Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
História e Conceitos de Saúde Pública W BA 01 22 _V 1. 7 2/234 História e Conceitos de Saúde Pública Autora: Andressa Soares de Camargo das Neves Como citar este documento: NEVES Andressa S.C. História e Conceitos de Saúde Pública. Valinhos: 2015. Sumário Apresentação da Disciplina 04 Unidade 1: História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império 06 Unidade 2: História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas 32 Unidade 3: História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista 59 Unidade 4: História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira da Segunda República ao Regime Militar 89 2/234 3/2343 Unidade 5: História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira no Período da Nova República: Aspectos Relevantes das Políticas Públicas de Saúde 117 Unidade 6: História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira: Lei Eloy Chaves, IAPs – Aspectos Relevantes das Políticas Públicas de Saúde 141 Unidade 7: O Papel dos Órgãos Oficiais na Escola Frente à Demanda por Políticas Educacionais que Atendam aos Desafios de uma Sociedade Multicultural 183 Unidade 8: SUS – A Organização e o Funcionamento 208 Sumário História e Conceitos de Saúde Pública Autora: Andressa Soares de Camargo das Neves Como citar este documento: NEVES Andressa S.C. História e Conceitos de Saúde Pública. Valinhos: 2015. 4/234 Apresentação da Disciplina O conteúdo a ser apresentado nesta disciplina foi elaborado com o intuito de capacitar profissionais da área da saúde e áreas afins, para atuarem como agentes transformadores dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), objetivando a prevenção, promoção e recuperação da saúde da população. Nas últimas décadas, o mercado de trabalho relacionado à área da saúde vem apresentando um crescimento significativo. Diante desse fato, torna- se cada vez mais necessária a busca de capacitação dos profissionais para uma melhor e constante atuação dentro dos serviços públicos de saúde. Sendo assim, os profissionais atuantes nesses serviços têm o compromisso de buscar alternativas para a construção de um sistema de saúde resolutivo, humanizado e de boa qualidade. Esta disciplina versará sobre: os fatos históricos e eventos sociais relacionados à saúde pública no Brasil (seu surgimento e desenvolvimento); as políticas de saúde pública e os arranjos institucionais brasileiros; as relações entre Estado e Sociedade e a organização e funcionamento do Sistema Único de Saúde; e os temas conjunturais e tendências de reformas no setor de saúde, entre outros. Não importa que você não se encontre inserido no mercado de trabalho do Sistema Único de Saúde; os conceitos e as experiências da historicidade a serem apresentadas aqui o ajudarão a entender e a refletir por que o modelo de saúde 5/234 pública atual evoluiu e ainda tem muito a evoluir. Prepare-se para embarcar em uma aventura e finalmente entender a história e os conceitos de saúde pública no Brasil. 6/234 Unidade 1 História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império Objetivos 1. Compreender o contexto histórico da Saúde Pública no Brasil do período Colonial ao Império. 2. Abordar os conceitos, organização e funcionamento do cuidado à saúde da população nestes períodos. 3. Apresentar uma análise do processo de saúde pública do Brasil do período Colonial ao Império. Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império7/234 1. Introdução No início do século XVI, Portugal, em seu projeto de expansão ultramarina, chegara às terras brasileiras. Encontrou aqui, entretanto, algo diferente da riqueza em ouro e diamante que procurava. Uma beleza natural tão impressionante, distribuída em uma imensidão territorial. Mas não demorou para que os portugueses percebessem que essas novas terras guardavam mais uma surpresa: habitantes. Seres humanos com um modo de vida completamente diferente do modelo europeu, os chamados índios (VICENTINO; DORIGO, 2012). Os primeiros contatos entre brancos e índios foram de maneira amigável, e pouco a pouco os interesses dos colonizadores passaram a se opor radicalmente aos dos indígenas. Na realidade, a cordialidade dos primeiros contatos era apenas uma forma de preparar para a dominação (VICENTINO; DORIGO, 2012). Link Estimativas apontam que no território brasileiro habitavam pelo menos 5 milhões de índios, por ocasião de Pedro Álvares Cabral, no ano 1500 (<http://www.trilhasdeconhecimentos.etc. br>). http://www.trilhasdeconhecimentos.etc.br http://www.trilhasdeconhecimentos.etc.br Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império8/234 Os portugueses, nesse início, tinham o objetivo de conhecer o potencial econômico do local e entender como eram esses habitantes e seus costumes. Cada tribo indígena teve seu modo de lidar com a nova situação. Algumas viam esses viajantes como deuses, sem perceber perigo em sua chegada e, inclusive, tentavam se comunicar e trocar conhecimentos. Ajudavam, por exemplo, a extrair o pau-brasil, que foi o primeiro produto a ser extraído e exportado da colônia para Portugal em troca de mercadorias como espelhos, pulseiras, entre outras (VICENTINO; DORIGO, 2012). Porém, não demorou muito para que começassem a eclodir diversos conflitos entre nativos e portugueses, os quais culminaram para um verdadeiro genocídio. Muitas tribos foram completamente extintas; os sobreviventes fugiram para o interior do território. Algumas décadas depois, todas as outras tribos encontradas seriam dominadas e catequizadas (VICENTINO; DORIGO, 2012). Para saber mais A captura do índio nativo não proporcionava lucro algum para a metrópole, no máximo gerava um comércio interno e um contato maior entre as diversas regiões da colônia, o que nem sempre era interessante para Portugal, uma vez que tal contato geraria o aquecimento de um mercado interno do qual a metrópole não participava, não recebia tributos e, portanto, não lucrava... Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império9/234 Para saber mais [...]. A relação entre escravidão e comércio fica mais evidente quando se percebe que, embora iniciado pelos portugueses, o tráfico de escravos foi praticado por todas as potências mercantilistas da época moderna, como Holanda, França e Inglaterra. (Mauro Bertoni e Jurandir Malerba. Nossa gente brasileira: textos e atividades para o Ensino Fundamental. Campinas: Papirus, 2001. p. 50). 1.1 Surgimento das Primeiras Doenças no Brasil Os portugueses trouxeram consigo, além das armas de fogo, um poderoso artificio para forçar a colonização. Algo que nem mesmo tinham consciência, mas acabou por lhes favorecer: as doenças que trouxeram, impregnadas em seus próprios corpos, navios e trajes, que não lhes causavam tantos danos graças a sua familiaridade (por exemplo, gripe, sarampo, catapora, pneumonia e varíola), história essa que não foi a mesma para os habitantes nativos que, ao terem contato com essas doenças, começaram a adoecer, enfrentando uma onda de enfermidade e terror (VICENTINO; DORIGO, 2012; AVELAR, 2015). As tribos só podiam, então, contar com seu próprio método rústico e empírico de tratamento de saúde, por meio de seus curandeiros, que embasados em Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império10/234 conhecimentos da flora local (plantas, ervas), desenvolviam uma série de curativos, rituais e remédios para a cura dessas doenças (VICENTINO; DORIGO, 2012; AVELAR, 2015). 1.2 Surgimento das Primeiras Santas Casas de Misericórdias no Brasil Nesse momento histórico, em meados de 1530, a população do Brasil se resumiaa índios e aos portugueses que começavam a chegar para produzir cana- de-açúcar nos engenhos do Nordeste (VICENTINO; DORIGO, 2012). Ainda não havia cidades propriamente ditas, mas nessas pequenas vilas já estavam sendo construídas as primeiras Santas Casas de Misericórdia em Santos, São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro, Belém e Olinda. Vieram, na mesma década, os primeiros jesuítas, para instalar as missões jesuítas (aldeamentos indígenas com objetivo de difusão da fé católica), que contavam com seus conhecimentos básicos de saúde, para que conseguissem ser autônomos, vivendo em localidades, muitas vezes, distantes das vilas. Absorveram muitos conhecimentos dos indígenas, aproveitando seu vasto conhecimento empírico em diversos aspectos (FILHO, 2000). A mão de obra utilizada nesses engenhos de açúcar era escrava. A data aproximada da chegada do primeiro navio negreiro ao Brasil consta em meados de 1531. Nesse Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império11/234 momento, ocorre uma maior expansão das doenças, trazidas por escravos negros, através de navios que não possuíam nenhum tipo de estrutura sanitária (VICENTINO; DORIGO, 2012). Para saber mais [...] O tráfico, o comércio intercontinental de escravos, foi uma atividade extremamente lucrativa para as coroas europeias durante a época moderna, e é pela ótica das práticas mercantilistas que ele deve ser entendido. O escravo era uma das mais valiosas mercadorias que a metrópole vendia para a colônia, enriquecendo os traficantes portugueses e facilitando a exploração do império português. (Mauro Bertoni e Jurandir Malerba. Nossa gente brasileira: textos e atividades para o Ensino Fundamental. Campinas: Papirus, 2001. p. 50). PRIMEIRAS MEDIDAS DE CUIDADOS COM AS QUESTÕES DE SAÚDE NA SOCIEDADE As primeiras medidas de cuidados com a saúde surgiram a partir da preocupação com o bem- estar das pessoas da coroa. Sendo assim, inicia-se um enfoque de fiscalização na saúde, como forma de colocar a atividade médica no poder soberano (GALVÃO, 2015). Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império12/234 A então denominada Fisicatura, órgão máximo a regular as questões relacionadas à saúde, nessa época, era vista como um tribunal que regulamentava a profissão, punia os infratores e reservava para a medicina o espaço da doença e à prática curativa (GALVÃO, 2015). De acordo com Machado (1978), observa-se a relação entre saúde e sociedade com um olhar de zelar pela limpeza das pequenas vilas que estavam sendo estruturadas e construídas. Para saber mais A consideração tanto da cidade, quanto do Porto, do ponto de vista da doença possível, adquire sua significação mais profunda no quadro da política metropolitana, que procura maior controle comercial e militar na colônia, na medida em que se articula com a defesa da riqueza e do território. É frequente nos documentos a ênfase dada no particular cuidado de sua majestade com a saúde dos povos e conservação do Estado. A população vital, aparece como elemento a ser preservado em vida, como vassalos do Rei, povoadores de uma terra disputada e produtora, é neste contexto que sujeira e doença articulam-se como binômio a ser evitado. Como também é a partir dele que se explica o medo e o perigo da peste, na medida em que ela dizima as populações, a ponto de paralisar a cidade e mesmo de diminuir a mão de obra (MACHADO, 1978, p. 559). Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império13/234 Aumentar o nível de saúde e impedir a ocorrência das doenças não era papel efetivo da Câmara, pois atuava de forma local, dispersa e sem continuidade, ficando clara a inexistência de um Projeto de Medicina Social, no que se refere ao campo de saúde pública (GALVÃO, 2015; ROSEN, 1979). Nos casos de aparecimento de doenças como a lepra por exemplo, a Câmara chamava médicos para darem um parecer diagnóstico. Além disso, elaborava um plano preventivo e de combate à doença, por meio de medidas isolamento (quarentena) dos doentes e a inspeção dos navios. Observa-se a ausência de medidas de eliminação das causas das doenças, isto é, de uma ação que incluísse toda a população (ROSEN, 1979). No final do século XIX, o enfoque passa a ser voltado à recuperação do estado de saúde da população, sendo criados os hospitais militares e os de isolamentos – leprosários. Os primeiros têm o intuito de reintegrar o soldado à tropa, e os segundos, o objetivo de assistência x exclusão social. São feitas transformações urbanas, como melhorias na infraestrutura das cidades (COSTA, 1985). Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império14/234 É dado um enfoque médico na importância da circulação livre do ar e da higienização das cidades, com o intuito de reduzir a Link A reclusão dos “leprosos” hoje hansenianos, se embasava nos saberes médicos da regras de salubridade que tentava controlar a população de “leprosos” de Fortaleza na década de 1920 os maiores objetivos para a edificação dos leprosários eram: evitar o “espetáculo” dos leprosos perambulando pelas ruas e tranquilizar a população apavorada, diante da ameaça do contágio, na medida em que o perigo era afastado para longe do maiores centros urbanos. (<goo.gl/R1uSR1>). ocorrência de doenças. Os documentos de 1798 citam a imoralidade (vadiagem) como outro fator causador de doença. Vale lembrar que, nessa época, a medicina e o poder político eram completamente relacionados, logo as conclusões alcançadas, os discursos e ações governamentais eram muito sincronizados (COSTA, 1985). As doenças eram consideradas um problema social, portanto de dever do governo. O alvo da reflexão e da prática medica é a cidade. A medicina era uma forma de apoio científico ao exercício de poder do Estado. As medidas políticas não são mais movidas por ações isoladas e diretas sobre a doença já instalada. O objetivo agora do “médico político” passa http://goo.gl/R1uSR1 Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império15/234 a dificultar ou impedir o aparecimento da doença, descobrindo e eliminando suas causas, para que não interfira mais no bem físico e moral da sociedade (COSTA, 1985). Os chamados “cirurgiões práticos” que atuavam nas Santas Casas de Misericórdia acabaram por receber habilitação. O Brasil não possuía curso superior de medicina, para manter a dependência da metrópole. Nesse período, a Câmara de Minas Gerais tentou pedir, alegando que iria, inclusive, utilizar de recursos próprios, mas foi negada (GALVÃO, 2015). Após 1808, com a chegada da corte portuguesa, foi autorizado o ensino cirúrgico no Brasil. Eram necessários cirurgiões capacitados ou, se disponíveis, médicos, para lecionar, o que não era fácil de encontrar. Quando D. João chega, são criados mais dois cursos de cirurgia, em Salvador e no Rio de Janeiro, enquanto em Minas Gerais o curso foi substituído pelo primeiro de Farmácia, mas era ensinado por bons docentes médicos (ROSEN, 1979). O curioso é que os farmacêuticos formados ajudavam a democratizar a saúde, uma vez que aceitavam trabalhar em locais distantes, e possuíam uma formação superior à dos cirurgiões. Houve grande influência e avanço da visão de saúde com a vinda da família real, pois a saúde passa a ser um objetivo importante do poder central e a visão de necessidade de formação dos colonos se torna algo necessário (GALVÃO, 2015). Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império16/234 A provedoria, uma instituição propriamente médica, passa a controlar a higiene pública com as seguintes atribuições: instituir a quarentena dos navios em um Lazareto, dispor de saneamento para a cidade, controlaros alimentos, pastagens, matadouros e açougues públicos. Surge no Brasil a Polícia Médica, ideia formulada na Alemanha para combater o charlatismo e organizar a saúde. Exemplo: teorias, políticas e práticas para o bem- estar da mãe e sua criança, controle e prevenção de epidemias, organização de estatísticas e conscientização da população (COSTA, 1985). Link A palavra quarentena vem do Italiano QUARANTINA, “conjunto de quarenta”, do Latim QUADRAGINTA, “quarenta”. Com o significado de “período de dias em que se mantinha um barco suspeito de transportar portadores de moléstias infecciosas em isolamento”, é dos anos 1660, determinado pelas autoridades de Veneza. (<http://origemdapalavra.com.br/site/ palavras/quarentena/>) Link O termo Medizinichepolizei, polícia médica, foi utilizado pela primeira vez na Alemanha, em 1764, por Wolfong Thomas Rau, em seu livro “Reflexões sobre a utilidade e a necessidade de um regulamento de polícia médica para um Estado” http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/quarentena/ http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/quarentena/ Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império17/234 Não foi difundida e não conseguiu se concretizar, já que necessitaria de um controle e aceitação. Como instrumento de poder, ela fracassou, mas ajudou a definir melhor os objetivos da higiene pública. Em 1828, a responsabilidade pela saúde passou a ser das Câmaras, uma vez que foi abolido o lugar de provedor-mor da saúde. Essas, por sua vez, não tratavam de assuntos totalmente alheios à saúde, mas sim de questões administrativas da cidade (perdem sua função Link O programa da polícia médica, iniciado no final do século XVIII, consistia nos seguintes pontos: registrar os diferentes fenômenos epidêmicos ou endêmicos, obtendo os dados através da observação da morbidade, pela contabilidade solicitada aos hospitais e aos médicos que exercem a medicina nas diferentes regiões da Alemanha; normalizar o ensino através de um controle pelo Estado dos programas de ensino e da atribuição dos diplomas; criação de um departamento especializado para coletar informações transmitidas pelos médicos, e para controlar a atividade dos profissionais da saúde junto à população; e, finalmente, a criação de um corpo de funcionários médicos competentes, nomeados pelo governo, para interferir diretamente com o seu conhecimento e sua autoridade sobre uma determinada região (<https://www.ufpe.br/proexc/images/publicacoes/cadernos_de_extensao/saude/policia.htm>) https://www.ufpe.br/proexc/images/publicacoes/cadernos_de_extensao/saude/policia.htm Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império18/234 jurídica), O provedor da saúde passou a ser o segundo vereador mais votado, fato que não foi bem aceito pelos médicos. Em seguida, surge a Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, com o intuito de ter um maior controle das doenças mais frequentes na área de saúde pública, lutando pela criação ou reformulação dos regulamentos sanitários (FERREIRA, 2004). Os médicos achavam que a Câmara não tinha competência para controlar questões de saúde, pois eram leigos, mas a real questão era a insatisfação por não ter poder, pois, na prática, não existiram problemas. A sociedade conseguiu que a Câmara aprovasse o Código de postura, em 1832. Nessa época, a política médica começa a ser incorporada, graças a essa representação que a sociedade mencionada fazia da Medicina Social Brasileira, assessorando e criticando, principalmente, medidas sanitárias. Por isso, em 1835, é transformada em Academia Imperial de Medicina (GALVÃO 2015; ROSEN, 1979). No ano de 1849, surgem os primeiros casos de febre amarela no Rio de Janeiro, ficando visível a precariedade da organização sanitária municipal. A junta de Higiene Pública é criada em 1850, visando unificar os serviços sanitários do