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CADERNO_TEXTO_LEGISLACAO_SUS_2019 pdf GESP

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CADERNO TEXTO 
 
www.cursosgesp.com 1 
SUMÁRIO 
 
 TEXTOS 
 
Página 
POLÍTICAS E SISTEMAS DE SAÚDE NO BRASIL: RETROSPECTIVA HISTÓRICA 02 
MOVIMENTO DA REFORMA SANITÁRIA 16 
MODELOS DE ATENÇÃO 20 
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 32 
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 42 
LEI 8.080 DE 19 DE SETEMBRO DE 1990 46 
LEI 8.142 DE 28 DE DEZEMBRO DE 1990 62 
CONTROLE SOCIAL: RESOLUÇÃO 453/2012 64 
PLANEJAMENTO NO SUS: PORTARIA Nº 2.135/2013 69 
PACTO PELA SAÚDE 2006 73 
DECRETO Nº 7.508 DE 28 DE JUNHO DE 2011 88 
LEI COMPLEMENTAR Nº 141 DE 13 DE JANEIRO DE 2012 94 
 FINANCIAMENTO DO SUS: PORTARIA N 3.992/2017. 105 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
www.cursosgesp.com 2 
POLÍTICAS E SISTEMA DE SAÚDE NO BRASIL: 
RETROSPECTIVA HISTÓRICA 
 
A área de estudos e de produção de conhecimentos conhecida como Política de 
Saúde passou a ter visibilidade, como disciplina acadêmica e âmbito de intervenção social, 
na Segunda metade do século XX. A criação da Organização Mundial de Saúde (OMS) em 
1946, vinculada ao sistema das Nações Unidas (ONU), pode ser considerada uma das 
referências para a conformação dessa disciplina (Ferrara et al., 1976). Isso não significa 
que antes dessa época os países prescindissem de executar políticas de saúde ou que 
faltassem estudos contemplando essa matéria. Apenas deve-se ressaltar que não havia um 
campo de saber sistematizado nem um conjunto de fundamentos, métodos e técnicas 
capazes de auxiliar a intervenção. 
Na realidade, a preocupação com a saúde das populações e a adoção de medidas 
governamentais visando ao controle sanitário existe desde a Antiguidade. Do mesmo modo, 
estudos históricos sobre Saúde Pública e Medicina (Rosen, 1980, 1994; Foucalt, 1981) dão 
conta de parte expressiva do desenvolvimento das intervenções sanitárias nos países 
europeus e na América do Norte, antes mesmo da Revolução Industrial. O aparecimento da 
Medicina Social no século XIX, ao ressaltar que a saúde do povo representa um objeto de 
inequívoca responsabilidade social e que as medidas para promover a saúde e conhecer a 
doença deveriam ser tanto sociais como médicas (Rosen,1980), indicava certas relações 
entre saúde e sociedade e, consequentemente, as ações sociais organizadas. Inclusive 
através do Estado. 
Na América Latina, o desenvolvimento da Saúde Coletiva, a partir da década de 70 
do século XX (Donnângelo, 1983; Ribeiro, 1991), retomou os princípios básicos da Medicina 
Social e aprofundou a análise das relações entre a saúde e a estrutura das sociedades, com 
ênfase na dinâmica das classes e dos movimentos sociais diante do Estado. Nessa época, 
países desenvolvidos e organismos internacionais já constatavam a crise do setor saúde e 
propunham a organização de sistemas, o planejamento e a formulação de políticas de 
saúde (OPS/OMS, 1972; CPPS/OPS, 1975; OPS/CLAD, 1988). 
Caminhos alternativos de reflexão e de intervenção foram sendo delineados por 
instituições acadêmicas de Saúde Coletiva na América Latina e por grupos críticos de 
alguns países centrais que constituíram distintas entidades, tais como o Centro Brasileiro 
de Estudos de Saúde (CEBES), a Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva 
(Abrasco), a Associação Latino-americana de Medicina Social (Alames) e a Associação 
Internacional de Política de Saúde (IAHP). 
 No Brasil, a partir das reflexões pioneiras sobre Política de Saúde (Mello, 1977) 
foram realizadas as primeiras investigações acadêmicas nesse campo disciplinar 
(Donnângelo, 1975; Luz, 1979; Braga; Goes de Paula, 1981). Simultaneamente, diante da 
crise do autoritarismo e da dívida sanitária herdada do “milagre brasileiro” (1968-1973), o 
Estado implementou, no Governo Geisel (1974-1979), um conjunto de programas especiais 
e campanhas, propôs a criação de Sistema Nacional de Saúde (CNS, 1975) e, durante a VI 
Conferência Nacional de Saúde (CNS, 1977). Um documento técnico voltado para a 
formulação de política de saúde (CPPS/OPS, 1975) serviu de referência para um dos textos 
desse evento (CNS, 1977). No âmbito acadêmico, diversas instituições de Saúde Coletiva 
modificaram seus planos de estudo e linhas de investigação de modo que, atualmente, 
ministram a disciplina Política de Saúde, realizam pesquisas e cooperação técnica nessa 
matéria, além de apresentarem seus produtos em congressos científicos (Abrasco, 2000). 
O presente capítulo tem como objetivo apresentar Política de Saúde como 
disciplina acadêmica e âmbito de intervenção social, descrevendo o seu desenvolvimento 
no Brasil em distintas conjunturas. 
 
www.cursosgesp.com 3 
ASPECTOS CONCEITUAIS 
 
A expressão Política de Saúde abrange tanto as questões relativas ao poder em 
saúde (natureza, estrutura, relações, distribuição e lutas) como as que dizem respeito ao 
estabelecimento de diretrizes, planos e programas de saúde. Assim, Política de Saúde no 
discurso oficial pode significar diretrizes e plano de ação, porém, enquanto disciplina 
acadêmica do campo da Saúde Coletiva, abrange tanto o estudo das relações e do 
exercício do poder como, também, a formulação e a condução de políticas de saúde. 
Desse modo, existem pelo menos três concepções subjacentes às definições de 
Políticas de Saúde: (a) um conjunto de princípios, propósitos, diretrizes e decisões de 
caráter geral (Brasil, 1999) voltados para a questão saúde; (b) uma proposta de 
distribuição do poder no setor (Testa, 1992); (c) as formas de intervenção do Estado sobre 
a organização social das práticas de saúde e sobre os problemas de saúde da população 
(Teixeira & Paim, 1994). 
Neste capítulo preferimos definir política de saúde como a ação ou omissão do 
Estado, enquanto resposta social, diante dos problemas de saúde e seus determinantes, 
bem como da produção, distribuição e regulação de bens, serviços e ambientes que afetam 
a saúde dos indivíduos e da coletividade (Paim, 2002). 
No estudo das políticas de saúde são examinadas determinadas conjunturas nos seus 
aspectos econômicos, políticos e culturais. Assim, é possível identificar fatos pelos 
discursos de autoridades, leis, documentos, intervenções, notícias, manifestações de 
entidades ou grupos, etc. A partir dos fatos produzidos procuram-se investigar 
determinantes e consequências, bem como proceder a análises prospectivas, recorrendo a 
diferentes métodos e técnicas. 
 
DESENVOLVIMENTO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL
1 
 
Uma revisão sucinta sobre o desenvolvimento das políticas de saúde no Brasil pode 
contemplar, na história republicana, pelo menos cinco conjunturas: (a) República Velha 
(1880-1930); (b) “Era Vargas” (1930-1964); (c) Autoritarismo (1964-1984); (d) “Nova 
República” (1985-1988); (e) Pós-Constituinte (1989-2002). 
 
a) República Velha (1889-1930) 
 
Nessa conjuntura predominavam as doenças transmissíveis como a febre amarela 
urbana, varíola, tuberculose, sífilis, além das endemias rurais. A ocorrência de epidemias e 
de doenças pestilenciais no início do século XX, ameaçando os interesses do modelo 
econômico agrário-exportador, favoreceu uma resposta do Estado mediante a organização 
de serviços de saúde pública e a realização de campanhas sanitárias. Os trabalhadores do 
campo (maior parte da população brasileira) e da cidade, bem como seus familiares não 
tinham acesso aos serviços de saúde. Diante da doença de um indivíduo, o atendimento 
médico somente era possível para os que podiam pagar ou por intermédio da caridade 
(Paim, 1994). 
Com a República Velha, instalou-se o modo de produção capitalista na sociedade 
brasileira. Os excedentes econômicos gerados pela produção do café no final do Império e 
da escravatura permitiram a implantação dasprimeiras indústrias. Capitais ingleses foram 
aplicados especialmente nos setores de energia e de transporte. Eram criadas as condições 
 
1
 Neste tópico são utilizados alguns trechos do texto didático Determinantes da situação de 
saúde no Brasil a partir da República (Paim, 1994). 
 
