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Colica Renal Fonte: Dr. Arnaldo e Medcurso Introdução A nefrolitíase acomete até 3% da população e até 12% da população durante a vida. Possui recorrência de 50% em 10 anos, portanto, é uma doença crônica que deve ser devidamente controlada. Acomete mais homens, entre 20-40 anos, em regiões de clima quente ou pessoas que trabalham em locais de temperatura mais alta (relação direta com desidratação crônica). Sua mortalidade é rara, mas sua deterioração renal chega a cerca de 28%. Fatores de risco: História pessoal de nefrolitíase; História familiar de nefrolitíase; Baixa ingesta hídrica; Urina ácida (como acontece na vigência de resistência à insulina, obesidade, diabetes mellitus tipo 2, diarreia crônica); História de gota; Hipertensão arterial sistêmica; Cirurgia bariátrica; Uso prolongado de certos medicamentos (ex.: indinavir em adultos e ceftriaxone em crianças); Infecção urinária crônica ou recorrente. Principais composições químicas: Oxalato de cálcio (70-80%): radiopaco, relacionado a hipocalciúria de cálcio idiopática, deficiência de citrato de sódio, desidratação; Fosfato amônio de magnésio - estruvita (15- 20%): é chamado de cálculo infeccioso, pois só se desenvolve na presença de bactérias produtoras de uréase na urina. Portanto, está relacionado com a ITU crônica e formação de cálculos coraliformes, que são radiopacos. Ácido úrico (5-10%): relacionado com os indivíduos que possuem hiperuricemia, deficiência de xantino oxidase, Cistina: doença genética e raro; Antirretrovirais (indinavir): formação de um único cálculo, radiotransparente na TC. Patogênese Existem condições em que há supersaturação do solúvel (hiperexcreção de solutos, volume urinário reduzido, alterações do pH e deficiência dos inibidores da cristalização) e consequente precipitação de substâncias, agregação destas em cristais e formação dos cálculos. Alterações anatômicas facilitam a formação de cálculos ao produzirem estase urinária, por exemplo: duplicidade pielocalicial, rim esponjoso medular, rim em ferradura, ureterocele etc. Também podemos ter um corpo estranho que faz com que haja essa formação de cálculos. O primeiro pré-requisito para a formação de cristais urinários é a Supersaturação. Dizemos que a urina está supersaturada de algum sal, quando o produto da concentração de seus componentes individuais está acima de um determinado valor. Este produto sofre influência do pH urinário: pH > 7,0 (alcalino) favorece a supersaturação do fosfato de cálcio (apatita) e do fosfato de amônio magnesiano (estruvita), pH urinário < 5,0 (ácido) reduz a solubilidade do ácido úrico e da cistina. A solubilidade do oxalato de cálcio não é afetada pelo pH urinário. Manifestações clínicas A dor típica dos cálculos urinários é decorrente de sua mobilização, o que produz graus variáveis de obstrução ao fluxo de urina. Sendo assim, cálculos grandes, porém imóveis, podem cursar de modo assintomático até crescerem a ponto de causar obstrução. Algumas pessoas podem eliminar pequenas concreções arenosas com quase nenhuma dor, enquanto outras podem apresentar sintomas graves de obstrução ureteral, determinando uma clássica síndrome clínica conhecida como “cólica nefrética”. Os cálculos renais costumam obstruir o sistema coletor em três pontos principais, conhecidos como pontos de constricção fisiológica do ureter: (1) junção ureteropélvica – mais comum; (2) terço médio do ureter (cruzamento com os vasos ilíacos internos); (3) junção vesicureteral. o Localização: lombar/flanco. o Irradiação: fossa ilíaca, região inguinal e órgãos genitais externos – cálculo vai descendo para o ureter distal –. o Caráter: em cólica (distensão da cápsula) o Início: súbito/agudo o Intensidade: forte o Fator desencadeando: Nenhum o Fatores agravantes: nenhum o Fatores atenuantes: nenhum (sem posição antálgica). o Sintomas associados: reflexo vagal (hipotensão postural, náuseas e vômitos), STUI (micro- hematúria, polaciúria e disúria), abdominais (distensão, constipação e dor à palpação profunda na fossa ilíaca). o Duração: variada. Tempo de eliminação do cálculo: < 0,4 mm: 1 semana 04-06 mm: 2 semanas Até 1 cm: 3 semanas ou não expulsa. Fase aguda (primeiras 12 horas) O paciente sente dor pela obstrução aguda e distensão da cápsula renal. Além disso, no momento da cólica nefrética, há liberação aumentada de PGEF2, que vasodilata a arteríola aferente, aumentando o fluxo sanguíneo, aumentando a diurese, elevando a pressão piélica e ureteral e mais dor ainda. A partir disso, há aumento da atividade da musculatura lisa ureteral, inibição da síntese de ADH e aumento da diurese, que perpetuam a dor nas primeiras horas. 