Buscar

APOSTILA HISTÓRIA DA FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 63 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 63 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 63 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

HISTÓRIA DA FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA
DEFINIÇÃO-Marx e Engels e a formulação do Materialismo Histórico; a herança marxista a partir de pensadores que desdobraram seu pensamento; as novas fases do marxismo a partir das influências da Escola de Frankfurt.
PROPÓSITO-Explicar, de forma fundamentada, as bases e a permanência do pensamento de Marx e os continuadores de suas teorias – marxianos e marxistas. Trata-se de uma das principais influências para o pensamento filosófico da contemporaneidade.
Módulo 1
Compreender o desenvolvimento do marxismo e o surgimento do Materialismo Histórico
INTRODUÇÃO:Depois de proclamada por tantas vezes a morte de Marx e iguais vezes evocada a sua ressurreição na história do pensamento contemporâneo, a pergunta que fica se refere à tentativa de compreender a importância do legado desse autor, que é amado por uns e odiado por outros tantos.
Para responder a essa questão, antes de discutir quem o aprecia e quem são aqueles que se reivindicam
como marxistas ou marxianos, é preciso partir do pressuposto de um dos seus críticos (um adversário?), Jacques Derrida, que um dia proclamou que não há futuro sem Marx e afirmou que é possível estar “para, contra, com, mas não sem Marx” (BENSAÏD, 2013, p. 168).
CONHECENDO MARX
Nascido em Trier, capital da província alemã do Reno, no alvorecer do século XIX, momento em que a humanidade atravessava sua primeira Revolução Industrial, que começava pela Inglaterra, mas levaria algumas décadas para atingir o restante da Europa, Karl Heinrich Marx (1818-1883) teve origem em uma ampla família judaica de classe média. Desde muito jovem, esteve envolvido com movimentos intelectuais, mas foi a partir de sua transferência para a Universidade de Berlim e do encontro com jovens intelectuais e discípulos do professor e filósofo Georg Wilhelm Friedrich Hegel que o jovem Marx descobriu sua paixão pela Filosofia e encontrou o que parecia ser sua vocação.
A partir do encontro com os chamados jovens hegelianos (também conhecidos como hegelianos de esquerda), Marx deu os primeiros passos no desenvolvimento do que viria a ser uma das mais profícuas e controversas obras da humanidade. Estamos nos referindo ao conjunto dos estudos que acabou por influenciar a Política, Sociologia, História, Economia e Filosofia. Apesar de ser teoricamente uma obra vital, cai em segundo plano ou em negação muitas vezes em virtude das controvérsias políticas que ensejou, e isso, às vezes, impede uma apreciação correta da sua dimensão.
Trabalhos iniciais de Marx: relações de propriedade
 Inicialmente, os trabalhos de Marx estudaram as relações de propriedade pela ótica da transformação do direito público e as formas assumidas na História pela propriedade privada.
 Marx começou pelas disputas pela lenha, um produto essencial para aquecer as casas durante o inverno em regiões temperadas. Tais disputas foram percebidas a partir de sua conversão em crime, já que buscar a lenha em florestas que tinham se tornado propriedade privada passou a ser considerado roubo.
 Como futuro pensador e militante socialista, Marx percebeu que o resultado da transfiguração do simples ato de recolher lenha na floresta em roubo provinha das transformações da sociedade que impunham às populações acostumadas a recolher a lenha a condição de párias e criminosas.
 Estava aberto o caminho para uma primeira crítica da sociedade de classes e transformar Marx, digamos, num marxista. Não obstante, essa crítica ainda se dava no terreno das ideias e da filosofia, porque foi feita muito antes de Marx descobrir as classes, a luta de classes e a sociedade burguesa (ou o modo de produção capitalista).
MARX E AS BASES DA FILOSOFIA MARXISTA
Os filósofos só interpretaram o mundo de diferentes maneiras; do que trata é de transformá-lo”.
(MARX; ENGELS, 1989, p. 97)
 Muito antes de formular essa famosa décima primeira tese sobre Feuerbach, que escreveu a partir do contato com seu grande amigo, parceiro e colaborador intelectual Friedrich Engels, Marx procurou construir uma carreira acadêmica discutindo a filosofia clássica e também o pensamento do seu mestre (e mestre de quase todos os jovens filósofos alemães da época), Hegel.
 São dessa época as obras A diferença entre as filosofias de Demócrito e Epicuro (1841), que se originou de uma tese de doutorado defendida em Jena, quando tinha apenas 23 anos, e seus primeiros textos, que sugerem uma preocupação incipiente com os temas da política e da transformação do mundo – isso o acompanharia por toda a vida –, além dos efeitos de uma intensa atividade jornalística desenvolvida em veículos de imprensa de jovens hegelianos.
 Como produtos literários dessa primeira fase de atividade intelectual, temos:
 Introdução à crítica da filosofia do Direito de Hegel;
 A questão judaica;
 Os manuscritos econômico-filosóficos.
Todas essas obras foram escritas em 1844. Algumas delas, sem terem sido publicados, ficaram inéditas até o século XX.
 Após se encontrar com Engels – que havia ido a Londres para administrar as indústrias do pai, mas passou a frequentar os ambientes da classe trabalhadora, o que o fez produzir A situação das classes trabalhadora na Inglaterra (1845) –, Marx extrai algumas das ideias para compor sua primeira obra escrita em parceria com o jovem Friedrich Engels.
 O resultado dessa colaboração é o esboço de uma concepção de mundo que, posteriormente, constituiria as bases filosóficas de tudo aquilo que se chama filosofia marxista.
Importante
 A obra A sagrada família ou A crítica da Crítica crítica: contra Bruno Bauer e consortes (1845) assinala o início da ruptura com os jovens hegelianos e a primeira formulação de uma concepção que se poderia dizer efetivamente “marxista” da História, chamada também de Materialismo Histórico.
Ruptura com hegelianos
 O encontro dos jovens intelectuais, que deu início a uma parceria que duraria por toda a vida, foi marcado pela ruptura com os jovens hegelianos, os quais eram percebidos como imersos no interior da filosofia metafísica de Hegel.
O QUE MARX E ENGELS PRETENDIAM?
Para Marx e Engels, a tarefa a ser cumprida não era superar Hegel no terreno da filosofia e do idealismo através da crítica à religião e ao cristianismo, mas presumir que, para que a crítica fosse eficaz, seria preciso transformar o mundo no qual os homens eram levados a acreditar em Deus e a construir religiões. Portanto, se havia um lugar onde essa luta se daria, não era no plano da crítica da religião ou da ideia de Deus, mas dentro da História real.
COMO: Superar a visão hegeliana através de um embate exclusivamente no plano metafísico ou das ideias.
Leia uma passagem escrita por Engels para A sagrada família:
Uma vez reconhecido o homem como essência, como a base de todas as atividades e dos estados humanos, apenas a “Crítica” pode inventar novas categorias e transformar de novo o próprio homem, conforme o faz agora, numa categoria e no princípio de toda uma série de categorias, atitude com a qual a humanidade teológica atemorizada e perseguida abraça, por certo, o último caminho de salvação que ainda lhe restava livre. A História não faz nada, “não possui nenhuma riqueza imensa”, “não luta nenhum tipo de luta”! Quem faz tudo isso, quem possui e luta é, muito antes, o homem, o homem real, que vive; não é, por certo, a “História” que utiliza o homem como meio para alcançar seus fins – como se se tratasse de uma pessoa à parte –, pois a História não é senão a atividade do homem que persegue seus objetivos. (MARX & ENGELS: 2003, p. 111)
 Dizer que a “História não faz nada” significa que, diferentemente do que pretendia Hegel e seus discípulos – que acreditavam na História como uma abstração, na qual as vontades do tempo ou de Deus eram realizadas a partir da evolução das ideias (do espírito) – são os homens reais que importam, são eles que contam porque lutam e perseguem seus objetivos, dando forma ao mundo real.
 O objetivo dessa crítica, que ilustra bem o espírito que move os dois amigos ao colaborarempela primeira vez, é superar a Filosofia da História de Hegel e dos jovens hegelianos. Essa visão pressupunha que havia um sentido inscrito na transformação do mundo e no caminho da realização da razão universal e do espírito absoluto que passava por fora da existência real dos homens.
A IDEOLOGIA ALEMÃ
 A tentativa de se opor no campo das ideias ao pensamento hegeliano não foi muito bem-aceita no meio acadêmico. Assim, outro trabalho de Marx e Engels tentou definir o conceito de Materialismo Histórico.
 A obra A ideologia alemã (1845) estabelece uma concepção original da História que põe o homem, em sua relação com a natureza e com os outros homens, no centro de toda a trama histórica. Por conseguinte, não por acaso, em passagem riscada do manuscrito, que sobreviveu para ilustrar em grande medida a concepção filosófica de Marx e Engels, eles declaram que conhecem “uma única ciência, a ciência da História” (MARX; ENGELS, 2007, p. 40)
O significado disso é:
 Para o marxismo, é no mundo real, formado por homens reais, que se dão as lutas e se estabelecem as relações sociais, ou seja, que se desenvolve a História.
 A importância desse trabalho é tão grande que os estudiosos atribuem à obra A ideologia alemã um ponto de inflexão na formulação do pensamento marxista, saindo de um ponto de vista ainda demasiadamente influenciado pelo idealismo para uma perspectiva essencialmente materialista. O filósofo francês Louis Althusser (1918-1990), um dos mais importantes autores marxistas da corrente do estruturalismo, considera que Marx teria se tornado “ele mesmo” apenas depois de 1845 (ALTHUSSER, 2015, p. 61).
 O resultado dessa transformação ensejou a seguinte conversão:
DO PENSADOR INQUIETO DADO A INTERVENÇÃO NOS DEBATES FILOSÓFICOS E POLÍTICOS...PARA MILITANTE E ORGANIZADOR EMPENHADO EM CUMPRIR A TAREFA CONJUGADA DE INTERPRETAR E TRANSFORMAR O MUNDO.
