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Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS LEITURA E PRODUÇÃO DE SENTIDOS EM ARTES VISUAIS Autor: Amauri Carboni Bitencourt 700 B624l Bitencourt, Amauri Carboni Leitura e produção de sentidos em artes visuais / Amauri Carboni Bitencourt. Indaial : Uniasselvi, 2011. 117 p. : il. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7830-484-3 1. Artes - comunicação I. Centro Universitário Leonardo da Vinci CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Dr. Malcon Tafner Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Profa. Hiandra B. Götzinger Montibeller Profa. Izilene Conceição Amaro Ewald Profa. Jociane Stolf Revisão de Conteúdo: Profa. Tatiana dos Santos Silveira Revisão Gramatical: Profa. Marcilda Cunha da Rosa Diagramação e Capa: Carlinho Odorizzi Copyright © Editora Grupo UNIASSELVI 2011 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: Doutorando em Filosofi a da Arte e mestre em Filosofi a (ambos pela Universidade Federal de Santa Catarina); especialista em Artes Visuais e em Metodologia do Ensino de Filosofi a e Sociologia; bacharel em Filosofi a, também pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professor universitário de desenho artístico, desenho de observação e desenho de moda. Pintor desde 1989, possui um acervo que gira em torno de 950 obras. Entre elas, algumas estão em coleções particulares em diversos países, como Japão, Espanha, Itália, Inglaterra, Uruguai e Brasil. Realizou algumas exposições de pinturas e recebeu, em 2007, a medalha de Honra ao Mérito Artístico Cultural da União Nacional dos Artistas Plásticos (UNAP). Possui algumas obras catalogadas (nacional e internacional). É autor de dois cadernos de ensino a distância do curso de Artes Visuais, a saber: Técnicas de Pintura e Desenho da Figura Humana, desenvolvidos para o Centro Universitário Leonardo da Vinci. Também é autor de alguns artigos que versam sobre arte e fi losofi a. Amauri Carboni Bitencourt Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................ 7 CAPÍTULO 1 Sistema de Signos ........................................................................ 9 CAPÍTULO 2 Linguagem Verbal e Não-Verbal ............................................... 29 CAPÍTULO 3 Introdução à Leitura da Imagem ................................................ 45 CAPÍTULO 4 Compreender e Refletir a Arte nas Diferentes Linguagens .............................................................. 65 CAPÍTULO 5 Leitura de Obra de Arte pela Psicanálise ............................... 83 CAPÍTULO 6 Arte e Filosofia ........................................................................ 101 APRESENTAÇÃO Caro(a) pós-graduando(a): Imagine que você já comprou as passagens aéreas e, daqui a alguns dias, visitará um país distante e entrará em contato com uma cultura diferente da sua. Você verá monumentos, casas e igrejas que não está acostumado a ver no dia a dia, com simbolismos que desconhece, bem como não saberá a história daquele país. Isso se você não se preparou, ao menos um pouco, munindo-se de um conhecimento mínimo prévio para que a sua visita tenha mais significância. Nesse sentido, quanto mais você se preparar para a sua viagem, mais estará apto a partilhar emoções e valores e, dessa forma, aprender sobre a cultura de outro país e usufruí-la. Cenas e detalhes que lhe passariam despercebidos terão mais a sua atenção se você estiver preparado para a viagem. De forma semelhante a uma viagem, é nossa inserção no mundo das obras de arte. Você não acha que ver uma pintura de alguns séculos terá mais significados após ter aprendido algo do contexto em que ela foi criada? Não acha que alguém que estuda a história da arte tenha mais condições de ler uma obra do que um leigo? Claro que o olhar de um espectador leigo experimentará sensações e emoções diversas e que todo aquele que se propõe a olhar uma obra deverá ter esse tipo de experiência. O que difere é que, para o estudante, a sua investigação continua, enquanto que o leigo geralmente para, ficando apenas na sensação visual e no padrão de gosto. De toda sorte, quanto mais você tiver aprendido sobre os métodos de criação artística, bem como sobre maneiras de olhar e ver uma obra, e também quanto maior for a sua cultura acerca da história da arte, mais condições terá de analisar uma obra com êxito. Por isso, é importante a visita aos museus e o contato com livros e catálogos de arte. Lembre-se: o treino do olhar é muito importante para um estudante de arte! Claro que ler uma obra com profundidade depende de outros conhecimentos fundamentais. Foi nesse contexto que criamos este material de estudos. Ele servirá como um guia inicial para que você tenha condições de adentrar este universo das artes visuais com mais profundidade, deixando, por conseguinte, os seus sentidos produzirem significações diversas no contato com as obras. Como todo aprendizado, o sucesso ou não destes estudos dependerá muito mais de você do que do material aqui proposto. Ao longo dos capítulos, apresentamos algumas sugestões de sites e livros. Esperamos que você os consulte para aprofundar seus conhecimentos. Didaticamente, este caderno foi dividido em seis partes: Capítulo 1 - Sistema de signos; Capítulo 2 - Linguagens verbais e não-verbais; Capítulo 3 - Introdução à leitura da imagem; Capítulo 4 - Compreender e refletir arte nas diferentes linguagens; Capítulo 5- Leitura de obra de arte pela psicanálise; Capítulo 6 - Arte e filosofia. Os dois primeiros capítulos tratarão da fundamentação teórica acerca dos signos; os dois centrais entrarão nas linguagens da arte e da leitura de algumas obras; e os dois últimos trarão alguns exemplos de produção de sentidos em espectadores e ramos do conhecimento humano, mais especificamente, psicanálise e filosofia. É importante ressaltar que o material aqui elaborado traz apenas algumas informações essenciais, bem como alguns exemplos de leituras e produção de sentidos. Aprofundar e ampliar seus conhecimentos acerca deste tema dependerá da sua dedicação e força de vontade. Por isso, não perca tempo: comece, agora mesmo, a estudar este assunto tão fascinante e instigante da cultura humana! O autor. CAPÍTULO 1 Sistema de Signos A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Diferenciar as principais vertentes do estudo dos signos. Conceituar a Semiótica e estabelecer relações entre as diversas abordagens do termo, bem como seus representantes mais importantes. Pontuar as principais trilogias conceituais acerca do signo elaboradas por Peirce. 10 Leitura e produção de sentidos em artes visuais 11 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 ConteXtualiZação Desde as primeiras inscrições rupestres feitas nas paredes de cavernas, no período Paleolítico Superior (provavelmente, há mais de 40 mil anos), o homem tenta representar, de várias formas, o mundo em que vive. Nesse período, foram criadas cerâmicas, armas e diversos utensílios trabalhados em pedra. Com o surgimento do primeiro alfabeto sobre o qual temos conhecimento – pictográfi co –, aproximadamente no ano 4.000 a.C., a raça humana começou a se comunicar e a se expressar por meio de desenhos simplifi cados chamados pictogramas. Após esse período, passou por diversas etapas de evolução da escrita: a escrita cuneiforme (3.250 e 1.950 a.C. por meio dos sumérios), a escrita hieroglífi ca (tribos nômades egípcias), o sistema de escritos dos gregos, o alfabeto latino, os primeiros escritos fi losófi cos dos pré-socráticos, o desenvolvimentoda dramaturgia e da poesia, as narrações de histórias literárias, o surgimento da imprensa e as invenções de Gutemberg, as várias manifestações artísticas e, recentemente, todo o aparato tecnológico virtual de imagens, símbolos, ícones e demais códigos que permeiam a vida humana contemporânea. Tudo isso nos mostra que o homem vive se expressando de várias maneiras e, por consequência, criando signos diversos. Esse sistema de signos permite que tenhamos uma compreensão melhor da vida que nos cerca. Isso, se soubermos decodifi cá-los, como, por exemplo, aprendermos que aplausos, risadas e sorrisos mostram que o público está de acordo e gostando de um espetáculo, ao passo que uma vaia quer mostrar o desagrado de um grupo de ouvintes diante de um discurso político. Mediante aprendizagem a priori, ao vermos um grande sinal de fumaça distante, consideramos que, provavelmente, algo estará pegando fogo (casa, mato, carro, etc.). Você percebe o quanto a nossa vida é cheia de signos como esse? Diante disso, cabe-nos aprender um pouco sobre esse universo regido pelos signos. Começaremos nossa jornada com o estudo dos fi lósofos acerca do tema, ao longo dos milênios. Depois, veremos alguns conceitos de Semiótica e Semiologia por diferentes autores e, fi nalmente, abordaremos as três principais vertentes do estudo semiótico a partir do século XIX. Neste capítulo, de maneira especial, aprofundaremos as teorias de Charles Sanders Peirce. Concentre-se, pois será um capítulo bem teórico! Origens do Estudo dos Signos As investigações acerca da doutrina dos signos coincidem com a própria história da fi losofi a. Obviamente que não era uma abordagem como a dos últimos séculos. Platão e Aristóteles, dois fi lósofos gregos antigos, já falavam sobre esse 12 Leitura e produção de sentidos em artes visuais assunto. Platão (427-347 a.C.), no diálogo chamado Crátilo, sobre a justeza dos nomes, pesquisou a relação entre o nome, as ideias