para diversos tipos de divagações por parte de Ricardo Reis. e. F − A viagem literária decorre do facto de, a cada passo, assistirmos a evocações e discursos de escritores muito variados. f. F − Além de não estarem assinalados, fundindo-se, quase sempre, no próprio discurso do narrador ou das personagens, os textos evocados nem sempre são fiéis ao original, surgindo muitas vezes sob a forma de alusões, paráfrases ou paródias. g. V 261 Educação Literária 1. Marcenda é uma jovem com mais de vinte anos, delgada, de pescoço esguio, queixo fino e de contornos pouco definidos. Sofre de paralisia na mão esquerda, o que condiciona muito o seu comportamento (cuida da mão como se de um animalzinho desprotegido se tratasse) e anula os projetos futuros (desiste de ser feliz, recusando o pedido de casamento de Ricardo Reis). É uma mulher virgem e inexperiente, tendo sido Ricardo Reis o primeiro homem a beijá-la. Revela ser destemida e um pouco arrojada para a época, já que não se coíbe de visitar o poeta em sua casa e no seu consultório. Contudo, é uma mulher sem grandes convicções e sem vontade própria, dado que está disposta a ir a Fátima, simplesmente para agradar ao pai. 2. Apologista de uma vivência sem paixões e sem envolvimentos, regida pela ataraxia e pela crença na fatalidade do destino, Ricardo Reis faz tudo para controlar as suas emoções e não se deixar afetar por nada. No entanto, a sua autodisciplina falha, quando ele se apercebe da paralisia da mão esquerda de Marcenda, a tal ponto que sente um arrepio e não consegue deixar de continuar a observá-la. 3.1 O segmento remete para algo inacessível, intocável, distante, o que prenuncia o desfecho do envolvimento romântico de Ricardo Reis e de Marcenda: a vivência de um amor impossível, de contornos platónicos. 4. Da mesma forma que a mão paralisada de Marcenda não tem nenhum tipo de reação voluntária (é “um corpo estranho” e manifesta um “abandono total”), também Ricardo Reis inicialmente tenta adotar uma atitude passiva, escusando-se a tomar partido, decisões ou a defender determinada posição, à boa maneira estoica. De facto, tal como Fernando Pessoa afirmava, Ricardo Reis começa por agir como se fosse um estrangeiro no mundo contemporâneo, tão distante da sua amada Grécia. 5.1 Apesar de a relação entre ambos ter assumido contornos físicos pouco tempo depois de se terem conhecido, já que se beijam sofregamente, Marcenda acaba por impor uma vivência platónica ao seu amor: recusa-se a casar com o médico e a voltar a vê-lo, ao mesmo tempo que lhe assegura que nunca o esquecerá; pede, em contrapartida, que Reis se lembre dela todos os dias. Ricardo Reis, por seu lado, pretende selar o fim da relação, deixando-a eternizada numa ode. 5.2 Na ode que Ricardo Reis escreve transparece a autodisciplina do sujeito lírico que, consciente da fugacidade e efemeridade da vida, se dispõe a aceitar serenamente a inevitabilidade da morte. Esta é, assim, uma maneira de Ricardo Reis assumir o fim da sua relação com a filha do doutor Sampaio, que murchou como uma flor, mas que ele está disposto a guardar sempre consigo. Esta é ainda uma forma de elevar Marcenda à categoria de musa inacessível e distante. 6.1 A comparação serve para salientar a fraqueza da mão de Marcenda e a tentativa de Ricardo Reis a curar. Extensivamente, esta expressão aplica-se à própria personagem que, pela sua desistência da vida, ia murchando a cada dia, tal como o nome indicia e o uso do gerúndio traduz e reforça. 7. O tom oralizante é visível, por um lado, pelo facto de o segmento funcionar como uma espécie de parênteses que o narrador abre para fazer uma observação e, por outro, pela envolvência do narratário no discurso, como se de uma verdadeira conversa se tratasse. 8. Discurso indireto livre. 9. Predominantemente, a sequência textual é de natureza descritiva, uma vez que estamos perante a caracterização de Marcenda e do pai. 268-269 Educação Literária 1. Ricardo Reis, primeiramente, fica surpreso, pois Lídia é o nome de uma das musas dos seus poemas (“Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio”, por exemplo), e sorri irónico, como se pensasse que o destino lhe estava a pregar uma partida. Depois, recompõe-se, porque não se quer deixar perturbar por nada nem desejar seja o que for. Assim, de imediato, escreve “Aos deuses peço só que me concedam o nada lhes pedir.” (ll. 27-28). 2. Quando relata a primeira reação de Ricardo Reis ao ouvir o nome de Lídia, o narrador comenta o facto de as pessoas terem a tendência para repetir as palavras de outrem. Contudo, logo de seguida, assume que essa é uma reflexão da sua autoria e que até vem a despropósito; por isso, como se estivesse a controlar marionetas (as personagens), retira Lídia da ação e convida o leitor a deter-se consigo na análise do comportamento de Ricardo Reis. 3.1 Lídia tem cerca de 30 anos, é bonita, morena, relativamente baixa e de formas bem feitas. É uma mulher pouco convencional para a altura, já que está disposta a manter um relacionamento não oficial com Ricardo Reis, porque está decidida em levar a gravidez até ao fim, ainda que o poeta não tenha a intenção de perfilhar a criança. Apesar de ser simples, humilde e pouco letrada, é uma pessoa informada, preocupada com os acontecimentos nacionais e mundiais; revela ter espírito crítico, a ponto de surpreender o seu interlocutor pelas afirmações que faz. É igualmente uma mulher ativa, trabalhadora e lutadora. 3.2 A Lídia de Saramago, sobretudo no plano psicológico, em muito se distancia da Lídia das odes de Ricardo Reis − caracterizada pela serenidade, pela pureza e pela passividade. De facto, o heterónimo pessoano canta uma mulher que é o protótipo da não envolvência em paixões ou problemas. 4. Pouco tempo depois de se conhecerem, Lídia toma a iniciativa de se relacionar amorosamente com Ricardo Reis. A partir desse momento, os dois estabelecem uma relação descomprometida, sobretudo de cariz sexual. Quando Reis arrenda casa, Lídia, por se sentir bem com o que tem e não desejar mais, até por reconhecer a distância cultural e social que a separa daquele homem, continua a manter a relação, ao mesmo tempo que desempenha as funções de sua empregada de limpeza. Já Reis admite gostar de estar com ela, mas nunca concebe que a relação possa evoluir. Esta atitude torna-se explícita quando Lídia engravida e Ricardo Reis se desresponsabiliza de perfilhar a criança. A pouco e pouco, a rapariga acaba por questionar o seu papel na vida do médico e afasta-se. No final, Ricardo Reis desiste de Lídia, optando por seguir Fernando Pessoa em direção à morte. 5.1 A viagem literária é comprovável pela evocação de autores, características e obras/excertos da literatura portuguesa: − quando confrontado com o envolvimento de Ricardo Reis com uma criada de hotel, Fernando Pessoa recorda a personalidade e a poesia do seu heterónimo como forma de evidenciar as diferenças entre a figura que criou e aquela que está diante de si no Hotel Bragança. Assim, confessa a sua surpresa pelo facto de um amante da estética, que sempre cantou nas suas odes, à maneira clássica, musas como Lídia, Neera e Cloe, estar agora envolvido com uma criada de hotel e adotar comportamentos comezinhos que o distanciam das palavras que escreveu um dia: “Sereno e vendo a vida à distância a que está” (excerto 4, ll. 92-93); − o nome de Camões é também referido por Fernando Pessoa para ridicularizar a situação, afirmando este que Reis teve mais sorte do que Camões, porque a musa das suas odes acabou por ter uma correspondente real, ao passo que a Natércia invocada por Camões nunca passou de uma entidade fictícia. 