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1 TEORIAS SOBRE AS RELAÇÕES OBJETAIS 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empre- sários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade ofere- cendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a partici- pação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber atra- vés do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 Sumário TEORIAS SOBRE AS RELAÇÕES OBJETAIS .................................................. 1 NOSSA HISTÓRIA ............................................................................................. 2 1. INTRODUÇÃO AS CONCEPÇÕES FREUDANAS NAS RELAÇÕES OBJETAIS .......................................................................................................... 4 1.1 Escolha de Objeto ou Escolha Objetal ...................................................... 5 1.2 Escolha de Objeto por Apoio .................................................................... 6 1.3 Escolha Narcísica de Objeto .............................................................. 7 2.TEORIAS SOBRE AS RELAÇÕES OBJETAIS ............................................. 11 2.1 O início das relações Objetais ................................................................ 11 2.1.1 Os objetos e objetivos sexuais ......................................................... 13 2.1.2 As relações do bebê com os objetos ................................................ 14 2.2 Melanie Klein – transição para o modelo estrutural-relacional ................ 16 2.2.1As relações objetais com os objetos internos.................................... 19 2.3 A teoria da personalidade de Ronald Fairbairn .................................. 21 2.3.1 Teoria do Desenvolvimento das Relações de Objeto com base na qualidade da dependência do objeto......................................................... 25 2.3.2A psicogênese do ego ....................................................................... 27 2.3.3 Lidando com objetos maus.............................................................. 28 CONCLUSÃO ................................................................................................... 30 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 32 file:///C:/Users/Tatiane/Desktop/CONTEUDOS%20FINALIZADOS/TEORIA%20SOBRE%20AS%20RELAÇÕES%20OBJETAIS/apostila%20TEORIAS%20SOBRE%20AS%20RELAÇÕES%20OBJETAIS.docx%23_Toc60857824 4 1. INTRODUÇÃO AS CONCEPÇÕES FREUDANAS NAS RELAÇÕES OBJETAIS Para adentrarmos sobre a relação objetal é necessário entender que essa teoria compõe a psicanálise. A psicanálise é um método de tratamento de transtornos mentais, moldado pela teoria psicanalítica. Fundada por Sigmund Freud (1856-1939), enfatiza processos mentais inconscientes e é algumas vezes descrita como a “psicologia profunda”. A Psicanálise possui um discurso próprio, resultante de mais de um século de produção teóricoclínica de Freud e seus seguidores. Se, de início, ela causou escândalo, com sua nova visão de homem e suas relações, com o passar do tempo o discurso psicanalítico foi sendo ma- ciçamente assimilado pela cultura, correndo risco de perder sua virulência e ca- pacidade de inovação. Esta absorção se fez notar de forma mais enfática a partir dos anos cinquenta. Em relação a vida amorosa, onde a sexualidade faz seus laços, vemos com frequência a incorporação de conceitos psicanalíticos ser usada, pelo discurso social, com o objetivo de julgar e medir o grau de adaptação e patologia dos relacionamentos. A apropriação da psicanálise por ideologias de cunho moralizante, ao propor um ideal de felicidade amorosa, nada mais faz do que tentar transformá-la em um instrumento de controle social no sentido da hi- gienização e medicalização da vida privada. Em Freud vamos encontrar dois tipos de escolha de objeto: a escolha de objeto narcísica e a escolha de objeto anaclítica. (Narcisismo 1914, p. 94) Na escolha de objeto narcísica o modelo é a relação do indivíduo consigo mesmo. É uma relação marcada pela onipotência, onde as limitações, enganos e erros são vividos como ofensa pessoal. Na escolha de objeto anaclítica, a pulsão se- xual está apoiada na pulsão de auto-conservação. É uma escolha regressiva e complementar – mulher que alimenta e homem que protege. Infantilizante para um, acentua o papel parental do outro. A escolha narcísica ativa está do lado masculino, e a escolha anaclítica, passiva, está do lado do feminino. Em relação à mulher, Freud estabeleceu duas condições que determinam a escolha. O ob- jeto deverá ser um substituto paterno: o complexo de castração leva a mulher a se afastar da mãe (a quem atribui à falta de um pênis) e a achar no pai uma 5 posição de descanso. O homem deve redundar num filho: que seu homem seja um pai e que seu homem seja um filho. A síntese deve caminhar para a resolu- ção da maternidade: seu homem é pai de seu filho. Dentro desta perspectiva, a escolha conjugal é correlativa às fixações infantis, marcas deixadas pelo encon- tro com os pais. Se para Freud o encontro com o objeto é sempre um reencontro, o laço amoroso teria um valor de um sintoma, tentativa de restituição e monta- gem de um fantasma. 1.1 Escolha de Objeto ou Escolha Objetal Ato de eleger uma pessoa ou um tipo de pessoa como objeto de amor. Distingue-se uma escolha de objeto infantil e uma escolha de objeto pubertária, sendo que a primeira traça o caminho da segunda. Para Freud atuam na escolha de objeto duas modalidades principais: o tipo de escolha de objeto por apoio e o tipo narcísico de escolha de objeto. O termo “escolha” não deve ser tomado aqui 6 num sentido intelectualista. Evoca o que pode haver de irreversível e de deter- minante na eleição do sujeito, num momento decisivo da sua história, do seu tipo de objeto de amor. Note-se que a expressão “escolha de objeto” é utilizada para designar quer a escolha de uma pessoa determinada (exemplo: “a sua escolha de objeto incide sobre o pai”). 