Império. Alguns marcos sequenciais importantes ocorreram: a reforma dos Serviços Sanitários do Império, que foram divididos em Serviço Sanitário Terrestre e Serviço Sanitário Marítimo e o Conselho Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império19/234 Superior de Saúde Pública, que tinha como objetivo normatizar as questões de higiene e salubridade geral (GALVÃO, 2015). Link Mas a partir de 1850 a cólera começou a reverter a balança do saber médico em direção às teorias do contágio por germes. O primeiro sinal da mudança surgiu de um verdadeiro trabalho de “médico-detetive” feito pelo inglês John Snow. Trabalhando como se estivesse conduzindo um experimento, por tentativa e erro, o médico inglês conseguiu descobrir que um surto violento no centro da cidade de Londres, que chegou a vitimar 500 pessoas entre 31 de agosto e 10 de setembro de 1854, provinha de uma bomba d’água contaminada usada pela população local. (<http://www.scielo.br/pdf/physis/v4n1/05. pdf>) http://www.scielo.br/pdf/physis/v4n1/05.pdf http://www.scielo.br/pdf/physis/v4n1/05.pdf Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império20/234 Glossário Brasil Colônia: período de chegada dos primeiros portugueses ao Brasil em 1500 e durou até a independência em 1822 (BRASIL COLÔNIA, 2015). Brasil Império: período da história do Brasil que se iniciou com a Independência em 7 de setembro de 1882 e terminou com a Proclamação da República em 15 de novembro de 1889, durando pouco mais de 67 anos (BRASIL IMPÉRIO, 2015). MedizinichepolizeiI: Significa polícia médica. Questão reflexão ? para 21/234 Como você pode perceber, o surgimento histórico das doenças no Brasil sugere uma necessidade de implantação de medidas de limpeza pública das cidades, a fim de prevenir e controlar os diversos tipos de doenças ocorridas na época. Reflita sobre essa situação e descreva uma ou mais situações da ocorrência de doenças que mostrem exemplos desta situação na atualidade. 22/234 Considerações Finais Na história da saúde percebemos claramente a influência de fatores sociais, políticos e econômicos; ao longo dos séculos, observamos a evolução e conceituação da saúde vinculada a benefícios da classe social alta e exclusão das classes sociais baixas; o surgimento das primeiras medidas relacionadas com a limpeza pública das cidades e a fiscalização dos navios ocorre devido a interesses de bem-estar da classe social alta; o enfoque do capitalismo é visível e constante desde o descobrimento do país. Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império23/234 Referências AVELAR, P. R. Surgimento da saúde no Brasil. Juiz de Fora. Disponível em: <http://www.ufjf.br/ oliveira_junior/files/2011/08/Aula-6-EcoUFJF.pdf>. Acesso em: 20 out. 2015. BRASIL COLÔNIA. Descobrimento do Brasil. Disponível em: <http://brasil-colonia.info/>. Acesso em: 23 dez. 2015. BERTOLOZZI, M. R.; GRECO, R. M. As políticas de saúde no Brasil: reconstrução histórica e perspectivas atuais. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v30n3/v30n3a04>. Acesso em: 20 ago. 2015. COSTA, N. R. Lutas urbanas e controle sanitário: origens das políticas de saúde no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1985. ESCOLA BRITANNICA. Brasil Império. Disponível em: <http://escola.britannica.com.br/levels/ fundamental/article/Brasil-Imp%C3%A9rio/483127>. Acesso em: 23 dez. 2015. FERREIRA, A. A. L. A História das Ciências e a Nova História: Indícios para os Estudos Históricos no Campo da Saúde. Cadernos de Saúde Pública, v. 13 n.2 p. 471-492, 2004. FILHO, W. C. P. The Santa Casa de Misericórdia of São Paulo. Acta Medica Misercordiae, São Paulo, v. 3, n. 1, p. 25-27, fev. 2016. GALVÃO, M. A. M. Origem das políticas de saúde pública no Brasil: Do Brasil-Colônia a 1930. http://www.ufjf.br/oliveira_junior/files/2011/08/Aula-6-EcoUFJF.pdf http://www.ufjf.br/oliveira_junior/files/2011/08/Aula-6-EcoUFJF.pdfhttp://brasil-colonia.info http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v30n3/v30n3a04 http://escola.britannica.com.br/levels/fundamental/article/Brasil-Imp%C3%A9rio/483127 http://escola.britannica.com.br/levels/fundamental/article/Brasil-Imp%C3%A9rio/483127 Unidade 1 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Período Colonial ao Império24/234 Ouro Preto. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/origem_politicas_ saude_publica_brasil.pdf>. Acesso em: 23 ago. 2015. MACHADO, R.; LOUREIRO, Â.; LUZ, R.; MURICY K. Danação da Norma: Medicina Social e constituição da psiquiatria no Brasil. Rio de Janeiro: Graal, p. 559, 1978. ROSEN, G. Da polícia médica à medicina social: ensaios sobre a história da assistência médica. Rio de Janeiro: Graal, 1979. VICENTINO, C.; DORIGO, G. História do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Scipione, 2012. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/origem_politicas_saude_publica_brasil.pdf http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/origem_politicas_saude_publica_brasil.pdf 25/234 1. No período do Brasil colônia, os portugueses trouxeram diversas doenças aos índios, entre elas: a) Varíola, sarampo e rubéola. b) Varíola, gripe, tuberculose, rubéola. c) Varíola, gripe, sarampo, catapora e pneumonia. d) Varíola, sarampo e catapora. e) Varíola, hanseníase, sarampo e rubéola. Questão 1 26/234 2. As Santas Casas de Misericórdias surgiram no Brasil em meados de 1530: a) em Olinda, Vitória, Rio de Janeiro; b) em Santos, São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro, Belém e Olinda; c) somente nas cidades de Olinda, São Paulo e Santos; d) somente nas cidades de Santos, São Paulo e Rio de Janeiro; e) somente nas cidades de Olinda, Vitória e São Paulo. Questão 2 27/234 3. A Fisicatura era: a) um determinado grupo da corte nomeada pelo Rei; b) uma comissão de indígenas que lutavam pelos seus direitos; c) uma disciplina da faculdade de medicina da época; d) órgão máximo que tratava das questões de saúde, com regulamentação da profissão de medicina; e) órgão máximo que tratava das questões de saúde, com regulamentação da profissão de farmácia. Questão 3 28/234 4. Durante o tempo entre o período Colonial e o Império, o Hospital Mili- tar foi construído com o intuito de: a) prestar assistência aos índios; b) prestar assistência aos colonizadores; c) prestar assistência à família real; d) reintegrar os soldados as tropas; e) prevenir a disseminação de epidemias. Questão 4 29/234 5. O leprosário foi construído com o objetivo de: a) prevenir e tratar a lepra; b) dar assistência à corte Real; c) agir como entidade assistencial que protegia a cidade do perigo de contágio; d) funcionar como entidade preventiva e assistencial nos casos de moléstias infectocontagiosas; e) ser um hospital voltado para doentes pobres que moravam no centro dos municípios. Questão 5 30/234 Gabarito 1. Resposta: C. Os portugueses trouxeram consigo, além das armas de fogo, um poderoso artifício para forçar a colonização. Algo que nem mesmo tinham consciência, mas acabou por lhes favorecer: as doenças, impregnadas em seus próprios corpos, navios e trajes, mas que não lhes causavam tantos danos graças a sua familiaridade (exemplo: gripe, sarampo, catapora, pneumonia e varíola). 2. Resposta: B. No período Colonial ao Império, no Brasil surgiram as primeiras instituições de Santas Casas de Misericórdias, nas localidades de Santos, São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro, Belém e Olinda. 3. Resposta: D. A chamada Fisicatura, órgão máximo para as questões de saúde nesta época, era considerada um tribunal com regulamentação da profissão, que tinha o objetivo de punir os infratores e reservar para a medicina o espaço da doença e reduzia-se a legalização da prática curativa. 4. Resposta: D. No final do século XIX, o enfoque muda e o poder colonial assume a questão da 31/234 Gabarito recuperação do estado de saúde de seus habitantes. São criados os hospitais militares, com o intuito de reintegrar o soldado a tropa. 5. Resposta: C. No final do século XIX, o enfoque muda e o poder colonial assume a questão da recuperação do estado de saúde de seus habitantes, criando os leprosários com o intuito de entidade assistencial de exclusão social que protegia a cidade do perigo de contágio. 32/234 Unidade 2 História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas Objetivos 1. Aprimorar conhecimentos de profissionais da área da saúde e afins sobre os pontos relevantes no contexto histórico da saúde pública no Brasil no período da Primeira República à Era Vargas. 2. Abordar os conceitos, organização e funcionamento do sistema de saúde. 3. Apresentar uma análise do processo de saúde pública do Brasil do período da Primeira República à Era Vargas. Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas33/234 1. Introdução No início do período da Primeira República, o país foi comandado pelas oligarquias, ou seja, os estados mais ricos, que possuíam grande produção de café. Sendo assim, aplicavam seu lucro no desenvolvimento de suas cidades, acelerando, dessa forma, o crescimento urbano (GOMES; FERREIRA, 2015). Nesse momento, são adotados os saberes experimentais da bacteriologia e da microbiologia, de forma a questionar os saberes tradicionais para a época que era baseado na teoria dos miasmas (FERREIRA, 2012; GOMES; FERREIRA, 2015). A organização dos programas de serviços de saúde voltava-se para as doenças coletivas, sendo que as investigações eram feitas em instituições estatais, seguindo um modelo etiológico centrado no controle dos insetos e animais vetores (GOMES; FERREIRA, 2015). A preocupação dos estados com as cidades era evidente e baseada em uma visão capitalista, focada na preservação da força de trabalho das classes sociais mais baixas, e ainda em preservar a segurança da classe alta que residia no meio urbano, ou seja, buscava eliminar doenças transmissíveis, como varíola, peste e febre amarela. A cidade de São Paulo, vista nesse período como cidade portuária, foi a primeira que implantou os empreendimentos de higiene Link Oligarquia” como termo tomado na sua acepção clássica, platônica e aristotélica, de governo dos ricos ou, por derivação, como o grupo dos ricos. (GAZMURI, 2004, p. 65) Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas34/234 pública. Iniciam-se as fortes e intensas intervenções higienistas na cidade, que na época era considerada uma das mais ricas das oligarquias. Ocorre, então, um alto investimento para a área da saúde pública. E, assim, as fiscalizações tornaram-se mais rigorosas, e ficou obrigatória a notificação oficial de todos os casos de doenças infectocontagiosas (GALVÃO, 2015; HORTON, 2011). Antes da criação dessas instituições de saúde pública e dos investimentos gerados, a política sanitária ficava sem meios de apoio, devido à inexistência, por exemplo, de análises químicas e bacteriológicas. Nesse momento, então, com o avanço da ciência, inicia-se realmente um controle dos ambientes da cidade, e melhora, assim, o entendimento dos aspectos sociais das populações urbanas (HORTON, 2011). Nas primeiras décadas do século XIX (1820), chegaram ao país inúmeros imigrantes europeus, mas, nesse período, as condições sanitárias para a entrada e permanência no país eram cada vez mais difíceis. Com a falta de políticas sociais e de saúde, ocorreu a disseminação de epidemias como a febre amarela e peste bubônica (GALVÃO, 2015). Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas35/234 Nesse momento, os emigrantes traziam doenças raras, como a cólera, a escarlatina e o tifo, o que resultava na ocorrência de diversos tipos de surtos em toda a população, sendo necessária a ampliação dos institutos bacteriológicos(HORTON, 2011). E a preocupação do governo era com o saneamento dos portos de várias cidades do litoral, porém seu maior objetivo era nos problemas médico-sanitários do Rio de Janeiro. Ocorreram ainda a criação dos seguintes serviços vinculados à área da saúde (HORTON, 2011): • A Inspetoria Geral de Higiene que realizava a inspeção das habitações populares, do serviço de vacinação, da alimentação pública; Para saber mais O estudo das epidemias de peste no Brasil, iniciou –se no Rio de Janeiro, no início do século XX. Neste período podemos observar que a epidemia abordou duas questões fundamentais: a criação do Instituto Soroterápico Federal, hoje Fundação Oswaldo Cruz, cuja principal finalidade por ocasião de sua inauguração foi a fabricação do soro para combater a Peste Bubônica, e a campanha de saneamento comandada por Oswaldo Cruz. (<http://www.hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh4/ trabalhos/Vagner%20Souza.pdf>) http://www.hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh4/trabalhos/Vagner%20Souza.pdf http://www.hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh4/trabalhos/Vagner%20Souza.pdf Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas36/234 • o Laboratório de Bacteriologia; • a Inspetoria Geral de Saúde dos Portos; • o Instituto Sanitário Federal com atribuições semelhantes ao Laboratório de Bacteriologia, ou seja, estudar natureza, etiologia, profilaxia e tratamento de doenças transmissíveis. Em 1893, com a direção de Adolfo Luiz, o instituto de São Paulo inicia o planejamento e a aplicação sistemática das técnicas de bacteriologia e da parasitologia na prática de saúde, organizando um laboratório sob direção de Vital Brasil, para fabricação de soros e vacinas. O pioneiro Emílio Ribas realizou grandes esforços em saúde pública no estado de São Paulo, com vasta aplicação de medidas sanitárias e combate intensivo contra epidemias (em especial a febre amarela) e outros tipos de doenças endêmicas (RIBEIRO, 2010). Desde 1849, a febre amarela apresentava taxa de mortalidade alta, permanecendo endêmica ao longo da costa litorânea e epidêmica nos centros urbanos. Até 1900, a frequência e regularidade com que a doença atacava o Rio de Janeiro, proporcionaram ao Brasil o rótulo de uma das áreas mais insalubres dos trópicos (FERREIRA, 2012). Nesse mesmo período histórico, observam-se os seguintes acontecimentos (CARVALHO, 2013; DANTES, 2003): Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas37/234 • A criação da Diretoria Geral de Saúde Pública no ano de 1897; • a organização do Instituto Soroterápico Municipal (Oswaldo Cruz) em 1900 a partir de uma grande epidemia de peste, que ocasionou uma crise sanitária e estimulou mudanças nas iniciativas do poder central em nível nacional; • Oswaldo Cruz assume em 1903 a Diretoria Geral de Saúde Pública com o intuito de acabar com a doença de febre amarela no município do Rio de Janeiro. E, para isso, adotou medidas autoritárias para destruir os mosquitos como, por exemplo: determinava aos 1500 guardas sanitários que entrassem nas casas sem pedir permissão e demolissem as construções antigas e expulsassem os moradores queimando os colchões dos doentes, o que gerou descontentamento popular; • a aprovação da lei no ano de 1904 sobre a vacinação e revacinação obrigatória contra a varíola, o que resultou em um conflito muito grande denominado posteriormente como Revolta da Vacina; • O chamado modelo campanhista criado por Oswaldo Cruz, concebido dentro de uma visão militar em que os fins justificam os meios e no qual o uso da força e da autoridade era considerado o instrumento preferencial de ação. Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas38/234 Apesar das arbitrariedades e dos abusos cometidos em decorrência do modelo campanhista, obtiveram-se importantes vitórias no controle das doenças epidêmicas, conseguindo, inclusive, erradicar a febre amarela da cidade do Rio de Janeiro, o que fortaleceu o modelo proposto e o tornou hegemônico como proposta de intervenção. Sendo assim, Oswaldo Cruz procurou organizar a diretoria geral de saúde pública, criando uma seção demográfica, um laboratório bacteriológico, um serviço de engenharia sanitária e de profilaxia da febre-amarela, a inspetoria de isolamento e desinfecção, e o instituto soroterápico federal, posteriormente transformado no Instituto Oswaldo Cruz (SANTOS et al., 2007). Durante a reforma feita por Oswaldo Cruz, foram incorporados como elementos das ações de saúde (SANTOS et al., 2007): • o registro demográfico, possibilitando conhecer a composição e os fatos vitais de importância da população; • a introdução do laboratório como auxiliar do diagnóstico etiológico; • a fabricação organizada de produtos profiláticos para uso em massa. Esse mandato durou até 1908, quando a lei da vacinação deixa de ser obrigatória. No ano de 1914, foi elaborado um novo regulamento para a Diretoria Geral de Saúde Pública, com características parecidas com as que ocorriam na gestão de Oswaldo Cruz. No restante do país, Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas39/234 situam-se as campanhas contra a malária como não era transmissível e se mantinha nas camadas populares, não tinha importância (FERREIRA, 2012). Para saber mais A campanha de erradicação da varíola no Brasil que vacinou e revacinou mais de 80 milhões de pessoas ocorreu entre os anos de 1966 a1973. Esta se deu no âmbito do Programa de Erradicação da Varíola da Organização Mundial da Saúde (OMS) entre 1967 e 1980, ano em que a varíola foi declarada erradicada (<http://www. scielo.br/pdf/csc/v16n2/v16n2a02.pdf>) A Cruz Vermelha Brasileira em 1916 criou uma escola de enfermagem no Rio de Janeiro, subordinada ao Ministério da Guerra, que preparava os enfermeiros em curso de dois anos de duração, com o objetivo de treinar socorristas voluntários, e em 1920, na mesma escola, foi criado o curso de visitadoras sanitárias (GOMES; FERREIRA, 2015; FERREIRA, 2012). Link A Escola de Enfermagem da Cruz Vermelha, na época era vinculada ao Ministério da Guerra e a Escola de Enfermagem Alfredo Pinto no Rio de Janeiro, vinculada ao Ministério da Justiça (<http:// www.scielo.br/pdf/tce/v18n4/16.pdf>). Em 1918, a gripe espanhola devastou diversas cidades, demostrando o quanto a questão de saúde pública estava frágil. http://www.scielo.br/pdf/csc/v16n2/v16n2a02.pdf http://www.scielo.br/pdf/csc/v16n2/v16n2a02.pdf http://www.scielo.br/pdf/tce/v18n4/16.pdf http://www.scielo.br/pdf/tce/v18n4/16.pdf Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas40/234 Além disso, ocorreram greves gerais nas fábricas e toda essa situação causava temor, pois poderia desencadear uma revolução como a ocorrida na Rússia. Nesse ano, foi criada a Liga Pró-Saneamento do Brasil, que congregou os maiores nomes do pensamento sanitarista, pois foi uma ideia da formação de um serviço de saúde pública, o qual pudesse enfrentar os problemas das áreas urbanas (DANTES, 2003; FERREIRA, 2015). Nota-se uma gravíssima situação sanitária das áreas rurais, e cria-se em maio desse mesmo ano (1918) o Serviço de Profilaxia Rural como o objetivo de controlar as 3 grandes endemias das regiões agrárias do país: a ancilostomose, a malária e a doença de Chagas. Então, veio a sugestão de solução dos problemas sanitários nacionais: a criação de um Ministério de Higiene e Saúde Pública, por parte da Liga Pró-Saneamento que compreenderia (GRECO, 2015): • uma Inspetoria de saúde pública do Distrito