 
www.cursosgesp.com 4 
para o capitalismo industrial e a República foi entendida como forma de governo capaz de 
facilitar a nova ordem econômica. 
Ainda assim, a economia era basicamente agrário-exportadora, movida, movida 
pelo capital comercial. Havia um núcleo agrário voltado para o café, a borracha, o açúcar 
e outras matérias-primas, além de um segmento urbano desenvolvendo atividades de 
financiamento, comercialização, transporte, administração e indústria. Na superestrutura 
político-ideológica tinha-se um Estado liberal-oligárquico, representando os interesses 
agrários de São Paulo, Minas (“política café-com-leite”) e do Nordeste (Braga & Goes de 
Paula, 1981). 
De acordo com a ideologia liberal dominante, o Estado só deveria atuar naquilo e 
somente naquilo que o indivíduo sozinho ou a iniciativa privada não pusesse fazê-lo. Em 
princípio, não teria porquê intervir na saúde. Entretanto, com o aparecimento das 
indústrias, as precárias condições de trabalho e de vida das populações urbanas 
propiciaram a emergência de movimentos operários que resultaram em embriões de 
legislação trabalhista (incluindo certa atenção para o trabalho do menor, para a jornada 
de trabalho e para os acidentes) e previdenciária (caixas de aposentadoria e de pensões 
incluindo a assistência médica). A despeito da ideologia liberal, o Estado foi reagindo às 
condições de saúde da população mediante políticas de saúde, normatizando e organizando 
a produção e a distribuição de serviços. 
Diante da epidemia de febre amarela na capital da República, Oswaldo Cruz foi 
convidado pelo Governo Rodrigues Alves para o seu combate, implantando posteriormente 
a vacinação obrigatória contra a varíola. Em 1904 realizou uma reforma na organização 
sanitária ampliando as competências da Diretoria Geral de Saúde Pública e realizou uma 
missão na Amazônia para organizar as ações sanitárias em Manaus (Santos, 1986). 
Entretanto, não era o conjunto de problemas de saúde e carências da população 
que passaram a ser objeto d atenção do Estado, mas aqueles que diziam respeito a 
interesses específicos da economia de exportação (capital comercial): a insalubridade dos 
portos, a atração e retenção de força de trabalho, as endemias rurais e o saneamento 
urbano. Quadros calamitosos como epidemias transformavam-se, eventualmente, em 
demandas políticas e pressionavam a ação estatal no âmbito da saúde. Em nenhum 
instante, no entanto, se configurava a ideia de direito à saúde (Costa, 1985). 
As condições de vida e de trabalho insatisfatórias, porém, propiciaram o 
aparecimento de movimentos sociais urbanos enfrentados pelo Estado como “caso de 
polícia” e, posteriormente, como “questão social”. Esta, vista sob os ângulos da 
previdência e da saúde pública, teve como respostas sociais, respectivamente: a Lei Eloy 
Chaves, organizando as CAP (Caixas de Aposentadorias e Pensões), e a Reforma Carlos 
Chagas, implantando o novo regulamento do Departamento Nacional de Saúde Pública com 
três diretorias (Serviços Sanitários Terrestres, Defesa Sanitária Marítima e Fluvial, 
Saneamento e Profilaxia Rural) e ampliando as suas atribuições (atenção à infância e 
controle da tuberculose, hanseníase e doenças sexualmente transmissíveis) (Braga & Goes 
de Paula, 1981). 
Desse modo, a organização de serviços de saúde do Brasil nessa conjuntura emerge 
de forma dicotômica entre saúde pública e previdência social, separando as ações de 
prevenção e controle de doenças na população, de um lado, e as de medicina individual 
(previdenciária, filantrópica e liberal), de outro. 
 
b) “Era Vargas” (1930-1964) 
 
Verifica-se nesse período um predomínio das doenças da pobreza (doenças 
infecciosas e parasitárias, deficiências nutricionais, etc.) e o aparecimento da chamada 
morbidade moderna (doenças do coração, neoplasias, acidentes e violências). Tem início 
uma transição demográfica com redução da mortalidade e certo envelhecimento da 
população. 
 
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A confluência da crise do café, com problemas de preço no mercado exterior, e da 
crise política da Velha República, em que as diferentes frações da burguesia lutavam pela 
hegemonia, foi enfrentada por um golpe de Estado conhecido como “Revolução de 30”. A 
autonomia relativa adquirida pelo Estado permitiu mudanças nos seus aparelhos e a 
ampliação de suas bases sociais. A acumulação capitalista passa ser realizada 
progressivamente pelo capital industrial, preservando, no entanto os interesses das 
oligarquias agrárias. Instala-se, desse modo, um Estado Nacional possibilitando a 
emergência de uma política nacional de saúde (Luz, 1979), mediante a instalação de 
aparelhos executores de políticas de saúde nos 15 anos da ditadura Vargas. 
A saúde pública passa a Ter a sua institucionalização, na esfera federal, pelo 
Ministério da Educação e Saúde, enquanto a medicina previdenciária e a saúde ocupacional 
vinculavam-se ao Ministério do Trabalho, recém-criado. Portanto, a organização dos 
serviços de saúde no Brasil desenvolveu-se de forma trifurcada no âmbito estatal (saúde 
pública, medicina previdenciária e saúde do trabalhador) e fracionada no setor privado – 
medicina liberal, hospitais beneficentes ou filantrópicos e lucrativo (empresas médicas). 
Assim, a organização dos serviços de saúde não se limitava mais a ação da política 
sanitária e das campanhas que caracterizaram as políticas de saúde da República Velha. A 
educação sanitária passou a ser valorizada e as campanhas de controle de doenças foram 
institucionalizadas, transformando-se em órgãos do Departamento Nacional de Saúde do 
Ministério da Educação e, depois de 1953, da estrutura do Ministério da Saúde. Merecem 
destaques, nesse caso, a incorporação dos serviços de combate às endemias (1941), a 
criação do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) e a instalação do Departamento 
Nacional de Endemias Rurais (1956). Esses organismos transformam-se depois em Fundação 
SESP e em Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (Sucam), fundidos em Funasa 
(Fundação Nacional de Saúde) três décadas depois (Paim, 1994). 
Portanto, as ações do Ministério da Saúde e das Secretarias de Saúde estaduais e 
municipais concentravam-se na execução de campanhas sanitárias e de programas 
especiais (materno-infantil, tuberculose, endemias rurais, hanseníase, etc.) bem como na 
manutenção de centros, postos de saúde e serviços de pronto-socorro, maternidades, 
hospitais específicos de psiquiatria, tisiologia, etc. para onde recorriam os segmentos da 
população não beneficiários da medicina previdenciária e que não podiam pagar pela 
assistência médico-hospitalar particular. 
Para os trabalhadores urbanos com carteira de trabalho assinada, o 
desenvolvimento da Previdência Social realizou-se mediante a organização de vários 
Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAP) por categorias: marítimos (IAPM), 
comerciários (IAPC), bancários (IAPB), transportes e cargas (IAPETEC), servidores do Estado 
(IPASE), etc. Com os IAP verificou-se o crescimento da medicina previdenciária na primeira 
metade do século, permitindo o acesso desses trabalhadores urbanos e seus familiares à 
assistência médico-hospitalar. O mesmo não ocorreu com os trabalhadores rurais, com os 
empregados domésticos, com os desempregados e com os vinculados ao chamado 
“mercado informal” (Paim, 1994). 
A medicina se exercia sob a modalidade liberal para os segmentos da população que 
podiam pagar por serviços particulares,embora fosse incorporando a modalidade 
empresarial vendendo serviços no mercado que se estruturava ou ao Estado mediante 
contratos com os vários IAP. Diante das pressões por consumo de serviços de saúde, 
especialmente da população urbana, de um lado, e os interesses clientelistas que 
marcaram a atuação de governos populistas até 1964, de outro, houve uma expansão dos 
IAP e da medicina previdenciária. Apesar da criação do Ministério da Saúde, em 1953, a 
assistência médico-hospitalar vai superando, progressivamente, as ações e serviços de 
saúde pública, fornecendo as bases para a capitalização do setor saúde e da medicina na 
conjuntura seguinte (Paim, 1987). 
 
c) Autoritarismo (1964-1984) 
 
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As condições de saúde da população brasileira, expressas em diferentes 
indicadores, permaneceram críticas. A mortalidade infantil, cujas taxas reduziram-se entre 
as décadas de 40 e 60, sofreu uma piora após 1964, juntamente com o aumento da 
tuberculose, malária, doença de Chagas, acidentes de trabalho, etc. (Guimarães, 1978). O 
perfil epidemiológico refletia a concomitância da morbidade moderna com a morbidade da 
pobreza, embora com o predomínio da primeira: as doenças do aparelho circulatório 
passaram a ser a causa mais importante de morte no Brasil nos anos 80. Mesmo no período 
do chamado “milagre brasileiro” (1968-1973), não houve melhoria do quadro sanitário, 
destacando-se a grave epidemia de meningite no início da década de 70. Somente no 
período pós-74 ocorreram melhorias localizadas em relação às doenças transmissíveis, 
particularmente as controláveis por imunização. 
O desenvolvimento econômico verificado na década de 50, baseado na substituição 
de importações, passou a enfrentar dificuldades no início da década seguinte, exatamente 
num período de maior mobilização de massas urbanas que pressionavam por melhores 
condições de vida e por reformas sociais (as chamadas reformas de base). O pacto 
populista, que até então possibilita a manipulação das demandas dos trabalhadores em 
função dos interesses das classes dirigentes, ficou comprometido com o aumento das 
tensões sociais. Ocorre mais um golpe militar em 1964; instalando um regime autoritário 
com a duração de 21 anos. 
Superada a etapa inicial de estagnação, a ditadura proporciona um desenvolvimento 
mediante a internacionalização da economia assentada em um tripé básico: capital 
nacional, Estado e capital multinacional. Verifica-se a consolidação do capitalismo 
monopolista de Estado (CME) com a contenção dos salários dos trabalhadores e repressão 
dos opositores ao regime (sindicalistas, intelectuais, estudantes, artistas, etc.). O modelo 
econômico adotado concentrou a renda, reforçou as migrações do campo para a cidade e 
acelerou a urbanização, sem garantir os investimentos necessários à infraestrutura urbana 
como saneamento, transporte, habitação, saúde, etc. (Guimarães, 1978). 
As políticas de saúde executadas pelos governos militares privilegiaram o setor 
privado, mediante compra de serviços de assistência médica, apoio aos investimentos e 
empréstimos com subsídios. Nesse sentido promoveu a unificação dos IAP, em 1966, 
criando o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), responsável tanto pelas 
aposentadorias e pensões (benefícios) quanto pela assistência médica dos segurados da 
previdência e seus familiares. Em 1973, o governo propiciou a extensão da medicina 
previdenciária aos trabalhadores rurais por intermédio do Funrural, ainda que de forma 
diferenciada. No ano seguinte, foi criado o Ministério da Previdência e Assistência Social 
(MPAS) que implantou o Plano de Pronta Ação (PPA), possibilitando às clínicas e aos 
hospitais particulares contratados pela Previdência Social a atenderem casos de urgência 
de qualquer indivíduo, segurado ou não (Paim, 1994). 
A crise do setor saúde foi caracterizada pela insuficiência, descoordenação, má 
distribuição, inadequação e ineficácia aos serviços durante a V Conferência Nacional de 
Saúde (V CNS), realizada em 1975. Nessa oportunidade o Governo apresentou a proposta de 
criação do Sistema Nacional de Saúde através da Lei 6229/75 que definia as atribuições dos 
diversos ministérios envolvidos com a questão saúde, bem como as responsabilidades da 
União, dos estados e dos municípios (CNS, 1975). 
A oposição efetuada pelos empresários da saúde contra a regulamentação dessa lei 
fez com que o governo concentrasse a sua intervenção política em um conjunto de 
programas verticais tais como: O Programa Nacional de Saúde Materno-infantil, a 
campanha da Meningite, o Programa Nacional de Imunizações (PNI), o Programa de 
Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (PIASS), o Programa Especial de Controle 
da Esquistossomose (PECE), o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (Pronan). 
Além desses programas especiais, foram implantados, no Governo Geisel, o Sistema 
Nacional de Vigilância Epidemiológica (Lei 6259/75), o “regime” de Vigilância Sanitária 
 
