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DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 1 ............................................................................................................................ 6 Apresentação .................................................................................................. 8 Aula 1: Cultura da Interface ............................................................................................................................. 8 Introdução .............................................................................................................................. 10 Conteúdo História da interface ........................................................................................................ 10 História da interface ........................................................................................................ 10 Início da era dos computadores ................................................................................... 11 Graphic user interface .................................................................................................... 12 Mapeamento de bits ........................................................................................................ 12 Cultura digital ................................................................................................................... 13 Espaço-informação ......................................................................................................... 13 Elementos WIMP .............................................................................................................. 14 Profundidade da interface e a criação de ambientes ............................................... 15 Excesso de informação ................................................................................................... 16 Espaço simbólico ............................................................................................................. 16 Macintosh x PC ................................................................................................................. 17 A ação na inferface .......................................................................................................... 18 Organização do espaço-informação ........................................................................... 19 Tipos de ação na interface ............................................................................................. 19 Movimento ........................................................................................................................ 20 Círculo de feedbacks ....................................................................................................... 20 Reconhecimento e manipulação ................................................................................. 21 Affordances ....................................................................................................................... 22 Interfaces gráficas digitais .............................................................................................. 22 Atividade proposta .......................................................................................................... 23 ....................................................................................................................... 24 Aprenda Mais ........................................................................................................................... 25 Referências ......................................................................................................... 26 Exercícios de fixação Chaves de resposta ..................................................................................................................... 33 ......................................................................... 36 Aula 2: Interação e comunicação digital ........................................................................................................................... 36 Introdução .............................................................................................................................. 38 Conteúdo Interatividade: além do senso comum ........................................................................ 38 DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 2 Poder sobre a experiência .............................................................................................. 38 Níveis de interatividade .................................................................................................. 39 Web 2.0 .............................................................................................................................. 40 Interatividade .................................................................................................................... 41 A importância de ser programável ............................................................................... 42 Natureza específica da interação digital ..................................................................... 43 Ferramenta expressiva .................................................................................................... 44 INTERFACE COMO ELEMENTO DA LINGUAGEM DIGITAL ..................................... 45 PROGRAMABILIDADE ...................................................................................................... 45 Linguagem da nova mídia ............................................................................................. 46 CINCO PRINCIPIOS DE MANOVICH ............................................................................ 46 Representação numérica e modularidade.................................................................. 47 Representação da imagem ............................................................................................ 48 Modularidade .................................................................................................................... 48 Automação e variabilidade ............................................................................................ 49 Variabilidade ..................................................................................................................... 50 Estrutura complexa da mídia digital............................................................................. 50 Atividade proposta .......................................................................................................... 51 ........................................................................................................................... 52 Referências ......................................................................................................... 53 Exercícios de fixação Chaves de resposta ..................................................................................................................... 60 ..................................................................... 63 Aula 3: Interfaces, criatividade e inovação ........................................................................................................................... 63 Introdução .............................................................................................................................. 64 Conteúdo Transcodificação: o acesso à informação na rede ................................................... 