federal; • uma Inspetoria Geral de Profilaxia Rural e urbana dos estados; • uma Inspetoria de Saúde dos Portos e Rios; • Inspetoria de Demografia Sanitária. Link Na América Latina,essa doença figura entre as quatro principais endemias, sendo um dos seus maiores problemas sanitários (<http://www. saude.rs.gov.br>). http://www.saude.rs.gov.br http://www.saude.rs.gov.br Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas41/234 Surge, então, a primeira Lei de Acidentes de Trabalho (1919). Em 1920, Carlos Chagas, sucessor de Oswaldo Cruz, reestrutura o Departamento Nacional de Saúde Pública, então ligado ao Ministério da Justiça, e introduz a propaganda e a educação sanitária na técnica rotineira de ação, inovando o modelo campanhista de Oswaldo Cruz, que possuía puramente enfoque fiscal e policial. Inicia-se a extensão pública dos serviços de saneamento urbano e rural, além da higiene industrial e materno-infantil, e começa um movimento sanitário por uma educação sanitária (FERREIRA, 2012; GALVÃO, 2015). São criados os órgãos especializados na luta contra a tuberculose, a lepra e as doenças venéreas e assistência hospitalar, infantil e a higiene industrial começam a se destacar como problemas individualizados. Ocorrem inovações na legislação de 1920 em relação à vigilância das condições de trabalho de mulheres e crianças e controle sobre qualidade de alimentos. Expandem- se as atividades de saneamento para outros estados, além do Rio de Janeiro (GALVÃO, 2015). A república pode ser vista, em termos de saúde, como um período de politização do movimento sanitarista no Brasil. Esse movimento perde a força ideológica, com o início da Era Vargas (1930- 1945), quando foi criado o Ministério da Educação e Saúde, desintegrando as atividades do Departamento Nacional de Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas42/234 Saúde Pública (vinculado ao Ministério da Justiça) e transformando a reforma sanitária em um projeto governamental. Vale dizer que o caráter dessa política continuou sendo restrito, pois limitava-se apenas à cobertura de certos segmentos de trabalhadores (DANTES, 2003; FERREIRA, 2015). Com a Revolução de 1930, as frações das oligarquias, o tenentismo e as classes médias urbanas, mudaram a estrutura de poder, reduzindo o poder oligárquico e aumentando o poder dos estratos sociais pertencentes à burguesia. As ocorrências de surtos epidêmicos se intensificaram, devido à piora das condições de vida, decorrentes principalmente do excesso populacional e da falta de infraestrutura sanitária (SANTOS et al., 2007). Em 1932, foram criados os Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), tendo sido vistos como resposta, por parte do Estado, às lutas e reivindicações dos trabalhadores no contexto de consolidação dos processos de industrialização e urbanização brasileiros. Acentua-se, assim, o componente de assistência médica, em parte por meio de serviços próprios, mas, principalmente, por meio da compra de serviços do setor privado. Devido à intensa inflação da época, acentuou a piora das condições de vida, fenômeno que se refletiu nas demandas por saúde e assistência médica. Os Institutos de Assistência Previdenciária (IAPs), que, a princípio, não se dispunham a fornecer esse tipo de cobertura, começaram Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas43/234 a diferenciar-se em suas estruturas, prestando serviços no âmbito da assistência médica (CARVALHO, 2013). A aceleração do crescimento industrial aumentava a preocupação com a manutenção da força de trabalho em condições de produção, bem como na sua reintegração rápida ao processo de produção. Para responder a essas demandas, várias instituições de trabalho passaram a criar serviços de atendimento ambulatorial próprios, de caráter terapêutico e, alguns, em nível de reabilitação (DANTES, 2003). Em 1933, foi criado o primeiro Instituto de Aposentadoria e Pensões: o dos Marítimos (IAPM). Seu decreto de constituição definia, no artigo 46, os benefícios assegurados aos associados (RIBEIRO, 2010): a) aposentadoria; b) pensão em caso de morte para os membros de suas famílias ou para os beneficiários, na forma do art. 55; c) assistência médica e hospitalar, com internação até trinta dias; d) socorros farmacêuticos, mediante indenização pelo preço do custo acrescido das despesas de administração. § 2º – O custeio dos socorros mencionados não deverá exceder à importância correspondente a 8%, da receita anual do Instituto, apurada no exercício anterior, sujeita a respectiva verba à aprovação do Conselho Nacional do Trabalho. Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas44/234 No ano de 1934, é criado o Ministério da Agricultura e em 1942, o Ministério da Higiene e Segurança do Trabalho, que se vincula ao Ministério do Trabalho. Ainda na Era Vargas, observamos algumas Para saber mais Órgão criado pelo Decreto nº 16.027, de 30 de abril de 1923, vinculado ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio e destinado à consulta dos “poderes públicos em assuntos referentes à organização do trabalho e da previdência social”. Em 9 de setembro de 1946, pelo Decreto nº 9.797, transformou-se no Tribunal Superior do Trabalho (<http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/ verbete-tematico/conselho-nacional-do- trabalho-cnt>). estruturações, como (SANTOS et al., 2007; GOMES; FERREIRA, 2015): • saúde pública institucionalizada pelo Ministério da Educação e Saúde Pública; • previdência social e saúde ocupacional institucionalizadas pelo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio; • campanhas de saúde pública contra a febre amarela e a tuberculose; • Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs) estendem a previdência social à maior parte dos trabalhadores urbanos (1933-38). http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/conselho-nacional-do-trabalho-cnt http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/conselho-nacional-do-trabalho-cnt http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/conselho-nacional-do-trabalho-cnt Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas45/234 Entre os principais desafios encontrados nesse período está a predominância de endemias rurais (por exemplo, doença de Chagas, esquistossomose, ancilostomíase e malária), tuberculose, sífilis e deficiências nutricionais (ROYQUAROL, 2003). Em 1941, instituiu-se a reforma Barros Barreto, em que se destacam as seguintes ações (DANTES, 2003; CARVALHO, 2013): • Instituição de órgãos normativos e supletivos destinados a orientar a assistência sanitária e hospitalar; • criação de órgãos executivos de ação direta contra as endemias mais importantes (malária, febre amarela, peste); • fortalecimento do Instituto Oswaldo Cruz, como referência nacional; • descentralização das atividades normativas e executivas por oito regiões sanitárias; • destaque aos programas de abastecimento de água e construção de esgotos, no âmbito da saúde pública; • atenção aos problemas das doenças degenerativas e mentais, com a criação de serviços especializados de âmbito nacional (Instituto Nacional do Câncer). A escassez de recursos financeiros associada à pulverização desses recursos e de pessoal entre diversos órgãos e setores, Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas46/234 aos conflitos de jurisdição e gestão, e superposição de funções e atividades, fizeram com que a maioria das ações de saúde pública no Estado Novo se reduzisse a meros aspectos normativos, sem efetivação no campo prático de soluções para os grandes problemas sanitários existentes no país naquela época (GRECO, 2015). Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas47/234 Glossário Oligarquias: oconceito micheliano de oligarquia permite identificar processos mediante os quais certos grupos apoderam-se do poder organizacional, entrincheirando-se e tornando-se infensos a controles, sejam eles democráticos ou meritocráticos (COUTO, 2012). Endemias: e a presença constante de uma doença ou de um agente infeccioso em determinada área geográfica (ROYQUAROL, 2003). Desinfeção: eliminação de agentes infecciosos que se encontram fora do corpo, por meio de exposição direta a agentes químicos ou físicos (ROYQUAROL, 2003). Questão reflexão ? para 48/234 Como você pode perceber, o período da Primeira República até a Era Vargas passou por inúmeras situações de endemias. Reflita sobre essa situação e descreva uma ou mais situações da ocorrência de endemias em algumas localidades brasileiras, citando os tipos de doenças mais frequentes em cada uma delas. 49/234 Considerações Finais No período da Primeira República o Brasil, foi comandado pelas oligarquias (estados mais ricos) que possuíam grande produção de café, sendo assim, aplicavam seu lucro no desenvolvimento de suas cidades; As endemias foram frequentes neste período; O enfoque capitalismo permanece também nesse período. Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas50/234 Referências CARVALHO, G. A saúde pública no Brasil: Estudos Avançados. São Paulo, v. 27, n. 78, p. 1-22, abr. 2013. COUTO, C. G. Oligarquia e processos de oligarquização: O aporte de Michels à análise política contemporânea. Rev. Sociology Polític, Curitiba, v. 20 n. 44, p. 47-62, agost. 2012. DANTES, M. A. Medicina e saúde pública na Primeira República: O encontro de historiadores da ciência. ANPUH – XXII Simpósio Nacional de História. João Pessoa, 2003. FERREIRA, L. C. Educação e saúde na Primeira República: Debates e reformas entre 1910 2e 1920. Revista Nupem. Campo Mourão, v. 4, n. 6, p. 103-118, jan/jul. 2012. GALVÃO, M. A. M. Origem das políticas de saúde pública no Brasil: Do Brasil-Colônia a 1930. Ouro Preto. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/origem_politicas_ saude_publica_brasil.pdf>. Acesso em: 23 ago. 2015. GOMES, A. M. C.; FERREIRA, M. M. Primeira República: um balanço historiográfico. Disponível em: <periodicos.ufrn.br>. Acesso em: 30 nov. 2015. GRECO R. M.; BERTOLOZZI, M. R. As políticas de saúde no Brasil: reconstrução histórica e perspectivas atuais. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v30n3/v30n3a04>. Acesso em: 30 nov. 2015. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/origem_politicas_saude_publica_brasil.pdf http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/origem_politicas_saude_publica_brasil.pdf https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=4&cad=rja&uact=8&ved=0ahUKEwiR4cSlzPLTAhXICpAKHbTXBvgQFghBMAM&url=https%3A%2F%2Fperiodicos.ufrn.br%2Finterlegere%2Farticle%2Fdownload%2F6407%2F5010&usg=AFQjCNGOfEQd7vxwsGhg81X5WEFjMd35Bg http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v30n3/v30n3a04 Unidade 2 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira na Primeira República à Era Vargas51/234 HORTON, R. Saúde no Brasil. Londres: The Lancet, p. 1-7, 2011. MELLO, A. O.; CESAR, É.; BELTRAME, M. V.; HEBERLE, R. O discurso sanitarista como discurso político e ideológico na República Velha, Porto Alegre. v. 3. n. 3. p. 92-106, dez. 2010. RIBEIRO, Carla T. M; RIBEIRO, Márcia G; ARAÚJO, Alexandra P; MELLO, Lívia R; RUBIM, Luciana C; FERREIRA, Joyce E. S. O sistema público de saúde e as ações de reabilitação no Brasil. Revista Pernanbucana Salud Publica Rio de Janeiro, v. 28, n. 1, p. 43-8, 2010. ROYQUAROL, M. Z. Epidemiologia e saúde. Rio de Janeiro: Medsi, 2003. SANTOS, L. A. C. de; BARBOSA I. C.; GOMES, M. L. Saúde no governo Vargas (1930-1945): Dualidade Institucional de um bem público. Rio de Janeiro. Fiocruz, 2007. 52/234 1. Qual a primeira cidade brasileira a investir em empreendimentos de higiene pública? a) Rio de Janeiro b) Minas Gerais c) São Paulo d) Salvador e) Recife Questão 1 53/234 2. São fatores que contribuíram para um quadro de desordem da saúde no RJ, no início do sec. XIX, exceto: a) Imigração europeia. b) Crescimento desordenado das cidades. c) Aparição de novas doenças. d) Epidemia de febre amarela. e) Ampliação do Instituto Bacteriológico. Questão 2 54/234 3. No final do século XIX, qual doença mais contribuía para a fama do Brasil de uma das áreas mais insalubres dos trópicos? a) Tifo b) Sarampo c) Febre amarela d) Gripe e) Hantavírus Questão 3 55/234 4. Sobre o sistema de saúde pública durante o Estado Novo, é correto afirmar, em síntese, que: a) o sistema de saúde tinha boa estruturação e funcionava bem na prática; b) o sistema de saúde não tinha nenhuma estruturação e não funcionava bem; c) o sistema de saúde não tinha nenhuma estruturação, mas funcionava bem; d) o sistema de saúde tinha estruturação, mas não funcionava na prática; e) não existia um sistema de saúde pública, mas por ação de voluntários as pessoas doentes eram bem atendidas. Questão 4 56/234 5. Qual afirmativa completa o texto corretamente? A população do RJ encontrava-se insatisfeita com as medidas radicais tomadas por ________________. Seu modelo ________________ começa, no objetivo de erradicar (3), mas é durante uma campanha obrigatória contra ________________ que eclode uma grande revolta popular, conhecida como ________________. a) Oswaldo Cruz / campanhista / febre amarela / o sarampo / Revolta da Vacina b) Oswaldo cruz / campanhista / tuberculose / a varíola / Revolta da Vacina c) Carlos Chagas / sanitarista / tuberculose / o tifo / Revolta da Vacina d) Oswaldo Cruz / campanhista / febre amarela / a varíola / Revolta da Vacina e) Carlos Chagas / sanitarista / febre amarela / o sarampo / Revolta da Vacina Questão 5 57/234 Gabarito 1. Resposta: C. A cidade de São Paulo, vista nesse período como cidade portuária, foi a primeira que implantou os empreendimentos de Higiene Pública. Iniciaram-se as fortes e intensas intervenções higienistas na cidade, que na época era considerada uma das mais ricas das oligarquias. 2. Resposta: E. Os fatores que contribuíram para um quadro de desordem da saúde no RJ, no início do século XIX, foram: imigração europeia; crescimento desordenado das cidades; aparição de novas doenças; epidemia de febre amarela. 3. Resposta: C. Desde 1849, a febre amarela apresentava taxa de mortalidade alta, permanecia endêmica ao longo da costa litorânea e epidêmica nos centros urbanos. Até 1900, a frequência e regularidade com que a doença atacava o Rio de Janeiro, a grande susceptibilidade dos estrangeiros à doença e o fracasso da Medicina em resolver o problema deram ao Brasil a reputação de uma das áreas mais insalubres dos trópicos. 4. Resposta: D. A escassez de recursos financeiros associada à pulverização desses recursos e de pessoal entre diversos órgãos e setores, 58/234 aos conflitos de jurisdição e gestão, e superposição de funções e atividades, fizeram com que a maioria das ações de saúde pública no Estado Novo se reduzisse a meros aspectos normativos, sem efetivação no campo prático de soluções para os grandes problemas sanitários existentes no país naquela época. 5. Resposta: D. A população do RJ encontrava-se insatisfeita com as medidas radicais tomadas por Osvaldo Cruz. Seu modelo campanhista começa, no objetivo de erradicar febre amarela, mas é durante uma campanha obrigatória contra varíola que eclode uma grande revolta popular, conhecida como Revolta da Vacina. 59/234 Unidade 3 História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista Objetivos 1. Aprimorar os conhecimentos de profissionais da área da saúde e áreas afins, sobre os pontos relevantes no contexto histórico da saúde pública brasileira no contexto do saneamento dos portos e do sanitarismo campanhista. 2. Abordar os conceitos, organização efuncionamento do saneamento dos portos e do sanitarismo campanhista. Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista60/234 1. Introdução A instalação oficial da vigilância sanitária no Brasil ocorreu em 28 de janeiro de 1808, quando D. João VI assinou em Salvador (BA), então capital brasileira, a carta régia que “abriu os portos às nações amigas”. Impôs-se um controle sanitário mais efetivo não só dos portos, mas também dos navios e passageiros que chegavam ao Brasil. Em 1808, com a transferência da família real para o Brasil, foram feitas profundas mudanças na cidade do Rio de Janeiro, visando adequá-la à condição de sede da corte portuguesa na América (BARBOSA, 1909). Essas transformações procuraram garantir a higiene e a salubridade urbana. A organização dos serviços sanitários instalados por D. João VI no Brasil enfocou o controle das doenças epidêmicas, com especial atenção para as cidades portuárias, mais propícias à sua ocorrência pela intensa circulação de pessoas e mercadorias. Inicialmente, as questões sanitárias relacionadas ao combate às Link Carta de Sua Majestade escrita ao Governador e Capitão Geral deste Estado, Dom João de Alencastro, sobre as sesmarias (<http://memoria.bn.br/pdf/094536/ per094536_1949_00084.pdf>) http://memoria.bn.br/pdf/094536/per094536_1949_00084.pdf http://memoria.bn.br/pdf/094536/per094536_1949_00084.pdf Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista61/234 epidemias e à inspeção dos portos era atribuição da Provedoria-mor de Saúde da Corte e Estado do Brasil, estabelecida pelo decreto de 28 de julho de 1809. À extinção dos cargos e órgãos responsáveis por tais serviços seguiu-se a aprovação, em 1828, da chamada Lei de 1º de Outubro, que definiu as funções das Câmaras Municipais. A criação da Inspeção de Saúde do Porto veio complementar a mudança que se verificava na divisão de responsabilidades entre o governo central, as províncias e as municipalidades na administração dos negócios referentes à saúde da população e à salubridade das cidades (CARVALHO, 2013). A Inspeção de Saúde Pública do Porto do Rio de Janeiro, criada pelo decreto de 17 de janeiro de 1829, tinha como função verificar o estado sanitário das embarcações e decidir se estavam autorizadas ou deveriam guardar quarentena. Esse regulamento de fiscalização sanitária do porto foi expedido no contexto da reorganização dos serviços de saúde durante o Primeiro Reinado (1822-1831), que definiu seu novo arranjo institucional após a extinção dos cargos de físico-mor, cirurgião-mor e provedor-mor, e a publicação da lei de 1º de outubro de 1828 (HORTON, 2011). Na corte, o serviço seria desempenhado por uma comissão composta por provedor da saúde, professor de saúde, intérprete, que serviria também de secretário, guarda-bandeira e os guardas que fossem Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista62/234 necessários. O chefe da comissão seria o provedor da saúde, escolhido dentre os vereadores e nomeado pela Câmara Municipal, que designaria também o professor de saúde, que deveria ser um médico ou cirurgião aprovado em medicina, e desempenharia a função de diretor das visitações (ROSEN, 1994). A inspeção e fiscalização, segundo o regulamento de fiscalização sanitária, determinava que fossem submetidas às visitas de saúde todas as embarcações mercantis ou de guerra, nacionais ou estrangeiras, que aportassem no Rio de Janeiro. Com exceção apenas das embarcações de menor porte, voltadas ao comércio interno e da costa. Para a visitação, os navios deviam ficar fundeados no ancoradouro de Jurujuba, em Niterói. (MELLO, 2010). A preocupação