5.2 A ironia presente no discurso do narrador serve para troçar de um dos dogmas da Igreja – o de que Deus é omnipresente. Desta forma, ridiculariza-se esta crença, admitindo-se que Deus, por estar sempre presente em toda a parte, seja também obrigado a assistir a momentos íntimos entre pessoas que se amam. 6.1 Tendo como motivo o facto de Ricardo Reis não ter intenção de perfilhar a criança que Lídia traz no seu ventre, o narrador faz alusão ao poema de Fernando Pessoa “O menino de sua mãe”. Este poema foca o morticínio da guerra e o desespero de uma mãe que perde o seu filho na guerra, aí representado por um jovem que, como tantos outros, jaz morto no campo de batalha. Assim, através de uma prolepse velada, o narrador evoca o ano de 1961, altura em que terá início a Guerra Colonial portuguesa e em que a criança estará em idade de combater pela pátria. O filho de Lídia personificará, desta forma, o sacrifício e o sofrimento de tantos portugueses que deram a vida pela pátria e pelo império português. 7. Durante toda a sua vida, o Ricardo Reis pessoano regeu-se pela inércia, pela indiferença, pela sobrevivência, mais do que pela vivência dos momentos. No entanto, confrontado com a situação histórica e política do ano de 1936 e também em virtude das relações amorosas que foi desenvolvendo, o Ricardo Reis saramaguiano ou se mantinha como o sábio que se contenta com o espetáculo do mundo, não se imiscuindo em nada, ou passava a adotar um comportamento ativo, tomando posições e intervindo nas situações. Porém, não o conseguindo fazer, Ricardo Reis acaba por não vingar como figura real, independente do seu criador, e, por isso, acompanha Fernando Pessoa na sua “última viagem”, ou porque acaba por desistir, estrangeiro do mundo como se sente, ou porque a força do destino o impele a isso. Significativo é ainda o facto de o heterónimo levar consigo o livro que tão bem metaforiza o seu labirinto interior. 8. O facto de a obra começar e acabar com uma recriação do verso de Camões “onde a terra se acaba e o mar começa” confere à obra uma estrutura circular. Para isso contribuem também as viagens de Ricardo Reis, primeiro de regresso à pátria, depois ao encontro da morte. 9. Ao contrário da época áurea e majestosa de Portugal, cantada por Camões, na qual o mar ocupava um lugar de relevo, a obra saramaguiana não termina com uma mensagem otimista: apresenta a denúncia de um país que perdeu a glória de outrora e que vive cercado pelo obscurantismo de uma ditadura que urge ultrapassar; daí a observação de que parecia que o Adamastor seria capaz de dar o grande grito (da revolta) e a afirmação “Aqui, onde o mar se acabou e a terra espera”. De certa forma, estas palavras remetem também para a Mensagem, de Fernando Pessoa, em que, por várias vezes, o poeta aponta para a necessidade de se ultrapassar a letargia vivida no seu tempo – “Senhor, falta cumprir-se Portugal”; “Ó Portugal, hoje és nevoeiro… / É a hora!”. 10.1 [D] 10.2 [C] 10.3 [B] 10.4 [A] 11. Citação, uma vez que se trata da transcrição exata de um verso de Ricardo Reis. 12. Palatalização. 13. Domicílio, domesticado. 269 Expressão Oral 1. Resposta de caráter pessoal. No caso da literatura, o aluno pode aludir, por exemplo, a: − Os Maias: apesar de Carlos da Maia e Maria Eduarda terem sido separados em crianças, o destino leva a que eles se reencontrem e se apaixonem anos mais tarde; − Édipo Rei: sabendo, por um oráculo, que havia de matar o pai e de casar com a mãe, Édipo foge de casa dos pais, ignorando que era adotado. Acaba por matar o verdadeiro pai e por casar com a verdadeira mãe, sem o saber. 271 Informar 1. Marcenda, tal como o nome indica, é uma mulher que está destinada a murchar, a desistir. A par disso, revela uma obediência extrema, uma inércia e uma passividade que contrastam com a proatividade, a liberdade e o envolvimento de Lídia nas questões do mundo que a rodeia. Assim, Marcenda acaba por representar a apatia de Ricardo Reis que age como um mero espetador do mundo. Lídia, por seu lado, constitui-se como a única possibilidade de o heterónimo se (re)construir como uma figura independente do seu criador e vingar no mundo de 1936, não se coibindo de tomar posições mais radicais nas questões importantes. Mas, no labirinto em que vive, Ricardo Reis sente-se incapaz de assumir esse comportamento e, por isso, resta-lhe aceitar a morte, para a qual se preparou durante toda a sua existência. 272 Informar 1. Ao longo de toda a obra são constantes as relações intertextuais estabelecidas com vários autores da literatura portuguesa e estrangeira, passando por citações de jornais, por diálogos que evidenciam características estéticas de poetas como Fernando Pessoa e Ricardo Reis, ou por alusões e citações bíblicas, entre outras. A dimensão intertextual concretiza-se quer através da voz do poeta de “Vem sentar-te comigo, Lídia”, quer pela voz do narrador – a propósito das deambulações de Ricardo Reis, por exemplo –, quer, ainda, pelas conversas que o heterónimo mantém com o ortónimo –, sendo de notar que, muitas vezes, as referências intertextuais surgem mescladas com outros discursos, sem qualquer sinal gráfico ou indicação de autoria por parte do locutor. 275 Verificar 1. a. F − Vivia-se na Europa uma grande instabilidade política, promovida pelas constantes divergências entre os partidos de direita e de esquerda; num grande número de países europeus vigoravam ditaduras de índole fascista. b. F − Apesar de a propaganda política pretender passar a imagem de um país próspero e feliz, a verdade é que grande parte da população vivia na miséria. c. F − Quer externa quer internamente, Salazar era visto como um modelo a seguir, um salvador, sendo poucos aqueles que em Portugal se atreviam a fazer- -lhe frente, até porque o regime era autoritário e repressivo. d. V e. F − José Saramago quis provar exatamente o contrário: que no panorama mundial de 1936 era impensável agir-se como mero espetador do mundo. f. F − Apesar de Saramago ter partido da conceção de Fernando Pessoa, por vezes a personagem distancia-se do original, já que, mesmo sem querer, há situações que lhe provocam emoções e reações contrárias ao proposto na criação heteronímica. g. V h. F − A viagem literária decorre da constante evocação de autores e de textos literários a que se assiste na obra. i. V j. F − Na obra estão presentes variadas formas de concretização da intertextualidade: citação, alusão, paródia, paráfrase ou imitação criativa. k. F − As duas mulheres revelam personalidades opostas e contrastantes. l. V m. V 1 solu??es sentidos12/Unidade 6.2 - Jos? Saramago, Memorial do convento .docx Sentidos 12, Unidade 6.2 – José Saramago, Memorial do convento Cenários de resposta Página(s) Domínio / texto Cenário de resposta 282 Expressão Oral 1.1 No separador figuram o convento de Mafra, as imagens de D. João V, de Baltasar, de Blimunda e da passarola. 1.2 A ação do romance Memorial do convento, de José Saramago, centra-se na construção, levada a cabo por milhares de trabalhadores, do convento de Mafra, que foi mandado edificar por D. João V. Na história intervêm também Baltasar e Blimunda que, com o padre Bartolomeu Lourenço, empreendem o projeto de construção de uma máquina voadora – a passarola – cuja invenção era apoiada pelo rei. 283 Informar 1. Ao intitular o seu romance Memorial do convento, Saramago pretende, acima de tudo, tornar memorável e inesquecível o verdadeiro obreiro da construção do edifício – o povo –, que a História ignora, celebrando apenas o seu promotor – o rei D. João V. 1.1 Como forma de homenagear e resgatar do esquecimento estes homens sofridos, Saramago enumera, simbolicamente, nomes iniciados por todas as letras do alfabeto. 2. a. Promessa de D. João V de construir um convento em Mafra. b. Construção do convento pelo povo. c. Relacionamento amoroso de Baltasar e Blimunda. d. Sonho do padre Bartolomeu Lourenço de construir a passarola. 