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Livro 5CIJD páginas 336 a 359

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Prévia do material em texto

KÁTIA LUCIA MOREIRA LEMOS 
PABLO JUAN GRECO 
JUAN CARLOS PÉREZ MORALES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5º CONGRESSO INTERNACIONAL DOS 
JOGOS DESPORTIVOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS 
5º Congresso Internacional dos Jogos Desportivos 
Copyright 2015 Instituto Casa da Educação Física 
 
Proibida a reprodução total ou parcial deste livro, por qualquer meio ou sistema, sem o 
prévio consentimento de seus editores. 
 
Instituto Casa da Educação Física 
Rua Bernanrdo Guimarães, 2786 - Santo Agostinho - CEP 30.140-082 - Belo Horizonte 
- MG - Tel.: (31) 3275-1234 - www.casaef.org.br 
 
Capa: Criação e Finalização: Instituto Casa da Educação Física 
Editoração Eletrônica e Projeto Gráfico: Leonardo Senhorini 
Revisão: Os autores 
Impressão: Davi Pires de Oliveira - ME 
Rua Espinosa, 64 - Carlos Prates - CEP 31.210-525 
Belo Horizonte - Minas Gerais - Tel.: (31) 3411-6149 
E-mail: sanagraf@yahoo.com.br - www.sanagraf.com.br 
 
Para dúvidas, críticas e sugestões sobre este livro, entre em contato: 
Universidade Federal de Minas Gerais - Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia 
Ocupacional - Av. Presidente Antônio Carlos, 6627 - CEP: 31.270-901 - BH / MG 
 
Ficha catalográfica elaborada pela equipe de bibliotecários da Biblioteca da Escola 
de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de 
Minas Gerais. 
C749a 
 
 
2015 
Congresso Internacional dos Jogos Desportivos (5. : 2015 : 
Belo Horizonte, MG) 
5. Congresso Internacional dos Jogos Desportivos /organizadores 
Kátia Lucia Moreira Lemos, Pablo Juan Greco, Juan Carlos Pérez 
Morales. Belo Horizonte 
: EEFFTO/UFMG, 2015. 
436p. 
ISBN: 978-85-61537-22-7 
Inclui bibliografia. 
1. Esportes - Congressos 2. Esportes – Estudos e ensino - 
Congressos 3. Educação física - Congressos. I. Lemos, Kátia Lucia 
Moreira. II.Greco, Pablo Juan. III. Pérez Morales, Juan Carlos. IV. Título. 
CDU:796 
http://www.casaef.org.br/
mailto:sanagraf@yahoo.com.br
http://www.sanagraf.com.br/
PREFÁCIO 
Os jogos desportivos fazem parte da cultura popular, estão 
enraizados e imbricados na nossa história, resultam indissociáveis das 
nossas características, formas de pensar, de nos integrar socialmente. 
Quem quando criança, não ouviu um amiguinho contar, ou vivenciou 
pessoalmente, ir a dormir abraçado a bola, o dia antes de aquele jogo tão 
importante? Porém, ou mesmo por causa disso, sua temática tão rica e 
diversificada solicita permanentemente de novas ideias, novos impulsos. 
Os jogos desportivos inerentes da nossa cultura, praticados na rua, na 
escola, no clube, no tempo livre, no rendimento etc. configuram-se de longa 
data como conteúdos do ensino, da pesquisa e da práxis. A construção das 
pontes, o estabelecimento de interações entre estes fatores se constitui no 
desafio presente para cada um dos que militam nessas áreas, o professor no 
seu dia a dia frente a turma, o pesquisador, na sua investigação que permita 
elucidar cada vez mais os componentes e as interações desse vasto mundo 
de modalidades e perguntas sobre as mesmas. Mas também na práxis 
daquele que pratica, que joga, que deseja consolidar suas motivações, 
suas expectativas, sua integração social. Para eles este texto oferece apoio 
cientifico de renomeados pesquisadores na área dos Jogos desportivos. 
Os capítulos aqui apresentados na sua versão original alinham-se 
dentro das diferentes áreas temáticas do 5° Congresso Internacional dos 
Jogos Desportivos, realizado em belo Horizonte, na Universidade Federal 
de Minas Gerais, com a coordenação do Centro de Estudos em Cognição 
e Ação. Todos os autores colaboraram de forma voluntária, assumindo os 
esforços de uma tarefa singular: descrever um tema de forma profunda, 
porém acessível, para que o leitor se identifique com a temática, descubra 
novas intencionalidades, opções e alternativas que o auxiliem no seu 
cotidiano, que ampliem seus horizontes. 
A obra apresentada reúne textos de especialistas de diferentes 
universidades, de distintos países, com díspares formações sob o elo 
comum da temática dos jogos desportivos. Como no jogo, a colaboração 
deles foi peça mestre na realização da obra. Como no jogo, as 
contribuições concatenam-se para conformar o ponto de partida que se 
integra espontaneamente numa adequada finalização, num chute a gol, um 
chute que tem todas as características de obter sucesso! Ser um bonito 
Gol. Não foi solicitado aos especialistas escreverem sobre um tema, foi 
deixado a estes a escolha. Fulcral, os jogos esportivos coletivos. E cada um 
deles realizou um aporte que se “encaixa” de forma interessante, pontos 
de vista complementares, nas áreas do conhecimento inerentes aos Jogos 
desportivos. Assim, da formação de recursos humanos, da formação de 
treinadores, um dos grandes problemas a ser superado nos dias de hoje no 
Brasil, carente de uma sólida estrutura de formação de treinadores (com 
exceções claro, como as do Voleibol, o que também mostra-se uma das 
características de ter chegado e mantido o sucesso ao longo dos anos!). 
passando pela área da análise da performance nos Jogos Desportivos, 
apresentam-se novidades importantes para os que desejam investigar e 
trabalhar na mesma. Também a área do ensino-aprendizagem e metodologia 
dos jogos desportivos são diferentes capítulos que abordam o tema, com 
ideias originais, e muitas propostas para reflexão e ação, e portanto á área 
da cognição e ação também se desenvolve com aportes direcionados a 
práxis, de utilidade para o quotidiano. 
Cientes que a abrangência da temática dos jogos desportivos não se 
esgota em uma obra, em um congresso, este livro texto visa provocar a 
reflexão, as pontes entre a teoria e a práxis, aliás o lema, ou tema central do 
congresso. Certamente a leitura trará novos desafios, incitará a geração de 
propostas, novas ideias, novos caminhos, abrirá fronteiras e despertará o 
desejo de continuar a crescer, marcar um constante “aprender a aprender”. 
Fecham-se as cortinas do presente aporte, porem abrem-se novamente 
as mesmas para o futuro. Quais os objetivos alcançados no evento? 
Quais as impressões que cada um conseguirá apreender após esses 
dias de convívio e como a leitura desta obra poderá indicar caminhos a 
percorrer. 
Como diz o poeta espanhol Antonio Machado, nos seus versos que 
descrevem o mediterrâneo, sua terra natal. 
“Caminante son tus huellas del camino y nada más caminante no hay 
camino, se hace caminho al andar, al andar se hace el camino y al volver la 
vista atrás se ve la senda que nunca se ha de volver a pisar, caminante no 
hay camino sino estelas en la mar.“ 
O futuro depende de cada um de nos, ele será construído, com as 
pontes entre a pesquisa e a práxis que cada um se anime a desenvolver. 
Obrigado pela leitura, que esta obra seja apenas uma pequena semente 
que contribui para o desenvolvimento de cada um de vocês, e contribui 
para a área que nos agrada, o fascinante mundo dos Jogos desportivos. Um 
mundo de aleatoriedade, de inovação, criatividade, colaboração, oposição, 
mas sempre fascinante. 
Os organizadores deste livro lhes desejam boa leitura. 
 
SUMÁRIO 
 
 
DESPORTO E UNIVERSIDADE: URGÊNCIA DE REVISÃO COM 
OS OLHOS DA FILOSOFIA E DA ARTE 
Jorge Olímpio Bento .......................................................................... 15 
PROCESSO ORGANIZACIONAL SISTÊMICO, A PEDAGOGIA 
DO JOGO E A COMPLEXIDADE ESTRUTURAL DOS JOGOS 
ESPORTIVOS COLETIVOS: UMA REVISÃO CONCEITUAL 
Alcides José Scaglia; Riller Silva Reverdito; Marcos Vinícius Russo dos 
Santos; Larissa Rafaela Galatti .......................................................... 43 
RELAÇÃO PEDAGÓGICA E EXPERIÊNCIA DOS ALUNOS NO 
ENSINO E APRENDIZAGEM DOS JOGOS DESPORTIVOS 
Amândio Graça ................................................................................. 63 
RUGBY NO BRASIL: NAESCOLA! É POSSÍVEL? 
Eraldo dos Santos Pinheiro; Mario Renato Azevedo Júnior; Mauricio 
Migliano; Gabriel Gustavo Bergmann ................................................ 87 
A PERCEPÇÃO DOS EXPERTS ACERCA DOS FATORES 
RELEVANTES PARA O DESENVOLVIMENTO DO JOGADOR DE 
BASQUETEBOL 
Fernando Tavares; Américo Santos; Luís Gonçalves .........................101 
TOMADA DE DECISÃO: DO ESPORTE AOS ASPECTOS 
NEUROFISIOLÓGICOS 
Gustavo De Conti Teixeira Costa; Pablo Juan Greco .........................123 
FORMAÇÃO DE TREINADORES: COMO ALOCAR UM 
DISCURSO TEÓRICO À PRÁTICA? 
Isabel Mesquita ................................................................................143 
IMPORTÂNCIADACOGNIÇÃO PARAO JOGAR DE QUALIDADE 
NO FUTEBOL 
Israel Teoldo; José Guilherme; Júlio Garganta ..................................169 
O ENSINO DOS ESPORTES DE RAQUETE: UMA ATUAÇÃO 
PEDAGÓGICA DIVERSIFICADA 
Layla Maria Campos Aburachid ....................................................... 217 
ANÁLISE DA PERFORMANCE ESPORTIVA COM FOCO NAS 
CARACTERÍSTICAS PSICOSSOCIAIS: EM BUSCA DE UM 
MODELO TEÓRICO 
Lenamar Fiorese Vieira; José Roberto Andrade do Nascimento Junior; 
Andressa Contreira; William Fernando Garcia; Marcus Vinicius 
Mizoguchi ......................................................................................... 237 
A INICIAÇÃO AO ANDEBOL (HANDEBOL) – UMAABORDAGEM 
CENTRADA NO DESENVOLVIMENTO DAS COMPETÊNCIAS 
DE JOGO 
Luísa Estriga ................................................................................... 255 
TRAININGATHLETES’ CHOICES USING A SIMPLE HEURISTIC 
APPROACH 
Markus Raab; Sylvain Laborde; Mariana Lopes; Pablo Greco ......... 271 
FORMAÇÃO DE TREINADORES ESPORTIVOS: REALIDADE E 
PERSPECTIVAS 
Michel Milistetd; William das Neves Salles; Vinicius Zeilmann Brasil; 
Michél Angillo Saad; Juarez Vieira do Nascimento .......................... 285 
A COGNIÇÃO EM AÇÃO: PROPOSTA DE UM MODELO DE 
TREINAMENTO TÁTICO-TÉCNICO DA TOMADA DE DECISÃO 
NOS JOGOS DESPORTIVOS COLETIVOS 
Pablo Juan Greco; Juan Carlos Perez Morales; Henrique de Oliveira 
Castro; Gibson Moreira Praça ........................................................... 311 
INICIAÇÃO ESPORTIVA UNIVERSAL: O JOGO DO “ABC” NA 
ALFABETIZAÇÃO ESPORTIVA 
Pablo Juan Greco; Juan Carlos Pérez Morales; Layla Campos Aburachid; 
Mariana Calábria Lópes; Schelyne Ribas da Silva; Rodolfo Novellino 
Benda ................................................................................................ 335 
ACTUACIÓN DOCENTE DEL ENTRENADOR PARA EL 
DESARROLLO DE LA TOMA DE DECISIONES DE JUGADORES 
DE VOLEIBOL EN ETAPAS DE FORMACIÓN 
Perla Moreno Arroyo ........................................................................261 
LA INTERVENCIÓN DEL ENTRENADOR A TRAVÉS DEL 
ANÁLISIS DE LAS TAREAS DE ENTRENAMIENTO 
Sergio J. Ibáñez; Sebastián Feu; María Cañadas; Javier García .........381 
TALENTO ESPORTIVO: TEORIA E PRÁTICA 
Adroaldo Gaya; Vinícius Denardin Cardoso; Anelise Reis Gaya; Alberto 
Reinaldo Reppold Filho .................................................................... 411 
 