Por conta disso, Marx e Engels ingressaram na Liga dos Justos, uma organização política prestes a assumir sua condição de comunista, para encontrar os homens de carne e osso que falavam em desvelar o proletariado como sujeito da revolução. Desse encontro com militantes empenhados em lutar pela transformação do mundo, foi delegada a eles a tarefa de redação de um manifesto que anunciaria a Liga dos Comunistas.
MANIFESTO COMUNISTA
 Depois de postergarem o compromisso que assumiram até o limite do tolerável, sem que Engels obtivesse uma resposta do seu companheiro, ele entregou a Marx um material que havia redigido e poderia servir como ponto de partida para a redação do manifesto: Princípios do comunismo (1847). A redação dessa obra e o trabalho em dupla para a elaboração do texto do manifesto da Liga dos Comunistas contribuíram para o surgimento de um dos mais significativos livros do marxismo e da História: o Manifesto do Partido Comunista (1848).
 Uma das frases da abertura do libelo que se tornou uma das obras mais editadas e traduzidas em todo o mundo, representa uma perfeita síntese da concepção de História surgida da transformação da filosofia idealista em filosofia marxista, melhor dizendo, em Materialismo Histórico:
“A história de todas as sociedades até hoje existentes é a história da luta de classes”.
(MARX; ENGELS, 1998)
 Publicado em fevereiro de 1848, quando eclodia na França a primeira revolução que inauguraria a Primavera dos Povos na Europa, o Manifesto do Partido Comunista é a melhor e mais acabada síntese do marxismo. Há no texto uma linguagem que exalta as realizações da burguesia, aponta suas limitações e localiza a sociedade burguesa e a produção capitalista como ponto de passagem da História, e não como sua chegada.
 Da antecipação das crises cíclicas do capitalismo, causadas pela ascensão da sociedade burguesa, à exaltação do proletariado, o Manifesto conjuga um estilo preciso e sofisticado com uma competente síntese do desenvolvimento histórico.
Saiba mais
 Para o filósofo estadunidense Marshal Berman (1940-2013), que vê em Marx um dos arautos da modernidade, os paradoxos presentes na linguagem dialética do Manifesto dão a impressão de que Marx, em vez de pretender enterrar a burguesia de uma vez, parece empenhado em exaltá-la (1992, p. 91). Segundo este autor, isso ocorre porque, pela ótica do livro, a sociedade burguesa, quanto mais exorta os homens a crescer, mais faz com que estes se voltem violentamente contra ela “como uma draga impetuosa (...) em nome de uma nova vida que ela própria os forçou a buscar” (1992, p. 95).
 Não podem restar dúvidas de que o Manifesto comunista (ou Manifesto do Partido Comunista) ocupa um lugar importante no conjunto da obra de Marx e Engels pelo vigor estilístico, pela abordagem clara e pelo seu formato simples, direto e acessível aos trabalhadores. Em vista disso, não é possível se aventurar pela descoberta do marxismo sem conhecer esse texto, quando não, sem iniciar o percurso por ele.
É com o Manifesto comunista que Marx explicita a luta necessária em relação ao controle dos meios de produção.
MARX E ENGELS: A HISTÓRIA
 O pensamento marxiano e engelsiano, pela sua complexidade, é composto de muitas outras obras. Marx analisa a história em processo, como nos escritos que deram origem às obras A luta de classes na França (1850), O 18 de Brumário de Luís Bonaparte (1852) e, posteriormente, A guerra civil na França (1871). A aplicação do Materialismo Histórico se mostra mais eficaz para fins de compreensão da realidade da luta de classes nos tumultuados contextos das revoluções de 1848 e do golpe de Luís Bonaparte, em 1851, e, muito depois, com a experiência da Comuna de Paris, em 1871.
 Nesses escritos, a análise marxista mostrou-se bastante eficaz, pois sobreviveu ao julgamento do tempo, guardando a importância para muito além do que se atribui aos clássicos, posto ser capaz de articular, como nenhum outro autor, as dimensões da estrutura e do processo na transformação histórica, como podemos ver em passagem do 18 de Brumário de Luís Bonaparte:
 Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha, e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”.
(MARX: 1997, p. 21)
 No século XIX, a burguesia de muitos países ainda não tinha varrido da cena histórica o que Marx considerava como os resquícios da sociedade feudal (aristocracias, reis, súditos, relações de suserania, servidão e vassalagem). Então, por entender que a moderna classe burguesa ainda cumpria um papel progressista na História, Marx e Engels admitiam que o mundo, antes de reunir todas as condições para a transição para o socialismo e o comunismo, precisaria passar pelo desenvolvimento pleno do capitalismo, de suas forças produtivas e de suas principais classes antagônicas: burguesia e proletariado.
 Porém, o que eram exatamente essas duas classes?
 Como estabeleciam a relação entre elas nessa fase de desenvolvimento histórico?
 Como se daria a relação de exploração?
 De onde vinha a riqueza que permitia a transformação de países de território restrito e pouca presença colonial em grandes potências?
 A partir de questões como essas e de muitas outras que inquietavam Marx e Engels, principalmente Marx, eles partiram para estudar as relações econômicas e o desenvolvimento do capitalismo em bases históricas assentadas.
 Engels, que vivera na Inglaterra, berço da Revolução Industrial e bastante mais desenvolvido industrialmente que o restante da Europa, deu informações a Marx sobre os economistas clássicos que analisavam as transformações na sociedade e na economia engendradas pela industrialização.
Atenção
 Precisamos lembrar que estamos em um campo filosófico de compreensão, pelo qual os autores se influenciavam. Assim, os estudos de Economia Política geravam fundamentações para o trabalho argumentativo e pragmático proposto por Marx e Engels.
1844
Marx inaugurou um novo momento de sua teoria no terreno econômico a partir dos Manuscritos econômico-filosóficos (1844), quandoainda estava sob influência direta de Hegel.
1847
Em Miséria da filosofia (1847) e com o texto Trabalho assalariado e capital (1847), partiu para defenestrar a obra de Joseph Proudhon (1809-1865), sem, no entanto, possuir as ferramentas conceituais que lhe permitiram em seguida analisar o capitalismo.
 Além disso, o encontro com o socialismo francês já havia proporcionado o substrato fundamental para compreender a luta de classes em perspectiva histórica. Sob o aspecto econômico, a reflexão marxiana apenas engatinhava, mas ainda faltava a obra definitiva em relação a esse prisma, faltava O capital.
O CAPITAL
A partir dos anos 1850, Marx intensificou seus estudos sobre economia. Em 1859, elaborou sua primeira obra mais diretamente empenhada em discutir a economia burguesa e seus fundamentos, Contribuição à crítica da economia política. Nessa obra, ele apresenta temas que deram base à obra que representa a maturidade de Marx, O capital (1867).
Vejamos alguns pontos que permeiam autor e obra:
TEMAS DO MUNDO REAL TRANSFORMADOS EM CONCEITOS
Mercadoria, capital, circulação, produção e dinheiro são temas tomados do mundo real e transformados em conceitos, num procedimento investigativo que pressupunha a passagem do concreto ao abstrato e, depois, um novo retorno ao concreto. No famoso prefácio dessa obra, Marx sintetiza uma concepção que vinha amadurecendo ao longo dos anos, mas que foi tomada muitas vezes fora de contexto e desconectada do conjunto da obra marxiana, como se fosse a última explicação da compreensão de Marx sobre a transformação histórica. Com O capital, Marx forneceu as bases para que muitos críticos lhe imputassem a pecha de economicista.
ASPECTO FILOSÓFICO E HISTÓRICO
Como apontam alguns dos melhores estudiosos da obra marxiana, por ser filho do seu tempo e sofrer influências de correntes que se desenvolveram em pleno século XIX, como o cientificismo, o evolucionismo e a própria economia política, um olhar sobre o conjunto da obra de Marx não recomenda que o identifiquemos como economicista. Isso porque, para muito além dessas tensões que aparecem aqui e ali –, que por vezes eram utilizadas com ênfase para redarguir um contraditor visível ou oculto –, a compreensão que Marx (e também Engels) tem da História, que se conforma no que pode ser chamado de filosofia marxista ou Materialismo Histórico, é muito distinta do que nos faz crer a leitura de certos fragmentos que precisam ser vistos nos seus contextos e dentro de certos enquadramentos mais amplos.
DEDICAÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE RELAÇÕES ECONÔMICAS E CAPITALISMO
Tendo elaborado um vasto projeto de estudos sobre a economia política, passando muitas horas de sua vida na biblioteca do Museu Britânico, Marx sobrevive elaborando pequenos artigos para periódicos da Europa e dos Estados Unidos, além de contar com a valiosa contribuição financeira que Engels lhe oferecia.
 Os vários esboços para a redação de O capital, como a própria Contribuição à crítica da economia política (também traduzido como Para uma crítica da economia política) e as centenas de páginas que deram origem aos Grundrisse, representam uma dimensão do grandioso projeto para redação de sua obra máxima. Além disso, acrescentam elementos para compreensão de sua concepção de História e do método desenvolvido, incluindo-se aqui o estudo das formas que precederam a produção capitalista.
MÉTODO DE ESTUDO
 No que tange ao método – uma das preocupações centrais de Marx, que sempre elaborava diversos planos de estudos antes de se enfurnar em investigações exaustivas –, vale acompanhar a passagem em que o autor faz questão de explicitá-lo:
 O concreto é o concreto porque é a síntese de múltiplas determinações, portanto, unidade na diversidade. Por essa razão, o concreto aparece no pensamento como processo de síntese, como resultado, não como ponto de partida, não obstante seja o ponto de partida efetivo e, em consequência, também o ponto de partida da intuição e da representação”.