www.cursosgesp.com 7 
(Lei 6360/76) e o Instituto Nacional da Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), 
em 1977 (Paim, 2002). 
Esse padrão de estruturação do setor saúde no Brasil, apesar de severamente 
criticado ao longo da década de 70, vai sofrer certa inflexão no início dos anos 80 diante 
de um período recessivo e da explosão da crise financeira da Previdência Social. O Governo 
Figueiredo elaborou o Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde (PREV-SAÚDE) 
discutido durante a VII Conferência Nacional de Saúde. Tratava-se de uma ambiciosa 
iniciativa de reorientação do sistema de saúde, mediante uma integração programática e 
funcional entre dois ministérios (Saúde e Previdência) e as secretarias estaduais e 
municipais de saúde. Tal programa apresentava um conjunto de diretrizes que reforçava a 
atenção primária de saúde (APS), a participação da comunidade, a regionalização e 
hierarquização de serviços, o sistema de referência e contrarreferência, a integração de 
ações preventivas e curativas, entre outras. No entanto, não chegou a ser implantado 
diante das pressões do setor privado e do boicote de dirigentes do INAMPS que 
constituíram “anéis tecnoburocráticos” para satisfazer interesses de empresas médicas 
(Paim, 2002). 
Em 1982, o Governo formulou Plano do CONASP (Conselho Consultivo de 
Administração da Saúde Previdenciária) que, entre outras medidas, extinguiu o pagamento 
por unidades de serviços ao setor privado contratado pelo INAMPS, implantou as 
autorizações para internação hospitalar (AIH) e possibilitou, mediante as Ações Integradas 
de Saúde (AIS) o acesso aos serviços previdenciários, além dos de saúde pública, para a 
população não segurada (Paim, 1987). 
Essas políticas racionalizadoras que atravessaram a saúde pública e a medicina 
previdenciária no período pós-74, ainda que parcialmente apoiadas por forças setoriais que 
se opunham ao autoritarismo, como o Cebes e Abrasco, não foram suficientes para alterar 
significativamente as condições de saúde da população nem para reorientar o modelo 
médico-assistencial privatista que articulava interesses das empresas médicas, do Estado e 
de empresas multinacionais de medicamentos e de equipamentos médico-hospitalares. 
A organização da classe operária do ABC, o movimento sanitário que articulou 
trabalhadores, acadêmicos, profissionais de saúde e setores populares, a mobilização 
nacional em torno das eleições “Diretas já” e a derrota do regime autoritário no Colégio 
Eleitoral que elegeu o Presidente Tancredo Neves, constituíram um processo político que 
ampliou o espaço das forças democráticas, possibilitando a construção da proposta da 
Reforma Sanitária Brasileira (RSB) (Borba, s/d.; Cebes, 1985). 
Essa proposta vinha sendo engendrada desde a década de 70, a partir de críticase 
estudos referentes ao sistema de assistência médico-hospitalares então vigentes. 
Expressava movimentos sociais envolvendo estudantes, profissionais de saúde, sindicatos, 
associações de moradores, destacando-se o chamado movimento sanitário (Escorel, 1998) 
que teve o Cebes e a Abrasco como atores políticos fundamentais. No primeiro Simpósio de 
Política Nacional de Saúde, promovido pela Câmara dos Deputados em 1979, o Cebes 
apresentou um documento para debate que, pela primeira vez, propunha a criação de um 
Sistema Único de Saúde para o Brasil (Cebes, 1980). E a Abrasco, na conjuntura seguinte, 
participou ativamente por intermédio de seus sócios na elaboração dos textos básicos da 
VIII Conferência Nacional de Saúde, além de divulgar o documento “Pelo Direito Universal 
à Saúde” (Abrasco, 1986). 
 
d) “Nova República” (1985-1988) 
No que diz respeito ao estado de saúde da população, verifica-se nesse período uma 
redução da mortalidade infantil e das doenças imunopreveníveis, a manutenção das 
doenças do aparelho circulatório e neoplasias como principais causas de mortalidade e um 
aumento das mortes violentas. Além do crescimento de casos de AIDS, surgem epidemias 
de dengue em vários municípios, inclusive em capitais como a do Rio de Janeiro (Paim, 
1994). 
 
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Com a interrupção da recessão econômica do início da década de 80 e a conquista 
da democracia, a demanda pelo resgate da “dívida social” acumulada no período 
autoritário colocou a saúde na agenda política da chamada Nova República. Os movimentos 
sociais de então que defendiam a democratização da saúde difundiram a proposta da 
Reforma Sanitária, debatida durante a 8a Conferência Nacional de Saúde. Nessa 
oportunidade, foram identificados problemas do sistema de saúde, medidas para a sua 
solução e os princípios e diretrizes da Reforma Sanitária, destacando-se os seguintes: 
 
 conceito ampliado de saúde; 
 reconhecimento da saúde como direito de todos e dever do estado; 
 criação do Sistema Único de Saúde (SUS); 
 participação popular (controle social); 
 constituição e ampliação do orçamento social (CNS, 1987). 
 
Nessa conjuntura, a Reforma Sanitária Brasileira (RSB) foi assumida como uma 
proposta abrangente de mudança social e, ao mesmo tempo, um processo de 
transformação da situação sanitária. Representava, “por um lado, a indignação contra as 
precárias condições de saúde, o descaso acumulado, a mercantilização do setor, a 
incompetência e o atraso e, por outro, a possibilidade da existência de uma viabilidade 
técnica e uma possibilidade política de enfrentar o problema” (Arouca, 1988). 
Enquanto se processavam os entendimentos políticos para a implantação da 
Reforma Sanitária no período pós-conferência, mediante os trabalhos da Comissão Nacional 
de Reforma Sanitária (CNRS), o Ministério da Saúde recuava para a sua prática campanhista 
enquanto o INAMPS, garantia a expansão das AIS para mais de 2.000 municípios. Durante a 
composição do arcabouço jurídico do Sistema Único de Saúde (SUS) no processo 
constituinte, ocorreu a transformação das AIS nos Sistemas Unificados e Descentralizados 
de Saúde (SUDS), mediante decreto Presidencial (Brasil, 1987). 
O SUDS, entendido como “estratégia-ponte” para a instalação do Sistema Único de 
Saúde durante a construção do arcabouço legal para a Reforma Sanitária, apoiava-se em 
convênios entre os governos federal, estadual e municipal, e apresentava certos avanços 
organizativos, pois superava a compra de serviços no interior do setor público (os repasses 
de recursos eram feitos com base na programação-orçamentação integrada [POI] e criava 
os conselhos estaduais e municipais de saúde, paritários e deliberativos) (Paim, 2002). 
A implantação do SUDS desconcentrou recursos e descentralizou parte do processo 
decisório para o âmbito dos estados (política denominada “estadualização”), sobretudo no 
que se refere ao esvaziamento estrategicamente planejado do INAMPS, mediante a fusão 
de suas estruturas administrativas nos estados com as das secretarias estaduais de saúde e, 
posteriormente, com a extinção de suas superintendências e substituição por escritórios 
regionais (Cordeiro, 1991). O SUDS estimulava a participação da sociedade civil nos 
conselhos de saúde e ampliava a cobertura de serviços para todos os cidadãos, inclusive 
nos hospitais, laboratórios e clínicas contratados pela Previdência Social. Somente nesse 
contexto o Estado brasileiro possibilitou a criação de canais de participação do cidadão na 
formulação e acompanhamento das políticas de saúde, particularmente com a 
promulgação da Constituição de 1988 que garantiu o direito à saúde para todos os 
brasileiros e instituiu o Sistema Único de Saúde (SUS). A incorporação dos princípios e 
diretrizes do movimento sanitário no Capítulo da Seguridade Social da Constituição de 
1988, mediante emenda popular, representou a maior vitória da RSB. 
Desde então, a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante 
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros 
agravos ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, 
proteção e recuperação (Art. 196) (Conasems, 1990). Esta concepção ampliada de saúde 
aponta para a necessidade de políticas públicas intersetoriais, envolvendo a área 
econômica e os setores sociais, no sentido de reduzir riscos (e não apenas danos). Do 
 