64 Princípios de Manovich .................................................................................................. 64 Código e linguagem ........................................................................................................ 65 Hipermídia e hipertexto .................................................................................................. 65 Hiperlinks ...........................................................................................................................66 Rede de Bolter .................................................................................................................. 67 Armazenamento .............................................................................................................. 67 Produção de conteúdo ................................................................................................... 68 Emergência ....................................................................................................................... 69 O comportamento da informação na rede ................................................................ 70 Protocolos de transferência ........................................................................................... 70 Comunicação digital ....................................................................................................... 71 DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 3 Atividade proposta .......................................................................................................... 72 ......................................................................................................... 74 Exercícios de fixação Chaves de resposta ..................................................................................................................... 82 ......................................................................................... 85 Aula 4: Interface, técnica e arte ........................................................................................................................... 85 Introdução .............................................................................................................................. 87 Conteúdo O que a interface esconde? ........................................................................................... 87 Influência da mídia impressa na linguagem da interface ........................................ 89 Influência do cinema na linguagem da interface...................................................... 91 Metáfora da interface ...................................................................................................... 92 Representação e controle .............................................................................................. 94 Arte digital ......................................................................................................................... 96 Internet das Coisas .......................................................................................................... 98 Atividade proposta .......................................................................................................... 98 ......................................................................................................................... 100 Referências ....................................................................................................... 101 Exercícios de fixação Notas ......................................................................................................................................... 105 Chaves de resposta ................................................................................................................... 106 ................................................................... 108 Aula 5: Interfaces, criatividade e inovação ......................................................................................................................... 108 Introdução ............................................................................................................................ 110 Conteúdo Conceituando criatividade e inovação ...................................................................... 110 Criatividade no contexto digital .................................................................................. 111 Elementos lúdicos em interfaces gráficas ................................................................ 112 Lazer e trabalho ............................................................................................................. 113 Occulus Rift ..................................................................................................................... 114 De onde vem a inovação ............................................................................................. 115 Tokens ............................................................................................................................. 116 Formação e crescimento das grandes civilizações ................................................. 117 De onde vem a inovação: O império Romano ............................................................ 118 O escrutínio do olho ..................................................................................................... 120 Fronteiras borradas ........................................................................................................ 122 Atividade proposta ........................................................................................................ 123 ......................................................................................................................... 124 Referências ....................................................................................................... 125 Exercícios de fixação Notas ......................................................................................................................................... 129 DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 4 Chaves de resposta ................................................................................................................... 129 ......................................................................................... 131 Aula 6: Experiência do usuário ......................................................................................................................... 131 Introdução ............................................................................................................................ 133 Conteúdo Comunicação através da interação ........................................................................... 133 Contracultura ................................................................................................................. 134 Trabalho com hardware ............................................................................................... 135 Evolução Apple .............................................................................................................. 136 O processo evolutivo da interação gráfica ............................................................... 136 Affordances: possibilidades de interação.................................................................. 