1.2 Escolha de Objeto por Apoio Tipo de escolha de objeto em que o objeto de amor é eleito a partir do modelo das figuras parentais na medida em que estas asseguram à criança ali- mento, cuidados e proteção. Fundamenta-se no fato de as pulsões sexuais se apoiarem originalmente nas pulsões de autoconservação. Freud fala de um ” tipo de escolha de objeto por apoio” para contrapô-la ao tipo de escolha narcísica de 7 objeto”. Freud mostrava então como, na origem, as primeiras satisfações sexuais apareciam por ocasião do funcionamento dos aparelhos que servem para a con- servação da vida e como deste apoio originário resulta que as funções de auto- conservação indicam à sexualidade um primeiro objeto: o seio materno. Mais tarde, “...a criança aprende a amar outras pessoas que ajudam no seu estado de desamparo e que satisfazem as suas necessidades; e este amor forma-se inteiramente a partirdo modelo das relações com a mãe que a alimenta durante o período de amamentação e no prolongamento dessas relações. 1.3 Escolha Narcísica de Objeto O tipo de escolha de objeto que se faz com base no modelo de relação do sujeito com a sua própria pessoa, e em que o objeto representa a própria pessoa sob este ou aquele aspecto. A descoberta de que determinados sujeitos, particularmente os homossexuais, “...escolhem o seu objeto de amor a partir do 8 modelo da sua própria pessoa” é para Freud “o motivo mais forte que nos obrigou a admitir a existência do narcisismo. A escolha narcísica de objeto opõe-se à escolha de objeto por apoio na medida em que não é a reprodução de uma re- lação de objeto preexistente, mas a formação de uma relação de objeto a partir do modelo da relação do sujeito consigo mesmo. Nas suas primeiras elabora- ções sobre o narcisismo, Freud faz da escolha narcísica homossexual uma etapa que leva o sujeito do narcisismo à heterossexualidade: a criança escolheria a princípio um objeto de órgãos genitais semelhantes aos seus. Mas já no caso da homossexualidade a noção de escolha narcísica não é simples: o objeto é escolhido a partir do modelo da criança ou do adolescente que o sujeito foi um dia, e o sujeito identifica-se com a mãe que outrora tomava conta dele. Freud amplia a noção de escolha narcísica e apresenta dela o quadro seguinte: “Ama-se segundo o tipo narcísico: a) O que se é (a própria pessoa); b) O que se foi; c) O que se gostaria de ser d) A pessoa que foi uma parte da própria pessoa 9 Nos três primeiros casos, trata-se da escolha de um objeto semelhante à própria pessoa do sujeito. No item d Freud visa o amor narcísico que a mãe tem pelo filho que foi outrora “uma parte de sua própria pessoa”. Aqui o caso é muito diferente, visto que o objeto eleito não é semelhante à própria unidade do sujeito, mas sim o que lhe permite reencontrar, restaurar a sua unidade perdida. 2. O INÍCIO DE TUDO: DESENVOLVIMENTO EMOCI- ONAL E AS PRIMEIRAS RELAÇÕES O desenvolvimento emocional dos indivíduos pode ser entendido como um processo que inicia em um estado de dependência absoluta e se direciona para a independência. Os estágios iniciais da vida são marcados pela relação com aquele que cuida do bebê e se ocupa em atender suas necessidades, na maior parte das vezes, a mãe. Esta dependência absoluta inicial é correspon- dida por uma condição chamada de preocupação materna primária, na qual a mãe se direciona ao bebê dedicando-se, exclusivamente, a prover um ambiente acolhedor onde ele não experimente frustrações que ameacem sua existência. As mães então se conectam ao bebê respondendo aos estados de fome, sede, frio, calor e também propiciando um padrão de estímulos e acolhimento que lhes possibilite ter contato com a vida, através do toque, da fala ou do silêncio. O bebê pode então experimentar sua existência em um mundo subjetivo ou ainda se movimentar espontaneamente de modo a explorar o ambiente. 10 Este estágio possibilita a integração, estabelecida na troca de identifica- ções entre o bebê e sua mãe ao experimentarem a harmonia e a unidade oriunda desta ligação. A amamentação é um elemento importante neste processo e não se limita à prática meramente mecânica, para fins de sobrevivência. Na chamada primeira infância, a alimentação representa um período significativo de atividade do bebê, sendo também um canal de comunicação com sua mãe. Nesta ocasião ele adquire elementos para a formação de seu psiquismo, a partir das trocas afetivas, sensações e representações decorrentes desta interação. Através da amamentação o bebê desenvolve seus impulsos agressivos quando na experiência de destruição do seio materno a mãe atua de modo a “sobreviver” aos ataques de raiva e frustração do bebê. Ao se proteger dos ata- ques de maneira adequada, sem retornar a agressividade sofrida, a mãe permite que o bebê reconheça seu objeto como algo distinto de si. 11 2.TEORIAS SOBRE AS RELAÇÕES OBJETAIS 2.1 O início das relações Objetais Em termos psicanalíticos, as relações objetais referem-se às relações emocionais entre sujeito e objeto amado que, através de um processo de identi- ficação comum, contribuem para o desenvolvimento do ego. Entende-se por "ob- jeto" uma pessoa, ou a sua representação, com a qual o sujeito forma uma rela- ção emocional intensa, que lhe possibilita a tal identificação com o outro. Este tipo de relações foram definidas em 1924 por Karl Abraham, que desenvol- veu as ideias de Freud acerca da sexualidade infantil e do desenvolvimento da libido. A teoria das relações objetais tem-se