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mesmo modo, assegura universalidade e igualdade no acesso às ações e serviços de saúde 
visando à promoção, à proteção e à recuperação da saúde. Portanto, além de uma 
concepção ampla de saúde, a Constituição propõe uma atenção integral, com um amplo 
espectro de ações. 
Destaque-se, ainda, que as ações e serviços públicos de saúde integram uma 
rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único de saúde (Art. 198) 
(Conasems, 1990). Este SUS deveria ser organizado de acordo com as diretrizes de 
descentralização, atendimento integral e participação da comunidade competindo-lhe, 
entre outras, as seguintes atribuições: controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e 
substâncias de interesse para a saúde e participar da produção de medicamentos, 
equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos; executar as ações 
de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador; 
ordenar a formação de recursos humanos na área da saúde; incrementar em sua área 
de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico; colaborar na proteção do meio 
ambiente, nele compreendido o do trabalho (Art. 200). Diante de tais atribuições, 
constata-se que o SUS tem uma responsabilidade constitucional que não se limita à 
assistência médico-hospitalar, devendo ser implementado com prioridade para as 
atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais (Conasems, 1990). 
Portanto, o período compreendido entre março de 1985 e março de 1988 
caracterizou-se pelo desencadeamento do processo da Reforma Sanitária Brasileira que, no 
âmbito setorial, produziu os seguintes fatos: 
 
 contenção das políticas privatizantes da previdência social através do INAMPS; 
 transferência significativa de recursos previdenciários para estados e municípios; 
 prioridade para o fortalecimento dos serviços públicos; 
 estímulo à integração das ações e serviços de saúde; 
 apoio à descentralização gerencial; 
 incorporação do planejamento à prática institucional; 
 abertura de canais para a participação popular (Paim, 2002). 
 
e) Pós-Constituinte (1989-2002) 
 
Em relação às condições de saúde da população, a década de 90 inicia-se com a 
epidemia de cólera e o agravamento da mortalidade por causas externas, destacando-se o 
predomínio dos homicídios sobre as mortes do tráfego. A composiçãoda mortalidade por 
grupos de causas apresenta em primeiro lugar as doenças cardiovasculares (DCV), seguidas 
das causas externas e das neoplasias. Quanto aos indicadores de morbidade, verifica-se a 
seguinte situação: erradicação da poliomielite, decréscimo da mortalidade infantil, 
persistência da tuberculose, estabilização das taxas de AIDS, expansão da dengue inclusive 
com formas hemorrágicas, incremento das taxas de incidência de leishmaniose visceral e 
malária, bem como redução da prevalência da hanseníase e da incidência das doenças 
imunopreveníveis (Barreto & Carmo, 2000; Singer, 2002). 
Assim, o Brasil inicia o século XXI com uma população de 169.799.170 habitantes, 
uma taxa de crescimento anual de 1,4%, fecundidade total de 2,33 filhos e uma taxa de 
urbanização de 78,4%. A esperança de vida encontra-se em torno de 68,4 anos, sendo 64,6 
para os homens e 72,3 para as mulheres. A taxa de mortalidade infantil corresponde a 34,8 
óbitos de menores de um ano por 1000 nascidos vivos. Apresenta um PIB per capita de R$ 
5.861,00 (US$ 3.229,70) e uma das maiores concentrações de renda do mundo, com um 
Índice de Gini da ordem de 0,567 (IBGE). 
No momento em que era promulgada a “Constituição Cidadã” aprofundava-se a 
instabilidade econômica com hiperinflação e crise fiscal do Estado, enquanto a Reforma 
Sanitária encontrava sérios obstáculos para a sua implementação. O recuo dos movimentos 
 
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sociais, a disseminação da ideologia neoliberal e a perda de poder aquisitivo dos 
trabalhadores de saúde ensejaram o aparecimento de uma “operação descrédito” contra o 
SUS, seja por parte das classes dirigentes e mídia, seja pelas ações políticas 
predominantemente corporativas dos trabalhadores de saúde (Paim, 2002). 
Mesmo assim, o Congresso Nacional aprovou a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8080/90). 
Esta Lei dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, 
bem como a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes. Regula, em todo 
o território nacional, as ações e serviços de saúde executados, isolada ou conjuntamente, 
em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito público ou 
privado (Conasems, 1990). Ou seja, todos os prestadores de serviços estão subordinados a 
essa Lei, não se trata apenas dos integrantes do SUS. 
Apesar dos vetos do Presidente, a sociedade brasileira conquistou uma Lei 
abrangente, que não só especifica os princípios, objetivos, atribuições, organização, 
direção e gestão do SUS nos diversos níveis da Federação, como também oferece 
indicações sobre relações com os serviços privados, financiamento, gestão financeira, 
recursos humanos, planejamento, etc. Essa Lei Orgânica da Saúde foi complementada pela 
Lei 8142/90 que regula a participação da comunidade no SUS, assegurando a existência de 
instâncias colegiadas como conferências e conselhos de saúde nos três níveis de governo, 
além de orientar as transferências intergovernamentais de recursos financeiros da área de 
saúde e de exigir a formulação de planos de saúde e a criação de fundos de saúde 
(Conasems, 1990). 
Ao tempo em que a Constituição permitia a incorporação de um terço da população 
brasileira ao sistema de saúde, o Governo Collor, utilizando-se de expedientes diversos, 
reduziu em quase a metade os recursos para a saúde. Portanto, não é difícil compreender 
o “caos dos SUS” no seu nascimento, muito menos o sucateamento dos serviços públicos. 
Ademais, os governos estaduais reduziram também a sua participação orçamentária 
em saúde, na medida em que passaram a receber transferências de verbas das AIS/SUDS e 
depois do SUS (Mendes, 1996). Assim, o processo da Reforma Sanitária deparou-se no 
período de 1988 a setembro de 1992 com uma situação que, apesar de envolver dois 
governos distintos, apresentou traços convergentes de políticas de saúde que apontavam 
para o reforço de um projeto conservador em saúde. Essas políticas caracterizaram-se 
pelos seguintes fatos: 
 
 apoio ao modelo médico-assistencial privatista “reciclado” (expansão da assistência 
médica supletiva); 
 reforço à centralização decisória a ao controle burocrático; 
 desmonte do SUDS e “operação descrédito” da Reforma Sanitária; 
 municipalização discriminatória (“presente de grego”); 
 implantação distorcida do SUS; 
 privilegiamento da lógica da produtividade nos serviços públicos por intermédio do 
Sistema de Informação Hospitalar e do Sistema de Informação Ambulatorial do SUS 
(Paim, 2002). 
Apesar desses fatos, nessa conjuntura foram elaboradas as constituições estaduais e 
as leis orgânicas dos municípios, sancionadas as leis que organizaram o SUS, realizada a IX 
Conferência Nacional de Saúde (CNS, 1992), instalado o Conselho Nacional de Saúde e 
experimentados modelos assistenciais e de organização de serviços, por intermédio de 
distritos sanitários, em diversos municípios. Após o impeachment do Presidente da 
República, no final de 1992, iniciou-se uma conjuntura sanitária que permitiu retomar 
certos aspectos do projeto da Reforma Sanitária. 
O Governo Itamar, logo após a realização da IX Conferência Nacional de Saúde em 
1992, que denunciou o não cumprimento da legislação sanitária e defendeu a 
municipalização da saúde, efetuou esforços pela descentralização das ações e serviços de 
saúde, consubstanciados na Norma Operacional Básica 01/93 (Brasil, 1993). Essa Norma 
 
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estabelece diferentes condições de gestão (incipiente, parcial e semiplena) para permitir a 
transição de uma situação em que os municípios eram tratados como meros prestadores de 
serviços para uma fase de municipalização plena prevista pela legislação em vigor. Embora 
avançasse no sentido da descentralização, a NOB-93 permaneceu ainda distante do que 
dispõe a legislação, especialmente no que tange ao redirecionamento do modelo de 
atenção. 
Mesmo assim, o SUS enfrentou-se com a descontinuidade administrativa no 
Ministério da Saúde, com o sequestro dos recursos da saúde pelo Ministério da Previdência 
apoiado pelo Ministério da Fazenda, com as pendências jurídicas, sonegação e adiamento 
do pagamento do COFINS (Contribuição Financeira para a Seguridade Social) pelos 
empresários, enfim, com o recrudescimento da “operação descrédito” capitaneada pelo 
próprio governo por intermédio da “área econômica”. Entretanto, alguns fatos novos 
ocorridos nesse momento pareciam reforçar o SUS: 
 
 influência da sociedade civil na política de saúde por intermédio do Conselho Nacional 
de Saúde, bem como nos conselhos estaduais e municipais; 
 municipalização da saúde reconhecendo a diversidade das situações; 
 experimentação de modelos assistenciais alternativos por governos estaduais e 
municipais; 
 reativação de certos movimentos da cidadania (luta contra a fome e a miséria, defesa 
da vida e contra a violência, etc.). 
 