(MARX, 2011, p. 54)
LUTA PELA ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES E PELO DESENVOLVIMENTO DO CAPITAL
 Dedicado por vários anos aos estudos da economia política, Marx jamais negligenciou a organização dos trabalhadores e o desenvolvimento do capital no mundo, inclusive nos Estados Unidos. Ele nunca deixou de lado as polêmicas, algumas das quais aparecem hoje como mesquinharias, e em tempo algum abdicou de contribuir para que a tarefa de transformar o mundo fosse o mote de todo seu esforço intelectual. Em vista disso, em 1864, com Engels e várias correntes que atuavam no nascente movimento operário de vários países, ajudou a fundar a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), posteriormente chamada de Primeira Internacional.
 Entendendo que caberia aos trabalhadores de todo o mundo (“proletários de todos os países, uni-vos”) organizar a luta para a transformação revolucionária da sociedade, Marx dedicou imenso esforço para dotar a obra que elaborava de uma linguagem que fosse acessível para os trabalhadores. Apesar desse esforço e consciente das dificuldades atinentes aos que se aventurassem em um percurso demasiadamente longo, tortuoso e repleto de conceitos complexos e inúmeras abstrações, no prefácio à edição francesa de O capital, publicada em 1872, Marx advertiu os leitores para o fato de que o método que havia empregado para a análise de assuntos econômicos podia tornar a leitura árdua para o público francês, “sempre impaciente por chegar a uma conclusão”. Todavia, Marx declara que não existe “estrada real para a ciência, e somente aqueles que não temem a fadiga de galgar suas trilhas escarpadas têm a chance de atingir seus cumes luminosos”.
(MARX, 2013, p. 93)
 Dedicado por vários anos aos estudos da economia política, Marx jamais negligenciou a organização dos trabalhadores e o desenvolvimento do capital no mundo, inclusive nos Estados Unidos. Ele nunca deixou de lado as polêmicas, algumas das quais aparecem hoje como mesquinharias, e em tempo algum abdicou de contribuir para que a tarefa de transformar o mundo fosse o mote de todo seu esforço intelectual. Em vista disso, em 1864, com Engels e várias correntes que atuavam no nascente movimento operário de vários países, ajudou a fundar a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), posteriormente chamada de Primeira Internacional.
 Entendendo que caberia aos trabalhadores de todo o mundo (“proletários de todos os países, uni-vos”) organizar a luta para a transformação revolucionária da sociedade, Marx dedicou imenso esforço para dotar a obra que elaborava de uma linguagem que fosse acessível para os trabalhadores. Apesar desse esforço e consciente das dificuldades atinentes aos que se aventurassem em um percurso demasiadamente longo, tortuoso e repleto de conceitos complexos e inúmeras abstrações, no prefácio à edição francesa de O capital, publicada em 1872, Marx advertiu os leitores para o fato de que o método que havia empregado para a análise de assuntos econômicos podia tornar a leitura árdua para o público francês, “sempre impaciente por chegar a uma conclusão”. Todavia, Marx declara que não existe “estrada real para a ciência, e somente aqueles que não temem a fadiga de galgar suas trilhas escarpadas têm a chance de atingir seus cumes luminosos”.
(MARX, 2013, p. 93)
 O capital vem a ser, portanto, a principal obra de Marx, o texto pelo qual o autor ficou conhecido no mundo, para muito além do que sugeria a leitura do Manifesto, um texto mais diretamente político, um apelo para a revolução e a luta, e para muito além do que muitos imaginam ser uma proposta de paraíso consumado num futuro supostamente comunista.
O que mais devemos saber sobre Marx e O capital?
Eis, portanto, a essência do que pode ser chamado de marxismo, uma filosofia que surge de base metafísica hegeliana; logo, transformada em movimento do mundo real e inserida na luta política a partir do socialismo francês. Em seguida, Marx buscou desvelar os mecanismos mais profundos de funcionamento das sociedades em geral e da sociedade burguesa do capital,pela crítica da economia política e pelo desenvolvimento histórico e da luta de classes, com vistas à sua transformação
Parte superior do formulário
1. A construção do pensamento não é um fato, mas um processo. Da mesma forma, conseguimos perceber a formulação do pensamento de Marx em termos filosóficos. A relação correta entre as influências e a construção do pensamento de Marx e Engels está presente na seguinte alternativa:
O Materialismo Histórico é uma deturpação da filosofia marxista, pois pretendia subverter toda a lógica metafísica do conhecimento.
Parte inferior do formulário
Comentário-Parabéns! A alternativa "C" está correta.
 Apesar de não ser um dos textos que, num primeiro momento, geram maior impacto, a obra A ideologia alemã é considerada um ponto de maturação de Marx em sua relação com Engels na construção do pensamento e entendimento da dinâmica da sociedade burguesa.
2. Uma teoria é formulada a partir de trocas e construções. Observando as obras de Marx e seu papel para a formulação de teorias, podemos afirmar que a explicação correta é:
Contribuição à crítica da economia política foi a obra escrita por Engels que introduziu Marx no conhecimento da economia clássica inglesa.
Parte inferior do formulário
Comentário-Parabéns! A alternativa "C" está correta.
 O pensamento de Marx e Engels deve ser fortemente considerado dentro da perspectiva do pensamento hegeliano. O manifesto comunista e O capital são importantes, mas devem ser entendidos como desdobramentos de um processo de construção de uma relevante teoria.
Parte superior do formulário
Parte inferior do formulário
Módulo 2
Identificar aspectos do pensamento marxiano e sua apropriação pelos marxistas clássicos
INTRODUÇÃO
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA: DISPUTA DO PENSAMENTO
MARXISTAS E MARXIANOS
Marxistas
Chamamos de marxistas os autores, militantes, movimentos, intelectuais e outros sujeitos que reivindicam o legado – teórico, prático, político – de Marx e Engels.
Marxianos
Os marxianos, um termo menos comum, são aqueles que, pretendendo evitar o compromisso com pensamentos, práticas e regimes que consideram como algum tipo de corrupção do pensamento original, preferem se vincular diretamente ao que foi produzido por Marx e Engels, negando todas as mediações.
Marxólogos
Um terceiro grupo pode ser adicionado aos dois primeiros, que são os marxólogos, estudiosos da obra marxiana, engelsiana e, eventualmente, de alguns marxistas, que não estabelecem nenhum vínculo de compromisso com nenhum dos dois grupos, pois se preocupam em estudar e conhecer as contribuições dos autores ao pensamento humano.
O legado de Marx e Engels, pela sua dimensão teórica e pelo engajamento político-prático que propuseram, nunca foi de aceitação unânime, como se deve saber. Mesmo entre muitos que consideram impossível pensar o presente e o futuro sem Marx – lembremos as palavras de Derrida –, nem todos pretendiam fazê-lo na perspectiva política sugerida pela obra marxiana e engelsiana em seu conjunto, ou seja, muitos não se empenharam na luta pela superação do capitalismo e pela implantação do socialismo como caminho até a sociedade comunista.
Considerando o próprio raciocínio de Marx, que articulava as forças da necessidade histórica, ou seja, os impulsos do passado que não são dominados pelos agentes humanos, podemos dizer que nem sempre as condições da transformação estiveram dadas. Portanto, trata-se de forças objetivas, combinadas com as forças da vontade, as quais vêm a ser o impulso subjetivo, que, em certas condições, fazem a diferença e interferem nos rumos tomados pelos acontecimentos históricos.
A História não anda sozinha. Quem faz a história são as pessoas. Esses indivíduos possuem necessidades – conscientes ou disfarçadas pela alienação. Então, em toda sociedade, há gente querendo que ela fique como está e outros que querem lutar. A força dos primeiros é de contenção; a força dos segundos, de movimentação. A luta de classes é o motor da História. Tudo o que será feito depende das intenções coletivas de quem promove a luta.
 Então, de forma fácil, podemos afirmar que Marx e Engels sempre estiveram atentos, pois, da mesma maneira que se empenharam em construir organizações para incidir sobre a luta de classes, eram sujeitos ativos, em movimentos políticos mundo afora. Esse ponto é vital. Temos, de um lado, o pragmatismo – que é uma forte característica do Engels, ajudando a exaltar Marx como um grande teórico – defendido pelos autores, o qual mostra que sua teoria é prática, tem sentido, tem execução prática, embora também fosse fácil dizer que não fora feita como deveria, ou que não rompia efetivamente a luta de classes como ele almejava.
O fato é que, durante a vida de Marx, parte substancial das condições para o desenvolvimento eficaz do marxismo no seio do proletariado europeu ainda não havia sido dada.
Depois da morte de Marx, em 1883, coube a Engels difundir seu legado. Marx possuía imensa dificuldade de popularizar suas ideias entre os membros do movimento operário, que seguiam orientações das mais diversas, e, muitas vezes, chegou a recusar o epíteto de “marxista” que seus adversários lhe imputavam. Por não concordar com muitos dos seus seguidores, foi apenas em fins do século XIX que tais ideias começaram a se popularizar.
REVOLUÇÃO RUSSA E O PENSAMENTO DE MARX
 Entender um pouco dessa discussão em solo russo é fundamental para compreender o salto dado pelo pensamento marxiano até o marxismo russo, pois foi com a Revolução Russa, de 1917, que o marxismo se popularizou no mundo.
 Vamos nos ater ao percurso histórico da Rússia que se relaciona com as ideias de Marx.
Interesse de Marx e Engels por questões trabalhistas na Rússia
 Até o início do século XX, ninguém diria que seria a Rússia a primeira nação a abrigar uma revolução inspirada nas ideias de Marx e Engels, já que este país era um dos mais atrasados da Europa. Por conta disso, os fundadores do Materialismo Histórico tinham muitas reservas em relação ao papel desempenhado pela Rússia no que diz respeito à expansão das revoluções burguesas. A partir dos anos 1870, Marx e Engels passam a se interessar pelas questões russas, inicialmente em função dos debates com o anarquista Bakunin, um membro russo que militava na Associação Internacional dos Trabalhadores e, em seguida, pelo contato que vinham travando com vários revolucionários emigrados.