284-285 Educação Literária 1. a. D. João V b. penitência c. Sucessão d. Espanha e. Baltasar f. a passarola g. dom h. São Sebastião da Pedreira i. Sete-Luas j. a Holanda k. recolher as vontades l. bênção m. Domenico Scarlatti n. música o. Espírito Santo p. Madeira q. morreu r. trabalhadores s. Pero Pinheiro t. Francisco Marques u. trezentos v. 1730 w. D. Maria Bárbara x. voo y. sagração z. auto de fé 286 Compreensão do Oral 1. a. F – A construção do convento resultou da promessa feita por D. João V, caso tivesse descendência. b. F – O almoxarife alerta o rei para o facto de o país se estar a endividar, mas, mesmo assim, este decide prosseguir com a construção. c. V d. F – Uma vez que não pode nomear todos os construtores do convento por serem tantos, Saramago usa como estratégia a referência, ao acaso, de nomes que percorram todo o alfabeto, de maneira que todos sejam homenageados. e. F – O grande protagonista é o povo, representado por Baltasar e por outros trabalhadores, dado o esforço e os sacrifícios que teve de suportar para levar a cabo a construção do convento, idealizada por D. João V. 288 Educação Literária 1.1 D. João V é um rei poderoso, mas que ainda não conseguiu alcançar um dos seus maiores objetivos: ter um descendente. Ainda assim, na busca desse propósito, é persistente e cumpre rigorosamente determinadas rotinas. É um homem infiel. D. Maria Ana Josefa é uma mulher muito religiosa e os problemas de infertilidade, no início do casamento, levam-na a ficar ainda mais devota. Por isso mesmo, sente um peso na consciência após cada ato sexual, o que a leva a rezar fervorosamente. No entanto, os escrúpulos religiosos dão lugar a desejos libidinosos que se configuram na forma de sonhos, ocultados ao confessor, que acabam por minimizar a insatisfação pessoal que sente e a ajudam a adotar uma atitude resignada relativamente à infidelidade do marido. De facto, a rainha é uma mulher paciente e submissa ao rei e às convenções da aristocracia e da corte a ponto de se sacrificar para dar um descendente à coroa. É, ainda, frágil (“estende ao rei a mãozinha suada e fria”, l. 61). 1.2 É uma relação pautada pela frieza, pela distância e pela formalidade. De facto, a ida do rei ao quarto da rainha, que ocorria rigorosamente duas vezes por semana, assume contornos protocolares, na medida em que é descrito um conjunto de atos de natureza cerimonial e ritual (os preparativos, o cortejo até aos aposentos da rainha, a ida para a cama). Além disso, a relação sexual mantida entre o rei e a rainha tem apenas o propósito de garantir a sucessão do rei, não havendo espaço para o amor ou para a ternura. Por isso, findo o ato, e ao contrário do que sucedia ao princípio, o rei abandona o quarto e não pernoita com a rainha. 2.1 Ao afirmar “Que caiba a culpa ao rei, nem pensar” (l. 6), o narrador denuncia a perspetiva machista da época: a de que a infertilidade seria sempre da responsabilidade da mulher, chegando mesmo a declarar que “a esterilidade não é mal dos homens, das mulheres sim” (ll. 6-7). Percebe-se, assim, que o narrador está a ser irónico, criticando a mentalidade que vigorava naquela altura quer relativamente ao casamento por conveniência quer no que concerne à ideia da mulher como ser submisso, com a função de assegurar a descendência. (A propósito desta questão, sugere-se que o professor leve os alunos a fazer aproximações com o romance Amor de perdição no que respeita à tentativa de Tadeu de Albuquerque casar a filha com Baltasar Coutinho). 3.1 Metáfora que evidencia o objetivo da ida do rei ao quarto da rainha: garantir a descendência. Deste modo, sendo a rainha o elemento gerativo da relação, ela é associada ao cântaro que espera a água da fonte, ou seja, espera que o rei a fecunde. Por outro lado, pela antecipação de "cântaro" a "fonte", distingue se a rainha como o elemento passivo da relação. 3.2 A intertextualidade é visível no facto de esta expressão resultar da transformação do provérbio “tantas vezes o cântaro vai à fonte que um dia lá deixa a asa”. 3.3 Alusão. 4. O facto de o narrador afirmar que, em Portugal, não há artífices de tanta qualidade, e se os houvesse ganhariam menos, é uma forma de demonstrar o menosprezo dos portugueses e das suas competências por parte dos governantes que valorizavam tudo o que era estrangeiro, não investindo nos seus concidadãos nem na sua cultura. (A propósito desta questão, pode estabelecer-se uma relação de intertextualidade com A Abóbada e com Os Maias, focando se o desprestígio a que muitas vezes o povo português foi votado. – A Abóbada: o facto de Afonso Domingues ter sido preterido por Mestre Ouguet. – Os Maias: a valorização da cultura francesa, em detrimento da portuguesa, por Dâmaso Salcede; o episódio da corrida de cavalos, “costume” importado de Inglaterra e que não se coadunava com as tradições portuguesas). 289 Informar 1.1 Retiram-se a uma parte D. João V e o inquisidor, e este diz: − Aquele que além está é frei António de S. José, a quem falando-lhe eu sobre a tristeza de vossa majestade por lhe não dar filhos a rainha nossa senhora, pedi que encomendasse vossa majestade a Deus para que lhe desse sucessão. E ele me respondeu que vossa majestade terá filhos se quiser. E então perguntei-lhe que queria ele significar com tão obscuras palavras… 1.2 Discurso direto: “(e este diz:) − Aquele que além está é frei António de S. José”. Marcas: verbo de tipo declarativo, dois pontos, parágrafo, travessão. Discurso indireto: “e então perguntei-lhe que queria ele significar com tão obscuras palavras…”. Marcas: verbo de tipo declarativo, oração subordinada substantiva completiva. 290 Educação Literária 1. Primeiro, foi necessário escolher o local (o alto da Vela, em Mafra); depois, estabelecer a dimensão do convento em função do número de frades que albergaria; a seguir, D. João V inaugurou a construção, colocando a primeira pedra, tendo-se iniciado, posteriormente, as obras de maior envergadura que requeriam já um número considerável de trabalhadores, que laboravam de manhã à noite. 2. Através destas palavras, o narrador pretende enfatizar as condições precárias e o sofrimento a que os trabalhadores estavam sujeitos, já que identifica o alto da Vela com o local onde Cristo foi crucificado. 3. Denuncia-se o desinvestimento na agricultura, em favor da construção de uma obra megalómana. 291 Compreensão do Oral 1. Véspera da reunião da concertação social em que o governo apresentará uma proposta de aumento do salário mínimo para 530 € em 2016 e 600 € até 2019. 2. (1) poder do governo para decretar politicamente “o salário mínimo”; (2) competitividade/ produtividade; (3) consequências a nível dos indicadores do emprego e do desemprego. 3. a. Está dependente da evolução da economia, do estado de desenvolvimento das empresas e da sustentabilidade do emprego. b. O valor mensal é baixo, mas o salário de cada trabalhador corresponde a 14 meses, além de outros encargos que o vencimento acarreta. c. Foi estabelecido um acordo com o governo para um aumento progressivo do salário mínimo a partir de 2011, acordo que foi violado, mantendo-se o salário mínimo congelado durante anos. d. O valor apresentado coaduna-se com a evolução da inflação desde 1974. e. Cerca de 700 mil trabalhadores estão a empobrecer todos os dias. f. Ao contrário do que se possa afirmar, a CGTP está preocupada com a manutenção dos empregos, mas é necessário cumprir os deveres e respeitar os direitos. 4. Trata-se de um debate, uma vez que estamos na presença de dois intervenientes que assumem posições diferentes em relação ao tema e às questões lançadas pela moderadora, servindo-se de argumentos e exemplos que fundamentam as suas opiniões. É ainda evidente o respeito pelo princípio da cortesia. 293 Educação Literária 1.1 Pretende-se realçar o poder de D. João V, uma vez que se afirma, ironicamente, que, apesar da importância de D. Henrique no conhecimento do mundo, e consequentemente na construção do império, o seu papel é agora diminuto, comparado com a gestão dos rendimentos e do reino que o rei português tem a seu cargo. 1.2 Trata-se da paródia, uma vez que o autor introduz diferenças por entre as semelhanças do seu texto com os versos do poema, “O Infante”. Para além disso, utiliza essas diferenças de maneira jocosa, como forma de criticar o rei D. João V na gestão das riquezas do reino. 