Em relação ao setor privado, observou-se uma expansão da assistência médica 
supletiva (MAS), com diversificação de planos de saúde para os consumidores e 
diferenciação de modalidades de compra e de pagamento dos serviços médicos. 
Consequentemente, a parte do setor privado contratada pelo SUS (profissionais 
credenciados e os hospitais e clínicas não competitivos no mercado) criticava o governo em 
face dos valores pagos por procedimentos. 
Nesse particular, o primeiro Governo FHC pode ser considerado uma continuidade 
dos governos Itamar e Collor (Paim, 2002). 
A implantação de mais um plano de estabilização econômica em 1994 (Plano Real), 
envolvendo um conjunto de políticas de ajuste macroeconômico e um elenco de projetos 
de Reforma do Estado (Lamounier & Figueiredo, 2002) resultou, com a expansão do 
neoliberalismo, em mais desajuste social: desemprego, violência e piora das condições devida (Paim, 2002). 
No que diz respeito ao acesso ao sistema de saúde, segmentos da classe média e 
dos trabalhadores de melhor nível de renda migraram para os seguros-saúde e outras 
formas de assistência médica supletiva (MAS) à proporção que se deterioravam os serviços 
públicos de saúde e a mídia desqualificava os esforços de construção do SUS. Já os demais 
cidadãos brasileiros usuários do SUS, apesar do direito à saúde, eram repelidos no 
cotidiano dos serviços de saúde pelas filas, maus-tratos, burocracia, humilhações, greves e 
baixa qualidade dos serviços. 
Apesar dos problemas na organização do sistema de saúde no Brasil e das 
dificuldades encontradas na implantação do SUS, ocorreu uma extensão de cobertura de 
serviços de saúde para a população brasileira no final do século XX. Essa foi a conclusão de 
diversas entidades médicas e dos conselhos de secretários estaduais e municipais de saúde 
reunidos em São Paulo, após a realização da X Conferência nacional de Saúde (CNS, 1996): 
 
“Ainda que o sistema que temos hoje distancie-se daquele que foi consagrado na 
‘Constituição Cidadã’, sua existência é essencial num País que apresenta enormes 
disparidades regionais e social (...). Portanto, aos que tentam apresentar o SUS como 
modelo falido de atenção à saúde, respondemos com experiências vitoriosas apresentadas 
na X Conferência Nacional de Saúde que comprovaram que ‘onde deu SUS, deu certo’(...). 
 
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Nesse sentido, impõe-se a manutenção do princípio do conteúdo constitucional da 
seguridade social, incluindo-se solidariamente a saúde, previdência e assistência social. A 
reforma da saúde já ocorreu e está na Constituição Brasileira. Cabe cumpri-la” (Em defesa 
do SUS, 1997:4). 
 
Na Norma Operacional Básica de Assistência a Saúde (NOB-96), observa-se uma 
preocupação desta norma em estabelecer as bases para que o SUS fosse “transformado em 
um modelo de atenção centrado na qualidade de vida das pessoas e do seu meio ambiente, 
bem como na relação da equipe de saúde com a comunidade, especialmente com os seus 
núcleos sociais primários – as famílias” (Brasil, 1998; 12). Além de favorecer as ações 
intersetoriais, propunha “a transformação na relação entre o usuário e os agentes do 
sistema de saúde (restabelecendo o vínculo entre quem presta o serviço e quem o recebe) 
e, de outro, a intervenção ambiental, para que sejam modificados fatores determinantes 
da situação de saúde” (Brasil, 1998; 13). 
Não obstante a crise do financiamento setorial, o Governo FHC nessa época 
estabelece “1997; o ano da saúde no Brasil”, comprometendo-se com a mudança do 
modelo de atenção através do Programa Saúde da Família (PSF) (Radis, 1997) e 
apresentando a proposta de ampliação de 847 para 3.500 equipes de saúde da família 
(ESF). Foi implantado o Piso de Atenção Básica (PAB), isto é, “um valor per capita, que 
somado às transferências estaduais e aos recursos próprios dos municípios deverá financiar 
a atenção básica da saúde” (Brasil, 1998:30), acrescido de uma parte variável destinada ao 
incentivo de Ações Básicas de Vigilância Sanitária, PACS/PSF e Programa de Combate às 
Carências Nutricionais. 
 Mobilizando interesses de prefeitos, secretários municipais de saúde e técnicos 
preocupados com o repasse de recursos financeiros e com a descentralização, o Ministério 
da Saúde estabeleceu as orientações para a organização da atenção básica, mediante 
Portaria 3.925/GM de 13/11/98 (Brasil, 1998a). Definiu atenção básica como um conjunto 
de ações, de caráter individual ou coletivo, situadas no primeiro nível de atenção dos 
sistemas de saúde, voltadas para a promoção da saúde, prevenção de agravos, tratamento 
e reabilitação (Brasil, 1998a: 11). Depois de ser implantado o Piso de Atenção Básica 
(PAB), foram explicitadas as responsabilidades dos municípios, as ações, atividades, 
resultados e impactos esperados, bem como as orientações sobre o repasse, aplicação, e 
mecanismos de acompanhamento e controle dos recursos financeiros que compõem esse 
instrumento de transferência de recursos. As responsabilidades nas áreas de zoonoses, 
endemias e medicamentos seriam objeto de pactuação mediante normas complementares. 
Durante a gestão do Ministro José Serra foi estabelecida a meta de implantação de 
20.000 equipes de saúde da família (ESF) até 2002 (Singer, 2002), chegando a alcançar 
17.000 equipes e uma cobertura de cerca de 50 milhões de usuários do SUS. Nesse período 
foi aprovada a Lei 9.656 de 03 de junho de 1998 que dispõe sobre os planos e seguros 
privados de assistência à saúde. Esta lei, que passou a regular a assistência médica 
supletiva (MAS), possibilitava, originalmente, as seguintes providências: abertura da 
participação de grupos estrangeiros no mercado nacional; atribuição da regulamentação 
dos planos privados de assistência à saúde ao Conselho Nacional de Seguros Privados 
(CNSP); definição da Superintendência de Seguros Privados (Susep) como ente regulatório; 
criação de um pacote mínimo na assistência à saúde e mecanismos para controlar a 
seleção de risco pelas operadoras; proibição de exclusão por idade, deficiência física; 
limites para exclusão de doenças e lesões preexistentes; garantia de usufruto do plano de 
saúde após demissão por um período de 6 a 24 meses; vinculação dos planos e seguros a 
garantias securitárias, atribuindo poder de intervenção à Susep quando essas garantias 
foram insuficientes; estabelecimento do ressarcimento ao SUS pelas operadoras; criação do 
Conselho de Saúde Suplementar (CONSU); e criação da Câmara de Saúde Suplementar. Essa 
Lei, apesar de modificada, por um conjunto de Medidas Provisórias (MP) da Presidência da 
República continua em vigor (Brasil, 2002). 
 
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Ainda no que se refere à AMS, foi aprovada a Lei 9.961 de 28 de janeiro de 2000 
criando a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) como órgão de regulação, 
normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência 
suplementar à saúde. Tem como missão regular a assistência à saúde dos consumidores 
privados, a assistência dos associados aos planos de saúde, e as operadoras e seguros-saúde 
(Brasil, 2002). Apesar da regulação estabelecida, o sistema de assistência médica supletiva 
(SAMS) mantém as seguintes características: segmentação da atenção contrária à 
integralidade; desperdício de recursos pela dupla utilização – setores público e privado; 
iniquidade devido a organização dos planos pela capacidade de pagamento; indução ao 
consumo e à incorporação sem critérios de tecnologia médica. 
Nessa conjuntura foram ainda produzidos os seguintes fatos político-institucionais: 
 
 criação da agência de vigilância sanitária (Anvisa); 
 implantação do SIOPS (Sistema de Informação do Orçamento Público em Saúde); 
 adoção do Cartão SUS em alguns municípios; 
 implementação do Programa de Interiorização do Trabalho em Saúde (PITS); 
 atualização da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME); 
 aprovação da Lei dos Medicamentos Genéricos (Lei 9787/99); 
 Realização da 11a Conferência Nacional de Saúde em 2000 e da I Conferência Nacional 
de Vigilância Sanitária (CNS, 2000; Convisa, 2001); 
 Estabelecimento da Emenda Constitucional (EC-29). 
 
 No caso da EC-29, procurou-se equacionar um dos maiores problemas do SUS, ou seja, a 
instabilidade do financiamento, definindo responsabilidades mínimas para a União, estados 
e municípios. Desse modo, a União deveria assegurar, no ano 2000, o montante empenhado 
em ações e serviços públicos de saúde no exercício de 1999, acrescido de no mínimo 5%, 
enquanto no período de 2001 a 2004, alocaria o valor apurado no ano anterior, corrigido 
pela variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Os estados e Distrito Federal 
deveriam garantir7% do produto da arrecadação dos impostos em 2000 até chegar a 12% 
em 2004. Nesse mesmo período, os municípios passariam de 7% a 15% (CFM-AMB, 2002). 
No plano internacional, o Brasil passou a ocupar posição de destaque, sobretudo 
durante a 54a Assembleia Mundial da Saúde em 2001, situando a política de saúde 
brasileira à frente das adotadas pela OMS e servindo de modelo para tomar atitudes mais 
ousadas. Nesse particular, destacam-se a defesa do medicamento como direito humano, o 
controle da AIDS não só mediante prevenção mas com o tratamento das pessoas 
contaminadas pelo HIV, a proposta de produção de medicamentos a preços reduzidos para 
países pobres, a luta contra o tabaco, com a legislação proibindo a propaganda em rádio e 
TV (inclusive em eventos esportivos e culturais internacionais), e a política de aleitamento 
exclusivo nos primeiros 6 meses de vida das crianças (Noronha, 2001). 
 
PERSPECTIVAS DAS POLÍTICAS DE SAÚDE 
As políticas de saúde no Brasil nas diversas conjunturas examinadas estruturaram 
um sistema de saúde, inicialmente mediante um sanitarismo campanhista (reforma 
Oswaldo Cruz – 1904) e a implantação da Previdência Social (lei Eloy Chaves – 1923) que 
estabeleceu a separação da saúde pública, medicina previdenciária e medicina liberal 
(décadas de 20 a 50). Na Segunda metade do século XX instalou-se o modelo médico-
assistencial privatista com a privatização, crise da saúde e a procura de alternativas 
(décadas de 60 a 70). Buscou-se a estruturação do sistema de saúde mediante certas 
estratégias (AIS-SUDS) e, após a Constituição de 1988, seguiu a construção social do 
Sistema Único de Saúde (SUS), ao tempo em que o mercado montava o sistema de 
assistência médica supletiva (décadas de 80 e 90). 
 