137 Ambiente ......................................................................................................................... 138 Alteração do homem no ambiente natural .............................................................. 139 A “linguagem” das novas mídias ................................................................................. 140 Ambientes digitais ......................................................................................................... 142 O mapeamento de bits ................................................................................................. 143 Termo affordance na interação humano-computador ......................................... 144 Affordances presentes no ambiente digital .............................................................. 144 Affordances na rede ...................................................................................................... 145 Compartilhamento de dados ...................................................................................... 147 Case: Facebook ..............................................................................................................149 Mídias sociais .................................................................................................................. 149 Affordance social ........................................................................................................... 150 Atividade proposta ........................................................................................................ 151 ......................................................................................................................... 152 Referências ....................................................................................................... 153 Exercícios de fixação Chaves de resposta ................................................................................................................... 156 .................................................................................. 158 Aula 7: Arquitetura da informação ......................................................................................................................... 158 Introdução Interface eficiente vs interface amigável .................................................................. 160 O usuário e a interface ................................................................................................. 160 Usabilidade ...................................................................................................................... 162 Norma ISO/IEC 9126-1 .................................................................................................. 163 Participação ativa do usuário ...................................................................................... 163 Dimensão ergonômica ................................................................................................. 164 Surgimento da ergonomia ........................................................................................... 164 Modelos mentais ............................................................................................................ 166 DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 5 Tipos de cognição ......................................................................................................... 168 Acessibilidade ................................................................................................................. 170 Atividade proposta ........................................................................................................ 171 ......................................................................................................................... 173 Referências ....................................................................................................... 174 Exercícios de fixação Chaves de resposta ................................................................................................................... 178 ..................................................................................... 180 Aula 8: Visualidade da interação ......................................................................................................................... 180 Introdução ............................................................................................................................ 182 Conteúdo Teoria das cores ............................................................................................................. 182 A percepção da cor ....................................................................................................... 183 Psicologia da cor ............................................................................................................ 184 Tipografia ........................................................................................................................ 188 O advento do computador .......................................................................................... 190 Metáforas visuais ............................................................................................................ 191 Atividade proposta ........................................................................................................ 193 ......................................................................................................................... 194 Referências ....................................................................................................... 195 Exercícios de fixação Chaves de resposta ................................................................................................................... 199 ........................................................................................................................... 201 Conteudista DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 6 Esta disciplina tem como objeto de trabalho o processo de comunicação entre humanos e computadores. Parte-se de um estudo dos conceitos de interação e interatividade, de modo a pensa-los além do senso comum. Os computadores e suas propriedades de expressão serão abordadas para definir o que entendemos como “interface digital”. A partir de exemplos concretos, objetiva-se dar ao aluno conhecimento com o qual possa repensar de forma criativa a nossa relação com os sistemas digitais e as possibilidades que emergem deste encontro. Entendemos que os computadores fazem emergir um novo tipo de linguagem: a linguagem da interação. O começo da discussão será centrado no conceito de interação e interatividade, uma das propriedades mais comumente atribuídas aos ambientes digitais. Analisaremos os principais componentes da interface digital, que se mostram presentes em todos os aparatos eletrônicos que usamos nos dia-a-dia. Isso nos levará a entender os usos destes conceitos em áreas diversas, como arte, aplicativos, redes sociais e games. Entendemos os computadores como elementos importantes na cultura e no dia- a-dia contemporâneo. Essa influência é ainda mais acentuada no trabalho de quem lida com comunicação. Repensar os conceitos que rodeiam o tema, nunca deixando de observar a realidade concreta, é fundamental para despertar a inovação que essa mídia permite. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 7 Sendo assim, essa disciplina tem como objetivos: 1. Conceituar interação, interatividade e interface, a partir da observação de casos concretos. 