Influências de O capital
 Foi, entretanto, a partir das questões apresentadas a Marx e Engels por narodiniks, os quais haviam tido contato com a obra O capital, que as relações começaram a se estreitar. O que muitos queriam saber era em que medida a frase contida no prefácio à primeira edição de O capital, que dizia que o “país industrialmente mais desenvolvido não faz mais do que mostrar ao menos desenvolvido a imagem do seu próprio futuro” (MARX, 2013, p. 78), podia ser entendida pelo movimento revolucionário de país atrasado, que pretendia superar a autocracia czarista, sem necessariamente criar as condições para a exploração capitalista, como uma determinação absoluta. Seria possível pular a etapa capitalista e passar diretamente ao socialismo na Rússia?
 As respostas, como se supõe, não eram fáceis, mas, ao tentar oferecê-las – provocados pelas informações sobre a movimentação política que vinha da Rússia e, em seguida, do primeiro agrupamento de militantes que neste país reivindicou o marxismo –, podemos, mais uma vez, entender o método marxiano de análise da História.
 Análise de Marx da realidade russa e do apontamento para a necessidade de uma revolução
Depois de receber, em 1881, uma carta da militante Vera Zasulitch, que pertencia a um grupo narodnik chamado Partilha Negra, Marx esboçou uma importante análise da realidade russa, pressupondo que a História avançava nos termos da “Lei do desenvolvimento desigual e combinado”. Isso significava que a Rússia poderia se beneficiar do fato de que as formas de propriedade até então existentes permitiriam “assim se aproveitar dos frutos sem se sujeitarao seu modus operandi”. Marx dizia que a comuna rural russa (mir) podia “tornar-se o ponto de partida direto do sistema econômico para o qual tende a sociedade moderna e trocar de pele sem ter de cometer suicídio”. Porém, para que isso se tornasse possível, seria necessária uma revolução na Rússia e evitar que a comuna fosse destruída pelas formas de produção capitalista que inexoravelmente avançavam (MARX; ENGELS, 2013, p. 100).
Popularização do marxismo pelos grupos revolucionários e por Lênin
 Em todo caso, foi a partir do desenvolvimento dos grupos revolucionários russos que o marxismo se popularizou para além das formas reformistas que tinha adquirido a partir do sucesso parlamentar do SPD alemão. Com efeito, o mais importante discípulo de Marx na Rússia foi Vladmir Ilych Ulianov, mais conhecido como Lênin (1870-1924). Foi Lênin quem adicionou pedras fundamentais no edifício teórico do marxismo. Foram tantas as suas contribuições que, não raro, alguns confundem o marxismo de Lênin com o pensamento marxiano ou o marxismo como um todo.
Lênin
 Lênin não foi só um militante revolucionário, organizador da corrente bolchevique do Partido Operário Socialdemocrata Russo (POSDR), que pavimentou o caminho da tomada do poder em 1917. Foi também um vigoroso intelectual e teórico que formulou a teoria do partido, expressa na obra Que fazer? (1902) e também a teoria do imperialismo, que aparece no livro Imperialismo, fase superior do capitalismo (1916).
Lênin não se limitou a escrever textos diretamente políticos. Seus escritos permanecem inspirando gerações de militantes ou, no mínimo, servindo como material de estudo para se pensar as condições de transformação do capitalismo e também os debates que permearam a crise e dissolução da Segunda Internacional e os impasses da revolução mundial.
Trótski
 Da Rússia, além de Lênin, Trótski, cujo nome verdadeiro era Lev Davidovich Bronstein, também é fundamental para se compreender os caminhos tomados pelo marxismo. Ele foi considerado o arquiteto da revolução. De Trótski, o marxismo conheceu a Teoria da Revolução Permanente, elaborada em 1906, na obra Balanços e perspectivas, depois retomada pelo seu autor, que partiu de uma formulação marxiana para criar uma das mais importantes intepretações do marxismo aplicadas às sociedades atrasadas a partir do uso da “Lei do desenvolvimento desigual e combinado”.
 A vigorosa crítica sociológica ao estamento burocrático, que teria posto fim ao sonho do socialismo na União Soviética sob o stalinismo, inspiração do livro A revolução traída (1937), constitui-se como uma das mais importantes contribuições de Trótski ao marxismo.
 Além das obras citadas, a História da Revolução Russa, publicada em 1930, sobre seu exílio nas ilhas de Prinkipo (ilhas do Príncipe), na Turquia, pode ser apontada como uma contribuição fundamental de Trótski ao pensamento marxista, pois nenhum autor se igualou em precisão, estilo e vigor ao escrever sobre a saga dos revolucionários que tomaram o poder na Rússia, em 1917.
Saiba mais
Saiba mais sobre a relevância de Trótski para o pensamento marxista por intermédio do historiador Isaac Deutscher (1907-1967), autor da mais importante biografia de Trótski.
Comentário
A obra de Trótski, que viveu bem mais que Lênin e passou importante parte da vida perseguido pelo stalinismo, terminou por se abrir a diversas outras fronteiras, pois o revolucionário russo, que aderiu ao bolchevismo tardiamente (em agosto de 1917), enfrentou desafios inimagináveis para muitos dos seus companheiros, que sucumbiram no período da Guerra Civil na Rússia (1918-1921) ou nos primeiros anos da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
ANTONIO GRAMSCI: UM MARXISTA BEM MARXIANO
 Outro intelectual de grande importância no século XX, que desperta até hoje a curiosidade de simpatizantes e adversários do marxismo, o italiano Antonio Gramsci (1891-1937) é detentor de vasta obra, parte substancial dela publicada depois de sua morte.
 Como militante do Partido Socialista Italiano, Gramsci escreveu diversos artigos para periódicos numa conjuntura extremamente conturbada. Era o momento da ascensão do movimento operário no Norte do país, que conformou o chamado biennio rosso (biênio vermelho) entre 1919 e 1921, com círculos operários que sugeriam que uma revolução poderia estar a caminho. Esse movimento foi derrotado em 1922, mesmo ano da ascensão de Benito Mussolini. Dessa atividade jornalística, um importante conjunto de escritos permite entrever um marxismo rico, inspirado no que havia de melhor da tradição socialista italiana, muito embora ainda bastante vinculado à tradição idealista.
 Eleito deputado em 1924 pelo Partido Comunista italiano, que havia sido fundado em 1921, Gramsci foi preso em 1926. Do cárcere, escreveu um projeto que pretendia ser um estudo aprofundado de diversos temas da história italiana, diferentemente dos escritos jornalísticos, os quais considerava que estavam destinados a morrer ao fim do dia.
 Da consecução de seu projeto, que Gramsci chamou de für ewig (do alemão “para sempre”), surgiu um conjunto de 33 cadernos que, depois de publicados, revelaram uma análise marxista original e bastante competente de um intelectual e militante pouco ortodoxo, mas comprometido com a revolução.
 A partir da obra gramsciana podemos identificar estudos sobre temas como hegemonia, revolução passiva, bloco histórico, guerra de movimento/guerra de posição, americanismo e fordismo entre muitos outros assuntos, formando um imenso mosaico que enriqueceu ainda mais o marxismo.
Saiba mais
 Apesar do esforço dos marxistas que dedicaram a vida à revolução, o advento do stalinismo, que dominou a União Soviética desde a derrota da Oposição de Esquerda, em fins dos anos 1920, provocou profundos abalos, cisões e incertezas. Sob a influência dessa corrente, de onde derivou uma doutrina chamada de marxismo-leninismo, adotada oficialmente na URSS e importada por quase todos os partidos comunistas organizados em diversos países do mundo, outra espécie de marxismo emergiu. Com efeito, três anos depois da morte de Josef Stalin (1878-1953), a revelação dos seus crimes através dos famosos relatórios secretos de Nikita Krushev (1894-1971) provocou uma profunda crise no movimento comunista internacional e nos meios marxistas de todo o planeta, determinando a ruptura de militantes, intelectuais e personalidades públicas, muitos dos quais se tornaram, em seguida, adversários ferozes do marxismo.
 Para muito além dos personagens relacionados acima, o marxismo da geração que se seguiu a Marx e Engels ainda contaria com nomes de vulto, que deram importantes contribuições teóricas ao pensamento marxista, como Antonio Labriola (1843-1904), Franz Mehring (1846-1919), Plekhanov (1856-1918), Rosa Luxemburgo (1871-1919), Görgy Lukács (1885-1971), entre muitos outros. A característica essencial dessa geração de marxistas é a de que todos, à maneira dos seus mestres, foram, além de importantes intelectuais, militantes engajados, alguns dos quais dirigiram partidos políticos e morreram lutando pela revolução.
 O pensamento gramsciniano é um diálogo entre a tradição do que acontecia na Rússia e suas influências ocidentais. Gramsci diz que o pensamento deve ser trabalhado e adaptado às concepções presentes – por isso, marxista –, uma vez que defendia que os intelectuais orgânicos, aqueles que permitiam e estruturavam o pensamento reproduzido pelo coletivo, surgiam nos partidos políticos.
 Uma vez conscientes, seria possível o rompimento, pois ambos os lados possuíam seus intelectuais orgânicos, e a luta geraria uma manutenção das estruturas sociais, o que era de interesse dos dominantes. A transformação pode ser feita por uma educação integral, rompendo fundamentos moralistas e religiosos, para a ruptura da alienação com sua vinculação ao todo e ao governo.
MARXISTA OU MARXIANO?
Gramsci representa os aspectos políticos e argumentativos marxistas, mas, ao adaptar essas discussões, retoma conceitos e adaptações que o aproximam deuma perspectiva marxiana.
MARXISMO PARA ALÉM DO MOVIMENTO MILITANTE
 O marxismo não se resumiu apenas ao universo de militantes que animaram partidos e travaram intensos debates por todo o século XX. Como corrente de pensamento, mesmo tendo sido popularizado por partidários de uma causa que era, acima de tudo, político-prática, principalmente revolucionária, mas também reformista, o marxismo atravessou as fronteiras do que era essencialmente a luta por interpretar e transformar o mundo, alcançando com vigor a intelectualidade universitária.