 
 
SOBRE OS ORGANIZADORES 
 
 
 
 
 
Profa. Dra. Kátia Lúcia Moreira Lemos 
Professora da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia 
Ocupacional (UFMG) 
Coordenadora do Grupo de Estudos em Sociologia e Pedagogia do 
Esporte (GESPE) 
 
 
 
Prof. Dr. Pablo Juan Greco 
Professor da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia 
Ocupacional (UFMG) 
Coordenador do Centro de Estudos em Cognição e Ação (CECA) 
 
 
 
Prof. Dr. Juan Carlos Pérez Morales 
Professor da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia 
Ocupacional (UFMG) 
Membro do Centro de Estudos em Cognição e Ação (CECA) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
COLABORADORES 
 
 
Prof. Ms. Gibson Moreira Praça 
Professor do Departamento de Educação Física (UFVJM) 
Membro do Centro de Estudos em Cognição e Ação 
 
 
 
Prof. Ms. Gustavo de Conti Teixeira Costa 
Professor da Faculdade Estácio de Sá 
Membro do Centro de Estudos em Cognição e Ação 
 
 
 
Prof. Ms. Henrique de Oliveira Castro 
Membro do Centro de Estudos em Cognição e Ação 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS 
 
 
Reitor 
Prof. Dr. Jaime Arturo Ramírez 
 
 
 
Vice-Reitora 
Profa. Dra. Sandra Regina Goulart Almeida 
 
 
 
Diretor da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia 
Ocupacional 
Prof. Dr. Sérgio Teixeira da Fonseca 
 
 
 
Vice-diretor da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia 
Ocupacional 
Prof. Dr. Herbert Ugrinowitsch 
 
 
 
Chefe do Departamento de Esportes 
Prof. Dr. Fernando Vitor Lima 
 
 
 
 
 
 
 
 
EQUIPE EDITORIAL 
ORGANIZADORES 
Profa. Dra. Kátia Lúcia Moreira Lemos EEFFTO/UFMG 
Prof. Dr. Pablo Juan Greco EEFFTO/UFMG 
Prof. Dr. Juan Carlos Pérez Morales EEFFTO/UFMG 
 
 
REVISORES 
Prof. Dr. Pablo Juan Greco EEFFTO/UFMG 
Prof. Ms. Gibson Moreira Praça DEFI/UFVJM 
Prof. Ms. Gustavo Conti Teixeira Costa EEFFTO/UFMG 
Prof. Ms. Henrique de Castro EEFFTO/UFMG 
 
CONSULTORA DE NORMALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICA 
Íris da Silva – Bibliotecária CRB6 2283 – EEFFTO/UFMG 
15 
DESPORTO E UNIVERSIDADE: URGÊNCIA DE REVISÃO COM OS OLHOS DA 
FILOSOFIA E DA ARTE 
 
 
 
Jorge Olímpio Bento1 
Os homens não desejam aquilo que fazem, mas os objetivos que os levam a fazer 
aquilo que fazem. 
Platão, 427-347 a.C. 
 
Começo com um aviso que deve merecer atenção da parte dos 
leitores: tenham muito cuidado comigo, porquanto ando na contramão, 
apostado em atrapalhar o tráfego! Na contramão do quê? 
Eu digo prontamente, sem delongas ou entretantos ou falinhas mansas: 
na contramão de uma era de cores e contornos medievais, dominada pela 
banalidade, insânia e trivialidade, pelo desprezo do património utópico, pelo 
‘império do efémero’, do superficial, do vazio asfixiante e da mesquinhez 
aviltante, pelo pragmatismo e utilitarismo de vistas curtas e exíguas, pela 
categorização e envernizamento do homo festivus como homo aestheticus, 
pelo entretenimento e hedonismo compulsivos e desenfreados, pelo 
egocentrismo e hiperindividualismo chocantes e desumanizantes, pelo 
pensamento (?) binário, de polaridade simplória e dicotomias primárias, 
simplista e reprodutor do ‘mainstream’ e do senso-comum.2 
Procuro objetivamente transitar, como peão avisado, desperto e 
perscrutador, na capciosa e traiçoeira faixa do alastramento e consentimento 
da barbárie, do canibalismo subtil, mas brutal e cruel, do desfortúnio 
cotidiano e da regressão civilizacional, do crescimento da ignorância 
arrogante e das certezas miseráveis, das mentalidades modeladas pelo 
estilo ‘bunker’, da ditadura e do endeusamento das métricas, dos números 
e dos gráficos, do apagão da lucidez, do desincentivo e da desmoralização 
da capacidade de pensar crítica e livremente, da ‘funcionalização’ da 
educação e formação e da ação dos professores, da ascensão dos padrões 
 
1 Professor Catedrático e Diretor da FADEUP-Faculdade de Desporto da Universidade 
do Porto. 
2 SAFATLE, Vladimir. Pensamento binário, Folha de S. Paulo, p. A2, 28.07.2015. 
16 
e ‘valores’ tecnocráticos, da involução mental, da diminuição da visão 
complexa e eclética do mundo, da realidade e da vida, do ressurgimento 
e da proliferação do fanatismo e das verdades apodíticas, baseadas na 
economia e estatística e, quiçá, em disciplinas estranhas e ocultas, da 
imposição de uma ‘ciência e pesquisa de eunucos’, ao serviço do sultão ou 
mandarim e dos seus beneficiários e financiadores. 
Não se estranhem: eu trafego propositadamente nestas pistas, porém 
em sentido contrário, para ocasionar o embate e o choque, para provocar 
estilhaços incómodos e atear, com labaredas acesas, discussões assanhadas! 
É com este circunstancialismo que venho falar da Universidade e 
do Desporto como ‘artefactos’ e ‘artífices’, como instituições e fatores 
de construção da ‘artificialidade’, franqueadorada passagem dos 
‘hominianos’ a humanos. Não venho desamparado. Trago comigo uma 
declaração de apoio, escrita por Friedrich Schiller (1759-1805): “A Arte 
é a mão direita da Natureza. Esta última deu-nos apenas o ser, a primeira 
fez de nós homens.” Uma outra firmada pelo punho de Fernando Pessoa 
(1888-1935): “É de meu natural ser artificial.” E ainda estoutra, assinada 
por Vinicius de Moraes (1913-1980) em A Garota de Ipanema: “A beleza 
é fundamental.” Sim, a beleza dos sentimentos, das atitudes, das palavras 
e gestos é o alicerce e o pilar que suportam a humanidade levantada sobre 
a animalidade. 
Valho-me, não por último, do amparo de Karl Marx (1818-1883), 
sabendo quão perigoso é socorrer-me dele. O barbudo e façanhudo, 
facundo e provocador analista e pensador, hodiernamente amaldiçoado e 
proscrito dos círculos do diletantismo e da masturbação do ‘politicamente 
correto’, seguindo a esteira dos antigos, inseminadores e percursores 
filósofos e mitólogos helenos, fundamentou a tese da impossibilidade do 
mundo humano-social se distinguir do mundo animal, sem ser modelado 
segundo “as leis da beleza”, sempre e em toda a parte, desde a sociedade 
primitiva até ao presente. Quer dizer, a ‘artealização’, a ‘estetização’ e 
‘estilização’ do mundo humano, das celebrações e rituais, dos contextos, 
corpos, objetos e utensílios são pressupostos antropológicos, contínuos 
e trans-históricos da sociedade. As diversas e extremamente distintas 
formas do labor estético constituem a marca singular de uma dada época, 
17 
humanizando e socializando as emoções, os paladares e os sentidos.3 
Para não deixar, por mãos alheias, os meus créditos de guerreiro de 
má e terrível fama, abro as hostilidades, atirando esta pedrada pesada e 
pontiaguda: O papel de oficina de ‘artesanato’, de ‘artesão’, de ‘ourives’ 
ou ‘tecelão’ de peças de retoque fino, de critério elegante e de gosto 
apurado, atribuído à Universidade e ao desporto, está abandonado ou 
subalternizado nas reflexões e nas linhas de investigação, tal como a sua 
vinculação ao Humanismo e Iluminismo. Como se fosse absolutamente 
normal e não houvesse nada a perturbar o nosso olhar. 
Ainda poderemos chamar desporto a muitas das suas manifestações 
na atualidade? Mais, sendo o desporto uma expressão do que é o indivíduo 
humano, um ‘ser excessivo’ e ‘transfronteiriço’, propenso a exceder 
e quebrar os limites e as amarras instintivas e naturais, a afastar-se e 
distinguir-se do animal, mas igualmente a regredir para o ponto de partida, 
para a fronteira da animalidade, como está a tematização deste afastamento 
e recuo? Suscita aplauso e louvor a elaboração das vias e balizas para esta 
apreciação? Ou será que ela é infundada e não tem carácter de urgência?4 
O empreendimento de edificação da cidade humana é obra da 
filosofia, da cultura, da arte, da ciência e, claro, também do desporto. A obra 
é muito difícil, porque a floresta da animalidade é densa, cresce e avança 
sem esforço. O Código de Hamurábi (escrito pelo rei com o mesmo nome, 
na Mesopotâmia, aproximadamente em 1700 a. C.) e os ‘libertadores’ 
3 LIPOVETSKY, Gilles & SERROY, Jean. A estetização do mundo: viver na era do 
capitalismo artista, p. 16. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. (Oferece-se chamar a 
atenção para a extraordinária multiplicação das tecnologias e usos do corpo, assim como 
para a expansão registada pelo desporto na segunda metade do século passado, a ponto 
de ‘desportificar’ a sociedade, as linguagens, os estilos de vida, o vestuário, etc. Não 
por acaso, há intelectuais, uns movidos pelo preconceito e ressabiamento e outros pela 
constatação factual, que rotulam o século XX como “esse estranho século do desporto”). 
4 Como é sabido, o limiar de tolerância à violência altera-se e é um dos indicadores da 
civilização. Ora o desporto é confabulação de uma violência simbólica, não podendo 
descambar para o combate de vida e de morte, alicerçado na violência meramente física, 
inerente à animalidade e bestialidade. Mais, ao longo da história, o código de regras 
do desporto sofreu alterações e várias modalidades desportivas foram banidas, devido 
exatamente ao facto de não se compaginarem com o limiar de tolerância à violência. O 
que é que vemos hoje? A emergência de formas brutais e grotescas de prática desportiva! 
Não está na hora de levantar a voz contra esta involução? Ou será que a cegueira ética 
impede de ver semelhantes aberrações? 
18 
Mandamentos de Moisés (redigidos, no Monte Horebe, cerca de 1512 a. 
C.) caíram, paulatinamente, no esquecimento; deixaram de ser ensinados, 
aprendidos, observados e praticados. Está bem assim? Batemos palmas de 
contentamento? 
 