1.3 A enumeração serve, por um lado, para salientar a riqueza do Império Português, já que se enunciam todos os bens de que o reino dispunha, provenientes das várias colónias, e, por outro, para acentuar o contraste existente entre as duas épocas – a de D. João V e a dos Descobrimentos – no que à gestão dos dinheiros públicos diz respeito. 2. Se no plano histórico estamos no séc. XVIII, mais concretamente no reinado de D. João V, o narrador, através da prolepse, dá-nos conta de uma realidade posterior e que tem a ver com a existência de um poeta português – Fernando Pessoa – que na sua obra Mensagem louva os feitos do infante D. Henrique. 3. O menosprezo pelos portugueses e por Portugal é visível no facto de, para o convento de Mafra, D. João V encomendar à Europa todo o tipo de ornamentos e contratar estrangeiros como artífices, cabendo apenas ao seu povo e à sua pátria os trabalhos braçais e o fornecimento de matérias-primas básicas, como a pedra. 4. A displicência do rei é visível na distribuição desigual dos bens, pois canaliza-os maioritariamente para a Igreja, negligenciando a miséria em que o povo se encontrava. É visível também no facto de, apesar dos avisos do almoxarife sobre a situação financeira do reino, ignorar recomendações feitas e continuar a delapidação da riqueza da coroa. 5. “Se vossa majestade me perdoa o atrevimento” – oração subordinada adverbial condicional; “eu ousaria dizer” − oração subordinante; “que estamos pobres” – oração subordinada substantiva completiva; “e sabemos” – oração coordenada copulativa. 293 Escrita 1. Introdução – Exposição do tema e defesa de um ponto de vista. Desenvolvimento – Apresentação dos argumentos e exemplos (vantagens: melhora as infraestruturas do país – são criadas novas redes viárias, hotéis, estádios…; traz proveitos económicos – há um maior fluxo turístico; desvantagens: o dinheiro investido na organização destes eventos podia ser canalizado para outros setores, como a educação, a saúde ou a investigação científica; o investimento feito pelo Estado é demasiado avultado, sendo de notar que a maior parte dos orçamentos apresenta derrapagens: o Euro 2004 em Portugal ou o Mundial do Brasil em 2014. Conclusão – retoma do tema e fecho. 297 Educação Literária 1. Elementos descomunais: − 400 bois e 600 homens para realizarem a tarefa; − o carro construído para carregar a pedra como uma espécie de nau da Índia; − o peso da pedra (31 toneladas) e a sua dimensão (35 palmos de comprimento, 15 de largura e 4 de espessura) − o transporte conseguido à custa de sofrimento, de sacrifício e de superação humana. 2. O facto de o narrador afirmar que nem o diabo – o protótipo do mal – se tinha alguma vez lembrado de um sacrifício tão grande para punir os pecadores espelha bem o esforço e o sofrimento sobre-humanos a que os trabalhadores foram sujeitos, no desempenho desta tarefa. 2.1 Além do recurso à descrição minuciosa quer da pedra, para que o leitor tenha noção do colosso que ela era, quer do trabalho que os homens tiveram que executar, são utilizados também recursos expressivos: a metáfora – “agora sim, ontem aquilo foi uma brincadeira de rapazes” (l. 65); “o monstro que implacavelmente o arrasta” (l. 68); a construção anafórica – “Seiscentos homens” (cf. ll. 61-76) – , que realçam o esforço hercúleo que uma enorme quantidade de homens teve de fazer para transportar uma enorme pedra de Pero Pinheiro até Mafra. 3. Enquanto Vasco da Gama e os seus marinheiros foram recompensados pelos deuses pela enorme empresa realizada, no célebre episódio da Ilha dos Amores, tendo retornado à pátria envoltos em fama e prestígio, os trabalhadores do convento regressam a Mafra em péssimas condições, sem qualquer tipo de glória ou reconhecimento. 4. Através da enumeração de nomes de A a Z, Saramago pretende destacar o papel preponderante dos trabalhadores na construção do convento, imortalizando-os e conferindo-lhes o verdadeiro mérito, já que a História apenas recorda o promotor da construção – D. João V –, ignorando a importância do povo. Quando os caracteriza como portadores de um conjunto de deficiências, a sua intenção é não só valorizá-los ainda mais pelo esforço empreendido, o que lhes confere o estatuto de heróis, ainda que não possuam as características canónicas para tal, como também demonstrar que a superação dos limites humanos é uma realidade ao alcance de todos. 5. Quando se serve da primeira pessoa do plural e afirma “melhor é julgarmos pelos nossos próprios olhos” (l. 8), o narrador assume o mesmo estatuto que o narratário, demonstrando-se disponível para, com ele, fazer a avaliação sobre a situação que está a ser narrada. 6. Por se sentir revoltado pelo facto de a História só homenagear D. João V na construção do convento, em detrimento dos verdadeiros protagonistas, o narrador utiliza uma expressão popular, típica do português atual – “que se lixam” (l. 77) – como forma de exprimir o seu estado de espírito. Ora, estando ele a relatar acontecimentos ocorridos no séc. XVIII, o narrador pede, pois, perdão pelo facto de não estar a utilizar linguagem própria da época e daí admitir que a sua narração esteja a assumir contornos anacrónicos, ou seja, fora do seu tempo. Este é, aliás, um recurso recorrente em Saramago, como forma de aproximar o narratário do seu universo de referência – o séc. XX. 7. Tendo ouvido falar de um ermitão, uma rainha que vivia insatisfeita quis ir visitá-lo para saber o que poderia fazer uma mulher da sua condição para deixar de se sentir apenas rainha e se sentir também mulher. O ermitão e a rainha acabam por fugir, na expetativa de se fazerem/sentirem verdadeiramente homem e mulher. 7.1 A história acaba por refletir, por um lado, a frustração da rainha D. Maria Ana Josefa por viver apenas em função do seu estatuto real, nunca chegando a sentir-se verdadeiramente mulher – veja-se a propósito a relação protocolar que mantém com o marido, sem amor, nem entrega; por outro lado, realçar o papel dos trabalhadores que transportaram a pedra que, tendo-se superado, atingem a verdadeira essência do que é ser homem e apenas dessa forma se notabilizam. 8. Através das palavras proferidas pelo frade, o narrador põe em evidência a manipulação da Igreja em relação aos seus fiéis, uma vez que se afirma que os trabalhos e sacrifícios passados durante a construção seriam recompensados com a vida eterna. 9. a. Posterioridade. b. Anterioridade. c. Simultaneidade. 9.1 Trata-se de um narrador participante, que está a observar in loco o desenrolar da ação, daí a simultaneidade. 10. Sonorização. 298 Leitura 1. a. O presidente da República defende a tese de que Portugal é o seu povo. Apresenta os seguintes argumentos: – o povo “não vacila, não trai, não se conforma, não desiste”; “A sabedoria hoje como há nove séculos reside no povo”; “quando a pátria é posta à prova, é sempre o povo quem assume o papel determinante”; “O povo, sempre o povo, a lutar por Portugal, mesmo quando algumas elites […] nos falharam”. Estes argumentos são corroborados pelos exemplos de determinação, coragem e sacrifício do povo, na conquista do território, no apoio ao Mestre de Avis, na Restauração da Independência, na resistência às invasões, na instauração da República, na queda da ditadura e nos momentos de crise económica atravessados pelo país; b. o caráter persuasivo e a eloquência são visíveis no uso da primeira pessoa do plural (“celebramos”), como forma de envolver o auditório, e na utilização de recursos expressivos como a anáfora (“Foi o povo”) ou a enumeração (“ele não vacila, não trai, não se conforma, não desiste”, l. 7), que enfatizam a importância e as qualidades do povo português. No que respeita ao conteúdo, o tom persuasivo resulta da convocação do passado, como forma de reforçar o papel determinante do povo, ao longo de nove séculos; c. o discurso evidencia uma dimensão social, pois o presidente enaltece aquele que considera ser o verdadeiro protagonista da História de Portugal – o povo –, valorizando assim esta classe social. 