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Desse modo, podem ser resumidas as características das políticas de saúde do Brasil 
no século passado: 
 
 incorporação lenta e gradual da população brasileira ao sistema de serviços de saúde; 
 participação ambivalente do Estado no financiamento, distribuição, prestação e 
regulação dos serviços de saúde; 
 fragmentação institucional entre a assistência médico-hospitalar, a saúde pública e a 
saúde ocupacional; 
 centralização da gestão; 
 restrições à participação do cidadão e das organizações da sociedade civil no controle 
público do Estado, dos seus aparelhos e da sua burocracia; 
 segmentação do sistema com a conformação contraditória de dois “subsistemas”- o 
público (SUS) e o privado (SAMS e outros); 
 formas diferenciadas de financiamento e de remuneração dos serviços; universal e 
“excludente”; “Hospitalocêntrico” e curativo. 
 
Nesse sistema segmentado persistem insuficiências, iniquidades e inadequações. 
Contudo, antes das AIS e da Constituição de 1988, a assistência médico-hospitalar era 
privilégio dos que podiam pagar, benefício dos trabalhadores segurados pela Previdência, 
e caridade para os pobres que só podiam apelar para os hospitais de indigentes. Com o 
SUS, não obstante as suas mazelas e a força dos seus detratores e oponentes, a saúde 
passou a ser direito social de todos, vinculado à condição de cidadania. 
Legalmente, o SUS é o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos 
e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta 
e das fundações mantidas pelo Poder Público (lei 8080/90 Art. 4a) (Conasems, 1990). 
Trata-se de uma forma de organizar as ações e os serviços de saúde no Brasil de acordo 
com princípios, diretrizes e dispositivos estabelecidos pela Constituição da República e Lei 
Orgânica da Saúde. O SUS não é um mero meio de financiamento e de repasse de recursos 
federais para estados, municípios, hospitais, profissionais e serviços de saúde, nem é um 
sistema de serviços de saúde destinados aos pobres e “indigentes”. O SUS é um sistema 
ainda em construção e, consequentemente, não basta a existência de uma imagem-objeto 
(IO) estabelecida por leis e normas. A “engenharia política” necessária para tal construção 
implica mobilização de vontades, participação social, capacidade de formulação e de 
pactuação para assegurar viabilidade e a implementação das ações. 
Portanto, impõe-se a necessidade de analisar não só os problemas do SUS, mas 
também as oportunidades e perspectivas do sistema de saúde brasileiro – público e 
privado. Se em termos de política de saúde e de gestão descentralizada não há como 
desconhecer os avanços do SUS, ainda persistem questões assistenciais e éticas requerendo 
a adoção de diversas medidas em defesa das pessoas e da cidadania. 
Ao estudar as tendências do sistema de saúde brasileiro, Piola (2001) aponta os 
valores sociais que deverão norteá-lo nos próximos dez anos, chamando a atenção para o 
fato de 89,8% das lideranças entrevistadas admitirem que estarão aprovados dispositivos 
legais e mecanismos em relação aos direitos dos usuários e autonomia dos pacientes. Sinais 
dessa tendência já podem ser observados no Estado de São Paulo quando a Lei 10241 
(17/3/99 – SP) estabeleceu um elenco de direitos tais como: atendimento digno e 
respeitoso; ser identificado pelo nome (não pela doença ou leito); sigilo de seus dados 
pessoais; identificação das pessoas que o tratam através de crachás; informações corretas 
sobre diagnóstico, exames, terapias, riscos, acesso permanente ao prontuário; papeleta de 
alta com diagnóstico de alta e nome do profissional; receber receitas legíveis com nomes 
de medicamentos genéricos; conhecer o material que irá receber como certificação do 
sangue e outros; garantia de privacidade, individualidade, respeito a princípios éticos e 
culturais, confidencialidade; ser acompanhado em consultas e internações, presença do pai 
 
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no pré-natal e no parto, receber anestesia quando necessária, recusar tratamentos 
dolorosos e extraordinários para prolongar a vida; e optar pelo local de morte. 
Consequentemente, a atenção digna, ética e com qualidade, muitas vezes referida 
como humanização do cuidado, constitui um dos maiores valores e desafios para o sistema 
de saúde brasileiro e o SUS, em particular nos próximos anos. Qualquer política de saúde a 
ser formulada não pode ignorar tais aspectos enfatizados no tema central e nas 
recomendações da XI Conferência Nacional de Saúde (CNS, 2000). 
A partir da análise da situação de saúde do Brasil em diferentes conjunturas, cabe 
levantar um conjunto de hipóteses explicativas a serem consideradas na formulação de 
políticas de saúde para os próximos anos: 
 
1. Os aumentos constantes nos custos da assistência à saúde associados aos recursos 
limitados para investimento no setor impedem a expansão de componentes da rede 
assistencial do SUS. 
2. Embora as ações de saúde sejam direcionadas para atender demandas relativas a 
problemas relevantes de saúde, estas têm baixo impacto no sentido de modificar os 
padrões de ocorrência das doenças e de reduzir riscos. 
3. Há mais ações de cuidado à saúde, porém, uma parte é inefetiva ou mesmo associada a 
efeitos danosos. 
4. O acesso e os benefícios gerados pelos programas de saúde não são equânimes, 
atingindo menos os que mais necessitam. 
5. As desigualdades sociais, além de perpetuarem as desigualdades em saúde, impedem 
que ocorram melhorias mais substanciais nos níveis globais de saúde. 
6. O quadro epidemiológico no Brasil caracteriza-se pela mistura das ditas “doenças da 
pobreza” com as “doenças da modernidade”, criando padrões epidemiológicos 
complexos em que novos problemas aparecerem superpondo-se e não substituindo os 
problemas já existentes, o que amplia a carga de doenças e, como consequência, faz 
crescer as necessidades por mais recursos para reparar os danos. 
7. Antecedendo a superposição das doenças, temos a superposição dos riscos, em quenovos riscos somam-se aos riscos já existentes, aumentando a chance de ocorrência de 
doenças (Barreto & Carmo, 2000). 
 
Essas reflexões reforçam a tese de que a questão saúde no Brasil não pode ser 
enfrentada exclusivamente por políticas setoriais. Ou a questão saúde, como expressão da 
qualidade de vida, configura-se como questão de Estado (além de governo), ou haverá 
grandes obstáculos para a superação dos seus impasses. 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
PAIM, Jairnilson Silva. Políticas de Saúde no Brasil. In ___________Epidemiologia e Saúde. 
6. ed. Rio de Janeiro: Medsi, 2003. 
 
 
 
 
 
 
 
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O MOVIMENTO DA REFORMA SANITÁRIA 
 
 
Chamamos de movimento sanitário a um conjunto organizado de pessoas e grupos, 
partidários ou não, articulado ao redor de um projeto. Esse conjunto organizado vem 
evoluindo do que foi a sua origem - intelectuais nas Universidades no período mais negro 
do autoritarismo – até os dias de hoje, quando o movimento sanitário se “corporifica” na 
Plenária de Entidades pela saúde na Constituinte. O que foi aprovado no segundo e 
definitivo turno da constituinte como o capítulo da Seguridade Social da nova Constituição 
é o coroamento de uma luta do movimento sanitário. E se é certo que a luta mal se inicia, 
o importante é que ela se reinicia a partir do pressuposto de que Saúde é um direito de 
todos e um dever do Estado. 
O que aparece hoje nas propagandas governamentais e a muitos pode parecer 
“óbvio” faz parte do que consideramos uma reviravolta na saúde na medida em que 
transformou em “lugar comum” um direito fundamental do ser humano enquanto um 
princípio norteador da ação governamental, o que durante muitos anos foi considerado 
subversivo e impossível, sonho de poetas e comunistas. 
Estudar e refletir sobre o movimento sanitário significa conhecer a evolução 
histórica das três práticas que o caracterizam: a prática teórica (a construção do saber), a 
prática ideológica (a transformação da consciência) e a prática política (a transformação 
das relações sociais). 
Se toda história tem um início, o movimento sanitário enquanto tal teria seu 
“começo” visível com a criação do Cebes – Centro Brasileiro de Estudos de Saúde em 
novembro de 1976. No entanto, quando o Cebes surge em São Paulo, a partir de uma 
articulação de intelectuais universitários de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, já 
significa dar concretude organizacional a um conjunto de ideias que vinham sendo 
trabalhadas teoricamente durante a primeira parte da década de 70. Esse conjunto de 
ideias, como bem sintetiza Sônia Fleury, está expresso na adoção do conceito de saúde 
coletiva que é uma área de conhecimento delimitada pela especificidade do seu objeto – o 
coletivo, e pela metodologia adotada na produção de conhecimentos acerca do mesmo 
objeto – o método histórico estrutural. 
 O movimento sanitário, então, tem suas origens nos Departamentos de medicina 
preventiva e outros departamentos universitários onde, num processo de crítica ao discurso 
preventivista, foi construída uma nova abordagem da problemática de saúde, o 
pensamento médico-social. Essa abordagem passou a ser um ponto de aglutinação, um 
código de identidade, um discurso que permitia o reconhecimento de um projeto comum. 
Quando o Cebes é criado, passa a existir uma entidade social civil que se encarrega 
de divulgar esse pensamento e as propostas elaboradas, assim como passa a ser um 
elemento aglutinador desse conjunto de pessoas e grupos com abordagem similar, crítica e 
materialista, sobre os problemas de saúde. 
Esse primeiro período de desenvolvimento do movimento sanitário (1976-1979) foi 
caracterizado pela criação do Cebes, pelas lutas sindicais das entidades médicas, por uma 
ampla e intensa produção intelectual nos meios acadêmicos, o que consolidou o campo da 
saúde coletiva no âmbito da saúde pública e pelas primeiras experiências concretas 
alternativas ao modelo dominante da organização do sistema de saúde. 
Ao fim desse primeiro momento, o movimento já havia crescido. Os intelectuais, 
professores e pesquisadores passaram, através do Cebes a relacionar-se com outros 
movimentos: além do movimento estudantil que é do próprio âmbito universitário, também 
com os movimentos corporativos, com os demais movimentos sindicais, com o movimento 
popular e num momento seguinte, como segmentos da burocracia governamental setorial. 
Em 1979 inicia-se uma segunda fase para o movimento sanitário, cujo marco foi a 
realização do I Simpósio sobre política Nacional de Saúde da comissão de Saúde da Câmara 
 