II 
Desde os primórdios da civilização, a sabedoria humana tem 
consistido em estabelecer a prevalência do espiritual, moral e sagrado 
sobre o material, o animalesco, mundano e profano, e em criar instituições 
que encarnam, difundem e consolidam essa primazia. 
Nessas instituições repousa a incumbência de indicar as metas e 
sentidos do processo civilizacional, de fornecer as referências, energias e 
estímulos que animam os nossos passos, as pernas que permitem avançar, 
os braços que ajudam a subir, os olhos que possibilitam discernir, os ideais 
que permitem sorrir. Elas concebem as artes, os artefactos, os instrumentos 
e os métodos que nos facultam e intimam a tornar possível o impossível, 
próximo o distante, realizável o idealizável, factual o virtual, familiar o 
estranho, a perseguir o infinito e a apresentar mais compreensíveis, leves, 
palpáveis e tangíveis os trágicos, profundos e indecifráveis mistérios da 
vida. 
A história da Humanidade é contada e interpretada pelo papel e 
trajeto das suas instituições ao longo dos tempos, pela sobrevivência e 
transformação de algumas, pelo desaparecimento e substituição da maioria 
delas, em sintonia com os arcanos e anseios, as contradições e os problemas 
de cada época. Elas são uma representação do entorno em que surgem 
os poetas e vates, os filósofos e pensadores e toda a sorte de artífices e 
pontífices que constroem e abatem mitos, causas, paradigmas, utopias e 
distopias, educam os povos e lançam pontes entre o passado, o presente e 
o futuro. 
A Universidade e o desporto incluem-se nesse escol de instituições 
e estruturas. E têm muito em comum: são um produto da Modernidade, 
do Humanismo e Iluminismo, recebem destes a base da sua fundação e a 
bússola da sua missão. Isto é, o clarão da filosofia e da cultura ilumina a 
Universidade e o desporto, com o fulgor dos axiomas gregos da ‘arété’, 
da perfectibilidade e transcendência. Ambos almejam prosseguir na senda 
19 
do Homem Novo, dono e senhor da natureza, um ser de liberdade e dos 
possíveis, fora de escala, sem especificidade, essência natural e identidade 
a priori, fiado na logodiceia e descrente da teodiceia. Visam tornar os 
humanos sujeitos da sua vida, aptos a superar a inumanidade de que somos 
parte, sob a luz da razão, da ética e da estética, dar-lhes uma arquitetura e 
‘forma’ interiores e exteriores, conformes às grandezas idealizadas. 
Wilhelm von Humboldt (1767-1835) bebeu nessa fonte a inspiração 
para, na peugada de Giovanni Pico della Mirandola (1463-1494), de 
Voltaire (1694-1778), de Rousseau (1712-1778), de Kant (1724-1804), 
de Pestalozzi (1746-1827) e Goethe (1749-1832), entre tantos outros, 
formular, em 1810, a ‘ideia’ da Universidade Moderna e coligir, para a 
respetiva concretização, os elementos do conceito de formação (Bildung). 
Antes dele, Guts Muths (1759-1839) tinha projetado o Homo 
Gymnasticus, como versão do Homem Novo e da sua busca, na obra 
Gymnastik für die Jugend (Ginástica para a juventude), escrita em 1793. 
Pestalozzi segue na mesma via ao fundamentar, em 1807, os atos corporais 
como autênticos exercícios ‘anímicos, volitivos e morais’; e ao prescrever 
o mandamento do ‘desenvolvimento’ do corpo,de não o abandonar à 
espontaneidade natural. 
O Homo Olympicus, de Pierre de Coubertin (1863-1937) incorpora 
essas bitolas. Com elas, o barão e os seus seguidores recriaram o desporto 
como expressão da relação de ‘natura’ e ‘cultura’ na configuração do 
homem e do seu corpo, da submissão da natureza originária e primeira aos 
fins da segunda. Apresentaram-no como metáfora, paradigma e versão de 
uma ‘filosofia da transcendência’ e da ‘exaltação da vida’, com ‘pretensão 
de totalidade’ e de aplicação em todos os campos: enlaçando o bem (ética), 
o belo (estética), o respeito por si e pelos outros (fair-play), a consciência 
de valores (moral) e a elevação da existência ao plano da excelência (arte, 
arété, virtude). 
Deste jeito no desporto encontram repercussão, guarida e observância 
as exortações e prescrições do Humanismo e Iluminismo, erigindo-o em 
‘fator de regeneração ética’ da sociedade, modelando-o com uma ‘moral 
em ação’. 
Em suma, a Universidade, o olimpismo e o desporto provêm da 
20 
mesma fonte matricial. Temos que os revisitar, munidos da mesma noção 
e visão, com o intuito de sopesar o abandono da mensagem original, 
sacrificada no altar do utilitarismo demencial. Com lentes conceitualmente 
aprimoradas, não será difícil verificar e reparar a medida da sua insana 
afetação pela loucura da contemporaneidade. 
III 
Como é sabido, os nossos ancestrais gregos definiram-nos como entes 
‘artísticos’ e ‘simbólicos’. A definição contém um requisito para sermos 
humanos. Por conseguinte, somos criadores e consumidores de símbolos 
que ritualizam a vida e associam as ações e objetos a significados que 
transcendem os seus efeitos palpáveis. Isto está bem expresso na citação 
de Platão, que inaugura este texto. 
Vivemos num universo simbólico. Somos protagonistas de 
símbolos práticos, de ‘atos intencionados’, interpretativos e instituidores 
de finalidades e sentidos, codificando, organizando e regulando, com 
significantes e significados, a nossa conduta. 
Este congresso é, portanto, um ato simbólico, como o são todos os 
praticados na instituição eminentemente simbólica que é a Universidade. 
Ele consagra o regresso à Grécia Antiga, ao contexto onde melhor 
coabitaram a academia e o desporto. Por isso é um ensejo para evocações, 
elogios e renovações, que acordem a inquietação perante os desvarios e 
descaminhos das circunstâncias. 
É nesta conformidade que aqui venho, de corda ao pescoço. O fio de 
inquietude, que me leva a pensar e questionar a Universidade e o desporto, 
é o mesmo; é tecido com as mesmas equações, inquietações, intenções 
e preocupações. Contudo, não basta apresentar a substância e textura do 
novelo. Estamos aqui para dele tirar ilações. 
Venho aqui aguilhoado pela advertência de Teixeira de Pascoaes, e 
amedrontado pela probabilidade de ser atingido pelo seu ferrão pontiagudo: 
“Sempre que o homem hesita na sua humanidade, aparece o macaco.” E 
também para corresponder ao seu ajuizamento: “A verdadeira liberdade 
consiste em obrarmos em nosso próprio nome, em sermos nós em nossas 
21 
obras e pensamentos.”5 
Não olvido este juízo, bem como o do Padre António Vieira (1608- 
1697): “Cada um é as suas ações e não outra coisa (…) A verdadeira 
fidalguia é a ação.” Este carrego não é maior do que a esperançosa 
convicção de encontrar companheiros de eleição em todos quantos trazem 
às páginas deste livro e às sessões do congresso o seu labor e reflexão. 
“Sem vontade nada feito”, proclamou Aristóteles (384-322 a.C.), 
lembrando que, só através da ação, podemos converter em realidade as 
irrealidades e inexistências que idealizamos e pensamos. 
A atitude passiva e demissionária aliena e tolhe os nossos passos. A 
acrasia, a desídia, gravidade, indolência, preguiça e obesidade nos olhos 
e sentimentos, no coração e na alma puxam para o chão e para a inércia, 
afundam no pasmo e na falsidade, no nível zero de humanização; e atiram 
para fora da órbita da dignidade. A fé, sem obras, é morta, postula o credo 
cristão. 
O lema do desporto e da vida - Citius, Altius, Fortius! - apela a 
sonhar e realizar. A não cair na tentação de converter a reflexão em lamúria 
inibidora da ação; e na ingénua espera de ver, de maneira espontânea, 
ultrapassados os males denunciados e realizados os sonhos idealizados, 
sem o empenho correspondente. 
Assumamos a necessidade e o dever de voltar a elaborar, divulgar e 
lutar por utopias e não ficar à espera de que se concretizem. Como disse 
Eurípedes (ca. 480-406 a.C.), “o tempo não se ocupa em realizar as nossas 
esperanças; faz o seu trabalho e voa.” Somos nós que temos de apontar os 
ideais e utopias, indicadores dos roteiros por onde nos cumpre caminhar, 
no dizer de Eduardo Galeano (1940-2015). 
IV 
A minha participação nesta douta congregação, dedicada ao estudo 
da nossa área de atuação académica e profissional, suscita-me um estado de 
alma pintado de gratidão e de regozijo. Sinto-me grato pela oportunidade, 
que me é oferecida, de discorrer sobre o que me pica e fere as entranhas e 
a pele. É verdade que faz escuro na Universidade e no desporto; vejo-os 
5 PASCOAES, Teixeira de. Arte de ser português. Lisboa: Assírio & Alvim, 1998. 
22 
envoltos em densa neblina, pedindo um foco de iluminação. Não é menos 
verdade que venho apontando e conclamando, nos últimos anos, para a 
necessidade de urgente revisão. 
Porém, não obstante a aliciante moldura de intenções, assola- 
me a dúvida de não conseguir este panegírico de abertura do congresso 
com a “imaginação, fecunda e santa”, com “a vida e a luz de tudo”, que 
Teixeira de Pascoaes vislumbra na Senhora da Noite. Ela, sob a forma de 
“erma donzela”, sobe, no lusco-fusco, aos cerros do Marão (a serra mais 
alta do reino maravilhoso de Trás-Os-Montes, meu berço alimentício e 
inspirador), para durante a noite se metamorfosear em aurora e irradiar 
um lume que rompe “a sombra indefinida, o espectro mudo”; e desce lá do 
alto, carregada de “noturnos sonhos”, para inundar de sol as encostas, os 
vales, outeiros e pinheirais da negra solidão, convertendo-os em faceiras 
de sorrisos e searas de trigo. 
Não logrando abeirar-me da concretização de tal intento, sobra esta 
gratificação: “Eu vos abençoo, malucos, lunáticos, mágicos (…), poetas e 
os que saem para a rua, sem chapéu, por divino esquecimento e os que vão 
a falar só, pelos caminhos (...) e os que olham a lua, latindo intimamente 
(...) e os que se não conformam, os que não seguem a lei nem o costume, 
todas as criaturas onde o anjo da infância sobrevive.”6 
Saúdo os organizadores deste congresso. Saúdo o desporto e todos 
quantos justificam o seu ideário. Saúdo a vida! Saúdo todos os congressistas 
pela generosidade e pelo simbolismo da decisão da sua presença e empenho, 
por afrontarem o conformismo dos hábitos e costumes. Ao homenageá-los, 
nesta hora em que as palavras perderam fiabilidade, estou igualmente a 
enaltecer todos quantos honram o desporto e a Universidade, fazem jus 
à altura do ritual do casamento entre os dois, pela conduta exemplar, por 
cultuarem a elegância e fulgurância da palavra subida, límpida e culminante 
e, assim, erguerem bem alto o legado que nos veio de tão longe. 
Importa que se diga algo mais. A tocha olímpica representa o fogo 
de Prometeu. E o estádio é, nem mais nem menos, o templo onde esse 
fogo arde para nos mostrar o céu da admiração e encantamento. Uma ‘lux 
indeficiens’, que nunca se extingue e apaga, por mais densa que seja a 
 