tornado um dos temas centrais da psicanálise pós-freudiana, em especial com os psicanalistas Melanie Klein e Do- nald Winnicott. Apesar de as teorias de cada um serem complementares, fizeram diferentes abordagens de análise, que contribuíram para as teorias do desenvol- vimento baseadas nas relações parentais precoces. Assim, as relações objetais seriam as ligações que a criança estabelece com as figuras parentais e a forma como estas delineiam a atividade da criança. Para Klein, ao longo do desenvol- vimento a mesma figura parental tem as- petos positivos e negativos que a criança terá de introjectar. Apesar do sentido ne- gativo que se dá ao "mau" objeto, o bom desenvolvimento da criança necessita de ambos, mas deve sempre predominar a presença do "bom" objeto. A compreensão da psicologia do self tem sua fundamentação nas teorias das relações objetais que consistiram em revisões teóricas da teoria de Freud so- bre o “objeto”. “Este aplicava o termo ‘ob- jeto’ em relação a qualquer pessoa, objeto ou atividade com capacidade para satisfazer ao instinto”. Na teoria psicanalítica ortodoxa, Freud relaciona o objeto a algo que só tem sentido enquanto relacionado à pulsão e ao inconsciente e 12 não na esfera da. Assim, o objeto torna-se um meio para o foco da satisfação, podendo esse objeto ser uma pessoa, objeto ou atividade, real ou imaginário. Todo conhecimento psicanalítico deve começar com as relações do in- divíduo com os outros. Esse entendimento tem base na teoria da pulsão de Freud, onde não existe uma pulsão sem um objeto implícito ou explícito. Assim, o objeto da pulsão seria a pessoa, objeto ou atividade, a qual a pulsão tem como objetivo, foco ou alvo. Essa sistemática segue o modelo estrutural/pulsional. Para Freud o primeiro objeto na vida do bebê, capaz de satisfazer ao instinto, era o seio materno. Mais tarde, a própria mãe como pessoa torna-se um objeto de satisfação do instinto. E, à medida que a criança cresce, outras pes- soas tornam-se objetos de satisfação do instinto . Greenberg e Mitchell (1994, p. 7 e 8) ainda afirmam que o termo “teoria das relações objetais”, em seu sentido amplo, refere-se a tentativas de respon- der a situação onde as pessoas interagem e reagem com objetos externos e 13 internos, e em que medida suas relações influenciam o funcionamento psíquico. Importante relatar que os objetos internos são entendidos como representações psíquicas de outras pessoas que influenciam as reações, percepções, os esta- dos afetivos do indivíduo (aspectos internos), bem como suas reações compor- tamentais externas. Os teóricos das relações objetais trazem concepções diferenciadas, o que torna o entendimento dos termos “objeto” e “relações objetais” bastante complexo. Há uma diferença entre esses termos para a psicologia acadêmica e a psicanálise. Para a primeira “objeto” refere-se a uma “entidade que existe no tempo e no espaço”, para a segunda está relacionada à pulsão. Na psicanálise de Freud, é o objeto libidinal (foco da pulsão sexual), havendo também o objetivo de autopreservaçãoe, mas tarde surgindo o objetivo da pulsão agressiva. Assim, Freud propôs que a “escolha objetal” ocorre quando as pessoas “categorizam” ou investem energia instintual em objetos que podem ser usados para gratificar impulsos instituais. Diferentemente da concepção de Freud que considerou a relação do objeto principalmente com a pulsão sexual, os teóricos das relações objetais consideram as relações interpessoais entre esses objetos. Há, portanto, ênfase no contexto social e ambiental na formação da personali- dade, destacando como principal influência a interação entre mãe e filho. A exis- tência das relações interpessoais indica que a construção da personalidade na infância se estabelece de forma mais precoce do que Freud idealizava. 2.1.1 Os objetos e objetivos sexuais O primeiro encontro com o objeto ocorre no estado primitivo da sexualidade infantil denominado por Freud de “autoerotismo”. Ele considera que, no autoerotismo, a pulsão sexual pode se ligar a um órgão ou à excitação de uma zona erógena e encontrar satisfação sem a necessidade de recorrer a um objeto externo. Para ele, no chuchar (sugar com deleite) que aparece no lactente e pode persistir até a vida adulta, a pulsão não está dirigida para outra pessoa, não está dirigida a um objeto; ela satisfaz-se no próprio corpo, sendo justamente por isso que ele a denomina de autoerótica. Em relação ao alvo sexual da pulsão infantil, Freud considera que ele se refere à zona erógena escolhida pela criança para ser estimulada a fim 14 de provocar satisfação. A criança procura repetir um prazer já vivenciado nas primeiras experiências de mamar ao seio materno. Ele diz que: a necessidade de repetir a satisfação sexual dissocia-se então da necessidade de absorção de alimento - uma separação que se torna inevitável quando aparecem os dentes, o alimento já não é exclusi- vamente ingerido por sucção mas é também mastigado. A criança já não se serve de um objeto externo para sugar, mas prefere uma parte de sua própria pele, porque isso lhe é mais cômodo, porque a torna independente do mundo externo, que ela ainda não consegue dominar [...] (Freud, 1996, v. 7, p. 171) Por meio do autoerotismo, Freud pôde observar três características das manifestações sexuais infantis: “a) em sua origem ela se ‘apoia’ em uma das funções somáticas vitais; b) ainda não se tem objeto sexual e é, assim, autoerótica; c) seu objetivo sexual é dominado por uma zona erógena” 2.1.2 As relações do bebê com os objetos Sobre a relação do bebê com os objetos Freud diz o seguinte: A primitiva escolha de objeto feita pela criança é dependente de sua ne- cessidade de amparo e exige-nos ainda toda a