2. Definir como a comunicação funciona nos ambientes digitais, a partir da análise de suas propriedades únicas. 3. Demonstrar o funcionamento dos conceitos estudados em áreas distintas, procurando ampliar a compreensão da capacidade comunicacional das interfaces digitais. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 8 Introdução Quando ouvimos a palavra “interface”, as imagens que saltam ao pensamento são, provavelmente, semelhantes à área de trabalho do nosso computador e aos botões que podem ser ativados na tela de um aplicativo de celular. Nesse sentido, a interface digital é o que se posiciona entre homem e máquina fazendo papel de tradutora, possibilitando o entendimento do funcionamento de aparelhos digitais. Essa função é essencial na comunicação contemporânea, e para conferir esse fato basta observar o uso de smartphones, tablets e outros sistemas eletrônicos. A concepção de interface, no entanto, ganha uma amplitude ainda mais significativa, se analisamos suas implicações com mais cuidado. Redes sociais, videogames, celulares e tablets possuem uma enorme quantidade de objetos programados e funções executáveis e oferecem possibilidades infindáveis de uso, que são reinventadas a cada minuto. Nesse contexto, as tecnologias de comunicação se tornam ambientes digitais que possuem capacidades expressivas. Hoje, podemos entender as interfaces digitais não apenas como mediadoras, mas como ambientes complexos. Desse modo, como podemos dar início a uma compreensãodos elementos básicos da interface e de como ela os usa para comunicar possibilidades de ação e, posteriormente, configurar um ambiente digital no qual podemos nos expressar culturalmente? DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 9 Objetivo: 1. Apresentar o conceito de interface gráfica digital como uma forma de expressão originada ao longo da história dos computadores; 2. Analisar os diferentes elementos que compõem a linguagem da interface gráfica, mostrando como criam desde ferramentas até ambientes culturais. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 10 Conteúdo História da interface Por já ser algo tão corriqueiro na vida da maioria das pessoas interagir com aparelhos eletrônicos, atualmente, é difícil parar para pensarmos nas etapas que precisaram ser cumpridas para chegarmos a esse ponto. O primeiro objetivo desta aula é observarmos brevemente a história do desenvolvimento de interfaces digitais, mostrando como cada momento da sua evolução introduziu novas características que hoje tornam possível atuarmos em uma cultura da interface. Que estamos rodeados de computadores de diversos formatos (smartphones, tablets, notebooks e desktops) é algo fácil de notar; já afirmar que esses objetos ultrapassam a condição de meras ferramentas para tornarem-se verdadeiros agentes que definem nossa cultura é um movimento mais ousado. Como é possível comprovar isso na realidade? História da interface Por já ser algo tão corriqueiro na vida da maioria das pessoas interagir com aparelhos eletrônicos, atualmente, é difícil parar para pensarmos nas etapas que precisaram ser cumpridas para chegarmos a esse ponto. O primeiro objetivo desta aula é observarmos brevemente a história do desenvolvimento de interfaces digitais, mostrando como cada momento da sua evolução introduziu novas características que hoje tornam possível atuarmos em uma cultura da interface. Que estamos rodeados de computadores de diversos formatos (smartphones, tablets, notebooks e desktops) é algo fácil de notar; já afirmar que esses objetos ultrapassam a condição de meras ferramentas para tornarem-se DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 11 verdadeiros agentes que definem nossa cultura é um movimento mais ousado. Como é possível comprovar isso na realidade? Início da era dos computadores Como ponto de partida, podemos nos localizar na era pré-interface gráfica, quando os computadores ainda estavam nos seus primeiros anos de existência. O matemático Alan Turing, um dos inventores da computação moderna, por exemplo, girava e apertava botões diretamente ligados aos circuitos dos enormes computadores que operava. Na Segunda Guerra Mundial, o cientista usou essa tecnologia para decifrar códigos alemães. Turing podia alterar o funcionamento dos circuitos e ver o resultado de sua ação em tempo real, sem abstrações como textos, cursores, entre outros. Para conseguir interagir com um computador nesse nível, porém, era preciso compreender sua arquitetura, as cadeias de correntes elétricas e as operações complexas que elas executavam. Ao longo das décadas de 1950 e 1960, usuários menos capacitados podiam interagir com computadores por meio de “linhas de comando”. Bastava digitar os códigos no teclado e esperar a máquina processar os dados de acordo com a ordem expressada. Ao mesmo tempo que esse modelo de interface tornava as coisas um pouco mais fáceis, ele possuía a desvantagem de não exibir seus resultados diretamente ao usuário. Era preciso digitar, por exemplo “apagar arquivo 1”, apertar enter e esperar o computador terminar a execução da ordem. As linhas de comando eram eficientes para processar e armazenar dados e funções que potencializaram as aplicações práticas dos computadores. Elas também viriam a ser usadas em videogames baseados em texto, como Colossal Cave Adventure (1977) e Zork (1979). Esses jogos tentavam simular um ambiente imaginário por meio de letras, nos quais o jogador orientava DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 12 personagens através de comandos como “ir para o leste”, “pegar chave”, entre outros. Os jogos de texto fizeram enorme sucesso nas décadas de 1970 e 1980 e estabeleceram códigos próprios de interação. Segundo Michael Nietsche (2008), porém, uma interface em que informações visuais transmitem as possibilidades de ação em tempo real são mais acessíveis. Elas permitem aos jogadores “interagir com o botão de um elevador dentro do espaço virtual de Counter- Strike”, por exemplo, sem precisar compreender códigos mais complexos, como os comandos utilizados em Zork e outros jogos textuais. Graphic user interface A passagem das linhas de comando para a GUI (graphic user interface) estendeu esse efeito para todas as outras aplicações computacionais. Nos videogames, isso é claramente visto com a adaptação de Colossal Cave Adventure para o Atari 2600. O jogo Adventure (1979) traduziu os textos e comandos do seu antecessor para espaços navegáveis através do joystick. Dragões e chaves apareciam como desenhos reconhecíveis, e seus movimentos e ações eram acompanhados diretamente, sem a necessidade de executar um comando por vez. Nos computadores pessoais, o mesmo ocorreu: o primeiro mouse, projetado por Douglas Engelbart, passeava pela tela do display transformando os dados que habitavam o disco rígido do computador em um espaço simulado. Mapeamento de bits Isso funcionava segundo um sistema de “mapeamento de bits”, desenvolvido por Engelbart com o propósito de vincular os pixels dos monitores às informações guardadas na máquina. Assim começava a nascer uma nova linguagem de interação, assimilável com muito mais facilidade, além de oferecer oportunidades novas para a expressão e criação por meio dos computadores (JOHNSON, 2001). DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 13 Quando ocorria um movimento do mouse para a direita, o cursor