6 PASCOAES, Teixeira de. Senhora da Noite. Verbo Escuro. Lisboa: Assírio & Alvim, 
1999. 
23 
escuridão em nosso redor. Quando o atleta sobe as escadas, que levam 
à pira olímpica, e a ateia com a chama que transporta nas mãos e dentro 
de si, está a devolver aos deuses, aumentado e multiplicado, o fogo que 
Prometeu lhes roubou para o entregar às criaturas de Epitemeu. É essa 
luz das estrelas acima de nósda nossa baixeza, do nosso espírito, das 
artes, das técnicas, das habilidades, das nossas escolhas e opções éticas 
e morais, do nosso Humanismo e Iluminismo, da nossa racionalidade e 
maioridade humanas, do aprimoramento da nossa imperfeição, da busca 
incessante da nossa imperfeita perfeição, do controlo, domínio, superação 
e transcendência da nossa pequenez e figura grotescas, sim, é tudo isso que 
vimos aqui celebrar e proclamar. 
Ao efetuarmos este ato e avocarmos estes compromissos no claustro 
da Universidade, local de consagração e meditação, destinado a abrigar, 
fecundar, fomentar e irradiar a erudição e a espiritualidade, estamos a optar 
por uma estrada de largo alcance. Esta vai para além de nós e deste lugar; 
leva-nos ao palco de comprovação das obrigações e responsabilidades 
cívicas e intelectuais que, na qualidade de académicos, nos atam à polis 
com laços indestrutíveis. Com isso emitimos sinais de que nos sentimos 
obrigados a uma remissão discursiva e prática dos fins e das orientações da 
Universidade e do desporto, da sociedade e da vida. Enfim, comprometemo- 
nos a questionar o idioma e a vulgata do ‘utilitês’, hoje em alta, secando e 
sufocando tudo à sua volta. 
 
V 
Por isso mesmo, a motivação, que aqui nos congrega, não é ingénua. 
Constitui um preito de reconhecimento e juramento de passagem do verbo 
à ação. Visamos edificar uma ponte para ultrapassar o enorme fosso entre 
a importância que o desporto usufrui na sociedade e o desdém que lhe 
é votado pela elite da alta cultura. Assim como apelamos a pôr termo à 
indiferença face ao crime de perversão e apoucamento da sua vocação 
humanista, perpetrado pelos donos desta hora e pelos seus avençados e 
súbditos nos órgãos mediáticos. 
Inclusive na Universidade o desporto é encarado como assunto 
periférico, com condescendência arrogante e sobranceira, cuidadosa de 
agir dentro das fronteiras do politicamente correto. 
24 
 
Seria estultice da nossa parte, se nos limitássemos a chorar lágrimas 
de crocodilo ou a vomitar impropérios contra esta situação, em vez de 
cuidarmos das causas que a provocam, bem como dos argumentos e 
remédios para a debelar. 
Píndaro (518-438 a. C.), nas suas odes, concita para a celebração 
religiosa dos atletas. Nele é notório o esforço e o engenho para valorizar 
as proezas atléticas, para as situar no pináculo da cultura, e criar delas 
uma imagem de sublimidade: “Olímpia, mãe dos jogos de áureas coroas, 
senhora da verdade!” 
Salvo raras exceções, a disposição para louvar o desporto não se 
prolongou na nossa tradição cultural. Muitos intelectuais diminuem e 
descartam a sua função. Não é raro que vejam a popularidade do desporto 
como indício de decadência ou afastamento de uma suposta ‘autenticidade’ 
cultural, “que jamais é definida com clareza.”7 
Mesmo muitos dos que gostam dele não logram captar o seu 
fundamento essencial, a sua função primordial. Faltam-lhes olhos 
para perceber que o desporto pode não mudar a nossa natureza, mas 
transforma-a, mudando o que escolhemos ser; pode ser uma centelha para 
soltar as consciências das cadeias da alienação e manipulação à solta. E 
porquê? Porque a paixão pelo desporto não implica que o indivíduo se 
enrede nele. Do útero, que gera a turba desregrada e virulenta, também 
nascem desígnios límpidos e floridos. 
Em regra, vigoram a depreciação e o menoscabo, que identificam o 
desporto com uma atribuição secundária, sem elevados fins intrínsecos, 
restando-lhe servir apenas para a satisfação de externalidades, ser 
instrumentalizado para interesses, mais ou menos escuros, de duvidosa 
credibilidade. 
A dificuldade de elogiar o desporto demonstra que continua vigente 
um tipo de racionalidade inibidora da descoberta e interpretação da 
metafísica nos movimentos e atos corpóreos, de que os corpos e os feitos 
dos atletas são signos e vias para algo espiritual e transcendental. Porventura 
contaminada por um veneno idêntico ao que se inoculou no tresloucado 
 
7 GUMBRECHT, Hans Ulrich. Elogio da beleza atlética, p. 28. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2007. 
25 
‘publish or perish’ da ‘papermania’ e dos ‘salami papers’, aquela visão 
não concebe a competição desportiva em cooperação e cumplicidade com 
a arété grega, com a harmonia e unidade de técnica, performance, ética, 
estética, excelência, magnificência, excelsitude e virtude. 
Essa racionalidade desabitada de sensibilidade impede de ver nos 
gestos e prestações corporais transfigurações eivadas de espiritualidade. 
Ignora a recomendação de Aristóteles (384-322 a.C.) para atribuirmos 
importância às coisas que nos cercam, laborarmos no aperfeiçoamento 
do relacionamento com elas, se queremos realmente melhorar-nos a nós, 
ver além do material e aceder ao imaterial. Tal como olvida a valoração 
extraordinária que Homero (séc. IX a.C.) concedeu às obras difíceis e bem 
conseguidas, entre elas os feitos desportivos, realizadas com os pés e as 
mãos. 
Eis algo que é bonito afirmar, mas não é bastante. Exige-se que não 
fiquemos por isso; a coerência aconselha a extrair ilações e consequências 
para as linhas de pesquisa, para a elaboração e formulação dos argumentos 
de legitimação e para a definição das instrumentalizações do desporto, 
nesta época ensandecida pela loucura e pelo viés do pragmatismo e 
utilitarismo mais extremados e do negócio e lucro mais obscenos. Pelo 
predomínio absoluto do animal laborans e do homo eficiens e faber sobre 
o homo ludens. 
 
VI 
Ora nós estamos aqui para afirmar o desporto e as suas instituições 
como desejáveis e indispensáveis à justificação e salvação da nossa 
precária existência. Certamente, o desporto e os atletas não ganham muito 
com o facto de lhes prestarmos este tributo. Somos nós que ganhamos; ao 
enaltecermos o fascínio e a paixão que o desporto nos causa, o prazer que 
os seus espetáculos nos proporcionam, exercitamos o dever e a pulsão da 
gratidão sem destinatário específico. É uma gratidão à vida que amamos. 
Uma recusa do registo hiper-racional de linguagens e modos de pensar 
esquecidos da necessidade de incluir as emoções nas avaliações e decisões.8 
 