2. É evidente que os autores de Memorial do convento e da Crónica de D. João I pretendem enaltecer as qualidades do povo, elegendo-o assim como o verdadeiro protagonista de determinados acontecimentos históricos e fazendo sobressair as suas capacidades de privação, de sacrifício, de determinação e de audácia. Assim o faz também o presidente da República no discurso proferido, ao declarar e comprovar que “Portugal é o seu povo”. 301 Educação Literária 1. O absolutismo do rei é evidente: − na maneira como se serve do seu poder para expressar as ordens, sejam elas razoáveis ou não (“É minha vontade que seja construída na corte uma igreja como a de S. Pedro de Roma”, ll. 2-3, ou “Sejam trezentos, não se discute mais, é esta a minha vontade”, l. 38, ou ainda “Então é nesse dia que se fará a sagração da basílica de Mafra, assim o quero, ordeno e determino”, ll. 54-55); − na forma caprichosa como impõe a data da inauguração do convento, ainda que seja alertado para o atraso das obras; − no modo como obriga os homens válidos de todo o país a irem trabalhar à força para Mafra. A sua megalomania é visível: − na vontade de construir uma obra da envergadura da basílica de S. Pedro; − na decisão de aumentar a capacidade do convento para 300 frades, quando viu frustrada a sua primeira intenção. 2. (1) Pela forma como o narrador faz contrastar a megalomania e o absolutismo do rei com a enorme fraqueza que D. João V deixa transparecer relativamente ao medo de morrer (não usufruindo da sua obra), o que conduz a uma certa inveja dos seus descendentes. (2) Na forma como é conduzido pelo arquiteto a uma decisão que não planeava e que assume como sendo sua desde o início. 3.1 Em ambos os casos, estamos na presença de homens velhos, que simbolizam a experiência de vida, um de aspeto venerando, o outro visto como um labrego, que se insurgem contra o que estão a presenciar. No caso de Os Lusíadas, o velho manifesta-se contra a empresa marítima, por considerar que o país fica votado ao abandono, em prol da fama, da glória e de uma ambição desmedida. No caso do Memorial do convento, o envio forçado de trabalhadores para Mafra faz o "labrego" insurgir-se contra a vaidade e prepotência do rei. 3.2 As diferenças servem para sublinhar não só a importância de cada uma das empresas – uma grandiosa, e daí o velho ter um aspeto venerando, a outra medíocre, por ser o resultado de um capricho, e, por isso, é denunciada por um labrego – mas também o período de censura e obscurantismo que se vivia na época de D. João V, que, sendo um rei absoluto, concentrava em si todos os poderes, infligindo grandes males ao povo. Por essa razão, ao contrário do que acontece em Os Lusíadas, em que o velho tem liberdade para discursar, no Memorial o labrego é abatido. 3.3 Paródia. 4. Trata-se da enumeração, que serve para evidenciar um conjunto de artistas mundialmente famosos a que Ludovice se refere como forma de criticar aquela que entende ser a falta de sensibilidade do rei em relação à criação artística. 5. Neste segmento textual, no relato que faz, o narrador recorre, por um lado, ao discurso direto, quando dá a conhecer a conversa estabelecida entre o rei e Ludovice, (“É minha vontade que seja construída na corte uma igreja como a de S. Pedro de Roma”, ll. 2-3). Recorre, por outro lado, ao discurso indireto livre quando nos transmite o pensamento do arquiteto sobre a intenção manifestada por D. João V (“este rei não sabe o que pede, é tolo, é néscio, se julga que a simples vontade, mesmo real, faz nascer um Bramante […] que Deus me livre dessa”, ll. 8-18). 302 Informar 1. Em Memorial do convento, assistimos à crítica da vaidade e da prepotência de um rei cheio de caprichos que gere de forma negligente os bens do reino. Não se coíbe, por isso, de delapidar a riqueza do país para construir um convento sumptuoso, ignorando as necessidades e fraquezas do seu povo que vivia na miséria. Assiste-se ainda à denúncia da ligação perversa entre o poder da coroa e da Igreja, que também detinha um estatuto absoluto. Ambos exerciam um enorme controlo sobre um povo ignorante, nomeadamente através da manipulação religiosa e da perseguição daqueles que não comungavam da mentalidade da nobreza e do clero. 303 Educação Literária 1. a. Excerto 3 b. Excerto 4 c. Excerto 1 d. Excerto 2 305 Educação Literária 1. Ainda que no Entrudo se assista a uma baixeza moral e comportamental (“sovaram-se incautos com réstias de cebolas, bebeu-se vinho até ao arroto e ao vómito”, ll. 7-8), de um povo ignorante que vivia na miséria (“esta cidade, mais que todas, é uma boca que mastiga de sobejo para um lado e de escasso para o outro”, ll. 1-2), é durante a procissão da Quaresma que se acentua a rudeza (de uma população que vivia castrada e manipulada pela ideia de um Deus castigador), o obscurantismo e a hipocrisia religiosa. A procissão da penitência tem como finalidade (ainda que não seja sincera) o castigo do corpo e a autoflagelação (os penitentes seguem de grilhões enrolados às pernas, suportam sobre os ombros grossas barras de ferro, desferem chicotadas; os homens e as mulheres arranham a cara e dão-se bofetões), enquanto “o bispo vai fazendo sinaizinhos da cruz para este lado e para aquele” (ll. 22-23). No entanto, tal como afirma Maria Joaquina Júlio, estas manifestações revelam muito pouco de devoção. São espetáculos de sadomasoquismo, delirantes e orgiásticos para quem se flagelava e para quem assistia, como o comprova o facto de haver penitentes que “clamam estrepitosamente, tanto pelos motivos que a dor lhes dá como de óbvio prazer, que não compreenderíamos se não soubéssemos que alguns têm os seus amores à janela e vão na procissão menos por causa da salvação da alma do que por passados ou prometidos gostos do corpo” (ll. 32-35). Quanto às mulheres, assistem à procissão nas janelas, excitadas pelo sofrimento dos homens. Quanto mais violenta for a vergastada do seu amado, maior será a sensação de prazer (“enquanto latejam por baixo das redondas saias, e apertam e abrem as coxas segundo o ritmo da excitação e do seu adiantamento.”, ll. 48-50). Esta é ainda uma altura que permite a prevaricação e a luxúria das mulheres que, a pretexto de irem à igreja, têm encontros furtivos com homens. 306 Compreensão do Oral 1. [A] – [7] [B] – [9] [C] – [10] [D] – [8] [E] – [11] [F] – [6] [G] – [2] [H] – [12] [I] – [14] [J] – [3] [K] – [13] [L] – [5] [M] – [4] [N] – [1] 307 Educação Literária 1. A ação decorre por ocasião da Guerra da Sucessão espanhola que se desenrolou entre 1702 e 1714, na altura em que reinava em Portugal D. João V, que foi proclamado rei em 1706, tendo o seu reinado durado 44 anos. 2. Baltasar Mateus surge em cena como um soldado esfarrapado e descalço, a viver da caridade, que se viu obrigado a abandonar a Guerra da Sucessão espanhola por ter perdido a mão esquerda. É um homem solitário, cuja família é de Mafra; é desenvolto, destemido e corajoso, já que se atreve a percorrer os caminhos sozinho, acabando mesmo por matar um homem em legítima defesa. Por meio da figura de Baltasar, o narrador põe em evidência o sofrimento da classe mais desfavorecida – o povo – às mãos dos caprichos dos poderosos. Baltasar, que, como se disse, perdera a mão esquerda ao serviço da pátria, numa guerra que nada tinha que ver com Portugal, vê-se abandonado pela própria nação. 3.1 A proximidade do narrador é visível no recurso ao deítico espacial “este” e ao deítico temporal “agora”, que presentificam o momento de enunciação do narrador, e ainda no uso do presente do indicativo “parece”, “é”. 3.2 Esta atitude de proximidade justifica-se pelo facto de o narrador mostrar simpatia por aqueles que são mais desfavorecidos, ou não fosse o objetivo de Memorial do convento homenagear o povo sofrido e valeroso. 3.3 O narrador adota a primeira pessoa do plural quando se refere ao povo português, por dele se sentir parte integrante. 