 Portanto, é impossível compreender o século XX negligenciando a força dos debates e das controvérsias que moveram a Filosofia e as Ciências Humanas, influenciadas pelo marxismo, por correntes teóricas que lhe eram hostis, ou também por propostas que promoveram a simbiose da filosofia marxiana com outras filosofias, variadas sociologias e, até mesmo, com a Psicologia e a Psicanálise.
 A propósito do assunto, é impossível ignorar as vastas polêmicas que atravessaram o marxismo do século XX, algo que se deu para muito além dos espaços partidários e diretamente vinculados à luta política. O inquestionável predomínio de certa leitura do marxismo feita pela corrente estruturalista no pós-Segunda Guerra Mundial, muito especialmente pelo filósofo Louis Althusser, só foi confrontada quando o estruturalismo perdeu força e estudiosos, como o historiador Edward Palmer Thompson (1924-1996), defenestraram abordagens que lhe pareciam empobrecedoras e dogmáticas, como as que, segundo este autor, estariam presentes em obras como Ler o capital (1965) e Por Marx, de Althusser (1965).
 Com efeito, A miséria da teoria ou um planetário de erros: uma crítica ao pensamento de Althusser (1978), obra de Thompson, foi avassaladora no que diz respeito à abordagem estruturalista e althusseriana do marxismo, como alguns anos antes foram as denúncias de Krushev sobre os crimes de Stalin. Essas denúncias levaram Thompson a romper com o Partido Comunista da Grã-Bretanha (PCGB), em 1956, sem necessariamente abandonar o marxismo, junto a outros grandes intelectuais que formavam a corrente de historiadores marxistas britânicos.
 Da polêmica que surgiu com a obra de Thompson, que nunca teve uma resposta de Althusser, o também historiador britânico Perry Anderson, na direção de uma das mais importantes revistas marxistas de nosso tempo, a New Left Review, publicou Teoria, política e história: um debate com E. P. Thompson (título da edição brasileira para Arguments within English marxism), em 1980. Anos depois, Ellen Meiksins Wood (1942-2016) dedicou um capítulo do seu livro Democracia contra capitalismo (1995) para apontar o mal-entendido da polêmica e os exageros da recepção da obra de Thompson, que terminaram obscurecendo o lugar de Althusser no interior do marxismo (WOOD, 2011).
 O resultado desse debate e de tantos outros que foram travados contra o marxismo ou no interior desta corrente é prova definitiva de que o Materialismo Histórico continua vivo e influente nos meios intelectuais de todo o mundo.
 Por tudo isso, sem que se diga que as universidades são “antros de marxistas”, algo que está longe de corresponder à verdade, é impossível não enxergar como essa corrente intelectual influenciou e segue influenciando os debates e o desenvolvimento científico de filósofos, historiadores, sociólogos, antropólogos, politólogos, psicólogos e estudiosos de muitas outras áreas pelo mundo afora.
1.Por conta da ação pragmática da teoria marxista, boa parte dos continuadores de sua pesquisa esteve também envolvida em uma forte atuação política e, mesmo entre seus seguidores, houve conflitos. No entanto, isso não retirou a perspectiva de seus desenvolvimentos por esses autores. Para reconhecer a continuidade da teoria, indique a alternativa em que a correta relação é feita:
1. Todo marxismo implica em um compromisso de quem quer qComentário
Parabéns! A alternativa "B" está correta.
 A perspectiva básica entre os autores é um legado em que pensam a tese de Marx como um campo único teórico. Isso é algo impensável, o discurso é livre, construído e reconstruído, o que não é diferente com as teorias do autor. Acontece que essas teorias, na negativa dos seus desenvolvimentos políticos, geraram a defesa de um retorno a uma versão menos impregnada, o que essa dicotomia acaba reforçando.
2. Sobre a continuidade dos estudos de Marx, redirecionamentos e debates de sua teoria, podemos afirmar que:
Comentário
Parabéns! A alternativa "A" está correta.-A atuação política e viva foi a base da continuidade das análises marxistas, passando a ser entendida como aquela que fundamentou os conceitos primordiais, mas as práticas e pragmáticas foram se reassentando em novos campos políticos desenhados a partir de então.
Módulo 3
Relacionar a Escola de Frankfurt e o marxismo
ESCOLA DE FRANKFURT
 Entre as correntes intelectuais mais importantes relacionadas ao marxismo no mundo, a Escola de Frankfurt se destaca por ter oferecido uma crítica consistente da sociedade de consumo, da indústria cultural e das formas assumidas pela modernidade, que ensejaram os mecanismos de dominação social, política e ideológica.
 A Escola de Frankfurt, que teve como berço o Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt, dirigido inicialmente por Carl Grümberg (1861-1940), onde se editava a Revista de Pesquisa Social, cujos colaboradores eram os filósofos Theodor Adorno (1903-1969), Max Horkheimer (1895-1973) e Hebert Marcuse (1898-1979) não chega a ser uma “escola” no sentido literal do termo. Mesmo assim, ela logo se tornou um centro de convergência de intelectuais e teóricos críticos, que usavam o marxismo como um instrumento de intepretação do mundo, de interpretação da cultura e de compreensão.
Em seu contexto, a Escola de Frankfurt, que data de 1924, pode ser entendida como um amplo empreendimento intelectual que, baseado do marxismo, pressupunha uma leitura do mundo sob a ótica da Filosofia, da Sociologia e da Psicanálise, livre das amarras, das ortodoxias e dos compromissos políticos estreitos com os fundadores do Materialismo Histórico e com os personagens políticos, regimes de Estado e partidos que dominavam o movimento comunista internacional.
O MOVIMENTO INTELECTUAL DOS FRANKFURTINIANOS
Os intelectuais frankfurtinianos despontaram para o universo intelectual no momento de derrota da Revolução Alemã (1919, 1921, 1923), da emergência e consolidação do stalinismo na URSS, da ascensão do fascismo na Itália (1922) e do nazismo na Alemanha (1933). Em sua relação com o marxismo, tais fatos foram determinantes para os caminhos que foram seguidos e que implicaram numa adesão repleta de incongruências e idiossincrasias.
O INSTITUTO E SEU PAPEL
Tendo surgido na Alemanha sob a influência dos tumultuados anos seguintes à Primeira Guerra, com a ascensão de Hitler, o Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt teve de se transferir para Genebra, depois para Paris e, finalmente, para Nova Iorque, nos Estados Unidos, onde a revista original passou a ser publicada com o nome de Estudos de Filosofia e Ciências Sociais. Tal percurso não deixou de influenciar os pensadores a ela vinculados. Ao fim da Segunda Guerra Mundial, o Instituto de Pesquisa Social retornou a Frankfurt, com boa parte dos membros da revista que prosseguiram nos seus trabalhos de investigação da Filosofia, da Estética, da cultura e da ideologia, temas que eram pensados a partir da ótica marxiana em diálogo com muitas outras correntes.
ENGAJAMENTO X ACADEMICISMO
Alguns traços presentes nas tradições das correntes marxistas, particularmente importantes para a disseminação e popularização dessa teoria pelo mundo – muito especialmente sob o aspecto do engajamento político de intelectuais em partidos e, a certa altura, da defesa quase que irrestrita da doutrina exarada da União Soviética stalinista entre os membros identificados com a Escola de Frankfurt –, não são observados nessa mesma medida e intensidade. Pelo fato de ter havido entre os frankfurtinianos uma relaçãode aberta recusa de tais compromissos políticos, esses autores eram frequentemente acusados pelos comunistas de não serem marxistas ou de serem intelectuais pequeno-burgueses interessados em suas carreiras acadêmicas.
MARXISMO OCIDENTAL
 De acordo com o historiador Perry Anderson, que compreende a teoria crítica dos frankfurtinianos como parte do que chama de “marxismo ocidental”, “a perda de qualquer contato dinâmico com a prática da classe operária” teria aproximado esses marxistas “de sistemas de pensamentos não marxistas e idealistas contemporâneos, com os quais aquela [teoria] agora evoluía em estreita, ainda que contraditória, simbiose”.
 Segundo este autor, a concentração de intelectuais no campo da filosofia profissional, combinada à descoberta e à edição de escritos marxianos até então desconhecidos – parte deles dos primeiros anos de formação do jovem Marx, estreitamente vinculados ao pensamento hegeliano –, teriam contribuído para uma reinterpretação do Materialismo Histórico com “acentuada predominância do trabalho epistemológico”.
 Tal reinterpretação tinha como foco essencial os problemas do método, vinculados a um “campo substantivo” de aplicação do método voltado para a análise da estética e, finalmente, constatando a introdução de novos temas, até então ausentes do marxismo clássico, que revelavam “um constante pessimismo”, ou seja, o “método como impotência, a arte como consolação, o pessimismo como imobilidade” (1989, p. 127-128).
 A predominância entre os frankfurtinianos de uma separação entre teoria e prática contribuiu para que esses teóricos fossem vistos com desconfiança por militantes dos partidos comunistas e por intelectuais vinculados a essas organizações.
 Esse fato tornou a Escola de Frankfurt impermeável à influência do dogmatismo e do marxismo vulgar. Sob o impacto da experiência traumática da Segunda Guerra Mundial e do holocausto – num contexto de emergência da Guerra Fria e das teorias críticas do totalitarismo, que igualavam as experiências do nazismo e do stalinismo, muito a propósito dos interesses do Departamento de Estado norte-americano –, a alternativa oferecida pelos teóricos de Frankfurt, com sua crítica visceral do capitalismo, da modernidade, do cientificismo, do poder, das ideologias e da indústria cultural, ainda nos marcos de um marxismo que se poderia dizer heterodoxo, correspondeu a um ponto de fuga de doutrinas herméticas que tinham sido testadas por longas décadas e pareciam naufragar sem oferecer alternativas ao capitalismo e às ditaduras da URSS e dos países do Leste Europeu.