atenção. Essa escolha dirige-se 15 primeiro a todas as pessoas que lidam com a criança e logo depois especialmen- aos genitores. A relação entre criança e pais não é, como a observação direta do menino e posteriormente o exame psicanalítico do adulto concorde-mente demonstram, absolutamente livre de elementos de excitação sexual. A criança toma ambos os genitores, e particularmente um deles, como objeto de seus de- sejos eróticos. Em geral o incitamento vem dos próprios pais, cuja ternura possui o mais nítido caráter de atividade sexual, embora inibido em suas finalidades. Nesse momento do desenvolvimento, Freud coloca a importância do ob- jeto no fato dele proteger a criança dos perigos externos. Além disso, entende que a busca pelo objeto é feita pela necessidade que a criança tem de ser am- parada e pela sua necessidade de satisfação instintual Em passagens de sua obra como essa, Winnicott aponta que Freud parece ter intuído sobre a importância do ambiente e percebido o aspecto da dependência do bebê, contudo, apesar de percebê-los, ele não consegue se aprofundar nessas discussões para abarcar as fases mais primitivas da vida da criança, dentro das formulações da sua teoria pulsional. Por estar completamente absorvido pelo tema da sexualidade, buscando comprovar suas descobertas, Freud não conseguiu perceber outros aspectos do relacionamento do bebê com os objetos. Toda a sua atenção 16 estava voltada para as excitações sexuais presentes desde o início da vida e, com isso, ao voltar-se para a relação mãe-filho, suas observações centravam- se nos aspectos sexuais dessa relação. Assim, pode-se perceber que, para Freud, a relação da mãe com o filho é uma relação libidinal, um ponto de apoio para o desenvolvimento instintual. Entretanto, apesar de não se aprofundar no estudo da infância mais primitiva, Freud não deixou de ressaltar que os pais têm importante papel na vida mental dos filhos. Para ele, as primeiras relações da criança com seus pais são relações passivas, pois as crianças apenas recebem cuidados, carinho, castigos e não se expressam nessas relações. Somente mais tarde se poderia observar a capaci- dade da criança em proporcionar afeto aos pais e de reagir frente ao afeto deles. 2.2 Melanie Klein – transição para o modelo estrutural-relacional O trabalho de Klein estende e elabora a teoria pulsional clássica e, no entanto, também serve como uma ponte para seu abandono, ela faz a transição entre a visão clássica do modelo estrutural-pulsional para a visão subsequente do modelo estrutural-relacional. Ao passo que Freud teria ignorado o objetivo da pulsão, ou o objeto, e teria dado mais importância à descrição da pulsão como fonte e objetivo, quando o objeto seria meramente o veículo através do qual a gratificação é obtida ou negada, para Klein, o objeto é mais essencial; as pulsões são inerentes e inseparavelmente dirigidas a objetos. Aqui começa um entendi- mento mais integrado entre os dois modelos. As teorizações de Klein envolvem uma nova compreensão da natureza da pulsão, ou do desejo, em si. Klein (1969) amplia o conceito de objeto, concebendo um mundo interno de objetos organi- zados ao redor de relações objetais internas inconscientes. A questão dos mecanismos de internalização e projeção é originária da teoria kleiniana, a partir de seu entendimento sobre as relações objetais. Klein sugere que as primeiras relações objetais da criança são relações com imagens, que só mais tarde tomam aspectos de objetos reais representativos do mundo 17 externo. É para estas imagens que, a priori, se dirigem as pulsões da criança, tanto amorosa quanto odiosamente. A autora afirma que as primeiras experiências de satisfação são ligadas à pulsão libidinal, e, por meio dela, ocorre a introjeção, no bebê, do que é um afeto, ligado a um objeto bom que servirá de base para o estabelecimento do ego; as más experiências, de frustração e desprazer são ligadas à pulsão de morte e, por isso, vividas como perigosas e projetadas no exterior. Assim, está constituída uma primeira unidade, ainda fragmentada. Essa dicotomia entre objeto bom e objeto mau adquire sentido, posto que em torno dela se organizarão as noções de eu e não-eu. Simplificadamente, esse pro- cesso inicial constitui a posição esquizo-paranóide. A seguir, novos mecanismos serão estabelecidos, como o da identificação projetiva, na tentativa de amenizar essa dicotomia, projetando sobre o objeto exterior seus aspectos maus para le- sar ou controlar o objeto. Sobre a possibilidade de a criança reconhecer a unicidade do objeto bom e do objeto mau, no decorrer de seu desenvolvimento, estabelece-se a posição depressiva, com angústias depressivas, quando experimenta a culpa em virtude de haver dirigido ódio ao mesmo objeto que fornece amor e satisfação. Uma 18 aceitação de ambos os aspectos do objeto permite a atenuação da clivagem – que ocorria anteriormente – e dos mecanismos que a acompanham: idealização, projeção, negação. A partir disso, a criança vai evoluindo de uma relação de objeto parcial, cindido, para uma relação de objetototal, integrado. Klein não discorda de Freud quando afirma que o bebê é ameaçado por um senso de destruição logo após o nascimento ter rompido com o equilíbrio do estado uterino. Aqui Klein propõe um mecanismo no qual o instinto de morte é projetado sobre o mundo externo, por ser, nesse momento, impossível contê-lo, dada a falta de um ego inicial para alguns autores – ou da existência de um ego ainda não- estruturado e diferenciado – para outros. Surge aí a fantasia de um objeto externo, pois não há confirmação de sua existência, já que foi projetada parte do instinto de morte, dando origem a um objeto percebido como mau, por conter impulsos destrutivos. Esses impulsos destrutivos são sentidos como medo da aniquilação, e tomam a forma de perse- guição, ligada a um objeto. Da mesma forma, uma porção dos instintos de vida é também projetada para fora, criando um objeto bom para o qual o instinto é direcionado. Tanto a natureza do objeto bom quanto do objeto mau é determinada pelas próprias mo- tivações da criança, uma crença que deriva da natureza da própria libido. Assim, nesta visão, os pri- meiros objetos das pulsões são extensões das próprias pulsões. Aqui começamos a compreender que a frustração ou a satisfação das necessidades corporais é que imprimem esses registros. Sensações físicas positivas, ou o desconforto, são personifica- das e atribuídas a bons e maus objetos, e introduzem a imagem de “seio bom” e “seio mau”. 