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dos Deputados. As eleições de 1978 levaram para Brasília um conjunto de Deputados 
(vinculados ou simpatizantes) da corrente dos “autênticos” do MDB com atuação na área 
de saúde. Esse grupo de legisladores auxiliado pelo núcleo do Cebes do Distrito Federal 
(por sua vez fortalecido pelo deslocamento para Brasília de uma série de quadros técnicos 
atraídos para trabalhar no Piass, PPREPS, e nos Ministérios) “tomou” a Comissão de Saúde 
e promoveu o I Simpósio. Nessa reunião, a que compareceram diversas forças com 
interesses no setor, o movimento sanitário tornou-se visível para os diferentes atores. O 
documento apresentado pelo Cebes - “A Questão Democrática na Área de Saúde” – foi 
incorporado como documento oficial do Simpósio por unanimidade. 
A realização do Simpósio marcou uma nova fase para o Cebes que a partir daí 
passou a estar mais vinculado com a política de saúde e a ocupar de forma relativamente 
permanente o espaço parlamentar. Mas o Simpósio marcou uma nova faze para o 
movimento sanitário como um todo. A sua realização evidenciou que o movimento existia, 
estava articulado, tinha um projeto definido e que ocupava cada vez mais espaço da arena 
setorial na defesa de seu projeto. 
Entre 1979 e 1982, o movimento sanitário foi construindo e ampliando sua 
organicidade, estabelecendo contatos e alianças com os demais movimentos pela 
democratização do país, e configurando sua especificidade, procurando cada vez mais 
“detalhar” o projeto e identifica-lo com maneiras concretas de atuar e agir sobre o 
panorama de saúde da população brasileira. Foi a época do “sonho tecnocrático” do prev-
saúde, por sua vez confluência de um conjunto de experiências institucionais do período 
anterior. É criada a Abrasco – Associação Brasileira de Pós-Graduação em saúde Coletiva, 
entidade científica representativa da “academia” e que no período recente assumiu uma 
atuação mais política no cenário setorial. 
A partir de 1983 o movimento sanitário consegue por em prática uma de suas 
estratégias – a “ocupação dos espaços institucionais”, na perspectiva de tentar modificar o 
direcionamento da política pública. Passa a fazer parte das instituições de saúde um lócus 
de construção contra hegemônica. Ao privilegiar um lócus “descuidou” de outros (a 
ampliação e aprofundamento da aliança com as classes-populares, subalternas, 
trabalhadoras – às quais o projeto dirige suas propostas e ações). 
Entre 1983 e 1985 o movimento sanitário esteve estreitamente vinculado com a 
operacionalidade do sistema de saúde e a tentativa de reverter a tendência hegemônica de 
privatização da assistência à saúde. É representativo desse período o desenvolvimento das 
Ações Integradas de Saúde conduzidas por elementos do movimento sanitário, uma 
proposta que articulou e ampliou o leque de alianças com os demais movimentos e forças 
sociais. 
Começa com a participação do movimento sanitário nas Ações Integradas de Saúde 
um processo de “institucionalização” dos projetos e propostas que até então tinham sua 
forma maior concentrada na sociedade civil. São os dois gumes da faca: ao mesmo tempo 
que é estratégico penetrar os espaços para tentar implementar ideias e alterar os rumos dapolítica, o movimento ao se “institucionalizar” sofre os limites da ação de alianças que a 
instituição impõe. O processo passa a ficar restrito a avanços e recuos no âmbito das 
políticas institucionais e aos poucos, concentrando nesse espaço de luta (o político-legal ou 
jurídico-institucional) o movimento sanitário tende a perder de vista não apenas a 
necessidade de trabalhar melhor sua aliança com as classes populares como também perde 
de vista o que Berlinguer chamou do “verdadeiro caráter revolucionário da reforma que é a 
saúde da pessoa”. 
Em 1985, com o fim do ciclo militar o movimento sanitário consegue com propostas 
coerentes e estruturadas, fazê-las prevalecer em diversos âmbitos de definição das 
políticas para o período de transição e até indicar e garantir a nomeação de seus 
representantes para postos-chave da administração publica setorial. Conseguir operar as 
máquinas burocráticas na direção contraria a que vinham funcionando, sem contar com 
quadros identificados com o projeto em todos os postos estratégicos do sistema, exigiu um 
 
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esforço enorme das pessoas envolvidas. Esse consumo intelectual com as inéditas 
experiências administrativas imprimiu uma das características do movimento sanitário 
neste período mais recente: o de restringe-se cada vez mais a busca consenso em torno de 
um projeto limitado à ordem jurídico-institucional, às diversas formas administrativas de 
organização do sistema. 
Mas é inegável também que esse conjunto de ações conseguiu ao longo desses três 
anos de crise permanente e progressiva, manter a viabilidade e a politização da questão de 
saúde. Se a 8º Conferencia Nacional de Saúde foi o exemplo máximo da utilização do 
espaço ocupado no aparelho de Estado para possibilitar a discussão democrática das 
diretrizes políticas, o desenvolvimento da proposta do Sistema Unificado e Descentralizado 
de Saúde (SUDES), que começa com a Comissão Nacional da Reforma Sanitária e que ainda 
não sabemos onde vai dar, foi mais um passo concreto na mudança do direcionamento da 
política de saúde, mesmo que esteja restrita a uma reforma administrativa e que a seta 
ainda esteja longe de apontar o verdadeiro alvo. 
A participação de representantes do movimento sanitário no governo durante os 
primeiros três anos da “Nova Republica” faz parte definitivamente da “estratégia do 
possível” que tem na ação permanente, na exploração do máximo possível, a perspectiva 
de não vir a perder a luta por não comparecer no campo em que ela se trava. 
Além da atuação institucional neste período mais recente do seu processo histórico 
de atuação, o movimento sanitário viveu um de seus momentos mais combativos na luta da 
constituinte. Nesse espaço, de alguma forma o movimento de encontra com o seu objeto 
“ausente” – as classes populares, através da participação na Plenária de Entidades pela 
Saúde. Num processo que se cruza com o movimento institucional foi construída e 
negociada uma proposta de texto constitucional que cristalizava a luta de todos esses 
anos. E ter conseguido escrever na Constituição a saúde enquanto direito universal, 
integral, descentralizado acessível e democrático, constituído por um conjunto de práticas 
que extrapolam o setor institucional de saúde, revela a existência de uma ampla frente de 
forças políticas, articuladas em torno de um projeto comum (que lhe confere identidade), 
superpartidária, organizada ao redor das práticas: teóricas, ideológicas e políticas. Essa 
ampla frente de forças políticas é o movimento sanitário hoje, o mesmo que construirá seu 
próprio desenvolvimento futuro. 
“Ao se afirmar a unidade dialética entre o saber, a ideologia e a prática política 
que fundamentam a trajetória e o projeto do novo sanitarismo, não se pretende ocultar as 
contradições que floresceram ao longo do percurso...”. Contradições existiram e 
continuaram existindo. No entanto até hoje, um dos elementos que mais força política deu 
ao movimento transformador do setor de saúde foi a capacidade de refazer internamente o 
pacto, unindo pensamentos com matizes ideológicos diferenciados, porém com um projeto 
comum que está conseguindo construir em comum. 
 É certo que temos toda uma história para contar do processo de luta pela 
democratização da saúde. O passado tem que ser contado, analisado e repensado para 
podermos avançar. O que temos pela frente ainda é um processo de lutas. As vitórias 
políticas para as forças progressistas, significam responsabilidades sociais. Existem, 
portanto, desafios colocados a cada passo da “unidade dialética saber – ideologia – 
prática” que caracteriza o movimento sanitário. 
Na pratica teórica está colocado o desafio de construir uma teoria de reforma 
sanitária brasileira como vem fazendo Sônia Fleury, Jaime Oliveira, Jairnilson Paim, 
Cristina Possas, entre outros. Nesse campo da construção do saber é fundamental manter a 
capacidade de crítica, não tomar histórias individuais como sendo as do movimento, nem 
procurar justificativas para o “ônus” da inserção institucional incorrendo em análises 
“oficialistas”. Mas tampouco deve-se cair como fez Gastão Campos em simplificações como 
leituras parciais do processo que tentam encaixar a realidade em esquemas provincianos e 
superficiais de análise. Uma boa teoria de reforma sanitária brasileira deve ir desvendando 
 
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os aspectos que orientam as práticas ideológicas e políticas do movimento, permitindo-lhe 
assim balizar seu projeto e seu direcionamento. 
A prática ideológica do movimento sanitário tem como desafio reconhecer que toda 
vitória é um recomeço da luta que ainda há um longo caminho a percorrer no 
aprofundamento da consciência sanitária, na manutenção da frente suprapartidária com a 
atuação na contra hegemonia. A conquista de aliados para o projeto, a consolidação das 
alianças (em particular com os movimentos corporativos da área da saúde e demais 
movimentos de trabalhadores) são desafios para que o movimento sanitário se mantenha 
enquanto tal e para que consiga operacionalizar as suas conquistas. 
A prática política do movimento sanitário tem como desafio tornar presente a 
“classe ausente”. Isso é bem mais que estabelecimento de alianças com movimentos 
sindicais e populares, é a construção em conjunto de um mesmo projeto, de um processo 
político de se tornar realidade uma transformação setorial: a reforma sanitária. A 
construção desse projeto, tão bem definido por Berlinguer como a “longa marcha através 
das instituições e do processo de transformação da Sociedade e do Estado” não tem 
receita. É construído coletivamente. 
 