WALTER BENJAMIN
 Nesse contexto, a obra de Walter Benjamin (1892-1940), filósofo considerado o membro externo da Escola de Frankfurt, é ilustrativa desse movimento de relação instável e tumultuada com a política, posto que pelo estético, pela cultura e pela crítica da ortodoxia, o autor compôs uma obra rica de nuances e imensas possibilidades. Ao estabelecer seu contato com o marxismo, que era assumido de uma perspectiva judaico-messiânica e também melancólica, Benjamin, que teve um destino trágico ao tentar fugir dos nazistas em 1940, vai ao encontro de uma rica concepção de história, em que o passado não é nunca um dado morto, mas algo que sobrevive nas reminiscências e num permanente refazer-se da memória através de um constante combate dos vencidos pelo direito à voz.
 A obra benjaminiana forma um rico mosaico de temas e escritos que, pela característica fragmentária, depois de se coligir peça a peça, permite entrever quão rica era a sua abordagem, colada a um tempo que viu ascender o nazismo e o stalinismo, mas um tempo que permaneceu prenhe de futuro, como seu anjo descrito no célebre artigo Sobre o conceito de história (1940).
ADORNO E HORKHEIMER: DIALÉTICA DO ESCLARECIMENTO
 Em A dialética do Esclarecimento (1947) (também traduzida como Dialética do Iluminismo), Adorno e Horkheimer ratificam os anseios inscritos nos primeiros estudos do Instituto de Pesquisas Sociais, na década de 1930, mas, ao mesmo tempo, ajustam o programa a uma temporalidade pós-traumática, na qual a ingênua ideia de progresso – subsumida a “um absoluto do resultado sabido do processo total da negação”, o que implicava saber de antemão a “totalidade no sistema e na História” – não seria mais possível (2006, p. 32).
 Foi justamente em relação a essa compreensão de processo e da História que Marx e Engels se desvincularam quando acertaram as contas com a herança hegeliana cem anos antes. Adorno e Horkheimer esperavam reinstituir a crítica radical do culto do progressismo, presente na filosofia hegeliana e no que chamavam de Esclarecimento, que nada mais era do que as formas de iluminismo e racionalismo da ciência, que, de alguma forma, eram parte de um mundo que sucumbiu a uma guerra que quase destruiu a humanidade.
Para Adorno e Horkheimer, contudo, isso não teria ocorrido apenas com sua filosofia como apoteose do pensamento em progresso, mas com o próprio Esclarecimento, entendido como a sobriedade pela qual este acredita distinguir-se de Hegel e da metafísica em geral. O Esclarecimento é totalitário como qualquer outro sistema. Sua inverdade não está naquilo que seus inimigos românticos sempre censuraram: o método analítico, o retorno aos elementos, a decomposição pela reflexão, mas no fato de que, para ele, o processo está decidido de antemão. (2006, p. 32)
 A dialética do esclarecimento não chega a ser uma obra fácil de atravessar. Sua leitura, entretanto, oferece um texto que é essencialmente filosófico e cheio de referências ocultas, o que representa a exata medida de parte do programa que seria incorporado como marcas fundamentais das teorias dos frankfurtinianos, muito especialmente a discussão sobre a indústria cultural, em alternativa crítica ao termo “cultura de massa”, que dava a entender que alguma forma de cultura poderia ser produzida autonomamente pelas massas, e também a crítica ao antissemitismo.
 No que tange aos desdobramentos desses estudos, enquanto Horkheimer permaneceu empenhado em deslindar de um ponto de vista filosófico em o Eclipse da razão (1947), Adorno enveredou pela teoria psicanalítica, muito especialmente por Freud, para entender as razões do antissemitismo e do fascismo que, inclusive, teriam sobrevivido à Segunda Guerra, reaparecendo em sociedades democráticas. Dos estudos desenvolvidos através de um programa coletivo de investigações que tomava o comportamento de cidadãos estadunidenses como foco da análise, surgiu Estudos sobre a personalidade autoritária (1950), obra em que é desenvolvida a “Escala F” (F de Fascismo), que tinha por objetivo “mensurar a personalidade potencialmente antidemocrática” em países tidos por democráticos e modelos civilizacionais. (ADORNO, 2019, p. 135)
HERBERT MARCUSE
 Ao lado dos estudos desenvolvidos por Adorno e Horkheimer, Eros e civilização (1955) e O homem unidimensional (1964), de Herbert Marcuse, além dos trabalhos de Erich Fromm, muito especialmente o Conceito marxista de homem (1961), foram particularmente influentes num contexto em que os movimentos de juventude, que inflexionaram as formas de se perceber e atuar na política, tendo como ponto fulcral o Maio de 1968 francês, buscaram alternativas no interior do pensamento crítico, permanecendo no campo do marxismo.
 Dessa forma, buscando recolocar o homem novamente em contato com sua plenitude existencial – que incluía um resgate do erotismo e uma reconciliação do indivíduo com a sua personalidade narcisista na busca pelo prazer, além de aspectos vinculados à libertação sexual, à contracultura e ao humanismo –os teóricos da Escola de Frankfurt estiveram entre os mais influentes dos movimentos que explodiram nas décadas de 1960 e 1970 pelo mundo.
 Diferentemente dos muitos marxismos que, petrificados nas suas ortodoxias e certezas, foram praticamente esquecidos por um mundo em permanente transformação, o marxismo da Escola de Frankfurt, como alguns outros, permaneceu oferecendo um importante referencial teórico para quem estivessedisposto a pensar (e transformar) o mundo.
1. Marque a alternativa que faz a correta relação entre o marxismo e a Escola de Frankfurt.
Comentário
Parabéns! A alternativa "D" está correta.
 A atualização do marxismo foi um dos termos equivocadamente trabalhados para afirmar a Escola de Frankfurt. Em um momento propício de vários debates teóricos sendo estruturados e reformulados, autores revisitaram as bases do pensamento marxista, trazendo perspectivas que foram deixadas de lado diante do foco no debate político empreendido até então.
2. As afirmativas abaixo explicam as características de alguns membros do movimento de Frankfurt. A correta explicação é:
Comentário
Parabéns! A alternativa "A" está correta.
 Todos são autores, e é normal se confundir um pouco, mas algumas chaves são fundamentais. Por exemplo, a percepção sobre A dialética do Esclarecimento como crítica aos marxistas e a forma como interpretaram as teorias de Marx. Assim, negavam interpretadores e recuperavam a teoria marxista em outro sentido.
IDEALISMO ALEMÃO
 A escola alemã filosófica do século XIX. A crítica ao concreto e o niilismo de Nietzsche e Schopenhauer. A resposta da intelectualidade alemã aos desafios lançados pela modernidade cartesiana/iluminista. Os desdobramentos do idealismo alemão no pensamento do século XX.
PROPÓSITO
Abordar o idealismo alemão a partir de uma perspectiva menos rígida do ponto de vista cronológico e menos dependente das biografias dos “grandes autores”, buscando compreender como o pensamento idealista alemão respondeu aos desafios lançados pela modernidade cartesiana/iluminista.
Módulo 1- Categorizar o idealismo alemão a partir de seu diálogo com a tradição iluminista.
Geralmente, as famílias intelectuais são construções feitas a pos
Nossa discussão está dividida em quatro partes: em primeiro lugar, nós nos esforçamos em traçar um panorama do idealismo alemão, reconstruindo seus conceitos fundamentais e entendendo suas respostas aos dilemas colocados pela modernidade cartesiana/iluminista. Depois, verificamos como Arthur Schopenhauer (1788-1860) e Friedrich Nietzsche (1844-1900) mobilizaram as ideias-chave do idealismo alemão em função de uma apreciação filosófica niilista.
Em seguida, debruçamo-nos sobre o trabalho de Franz Kafka (1882-1924), tentando entender a presença dos conceitos idealistas na sua obra literária. Por último, abordamos a atualização do pensamento idealista na contemporaneidade, dando especial atenção aos escritos de Freud (1856-1939) e ao ambiente intelectual que alguns chamam de “pós-modernidade”.
A MODERNIDADE ILUMINISTA E O IDEALISMO ALEMÃO: NOTAS PRELIMINARES
O filósofo norte-americano Josiah Royce é autor de um estudo considerado incontornável sobre o idealismo alemão. Para Royce, ele se constitui como corrente de pensamento entre a publicação do livro, em 1781, Crítica à razão pura, texto mais conhecido da obra de Kant, e a morte de Hegel, em 1831.
Desde o século XVI, vinha se processando na Europa uma mudança epistemológica estrutural que alguns autores costumam chamar de “revolução cartesiana”.
Conheça alguns aspectos dessa revolução:
COGNIÇÃO HUMANA
Essa mudança implodiu o preceito epistemológico medieval segundo o qual o conhecimento humano era sempre incompleto e lacunar, cabendo apenas a Deus o conhecimento total e perfeito. A modernidade cartesiana/iluminista acabou com a limitação preliminar que a episteme medieval impunha à cognição humana.
INSUFICIÊNCIA METODOLÓGICA
A partir de agora, qualquer eventual incapacidade de conhecimento se justifica pela insuficiência metodológica, e não pelo mistério divino. Hume confronta exatamente essa ambição cognitiva iluminista. Seu ceticismo, portanto, assume a forma de uma advertência que destaca os limites cognitivos humanos.
CETICISMO HUMANO
Ao negar a certeza iluminista, Hume não está negando completamente toda possibilidade de conhecimento. Ele chama a atenção para o fato de que todo conhecimento possui uma dimensão de probabilidade, pois a própria inteligência humana é incapaz de alcançar o conhecimento perfeitamente verdadeiro. Kant se apropriou do ceticismo humano para formular as bases da corrente de pensamento que seria conhecida como idealismo alemão. 