19 Ainda neste momento evolutivo, e quem sabe na vida adulta de algumas pessoas, as privações e necessidades internas são sentidas como externas. Não podemos negligenciar aqui as experiências com o outro real, que até o momento, segundo a teoria, não estavam privilegiadas. Estas imagens objetais contêm traços da mãe e do pai reais, mas distorcidos. As percepções dos objetos reais no mundo externo misturam-se com as imagens projetadas, e tais percepções são internalizadas. Assim, os objetos internalizados são as transformações das percepções dos objetos reais, o que estimulará as relações objetais no mundo real, à medida que a criança procura fontes de reasseguramento de suas percepções, que serão seus objetos internos. O mundo interno passa a ser concomitantemente transformado, e o ciclo de projeção e introjeção têm sua direção. Importante salientar que essa internalização não é considerada um mecanismo de defesa, mas um modo de relacionar-se com o mundo externo. 2.2.1As relações objetais com os objetos internos Os impulsos e os sentimentos do bebê são acompanhados por uma atividade mental que Klein considerou a mais primitiva de todas, a elaboração de fantasias (ou pensamento imaginativo). Essas fantasias primitivas que acompanham os sentimentos do bebê podem ser de variados tipos: fantasias de gratificação quando o seio está ausente mas o bebê fantasia que está sendo gratificado; fantasias agradáveis quando está sendo amamentado e a satisfação é real; fantasias destrutivas quando é frustrado pelo seio, e o bebê sente desejo de morder e despedaçar a mãe e seus seios, ou então de destruí- la de outras maneiras. Klein chama a atenção para o caráter de realidade dessas fantasias, principalmente as destrutivas, porque o bebê sente que aquilo que deseja em suas fantasias já se realizou, ou seja, ele imagina que realmente destruiu o objeto onde projetou seus impulsos destrutivos. Para lidar com esses temores, o bebê busca apoio nas fantasias onipotentes do tipo restaurador. Entretanto, 20 mesmo imaginando que está juntando novamente os pedaços do objeto e restaurando-o, os temores de haver destruído o objeto não são totalmente dissipados. Os conflitos básicos que se originam desses processos influenciam seu desenvolvimento mental e sua vida emocional (1975b, p. 85-86). No início da vida do bebê, a fantasia inconsciente está ligada às sensações que acompanham o ato da alimentação e as fantasias que ela mobiliza. São estas fantasias que vão determinar o caráter dos objetos engolidos ou incorporados. Por meio desses impulsos orais, o bebê constrói um mundo interno que contém as duplicatas dos objetos externos com os quais se relaciona. Para a autora, o primeiro objeto internalizado é um objeto parcial – o seio da mãe – e isso ocorre mesmo com bebês alimentados com a mamadeira. Ela considera ainda que o pai desde cedo, também é internalizado e possui impor- tante papel na vida da criança. O sistema de fantasias que se encontra no centro do mundo interno do bebê é de suma importância para o desenvolvimento do ego. 21 2.3 A teoria da personalidade de Ronald Fairbairn Fairbairn estabelece o problema da esquizoidia como uma condição an- terior a da sexualidade pela qual o ego se estrutura ante a situação de depen- dência plena do objeto. Desse modo, as características orais, como formas con- dicionantes da relação de identificação, envolvem o sujeito fairbairniano em uma tragédia de fragmentações internas, porquanto nunca os objetos serão plena- mente responsivos. A inevitabilidade da estruturação esquizóide permite compreender que está ausente à elaboração fairbairniana o que, por outro lado, Green (1988) con- sidera fundamental ser considerado nas relações primitivas com o objeto. Trata- se da possibilidade de recuperação da adaptação pela ação do meio, isto é, do objeto, que, assim, compensaria o estado de desvalimento absoluto em que se encontra a criança. Isso aponta a desconsideração de Fairbairn para com as possibilidades ou os efeitos estruturantes das relações com o objeto bom. Da obra desse autor fica a impressão de que o alcance do objeto bom se esgota na satisfação que possa fornecer à necessidade da dependência. Nesse sentido, podemos abraçar completamente a interpretação de Figueiredo (2003, p. 41-56) segundo a qual Fairbairn constitui uma verdadeira – e acrescentaríamos, con- creta e efetiva – psicopatologia fundamental. Tal posição tem consequências na compreensão da tarefa psicoterapêutica, ao modo de um pessimismo bastante acentuado, senão radical. É verdade que Fairbairn tenta corrigir essa sua visão. Enfatiza a internalização do objeto pré-ambivalente da fase oral, para contrapô-la à concepção da primária internalização do objeto mal. A ambivalên- cia, então, instaurar-se-ia na relação interna do ego com o objeto, atribuída, por- tanto, à ação do ego. Segue-se a compreensão de que esse processo de disso- ciação e repressão dos