imediatamente obedecia. Quem usava o mouse podia ver o resultado de sua manipulação imediatamente, o que causava a ilusão de que não havia um intermediário entre homem e máquina: o usuário sentia que estava manipulando os dados diretamente, assim como Alan Turing – mesmo que essa “mágica” fosse obra de um truque de programação. Cultura digital Esse primeiro momento da interface gráfica, embora simples, foi o estopim para a constituição de uma cultura digital abrangente e criativa. Segundo Steven Johnson, embora Engelbart não tenha sido o primeiro a tentar exibir imagens por meio de computadores, ele foi o pioneiro na tentativa de traduzir as informações binárias em um espaço-informação. A diferença da linguagem visual para a linguagem da interface, portanto, está nas informações e dados que cada interface manipula. As imagens e os textos são importantes, sem dúvida, mas as funções que eles executam são tão importantes quanto. Na primeira demonstração do uso de mouse, Douglas Engelbart demonstrou este primeiro passo: o mouse trafegava pelo espaço e permitia clicar em hiperlinks de texto que levavam a um gráfico ilustrativo. Espaço-informação Sendo assim, esse primeiro elemento da interface, o espaço-informação, poderia ser pensado como uma espécie de palco que viria a ser preenchido com outras funções. Na primeira demonstração de Douglas Engelbart, podemos ver, por exemplo, o cientista clicando em hiperlinks que levam a novos espaços com outras informações. O espaço-informação, a partir daí, foi constantemente aprimorado, e desses momentos podemos destacar alguns mais significativos. Um centro de pesquisa financiado pela Xerox, o Palo Alto Research Center, lançou, em 1973, um dos primeiros computadores para uso individual, o Xerox Alto. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS14 Ele contava com uma interface gráfica para ser usada com mouse e inaugurou o sistema de interfaces para computadores pessoais usado até hoje. Mais tarde, esse sistema seria conhecido como WIMP: “windows, icons, menus and pointer” (janelas, ícones, menus e ponteiro). Esses elementos podem ser pensados como uma espécie de sintaxe ou gramática das interfaces gráficas. Em outras palavras, são formas de comunicar possibilidades de ação por meio de uma representação espacial, visual e de movimento. Elementos WIMP (imagem representativa do WIMP) É possível encarar o WIMP como uma sistematização do que Steven Johnson chama de metáforas visuais. Se o espaço pelo qual o mouse trafega é o palco, as metáforas visuais seriam os atores da peça. A diferença é que cada metáfora visual, como ícones, por exemplo, pelo menos nesse momento, não atuavam, e sim ofereciam possibilidades de ação aos usuários. Metáforas visuais, portanto, fazem uso da linguagem cotidiana para nos comunicar ações possíveis de serem executadas pelo sistema do computador: armazenar arquivos, escrever textos, “fechar janelas” etc. Para fins didáticos, DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 15 podemos eleger essas metáforas como o segundo elemento básico da linguagem da interface gráfica digital. Interface gráfica da área de trabalho do Macintosh (1980). Os elementos WIMP, nessa interface, já eram muito semelhantes na sua configuração às aplicações contemporâneas. Tanto por parte das interfaces baseadas em Linux, quanto as da Microsoft e da Apple. Atores importantes contribuíram para a solidificação desse sistema de interface realizando melhorias aqui e ali e desenvolvendo novas funções, articuladas pelo espaço-informação. Podemos destacar a linhagem dos primeiros microcomputadores da Apple, do Apple II, passando pelo Apple Lisa até o primeiro Macintosh. A Apple, sob o comando da dupla Steve Wozniak e Steve Jobs, teve importante papel na popularização das interfaces baseadas em linguagem gráfica. Logo a IBM entrou na disputa com a Apple, com preços mais competitivos. O mercado rapidamente seria dominado pelos computadores pessoais (PC). As interfaces gráficas WIMP são os nossos canais de comunicação para lidar com esses sistemas. Profundidade da interface e a criação de ambientes No entanto, seguindo a hipótese de Steven Johnson (2001), precisamos pensar a interface não apenas como uma facilitadora de tarefas corriqueiras como armazenar documentos, por exemplo. A interface gráfica digital torna-se, para o autor, aquilo que dispara uma mudança que gera uma nova categoria cultural. Como isso acontece? Johnson defende sua proposta com uma análise do romance e da TV e como esses representam a vida cotidiana nos séculos XIX e XX, respectivamente. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 16 Excesso de informação As mudanças da Revolução Industrial foram capturadas em romances como os de Charles Dickens. O rádio, a TV e o cinema transmitiram ao público as narrativas que exploravam a modernização ocorrida no século XX. Na sociedade pós-moderna do final do século XX e do início do século XXI, o tema a ser representado é o excesso de informação. A interface faria o papel duplo de facilitar nosso tráfego em meio a esse mar de dados, ao mesmo tempo que mapeia nossa vida e a representa nas telas dos aparatos digitais. Todos os campos da vida cotidiana são representados e vivenciados na interface: trabalho, lazer, amor, amizade etc. É possível, portanto, perceber a diferença entre guardar um arquivo e criar ambientes culturais computacionais. As interfaces traduzem a linguagem computacional para a linguagem cotidiana (KITTLER, 1995). A linguagem computacional é feita de processos elétricos e dados binários (bits). O mapeamento de bits permite dar forma a esses dados. Por exemplo, pode-se criar imagens e movimentá-las, deletá-las, armazená-las etc. Espaço simbólico O próximo passo é compreender como as interfaces gráficas conseguem simular um espaço simbólico que se expande para além da tela de um monitor. A tela de um celular, por exemplo, é muito menor do que a quantidade de dados que ela pode mostrar com seus pixels. Para podermos exibir vários dados e selecionar quais queremos ver (e quando), a interface cria uma dimensão de profundidade para sua linguagem. Propomos esse como o terceiro elemento da linguagem da interface. A área de trabalho (ou desktop) nasceu de uma inovação de Alan Kay, no Xerox PARC, que criou um espaço permanente no qual diversas aplicações apareceriam e poderiam ser substituídas por outras. Segundo Steven Johnson, essa inovação dá ao computador mais do que espacialidade: ela traz profundidade. Quando minimizamos um arquivo PDF e abrimos um vídeo, DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 17 estamos sendo agentes de uma metáfora: seria como guardar uma folha de papel na gaveta e pegar uma outra para ler. Assim, o que podemos ver no monitor é apenas o que está na nossa frente naquela hora: o espaço profundo da interface se amplia para além da tela e para o que está “atrás”, guardado na memória interna do disco rígido. Os designers de interface possuem a intrigante tarefa de comunicar formas de se locomover por esse espaço profundo, por meio de ações que devem ser facilitadas pela organização do espaço em si. Johnson compara esse trabalho com o da arquitetura: quando escolhe as posições das saídas e escadas em um edifício, o arquiteto possui um objetivo em mente. Em um prédio residencial, essas posições serão diferentes de como seriam em um shopping; enquanto um prioriza elementos de praticidade cotidiana, o segundo