e as coisas. Investigou se a relação entre o nome, as ideias e as coisas acontecem de forma natural ou se é uma construção social e chegou a algumas conclusões: • Os signos verbais e naturais são apenas representações incompletas da verdadeira natureza das coisas (segundo Platão, a verdadeira natureza das coisas não está no mundo empírico). • A pesquisa das palavras nada desvenda acerca da verdadeira natureza das coisas. Isso porque o “lugar” das ideias não depende das representações na forma de palavras. • Cognições elaboradas por meio de signos são apreensões indiretas e, portanto, inferiores às cognições diretas. Na concepção de Platão, as palavras seriam um intermediário e, consequentemente, inferiores ao conhecimento direto com as coisas às quais se referem. Assim, o conhecimento direto, sem o recurso de signos, coloca-nos mais próximos da “verdade”. Aristóteles (384-322 a.C.), por sua vez, investigou a teoria dos signos nos campos da retórica e da lógica. Traçou uma distinção entre signo certo – tekmérion – e signo incerto – semeîon – com o objetivo de mostrar que o signo pode ser uma proposição bem certa, ou necessária, ou também pode corresponder a uma opinião. Outros fi lósofos também se acercaram deste tema, tais como: os estóicos (Ca. 300 a.C. a 200 d.C.), os epicuristas (Ca. 300 d.C.), Santo Agostinho (354-430 d.C.), Tomás de Aquino (1225-1274) e John Locke (1632-1704). Não nos aprofundaremos nas investigações sobre a teoria dos signos desses fi lósofos, pois levaríamos demasiado tempo e esforço e por também se tratarem de teorias difíceis e específi cas. O que é importante ressaltar é que a Semiótica, tal como entendemos e estudamos atualmente, teve seu início com os fi lósofos John Locke (1632-1704) que, em 1690, no texto Ensaio acerca do entendimento humano, postulou a “doutrina dos signos”, cujo nome era Semeiotiké, e Johann H. Lambert (1728-1777), que escreveu, em 1764, um tratado intitulado Semiotik. Para Locke, os signos são grandes instrumentos de conhecimento, divididos em duas classes, a saber: as ideias e as palavras. As ideias são signos que estão na mente do espectador (ou contemplador), e as palavras são signos das ideias As investigações acerca da doutrina dos signos coincidem com a própria história da fi losofi a. Na concepção de Platão, as palavras seriam um intermediário e, consequentemente, inferiores ao conhecimento direto com as coisas às quais se referem. Aristóteles (384-322 a.C.), por sua vez, investigou a teoria dos signos nos campos da retórica e da lógica. 13 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 da mente do emissor. As palavras, em todo caso, nada representam, a não ser as ideias da pessoa que as usa. Esses conceitos foram fortemente combatidos por pesquisadores do assunto, pois Locke não admite que as palavras também sejam signos das ideias na mente do contemplador (e, portanto, das outras pessoas, além do emissor), pessoas com as quais nos comunicamos. Apesar disso, as ideias de Locke foram importantes para o desenvolvimento da teoria dos signos. O fi lósofo Alemão Georg W. F. Hegel (1770-1831) foi, entre os fi ósofos do século XIX, o que se destacou no estudo dos signos. Estabeleceu as fronteiras semióticas ao introduzir diferenças entre signos e símbolos. Outros fi lósofos dessa época se destacaram na investigação sobre esse tema: J. G. Fichte (1762-1814), Wilhelm von Humboldt (1767-1835), Bernard Bolzano (1781-1848) e Lady V. Welby (1837-1912). A Semiótica, tal como a teoria dos signos, desenvolveu-se através dos milênios até chegar ao ponto de se tornar uma disciplina ou ramo do conhecimento (ou mesmo ciência) estudada, principalmente, em áreas da Linguística e em áreas ligadas às artes. Ao ler Santaella (2005, p. 15), encontramos: A semiótica, a mais jovem ciência a despontar no horizonte das chamadas ciências humanas, teve um peculiar nascimento, assim como apresenta, na atual fase do seu desenvolvimento histórico, uma aparência não menos singular. A primeira peculiaridade reside no fato de ter tido, na realidade, três origens ou sementes lançadas quase simultaneamente no tempo, mas distintas no espaço e na paternidade: uma nos EUA, outra na União Soviética e a terceira na Europa Ocidental. Dessa forma, temos três momentos do surgimento da Semiótica: • EUA: Semiótica Peirceana, cujo precursor é Charles Sanders Peirce (1839- 1914); • UNIÃO SOVIÉTICA: geralmente chamada de Semiótica Soviética, Russa ou da Europa Oriental; • EUROPA OCIDENTAL: Semiótica Saussureana. Nesta, também estão vinculadas a Semiótica Visual e a Greimasiana ou Discursiva. A Semiótica, tal como entendemos e estudamos atualmente, teve seu início com os fi lósofos John Locke (1632- 1704) que, em 1690, no texto Ensaio acerca do entendimento humano, postulou a “doutrina dos signos”, cujo nome era Semeiotiké, e Johann H. Lambert (1728-1777), que escreveu, em 1764, um tratado intitulado Semiotik. 14 Leitura e produção de sentidos em artes visuais SemiÓtica e Semiologia: Conceitos e PolÊmicas Caro estudante, vimos que alguns pensadores refl etiram sobre a questão dos signos de diferentes maneiras. Vimos, também, que a Semiótica tornou-se, recentemente, uma nova disciplina do conhecimento humano. Mas, afi nal, o que, de fato, é Semiótica? Podemos iniciar dizendo que a palavra semiótica vem do grego sēmeiōtikos que, etimologicamente, quer dizer “a ótica dos sinais”. Em linhas gerais, falamos que é a ciência dos signos, embora saibamos a implicância que há em classifi car um conhecimento como sendo ciência ou não. Contudo, são várias e diferentes as concepções dos estudiosos do assunto acerca desse termo. O primeiro ao qual recorremos, com o objetivo de pensar sobre este assunto, é Winfried Nöth, segundo o qual A semiótica como teoria geral dos signos teve várias denominações no decorrer da história da fi losofi a. A etimologia do termo nos remete ao grego semeîon, que signifi ca ‘signo’, e sêmea, que pode sertraduzido por ‘sinal’ ou também ‘signo’. (NÖTH, 1995, p. 21). Apesar de Nöth (1995) falar da origem etimológica da palavra e o que ela signifi ca, ainda assim temos dúvida quanto a sua elaboração conceitual. No Brasil, uma grande estudiosa desse assunto é Lúcia Santaella, para quem A semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de signifi cação e de sentido. (SANTAELLA, 2005, p. 13). Com a defi nição de Santaella (2005), cremos que fi cou mais claro o que se entende por Semiótica. A professora Sandra Regina Ramalho e Oliveira, da Universidade Estadual de Santa Catarina, em seu livro Imagem também se lê, afi rma que os estudiosos defi nem o termo conforme sua visão e de acordo com o seu campo de atuação específi co (artes visuais, linguística, design, etc.). (OLIVEIRA, 2009). Apesar de algumas dessas defi nições serem complexas, podemos iniciar com concepções sucintas. A autora nos mostra algumas dessas concepções: A palavra semiótica vem do grego sēmeiōtikos que, etimologicamente, quer dizer “a ótica dos sinais”. Os estudiosos defi nem o termo conforme sua visão e de acordo com o seu campo de atuação específi co (artes visuais, linguística, design, etc.). 15 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 Semiótica é a ciência geral dos signos; também pode ser considerada a ciência da signifi cação, ou a ciência que estuda as linguagens [...]. Pode ser ainda defi nida como a ‘ciência geral de todos os sistemas de signos por meio dos quais se estabelece a comunicação entre os homens’, usando-se as palavras de J. T. Coelho Netto; ou conforme Odin, inspirado em Greimas: ‘teoria geral dos sistemas de comunicação, capaz de possibilitar o estudo do conjunto dos processos de produção de sentidos, seja intervindo nas linguagens verbais, não verbais ou no mundo natural’. (OLIVEIRA, 2009, p. 38). Apesar de parecidas, vemos que são defi nições que possuem diferentes ramifi cações e, por ser um campo de estudo recente como disciplina sistematizada, não há um consenso a respeito da defi nição. Outra discussão que encontramos entre os estudiosos do assunto é se a Semiótica é um conhecimento científi co ou não. Dela não conseguimos teorias que possam ser aplicadas em pesquisas das ditas ciências especiais ou especializadas, como a Química, a Biologia e a Física, pois não possui um objeto de estudo delimitado e defi nido. Esse objeto de estudo, segundo a autora, “poder-se-ia dizer as linguagens; mas como delimitar linguagens, quando hoje se fala da Ecossemiótica, da Sociossemiótica, da Biossemiótica e da Semiótica da cultura?” (OLIVERIA, 2009, p. 40). Logo, sendo diferentes objetos de estudos, há, então, por conta disso, uma exigência correspondente de múltiplos instrumentos de investigação para dar conta desses estudos. Tampouco podemos dizer que seja uma ciência especial. Em síntese, há os que acreditam que a semiótica seja uma ciência e deva ser tratada como tal e há aqueles que asseguram que “os fundamentos semióticos estarão associados a bases teóricas das ciências da vida, ou das ciências sociais, ou da física, da fi losofi a, ou de uma ou mais subdivisões de algumas dessas ciências [...]” (OLIVERIA, 2009, p. 40). Polêmicas à parte acerca de ser um conhecimento científi co ou não, também cabe, aqui, mostrar que há uma discussão em torno das terminologias Semiótica e Semiologia. São palavras que querem dizer a mesma coisa ou se referem a coisas distintas? Podemos usar ambas as palavras para falar do mesmo ramo do conhecimento? Investiguemos a questão. Nöth (1995, p. 23) nos mostra que Alguns semioticistas [...] começaram a elaborar distinções conceituais entre semiologia e semiótica: semiótica, designando uma ciência mais geral dos signos, incluindo os signos animais e da natureza, enquanto semiologia passou a referir-se unicamente à teoria dos signos humanos, culturais e, especialmente, textuais. Há os que acreditam que a semiótica seja uma ciência e deva ser tratada como tal e há aqueles que asseguram que “os fundamentos semióticos estarão associados a bases teóricas das ciências da vida, ou das ciências sociais, ou da física, da fi losofi a, ou de uma ou mais subdivisões de algumas dessas ciências [...]” (OLIVERIA, 2009, p. 40). 