objetos rejeitante e excitante escindidos deixa no ego central um núcleo do objeto original. Este objeto, dessexualizado e idealizado, constitui-se, então, para Fairbairn, no ponto ao redor do qual se constrói o supe- rego. Deste modo, Fairbairn busca introduzir em sua teoria as condições, tam- bém primitivas, para a influência terapêutica com base egóica. Na perspectiva 22 psicoterapêutica, compreende-a o analista como objeto bom, capaz de ganhar a boa vontade do superego, a partir do que poderia ter alguma influência sobre a dinâmica fundamentalmente esquizóide do ego. Tais reconsiderações, no en- tanto, não desfazem sua convicção mais acentuada, pois permanecem pouco desenvolvidas e marginais As perspectivas terapêuticas de Fairbairn, bem como suas interpreta- ções socioculturais de certos e predominantes quadros psicopatológicos, podem ser bastante profícuas para a reflexão da clínica psicanalítica na contemporanei- dade. Ele sugere avaliações e alternativas de compreensão que podem ser úteis para o psicanalista ou o psicoterapeuta ainda hoje, somando, e talvez até impul- sionando, as perspectivas psicanalíticas do atendimento e tratamento dos cha- mados casos difíceis, borderlines e psicóticos. Não obstante tal riqueza, essas duas perspectivas de sua obra não são aqui desenvolvidas, pois tomamos por demarcação a intrigante teoria da personalidadeconstruída a partir das relações de objetos e nelas fundamentada. As críticas de Fairbairn à teoria da libido, que fundamentam o abandono da dinâmica pulsional, podem ainda ser compreendidas a partir da reinterpreta- ção da libido como amor. Essa relação amorosa desenvolver-se-ia segundo o apego ao objeto, sustentando as frustrações que lhe são inerentes. Forçando-se um pouco o sentido, pode-se sugerir que a estrutura dinâmica de Fairbairn rea- liza - de uma forma impar, é verdade - a pulsão de vida, se a tomarmos em sua significação de pulsão de ligação, de constituição de vínculos. Mas não se pode desprezar a preferência da vinculação dessa estrutura dinâmica (o ego) com o objeto mau o que pode levar à consideração de se tratar, mantendo-se a apro- ximação sugerida, de uma pulsão de vida que se vincula à morte, à morte psí- quica, no sentido da fragmentação egóica (ou morte narcisista, se pensarmos a partir de outros termos que não os fairbairnianos). O psiquismo em Fairbairn, não obstante a ênfase nas relações de objeto, é um psiquismo que se fecha, voltado para si mesmo, para suas partes cindidas do ego e para os objetos in- ternalizados. 23 Não obstante, o ego, na metapsicologia de Fairbairn, possui relações primitivas não apenas com objetos internalizados, mas também com objetos ex- ternos e concretos, o que aproxima a psicogênese do ego da preservação do organismo biológico. Por privilegiar a concretude da relação objetal, ensejando uma metapsicologia muito próxima da experiência infantil, podemos conceber Fairbairn como um teórico das relações objetais exclusivas, distinguindo-o dos demais teóricos das relações objetais que mantêm a designação de alguma im- portância para a pulsão (instinto) na constituição psíquica. Para o autor, a teoria da libido possui limitações intrínsecas que impe- dem uma compreensão genuína dos mecanismos primitivos de constituição psí- quica. Haveria uma incompatibilidade fundamental entre a teoria da libido e a teoria das relações de objeto, visto que ambas dizem respeito aos fundamentos do psiquismo. A sexualidade somente seria experimentada e, portanto, teria vi- gência, posteriormente à garantia de relações objetais seguras, não sendo, con- forme em Freud, inicialmente constitutiva do psiquismo. A sexualidade termina recolocada no lugar de uma função, orgânica e vital, que estará sujeita à conso- lidação das relações de objeto, ao invés de sujeitá-las. A consequência, comparativamente ao modelo freudiano, é a do aban- dono do fundamento neurótico da compreensão da estrutura psíquica, isto é, do inconsciente sexual e, na segunda formulação de Freud, do id - este último não somente como fonte pulsional, mas do sentido, assegurado desde a postulação do inconsciente em A Interpretação dos Sonhos (Freud, 1900/1972), da dife- rença radical do sujeito com ele mesmo. O inconsciente sexual freudiano pode ser propriamente entendido como condição antropológica fundamental; o ego cindido de Fairbairn, por seu lado, é condição circunstancial, embora se trate de circunstância inevitável. 24 Fairbairn não somente amplia Freud, se é que o faz. Ao inverter o caráter da meta libidinal, colocando-a em busca do objetivo e não, do prazer, ele pre- tende consolidar estados mais primitivos do funcionamento psíquico sob a base das relações de objeto e funda- mentar a esquizoidia como estru- tura básica e inescapável dos processos de subjetivação. O autor pretende com- provar a tese de que as defesas dissociativas são fenômenos pre- sentes na personalidade de um modo geral. Respaldando-se na experiência clínica e interessado na psicogênese do ego, identifica aproximações entre os processos do ego rudimentar da criança e os do esquizóide, que seriam: a) Tendência à orientação para um objeto parcial; b) Predomínio do tomar sobre o dar na atitude libidinal; c) Tendência à incorporação e à internalização do objeto; d) Sobrevalorização dos estados opostos de plenitude e vazio. 25 Estas aproximações já trazem de modo não totalmente explícito a pre- ponderância do objeto na determinação das atitudes libidinais. É isso que cons- titui o gérmen das principais críticas de Fairbairn à teoria da libido freudiana, concebendo, assim, a mudança da meta libidinal. 