2 horas iniciais Aumento da pressão piélica e fluxo sanguíneo renal. 6-24 horas A pressão piélica permanece elevada, mas com diminuição do fluxo renal. Após 24 horas A pressão piélica tende a reduzir em relação a inicial, mais ainda permanece elevada e o fluxo sanguíneo renal continua diminuindo. Se persistindo, a obstrução pode levar a isquemia renal. A localização da dor se relaciona com a topografia do cálculo impactado: Junção ureteropélvica: dor em flanco e sinal de Giordano precocemente positivo. Próximo à porção média do ureter: dor abdominal com irradiação para o ligamento inguinal e/ou testículo/grande lábio ipsilateral. Junção vesicureteral: podem ser confundidos com cistite bacteriana, cursando com disúria, polaciúria, urgência e dor uretral (no homem: dor peniana). Pode ou não haver sinal de Giordano. Outras manifestações clínicas Hematúria o A hematúria é detectada em 90% dos pacientes que apresentam cálculo renal. Algumas vezes, pode ser o único sinal da nefrolitíase. Infecção renal o A infecção renal (pielonefrite) é a complicação mais temível da litíase com cálculo impactado no ureter. o Estes pacientes evoluem com febre alta, calafrios e leucocitose com desvio à esquerda, achados não esperados na ureterolitíase per se. o Por ser uma pielonefrite complicada (“infecção fechada”), a sepse costuma ser intensa e de rápida instalação, cursando com bacteremia. o Se o rim infectado não for logo desobstruído existe grande chance daquele rim ser rapidamente destruído (em questão de dias) num processo conhecido como pionefrose. Obstrução o Quando o cálculo impacta no ureter, geralmente causa uma obstrução apenas parcial. Eventualmente, contudo, a obstrução pode ser total, acarretando hidronefrose progressiva e perda do parênquima renal (semanas a meses se não houver infecção), caso a obstrução não seja desfeita. Nefrocalcinose o Uma forma de apresentação da litíase por fosfato de cálcio (apatita) é a nefrocalcinose, definida como uma calcificação do parênquima renal com deposição de cristais difusamente sobre as papilas renais. Cálculos coraliformes o São cálculos geralmente assintomáticos que crescem de modo a ocupar quase toda a pelve e cálices renais. o Eles são mais comumente formados por estruvita (fosfato de amônio magnesiano), porém, podem ser de cistina ou ácido úrico. o Tais cálculos se associam a um mau prognóstico do rim acometido (degeneração parenquimatosa) e sempre indicam terapia intervencionista, mesmo quando não produzem sintomas. Diagnóstico A suspeita de nefrolitíase, na prática, deve sempre ser formulada diante de três apresentações clínicas típicas: (a) síndrome de “cólica nefrética”; (b) hidronefrose; e (c) hematúria. Os diagnósticos diferenciais que mais se confundem com cólica nefrética são o aneurisma de aorta abdominal em expansão, a apendicite e a diverticulite aguda, a pielonefrite, a cistite bacteriana (cálculo passando pelo ureter distal) e o infartorenal (oclusão aguda de artéria renal). Exames de imagem USG de vias urinárias UroTC helicoidal multislice sem contraste: exame padrão ouro. Exames complementares Hemograma: saber se há infecção PCR: saber se há infecção Ureia: saber se há IRA ou IRC agudizada Creatinina: saber se há IRA ou IRC agudizada EAS: o exame de urina pode eventualmente confundir o diagnóstico, pois alguns casos de aneurisma em expansão ou apendicite aguda PODEM cursar com hematúria, devido à irritação ureteral direta. A presença de cristais urinários (cristalúria) não garante o diagnóstico de litíase, uma vez que pode ocorrer em pessoas normais, não formadoras de cálculo. Urocultura com antibiograma Qual é a composição do cálculo? A melhor forma de acessar a composição de um cálculo é através de sua análise direta. O portador de nefrolitíase deve ser orientado – durante o período de crise – a FILTRAR A URINA. A urina também deve ser avaliada do ponto de vista microbiológico (urinocultura) e ter seu pH anotado. Tratamento clínico AINE É a primeira opção, de preferência por vai oral, porém em casos de dor severa ou vômitos, indica-se a via parenteral. Pode ser iniciado em jovens, com função renal normal. Antiespasmódicos: pode ser associado aos AINE, como escopolamina + dipirona. Opióides: paciente refratário aos AINE’s. Anti heméticos Hidratação mínima é mais eficaz do que hidratação vigorosa. Esta última deve ser instituída quando for necessário corrigir um quadro de franca desidratação