4. Por duas vezes, o narrador serve-se da prolepse para antecipar acontecimentos. Primeiro, fá-lo, em relação ao desfecho da Guerra da Sucessão, numa altura em que esta ainda decorria; depois revela que, num futuro próximo, Baltasar matará um homem que tentou assaltá-lo. Recorre, ainda, à analepse, quando dá conta da batalha em Jerez de los Caballeros, ocorrida um ano antes. 5. A sequência textual predominante no primeiro parágrafo é de natureza explicativa, uma vez que o narrador pretende esclarecer o leitor sobre as razões e as circunstâncias que levaram Baltasar a ser dispensado do exército, bem como sobre as condições de vida experienciadas pelo ex-soldado. 6. Valor perfetivo. 7. Coesão gramatical (referencial). 8. Modalidade epistémica (valor de certeza). 310 Educação Literária 1. A opressão sobre o povo era concretizada na perseguição aos que tinham um credo diferente, aos que não respeitavam os dogmas da Igreja, aos acusados de práticas de feitiçaria e ainda aos que apresentavam comportamentos sexuais desviantes. De acordo com a gravidade da acusação, os condenados eram degredados ou queimados numa fogueira. 2.1 O povo é visto como ignorante e sanguinário porque, não compreendendo a opressão e a perseguição que a Igreja exercia sobre os mais desprotegidos, se regozija e se excita com a violência infligida aos seus semelhantes, no decurso dos autos de fé, vividos como um momento festivo. 2.2 O narrador serve-se da prolepse quando afirma “nunca se chegará a saber de que mais gostam os moradores, se disto, se das touradas, mesmo quando só estas se usarem” (ll. 9-11). Esta observação, que serve para denunciar a caráter sanguinário do povo, contribui também para destacar e criticar a violência ainda hoje presenciada nas touradas portuguesas. 3. Ironia. Ao referir que Domingos Afonso Lagareiro tinha sido condenado por ter visões e curar enfermos, o narrador ironiza esta condenação, evocando a figura de Jesus Cristo, que partilhava dos mesmos dons e é o responsável pela existência do cristianismo, o que não deixa de resultar numa situação paradoxal. 4. Quando apresenta a mãe de Blimunda (Sebastiana de Jesus), o narrador permite que ela se assuma como voz enunciativa, falando, por isso, na primeira pessoa. 5. Blimunda tem dezanove anos e é filha de Sebastiana de Jesus, que foi condenada ao degredo pela Santa Inquisição por ter “visões e revelações”. É uma mulher forte já que, para sua própria defesa, não revela quaisquer sentimentos quando vê a mãe pela última vez. No entanto, quando está em casa, chora copiosamente, assim demonstrando a sua emotividade e a sua tristeza. Revela-se uma mulher pouco convencional para a época, dado que não se coíbe de perder a virgindade com um homem que acabara de conhecer, assumindo, nessa relação, um papel ativo. Percebe-se ainda que tem poderes sobrenaturais e místicos, uma vez que consegue comunicar telepaticamente com a sua mãe e se benze e faz uma cruz no peito de Baltasar com o sangue da virgindade. Fisicamente, o que mais a distingue são os olhos que vão variando de cor, consoante a luz ou as emoções. 6. É ela quem, telepaticamente, leva Blimunda a perguntar o nome a Baltasar, estabelecendo, assim, o primeiro contacto com aquele homem que se relacionará com ela – “que vai ser deles” (ll. 34-35). 7. É visível (1) no facto de Blimunda ter esperado para comer da mesma colher que Baltasar, situação que o narrador associa à declaração formal de união que ocorre num casamento; (2) no facto de o padre ter abençoado não só a casa e a comida mas também a esteira no chão e o punho cortado de Baltasar; (3) no facto de Blimunda ter feito uma cruz no peito de Baltasar e se ter benzido com o sangue da virgindade, como se estivesse a selar um pacto entre os dois. 8. Por um lado, a relação assume contornos pouco convencionais para a época, na medida em que o casal optou por não legitimar formalmente a sua união, através do casamento, e pelo facto de Blimunda se ter entregado a Baltasar no primeiro encontro. Por outro, este casal dá mostras da vivência de um amor puro, sincero e profundo, visível quer na forma como, estrategicamente, Baltasar se coloca na cama para poder abraçá-la quer na frequência com que tinham relações íntimas, respeitando a vontade e o desejo de um e de outro. 9. O ato sexual dos reis reveste-se de um formalismo ritual, protocolar (os preparativos ou a condução, em jeito de procissão, da rainha pelo rei até à cama), apenas com o objetivo preciso de gerar um herdeiro. Além disso, está isento de qualquer afeto e intimidade, dada a presença de um conjunto de criados. Baltasar e Blimunda, contrariamente, vivem a sexualidade com liberdade, de forma pura e com uma entrega total, decorrente apenas da vontade prazerosa de ambos: “e se a ele apeteceu, a ela apetecerá, e se ela quis, quererá ele” (ll. 94-95). O facto de Blimunda, findo o ato, se benzer e fazer uma cruz com o sangue da sua virgindade no peito de Baltasar traduz o compromisso selado entre ambos a partir daquele dia, um compromisso em que não cabem nem os pensamentos libidinosos da rainha nem as relações adúlteras do rei. 311 Leitura 1.1 [B] 1.2 [C] 1.3 [D] 2. [B], [D], [E], [F] 313 Educação Literária 1. Baltasar esconde o pão de Sete-Luas porque quer, de uma vez por todas, compreender a razão do ritual de Blimunda: todas as manhãs, mal acorda, ela come pão de olhos fechados. 2. Blimunda, a não ser que mude o quarto da lua, possui o dom de ver as pessoas por dentro, quando está em jejum. Por esta razão, e por respeitar Baltasar, jurou que nunca se iria servir daquele dom para o olhar por dentro. 3. Blimunda era constantemente confrontada com visões terríveis e com situações que gostaria de evitar, até porque, como diz, “o que a pele esconde nunca é bom de ver-se” (ll. 48-49). 4. O dom de Blimunda poderá vir a ser confundido com heresia e feitiçaria, situação que a levaria a ter problemas com o Santo Ofício, podendo culminar com um destino semelhante ao de sua mãe, que foi açoitada e degredada. 5. Sete-Sóis soergueu-se na enxerga, incrédulo, e também inquieto: − Estás a mangar comigo?! Ninguém pode olhar por dentro das pessoas. − Eu posso. − Não acredito. − Primeiro, quiseste saber, não descansavas enquanto não soubesses, agora já sabes e dizes que não acreditas, antes assim, mas daqui para o futuro não me tires o pão. − Só acredito se fores capaz de dizer o que está dentro de mim agora. − Não vejo se não estiver em jejum, além disso fiz promessa de que a ti nunca te veria por dentro. − Torno a dizer que estás a mangar comigo. − E eu torno a dizer que é verdade. − Como hei de ter a certeza? − Amanhã não comerei quando acordar. Sairemos depois de casa e eu vou-te dizer o que vir, mas para ti nunca olharei, nem te porás na minha frente. Queres assim? − Quero – respondeu Baltasar – mas diz-me que mistério é este? Como foi que te veio esse poder, se não estás a enganar-me… − Amanhã saberás que falo verdade. 6. (“que o era”): água de batismo; (“quando o senti”): sangue da virgindade. 7. Valor causal. 313 Escrita 1. São considerados fenómenos paranormais aqueles que a ciência não consegue explicar, ou cuja explicação supera os limites desta, ou que resultam de situações não expectáveis. Podem ter várias causas e não dependem da cultura, da educação ou do QI. Frequentemente, são associados a superstições, a ansiedade ou a más interpretações da realidade. (50 palavras) 316-317 Educação Literária 1. O padre Bartolomeu, fazendo uso das relações privilegiadas que tinha no Paço, foi informar-se de uma possível pensão de guerra destinada aos soldados feridos na Guerra da Sucessão espanhola. 2. Bartolomeu Lourenço era conhecido como o Voador por ter feito voar um balão, mais do que uma vez. 3. Bartolomeu Lourenço sente-se humilhado com essa alcunha, porque sabe que ela lhe foi atribuída por malícia, já que tinha havido muita gente a ridicularizar os seus inventos. 