2.3.1 Teoria do Desenvolvimento das Relações de Objeto com base na quali- dade da dependência do objeto Fairbairn também descreve uma teoria do desenvolvimento. É curioso como nomeia esta teoria: "Desenvolvimento das relações de objeto baseada na qualidade de dependência em relação ao objeto" (Fairbairn, 1952/1980, p. 28). A curiosidade dessa afirmação é que ela conduz ao entendimento de que o de- senvolvimento do ego não se processa de modo autônomo, ao contrário, por- tanto, do que julga ser o desenvolvimento da libido a partir das zonas erógenas e da busca do prazer. De fato, para Fairbairn, o processo de desenvolvimento da personalidade define-se como desenvolvimento da relação de objeto. 26 Podemos dizer inicialmente que o ego está, submetido à dependência radical do objeto. O processo de desenvolvimento consiste na diminuição da de- pendência e na progressiva diferenciação com respeito ao objeto. O propósito (um certo propósito egóico, como se verá à frente, com a noção de ego rudimen- tar) desse processo seria o de salvaguardar a perda do ego diante da circuns- tancial, porém inescapável inadequação das relações de objeto. São basica- mente três, segundo Fairbairn, as fases do desenvolvimento da relação de ob- jeto: 1ª) dependência infantil – na qual existem duas subfases orais: a pri- meira, pré-ambivalente em relação ao objeto (sugar ou recusar o seio), a se- gunda, ambivalente (sugar ou morder o seio) 2ª) etapa de transição, e 3ª) dependência madura. As principais características da dependência infantil são as atitudes in- corporativas e a identificação indiferenciada com o objeto. Essas características fazem com que a perda ou o afastamento do objeto sejam acompanhados pelo sentimento de aniquilação do ego. Esse aspecto é extremamente significativo na teoria, é o motivo que leva à esquizoidia como condição estruturante, pois todos passam, inevitavelmente, por essa extrema dependência oral do objeto. 27 Na etapa de transição, ocorre o início da diferenciação com o objeto. Para evitar que as frustrações impostas pelas relações objetais conduzam à perda do ego, a defesa é acionada. Sendo insuportável para o ego a ambivalên- cia responsiva do objeto às suas necessidades, o ego cinde o objeto em suas partes: o aceito e o recusado. Esses objetos serão, no processo de desenvolvi- mento, internalizados ou externalizados. As neuroses clássicas são considera- das como conflito nessa fase. Já a dependência ma- dura, última fase do desenvolvi- mento das relações de objeto, é caracterizada pela possibilidade de relações menos dependentes do objeto. Fairbairn não porme- noriza técnicas defensivas nessa fase, apenas indica que o grau de dependência é diminuído, o que se esperaria de um adequado desenvolvimento. O desenvolvimento das relações de objeto está, portanto, relacionado com o grau de iden- tificação do ego com o objeto e com as técnicas para lidar com suas relações. Quanto maior o número de estratégias dissociativas para lidar com o objeto, maior seria a de- pendência infantil, ou a sua permanência e não-superação. 2.3.2A psicogênese do ego O primeiro momento em que Fairbairn fornece indícios de uma teoria da psicogênese do ego é em 1940, quando descreve o ego da criança como um ego bucal. Como o autor não volta a tematizar o caráter desse rudimento egóico, não fica clara sua natureza. É certo que em suas teorizações não há lugar para 28 compreensões de egos rudimentares constituídos como efeitos das ações deinstintos de vida ou de morte, que procuram o objeto para a gratificação. O ego bucal seria apenas a expressão do primeiro modo de vinculação de contato so- cial. Progredindo, Fairbairn mostra, em 1941, uma original compreensão das relações primitivas de objeto, aproximando as incorporações de verdadeiras as- similações dos objetos reais e concretos. O seio da mãe e o leite materno irão dar os primeiros contornos egóicos à criança. Em razão disso, as falhas invevi- táveis nas relações objetais primitivas estruturam o ego, por meio de processo defensivo, como veremos à frente. Tais falhas correspondem à angústia de des- truição e morte para a criança, que está dependente do encontro com o objeto. A concepção de Fairbairn não exclui ou descarta a idéia de um ego ini- cialmente constituído, mesmo que radicalmente dependente do objeto. Talvez se encontre nesse aspecto de sua teoria um desses paradoxos teóricos, os quais estamos acostumados a encontrar em Winnicott, por exemplo, que teria usufru- ído bastante as formulações de Fairbairn, embora não o cite (Grotstein & Rinsley, 2000). Este paradoxo pode ser entendido como a necessidade de se adotarem simultaneamente duas perspectivas aparentemente excludentes: 1) a do ego rudimentar e, nem tanto, já constituído – responsável pelas múltiplas defesas nas relações com o objeto, como divisão ambiva- lente, incorporação, identificação e repressão ou a rejeição do ob- jeto, e, por outro lado 2) a do ego dependente do objeto – constituindo-se de modo subordi- nado à qualidade da relação de objeto e estruturando-se em face dessa qualidade e, até mesmo, moldando suas defesas a ela. 2.3.3 Lidando com objetos maus A dependência para com o objeto e a estruturação do ego segundo a qualidade das relações de objeto conduzem Fairbairn à revisão da teoria da re- pressão. 29 Comparando o seu próprio percurso ao anunciado por Freud em o Ego e o Id (1923/1976), que teria partido da preocupação com o reprimido para che- gar posteriormente ao interesse pela instância repressora, Fairbairn acredita re- tornar ao princípio. Busca então uma compreensão do reprimido, mas agora se- gundo o princípio da importância do objeto. Fairbairn desenvolve a idéia principal acerca da natureza do reprimido. O reprimido consistiria em objetos maus com os quais o ego está identificado, e não em impulsos culpáveis ou lembranças intoleráveis, como Freud concebera. Acredito agora que a vítima de um ataque sexual resiste a reviver a lem- brança traumática porque isto constitui um testemunho de uma relação com um objeto mau [...] é difícil conceber que a experiência de ser violado proporcione alguma gratificação [...]