8 Se a racionalidade de não poucos decisores políticos e afins incluísse o sensível, ser- 
lhes-ia mais difícil tomar medidas que empurram as pessoas para o desvão da indignidade 
e desumanidade. 
26 
Concedamos que é deveras difícil elogiar o desporto, por não ser 
fácil descrever a inigualável beleza e imagética que o perfazem e nos 
oferecem momentos de contacto intermitente com o fascínio e esplendor 
das utopias da felicidade e verdade. Por ser evidente que ele atrai para 
condutas e reações ruins e pouco saudáveis. Mas isso não nos pode 
desviar da explicação central e fundamental do seu apelo: a insularidade 
e a autonomia da experiência estética em relação ao trama do quotidiano, 
driblado e posto de lado durante a execução desportiva. Esta somente é 
realidade exterior na aparência, porquanto tem o singular poder de evocar 
e inundar a nossa alma de todos os sentimentos possíveis e de todos os 
conteúdos vitais. Nisto reside algo muito valioso que confere ao desporto 
“o poder por excelência da arte”, apontado por Hegel (1770-1831) nas 
suas reflexões sobre estética. 
Kant formulou que a arte é bela, quando parece ser natureza. Esta 
asserção aplica-se inteiramente ao desporto. Uma jogada ou um gesto 
são belos por nos parecerem atitudes naturais dos seus autores. Mais, o 
desporto congrega o belo e o feérico, a qualidade e a grandeza, a forma 
que limita o objeto e a ilimitabilidade que nele se expressa, aquilo que, ao 
mesmo tempo, nos aprimora e sobrepuja. 
Poderá contrapor-se que isto se descortina e experiencia noutros 
objetos. Mas não com a intensidade e concentração torrenciais, registadas 
no desporto. Não há nada mais intenso do que assistir a um espetáculo 
desportivo, suportar a incerteza, esperar o que pode acontecer,sem ter 
a garantia de que aconteça, por ficar acima dos limites de previsão da 
prestação humana. O mesmo é dizer que a vivência estética no desporto, 
sejamos praticantes ou expectadores, sendo idêntica à da experiência 
estética em geral, distingue-se pelo facto de a nossa condição atuar perto 
do limite máximo. Oscilamos entre o aparecimento e a dissolução rápida e 
irreversível de formas belas e magníficas de transfiguração corporal, entre 
a percepção da beleza na sua aparência física e a obrigação de a interpretar 
consoante as regras em presença. 
É isto que torna viciante o efeito estético do desporto e o torna palco 
de epifanias e artes dramáticas. Tudo nele é real e fecundo, nada é mera 
atuação ou fingimento. Ele enleia-nos com o encanto das adaptações dos 
corpos a uma multiplicidade de formas, figuras e funções, resultantes da 
27 
conjugação do sacrifício e sofrimento com a dinâmica e o ritmo, o rigor 
apolíneo e o excesso dionisíaco. Repare-se, por favor, na volta triunfal 
do atleta, de braços erguidos, que acaba de ganhar uma prova no estádio 
olímpico! Ele concita aplauso e respeito por ser a imagem delicada 
e exuberante de um sábio que dobrou o destino com a administração 
harmoniosa e inteligente das suas forças. 
Nem toda a gente é capaz de ver estas ‘coisas’ subidas que ele contém. 
É certo que a beleza e a magnificência estão latentes em qualquer parcela 
da realidade, por mais pequena que seja. Porém elas são invisíveis aos 
que não possuem a sensibilidade para as captar. Mais, todos os indivíduos 
creem na existência do belo, muitos pressentem e lobrigam a sua presença 
aqui e ali, mas poucos sabem defini-lo. 
A arte e a cultura não moram só em museus, bibliotecas, livrarias e 
salas de orquestra. Também se encontram nas festas e romarias, nas missas 
e procissões, nas confraternizações e feiras, nos estádios e nos sentimentos 
de alegria, angústia, choro, drama, dor e tristeza que aí afloram, nas 
identificações, expressões e estados de forma que se revelam em tais 
instâncias, lugares e situações. 
Zygmunt Bauman vai ao âmago da função da cultura: “Codificações 
de mecanismos engenhosos calculados para tornar suportável a vida com 
a consciência da morte.” 
Está tudo dito, mas ele concretiza e precisa: a genialidade e 
“inventividade das culturas (consiste em) tornar possível conviver com a 
inevitabilidade da morte.”9 
Noutra obra o magno analista da contemporaneidade aborda, com a 
sua fina lupa, a noção de cultura: “um fermento que evita que a realidade 
social fique parada e que obriga a uma eterna autotranscendência.” 10 
As manifestações culturais e artísticas podem comportar uma 
saudável dimensão ou função recreativa e até catártica ou escapista; mas 
não podem ser reduzidas a isso. São obra e expressão do imaterial, da 
roupa que nos veste por dentro e não se pode despir, sob pena de cairmos 
numa concepção enviesada da cultura e da arte, feita só de banalizações, 
9 BAUMAN, Zygmunt. Medo Líquido. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006. 
10 BAUMAN, Zygmunt. Vida líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2007. 
28 
frivolidades, superfícies, vernizes, ruídos, de promoção do bacoco, soez e 
grotesco, de perversão da estesia. 
Não se esqueça: a arte interpreta e inspira a vida; a sua função 
suprema é a de convidar a vida a imitá-la e segui-la. A grandeza da arte 
mede-se pela sua capacidade de nos levar à ‘intuição do inexprimível’ e 
até ‘do não representável’, mesmo que estes não possam ser descritos. 
O verdadeiro artista é aquele que encontra a expressão simbólica da 
experiência transcendente. 
 
VII 
Como já apontado atrás, o indivíduo ‘hominiano’ é um sujeito da 
inclinação para o ‘excessivo’, o único dos animais com tendência para 
cometer excessos, para atingir, transgredir e violar o limite natural, para 
ter uma relação com o não vivível e usar uma fala suscetível de namorar 
e dizer o não dizível. Excede-se, desafia, investe e vai além dos limites, 
em todas as dimensões existenciais, convertendo as suas possibilidades 
naturais em domínios culturais, assim se artificializando e acrescentando 
novas qualidades artificiais. 
Afetado pela ‘hibridez’, ele tanto pode ser refém da feiura e do mal 
como optar pelo bem e o bom. Esta competência de opção faz dele um 
‘sujeito ético’, metafísico, sobrenatural, e místico, incompatível com a 
esfera dos meros factos. Um ‘sujeito auto-transcendente’ e ‘problemático’, 
disponível para a transgressão, para sair de si e da subjetividade, para 
buscar e apropriar o não familiar e o não existente, distendendo-se numa 
esfera superior à da objetividade e à dos factos. Somente seguindo esta via, 
é que se realiza como ‘sujeito ético e estético’, superador e transgressor do 
espaço do seu mundo estreito e fechado, para contactar com o intocável. 
É precisamente isto que perfaz o cerne da filosofia e da arte; e 
constitui o fim primeiro do desporto e neste é visível, tal como em todas as 
modalidades da cultura e ciência. 
Filosofia, arte e desporto são uma forma de busca e afirmação da 
verdade ética e estética, da virtualidade pura. Estas ganham foros de 
realidade no momento em que se toca o impossível. Dito de outro modo, 
a filosofia, a arte e o desporto são formas e instrumentos de realização de 
29 
verdades não pré-existentes, de as inventar e produzir. 
Ao convidarem, intimarem e pressionarem o ‘artista’ a ir para além 
do seu ser atual, a lançar-se e perder-se no espaço do indeterminado, a 
aprimorar, depurar e sublimar a forma, a arte e o desporto concitam para a 
verdade, ou seja, para o que sobra, para o que resulta do excesso laborioso 
do artífice. É assim, saindo da esfera da restrita subjetividade, que o sujeito 
projeta como objeto e alvo a sua identificação; e encontra-a na peregrinação 
atrás do inconcebível e incrível. Paradoxalmente, a figura lendária e mítica 
de Ícaro só existe por ele ter arriscado voar e expor aos raios e ao calor do 
sol as suas asas fixas com cera. 
A filosofia e a arte ligam-se, de maneira insolúvel, à ‘liberdade 
transcendental’ ou à transcendência fundamental e fundadora do sujeito. 
Elas ostentam um carácter de desassossego e instigação, espicaçante, 
ofensivo e agressivo, apostado em remover o sujeito da mera circunstância 
animal, em dar a esta um pendor supra-subjetivo, a beirar o esplendor 
platónico do belo, do bom e verdadeiro. 
Outra coisa não é o desporto. Ele configura-se como uma compilação 
de medidas e padrões de criação e animação da vontade (conforme a 
fundamentação de Pestalozzi) e da coragem da liberdade do sujeito e do 
seu anticonformismo. Para sair de si e da ordem estabelecida, para se 
transgredir, não se acomodar e conformar à autoimagem, para ativar o seu 
outro si e se responsabilizar por essa ousadia. 
No desporto afirma-se, ao mesmo tempo, uma forma de verdade e 
uma forma de vida, que partilha com os outros. Por isso, ele é, cumulativa 
e essencialmente, um campo de cultivo da alteridade, da convivialidade e 
solidariedade, de aprendizagem de normas do trato humano do outro, de 
apreço e assunção de responsabilidade pelo outro. 
VIII 
A ontologia, a questão do ser e da sua essência são objeto da filosofia, 
pelo menos desde Parménides (530 - 460 a.C.). Do desporto também; sim, 
é esse o coração e o assunto fulcral do desporto. 
Os pensadores gregos espantaram-se por ver, nos seres, o menos, 
o pequenino, o insuficiente, o frágil, o imperfeito e o rasteiro crescer e 
30 
tornar-se mais, grande, forte, magnífico, superior, sobrenatural e sublime. 
A esta transformação evolutiva chamou Aristóteles ‘ousia’, percebendo 
nela a substância e essência imanentes no ser, conceitualizando a chegada 
aos limites e à maturidade, mediante a coadjuvação da experiência e do 
conhecimento. Na ‘ousia’, digo eu, configura-se o sentido da vida, a 
finalidade vinculativa da nossa existência. 
Vê-sebem, o desporto, quer na sua conceção, quer na sua execução, 
é arte e filosofia. É uma prática artística e filosófica, na medida em que 
rompe o campo do possível, extrapola a realidade, a ordem estabelecida, 
pragmática e situacional (a ‘frónesis’, de Aristóteles). Como a arte 
e a filosofia, ele tem como objeto a edificação do sujeito como força 
de afirmação da oposição e do contrariamento, de negação, recusa, 
rompimento e transgressão dos factos dados, apodíticos e dogmáticos (a 
‘doxa’). Como elas, o desporto não se contenta com provas e opiniões, já 
dadas e firmadas, com um cenário de definição marcado pela fixação do 
contexto, tempo e lugar; visa posições, superadoras e transgressoras do 
convencional, seguindo pela via da incerteza. A verdade, que procura e à 
qual quer dar forma, é a do contacto com o limite dos factos, liberta dos 
imperativos da facticidade. Logo, a função utópica da arte, da filosofia e 
do desporto é a mesma e una: mediante tocarem no intangível e intocável, 
abrem-nos as portas para uma superior forma de vida. 
Na filosofia trata-se de alargar as margens e possibilidades de 
conhecer, de procurar sem conhecer o que se procura, de tocar a verdade, 
mas sem cessar de continuar a procurar, sob pena de se enclausurar na 
certeza. O mesmo sucede no desporto. Atingido um objetivo, ele deixa de 
o ser, constituindo-se em ponto de partida para outra meta. 
Arte, filosofia e desporto são um oceano ou descampado do 
‘vaguear’; partem do contacto da naturalidade dos factos e do contacto 
com os projetos, ideias e ideais, para habitarem uma terceira dimensão: 
a do limite, a da indiscernibilidade da zona de indeterminação para além 
dele. 
No fundo, o sujeito experiencia-se a si mesmo como um limite, 
subtrai-se ao familiar, ao seu abrigo e fechamento, abre-se ao indizível, 
ao sobrenatural, ao metafísico e místico, ao devir, ao exterior, à diferença, 
31 
ao outro, ao universal.11 Enfim, coloca-se num horizonte de infinitude e 
impossibilidade, escalando e atravessando a montanha do possível para 
tanger o impossível, que é a dimensão da verdade e da liberdade não real. 
Esta projeção para além do familiar visa a familiaridade fundamental com 
uma forma de vida, cuja presença apenas pode aparecer como ausência. 
Numa das muitas e tão assertivas frases que nos deixou, Ludwig 
Wittgenstein (1889-1951): definiu a preceito: “Se o lugar onde quero 
chegar fosse apenas alcançável graças a uma escada, eu renunciaria a ele, 
uma vez que ao lugar aonde quero chegar, na verdade eu já lá deveria 
estar.” Que síntese excelente para clarificar e iluminar a função da arte, da 
filosofia e do desporto, e do sujeito de cada uma delas! 
Ademais, o desporto é uma pedagogia da superação e da admiração 
da arte e beleza das performances, próprias e alheias, e de tudo quanto lhes 
subjaz para poderem ser alcançadas. Nos atos desportivos moram uma alma 
transcendental e uma sublimação espiritual, buscando a maior liberdade 
que alguma vez se pode congeminar. Nesta conformidade eles incarnam, 
em simultâneo, uma ‘antropologia da afirmação’ da humanidade e uma 
‘antropologia da restrição’ da animalidade. 
O desporto é a forma pedagógica de um imaginário ou fenómeno 
artístico e filosófico, que nele se torna realidade e pode ser representado, 
conhecido e partilhado com outros sujeitos. Deste modo ele é agente de uma 
comunidade de sujeitos ou fator da vertente comunal do sujeito, potenciada 
e concretizada em torno de um fenómeno convertido em realidade factual. 
Em síntese, o desporto não é uma coisa ‘utilitária’; serve finalidades 
éticas e estéticas, axiológicas e simbólicas que nos ajudam a escapar ao 
triste fado de Sísifo e ao pesado fardo do utilitarismo. Ele encontra um 
alicerce sólido e uma polinização frutífera num matrimónio de comunhão 
de bens com a filosofia, a arte e a cultura. 
Este é um legado dos gregos, do qual temos a obrigação de ser bons 
gestores e dele extrair as devidas ilações para as tarefas de formação, 
11 Ludwig Wittgenstein caracterizou a ética como esfera do “sobrenatural” (“acima da 
natureza”), do miraculoso e do místico, apostada em operar um milagre na existência e 
no mundo. Dito de outro modo, a ética tem como vocação olhar para a vida e o mundo 
como objetos de um milagre, de modo a que existam não como são, mas, sim, como 
místicos. Esta asserção é central na matriz axiológica do desporto. 
32 
de educação, de pesquisa, de problematização, reflexão, aplicação e 
instrumentalização do desporto, conformes aos desafios desta era. 
Aodizeristo,estouaproclamar,demodoinequívoco,aimpossibilidade 
da legitimação plausível e do entendimento cabal do desporto fora da sua 
conexão com a arte e a filosofia (entendida esta como teoria de indagação 
do mundo e de salvação da vida). Mais, proclamo que os estudos sobre 
tática, técnica e temas quejandos dos jogos desportivos, após se terem 
autonomizado e independentizado, carecem de regressar à sua casa mãe: à 
mansão da ‘arété’, da cultura, da filosofia e da pedagogia, da axiologia, da 
ética e da estética, para receberem sustento, alento, impulso e influxo para 
novos voos em direção à arte, à beleza, à verdade. O seu casamento com 
temáticas, externalidades e mais-valias, mesmo que elas sejam atraentes, 
importantes e rendosas nos nossos dias (p. ex., atividade física, saúde, 
obesidade), estafou-se e gastou-se, requerendo outros temperos; é chão 
que não dá mais uvas, pelo menos com o tamanho e sabor que satisfaçam 
os paladares exigentes. 
 