16 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Esta é, caro estudante, apenas uma das diferenças entre os termos. No mesmo texto, Nöth (1995) escreve que a palavra Semiótica, postulada por Locke, em 1690, era, geralmente, o termo preferido dos teóricos ligados à tradição da teoria dos signos de Charles Sanders Peirce, enquando que o termo usado pelos estudiosos ligados às teorias de Ferdinand de Saussure era Semiologia. Muitos textos foram escritos para dar conta dessa diferenciação. Porém, em 1969, a Associação Internacional de Semiótica passou a adotar os termos Semiótica e Semiologia como sinônimos. O termo ofi cial passou a ser Semiótica e abarcaria os conhecimentos tanto da Semiologia quanto da Semiótica. O autor dessa proposta foi Roman Jakobson. • Importante: Na medicina, desde a Antiguidade, há uma disciplina chamada Semiologia, dedicada ao estudo da interpretação dos sinais (ou diagnóstico dos signos das doenças). Esses estudos começaram com o médico grego Galeno (139-199), de Pérgamo. Essa disciplina da medicina é diferente da nossa proposta de estudo. Portanto, por ser o termo ofi cial e para não confundir com a área médica, utilizaremos apenas o termo Semiótica (exceto quando for citação de algum autor). A seguir, apresentamos dois sites que você pode acessar e aprofundar os seus conhecimentos de Semiótica. Uma fonte recomendável e confi ável para ler artigos científi cos sobre Semiótica é a revista Galáxia, que é uma publicação do Programa de Estudos de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC- SP). Eis o site da revista: http://revistas.pucsp.br/index.php/galaxia/index Acompanhe o grupo de estudos de Semiótica da Universidade de São Paulo (USP), acessando o site: <http://www.ffl ch.usp.br/dl/ semiotica/public/public.html>. Nele, você encontra vários artigos sobre o tema. Em 1969, a Associação Internacional de Semiótica passou a adotar os termos Semiótica e Semiologia como sinônimos. O termo ofi cial passou a ser Semiótica e abarcaria os conhecimentos tanto da Semiologia quanto da Semiótica. 17 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 Munidos desses conhecimentos históricos e conceituais, passemos ao estudo da teoria dos signos em cada uma das três vertentes fundantes da Semiótica. Atividade de Estudos: 1) Com o objetivo de fi xar o conteúdo até aqui exposto, responda, em linhas gerais, o que você entende por Semiótica e qual a diferença entre Semiótica e Semiologia. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Os Estudos de CHarles Sanders Peirce Sendo fi lho de um importante matemático de Harvard, Peirce cresceu num ambiente de acentuada proliferação intelectual. Sua grande paixão eraa ciência, mas também dedicava-se aos estudos de literatura, de linguística, de história, de fi lologia, de psicologia, entre outros ramos do saber humano. Fez importantes e originais contribuições na Matemática, na Química, na Física e na Filosofi a. Ao dedicar-se intensivamente à lógica das ciências, Peirce lutou pela consideração de tornar a lógica uma ciência. Em meio a esses estudos foi que postulou a teoria dos signos. Escutemos as palavras de Santaella (2005, p. 20): 18 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Desde o começo do despertar do seu interesse pela lógica, Peirce a concebeu como nascendo, na sua completude, dentro do campo de uma teoria geral dos signos ou Semiótica. Primeiramente, ele concebeu a lógica propriamente dita (aquilo que conhecemos como Lógica) como sendo um ramo da Semiótica. Mais tarde ele adotou uma concepção muito mais ampla da Lógica que era quase coextensiva a uma teoria geral de todos os tipos possíveis de signos. Na última década de sua vida, estava trabalhando num livro que se chamaria Um sistema de Lógica, considerada como Semiótica. Tendo interesse por lógica e, consequentemente por Semiótica, Peirce elaborou, desde tenra idade, uma vasta teoria dos signos. Partindo dos estudos fenomenológicos, fundamentou conceitualmente toda a sua fi losofi a com o objetivo de “dar conta do ‘trabalho inteiro da razão humana’.” (SANTAELLA, 2005, p. 30). Não aprofundaremos as bases fi losófi cas sobre fenomenologia, porém cremos que seja importante uma defi nição do termo. Um conceito que consideramos importante é exposto pelo fi lósofo Maurice Merleau-Ponty: A fenomenologia é o estudo das essências [...]. É a ambição de uma fi losofi a que seja uma ‘ciência exata’, mas é também um relato do espaço, do tempo, do mundo ‘vividos’. É a tentativa de uma descrição direta de nossa experiência tal como ela é [...] (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 1). Em seus escritos sobre a doutrina dos signos, ou Semiótica, Peirce queria confi gurar conceitos acerca dos signos tão gerais que pudessem servir de base para todas as ciências aplicadas. Desse modo, teria por função descrever e classifi car os diversos tipos de signos. Para isso, Peirce criou três categorias que constituem a base de suas teorias. Essas três categorias enquadrariam todos os fenômenos da natureza e da cultura. São elas: a primeiridade, a secundidade e a terceiridade. Resumidamente, essa tricomia pode ser assim delineada: • Primeiridade: capacidade humana de contemplar, a visão espontânea, o simples ato de ver os fenômenos. Algo que não é analisável, impressão imediata, livre, original e que precede toda síntese e diferenciação. Em seus escritos sobre a doutrina dos signos, ou Semiótica, Peirce queria confi gurar conceitos acerca dos signos tão gerais que pudessem servir de base para todas as ciências aplicadas. 19 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 • Secundidade: reação humana aos fatos concretos, capacidade de distinguir, de aceitar ou rejeitar as diversas experiências. Estar em relação a algo ou a alguém. Compreensão do mundo. • Terceiridade: capacidade de classifi car as experiências em categorias. É nesse nível que ocorrem a mediação e o crescimento. Inteligibilidade e interpretação do mundo. Você consegue perceber onde se encaixa essa teoria de Peirce? Pois bem, primeiro, vimos que a Semiótica foi tratada por diferentes fi lósofos ao longo de dois milênios e meio; depois, que ela está atrelada à ciência (questão polêmica) e à fi losofi a. Peirce elaborou a trilogia fundamental de sua teoria (que pudesse dar conta de todos os fenômenos da natureza e da cultura), a saber: primeiridade, secundidade e terceiridade. A sua investigação sobre Semiótica (doutrina dos signos) possibilita o estudo dos signos nos diversos campos de linguagens: artes visuais, teatro, cinema, fotografi a, música, dança, literatura, etc. Resumidamente, essa teoria está exposta no esquema a seguir. Figura 1 – Organograma da Teoria de Peirce Fonte: O autor. Na tentativa de instaurar uma teoria de signos, com conceitos tão gerais que pudessem servir de base para toda ciência aplicada, Peirce elaborou uma vasta constelação de conceitos e os classifi cou em múltiplos de 3 (três). Peirce elaborou a trilogia fundamental de sua teoria (que pudesse dar conta de todos os fenômenos da natureza e da cultura), a saber: primeiridade, secundidade e terceiridade. 20 Leitura e produção de sentidos em artes visuais As primeiras três categorias já vimos. Foi nesses pilares que Peirce fundamentou a sua teoria. Outro conhecimento importante é o que ele entende por signo, objeto e interpretante. • Signo: é uma coisa que representa ou substitui outra coisa: seu objeto. Sendo assim, o signo não é objeto, mas toma o lugar do objeto. Assim, representa e está no lugar desse objeto de certo modo e numa determinada capacidade. É aquilo que substitui alguma coisa. O desenho de um maçã, por exemplo, não é a maçã em si, mas algo que representa a maçã. Logo, o desenho a substitui; de um certo modo, dá-nos a ideia da maçã, mas o desenho não é a maçã. Figura 2 - Exemplo de signo (representação/desenho de uma maçã) Fonte: Disponível em: <http://engravedguitarparts.blogspot.com/2010/07/ desenho-lapis-maca.html>. Acesso em: 15 jul. 2011. • Objeto: Corresponde ao referente, ou seja, à coisa. O objeto pode ser uma coisa material do mundo ou uma entidade meramente mental ou imaginária. Nöth (1995, p. 67) aponta para uma terceira possibilidade do “ser” do objeto: “algo que é ‘inimaginável num certo sentido’”. Peirce reconhece dois tipos de objetos: o objeto imediato e o objeto mediato (também chamado de real ou dinâmico). • Interpretante: é a signifi cação ou efeito do signo. É algo que se cria (criado) na mente interpretadora e, portanto, “não se refere ao intérprete do signo, mas a um processo relacional que se cria na mente do intérprete.” (SANTAELLA, 2005, p. 58). Peirce reconhece três classes de interpretantes: o interpretante imediato, o interpretante dinâmico e o interpretante fi nal. Grafi camente, grosso modo, essa trilogia pode ser assim representada: 21 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 Figura 3 - Tríade semiótica de Peirce Fonte: Elaborada pelo autor com base em Peirce (2010). Nas palavras de Peirce, Um signo, ou representâmen, é aquilo que, sob certo aspecto ou modo, representa algo para alguém. Dirige-se a alguém, isto é, cria, na mente dessa pessoa, um signo equivalente, ou talvez um signo mais desenvolvido. Ao signo assim criado denomino interpretante do primeiro signo. O signo representa alguma coisa, seu objeto. Representa este objeto não em todos os seus aspectos, mas com referência a um tipo de ideia que eu, por vezes, denominei fundamento do representâmen. ‘Ideia’ deve aqui ser entendida num certo sentido platônico, muito comum no falar cotidiano; refi ro-me àquele sentido em que dizemos que um homem pegou a ideia de um outro homem; em que, quando um homem relembra o que estava pensando anteriormente, relembra a mesma ideia, e em que, quando um homem continua a pensar alguma coisa, digamos por um décimo de segundo, na medida em que o pensamento continua conforme consigo mesmo durante esse tempo, isto é, a ter um conteúdo similar, é a mesma ideia e não, em cada instante desse intervalo, uma nova ideia. (PEIRCE, 2010, p. 46. grifos do autor). Atividade de Estudos: 1) Apresente, em linhas gerais, as diferenças entre signo, objeto e interpretante. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 22 Leitura e produção de sentidos em artes visuais ____________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Segundo Peirce (2010), em virtude de o signo estar ligado ao fundamento, ao objeto e ao interpretante, a Semiótica está, então, dividida em três ramos: grámatica especulativa, lógica propriamente dita e retórica pura. • Gramática especulativa: ramo também chamado de gramática pura. Tem por tarefa determinar o que deve ser verdadeiro quanto ao signo usado pelo cientifi cismo com o objetivo de incorporar um signifi cado qualquer. • Lógica propriamente dita: ramo também chamado de lógica crítica. Investiga os tipos de argumentos, inferências e raciocínios, a saber: deducão, indução e abdução. • Retórica pura: ramo também chamado de retórica especulativa ou metodêutica. “Seu objetivo é determinar as leis pelas quais, em toda inteligência científi ca, um signo dá origem a outro signo e, especialmente, um pensamento acarreta outro.” (PEIRCE, 2010, p. 46). Estando ciente dos fundamentos fi losófi cos da Semiótica, da inter-relação signo-objeto-interpretante e dos ramos da lógica, estudaremos outra importante tricotomia elaborada por Peirce: as noções de ícone, índice e símbolo. • Ícone: quando a relação do signo com o objeto é de semelhança. Exemplos: pinturas, desenhos, caricaturas, imagens do cinema, mapas e estátuas. Figura 4 - Exemplo de ícone (pintura de um gato) Fonte: O autor. 23 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 • Índice: quando a relação do signo com o objeto é direta. Exemplos: espirro (índice de resfriado), fumaça (índice de fogo) e impressão digital. Figura 5 - Exemplo de índice de fogo (fumaça) Fonte: Disponível em: <http://noticias.r7.com/cidades/noticias/ aviao-da-esquadrilha-da-fumaca-cai-durante-apresentacao- em-sc-20100402.html> Acesso em: 5 jun. 2011. • Símbolo: quando a relação do signo com o objeto é convencional, isto é, imposta pela sociedade. Exemplos: H20 é símbolo da água, o buquê de fl ores é símbolo de afeto ou admiração. Da mesma forma, o número 8, o nome Paulo e a bandeira nacional são bímbolos. Figura 6 - Exemplo de símbolo (símbolos religiosos) Fonte: Disponível em: <http://3ipbcg.org.br/site/?p=2033>.Acesso em: 5 jun. 2011. 24 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Há, entrementes, caro estudante, alguns signos que possuem classifi cação dupla ou tripla. O traje de luto, por exemplo, é índice, pois morreu um ente querido da pessoa, e é símbolo, pois quem usa mostra o pesar pela morte de alguém. Peirce não apenas elaborou as teorias que vimos até aqui. Ele fez uma constelação dos tipos possíveis de signos (sempre triádicas, ou seja, numa combinação de três a três). Não nos aprofundaremos nesse assunto. Uma dessas classifi cações importantes (ícone, índice e símbolo) já estudamos. Agora, à guisa de conhecimento, apresentamos as três tricotomias do signo: • Segundo a natureza material do signo: quali-signo, sin-signo e legi-signo. • Relação do signo com seu objeto: ícone, índice e símbolo. • Relação do signo com seu interpretante: rema, discente e argumento. Os signos podem ser apresentados da seguinte maneira: Signo Objeto Interpretante Primeiridade Quali-signo Ícone Rema Secundidade Sin-signo Índice Discente Terceiridade Legi-signo Símbolo Argumento Quando combinados, formam uma classe de 10 classes de signos, material deveras extenso e complexo, sobre o qual não nos ateremos por momento. Se você quiser se aprofundar nos estudos de Peirce sobre Semiótica, um bom livro é: PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2010. Mas se você não dispõe de muito tempo para estudar, recomendamos a leitura do livro de Lúcia Santaela: SANTAELLA, Lucia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2005. (Coleção primeiros passos). Nesse pequeno grande livro, você encontra um resumo e uma introdução singular à leitura de Semiótica, especialmente a de Peirce. Peirce não apenas elaborou as teorias que vimos até aqui. Ele fez uma constelação dos tipos possíveis de signos (sempre triádicas, ou seja, numa combinação de três a três). 25 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 Atividade de Estudos: 1) Após este estudo teórico acerca da teoria Semiótica de Peirce, estabeleça diferenças entre ícone, índice e símbolo. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ A SemiÓtica na União SoViÉtica Chamada de Semiótica Soviética, Russa ou da Europa Oriental. Atualmente também chamada de Semiótica da Cultura. Na segunda metade do século XIX, não havia uma disciplina ou teoria específi ca para estudar os signos. Já havia, porém, uma consciência Semiótica entre alguns pensadores. Os primeiros, de acordo com Santaella (2005), foram dois grandes fi lósofos: A. N. Viesse-lovski e A. A. Potiebniá. Diz-nos Santaella (2005, p. 73-4, grifo da autora): Começando pelos fi lósofos citados (Potiebniá e Viesse-lovski) em cujas obras podem ser encontradas, já no século XIX, algumas raízes das descobertas do estruturalismo linguístico no século XX, chegamos ao lingüista N. I. Marr, que, no começo deste nosso século, vinha desenvolvendo, segundo nos informa B. Scheneiderman, ‘uma teoria estadial que ligava intimamente a fase de desenvolvimento da língua com os estádios de desenvolvimento da sociedade’. Essa consciência semiótica, iniciada por esses dois autores, perdurou até Stalin assumir o governo. O grupo que estudava esse assunto fi cou conhecido como Círculo Línguístico de Moscou. Oliveira (2009, p. 41) afi rma que Chamada de Semiótica Soviética, Russa ou da Europa Oriental. Atualmente também chamada de Semiótica da Cultura. 26 Leitura e produção de sentidos em artes visuais O Círculo Linguístico de Moscou inspirou a criação do Círculo Linguístico de Praga entre as décadas de 1920 e 1940. Em ambos, havia a predominância de estudos acerca da linguagem verbal, com ênfase na análise sintática, especilamente da poesia. Entretanto, já havia prenúncio da possibilidade de estender os princípios da estruturação da linguagem verbal para o estudo de outros códigos estéticos, como a pintura, o teatro, o cinema e a arte popular. Você percebe, caro estudante, que os estudos semióticos soviéticos também adentraram as artes visuais, foco do nosso interesse? Pois bem, um dos pensadores que se ocupou dessas pesquisas foi Roman Jakobson que, grosso modo, falava de um “trânsito entre sistemas distintos, a partir de um modelo comum, até então utilizado nos estudos das línguas naturais.” (OLIVEIRA, 2009, p. 41). Somente em 1950, foi fundado, em Moscou, o Instituto de Semiótica da URSS. Antes, o grupo de estudos fi cou impossibilitado de se reunir, pois o governo de Stalin desconfi ava de cada grupo que se reunia. A partir de 1970, a entidade passou a fi car mais conhecida como o grupo que estuda a Semiótica da Cultura, pois tinha como objetivo “investigar os sistemas de signos sempre levando em conta seu respectivo contexto cultural.” (OLIVEIRA, 2009, p. 42). A Semiótica da cultura está, atualmente, presente em vários países. Se você quiser se aprofundar nos estudos da Semiótica Soviética, leia o livro Semiótica russa, cuja referência é: SCHNEIDERMANN, B. Semiótica russa. São Paulo: Perspectiva, 1981. A Concepção de Ferdinand de Saussure Outro pesquisador importante para os estudos semióticos é Ferdinand de Saussure. De nacionalidade suíça e mais dedicado aos estudos da linguagem verbal, esse pesquisador fez grandes contribuiçõesà teoria dos signos. De uma maneira geral, você verá que a abordagem de Saussure é bem diferente da abordagem de Peirce. Somente em 1950, foi fundado, em Moscou, o Instituto de Semiótica da URSS. 27 SISTEMA DE SIGNOSCapítulo 1 Dão-se vários nomes para as semióticas derivadas a partir deste autor. Por ser iniciada por Saussure, é conhecida como Semiótica Saussureana. Para diferenciá-la da Europa Oriental (Semiótica Soviética), é chamada de Semiótica Ocidental; por ter vários estudiosos franceses, é dita Semiótica Francesa; também é conhecida como Semiótica Visual (por ter estudos “visuais” avançados na École de Paris). Um dos seguidores dessa linha de pesquisa é Algirdas