dos estados com as cidades era evidente, preservando a força de trabalho das classes sociais mais baixas e ainda preservando a segurança da classe alta que residia no meio urbano contra doenças transmissíveis, como varíola, peste e febre amarela. Link O vírus da varíola foi descoberto pela primeira vez em 570 DC. Por Bishop Marius de Avenches, na Suiça. A palavra deriva do latim varius ou varus que significa bexigas (<http://www.ahistoria. com.br/variola/>) http://www.ahistoria.com.br/variola/ http://www.ahistoria.com.br/variola/ Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista63/234 A cidade de São Paulo foi a primeira cidade portuária que implantou os empreendimentos de higiene pública. Ocorre, então, um alto investimento para a área da saúde pública. E, assim, as fiscalizações tornaram-se mais rigorosas, e ficou obrigatória a notificação oficial de todos os casos de doenças infeciosas. Nas primeiras décadas do século XIX (1820), ocorreu a chegada de inúmeros imigrantes europeus, sendo que as condições sanitárias para a sua recepção e permanência no país eram cada vez mais difíceis. Esse fato, juntamente com a falta de políticas sociais e de saúde, resultou na disseminação de epidemias de febre amarela e peste bubônica, dentre outras. Além disso, os emigrantes traziam doenças raras, como a cólera, a escarlatina e o tifo, o que resultava na ocorrência de diversos tipos de surtos em toda a população (BARBOSA, 1909). Para saber mais No quadro das principais doenças da história da humanidade, a Peste Bubônica, indubitavelmente, ocupa um lugar de destaque. Para a maioria dos países, a palavra peste significa tanto uma doença específica, a Peste Bubônica, quanto uma série de males que por séculos assolaram as populações humanas. Tal associação se deve ao elevado número de óbitos provocados pelas epidemias no continente europeu, cuja mais impactante permanece sendo a do século XIV (<http://www. hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh4/trabalhos/ Vagner%20Souza.pdf>). http://www.hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh4/trabalhos/Vagner%20Souza.pdf http://www.hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh4/trabalhos/Vagner%20Souza.pdf http://www.hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh4/trabalhos/Vagner%20Souza.pdf Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista64/234 A partir de 1832, a epidemia de cólera se propagou pela Europa e seguiu as rotas comerciais que ligavam os diferentes portos, chegando rapidamente à América. O desafio das autoridades nesse momento era conter a entrada da epidemia e, ao mesmo tempo, manter as atividades comerciais, o que esbarrava nas quarentenas previstas pelo código sanitário. Os prazos das quarentenas eram definidos de acordo com os portos de proveniência dos navios, tendo sido estipulados procedimentos específicos a serem adotados com as embarcações dedicadas ao tráfico negreiro (BARBOSA, 1909; CARVALHO, 2013). Assim, o serviço da Inspeção no Rio de Janeiro passou a se organizar em duas frentes, subordinadas ao provedor de saúde: o serviço de mar, composto pelo professor de saúde, intérprete e um guarda; e o serviço de terra, desempenhado pelo facultativo, intérprete e guarda. Em 1836, esse regulamento foi alterado pelo decreto de 23 de abril, que limitou o número de facultativos servindo na Inspeção de Saúde do Porto, aboliu o destacamento semanal dos empregados do serviço de mar na fortaleza de Villegaignon, estabeleceu visitas diárias às embarcações e determinou que as despesas do serviço se fizessem pelo orçamento da própria Provedoria da Saúde (HORTON, 2011; MELLO, 2010). Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista65/234 O decreto n. 243, de 30 de novembro de 1841, autorizou o governo a reformar as inspeções de saúde dos portos. Um novo regulamento foi aprovado apenas em 1843, pelo decreto n. 268, de 29 de janeiro, que retirou das Câmaras Municipaisa jurisdição sobre as inspeções sanitárias dos portos e determinou a competência privativa do governo imperial sobre a nomeação de seus empregados. Esse ato aboliu ainda o lugar de professor de saúde, ficando suas funções transferidas para o provedor de saúde, cargo exercido por um médico ou cirurgião. A Inspeção de Saúde no Rio de Janeiro, segundo decreto n. 273, de 25 de fevereiro, ficava subordinada à 2ª Seção da Secretaria de Estado dos Negócios do Império, responsável pelos Para saber mais Em 10 de novembro de 1555, chegou ao Brasil uma expedição comandada pelo francês Nicolas Durand de Villegagnon, Vice-Almirante da Bretanha, tendo como pretensão fundar uma colônia francesa em terras austrais brasileiras pertencentes a Portugal. Fundou na Baía de Guanabara, chamada pelos franceses de Genèvre, e resolveu, após dois meses estudando as ilhas e as terras adjacentes com a ajuda dos índios tupinambás, estabelecer se numa pequena ilha conhecida pelos indígenas com o nome de Sergipe e pelos portugueses, de Palmeiras (<http://www.revistanavigator. com.br>). http://www.revistanavigator.com.br http://www.revistanavigator.com.br Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista66/234 assuntos relativos à saúde pública, instrução, obras públicas, polícia civil e caridade (ROSEN, 1994). No Rio de Janeiro, o órgão era composto pelo provedor, dois secretários intérpretes, um agente, um guarda bandeira e dois guardas. Nas províncias, a estrutura variava um pouco: na Bahia, Pernambuco e Maranhão, haveria provedor, secretário intérpretes e guarda; nos demais portos onde houvesse alfândega, teriam somente o provedor e guarda. O regulamento de 1843 estabeleceu ainda que em todos os portos brasileiros deveria ser designado um ancoradouro para a quarentena, e que as embarcações vindas do exterior eram obrigadas a exibir a carta de saúde, documento expedido pelas autoridades sanitárias que atestava a saúde da tripulação e do porto de origem (CARVALHO, 2013). Apesar de todos esses esforços, a febre amarela aportou em Salvador em 1849, atingindo ainda Natal, Belém e Santos, mas foi sua chegada ao Rio de Janeiro que promoveu alterações na organização dos serviços sanitários, com a aprovação, pelo decreto n. 598, de 14 de setembro de 1850, de um crédito extraordinário a ser despendido exclusivamente na melhoria da salubridade da capital e a criação da Junta de Higiene Pública. À Junta, encarregada de apresentar ao governo imperial medidas indispensáveis à manutenção da salubridade pública, ficavam incorporados a Inspeção de Saúde do Porto e o Instituto Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista67/234 Vacínico do Império. O decreto também determinava que a junta exercesse a polícia médica nas visitas das embarcações, papel que até então cabia à Inspeção da Saúde do Porto (HORTON, 2011). organização da Inspeção de Saúde dos Portos, de forma a adequá-la às novas autoridades sanitárias constituídas nas províncias: as comissões de higiene e os provedores de saúde pública. Além disso, com a recorrência da febre amarela no Rio de Janeiro, foi estabelecido nesse mesmo ano um lazareto na enseada de Jurujuba, transformado, em março de 1853, no Hospital Marítimo de Santa Isabel. O decreto n. 2.052, de 12 de dezembro de 1857, colocou o Hospital de Santa Isabel sob a direção do provedor de saúde do porto do Rio de Janeiro (MELLO, 2010). Em 1859, um novo regulamento da Inspeção de Saúde dos Portos, define que seria considerado portos infeccionados aqueles onde reinassem o cólera-morbo, Para saber mais Criado pelo decreto n.º 464, de 17/08/1846, o Instituto Vacínico do Império, conhecido também pelo nome de Instituto Vacínico da Corte, era resultante do Regulamento que reformara a Junta Vacínica da Corte, ampliando seu raio de ação para todo o Império (<http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/ iah/pt/verbetes/instvacimp.htm>). O regulamento aprovado pelo decreto n. 828, de 29 de setembro de 1851, promoveu alterações pontuais na http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/pt/verbetes/instvacimp.htm http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/pt/verbetes/instvacimp.htm Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista68/234 a febre amarela e a peste do Oriente, estabelecendo as formas e prazos para concessão da carta de saúde aos navios que tocassem os portos brasileiros. Ainda em 1859, um novo decreto reorganizou a estrutura da Inspeção de Saúde dos Portos nas províncias da Bahia, Pernambuco, Pará, e S. Pedro, extinguindo o cargo de ajudante dos inspetores de saúde (ROSEN, 1994). O regulamento de 1861, aprovado pelo decreto n. 2.734, de 23 de janeiro, substituiu as quarentenas pelas desinfecções dos navios e estabeleceu que fossem duas as visitas no porto do Rio de Janeiro, a do escaler aos navios que entrassem e a do vapor aos que já estivessem ancorados. Também ficou definida uma nova estrutura para a Inspeção de Saúde dos Portos, no Rio de Janeiro e nas províncias. Na corte, além do inspetor de saúde, a Inspeção contaria com três ajudantes, secretário, agente e dois guardas. Na Bahia, Pernambuco, Maranhão, Pará e São Pedro haveria o inspetor, secretário e dois guardas, enquanto que nos demais portos em que houvesse alfândega a composição previa o inspetor e dois guardas. O novo regulamento definiu que para os cargos de inspetor e ajudante só poderiam ser nomeados “doutores em medicina” que soubessem falar francês ou inglês (RIBEIRO, 2010). Em 1863, a Inspeção de Saúde do Porto do Rio de Janeiro passou por alterações pontuais que, de acordo com o