bem como quando houver indicação de analgesia parental. Terapia expulsiva = AINE + alfabloqueador: Indicada para aumentar a taxa de eliminação de cálculos ureterais distais de até 6 mm. → Aumentam a chance de eliminação do cálculo ureteral distal em 30-65%. Pacientes com cálculos ureterais pequenos (≤ 10 mm), cujos sintomas conseguem ser bem controlados e que não apresentam indicações formais para uma abordagem urológica imediata (ex.: sepse, IRA – ver adiante), podem tentar a TME por um período de até 4-6 semanas. Alfa bloqueador: tansulosina 0,4 mg e doxazosina 4 mg. Também pode ser utilizado bloqueadores de canais de cálcio. Durante a TME devemos reavaliar o paciente (ex.: USG após 7-14 dias), a fim de verificar se houve migração do cálculo. Quando o cálculo – mesmo pequeno – não for expelido no prazo de quatro a seis semanas, uma abordagem intervencionista deverá ser programada. Dissolução química do cálculo O único cálculo comprovadamente passível de ser “dissolvido” é o de ácido úrico. → Alcalinização urinária com bicarbonato VO. Uma dissolução completa e em curto prazo é um desfecho incomum, e por isso as estratégias de dissolução química são pouco empregadas na atualidade. Intervenção cirúrgica Acima de 5 mm a probabilidade de eliminação espontânea diminui de forma progressiva, sendo extremamente baixa com cálculos maiores do que 10 mm. Desse modo, no tocante às dimensões do cálculo, o “ponto de corte” atualmente aceito pela literatura para indicar uma abordagem intervencionista precoce é > 10 mm. Indicações para cirurgia de urgência o Dor refratária à terapia clínica: fez AINE, opioide, antiespasmódico e não resolveu. o Vômitos incoercíveis: possibilidade de distúrbios hidroeletrolíticos. o ITU: pielonefrite complicada, com risco maior de sepse. o IRA o Cálculos ureterais > 1 cm (às vezes até > 7 mm já tem baixa probabilidade de resolução com terapia medicamentosa. o Cálculo impactado há > 4 semanas: risco de estenose de ureter e de hidronefrose. o Cálculo bilateral ou rim único: risco de IRA dialítica. o Preferência do paciente Escolhas da modalidade cirúrgica Características do cálculo a serem analisadas o Densidade o Localização o Tamanho o Espessura do tecido adiposo Litotripsia extracorpórea por ondas de choque: localização do cálculo → onda de choque → fragmentação do cálculo → Migração de microcálculos pelo ureter Cálculos renais ou ureterais proximais Tamanho < 2 cm Densidade < 1000 UH Pacientes não obesos (distância cálculo-pele < 10 cm) Esses pacientes podem sentir cólica renal nesse procedimento, por isso podemos receitar alfa- bloqueadores para após a cirurgia. Não fazer em: gestantes, ITU, sintomáticos, urgência, anticoagulados, DPOC, HAS descompensada. A LOCE é menos eficaz (e por isso não deve ser indicada) nas seguintes situações: (1) cálculos > 20 mm; (2) cálculos localizados no pólo inferior do rim; (3) cálculos “duros”, como os de cistina. Complicações: hematúria macroscópica, hematoma renal, rua de cálculos (obstrução por microcálculos), atrofia renal, sepse, lesão de órgãos adjacentes. Ureteroliotripsia rígida Cálculos ureterais em terços medial e distal; Tamanho < 2 cm; Complicações: perfuração ureteral, falso trajeto, sangramento, avulsão do ureter (< 0,5%), sepse (0,3-1%), estenose ureteral (0-4%). Ureterorrenolitotripsia flexível É o método de escolha para a retirada dos cálculos impactados em ureter distal. É o tratamento de segunda escolha para cálculos renais ou ureterais proximais. Tamanho < 2 cm Densidade > 1000 UH Distância cálculo a pele > 10 cm Nefrolitotripsia percutânea Incapacidade de usar o ureter Cálculos renais > 2 cm Principalmente cálculos coraliformes: devem ser inicialmente submetidos à nefrolitotomia percutânea. Complicações: sangramento, fístula renocutânea, lesão de pulmão ou pleura, perfuração de cólon (mais grave de todas, com possibilidade de peritonite fecal), perfuração de fígado ou baço. Tratamento da litíase complicada Litíase complicada = um cálculo obstrutivo se associa à infecção renal (pielonefrite) ou quando sobrevém insuficiência renal aguda pós-renal, por obstrução ureteral total bilateral ou em rim único. Em tais casos, a primeira preocupação não deve ser retirar o cálculo, mas sim desobstruir a via urinária, a fim de evitar a evolução para perda irreversível do parênquima. Para desobstruir o rim acometido, dois procedimentos emergenciais podem ser usados: (1) Nefrostomia percutânea (cateter “único-J”); (2) Stent ureteral (cateter “duplo-J”).
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