J. Greimas, razão pela qual é chamada, também, de Semiótica Greimasiana ou Discursiva. Saussure tem suas bases teóricas na linguagem. Mesmo tendo estudado física e química nos primeiros anos de sua vida acadêmica, percebeu que seu caminho era outro. Assim, passou a dedicar-se ao estudo da linguagem e criou a Linguística. Além de dedicar-se ao estudo de sinais, Saussure tinha a Linguística como a “matriz do comportamento e do pensamento dos seres humanos, uma vez que considerava a linguagem a formatação de atos, vontades, sentimentos, emoções e projetos [...]” (OLIVEIRA, 2009, p. 45). Em outras palavras, para Saussure, a linguagem é um dos fundamentos principais das sociedades humanas. Inicialmente chamada de Semiologia – estudo de todos os sistemas de signos – a Semiótica Saussureana se baseia em dois conceitos fundamentais: signifi cante e signifi cado. Esta teoria teve vários seguidores que difundiram as ideias do criador, os quais também fazeram algumas modifi cações, conforme seu interesse e ramo de atividade. Caro estudante, como o próximo capítulo tratará de linguagem verbal e não-verbal, será nele que centraremos os estudos da Semiótica de Saussure, bem como o aprofundamento dos conceitos de signifi cante e signifi cado. Aqui, o objetivo era aprofundar os conceitos de Peirce e mostrar, em linhas gerais, as outras duas correntes semióticas apontadas no início do capítulo. Algumas ConsideraçÕes Este capítulo, como havíamos mencionado no início, foi deveras teórico. Em se tratando de um curso de arte e educação, talvez você tenha sentido falta de mais imagens. Contudo, nos outros capítulos, esse recurso será mais utilizado. Para Saussure, a linguagem é um dos fundamentos principais das sociedades humanas. Inicialmente chamada de Semiologia – estudo de todos os sistemas de signos – a Semiótica Saussureana se baseia em dois conceitos fundamentais: signifi cante e signifi cado. Por ser iniciada por Saussure, é conhecida como Semiótica Saussureana. 28 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Resumidamente, vimos as origens fi losófi cas da teoria dos signos, os conceitos de Semiótica e Semiologica, bem como as polêmicas que giraram em torno de ambos os termos. Adentramos as teorias do fi lósofo Charles Sanders Peirce e investigamos as três categorias que enquadram todos os fenômenos da natureza e da cultura, a saber: a primeiridade, a secundidade e a terceiridade. Estudamos, também, a inter-relação signo-objeto-interpretante. Finalmente, fi camos sabendo que Peirce fez uma constelação de tipos possíveis de signos (sempre triádicas, ou seja, numa combinação de três a três). Além disso, sobrevoamos a Semiótica na União Soviética (também chamada de Semiótica da Cultura) e, brevemente, iniciamos o estudo da concepção de Ferdinand de Saussure. Dessa forma, demos o ponta-pé inicial na leitura e na produção de sentidos em artes visuais. No próximo capítulo, retomaremos as teorias de Saussure e investigaremos as linguagens verbal e não-verbal. ReferÊncias MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1999. NÖTH, Winfried. Panorama da semiótica: de Platão a Peirce. São Paulo: Annablume, 1995. OLIVEIRA, Sandra Regina Ramalho e. Imagem também se lê. São Paulo: Edições Rosari, 2009. (Coleção TextosDesign). PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2010. SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2005. (Coleção primeiros passos). CAPÍTULO 2 Linguagem Verbal e Não-Verbal A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Conhecer aspectos da linguagem verbal e da não-verbal. Estabelecer relações entre a linguagem verbal e a não-verbal. 30 Leitura e produção de sentidos em artes visuais 31 LINGUAGEM VERBAL E NÃO-VERBALCapítulo 2 ConteXtualiZação O ser humano, quando em convívio com outras pessoas, precisa se comunicar. Ele desenvolveu, ao longo da história, uma variedade de formas de comunicação, fazendo com que o entendimento entre os indivíduos acontecesse de maneira mais fácil e rápida. A linguagem verbal foi uma delas. De fato, nos comunicamos por meio da palavra, tanto da falada quanto da escrita. Estamos tão envolvidos com esta maneira de nos expressarmos que se torna quase impossível imaginar um mundo onde elas não existam. Por outro lado, desenvolvemos, também, ao longo dos anos, signos não- verbais. Em uma placa de trânsito, por exemplo, vemos um tipo de linguagem que não utiliza palavras (com exceção de algumas). Você lida, caro estudante, com tantos exemplos de comunicação não-verbal em sua vida, que, na maioria das vezes, nem se dá conta disso. Passam-nos despercebidos. Você pega o videogame e joga com seu irmão. Nesse ato, tão simples para algumas pessoas, há a utilização da linguagem não-verbal (claro que se você falar com seu irmão ou aparecer alguma palavra na tela do visor, você também estará empregando a linguagem verbal). O jogo em si, porém, constitui um tipo de linguagem não-verbal. No capítulo anterior, vimos que a Semiótica é a ciência que tem por fi nalidade a investigação de todas as linguagens possíveis. Estudamos as teorias de Peirce e o universo do sistema de signos. Neste capítulo, investigaremos as teorias de Ferdinand de Saussure, que desenvolveu a Linguística entre os séculos XIX e XX e que teve como objeto de estudo a linguagem verbal humana. Em contraposição, veremos aspectos da linguagem não-verbal tão presente em nossas vidas quanto o universo das palavras. Entre a Linguagem Verbal e a Não- Verbal Você percebe, caro estudante, o quanto a nossa vida é regida pela linguagem? É só observar que, para nós nos comunicarmos neste momento, utilizamos a linguagem escrita. Quando você assiste à televisão ou participa de uma palestra, escuta a palavra falada. Então, podemos dizer que uma das formas de linguagem que utilizamos é a que emprega a palavra para que haja comunicação. Mas está aí o limite da linguagem? Obviamente que não. Você já deve ter escutado a expressão: “entendeu ou quer que eu desenhe?”. Nesse caso, verifi camos que o desenho também é uma forma de comunicarmos algo a alguém. O pintor, ao pintar uma tela, também objetiva atingir o espectador e passar, com isso, uma 32 Leitura e produção de sentidos em artes visuais determinada mensagem. O músico, com suas composições e arranjos musicais, emociona enamorados, intensifi ca o drama no cinema e aquieta um coração despedaçado pela perda de um ente querido. Isto só para citar alguns exemplos que encontramos no nosso cotidiano. Adentremos, então, esse universo da linguagem. Grosso modo, podemos dividir a linguagem em dois grandes grupos: • linguagem verbal e • linguagem não-verbal. Aprofundaremos esses conceitos. Antes, porém, cumpre-nos distinguir língua de linguagem. Saussure, que será mais estudado no decorrer deste capítulo, ocupou-se do estudo da linguagem verbal. Um dos seus seguidores, Roland Barthes, no livro Elementos de semiologia, afi rma que “A língua é então, praticamente, a linguagem menos a fala.” (BARTHES, 2006, p. 17). Contudo, uma não existe sem a outra. Assim, língua e fala coexistem no processo de comunicação. Outros elementos, nesteprocesso, são os gestos e as imagens. Ao falarmos da língua, estamos nos reportando à linguagem verbal. Este é o tipo de linguagem que podemos criar, modifi car, transformar e reproduzir, para que possamos nos comunicar com os outros seres humanos. No ocidente, utilizamos o alfabeto para nos comunicar por meio da escrita. Esse código, criado e estabelecido a partir dos gregos, permite uma combinação extensa de signos convencionais para a expressão de ideias humanas. São exemplos de linguagem verbal: entrevistas, cartas, e-mail, texto narrativo, bilhetes, bate-papo na internet e jornal televisionado. Comunicamo-nos por meio da palavra escrita e pela fala, mas também por outros tipos de codifi cações como, por exemplo, os ideogramas: linguagem utilizada pelos povos orientais. Figura 7 - Exemplo de ideogramas chineses Fonte: Disponível em:< http://oulunarkkitehtikilta.net/kalenteri/ ideogramas-chineses>. Acesso em: 1º jul. 2011. Ao falarmos da língua, estamos nos reportando à linguagem verbal. Este é o tipo de linguagem que podemos criar, modifi car, transformar e reproduzir, para que possamos nos comunicar com os outros seres humanos. 33 LINGUAGEM VERBAL E NÃO-VERBALCapítulo 2 Além da linguagem verbal, temos outro tipo que chamamos de linguagem não-verbal. Santaella (2005, p. 12) explica que, quando dizemos linguagem, queremos nos referir a uma gama incrivelmente intrincada de formas sociais de comunicação e de signifi cação que inclui a linguagem verbal articulada, mas absorve também, inclusive a linguagem dos surdos-mudos, o sistema codifi cado da moda, da culinária e tantos outros. Aqui, Santaella (2005) aponta para a linguagem não-verbal. Grosso modo, podemos dizer que a linguagem não-verbal é aquela que não emprega palavras. Como exemplos, podemos citar: o desenho, as placas de trânsito, a pintura, a dança, a escultura e a cor. Figura 8 - Exemplo de linguagem não-verbal: vestimenta Fonte: Disponível em: <http://www.modanapassarela. com.br/?p=5676>. Acesso em: 1º jul. 2011. Você já deve ter assistido, em algum programa de televisão, a profi ssionais dando dicas de como se vestir ou lido, em alguma revista de moda, a esse respeito. Dizem, por exemplo, que usar roupas com listras horizontais faz com que a pessoa fi que mais “gorda”, ao passo que vestir roupas com listras no sentido vertical faz com que emagreça. Não é (quase) unânime a afi rmação de que usar roupa preta deixa a pessoa mais “esbelta”? Pois bem, vemos que a cor comunica a imagem de gordura ou magreza na moda. Podemos dizer que a linguagem não-verbal é aquela que não emprega palavras. 