A CRÍTICA À RAZÃO PURA DE KANT: O EVENTO FILOSÓFICO FUNDADOR DO IDEALISMO ALEMÃO
Uma das principais características do pensamento filosófico é a abstração, o que, muitas vezes, dificulta nossa compreensão. Uma solução para tornar o texto filosófico mais compreensível é reconstruir a concretude das experiências que lhe deram vida em seu contexto social original. No que se refere ao pensamento de Kant, foi fundamental a leitura dos textos de Hume. Foi no ato de leitura e apropriação do ceticismo de Hume que Kant construiu as formulações que, mais tarde, inspirariam outros autores que passariam a ser reconhecidos como representantes do idealismo alemão. No tratado Os prolegômenos a toda metafísica futura, publicado em 1883, Kant vê o conceito humano de “causa” como um “bastardo da imaginação”, como filho ilegítimo da cognição moderna, que, na contramão das inclinações metafísicas, tão caras ao Iluminismo, apelou para a experiência como instância mediadora do conhecimento. Ao fazê-lo, Hume, segundo Kant, apresentou colaboração imprescindível para o mesmo pensamento moderno, apresentando uma espécie de regulação capaz de mitigar os exageros da imaginação metafísica, demonstrando que a razão não pode pensar a priori a partir de conceitos de relação causa e efeito (MONTEIRO, 1993).
Immanuel Kant
Nas palavras do próprio Kant:
Hume demonstrou de forma irrefutável, e ousada, que a razão não opera de maneira completamente independente das circunstâncias, interrompendo, assim, o dogmatismo inerte e dando uma direção completamente diferente às minhas pesquisas no campo da filosofia especulativa.
(KANT, 2012, p. 56)
Ao questionar o procedimento dedutivo do Iluminismo francês, Hume abriu caminhos para a legitimação de um procedimento indutivo que, ressonado por Kant, iria tornar-se fundamental para o pensamento moderno. Dedução significa elaborar uma teoria do plano da imaginação, ou da “metafísica pura”, como diria Kant, e aplicá-la ao “mundo fenomênico”, ao plano das coisas concretas. Na avaliação de Hume, endossada por Kant, o Iluminismo francês é exclusivamente dedutivo e, por isso, frágil. Já o procedimento indutivo opera pela via contrária. O plano fenomênico é tratado como a base apriorística incontornável para a elaboração metafísica. Em termos mais simples e diretos: somente é possível teorizar depois de um cuidadoso exame da realidade concreta. Não se trata de negar a elaboração metafísica, mas condicioná-la à experiência, não a considerando um fim em si, como exercício de pura especulação. Esse é o fio central da filosofia de Kant, sendo o fundamento argumentativo das suas principais obras, A crítica à razão pura e a Metafísica dos costumes, publicadas, respectivamente, em 1781 e 1785. Nos dois textos, fica bem clara a impossibilidade, para Kant, de um conhecimento a priori¸ produzido pela pura razão, uma metafísica completamente independente dos costumes.
Reflita!- Se não há dúvidas de que o empirismo de Hume é matriz filosófica importante para Kant e para o idealismo alemão, estaríamos equivocados se acreditássemos que a apropriação kantiana de Hume foi apenas elogiosa?
Diante dessa reflexão, pode-se dizer que as críticas de Kant a Hume são tão importantes para o posterior desenvolvimento do idealismo alemão quanto os elogios (DUDLEY, 2007). O núcleo da discordância está no conceito humeniano de “causa”. Levando o empirismo às últimas consequências, Hume, na percepção de Kant, possui uma relação um tanto ingênua e de fetiche com a experiência, como se ela pudesse se dar em estado puro, involuntariamente de qualquer elaboração conceitual prévia.
[...] Perder-se-ia completamente o tal conceito de causa, se quisesse derivá-lo, como Hume o fez, de uma frequente associação daquilo que acontece com aquilo que o antecede e do hábito daí decorrente de conectarrepresentações. Ao invés disso, o mais correto seria formular um conceito a priori capaz de iluminar as experiências, não necessariamente enquadrando-as em uma rigidez conceitual metafisica, mas, ciente da artificialidade cognitiva da elaboração intelectual, trata o conceito com via essencial, e irremediável, de acesso à experiência.
(KANT, 2011, p. 43)
Kant se apropria do empirismo humeano, pois vê um caminho crítico ideal para confrontar a “metafísica pura” do Iluminismo francês, que “trata a realidade como se fosse mera equação matemática, matéria a ser enquadrada, e violada, pela razão” (KANT, 2011, p. 42). É exatamente esse esforço de Kant em encontrar um meio-termo entre a “razão pura” do Iluminismo francês e a ortodoxia empirista humeana, entre a pura abstração e a total rejeição da teorização, que se tornou o fio condutor da tradição de pensamento que hoje chamamos de “idealismo alemão”, podendo ser encontrado também nos textos de outros de seus principais representantes: Fichte, Hegel e Schelling. É sobre esses autores que nos debruçamos a seguir.
FICHTE, LEITOR DE KANT
Trinta anos mais jovem que Kant, Johann Fichte tinha à sua disposição a obra daquele que é considerado o pai do idealismo alemão. É importante analisar com atenção a leitura que Fichte fez de Kant, para que consigamos entender os desdobramentos do idealismo alemão para além da crítica kantiana.
O problema da subjetividade cognoscente é central no pensamento filosófico moderno, que está fundamentado no esforço de compreender as condições humanas, da subjetividade humana, de conhecimento da realidade. A filosofia moderna, portanto, não trata a subjetividade como mero ponto de partida para o conhecimento, mas está preocupada com seus dispositivos próprios, com suas estruturas internas.
Como se constrói o sujeito do conhecimento? Como o sujeito do conhecimento tenta conhecer a realidade?
Os filósofos modernos apresentaram diversas possibilidades de solução para o problema, e é aqui que podemos identificar o diálogo de Fichte com a obra de Kant (ROCKMORE, 2013).
Como já sabemos, Kant se apropriou parcialmente do ceticismo de Hume ao afirmar que a experiência é o ponto de partida para a produção de todo conhecimento. Não existiria, então, segundo Kant, um estado racional puro, imune a qualquer influência ordinária, no qual o sujeito cognoscente pudesse se inserir para pensar a realidade idealmente. O que existe, para Kant, são homens no mundo, representando a si mesmos nos seus esforços de representação da realidade.
Para ser mais claro: o sujeito se constrói como sujeito de conhecimento ao longo de sua vida, sensibilizado pelas experiências que marcam sua trajetória. Ao produzir conhecimento, o sujeito representa a realidade observada e o repertório de experiencias que o constitui. O conhecimento, então, é duplamente representacional. Fichte se apropria, também parcialmente, da elaboração kantiana nos seus principais textos: os livros Sobre o espírito e a letrada na filosofia e a Doutrina da Ciência, publicados, respectivamente, em 1794 e 1795.
O conceito de estado de ação é fundamental na teoria fichteana, que é, ao mesmo tempo, tributária e crítica à discussão kantiana. É tributária porque Fichte também nega o idealismo puro do Iluminismo francês, que supõe a existência de ideias desencarnadas, sem sujeitos.
Conheça a diferença entre o sujeito na teoria desses filósofos:
O sujeito kantiano é resultado do acúmulo de experiências.
FICHTE
Já o sujeito fichteano é o resultado da ação epistemológica original, do momento em que o sujeito, conscientemente, transforma-se em sujeito de conhecimento. 
Pensemos em um filósofo imaginário de 30 anos, filho de uma família rica e educado nas melhores escolas e universidades.
Para Kant, todas as experiências desse filósofo são determinantes para o tipo de filosofia que ele produz: sua infância, os professores que teve, suas frustrações afetivas que se mantêm ativas no plano da inconsciência. Ao produzir sua filosofia, o filósofo representa a si mesmo, entendido como o conjunto de suas experiências. O conhecimento produzido, portanto, é duplamente representacional: representa a realidade analisada e o sujeito, entendido como subjetividade formada por um amplo repertório de experiências. São essas experiências que formam a ideia através da qual o sujeito se debruça sobre a realidade.
Já para Fichte, o conhecimento que o filósofo hipotético produz somente é afetado pelas experiências vividas durante a racionalização epistêmica. Ou seja, não importam as escolas onde o filósofo estudou, seu ambiente familiar, suas viagens, suas emoções de infância e sua juventude. Importa apenas o momento em que ele, descobrindo-se como filósofo, debruça-se sobre determinada realidade. É esse momento que Fichte chama de “estado de ação”, quando o sujeito toma conhecimento de sua tomada de posição como sujeito do conhecimento.
Como podemos perceber, Kant e Fichte rejeitam a metafísica pura, que supõe a possibilidade de ideias autônomas, desencarnadas. Ambos chamam atenção para o fato de que as ideias só existem a partir da ação subjetiva.
A FILOSOFIA DA NATUREZA E DA RELIGIÃO DE SCHELLING
Vamos entender o que é chamado de natureza. Se Fichte e Kant estavam especialmente preocupados com a subjetividade cognoscente, Schelling está preocupado com o objeto dessa subjetividade, aquilo que ele chama de natureza. O projeto da filosofia de Schelling era corrigir a dicotomia entre natureza e espírito, o que teria sido o principal erro da modernidade filosófica inaugurada por Descartes. O pensamento cartesiano partia da premissa de que o conhecimento era construído a partir de um corte vertical que separava sujeito e objeto, espírito e natureza.
A partir daí, o sujeito faria uma intervenção metodológica sobre o objeto, sendo conhecimento produzido derivado do método. O objeto, a natureza, não faz outra coisa a não ser se deixar explorar, sendo que Descartes não reconhecia a possibilidade de a natureza não se deixar explorar. Na episteme cartesiana, a natureza, o objeto, é sempre passivo. É isso que Schelling critica. Nessa crítica, está a originalidade de sua obra. (COELHO, 2018)
Para Schelling, o significado de natureza não consiste, necessariamente, em florestas, mares, fauna e flora. Natureza é toda a realidade que se torna algo da intervenção filosófica. Esse foi o argumento que Schelling desenvolveu nos livros Ideias para a filosofia da natureza e Da alma e do mundo, publicados, em 1797 e 1798.