IX 
“Vivemos tempos assustadores”; para os equacionare combater temos 
que responder na mesma moeda: “precisamos de conceitos assustadores”, 
prescreve Charles Esche.12 
Com esta apresentação conclamo-vos, muito queridos companheiros 
e cúmplices da caminhada existencial, para a urgência de repensar 
a Universidade e o desporto como observatório de contemplação e 
consideração da beleza e da sensibilidade. 
Citius, Altius, Fortius! Este pregão instala o desporto nas alturas. 
Invetiva-nos por nos mantermos agarrados e presos às cadeias da rasura 
do chão, em vez de subirmos para os píncaros da altitude e magnificência. 
Aviva-nos a convicção de que temos uma vocação alada: somos seres 
obstinadamente transcendentes, porém só criamos algo belo e mágico com 
transpiração abundante. Assemelhamo-nos a anjos nascidos sem asas; e, 
realmente, nascemos sem elas. Contudo, impende sobre nós a obrigação 
de subir e voar. Não a conseguimos cumprir, sem criarmos asas e fazê-las 
crescer. 
 
12 Entrevista a Charles Esche, Jornal Público, p. 26-28, 22.12.2014. 
33 
Parafraseando José Saramago (1922-2010), temos que fazer jus ao 
nosso nome: levantar-nos do chão, lamber as feridas como um ‘cão de 
lágrimas’, rasgar o cerco da cegueira com a luz dos sonhos, sobreviver 
numa jangada de pedra face às ondas e aos ventos da alienação e opressão, 
contrariar a propensão para elefante, libertar-nos da condenação e fado de 
Caim e subir no céu como morteiros impulsionados pela pólvora do espírito 
e ousadia, para escrevermos, com as letras e a tinta do compromisso e 
decência, um manual da existência e deixarmos de nós um memorial do 
impossível. 
Olhemos o desporto e a Universidade por esta fresta de luz e 
esperança. Examinemos um e a outra com o estetoscópio da arte, com o 
fito de nos apercebermos do seu estado e dos remédios que necessitam 
tomar para debelar os males detetados. 
Convém lembrar que a arte tem uma função curativa; e esta não é 
apenas mítica. A arte é útil (não ‘utilitária’), ferramental ou instrumental 
e imprescindível, porquanto tem o condão de imaginar coisas que não 
existem. Imaginar o que ainda não existe é um pressuposto indispensável; 
porque, se não conseguirmos imaginar, será muito difícil criar. Por 
outras palavras, a arte tem um papel funcional dentro das estruturas do 
pensamento; cumpre-lhe assumirrelações reais com o mundo, fazer 
propostas para mudanças concretas deste. 
O espaço da arte é, pois, o da imaginação de coisas diferentes das que 
existem. Logo com ela podemos também imaginar outra sociedade. Indo 
mais longe, a arte pode ter a função genuína de nos ajudar a desmascarar 
a pseudo-democracia, imposta pelos poderes autocráticos e cleptocráticos. 
Essa função é deveras relevante nestes tempos, em que o interesse coletivo 
está cada vez menos representado e defendido e cada vez mais perseguido 
e espremido, em que se passou da dependência de estruturas democráticas 
para a dependência de organismos compostos por membros diretos e ou 
oriundos das oligarquias. 
Ademais, a arte avisa para não deixarmos espinhar o coração, a alma 
e os olhos, para o perigo de que isso pode suceder em todo o tempo. Ela 
mantém à superfície a curiosidade da infância e a candura da meninice, 
para não sermos expressão de uma velhice apagada, soturna, trágica e 
34 
triste, sem sabedoria, benignidade e ingenuidade, cerrada ao espanto, à 
admiração, à maravilha e fantasia, e aberta à angústia e ao pasmo. Para não 
nos desidratarmos de ideais, sonhos e utopias. 
A invasão da arte (tal como do desporto e da Universidade) pela 
economia e pela ganância financeira tem vindo a condicionar a orientação 
e consumação daquela, e a dificultar a observância da sua nascente original: 
a transcendência. 
A cultura e a arte, a Universidade e as estruturas desportivas estão 
a esquecer a sua idiossincrasia axiológica, cultural, ética e estética, a 
ser capturadas pelo pragmatismo e utilitarismo, pelo mercado e pela 
‘civilização do espetáculo’, correndo o risco de se afastarem da arété e 
paideia gregas.13 
O panorama apresenta-se desfigurado, sombrio, mostrengo e 
aterrador, propício à vinda dos cavaleiros da escuridão civilizacional. 
Enfrentemo-lo. Não pode nem deve ser atirado para o caixote do lixo a 
observância do terceiro dos mandamentos da Lei de Deus, redigidos 
e proclamados por Moisés para condenar e sancionar, refrear e inibir a 
barbárie e violência até então reinantes - e que se veem ressuscitar nestes 
tempos de austeridade, crueldade, tortura e esfola, praticadas pela gadanha 
e seitoura da ignóbil globalização financeira e neoliberal. 
O dito mandamento não perdeu validade; é de atualidade candente 
e permanente e exige vigilância gritante e incessante. Ele ordena que 
guardemos os dias santos e valoremos a fruição do corpo e da mente! Esse 
imperativo apresenta-se, muito justamente, como o ‘mandamento do ócio 
13 Com isto não estou a sugerir que o sistema mercadológico, em que vivemos, se 
desinteressou do embelezamento do mundo e aposta na sua feiura e decadência estética. 
Nem ignoro que o design, o estilo e outros padrões estéticos são hoje um aspeto relevante 
nos mais variados objetos, inclusive os tecnológicos, procurando cativar a atenção 
e atração dos consumidores. De resto, é notória, nas mais pequenas coisas, a intenção 
de fazer do dia-a-dia um projeto de arte. O processo de estetização do mundo continua 
navegando a todo o pano. “Arte e mercado nunca se misturaram tanto, inflando a 
experiência contemporânea de valor estético.” A questão é outra; tem a ver com a ordem 
dos fins. “Essa arte já não tem a dimensão absoluta e o poder questionador que tinha 
em outros momentos da história, ela não pretender transformar a humanidade ou refletir 
sobre a própria função. Seu propósito é mercadológico: ampliar o consumo das massas 
e o lucro das empresas.” (GILLES LIPOVETSKY & JEAN SERROY, A estetização do 
mundo: Viver na era do capitalismo artista. São Paulo: Companhia das Letras, 2015) 
35 
criativo’, estipulando que o Ser humano não é apenas ‘homo faber’ ou besta 
e ‘recurso de trabalho’; antes alcança, exibe e realça a sua Humanidade, 
‘santificando’ todas as dimensões da existência. 
Não tomemos este aspeto como coisa menor ou um devaneio 
intelectual. Ele situa-nos na fronteira de demarcação nítida entreacivilização 
e a animalização, a ética e a imoralidade, a moral e a amoralidade. 
X 
É curial afirmar estas coisas aqui e agora. O ‘aqui’ refere-se à 
Universidade e ao desporto; o ‘agora’ a esta ‘hora crepuscular’ e à 
‘civilização do espetáculo’, inimigas da reflexão, em que todos, com 
irresponsabilidade mais ou menos consciente ou diluída, aceitamos 
participar. 
Vivemos numa conjuntura em que as palavras não passam de ardis 
para impingir uma ‘saída limpa’ da estrumeira em que nos atolamos. Estou 
a falar, com dorida mágoa, para a Universidade: não especificamente para 
a que nos alberga, mas a Universidade, edificada para ser casa da erudição 
e da espiritualidade, para colocar o ‘primado da verdade sobre a utilidade’, 
para fomentar o ‘espírito livre’. 
O que é feito dessa instituição da Modernidade, cujos alicerces e 
alvos Humboldt tão luminosamente plantou? Mal a vemos, porque foi 
abatida com a nossa conivência e cumplicidade, ação ou omissão. Quem 
a substitui? A resposta titubeia. Por um lado, a ‘coragem’, a virtude que 
Aristóteles considerou a mais importante de todas, não é abundante e saiu 
de moda; Por outro, a ‘liberdade’, o genuíno alimento dos Seres Humanos, 
tal como a ambrosia era o dos deuses, encontra-se perecível, num torpor 
de morbidez. 
A Universidade hodierna afunda-se na capitulação. Ao não abjurar 
a panóplia de mistificações postas em circulação, coopera na instauração 
de um clima de servidão. Em consequência, ela tem vindo a desfazer-se, 
paulatinamente, da matriz identitária, a perder o crédito de instituição 
humana e socialmente relevante. O seu código genético vem sendo 
desativado e substituído por um programa espúrio e alheio, concordante 
com o radicalismo neoliberal e o credo do ‘utilitês’. O ócio, o fermento 
36 
criacionista da ciência e da cultura, esse, de tanto ser pisado, desapareceu 
e escondeu-se do olhar dos tomadores de decisões e da lista das nossas 
exigências e reivindicações. 
Os senhores congressistas e leitores já foram, por certo, assaltados 
pela tentação de abandonar este auditório ou salão nobre ou estas páginas, 
molestados com o tom da minha intervenção. Apelo à vossa bondade e 
compreensão. A honraria, que me foi outorgada, não dispensa a vassalagem 
a Miguel Torga, a voz maior da alma transmontana: “Nasci para falcão da 
serra, e não para codorniz de baixio.”14 
Tudo se conjuga para tornar apropriadíssima ao panorama 
universitário dos nossos dias a sátira que Ortega y Gasset (1883-1955) 
disparou ao da sua época: “Foi preciso esperar até o começo do século XX 
para se presenciar um espetáculo incrível: o da peculiaríssima brutalidade 
e agressiva estupidez com que se comporta um homem quando sabe 
muito de uma coisa e ignora todas as demais.” Ou estoutra: “Dantes os 
homens podiam facilmente dividir-se em ignorantes e sábios, em mais 
ou menos sábios ou mais ou menos ignorantes. Mas o especialista não 
pode ser subsumido por nenhuma destas duas categorias. Não é um sábio 
porque ignora formalmente tudo quanto não entre na sua especialidade: 
mas também não é um ignorante porque (…) conhece muito bem a 
pequeníssima parcela do universo em que trabalha. Teremos de dizer que 
é um sábio-ignorante – coisa extremamente grave, pois significa que é um 
senhor que se comportará em todas as questões que ignora, não como um 
ignorante, mas com toda a petulância de quem, na sua especialidade, é um 
sábio.” 15 
Com a minha alocução, eu pretendo acordar, homenagear, revisitar 
e trazer ao palco da vossa atenção a missão da Universidade e as teses de 
Ortega y Gasset. Disse o mestre insigne: “Todas as grandes obras humanas 
têm uma dimensão desportiva.” Mais: a filosofia é uma atividade lúdica de 
dimensão séria, visando promover o “homem luxoso e desportivo”, face ao 
“homem utilitário e biológico”. Por isso ela é “a ciência dos desportistas.” 
Nem mais, nem menos! 
Filosofiae desporto são atividades promotoras de felicidade para 
 