34 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Figura 9 - Exemplo de linguagem não-verbal: dança Fonte: Disponível em: <http://www.dicasdedanca.com.br/wp-content/ uploads/2010/09/dança-do-ventre-véu.jpg>. Acesso em: 1º jul. 2011. Vemos a linguagem não-verbal em diversos setores do conhecimento e de expressões humanas, como a moda e a dança. O semáforo também é um exemplo de linguagem não-verbal. Ao empregar esse tipo de sinal para a organização do trânsito, o homem abre mão da palavra e utiliza outro meio de comunicação, no caso, as cores. Assim, aquele que teve um aprendizado sobre este sistema de codifi cação saberá que, se o semáforo estiver com a luz acesa no vermelho, deverá parar o carro, se estiver verde, deverá avançar e, se estiver amarelo, deverá dirigir com atenção. Essas observações permitem afi rmar que o ser humano utiliza dois tipos de linguagens: a verbal e a não-verbal. Para facilitar o aprendizado, veja a fi gura a seguir. Vemos a linguagem não-verbal em diversos setores do conhecimento e de expressões humanas, como a moda e a dança. 35 LINGUAGEM VERBAL E NÃO-VERBALCapítulo 2 Figura 10 - Organograma da ciência da linguagem (verbal x não-verbal) Fonte: Elaborada pelo autor. Compreendem a linguagem verbal: escrita, hieróglifos, pictogramas, fala, ideogramas, logogramas e outros. Já, por outro lado, os desenhos, jogos, músicas, pinturas, esculturas, danças, movimentos, cenografi as, libras e cores são exemplos de linguagem não-verbal. Claro que não podemos fazer uma distinção tão separatista entre essas duas linguagens. Isso porque há determinados signos que empregam as duas ao mesmo tempo. Podemos chamar de linguagens mistas. Citamos, como exemplo, a placa de trânsito, que emprega imagens e palavras ao mesmo tempo. Outro exemplo é a pintura do artista pop Basquiat. 36 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Figura 11 - Exemplo de linguagem mista: placa de trânsito Fonte: Disponível em: <http://turmadopedal.groupsite.com/discussion/topic/show/ 298989>. Acesso em: 1º jul. 2011. Figura 12 - Exemplo de linguagem mista: pintura Fonte: Disponível em: <http://slamxhype.com/music/jean- michel-basquiat/>. Acesso em: 1º jul. 2011. A LinguÍstica de Saussure Após investigarmos a distinção entre linguagem verbal e não-verbal, a partir de agora, aprofundaremos o estudo acerca do verbal. Um dos estudiosos que mais mergulhou no universo deste tipo de linguagem foi Ferdinand de Saussure. 37 LINGUAGEM VERBAL E NÃO-VERBALCapítulo 2 Leitura obrigatória para os estudantes e pesquisadores da linguística, sua obra mais importante é Curso de lingüística geral, publicação póstuma, em 1916, organizado por seus alunos Charles Bally e Albert Sechehaya a partir das aulas do mestre. Essa obra traz elaborações teóricas que desenvolveram a linguística como ciência e desencadearam, também, o surgimento do estruturalismo. Ferdinand de Saussure estudou línguas europeias e publicou, aos vinte e um anos de idade, a sua dissertação que tinha como tema o primitivo sistema das vogais nas línguas indo-europeias. Após defender a tese sobre o uso do caso genitivo em sânscrito, em Berlim, lecionou, em Paris, Sânscrito, Gótico, Alto Alemão e também Filologia Indo-Europeia. De volta a Genebra, sua cidade natal, lecionou Sânscrito e linguística histórica em geral. Em 1906, começou a ensinar aquilo que o consagraria como o pai da linguística: realizou uma série de conferências sobre linguística geral, cujo resultado culminou em modifi car a visão acerca do que hoje se entende por linguística. Sânscrito é a língua na qual se encontram escritos os textos de Vedanta. Pertence à grande família de línguas indo-europeias, como o grego e o latim, de onde derivou a maior parte das línguas ocidentais modernas. Possui uma estrutura bastante elaborada, como indica seu próprio nome (sams - bem; krtam - feita) e baseia-se num sistema de derivação no qual as palavras são formadas a partir de um conjunto de cerca de 2.200 elementos básicos, chamados raízes, seguindo regras muito bem estabelecidas. FONTE: Disponível em: <http://www.vidyamandir.org.br/ sanscrito.htm> Acesso em: 1º jul. 2011). Claro, caro estudante, que a linguística evoluiu muito durante os séculos XX e XXI. Contudo, muito do que foi construído acerca dessa ciência partiu dos estudos de Saussure, que já sabia dos limites de suas pesquisas. Entretanto, ainda hoje, os estudiosos do assunto precisam recorrer continuamente aos conceitos e dicas do mestre genebrino. Linguística, segundo Saussure (2006, p. 7), é “a ciência que se constitui em torno dos fatos da língua” e “passou por três fases sucessivas antes de reconhecer qual é o seu verdadeiro e único objeto”, a saber: Gramática, Filologia e Gramática Comparada. Sobre esta visão geral da história da linguística, não nos deteremos. Linguística, segundo Saussure (2006, p. 7), é “a ciência que se constitui em torno dos fatos da língua”. 38 Leitura e produção de sentidos em artes visuais O importante é notar que, antes de a linguística se constituir como ciência, cujo objeto é a língua, ela passou pelas três fases citadas anteriormente. Importante: A Linguística é uma das partes da Semiótica ou Semiologia. Lida essencialmente com a linguagem verbal. No início deste capítulo, esboçamos umbreve comentário em torno da língua. Sendo um conceito muito importante nos estudos de Saussure, aprofundaremos esta investigação. RETOMANDO ROLAND BARTHES: “A língua é então, praticamente, a linguagem menos a Fala: é, ao mesmo tempo, uma instituição social e um sistema de valores. Como instituição social, ela não é absolutamente um ato, escapa a qualquer premeditação; é a parte social da linguagem; o indivíduo não pode, sozinho, nem criá-la nem modifi cá-la. Trata-se essencialmente de um contrato coletivo ao qual temos de submeter-nos em bloco se quisermos comunicar; além disto, este produto social é autônomo, à maneira de um jogo com as suas regras, pois só se pode manejá-lo depois de uma aprendizagem. Como sistema de valores, a língua é constituída por um pequeno número de elementos de que cada um é, ao mesmo tempo, um vale-por e o termo de uma função mais ampla onde se colocam, diferencialmente, outros valores correlativos; sob o ponto de vista da língua, o signo é como uma moeda: esta vale por certo bem que permite comprar, mas vale também com relação a outras moedas, de valor mais forte ou mais fraco. O aspecto institucional e o aspecto sistemático estão evidentemente ligados: é porque a língua é um sistema de valores contratuais (em parte arbitrários, ou, para ser mais exato, imotivados) que resiste às modifi cações do indivíduo sozinho e que, consequentemente, é uma instituição social. Diante da língua, instituição e sistema, a Fala é essencialmente um ato individual de seleção e atualização [...]. O aspecto combinatório da Fala é evidentemente capital, pois implica que a Fala se constitui pelo retorno de signos idênticos: é porque os 39 LINGUAGEM VERBAL E NÃO-VERBALCapítulo 2 signos se repetem de um discurso a outro e num mesmo discurso (embora combinados segundo a diversidade infi nita das palavras) que cada signo se torna um elemento da Língua; é porque a Fala é essencialmente uma combinatória que corresponde a um ato individual e não a uma criação pura. [...] não há língua sem fala e não há fala fora da língua [...]. Só podemos manejar uma fala quando a destacamos na língua; mas, por outro lado, a língua só é possível a partir da fala: historicamente, os fatos de fala precedem sempre os fatos de língua (é a fala que faz a língua evoluir), e, geneticamente, a língua constitui-se no indivíduo pela aprendizagem da fala que o envolve (não se ensina a gramática e o vocabulário, isto é, a língua, de um modo geral, aos bebês). A Língua é, em suma, o produto e o instrumento da Fala, ao mesmo tempo: trata-se realmente, portanto, de uma verdadeira dialética”. Fonte: BARTHES, Roland. Elementos de semiologia. São Paulo: Cultrix, 2006. Figura 13 - Exemplo de “língua” Fonte: Disponível em: <http://martabolshaw.blogspot.com/2008/06/o- incrvel-mundo-da-linguagem.html>. Acesso em: 1º jul. 2011. Trouxe estas palavras de Barthes sobre a questão língua-fala, pois é de fundamental importância nos estudos de Saussure. Vimos que a língua e a fala coexistem e que uma não sobrevive sem a outra. A língua se aprende: ninguém consegue aprendê-la sem o auxílio do outro. Neste processo de comunicação verbal, torna-se mister, então, a investigação acerca do signo em Saussure. Vimos que a língua e a fala coexistem e que uma não sobrevive sem a outra. A língua se aprende: ninguém consegue aprendê-la sem o auxílio do outro. 