4. A enumeração, a gradação e a metáfora presentes neste segmento servem para ilustrar a evolução humana, que acontece paulatinamente, por etapas, e à custa da constante persistência, apesar dos eventuais percalços. 5. Primeiro, o padre tenta persuadi-lo de que com uma mão e um gancho poderá fazer tudo o que quiser, até porque “um gancho não sente dores se tiver de segurar um arame ou um ferro, nem se corta, nem se queima” (ll. 42-43); depois, advoga que Deus é maneta, por não haver ninguém que se sente à sua esquerda, e mesmo assim fez o universo. Este argumento acaba por ser decisivo quanto ao intento do padre. 6.1 A alusão ao bicho da terra, forma como Camões se refere à fragilidade humana por estar à mercê de um conjunto de contrariedades inerentes à vida, serve para salientar a necessidade sentida pelo ser humano de progredir e evoluir, para poder dar resposta às adversidades ou limitações que lhe são impostas pela sua natureza. 7. Esse cruzamento é visível no facto de o padre declarar que, para os seus inventos, tem contado com a proteção de D. João V, que inclusivamente lhe cedeu a quinta do duque de Aveiro, em S. Sebastião da Pedreira, para que pudesse continuar a fazer as suas experiências. 8. Blimunda serve-se do seu dom (de conseguir ver as coisas por dentro), para fazer a vistoria aos materiais usados na construção da passarola e perceber, assim, as fraquezas/ defeitos da construção. 9. O batismo do padre salienta a vidência de Blimunda ao mesmo tempo que reforça a complementaridade existente entre ela e Baltasar. 10. O padre Bartolomeu Lourenço decide partir para a Holanda, com o intuito de descobrir a forma de fazer descer o éter do espaço, já que sem ele a passarola não podia voar. 11. O padre Bartolomeu revela ser um homem influente e, por isso, tenta interceder por Baltasar relativamente à pensão de guerra a que este teria direito. Era apelidado, de forma jocosa, “o Voador”, por ter feito voar balões no Paço. No entanto, o seu projeto é apadrinhado pelo rei D. João V, que lhe cedeu a quinta do duque de Aveiro, em S. Sebastião da Pedreira. É um homem sonhador, que acredita no progresso e na evolução da humanidade e que se revela como o mentor de uma invenção: construir uma máquina que permita ao homem voar. Demonstra ser um padre pouco convencional, já que se interessa por artes ocultas (travou conhecimento com a mãe de Blimunda) e profere afirmações, como “maneta é Deus, e fez o universo”, que seriam consideradas heresia por parte da Igreja. É ainda um homem persuasivo quando convence Baltasar a participar no seu projeto. É persistente e, por isso, está disposto a partir para a Holanda para descobrir o segredo do éter. 12. A relação entre eles alicerça-se não só na profunda amizade que os une (veja-se que na despedida prescindiram da formalidade a que o estatuto do padre obrigava e acabam por se abraçar os três) mas também na confiança mútua. Esta harmonia e forte ligação estão espelhadas nos seus próprios nomes, dado começarem todos pela mesma letra do alfabeto. 13. [A] 14. [B] 15. [D] 16. [C] 317 Compreensão/Expressão Oral 1.1 A canção versa sobre a importância do sonho para a evolução e o desenvolvimento humanos. Sem ele, o Homem não teria progredido nem realizado missões como a descoberta dos mares ou da superfície lunar. 1.2 Comparação – “como esta pedra cinzenta / em que me sento e descanso”. Metáfora – “que em verde e oiro se agitam”. Enumeração – “é tela, é cor, é pincel, / base, fuste, capitel”. 1.3 Da mesma forma que o sujeito lírico afirma que é o sonho que comanda a vida e que é ele o promotor da evolução humana, visível, por exemplo, em inventos ou em manifestações artísticas, também o padre Bartolomeu declara a importância do sonho, afirmando que a necessidade, aliada à vontade humana, fez o Homem progredir ao longo dos tempos, levando-o a ambicionar chegar cada vez mais além. 2.1 Poderão ser abordados, entre outros, os seguintes aspetos: − quer Fernando Pessoa quer Saramago destacam na sua obra a importância do sonho, como força motora capaz de levar o homem a superar-se e a progredir. Mensagem Foi o sonho, aliado à vontade, que levou os portugueses a aventurarem-se nos mares desconhecidos e a construírem um Império, e serão eles – sonho e vontade – que poderão resgatar Portugal do estado de letargia em que se encontra. Exemplos: “E a nossa grande raça partirá em busca de uma Índia nova, que não existe no espaço, em naus que são construídas daquilo de que os sonhos são feitos”, “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”; “Triste de quem vive em casa, / Contente com o seu lar, / Sem que um sonho, no erguer de asa, / Faça até mais rubra a brasa / Da lareira a abandonar!” Memorial do convento Foi o sonho do padre, juntamente com as duas mil vontades recolhidas por Blimunda (e que representam a vontade humana), que levou a passarola a voar. Exemplos: “Esse gancho que tens no braço não o inventaste tu, foi preciso que alguém tivesse a necessidade e a ideia, que sem aquela esta não ocorre, juntasse o couro e o ferro, e também estes navios que vês no rio, houve um tempo em que não tiveram velas, e outro tempo foi o da invenção dos remos, outro o do leme, e, assim como o homem, bicho da terra, se fez marinheiro por necessidade, por necessidade se fará voador”; “é portanto a vontade dos homens que segura as estrelas, é a vontade dos homens que Deus respira”. 319 Educação Literária 1. O padre tenciona retornar a Coimbra para prosseguir os seus estudos teológicos e se sagrar doutor. 2. O padre ficou a saber que, antes de subir aos ares, o éter vive dentro dos homens e das mulheres, sob a forma de uma nuvem fechada, que mais não é do que a vontade dos vivos e que se pode separar do homem ainda em vida ou na hora da sua morte. 3. Para que o mundo possa evoluir e os projetos se possam concretizar, torna-se imprescindível que os homens manifestem vontade de o fazer. Sem ela, nada acontece nem se realiza. 4. Blimunda foi incumbida de recolher as vontades que se desprendessem dos homens (duas mil no total). Para tal, deveria usar um frasco com uma pastilha de âmbar amarelo que possuía a faculdade de atrair o éter. 5. O padre tem esta atitude porque chegou a temer ter perdido a vontade, quando, numa primeira tentativa, Blimunda nada viu dentro dele. Ele tem plena consciência de que, sem ela, o seu projeto de voar nunca se concretizaria. 6. A adoção de um novo nome espelha uma sociedade mesquinha, que valoriza os títulos em detrimento da essência do ser humano e que distingue os seus membros em função do seu estatuto. 321 Educação Literária 1. Trata-se de um músico italiano, nascido em Nápoles, que foi contratado para ensinar a infanta D. Maria Bárbara a tocar cravo. É um homem com boa figura, “rosto comprido”, “boca larga e firme” e “olhos afastados” (l. 8). 2. O padre começa a duvidar de um dos dogmas mais importantes da Igreja Católica – a Santíssima Trindade. Este dogma defende que, apesar de Deus ser uno em essência, é trino em pessoa, ou seja, Deus é uma unidade composta pelo Pai, pelo Filho e pelo Espírito Santo. A razão para esta dúvida decorre, por um lado, do facto de ter concluído, durante a conversa com Scarlatti, que Pilatos e Jesus eram iguais. Por outro lado, o facto de se ter sentido da mesma carne e do mesmo sangue de uma gaivota levou-o a concluir que participavam todos da mesma essência de Deus e que, por isso, Ele só podia ser um e estar presente em cada uma das coisas que criou. 3. Depois de ter ido à abegoaria, onde viu a passarola e conheceu Baltasar e Blimunda, Scarlatti faz uma analogia entre os três e o mistério da Santíssima Trindade: o padre, enquanto mentor do projeto, identificar-se-ia com o Pai; Baltasar, enquanto executor da vontade de Bartolomeu, com o Filho; Blimunda, por estar incumbida de uma missão com contornos transcendentais, com o Espírito Santo. 