leva em conta a necessidade de fazer o cliente caminhar em volta do shopping por mais tempo a fim de, obviamente, maximizar as chances de o seu usuário comprar algo. De forma semelhante, Alan Kay introduziu a metáfora do desktop de modo a facilitar a vida dos usuários de computadores, quando esses realizassem tarefas simples. E sua inovação foi aperfeiçoada em diferentes frentes com diferentes efeitos. A batalha de sistemas operacionais travada pela Microsoft e pela Apple, por exemplo, sugere como duas interfaces podem produzir atitudes culturais distintas a partir de suas organizações espaciais e das informações que elas veiculam ao usuário. Macintosh x PC Depois do Macintosh, lançado em 1984, a interface gráfica dos computadores da Apple prezaram pela fluidez nessa comunicação, enquanto os PCs ainda conservavam a herança das linhas de comando e dos códigos mais complexos. Daí nasceu a visão, não necessariamente correta, de que a Apple priorizava o trabalho artístico e visual nas suas aplicações. Essa visão ignora o fato de que a criação de imagens pode servir não necessariamente como fim, mas como meio de comunicação com o usuário. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 18 Como a introdução de uma dimensão de profundidade produz uma linguagem que cria ambientes? Vamos expandir o que entendemos por ambiente no restante da Aula; por enquanto, podemos dizer que as interfaces, através da sua profundidade, podem ser mais do que ferramentas para produzir resultados pragmáticos. Elas servem como lugares de expressão, de vivência e experiência. A internet torna isso evidente quando une pessoas através de seus ambientes digitais, mas mesmo um computador na década de 1980 servia como ambiente de criação e manifestação da cultura da época. A ação na inferface A comunicação através de metáforas visuais é uma linguagem complexa e ainda em desenvolvimento, sujeita a falhas de experimentação por parte de quem a usa. Steven Johnson ressalta os exemplos do Microsoft Bob e o Magic Cap, aplicações que levaram ao extremo a premissa de “imitar” o mundo real. Observe: Telas da interface Magic Cap. Existe uma diferençafundamental entre essas interfaces e a interface WIMP do Macintosh: as janelas do Macintosh não possuem as mesmas propriedades das janelas de uma casa real. A diferença entre a janela do Macintosh e a janela “de verdade” é o que torna a metáfora efetiva: a metáfora vincula um processo da vida concreta (cada janela exibe uma paisagem) a um processo digital (abrir uma janela para ver um editor de texto ou outra janela para ver um editor de imagens, por exemplo). Cada janela da interface exibe uma aplicação. Mas essas “janelas” podem ser movidas, minimizadas e encerradas, ações impossíveis com uma janela “de verdade”. Tela da interface do Microsoft Bob. O Microsoft Bob e o Magic Cap ignoravam essa diferença necessária entre o que a metáfora visual “imita” e o que ela executa de fato. Eles criaram simulações de salas de trabalho, e não metáforas. O espaço-informação de uma área de trabalho não deve se aproximar totalmente da experiência de uma sala DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 19 de trabalho convencional. As duas aplicações tentaram simular processos cotidianos no computador, possibilitando experiências familiares, mas que, assim como no cotidiano, podem facilmente tornarem-se tediosas e difíceis. O que os designers dessas ferramentas ignoraram é que a tecnologia digital permite eliminar pequenos tédios e dificuldades, guardando apenas o familiar e a necessidade. Organização do espaço-informação A organização do espaço-informação é um processo que depende diretamente da ação que o usuário faz dele. Sendo assim, é importante reconhecer as unidades fundamentais da interface e quais espécies de espaço-informação podem ser construídos com diferentes combinações de metáforas visuais. Igualmente importante é saber que tipos de ações os usuários desempenham. Podemos reduzir as ações dos usuários a algumas categorias básicas, seja uma interface complexa, como a de um jogo eletrônico ou software de edição de vídeo ou uma interface mais simples, como a de um site corporativo,. A primeira pista é o conceito de mapeamento de bits desenvolvido por Douglas Engelbart. Para Steven Johnson, relacionar os dados do computador a uma lógica espacial cria uma metáfora visual. A pesquisadora Katheryn Hayles (1999) leva essa forma de pensar a outro nível. Descrevendo a experiência de navegar em um espaço simulado digitalmente, a autora diz que “as fronteiras relevantes são definidas menos pela pele e mais pelo círculo de feedbacks que conecta corpo e simulação, em um circuito integrado de forma biotecnológica”. Tipos de ação na interface Que tipo de ação podemos exercer nessas interfaces? Obviamente, as mais variadas possíveis. Como dito anteriormente, porém, vamos começar das mais simples. Se pensarmos as interfaces como ambientes digitais, precisamos de mecanismos para explorar esses ambientes. Para entender como a exploração acontece, é possível recorrer à pesquisa de Hans Moravec (1988). Trabalhando com robótica no MIT, esse cientista percebeu que jamais conseguiríamos criar DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 20 robôs inteligentes e racionais se nem ao menos sabemos programá-los para executar tarefas aparentemente simples, como abrir portas ou diferenciar uma fruta de uma granada de mão. Moravec percebeu que o comportamento exploratório é presente na natureza e executado pelos animais mais primitivos. A partir disso, seu grupo no MIT começou a tentar simular esse comportamento em robôs. O que isso pode ter a ver com interface? Hans Moravec dividiu as ações básicas da exploração de ambientes, e é justamente isso que nos pode ser útil para pensar o mesmo tipo de comportamento nos ambientes simulados pelas interfaces gráficas. Movimento A primeira habilidade que compõe o comportamento exploratório é o movimento. Moravec mostrou que a inteligência animal só pôde se desenvolver graças ao movimento. Seres vivos que não possuem essa capacidade, como as árvores, não desenvolveram qualquer coisa que possamos chamar de inteligência. Mobilidade nos permite chegar a espaços com informações novas, que por suas vezes podem nos nutrir de forma positiva ou negativa. Só com o movimento podemos chegar às fontes de diferença necessárias para a realização de tarefas novas. Círculo de feedbacks A pista que o mapeamento de bits nos dá é que o movimento também foi a primeira habilidade desenvolvida na cultura da interface, com o mouse de Engelbart. Não é à toa que Steven Johnson elegeu esse como o momento inaugural da cultura da interface: ele é o primeiro passo para a constituição de ambientes digitais. O círculo de feedbacks (HAYLES, 1999) entre um ser humano, o mouse, o computador e a tela produziram a capacidade de representar a movimentação e a locomoção, as habilidades mais básicas e fundamentais da cultura da interface. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 21 Porém, não se pode parar aqui. O movimento puro e simples só é funcional se aplicado de forma sistemática. É preciso ter alguma ideia de onde queremos chegar, o que queremos achar e como faremos pra voltar para o lugar de onde saímos. A habilidade de construir relações entre diferentes pontos do espaço é a navegação. Navegar significa coordenar o próprio movimento para evitar ameaças, otimizar o trajeto e as ações que se precisa realizar no caminho. Obviamente não é coincidência que o verbo “navegar” é usado frequentemente para se referir à experiência de agir na internet. E também não é coincidência que muitos sites, há alguns anos, possuíam “mapas” que esquematizavam as conexões entre as páginas, com a meta de facilitar o uso. Hoje a maioria das interfaces procura construir esse mapa de forma intuitiva; elas são planejadas de modo a permitir que os usuários identifiquem as possibilidades de ação imediatamente e possam fazer o que desejam da forma mais fluida. Cada função de uma interface se posiciona em pontos do espaço- informação. Portanto, a capacidade de fazer com que o usuário ache e execute uma função de forma “intuitiva” é construir mecanismos de navegação (mesmo que sutis), ou seja, mecanismos que o ajudem a construir um plano de movimento e ação no ambiente. Reconhecimento e manipulação As últimas habilidades identificadas por Moravec na prática da exploração são o reconhecimento e a manipulação. Logicamente, mais do que nos movimentar e navegar, geramos mudanças nas interfaces com as quais interagimos. É assim que criamos cadeias de feedbacks que nos permitem entender como elas funcionam e agir novamente para ver e criar coisas novas. A manipulação, porém, exige antes o reconhecimento de funções. Outra tarefa importante do designer de interface, portanto, é mostrar ao usuário o que é possível fazer naquele ambiente. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 22 Novamente, a raiz desse processo está no mundo concreto. O psicólogo James J. Gibson (1986) já havia demonstrado, em sua pesquisa sobre a percepção visual, que um ambiente nos informa a todo momento o que podemos fazer nele. O chão possibilita sustentação, e uma árvore informa que podemos descansar sob a sua sombra. Essas possibilidades são diferentes para cada organismo: um pássaro enxerga em uma árvore a possibilidade de pousar ou construir um ninho, e a água possibilita sustentação a certos insetos, mas não a seres humanos. Affordances Gibson deu o nome de affordances às possibilidades de ação que cada elemento do ambiente informa a cada organismo. Esse conceito serviu perfeitamente aos designers, já que seu trabalho é justamente possibilitar, através da forma dada a objetos, um certo tipo de ação possível. Nesse sentido, por mais que não pensemos nisso imediatamente, cada objeto do dia a dia, desde maçanetas até portas de emergência, é pensado com o objetivo de comunicar e possibilitar seususos desejáveis através de sua forma, cor, peso, textura etc. (NORMAN, 1990; 1999). Esses atributos são concebidos com um usuário ideal em mente. Uma criança, por exemplo, pode não ter altura para usar uma maçaneta, e os problemas de acessibilidade nas grandes metrópoles são falhas de quem não prevê a existência de deficientes físicos em espaços urbanos. Isso mostra que as ações possíveis dependem tanto do instrumento quanto do usuário; os processos são feitos em conjunto pelos dois, e as affordances surgem quando eles se unem. Interfaces gráficas digitais O mesmo se pode aplicar a interfaces gráficas digitais. Elas são organizadas computacionalmente e espacialmente de forma a possibilitar a integração entre usuário e máquina; desse pareamento, affordances únicas emergem. Mas qual seria a essência das interfaces em relação a uma xícara, uma porta ou uma DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 23 calculadora? Todos esses são objetos aos quais nos conectamos para gerar processos únicos. No contexto dessa pergunta, volta a ser importante pensar as interfaces digitais como ambientes que produzem condições de manifestação da cultura humana. É seguro afirmar que esses ambientes devem ser analisados segundo suas particularidades, e o design das interfaces determina o que se pode fazer neles, como essas ações podem ser achadas e executadas e ainda pode possibilitar a formação de novas conexões entre os elementos da interface para se expressarem criativamente (algo que acontece nas redes sociais, por exemplo, com bastante frequência). Atividade proposta Durante a última aula, falamos sobre computadores e suas interfaces. Ao longo da história mais recente da tecnologia digital, novos suportes começaram a ganhar importância na comunicação entre as pessoas. Sobretudo, estamos falando de smartphones e tablets, aparelhos que possuem uma diferença fundamental em relação aos computadores: a maioria dos modelos mais usados e cobiçados, como o iPhone e a linha Galaxy da Samsung, usam telas sensíveis ao toque – não há ponteiro ou mouse. Apesar disso, é possível dizer que suas interfaces fazem uso dos mesmos conceitos básicos que estudamos aqui. Como podemos relacionar a interface do iPhone com os seguintes conceitos: mapeamento de bits/espaço-informação; metáforas visuais; e profundidade da interface? Chave de resposta: Mapeamento de bits/espaço-informação: No que se refere a esse tipo de recurso, um smartphone touch-screen (como o iPhone) faz algo análogo ao que o mouse de Engelbart introuduziu há décadas atrás. Afinal, ele usa mecanismos de detecção e rastreamento de toques e movimento do dedo e vincula esses processos a uma representação que aparece na tela (um ícone se movendo, uma janela se abrindo etc.). Isso é DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 24 possível porque um espaço-informação foi criado pela vinculação entre o espaço da tela sensível ao toque e os dados armazenados no disco rígido do aparelho. Metáforas visuais: Praticamente todas as imagens que provocam alguma mudança quando tocadas comunicam que mudanças serão essas. Essa comunicação é feita através de metáforas visuais: ícones que representam aplicativos são os exemplos mais claros. Por suas vezes, as interfaces desses aplicativos provavelmente farão uso de imagens que podem ser tocadas para produzir as funções da aplicação: a visualidade dessas imagens comunica possibilidades de interação (affordances). Profundidade da interface: Os smartphones mantêm uma das mais importantes características das interfaces gráficas digitais, a profundidade, e faz isso através do gerenciamento do espaço-informação. Quando usamos múltiplos aplicativos simultaneamente, por exemplo, os mecanismos que executamos para navegar entre as janelas denota a profundidade da interface, que simula um espaço maior que a tela do telefone. Aprenda Mais Material complementar Para saber mais sobre o conteúdo analisado, leia a resenha do livro Cultura da Interface, disponível em nossa biblioteca virtual. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 25 Referências GIBSON, James J. The Ecological Approach to Visual Perception. Londres: Psychology Press, 1986. Hayles, N. Katherine. How We Became Posthuman: Virtual Bodies in Cybernetics, Literature, and Informatics. Chicago: University of Chicago Press, 1999. JOHNSON, Steven. Cultura da interface: como o computador transforma nossa maneira de criar e comunicar. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001. KASTRUP, Virgínia. A invenção de si e do mundo: Uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. KITTLER, Friedrich. There is no software. 