40 Leitura e produção de sentidos em artes visuais O signo linguístico não une uma coisa a uma palavra, mas uma coisa à imagem acústica. Não é a imagem física do som, mas a impressão psíquica ou imagem mental do som. Está confuso? Pois bem, vejamos isso melhor. Para Saussure, signo é constituído de um signifi cado e de um signifi cante. Em outras palavras: o signo é composto por uma imagem acústica (signifi cante) e um conceito (signifi cado). “O plano dos signifi cantes constitui o plano de expressão [forma] e o dos signifi cados o plano de conteúdo.” (BARTHES, 2006, p. 42). A imagem a seguir ajudará você a entender melhor estes conceitos. Figura 14 - Signifi cante versus signifi cado Fonte: Disponível em: <http://ideiabasica.blogspot.com/2010/09/ arbitrariedade-do-signo-dialogo-entre.html>. Acesso em: 1º jul. 2011. Numa linguagem mais simplifi cada, imagem acústica ou signifi cante é a representação mental do som produzido pela fala. Assim, se dissermos “casa”, em sua mente, formar-se-á uma imagem fi gurativa que fará com que você entenda o que estamos falando. Caro estudante, para um melhor aprofundamento na teoria linguística de Saussure, recomendamos duas obras: SAUSSURE, Ferdinand. Curso de lingüística geral. São Paulo: Cultrix, 2006 e BARTHES, Roland. Elementos de semiologia. São Paulo: Cultrix, 2006. Apear de Saussure ser a referência primeira deste ramo do conhecimento, o livro de Barthes possui uma linguagem mais fácil e rápida de entender. O signo é composto por uma imagem acústica (signifi cante) e um conceito (signifi cado). 41 LINGUAGEM VERBAL E NÃO-VERBALCapítulo 2 Atividade de Estudos: 1) Explique, em linhas gerais, o que Saussure entende por signo. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ A Linguagem Não-Verbal Como seres humanos, não nos comunicamos somente por meio de palavras, mas também por gestos, expressões faciais, expressões artísticas diversas e toda crescente rede de signos não-verbais que continuamente invade nossas vidas. A internet, com todo o aparato tecnológico computacional, lança signos a cada instante. Não apenas isso: as distâncias estão sendo “encurtadas”, e a globalização faz com que as distinções e singularidades fi quem cada vez menos acentuadas. Rompem-se os cânones artísticos, e novas formas de “imagens” surgem sucessivamente. A pintura, por exemplo, deixou de ser, com o advento da fotografi a, a representação do mundo. Após um período de desconstrução da imagem, a pintura ultrapassou os limites da tela: surgiram, por exemplo, as instalações e a pintura digital. Você percebe, caro estudante, a grande variedade de signos não- verbais com que temos de lidar no dia a dia? Você liga o computador, abre uma determinada página da internet e recebe uma avalanche de informações: gráfi cos, fotos, desenhos, jogos e imagens, com suas mais variadas cores e formas que invadem sua vida, sem, ao menos, ter tempo para aceitá-las ou não. Corporalmente, sem recorrermos ao emprego de palavras, estamos o tempo todo nos comunicando. Estamos compartilhando linguagens quando sorrimos, quando levantamos o braço, quando levantamos o dedo em sinal de positivo, quando abrimos os braços, quando movimentamos os olhos, etc. Note que alguns dos gestos que utilizamos no cotidiano têm diferentes significados conforme o povo que os utilizam. Um desses exemplos é o “ok” norte-americano que, no Brasil, é empregado quando querendo “xingar” alguém. Estamos compartilhando linguagens quando sorrimos, quando levantamos o braço, quando levantamos o dedo em sinal de positivo, quando abrimos os braços, quando movimentamos os olhos, etc. 42 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Figura 15 - Exemplo de linguagem não-verbal: gesto Fonte: Disponível em: <http://www.contraovento.com. br/?attachment_id=3857>. Acesso em: 1º jul. 2011. Há livros específi cos sobre o signifi cado psicológico dos gestos humanos. O psicólogo francês, que vive no Brasil desde 1948, Pierre Weil, por exemplo, escreveu um livro chamado O corpo fala. Dessa forma, tornou-se uma referência neste assunto. Em sua obra, analisa gestos, como o cruzar de braços e o signifi cado deste na comunicação entre as pessoas. Para saber mais sobre a vida e a obra de Pierre Weil, visite o site <http://www.pierreweil.pro.br/Brazil.htm>. Uma das formas mais explícitas que comunicamos com o corpo é quando movemos os músculos e pormenores do rosto.As expressões faciais constituem o meio mais fácil de criarmos simpatia ou antipatia ao encontrarmos alguém. Figura 16 - Exemplo de linguagem não-verbal: expressão facial/sorriso Fonte: Disponível em: <http://eternamente-princesa.blogspot. com/2010_04_01_archive.html> Acesso em: 1º jul. 2011. Também comunicamos quando vestimos uma determinada roupa, com uma estampa escolhida por nós, de cor vibrante ou neutra que selecionamos, 43 LINGUAGEM VERBAL E NÃO-VERBALCapítulo 2 ou indicada por um consultor de moda, e acessórios mais discretos ou mais marcantes conforme nossa disposição do momento. Vemos, então, o quanto a maneira como somos, como agimos e como nos vestimos diz algo a nosso respeito às outras pessoas. Recentemente, no Brasil, os cursos universitários vêm implantando, em suas grades curriculares, especialmente de licenciaturas, a disciplina de Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), como forma de melhorar a comunicação entre professores e alunos e inserir a comunidade surda no convívio social e escolar de forma mais fácil e efi ciente. Figura 17 - Exemplo de linguagem não-verbal: LIBRAS Fonte: Disponível em: <http://www.smarcos.net/noticias/282-lingua- brasileira-de-sinais-libras-na-usm.html>. Acesso em: 1º jul. 2011. Constantemente, utilizamos a linguagem verbal e a não-verbal em nosso dia a dia. O estudo sobre a não-verbal, que brevemente vimos neste capítulo, será aprofundado no capítulo seguinte, mais especifi camente no que tange à leitura de imagem. Atividade de Estudos: 1) Comente, brevemente, o que você entende por linguagem não- verbal. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 44 Leitura e produção de sentidos em artes visuais ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Algumas ConsideraçÕes Neste capítulo, tivemos a oportunidade de estudar aspectos importantes da linguagem verbal e da não-verbal. Por verbal, grosso modo, entendemos as linguagens que fazem uso de palavras e, por não-verbal, as que não utilizam palavras. Aprofundamos nosso conhecimento acerca da linguagem verbal por meio da linguística de Ferdinand de Saussure. Alguns conceitos são considerados centrais em sua doutrina dos signos, como, por exemplo, o de língua e o de fala. Além disso, o signo se constitui de duas partes essenciais: o signifi cante e o signifi cado, ou seja, de acordo com Saussure, o signo é composto por uma imagem acústica (signifi cante) e um conceito (signifi cado). Vimos que não nos comunicamos somente por meio de palavras, mas também por meio de gestos, de expressões faciais, da maneira como nos vestimos e agimos, bem como dos acessórios com os quais nos enfeitamos ou carregamos no dia a dia. Diante disso, investigamos os universos verbais e não-verbais da linguagem. Estes conhecimentos são a base para começarmos a pensar a leitura de imagens e a produção de sentidos que as obras suscitam em nós. ReferÊncias BARTHES, Roland. Elementos de semiologia. São Paulo: Cultrix, 2006. SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2005. (Coleção primeiros passos). SAUSSURE, Ferdinand. Curso de lingüística geral. São Paulo: Cultrix, 2006. CAPÍTULO 3 Introdução à Leitura da Imagem A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Compreender a maneira como a imagem comunica e transmite mensagens. Fazer uma leitura consciente da imagem artística. Refl etir sobre as diferentes possibilidades de leitura de imagem em sala de aula. (leitura formal, descritiva, interpretativa e contextualizada). 46 Leitura e produção de sentidos em artes visuais 47 INTRODUÇÃO À LEITURA DA IMAGEMCapítulo 3 ConteXtualiZação Por vezes, em exposições de obras de arte contemporânea, vemos fi guras disformes, distorcidas, que ofuscam e embaralham nosso olhar. Causam-nos incômodos. Como podemos apreciá-las se, ao olhar para elas, a sensação que temos é de repulsa e de desagrado? O observador contemporâneo fi ca, quase sempre, perdido quando a obra ultrapassa os limites cristalizados pela cultura clássica. O que devemos fazer nesse caso? Quando não é a representação de cenas tal como a fotografi a o faz, parece que precisamos ler algum texto de uma pessoa especializada no assunto, ou mesmo do próprio artista, para poder entender a obra, ao menos em parte. Quando contemplamos, por outro lado, uma obra de arte clássica renascentista, por exemplo, ao visitar o museu do Louvre, na França, fi camos extasiados e perplexos, tamanha a efi ciência no manejo das técnicas utilizadas pelos grandes mestres. Diante de tais obras, nosso olhar fl ui com naturalidade. Vimos nascer, no fi nal do século XIX, uma nova forma de fazer arte. O advento da fotografi a propiciou aos pintores uma mudança signifi cativa na elaboração das obras. Mas como ler tais obras? Como devemos nos comportar diante de uma arte que não representa mais o visível? De fato, é preciso uma reeducação do olhar. É preciso que aprendamos alguns elementos e técnicas básicas das manifestações artísticas, especialmente das modernas e contemporâneas. NesSas, o nosso olhar se modifi ca, se estranha, interage, participa. É nesta perspectiva que este capítulo começará com a leitura de uma obra de arte moderna, do pintor francês Henri Matisse. Depois, passamos pelo exemplo de uma pintura brasileira de Cândido Portinari, também pela escultura Monumento às Bandeiras, do artista paulista Vitor Brecheret, e, fi nalmente, culminamos com uma análise semiótica, realizada, a partir de uma ofi cina de arte contemporânea, com alguns alunos pela arte-educadora gaúcha Patriciane Born. Matisse e o VermelHo Intenso A professora e especialista em Semiótica Peirceana no Brasil, Lúcia Santaella, em seu livro Semiótica aplicada, mostra alguns exemplos de como algumas imagens podem ser analisadas a partir da Semiótica de Peirce. Uma das obras analisadas, e retomada aqui para exemplifi cação, é Interior vermelho, natureza-morta sobre mesa azul, do pintor fauvista Henri Matisse, de 1947. 