REFERÊNCIAS 
 
REFORMA SANITÁRIA. Tema. Radis. Fundação Oswaldo Cruz. Manguinhos. Ano VI Novembro 
de 1988. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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MODELOS DE ATENÇÃO 
 
Os sistemas de serviços de saúde são formados por cinco componentes 
fundamentais: (a) prestação da atenção (modelo assistencial); (b) organização dos 
recursos; (c) desenvolvimento de recursos de saúde (infra-estrutura de recursos materiais, 
humanos e tecnológicos); (d) apoio econômico (financiamento); (e) gestão (Kleczkowski et 
al., 1984). Representariam “áreas-problema” do sistema de serviços de saúde, isto é, áreas 
nas quais se concentrariam os principais obstáculos identificados nesse sistema. Nesse 
sentido, esses componentes podem ser reconhecidos como alvos de intervenções das 
políticas de saúde para a superação dos problemas diagnosticados. 
Durante a 8a Conferência Nacional de Saúde em 1986, os principais problemas 
identificados no âmbito da prestação da atenção foram: desigualdade no acesso aos 
serviços de saúde, inadequação dos serviços àsnecessidades, qualidade insatisfatória dos 
serviços e ausência de integralidade das ações (CNS, 1987). A partir de então, diversas 
iniciativas têm sido empreendidas em universidades e algumas instituições de saúde no 
sentido de superar tais problemas e construir modelos de atenção mais coerentes com o 
corpo doutrinário da Reforma Sanitária Brasileira. 
A discussão sobre modelos de atenção vem assumindo, progressivamente, certa 
relevância ao ponto de o tema central da 10a Conferência Nacional de Saúde, em 1996, Ter 
sido “SUS: construindo um modelo de atenção para a qualidade de vida”(CNS, 1996). Já 
na XI CNS, realizada em 2000, esta questão reaparece como um dos subtemas de discussão: 
“Modelos de atenção voltados para a qualidade, efetividade, equidade e 
necessidades prioritárias de saúde” (CNS, 2000). 
Assim, o presente capítulo tem como objetivo sistematizar estudos e reflexões 
sobre os modelos assistenciais vigentes, discutindo certas propostas alternativas voltadas 
para a transformação do Sistema de Saúde no Brasil. 
 
ASPECTOS CONCEITUAIS 
 
Modelos assistenciais ou modelos de atenção têm sido definidos como 
combinações tecnológicas utilizadas pela organização dos serviços de saúde em 
determinados espaços-populações, incluindo ações sobre o ambiente, grupos 
populacionais, equipamentos comunitários e usuários de diferentes unidades prestadoras 
de serviços de saúde com distinta complexidade (postos, centros de saúde, hospitais etc.). 
Nesse sentido, não deveriam ser entendidos como um padrão nem exemplo. Modelo 
também não é uma forma de organizar serviços de saúde nem um modo de administrar o 
sistema e os serviços de saúde (Paim, 2002). 
Assim, modelo de atenção é uma dada forma de combinar técnicas e tecnologias 
para resolver problemas e atender necessidades de saúde individuais e coletivas. É uma 
razão de ser, uma racionalidade, uma espécie de “lógica” que orienta a ação. É uma 
maneira de organizar os meios de trabalho (saberes e instrumentos) utilizados nas 
práticas ou processos de trabalho em saúde. Aponta para um determinado modo de dispor 
os meios técnicos-científicos existentes para intervir sobre riscos e danos à saúde. 
Incorpora uma “lógica” que orienta as intervenções técnicas sobre os problemas e 
necessidades de saúde, constituindo um modo de intervenção em saúde. Corresponde, 
portanto, à dimensão técnica das práticas de saúde. 
No presente capítulo, modelos assistenciais, modelos de atenção ou modos de 
intervenção em saúde são entendidos como combinações tecnológicas estruturadas em 
função de problemas de saúde (danos e riscos) que compõem o perfil epidemiológico de 
uma dada população e que expressam necessidades sociais de saúde, historicamente 
definidas. Portanto, não se trata de normas ou exemplos a serem seguidos, mas sim de 
racionalidades diversas que informam as intervenções em saúde (Paim, 2002). 
 
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Os modelos assistenciais podem estar voltados para a “demanda espontânea” 
(modelo médico hegemônico) ou para necessidades de saúde (campanhas e programas 
especiais de saúde pública). Desse modo, dois modelos convivem no Brasil de forma 
contraditória ou complementar: o modelo médico-assistencial privatista e o modelo 
assistencial “sanitarista”. 
 
MODELO ASSISTENCIAL SANITARISTA 
 
O modelo “sanitarista” corresponde à Saúde Pública institucionalizada no Brasil 
durante o século XX, que tem enfrentado os problemas de saúde da população mediante 
campanhas (vacinação, combate às epidemias, reidratação oral etc.) e programas 
especiais (controle de tuberculose e da hanseníase, saúde da criança, saúde da mulher, 
saúde mental etc.). Usualmente essas formas de intervenção não contemplam a totalidade 
da situação de saúde, isto é, concentram sua atenção no controle de certos agravos ou em 
determinados grupos supostamente em risco de adoecer ou morrer. Deixam de se 
preocupar com os determinantes mais gerais da situação sanitária. Consequentemente, 
configuram um modelo assistencial que não enfatiza a integralidade da atenção e não 
estimula a descentralização na organização dos serviços. 
As campanhas de Saúde Pública têm um caráter geralmente temporário, requerem 
uma grande mobilização de recursos e dispõem de uma administração centralizada. Muitas 
vezes aparentam uma operação militar visando ao combate de uma epidemia (cólera, 
dengue etc.), ao controle de determinado agravo à saúde (acidente de trabalho), ou ao 
esclarecimento e à informação da comunidade (AIDS). É como um trabalho de bombeiro, 
tentando sempre “apagar incêndios”. 
As campanhas têm sido consideradas “um mal necessário” para enfrentar problemas 
de saúde que a rede de serviços não conseguiu resolver através das suas atividades usuais. 
É o caso, por exemplo, das campanhas de vacinação (pólio, sarampo etc.) e do controle da 
dengue ou da meningite. Criam problemas na organização e na administração dos serviços 
de saúde, pois desestruturam certas atividades de rotina nos períodos que antecedem e 
sucedem a sua realização, além de apresentarem altos custos. 
Os programas especiais de saúde pública dispõem geralmente de uma 
administração única e vertical, de modo que atravessam instituições, estabelecimentos e 
serviços de saúde de forma individualizada e desintegrada (Teixeira e Paim, 1990). Detêm 
um conjunto de recursos (humanos, materiais e financeiros) e de atividades visando a 
objetivos bem definidos. Apresentam um caráter mais permanente que as campanhas, 
mas, quando geridos verticalmente, propiciam conflitos na ponta do sistema (centros de 
saúde, hospitais e laboratórios) pelas dificuldades de integração com outras atividades dos 
serviços de saúde. Assim, existem programas de controle de tuberculose ou de saúde da 
criança e da mulher que muitas vezes não interagem com os programas e campanhas de 
imunização e com as atividades de vigilância epidemiológica. 
Muitos desses programas são substitutos de campanhas que se prolongaram, 
enquanto outros constituem respostas pontuais e certas mudanças do perfil 
epidemiológico. O seu vínculo institucional tem origem basicamente no Ministério da 
Saúde, passando por metamorfoses institucionais (Campanha de Erradicação da Malária, 
Departamento Nacional de Endemias Rurais, Fundação SESP, Superintendência de 
Campanhas de Saúde Pública, Fundação Nacional de Saúde, Secretaria de Vigilância em 
Saúde etc.) e sendo reproduzidos pelas secretarias estaduais e municipais de saúde. 
 
MODELO MÉDICO-ASSISTENCIAL PRIVATISTA 
 
O modelo médico-assistencial privatista é o mais conhecido e prestigiado, apesar 
de não contemplar o conjunto dos problemas de saúde de toda a população. Predomina no 
 
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Brasil, estando voltado para os indivíduos que, na dependência do seu grau de 
conhecimento e/ou sofrimento, procuram os serviços de saúde por “livre iniciativa”. 
Consequentemente, os indivíduos e os grupos populacionais que não percebam a existência 
de problemas de saúde ou que não estejam alertas para as medidas de prevenção deixarão 
de ser alcançados pelo sistema de saúde, já que não constituiriam uma “demanda 
espontânea”. 
Esse modelo assistencial reforça a atitude dos indivíduos de só procurarem os 
serviços de saúde quando se sentem doentes. Nesse caso, as preocupações das instituições 
de saúde restringem-se a manter em funcionamento uma dada oferta de atendimento. É a 
pressão espontânea e desordenada da demanda que condiciona a organização de recursos 
para a oferta. Outras vezes é a própria oferta, distorcida em relação às necessidades de 
saúde, que determinaria o consumo de serviços médicos. 
No Brasil, o modelo médico-assistencial privatista tem origens na assistência 
filantrópica e na medicina liberal, é fortalecido com a expansão da previdência social e 
consolida-se

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