decreto Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista69/234 n. 3.059, de 11 de março, deveriam ser executadas quando o Hospital Marítimo de Santa Isabel deixasse de receber doentes, ou seja, quando não houvesse mais risco epidêmico. Nessa ocasião, diminuiriam para dois os lugares de ajudante do inspetor de saúde e as duas visitas sanitárias aos navios seriam feitas pelo vapor (MELLO, 2010). Ainda que a febre amarela tenha se tornada endêmica, o Rio de Janeiro teve dois surtos importantes da doença, em 1873 e 1876. Como forma de conter a frequência com que as febres amarelas, além da cólera e outras moléstias, irrompiam na corte e cidades portuárias, foram reorganizados os serviços sanitários em diversas cidades marítimas do Império. O decreto n. 6.378, de 15 de novembro de 1876, mandou executar provisoriamente medidas necessárias para conter a introdução e o avanço de doenças epidêmicas em diversos portos e cidades marítimas do Império, com instruções específicas para a organização e o serviço a cargo da Junta Central de Higiene Pública (CARVALHO, 2013). O ato também dispôs sobre as duas visitas sanitárias aos navios no porto do Rio de Janeiro, criando provisoriamente um lazareto flutuante na enseada da Jurujuba, destinado à quarentena dos passageiros procedentes de portos onde grassassem a febre amarela, cólera ou peste do Oriente. Tais medidas foram estendidas, no que fosse aplicável, às províncias da Bahia, Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista70/234 Pernambuco, Maranhão, Pará, São Paulo e Rio Grande do Sul (MELLO, 2010). O decreto n. 9.159, de 1º de março de 1884, ampliou as atribuições da Inspeção de Saúde do Porto do Rio de Janeiro, conferindo-lhe, além do serviço sanitário que regularmente executava, a polícia sanitária do litoral e das docas de mercado, bem como o exame dos gêneros fornecidos Link O termo peste é usado popularmente para designar flagelos marcantes que, porsua magnitude e transcendência, alteram a rotina das famílias, das sociedades e das nações (<http://bvsms.saude.gov.br>). às embarcações pelos quitandeiros marítimos. A Inspeção ficava ainda responsável pela vigilância sobre posturas municipais, no que concernia à higiene do litoral, devendo comunicar as infrações à Câmara Municipal para imposição das penas (ROSEN, 1994). No mesmo ano de 1884, a cólera-morbo voltou a grassar epidemicamente na Europa, atingindo rapidamente diversos países. No Rio de Janeiro, foi autorizada a construção de um lazareto na Ilha Grande, destinado às quarentenas, subordinado à Inspetoria-Geral de Saúde dos Portos do Rio de Janeiro (MELLO, 2010). Em 1886, o decreto n. 9.554, de 3 de fevereiro, reestruturou os serviços sanitários do Império, dividindo-os em http://bvsms.saude.gov.br/edicoes-anteriores/2001-a-2016/174-edicoes-2003/is-n-2-abr-jun-2003/1551-doencas-endemicas Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista71/234 serviços terrestre e marítimo, dirigidos respectivamente pela Inspetoria-Geral de Higiene e pela Inspetoria-Geral de Saúde dos Portos. Este ato é considerado a última grande reforma na área da saúde pública do Império, e confirmava a tendência à centralização político-administrativa, criando o Conselho Superior de Saúde Pública, presidido pelo secretário e ministro dos Negócios do Império, e extinguindo a Junta Central de Higiene Pública e seus órgãos subordinados (REBELO, 2010). Pela nova estrutura, na corte o serviço sanitário terrestre ficava responsável pelas atividades de propagação da vacina, enquanto o serviço sanitário dos portos respondia pelo socorro médico e pela polícia sanitária dos navios, ancoradouros e litoral, além das quarentenas marítimas. Na execução dos serviços, a Inspetoria-Geral de Saúde dos Portos tinha a jurisdição no porto do Rio de Janeiro e as províncias ficavam sob a alçada dos inspetores de saúde dos portos das províncias (MELLO, 2010). Na corte, a estrutura da Inspeção de Saúde compunha-se do inspetor- geral, quatro ajudantes, secretário, que deveriam ser médicos, além de dois amanuenses, porteiro e contínuo. Nas províncias do Pará, Pernambuco e Bahia haveria um inspetor de saúde do porto, um ajudante do inspetor, um secretário e dois guardas de saúde. Nas províncias do Maranhão, São Paulo e Rio Grande do Sul, existia um inspetor de saúde do porto, um secretário e dois guardas de saúde. Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista72/234 Nas províncias do Amazonas, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Sergipe, Espírito Santo, Paraná e Santa Catarina, a Inspeção seria formada pelo inspetor de saúde do porto e dois guardas de saúde (CARVALHO, 2013). Até 1900, a frequência e regularidade com que a doença atacava o Rio de Janeiro, a grande susceptibilidade dos estrangeiros à doença e o fracasso da Medicina em resolver o problema deram ao Brasil a reputação de uma das áreas mais insalubres dos trópicos (BARBOSA, 1909). Em 1903, Oswaldo Cruz assume a Diretoria Geral de Saúde Pública, com o objetivo de eliminar a febre amarela do Rio de Janeiro, adotando medidas autoritaristas desempenhadas pelos chamados guardas sanitários (por exemplo, entrada nas casas da população sem permissão do dono, seguida de queima de colchões, demolições de construções antigas, o que gerou descontentamento e revolta popular). Este foi o modelo de intervenção chamado de campanhista, concebido dentro de uma visão militar em que os fins justificam os meios, e no qual o uso da força e da autoridade eram considerados os instrumentos preferenciais de ação (SANTOS et al., 2007). Apesar das arbitrariedades e dos abusos cometidos em decorrência do modelo campanhista, obtiveram-se importantes vitórias no controle das doenças epidêmicas, conseguindo, inclusive, erradicar a febre amarela da cidade do Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista73/234 Rio de Janeiro, o que fortaleceu o modelo proposto e o tornou hegemônico como proposta de intervenção na área da saúde coletiva saúde durante décadas (SANTOS et al., 2007). Em 1914, foi criada a Liga Pró-Saneamento do Brasil, que congregou os maiores nomes do pensamento sanitarista. Com a situação dos problemas sanitários nacionais, criou- se o Ministério de Higiene e Saúde Pública, por parte da Liga Pró-Saneamento, que compreenderia a inspeção de Saúde dos Portos e Rios. Em 1920, Carlos Chagas, sucessor de Oswaldo Cruz, reestrutura o Departamento Nacional de Saúde Pública, então ligado ao Ministério da Justiça, e introduz a propaganda e a educação sanitária na técnica rotineira de ação, inovando o modelo campanhista de Oswaldo Cruz, que possuía puramente enfoque fiscal e policial. Nesse período, ocorriam os movimentos dos operários reivindicando alguns direitos sociais (CARVALHO, 2013). Assim, em 24 de janeiro de 1923, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei Eloi Chaves, marco inicial da previdência social no Brasil, sendo instituídas as Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) que asseguravam os socorros médicos em caso de doença em sua pessoa ou pessoa de sua família; a aposentadoria; a pensão para seus herdeiros em caso de morte; e a assistência aos acidentados no trabalho. A primeira CAP criada foi a dos ferroviários, o que pode ser explicado pela Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista74/234 importância que esse setor desempenhava na economia do país naquela época e pela capacidade de mobilização que a categoria dos ferroviários possuía. A lei deveria ser aplicada somente ao operariado urbano e as caixas organizadas pelas próprias empresas (HORTON, 2011). O Estado não participava propriamente do custeio das Caixas, que, de acordo com o determinado pelo artigo 3o da lei Eloy Chaves, eram mantidas por: empregados das empresas (3% dos respectivos vencimentos); empresas (1% da renda bruta); e consumidores dos serviços delas. Em 1930, o sistema já abrangia 47 caixas, com 142.464 segurados ativos, 8.006 aposentados e 7.013 pensionistas (RIBEIRO, 2010). No que tange a previdência social, a política do estado pretendeu estender a todas as categorias do operariado urbano organizado os benefícios da previdência. Dessa forma, as antigas CAPs são substituídas pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP). Nesses institutos, os trabalhadores eram organizados por categoria profissional (marítimos, comerciários, bancários) e não por empresa (REBELO, 2010). Em 1933, foi criado o primeiro Instituto de Aposentadoria e Pensões o dos Marítimos (IAPM). Seu decreto de constituição definia, no artigo 46, os benefícios assegurados aos associados (FERREIRA, 2012): Unidade 3 • História e Conceito de Política de Saúde Pública Brasileira do Saneamento dos Portos e Sanitarismo Campanhista75/234 a) aposentadoria; b) pensão em caso de morte para os membros de suas famílias ou para os beneficiários, na forma do art. 55; c) assistência médica e hospitalar, com internação até trinta dias; d) socorros farmacêuticos, mediante indenização pelo preço do custo acrescido das despesas de administração. § 2º - O custeio dos socorros mencionados na alínea c não deverá exceder à importância correspondente ao total de 8%, da receita anual do Instituto, apurada no exercício anterior, sujeita a respectiva verba à aprovação do Conselho Nacional do Trabalho (FERREIRA, 2012): Os IAPs foram criados de acordo com a capacidade de organização, mobilização e importância da categoria profissional em questão. Assim, em 1933, foi criado o primeiro instituto, o de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), em 1934, o dos Comerciários
Compartilhar