14 TORGA, Miguel. Diário IV, p. 63. 
15 Estas citações encontram-se em textos colocados nas redes e espaços informáticos. 
37 
quem as exercita; elas não estão vinculadas ao imediatismo utilitário. O 
desinteresse pelo utilitário e pelo imprescindível impregna os pensadores 
e os desportistas de um dom de generosidade que floresce somente nos 
cumes de maior altitude vital! 
O desporto representa a vida criadora e graciosa, enquanto “os atos 
utilitários e adaptativos, tudo o que é reação a prementes necessidades, são 
vida secundária. A utilidade não cria, não inventa, simplesmente aproveita 
e estabiliza o que sem ela foi criado (…) A vida foi primeiro uma invenção 
pródiga de possibilidades e depois uma seleção (…) Esta abundância de 
possibilidades é o sintoma mais característico de vida pujante; tal como o 
utilitarismo, ao ater-se ao estritamente necessário, à maneira do enfermo 
que poupa movimentos, é o sintoma de debilidade e vida minguante.” 16 
Estas considerações de Ortega y Gasset seguem o padrão do patriarca 
Aristóteles, que valorou devidamente: a atividade laboral justifica-se e tem 
em vista o ócio, as coisas necessárias e úteis têm em vista as coisas boas e 
belas; estas são mais importantes do que as primeiras. O que serve apenas 
a necessidade utilitária, é feio, não é da ordem do belo. 
O desporto e a formação universitária não podem ser reduzidos à 
ordem ‘utilitária’; visam fins éticos e estéticos, axiológicos e simbólicos, 
que nos ajudem a escapar ao peso do pragmatismo e utilitarismo. O 
seu préstimo pode ser medido por este metro: “Se o trabalho se torna 
autodeterminado, autónomo e livre, e por isso dotado de sentido, será 
também (e decididamente) por meio da arte, da poesia, da pintura, da 
literatura, da música, do uso autónomo do tempo livre e da liberdade 
que o ser social poderá humanizar-se e emancipar-se no seu sentido mais 
profundo.”17 
Até hoje estas teses não foram rebatidas. Por conseguinte é imperativo 
integrá-las no entendimento e na organização da vida, da educação, da 
sociedade, do desporto e da Universidade. Mas… são, hodiernamente, o 
desporto e a Universidade um campo onde floresce e frutifica a beleza 
e dela nos sustentamos? Revemo-nos no canto e na dança? Abjuramos 
16 ORTEGA Y GASSET. El origen deportivo del estado, p. 13-16. A coruña: edición inef 
galicia, universidade da corunha, 2011. 
17 ANTUNES, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho: Ensaios sobre a Afirmação e a Negação 
do Trabalho. Coimbra: CES/Almedina, 2013. 
38 
aquilo que fere e destrói, por não nos ser semelhante? Fazemos boa leitura 
e melhor apropriação da consabida máxima de Terêncio (195 ou 185 – 159 
a.C.)?18 
O desporto funda-se nos mitos de Hércules e de Ulisses, nas 
metáforas, narrativas e parábolas de Homero, que concebem e propõem 
uma existência ideal, experimentada, séria e virtuosa, fundada na fortaleza 
do ânimo e na persistência face às dificuldades e perseguições, sem perder a 
orientação básica da esperança que conduz à elevação e recompensa. Qual 
o estado de concretização de tais proposições e mitos? Estarão gastos? 
Será melhor esquecermo-nos deles, abandoná-los, descartá-los ou tentar 
viver ao nível dos desafios que eles colocam? 
XI 
Caros congressistas e leitores: ouço-vos murmurar que sou um 
idealista, um sonhador. É verdade, eu sou. Mas eu também sei que não 
sou o único. Cada um de vós está, aprumado e determinado, ao meu lado! 
É chegada a altura de parar, de medir o caminho andado, de 
corrigir e reparar os desvios da rota seguida, e de traçar e encetar um 
novo percurso. Comunguemos o apelo de José Saramago: 
“O fim duma viagem é apenas o começo de outra. 
É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, 
ver na primavera o que já se viu no Verão, ver de dia o que se viu de 
noite, com sol onde primeiramente a chuva caía, ver a seara verde, o fruto 
maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. 
É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e traçar 
caminhos novos ao lado deles. 
É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já.”19 
Trazemos na testa o ferrete de Homo Viator, de condenados a 
peregrinar em diáspora e errância permanentes, em trânsito ininterrupto. 
Estamos e somos em viagem; ela não nos concede descanso. Seguimos 
em viagem, carregados de contradições, metas e carências que indicam o 
18 “Homo sum, humani nihil a me alienum puto - Sou um homem, nada do que é humano 
me é estranho.” 
19 SARAMAGO, José. Viagem a Portugal. Lisboa: Editorial Caminho, 1981. 
39 
quanto há e sempre haverá em nós por fazer. 
O sonho empurra-nos para a frente, impele-nos a continuar a viagem. 
É nosso dever embarcar nela. E navegar no rumo da aventura, com os 
ventos do contentamento e descontentamento a insuflar-nos as velas da 
alma. 
Ocupemo-nos a juntar as pessoas em torno de causas, ideais, 
princípios e valores! Isto requer que estejamos acordados, empenhados e 
despertos, que não enfileiremos com os medíocres. 
Cultivemos causas, valores, virtudes, maneiras e disposições para 
agir condignamente, se não quisermos ser esmagados pelas hordas da 
bestialidade, que mutilam o teor humanista e cultural do nosso mister. 
Podemos viver numa sociedade sem causas, ideais, utopias, 
princípios e valores? Sim, podemos! Mas não é a mesma coisa, nem a isso 
se chama viver. Com os valores ausentes de nós, não logramos ser pessoas. 
Somos apenas maciços de carne, que andam e se movem sem o espírito a 
comandar os nossos passos. 
O que nos compete fazer? O sociólogo Immanuel Wallerstein 
alerta-nos que todos os debates são simultaneamente intelectuais, morais 
e políticos, buscando aonde vamos, aonde queremos ir, a modalidade de 
chegarmos mais facilmente. 
Assumamos a nossa quota-parte de responsabilidade. Reflitamos e 
falemos acerca da importância do desporto e da formação universitária, 
como fatores da dignificação e elevação do mistério da vida. 
Não fiquemos paralisados diante de factos absurdos e irrazoáveis, 
por mais impositivos e inevitáveis que pareçam! O momento incita a agir, 
a pensar de modo sereno, todavia radical, as soluções que nos propõem e 
os becos aonde elas conduzem. 
Porfiaremos em ser um edifício em construção, inacabado e 
inconclusivo. A paixão, o entusiasmo e os ideais, que iluminaram a 
caminhada até aqui e habitam dentro de nós, continuarão a insuflar-nos a 
alma e a ditar-nos as palavras e os atos. 
O mundo em que vivemos, se teimar em banir as utopias e ser coutada 
do utilitarismo e imediatismo, não passa de uma sensaboria sem o paladar 
40 
do humano e sem a graça e o encanto da harmonia e felicidade. 
Em todo o tempo e lugar, impõe-se tentar recriar constantemente 
a fulgurância da vida, para subtrair esta da tragédia da indignidade e 
fealdade. Ou seja, a educação ética e estética reclama ser um direito e 
uma necessidade de todos. No desporto e na Universidade ela deve ser 
uma meta constante. Ser melhor é jogar, competir, superar e vencer com 
dignidade e elegância; é fruir e atingir a verdade e beleza do jogo. 
Precisamos de ‘inutensílios’, de coisas não ‘utilitárias’ e do ‘ócio 
recriador’, para aliviar o sufoco do utilitarismo e sanear o ambiente 
inestético e demencial, em que se converteu o contexto social e existencial, 
inclusive o universitário. Que avaliação faz de si a Universidade a este 
respeito? Ainda é o lugar do espírito livre, onde se procura a verdade, por 
ser verdade? Ainda prevalece nela o primado humboldtiano da verdade 
sobre a utilidade? Que ponderação tecem disto os académicos? Sentem-se 
bem com a ‘forma’ e a quadratura da Universidade? 
Estamos disponíveis para passar do desassossego à ação, para 
remir, no discurso e na prática, os lemas comuns, matriciais e originais da 
Universidade e do desporto? Aonde transporta este atode compromisso, 
selado entre a nossa pertença e paixão pela Universidade e pelo desporto? 
À inquietude pessoana de inquirir associo a franqueza do Padre 
António Vieira (1608-1697) para concluir: “Tenho acabado, senhores (…) 
Se a alguém pareceu que me atrevi a dizer o que fora mais reverência 
calar, respondo com Santo Hilário: Quae loqui non audemus, silere non 
possumus: O que se não pode calar com boa consciência, ainda que seja 
com repugnância, é força que se diga.”20 
O que é que então faz falta para abater os muros que comprimem 
a Universidade e o desporto? Algo muito pequeno na formulação, porém 
assaz exigente na ação: coragem e lucidez! Ou as temos ou não. Se as 
temos e não usamos, somos cobardes; se as não temos, somos carentes e 
dementes. Tanto num como no outro caso, não estamos à altura de cuidar 
de outrem; antes carecemos de alguém que cuide de nós. Logo, sejamos 
justos e precisos: o nosso lugar não é na Universidade; é num hospício. 
 