321 Expressão Oral Poderão ser tratados, entre outros, os seguintes aspetos: − ao longo dos séculos, a religião constituiu-se como um entrave ao desenvolvimento e ao progresso: veja-se, por exemplo, a condenação à fogueira de Copérnico, por defender que a Terra girava em torno do Sol, ou o conjunto de conhecimentos que, durante séculos, a Igreja impediu que fossem divulgados; − na atualidade, há investigações científicas que a Igreja condena, como a clonagem humana; − um crente defende ideias incompatíveis com a ciência, como a crença de que foi Deus a conceber o Universo, quando a ciência defende a teoria do Big Bang; − o Vaticano promove a investigação científica: por exemplo, na área da astronomia; − ao longo dos séculos, houve várias figuras religiosas com contributos importantes na área da ciência: veja-se o caso de Rogério Bacon, que inventou o telescópio; − um crente consegue facilmente conciliar a religião com a ciência, aceitando, por exemplo, que a história de Adão e Eva seja uma metáfora do início da humanidade. 323 Educação Literária 1. Blimunda caiu doente, perdendo momentaneamente a sua própria vontade, ficando apática e num estado de letargia, provavelmente por ter atingido um estado de extrema exaustão, causado pelo confronto com visões terríveis, e por ter estado constantemente em contacto com a morte. 2. O padre considerava-se responsável pelo estado de Blimunda, por a ter incumbido de recolher vontades junto dos moribundos e, por isso, sentia-se com remorsos e arrependido. 3. Blimunda recupera progressivamente graças à música do cravo tocada por Scarlatti. Esta situação poderá justificar-se pelo facto de a música ter a faculdade de despertar emoções no ser humano. Ora, estando Blimunda num estado de letargia, a música poderá ter funcionado como um estimulante para resgatar a vontade que estaria “refugiada em confins inacessíveis do corpo” (l. 42), fazendo-a regressar à vida. 4. Por causa das dúvidas que o começaram a assaltar acerca dos dogmas da Igreja Católica, o padre recusa-se a abençoar Baltasar e Blimunda, por já não saber “em nome de que Deus” (l. 78) o faria. Por outro lado, quando propõe que eles se abençoem um ao outro, afirmando que “pudessem ser todas as bênçãos como essa” (ll. 79-80), o padre acaba por sugerir que, mais do que em qualquer religião, a humanidade poderá atingir a plenitude se se deixar reger pelo amor. 325 Educação Literária 1. O padre estava aterrorizado por saber que o Santo Ofício andava à sua procura. 2. As palavras do padre enfatizam as situações de terror a que qualquer pessoa estava sujeita no século XVIII por causa do Santo Ofício. Assim, quando afirma que, muitas vezes, o homem é confrontado com o inferno ainda em vida, está na verdade a referir-se às fogueiras a que eram sujeitos tantos condenados pela Inquisição. 3. A ridicularização é visível no facto de os habitantes de Mafra que testemunharam o voo terem acreditado que se tratava de uma aparição do Espírito Santo, com o intuito de abençoar as obras do convento. Este episódio serve o propósito de demonstrar a fragilidade e a falsidade de muitas situações que a Igreja Católica considerava como milagres, constituindo assim uma crítica aos dogmas da Igreja. 4. A passarola constitui-se como um bem em prol do desenvolvimento humano, ao passo que o convento é apenas um símbolo da vaidade e da prepotência de um rei. Para a construção da máquina voadora foram necessárias apenas três pessoas, movidas pela vontade e pelo sonho; em contraste, as obras do convento obrigaram a um trabalho hercúleo e de sofrimento por parte de milhares de trabalhadores. Ambas as construções são finalizadas, mas só a do convento subsistiu, situação que traduz, por um lado, o poder da Igreja e o absolutismo do rei e, por outro, a opressão do povo. 327 Educação Literária 1. A premonição da tragédia por parte de Blimunda é visível não só nos conselhos que dá a Baltasar para que tenha cuidado na vistoria que irá fazer à passarola, mas, sobretudo, quando afirma “Não sossego, homem, os dias chegam sempre” (l. 9). 2. O reencontro de Blimunda com Baltasar pode ser visto como o coroar de um esforço: uma recompensa pelo facto de Sete-Luas, durante nove anos, ter procurado incansavelmente Sete-Sóis. Ao mesmo tempo, o facto de esse reencontro ter ocorrido na sétima vez em que a personagem passava por Lisboa sugere a renovação e a completude da ligação entre os dois, já que Blimunda se une novamente a Baltasar, recolhendo a sua vontade. 3. Foi a voz que Blimunda parecia ouvir que a aconselhou a manter-se em jejum. Se assim não fosse, Blimunda não poderia ter recolhido a vontade de Baltasar e ficar permanentemente ligada a ele. 4. Apesar de, fisicamente, Baltasar e Blimunda se virem obrigados ao afastamento, dado que Baltasar morre queimado na fogueira, espiritualmente o amor e a união entre os dois mantém-se, pelo facto de Blimunda ter acolhido dentro de si a vontade de Baltasar, o que sugere que, enquanto viver, Sete-Luas estará sempre acompanhada de Sete-Sóis. 5. A circularidade é visível no facto de a terceira linha de ação finalizar praticamente da mesma forma como se inicia: Blimunda (re)encontra Baltasar num auto de fé no Rossio. 6. “Teria de substituí-las, trazer os materiais necessários, demorar-se aqui uns dias, ou então, só agora lhe ocorria a ideia, desmontar a máquina peça por peça, transportá-la para Mafra escondê-la debaixo duma parga de palha, ou num dos subterrâneos do convento, se pudesse combinar com os amigos mais chegados, confiar-lhes metade do segredo” (ll. 14-18). 7. Noturno, notívago. 329 Informar 1. A relação de Baltasar e de Blimunda pauta-se pelo amor profundo e verdadeiro: efetivou-se sem os formalismos do casamento; manifesta-se a todo o instante; perdura além da morte. Contrariamente, a relação do rei e da rainha caracteriza-se pelo formalismo e pelo convencionalismo. Nesta relação está ausente a intimidade, a cumplicidade e a pureza do sentimento – a rainha sonha com outros homens, e o rei dorme com outras mulheres. Através do contraste entre o par fictício e o par histórico da obra, o autor pretende realçar a nobreza de sentimentos e atitudes das classes mais desfavorecidas. Poderá também evidenciar a opressão política e religiosa a que estavam sujeitas estas classes, já que os dois amantes se veem forçados a separar-se fisicamente após a morte de Baltasar. 330 Informar 1. [A] – [6] [B] – [8] [C] – [5] [D] – [1] [E] – [7] [F] – [3] [G] – [4] [H] – [2] 331 Informar 1. O tempo histórico é aquele que é evocado pela ação e que se circunscreve a uma determinada época. No caso de Memorial do convento, a ação situa-se no século XVIII, no reinado de D. João V. O tempo da narrativa diz respeito ao tempo de duração da ação: 28 anos, desde 1711 até 1739. 335 Verificar 1. a. F − O objetivo é Resgatar da sombra aquele que Saramago considera ser o verdadeiro herói e protagonista da construção do convento: o povo. b. F − As linhas de ação entrecruzam-se a cada passo, conferindo unidade à obra. c. V d. F − Foi Sebastiana de Jesus quem telepaticamente deu essa indicação à filha. e. F − Blimunda recolhe a vontade de Baltasar para que a união entre eles se mantenha, enquanto ela viver. f. F − O papel de Blimunda foi extremamente importante, pois, sem a recolha das vontades por ela protagonizada, a passarola nunca teria voado. g. F − É no entender de Scarlatti que Baltasar, Blimunda e Bartolomeu Lourenço formam uma trindade terrestre. h. F − É na cura de Blimunda que Scarlatti tem um papel preponderante. i. F − O episódio assume contornos heroicos pela força hercúlea que os homens tiveram de despender, pelo sofrimento causado e pela superação humana. j. F − O tempo da narrativa é o que decorre de 1711 a 1739. k. V l. V m. F − Denuncia sobretudo a opressão do povo em face dos caprichos dos poderosos. n. F − Constitui-se como um ciclo perfeito e acabado (7x4) e corresponde ao tempo da duração da ação. o. V p. V q. V r. F − Saramago usa apenas dois sinais de pontuação: o ponto final e a vírgula. s. V 4