. É interessante assinalar que a criança vive a relação com um objeto mau não somente como algo intolerável, mas também como algo vergonhoso [...]. O fato de que a relação com um objeto mau seja vergonhosa só pode ser explicada satisfatoriamente presumindo-se que na infância precoce todas as relações de objeto estejam baseadas na identificação. Nesse ponto, Fairbairn demonstra conceber um estatuto bastante parti- cular a respeito da maldade do objeto, pois, se a qualidade das relações objetais não responsivas caracteriza o grau de maldade do objeto – e um grau de não- responsividade do objeto estará sempre presente, devido às necessidades do ego no estado de dependência –, a maldade torna-se uma característica do ob- jeto, e não mais da relação. As relações objetais responsivas na tenra infância, uma vez que cum- pram a satisfação das necessidades do ego dependente, terão esgotado o seu valor, por assim dizer, na compreensão de Fairbairn. É assim que, inicialmente, para o autor, o objeto bom tem pouca relevância para a estruturação do ego. Ao contrário, predominam sobre o ego os efeitos das relações não responsivas com o objeto mau. Para evitar a dependência de objetos maus, a criança encontra modos defensivos de se relacionar com esses objetos, identificando-se com a 30 maldade presente neles e assim se considerando má. O autor sugere que essa é uma estratégia para sobreviver em um mundo incondicionalmente mau (e que sempre será mau no sentido libidinal), visto que seria melhor para ela considerar que a maldade presente nas relações de objeto é condicional à sua pessoa, e não uma consequência inevitável do objeto do qual depende. É mais esperan- çoso ser má em um mundo bom que ser boa em um mundo mau. Assim, como a criança identificou-se com a maldade, ela torna-se uma ameaça para si mesma. Ela procuraria, então, um modo de controlar e livrar o mundo externo de sua maldade e de seu potencial destruidor identificando-se com os objetos maus, trazendo-os para dentro de si e reprimindo-os. A repressão ocorreria, então, so- bre os objetos maus identificados com o ego. A essas técnicas protetoras, posteriormente, Fairbairn acrescenta a de- fesa moral superegóica, como internalização de objetos bons compensatórios. Os objetos maus estariam relegados ao inconsciente e a culpa seria uma forma de defesa contra as relações do ego com esses objetos. Desse modo, a criança vítima de abuso só experimentaria essa situação como algo vergonhoso porque a vergonha seria o resultado da identificação com o objeto mau e o testemunho de uma relação de dependência. A posterior internalização de objetos bons seria a forma compensatória, que impediria o sujeito de identificar-se plenamente com o objeto mau. Os objetos bons encontram finalmente um lugar subsidiário na compreensão de Fairbairn, aspecto que retomaremos mais adiante. CONCLUSÃO A psicanálise se internacionalizou, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, contextualizando-se numa diversidade de estudos inspirados nas condições sociais, políticas e econômicas dos vários países onde seus es- tudos estiveram presentes, e como forma de atender as necessidades individu- ais e coletivas daquela época. A transformação e o aperfeiçoamento da psicolo- gia e dos métodos psicoterápicos é um elemento essencial para a evolução dessa disciplina e para a sua contribuição na evolução da humanidade. A psico- logia do self, desenvolvida por Heinz Kohut tem suas raízes e originalidade a 31 partir das ideias e dos conceitos revistos acerca da teoria das relações objetais e do conceito de narcisismo da psicanálise ortodoxa. Para Kohutas, relações objetais sempre estão presentes na vida de uma pessoa e consistem em rela- ções interpessoais. A relação da mãe em constituir um vínculo significativo para a criança é fundamental para as primeiras relações objetais e formação da per- sonalidade desta criança, trata-se de um processo de desenvolvimento da cri- ança que ao se desligar da mãe estabelece outras relações com outras pessoas próximas. Esse processo é que forma um self coeso atribuindo ao futuro adulto força, saúde e grandeza de um ser humano apto para a vida. 32 REFERÊNCIAS https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/polemica/article/view/11675/9163 (acesso em 05/01/2020) relações objetais in Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2020. [con- sult. 2020-12-06 23:55:03]. Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/$re- lacoes-objetais FONSECA.Alexandre Barbosa da.PSICANÁLISE E AS RELAÇÕES OBJETAIS- Cadernos de Graduação- Ciências Biológicas e da Saúde | Maceió | v. 1 | n.3 | p. 57-66 | nov. 2013 ABRAS, Rosa Maria Gouvêa; SANCHES, Nina Rosa Artuzo. Abrindo o jogo. In: Revista SALLES, Ana Cristina Teixeira da Costa; CECCARELLI, Paulo Roberto. Angús- tia, separação e desamparo na clínica contemporânea. In: Estudos de Psicanálise, n. 38. Publi- cação do Círculo Brasileiro de Psicanálise – CBP. Belo Horizonte, dez./2012. Vorstellung, n. 1. Publicação do Grupo de Estudos Psicanalíticos – GREP. Belo Horizonte, out./1997.https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/polemica/article/view/11675/9163%20(acesso https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/polemica/article/view/11675/9163%20(acesso https://www.infopedia.pt/$relacoes-objetais https://www.infopedia.pt/$relacoes-objetais
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