 
20 PADRE ANTÓNIO VIEIRA. Sermão do Bom Ladrão, proferido em 1655 na Igreja da 
Misericórdia de Lisboa (Conceição Velha), perante D. João IV e a sua corte. 
41 
REFERÊNCIAS 
ANTUNES, R. Os Sentidos do Trabalho: ensaios sobre a afirmação e a 
negação do trabalho. Coimbra: CES/Almedina, 2013. 
BAUMAN, Z. Medo Líquido. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006. 
BAUMAN, Z. Vida líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2007. 
ENTREVISTA a Charles Esche. Jornal Público, p. 26-28, 22.12.2014. 
LIPOVETSKY, G. & SERROY, J. A estetização do mundo: viver na era 
do capitalismo artista. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. 
GUMBRECHT, H. U. Elogio da beleza atlética. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2007. 
ORTEGA Y GASSET. El origen deportivo del estado. A coruña: edición 
inef galicia, universidade da corunha, p. 13-16, 2011. 
VIEIRA, Padre António. Sermão do Bom Ladrão. Proferido em 1655 na 
Igreja da Misericórdia de Lisboa (Conceição Velha), perante D. João IV e 
a sua corte. 
PASCOAES, Teixeira de. Arte de ser português. Lisboa: Assírio & 
Alvim, 1998. 
PASCOAES, Teixeira de. Senhora da Noite. Verbo Escuro. Lisboa: 
Assírio & Alvim, 1999. 
SAFATLE, V. Pensamento binário. Folha de S. Paulo, p. A2, 28.07.2015. 
SARAMAGO, J. Viagem a Portugal. Lisboa: Editorial Caminho, 1981. 
TORGA, M. Diário IV, p. 63. 
42 
 
43 
PROCESSO ORGANIZACIONAL SISTÊMICO, A PEDAGOGIA 
DO JOGO E A COMPLEXIDADE ESTRUTURAL DOS JOGOS 
ESPORTIVOS COLETIVOS: UMA REVISÃO CONCEITUAL 
 
 
Prof. Dr. Alcides José Scaglia 
Prof. Drndo. Riller Silva Reverdito1, 
 
 
Prof. Marcos Vinícius Russo dos Santos1 
Prof. Dra. Larissa Rafaela Galatti1 
O JOGO COMO UMA UNIDADE DE RELAÇÕES COMPLEXAS 
Na Pedagogia do Esporte, enquanto disciplina das Ciências do Esporte 
(REVERDITO; SCAGLIA; PAES, 2009; GALLATTI et al., 2014), tem 
sido construída uma base argumentativa ao longo dos anos para defender 
o ensino de jogos esportivos coletivos por meio da valorização do jogo 
(GRECO, 1998; BETTEGA et al. 2015a; BETTEGA et al. 2015b; CÔTÉ; 
ERICKSON; ABERNETHY, 2013; CÔTÉ, STRACHAN e FRASER- 
THOMAS,2007; CÔTÉ, 1999; BAYER, 1994; GARGANTA, 1998; 
FREIRE, 2006; GRAÇA; MESQUITA, 2009a, 2009b; LEONARDO; 
REVERDITO; SCAGLIA, 2009; ARAUJO, 2006; TRAVASSOS et al., 
2013; BAKER, et. al., 2005; SOBERLAK & CÔTÉ, 2003; MENEZES, 
2012; SCAGLIA et al., 2013; SCAGLIA; REVERTIDO e GALATTI, 
2014). Estes autores rompem com a abordagem tradicional de ensino e 
treinamento do esporte (SCAGLIA; REVERDITO; GALATTI, 2014), 
desvelando a complexidade estrutural e dinâmica dos jogos. 
Nesta perspectiva de rompimento, as abordagens pautadas nas 
teorias ecológicas, sistêmicas e complexas, buscam compreender o 
processo organizacional sistêmico dos jogos para que possam estabelecer 
interações eficientes entre ambiente de jogo e o ambiente de aprendizagem 
(BAKER; CÔTÉ & ABERNETHY, 2003; BAKER, et al., 2005; SCAGLIA; 
REVERTIDO; GALATTI, 2013; SCAGLIA, et al. 2013; BRIDGE; TOMS, 
2013; HORNIG; AUST; GÜLLICH, 2014), reconhecendo o jogo como um 
sistema complexo (FREIRE, 2002; SCAGLIA, 2003, 2005; LEITÃO, 
2009; REVERDITO; SCAGLIA, 2007; LEONARDO; REVERDITO; 
44 
SCAGLIA, 2009; SCAGLIA et al., 2013). 
No entanto, a compreensão dessa base argumentativa, passa pela 
compreensão de alguns conceitos que emergem de um processo de rupturas 
paradigmáticas (KUHN, 2007; 2011). Nesse sentido, por exemplo, não 
basta dizer que o jogo é complexo; é preciso compreender o conceito de 
sistema e o engendramento complexo das interações, culminando com o 
processo organizacional. 
Desde a segunda metade do século XX ganhou força a ideia de que 
os sistemas não poderiam ser entendidos a partir do paradigma cartesiano 
(CAPRA, 1996; MORIN, 2013). Isto porque as suas propriedades e suas 
qualidades não poderiam ser compreendidas em partes isoladas da sua 
totalidade ou contexto (CAPRA, 1996). No entanto, salientando que não é 
uma ideia nova, Morin (2013, p. 259), exprime um aspecto importante de 
um sistema: “Ora, o paradigma novo que a ideia do sistema traz, Pascal já 
havia exprimido: Considero impossível conhecer as partes sem conhecer 
o todo, como conhecer o todo sem, particularmente, conhecer as partes.” 
Já em meados do século XX o nome de Ludwig von Bertalanffy 
(2008) ganhou destaque pela proposição da sua Teoria Geral dos Sistemas, 
onde sustentou o conceito de sistema aberto, designado aos organismos 
vivos para mostrar que neles há um constante fluxo de matéria e energia 
de fora para dentro e de dentro para fora. Em relação aos organismos de 
maior complexidade, Morin (2013) destaca também o constante fluxo de 
informação. 
Durante as últimas décadas do século XX, Morin (2002, 2007 e 
2013), consolidado como um dos nomes mais importantes do pensamento 
complexo, nos trouxe a complexificação das relações internas dos 
sistemas, dizendo que estas não expressam apenas o todo maior que a 
soma de suas partes, mas que as partes são ao mesmo tempo mais e menos 
que o todo. Isto é, o todo pode ser menos que as partes além de ponderar 
que o todo é insuficiente, incerto e, por vezes, conflituoso, evidenciando 
uma das máximas da complexidade que pode se resumir em: apesar de 
contraditórias as afirmações, elas são complementares. 
Dentro deste universo, Morin (2013, p. 265) define sistema como 
aquele “[...] que exprime a unidade complexa e o caráter fenomenal do 
45 
todo, assim como o complexo de relações entre o todo e as partes”. De 
modo complementar a esta definição, o autor integra os diferentes termos 
sistema, interação e organização (MORIN, 2013), evidenciando um 
macroconceito de recorrente interdependência. 
Desse modo, a partir da maior ou menor aproximação entre as teorias 
desenvolvidas por Morin (2013), queremos ressaltar que elas delineiam 
o paradigma emergente (SANTOS, 2003; KUHN, 2007), fornecendo 
subsídios e sustentação teórica para pensarmos a Pedagogia do Esporte, 
e por consequência as metodologias de ensino e treinamento de esportes, 
por um prisma (ponto de vista) diferente da ainda hegemônica e positivista 
visão tradicional (BETTEGA et al., 2015b; GALATTI et al., 2014; 
SCAGLIA, 2014). 
Feita a incursão sobre as bases do pensamento complexo/sistêmico, 
a qual poderia se estender pelas profícuas reflexões de outros autores 
(a exemplo de MATURANA; VARELLA, 2001; ATLAN, 1992, 1994; 
PRIGOGINE, 1996; PRIGOGINE; STENGERS, 1997; BATESON, 1986, 
2006), podemos avançar sobre o processo de ensino, aprendizagem e o 
treinamento dos jogos coletivos, partindo do pressuposto de entendê-los 
enquanto jogo, antes de tudo (SCAGLIA; REVERDITO; GALATTI, 
2013; 2014). 
No intuito de imbricar tais pensamentos advindos do paradigma 
da complexidade à Pedagogia do Esporte, procuramos aproximar essas 
definições junto ao conceito de jogo (SCAGLIA, 2003), coadunando-as à 
reflexão de Freire (2002), relacionando-os à pedagogia do jogo. 
A partir

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