48 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Figura 18 - Interior vermelho, natureza-morta sobre mesa azul, 1947, Henri Matisse Fonte: Disponível em: <http://www.passeiweb.com/saiba_mais/ arte_cultura/galeria/open_art/1155>. Acesso em: 5 jul. 2011. Em primeiro lugar, já caminhando na direção da teoria de Peirce, Santaella (2002, p. 86) pede ao leitor que tenha uma experiência fenomenológica com a obra, ou seja, devemos “abrir os olhos do espírito e olhar para a pintura” com nenhum juízo de valor ou conceitos previamente formados. De acordo com Santaella (2002), são três as fases dessa experiência: • Disponibilidade contemplativa: devemos olhar a obra com singeleza e candidez, deixando-nos impregnar pelas cores, linhas e formas, deixando os nossos sentidos sentirem a obra. • Observação atenta da comunicabilidade da pintura: estamos, aqui e agora, diante de algo singular e único. • Generalização do específi co dentro da classe a que pertence: observar a classe de pinturas à qual pertence a obra. Depois dessa experiência, por mais provocativa e confusa que possa ser, é que a análise deverá ser iniciada. A pintura é um signo, pois “é algo que representa algo, sendo capaz de produzir efeitos interpretativos em mentes reais ou potenciais.” (SANTAELLA, 2002, p. 88). Isso é evidente e já o sabemos. O primeiro elemento da análise é a relação do signo consigo mesmo: aquiloque Peirce chamou de quali-signo, sin-signo e legi-signo. Assim, para vermos 49 INTRODUÇÃO À LEITURA DA IMAGEMCapítulo 3 o quali-signo (qualidade sígnica imediata) da obra de Matisse, devemos fi car “no plano puramente sensório e sensível, como uma criança que ainda não é capaz de reconhecer fi guras.” (SANTAELLA, 2002, p. 88). Observamos, então, um vermelho chapado, puro e intenso: vermelhos em destaque, mas também amarelos, azuis e verde que se complementam. Linhas verticais, horizontais, em ziguezague e círculos compõem a forma e dão magnitude à obra. O sin-signo (caráter de existência) está no fato de que o quadro existe como quadro. Aqui, Santaella (2002) nos adverte de que, geralmente, nesse caso específi co, também estamos diante de uma reprodução da obra, e não da obra em si. Assim, em vez de estamos diante de uma pintura, estamos diante de uma fotografi a da pintura. Esse fato modifi ca, em parte, os elementos constitutivos da obra. A tonalidade das cores, o tamanho do original versus o tamanho da reprodução, textura e lugar que ocupa (geralmente museu), por exemplo. O legi-signo (lei) nos diz que a obra de Matisse pertence à classe das pinturas, mais especifi camente das pinturas a óleo. Também pertence à classe das pinturas modernas do gênero fauvista. Fovismo ou fauvismo (do francês les fauves, “as feras”, como foram chamados os pintores não seguidores do cânone impressionista, vigente na época) é uma corrente artística do início do século XX, que se desenvolveu, sobretudo, entre 1905 e 1907. Associado à busca da máxima expressão pictórica, o estilo começou em 1901, mas só foi denominado e reconhecido como um movimento artístico em 1905. O fovismo tem como características [...] marcantes a simplifi cação das formas de pelos, o primado das cores e uma elevada redução do nível de graduação das cores utilizadas nas obras. Os seus temas eram leves, retratando emoções e a alegria de viver e não tendo intenção crítica. A cor passou a ser utilizada para delimitar planos, criando a perspectiva e modelando o volume. Tornou-se, também, totalmente independente do real, já que não era importante a concordância das cores com o objeto representado, e sendo responsável pela expressividade das obras. (Fonte: Disponível em: <http://artn. highforum.net/t532-fauvismo> Acesso em: 10 jul. 2011). 50 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Após apresentar esses elementos básicos da obra, Santaella (2002) entra na análise da obra propriamente dita. Atenta para o fato de que a pintura apresenta imagens ambíguas, como, por exemplo, a porta também poder ser uma janela, apenas acentuada pelo fato de as linhas em ziguezague darem continuidade ao chão e do círculo amarelo, que sinaliza, possivelmente, um quadro colocado à esquerda. Apesar de o quadro trazer uma reprodução de um interior de um ambiente, a obra é retratada de maneira moderna, cujos padrões pictóricos são realizados singularmente, de acordo com o estilo de Matisse. Isso deve ser levado em conta, pois, quanto mais o interpretante souber da obra, do estilo de Matisse e, claro, dependendo “especialmente do repertório cultural que o intérprete internalizou, alguns signifi cados simbólicos se atualizarão, outros não.” (SANTAELLA, 2002, p. 93). Por consequência, a obra terá mais signifi cações para o interpretante que tiver mais conhecimento sobre o contexto da obra. Da relação do signo com o seu objeto, a obra assim é composta: • Ícone: um tema de interior com vaso pintado à maneira de Matisse e que apresenta imagens ambíguas. • Índice: referencialidade das imagens indicada por Matisse. Há, na obra, um equilíbrio entre a ambiguidade da “referencialidade indicial” e da icônica. • Simbólico: padrões de pintura moderna concernentes à arte moderna, em específi co, ao fauvismo. Parece difícil entender isso, não?! De fato, é um pouco, mas não precisamos, no momento, entender a fundo isso. Com o tempo e com estudos, você pode entender esse assunto de forma mais direta e efi caz. Em seguida, a autora mostra os efeitos interpretativos da obra. Nesse caso, apresenta os níveis do interpretante. Sobre este aspecto, Santaella (2002) exprime que o primeiro nível é o imediato, aquele em que a predominância é o sensório, pois é a primeira impressão que ocorre no encontro com a obra. Assim, as cores fortes e os traços intensos provocam-lhe determinadas reações e sensações. Em seguida, determinadas emoções são acionadas: alegria, leveza, fl utuação... Outros tipos de interpretantes são caracterizados, como o dinâmico energético, vontade de entrar no ambiente; e o lógico, que depende dos conhecimentos culturais e históricos que possui. Sem um conhecimento sobre a arte moderna e sobre detalhes da pintura fauvista, um interpretante poderá fi car apenas no nível emocional. Por fi m, Santaella (2002, p. 97), fala do Em um conhecimento sobre a arte moderna e sobre detalhes da pintura fauvista, um interpretante poderá fi car apenas no nível emocional. Apesar de o quadro trazer uma reprodução de um interior de um ambiente, a obra é retratada de maneira moderna, cujos padrões pictóricos são realizados singularmente, de acordo com o estilo de Matisse. 51 INTRODUÇÃO À LEITURA DA IMAGEMCapítulo 3 interpretante fi nal (em devir): “toda a admiração e gratifi cação ao olhar que essa pintura ainda poderá despertar no futuro”. Enterro na Rede Enterro na rede é uma das obras da série Os retirantes, pintadas em 1944, pelo artista brasileiro Cândido Portinari. A professora Sandra Regina Ramalho e Oliveira, da Universidade Estadual de Santa Catarina, em seu livro Imagem também se lê, faz uma análise dessa obra, que poderíamos aproximar de um segmento de teoria semiótica que deriva daquela iniciada por Saussure. Figura 19 - Enterro na rede, 1944, Cândido Portinari Fonte: Disponível em: <http://www.casadeportinari.com.br/ cronologia/enterro.htm>. Acesso em: 5 jul. 2011. Com o título da análise Enterro sem caixão, a autora começa por indagar “o que você vê?”; depois, sugere: “observe-se, primeiramente, um eixo vertical; e duas diagonais que lhe cortam em seguida, os elementos constitutivos.” (OLIVEIRA, 2009, p. 69). Para mostrar como os elementos constitutivos estão estruturados na obra, apresenta um esquema visual por meio de um croqui contento os traços de contorno da obra. Diz a autora: “neste esquema são destacados um a um os planos de profundidade propostos, diferenciação que é feita por meio do uso de linhas e cores específi cas para contornar e destacar a estrutura de cada um deles.” (OLIVEIRA, 2009, p. 69). 52 Leitura e produção de sentidos em artes visuais Figura 20 - Esquema visual da obra Enterro na rede Fonte: Oliveira (2009, p. 116). O esquema é uma maneira que podemos estabelecer na análise de obras para facilitar nossa inserção no contexto estrutural em que ela foi feita. Vemos, então, no centro da composição, uma mulher ajoelhada e de costas para o espectador. Atente para a posição dos pés, em tamanho destacado, acentuando a posição de oração e olhando para o centro da obra onde está o foco central da obra: o defunto. Observe que essa mulher, em combinação com o lençol usado na cena, forma um grande triângulo central na pintura. Outros ângulos são vistos quando percorremos nosso olhar pelas vestimentas e pela posição das fi guras. O que é importante ressaltar é que “o ângulo formado pelos braços dessa mulher remete o olhar para seu vértice, no tronco do corpo dela mesma, o qual oculta o centro da rede, lugar onde está o morto” (OLIVEIRA, 2009, p. 71). Olhando a imagem, temos: no primeiro plano, em destaque, os pés da mulher ajoelhada; no segundo, a própria mulher de joelhos; no terceiro, dois “carregadores” masculinos, formando um quadrado ao redor da cena; no quarto, uma mulher agachada à direita; e, no quinto, o fundo do quadro. Toda a obra é formada por diversas fi guras geométricas e ângulos em destaque,
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