A partir do momento em que o ser humano coloca a si mesmo em oposição com o mundo exterior, é dado o primeiro passo para a filosofia. Com esta separação, começa pela primeira vez a racionalização; a partir daí, o ser humano separa aquilo que a natureza uniu para sempre, ele separa o objeto da intuição, os conceitos da imagem, e, por fim, ele mesmo de si mesmo. Esse foi o primeiro ato de decadência moral da humanidade, impulsionada pela tentativa pretenciosa de domesticar a natureza, como se houvesse nela razão própria e indomesticável. A natureza não é um mero produto de uma criação inconcebível, ela é, ao contrário, esta própria criação. Não é uma aparição ou revelação do eterno. Ela é, ao mesmo tempo, esse próprio eterno. (SCHELLING, 2010, p. 48)
Para Schelling, o pensamento cartesiano é o responsável pela “primeira decadência moral” da humanidade, pois acreditou ser possível separar radicalmente espírito (sujeito cognoscente) e natureza (objeto), tornando a natureza objeto a ser livremente manipulado pelo espírito. A natureza seria a não razão, a total ausência de sentido, enquanto o espírito seria o monopolizador da razão. Schelling questiona o argumento cartesiano em dois aspectos: primeiro, no que se refere à real possibilidade de separar o espírito e natureza, sujeito e objeto. Depois, em relação à premissa de que a natureza, objeto, é passiva e não interfere no conhecimento produzido sobre ela mesma. Segundo Schelling, a natureza e o espírito, sujeito e objeto, são inseparáveis. Ao tentar entender a realidade, o sujeitojá está sob a ação da própria realidade. A realidade, para ele, é a potência organizadora da vida, autoridade reguladora de toda possibilidade de conhecimento. Por isso, a pretensão cartesiana de um sujeito cognoscente descolado da natureza seria não apenas pretensiosa, mas tola.
Vale ressaltar que há certa dimensão teológica na filosofia da natureza de Schelling, pois “natureza”, no limite, é Deus. Porém, Schelling tem concepção de divindade bastante diferente do monoteísmo característico, por exemplo, do cristianismo (COELHO, 2018). Trata-se de uma divindade panteísta, segundo a qual Deus está presente em todas as coisas.
A forma “inata” da manifestação de Deus no mundo é a natureza, que é independente da consciência humana. A inteligência humana fica plenamente livre quando toma consciência da presença de Deus em todas as coisas. É exatamente a comunhão com a presença divina que permite ao homem, segundo Schelling, conhecer as coisas do mundo. As religiões seriam as formas através das quais os homens tentam tomar consciência da presença de Deus em todas as coisas. É assim que a filosofia da natureza toca na filosofia da religião (COELHO, 2018).
Podemos perceber, nos escritos de Schelling, a preocupação em demonstrar que o processo de construção de conhecimento não é ideal, ou seja, não se dá através da manifestação de uma metafísica pura e desencarnada. Kant e Fichte apresentaram esse argumento priorizando a análise do sujeito (espírito). Schelling tomou outro caminho, destacando a racionalidade intrínseca ao objeto (natureza). Vejamos, a seguir, como Hegel se inseriu nessa discussão.
HEGEL, A FENOMENOLOGIA DO ESPÍRITO E A FILOSOFIA DO DIREITO
Há relativo consenso nos manuais de história da filosofia a afirmação de que Hegel é o grande representante do idealismo alemão, o autor que melhor teria sistematizado as diretrizes gerais dessa forma de pensamento. Entre tantos outros, por que Hegel é visto como o principal idealista alemão? A resposta pode estar no hercúleo esforço de Hegel em ler e se apropriar daquilo que os outros idealistas escreveram. Entre os idealistas alemães, nenhum foi tão disciplinado na leitura e na interlocução com seus pares como Hegel (KERVERGAN, 2007).
A interlocução de Hegel com os outros idealistas fica muito clara, por exemplo, no seu conceito de “realidade como espírito”, desenvolvido a partir da leitura dos textos de Fichte e Schelling. Na esteira dos outros, Hegel também criticou a dicotomia cartesiana espírito versus natureza/sujeito versus objeto, atribuindo racionalidade própria à natureza e capacidade de agência sobre o conhecimento produzido sobre ela.
Friedrich Hegel
Tal como Schelling, Hegel define a natureza em perspectiva panteísta. A natureza está em todos os lugares, até mesmo no espírito, entranhada na subjetividade cognoscente. Entender a realidade como espírito, de acordo com a filosofia de Hegel, é entendê-la não apenas como substância, mas também como sujeito. Isso significa pensar a realidade como processo, como movimento, não somente como coisa (substância). Como já sabemos, essa é a contribuição de Schelling. Hegel dá um passo adiante ao elaborar metodologicamente como deveria se dar essa relação do espírito com a natureza.
TESE
A tese, em que o sujeito cognoscente experimenta a natureza e faz uma afirmação (não apenas observa, como reza a cartilha cartesiana).
ANTÍTESE
A própria realidade reage, pois, no processo epistemológico hegeliano (diferente do processo cartesiano), ela não é passiva naquilo que Hegel chama de antítese.
SÍNTESE
Dessa forma, processo cognitivo, portanto, na perspectiva hegeliana, é marcado pela relação tensa e complementar entre sujeito e objeto, entre espírito e natureza, concluindo a crítica ao cogito cartesiano e à metafísica pura do Iluminismo francês, que caracterizam o idealismo alemão (KERVERGAN, 2007).
A partir da próxima seção, começaremos a estudar os desdobramentos das teses do idealismo alemão nas gerações posteriores aos primeiros idealistas. É na recepção dessas teses que essa tradição foi sendo criada, a ponto de, hoje, ser lição obrigatória em todo o estudo sobre a história da filosofia moderna. Veremos como Arthur Schopenhauer (1788-1860) e Friedrich Nietzsche (1844-1900) se apropriaram do núcleo duro do pensamento idealista alemão para desenvolverem uma abordagem filosófica que, posteriormente, seria conhecida como “niilista”.
1. A modernidade iluminista é marcada por um sentimento hegemônico que pode ser encontrado nos escritos de autores como Marquês de Condorcet, Voltaire e Diderot. Assinale, entre as alternativas abaixo, aquela que melhor define esse sentimento hegemônico.
A-O sentimento hegemônico no Iluminismo foi a melancolia, pois os pensadores iluministas estavam convencidos de que a Idade Média havia sido o apogeu do progresso humano.
B-O sentimento hegemônico no Iluminismo foi a nostalgia, pois os pensadores iluministas estavam convencidos de que a Antiguidade havia sido o apogeu do progresso humano, um legado considerado irrecuperável.
C-O sentimento hegemônico do Iluminismo foi a religião, pois os pensadores iluministas estavam convencidos de que o catolicismo medieval era o apogeu da cultura humana e, por isso, deveria ser preservado.
D-O sentimento hegemônico no Iluminismo foi o otimismo, pois os pensadores iluministas estavam convencidos de que viviam um momento de aceleração a história rumo ao progresso.
Comentário- A alternativa "D" está correta.
O Iluminismo foi marcado por um ambiente de intenso desenvolvimento tecnológico e ampliação das fronteiras europeias, o que fez com que a intelectualidade da época tendesse a verbalizar um sentimento de otimismo e crença no potencial da razão científica em conduzir o progresso da humanidade.
2. O pensamento filosófico de David Hume é marcado pelo ceticismo. Assinale a alternativa que melhor define o ceticismo de Hume.
A)O ceticismo de Hume tinha a religião católica como alvo, o que nos permite dizer que se relaciona ao ateísmo do autor.
B)O ceticismo de Hume tinha a crença iluminista no potencial emancipatório da razão como algo, o que nos permite dizer que se relaciona a um projeto filosófico e político de esvaziamento da hegemonia iluminista.
C)O ceticismo de Hume tinha dimensão política e defendia a ideia de que a monarquia era incapaz de garantir a paz social, devendo, por isso, ser substituída pela democracia.
D)O ceticismo de Hume tinha dimensão cultural e questionava a capacidade da civilização ocidental em instaurar a paz universal.
Comentário-  A alternativa "B" está correta.
Hume questionou a ambição cognitiva característica do pensamento iluminista, afirmando a dimensão de probabilidade que caracteriza todo saber.
MÓDULO 2- Expressar as teses do idealismo alemão
no niilismo de Schopenhauer e Nietzsche.
TESES DO IDEALISMO ALEMÃO E O NIILISMO
Como vimos, na sua origem, com Kant, Fichte, Schelling e Hegel, o idealismo alemão não era exatamente uma corrente de pensamento, mas um conjunto de respostas às questões postas pela modernidade cartesiana/iluminista, especialmente a dicotomia cartesiana sujeito versus objeto e a crença iluminista na possibilidade de uma racionalidade pura e emancipatória. Enquanto ali, por meados do século XVIII, a modernidade hegemônica francesa prometia progresso e o império da razão, alguns alemães desconfiavam e formulavam um idealismo alternativo. Essa crítica chegou ao século XIX, sendo radicalizada por escritores como Schopenhauer e Nietzsche.
Atenção
Vale a pena pensar sobre o termo niilismo e justificarmos sua escolha. Sua definição em dicionários diversos, de língua a filosóficos, sempre trata da ideia de aniquilar, destruir, apagar. Niilismo é um conceito filosófico que remete à formulação do mundo contemporâneo, que buscou intensamente romper com a naturalização de valores tidos como componentes do ser (valores morais), das verdades do mundo, dos exercícios de verdade.
Niilismo é o exercício do nada, da marcha para o abismo, não à toa vinculado ao pessimismo. Falar de niilismo é falar em Nietzsche

Continue navegando