1995. Disponível em: < http://www.ctheory.net/articles.aspx?id=74- Acesso: 07 fev. 2014. MORAVEC, Hans. Mind Children: The future of robot and human intelligence. Cambridge, Massachussetts: Harvard University Press, 1988. NITSCHE, Michael. Video Game Spaces: Image, Play, and Structure in 3D Worlds Cambridge: The MIT Press, 2009. NORMAN, Donald. The Design of Everyday Things. New York: Doubleday, 1990. NORMAN, Donald. Affordance, conventions, and design. Interactions, v. 6, n. 3, p. 38-43, 1999. http://www.ctheory.net/articles.aspx?id=74- DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 26 Exercícios de fixação Questão 1 Os computadores, antes da invenção do mouse, exigiam um entendimento relativamente complexo de seu funcionamento. Com o uso do mouse, demonstrado pela primeira vez por Douglas Engelbart, é possível que o usuário compreenda suas ações sem necessariamente entender como um computador funciona. Como é possível explicar esse fenômeno? a) O mouse aparenta ser mais fácil de ser usado porque usa um código mais complexo e com mais possibilidades. O usuário precisa pensar em cada ação que está fazendo e raciocinar logicamente para usar esse código da melhor maneira. b) Engelbart programou o mouse de forma que quem o movimentasse pudesse ver o resultado da ação imediatamente exposto na tela. Em pouco tempo, o usuário aprende o que cada movimento causa sem necessariamente perceber esse aprendizado. c) O mouse é controlado por movimento, o que quer dizer que existe uma dimensão não digital no processo de interação. Assim, é possível ultrapassar a linguagem da máquina, que é intraduzível para o ser humano. d) O mouse é eficiente porque o usuário não precisa compreender os resultados visuais das suas ações na tela. Isso facilita o processo de interação para pessoas pouco acostumadas com tecnologia, que podem compreender suas ações apenas através do movimento. Questão 2 O “truque de programação” usado por Engelbart, e que é repetido até hoje, é o mapeamento de bits. Ele é responsável por construir o palco no qual a cultura da interface se manifesta. Como é possível descrever esse truque em poucas palavras? a) Mapeamento de bits é uma metáfora usada para descrever a manipulação de dados brutos. Embora possa parecer, esses dados não estão vinculados ao espaço bidimensional da tela. Eles estão encerrados na memória interna do aparelho e não produzem efeitos visuais e espaciais. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 27 b) O mapeamento de bits é uma forma de perceber o movimento do mouse e transformá-lo em dados. O usuário movimenta o mouse (ou outra ferramenta), e a máquina mapeia esse processo e transforma a tela em uma simulação bidimensional. c) Mapeamento de bits é o processo de simular um espaço bidimensional no interior do disco rígido do computador. O papel da interface é apenas exibir imageticamente a forma que esses dados assumem no interior da máquina. d) Mapear bits significa ligar os pixels (as menores unidades da imagem exibida em uma tela de computador) aos dados binários armazenadosno disco rígido. Engelbart ligou a memória do computador ao espaço da tela, possibilitando que esse espaço fosse manipulado com ferramentas como o mouse. Questão 3 Apresentamos na aula o conceito de espaço-informação, sendo possível descrevê-lo como uma linguagem que informa através de uma organização espacial que permite a ação do usuário. Qual seria um exemplo incorreto desse conceito? a) Um site pode construir através das suas cores, fontes do texto e formato dos menus e botões, informando ao usuário certas características, como tradição, bom humor, seriedade etc. Tudo depende da visualidade imaginada pelos designers. b) Uma página na internet pode exibir no seu topo diversas bandeiras de países que indicam os idiomas nos quais ela está disponível. O usuário pode clicar e lê- la em outra língua. c) Um editor de texto simula um espaço bidimensional em forma de página, que nos permite digitar e formatar um texto e ver como ele será impresso. d) Uma editor gráfico permite, através de ferramentas diversas, alterar o brilho, as cores, as dimensões e até mesmo a forma de imagens. As possibilidades de manipulação são comunicadas pelo espaço da interface. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 28 Questão 4 Se o espaço-informação é a base para a construção da interface, a metáfora visual seria um dos tipos de peças que compõem seu cenário. Como é possível descrever sua função? a) Metáfora visual é o processo que ocorre quando o usuário manipula uma imagem no computador. Embora ele visualize a imagem na tela, a metáfora é feita nos circuitos internos da máquina. b) A metáfora visual é uma simulação das tarefas que fazemos no dia a dia. Os designers de interface tentam transferir para o mundo digital processos como guardar arquivos. Quanto mais parecidos eles forem com a realidade, mais eficiente a metáfora visual será. c) A metáfora visual é um recurso para estabelecer a identidade visual da interface. E a aparência dos objetos é mudada de acordo como a vontade do designer, que influencia o usuário através de cores e formas. d) A metáfora visual indica uma tarefa possível de ser realizada através de uma imagem, ícone, botão ou forma manipulável na tela. Por exemplo, um “botão” com um “X” desenhado é uma metáfora que indica a possibilidade de encerrar uma aplicação na interface. Questão 5 Para Steven Johnson, o erro das interfaces Magic Cap e Microsoft Bob é levar a função das metáforas visuais muito ao pé da letra. Por que esse erro gera consequências tão graves? a) As interfaces eliminaram muitas etapas presentes em tarefas cotidianas. Para compreender uma metáfora visual, o usuário precisa realizar a tarefa exatamente da maneira como ele a executa no seu dia a dia, mesmo que isso signifique uma experiência tediosa. b) O erro gera consequências ruins, pois a tela do computador não conseguia, principalmente naquela época, simular espaços compreensíveis para o usuário. Dessa forma, ela se torna pouco eficiente, pois resulta em um espaço pouco convincente. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 29 c) As interfaces possuem design visual muito pobre, misturando muitas cores e formas numa mesma tela. Isso confunde o usuário, que pode não perceber a metáfora visual que indica a função desejada naquele momento. d) Porque no computador temos a possibilidade de eliminar etapas tediosas de um determinado processo. Por exemplo, se quisermos sair de um navegador web e abrir um jogo, basta trocar de janelas. As interfaces citadas obrigavam o usuário a percorrer muito mais etapas, como se mover por um espaço virtual muito amplo para trocar de aplicação. Questão 6 Uma das premissas para tratarmos as interfaces gráficas como formas de expressão cultural é a de que elas podem criar ambientes, e não apenas ferramentas com usos pragmáticos. Com isso em mente, considere as afirmações: I. As interfaces são fundamentais para armazenar as memórias culturais no nosso mundo. Isso as torna ambientes responsáveis por organizar os verdadeiros componentes da nossa cultura. II. Podemos chamar as interfaces digitais de ambientes porque os dados binários aos quais elas se associam formam ambientes matemáticos no interior dos discos rígidos dos computadores. III. Além de finalidades “práticas” como guardar documentos em arquivos, o usuário pode explorar a interface para descobrir maneiras de criar e compartilhar dados e informações, aumentando as possibilidades de expressão individual e colaborativa. IV. As interfaces oferecem a possibilidades de ação e manifestação de relações de amizade, trabalho e trocas culturais em geral. Quais delas representam corretamente as motivações que nos permitem chamar certas interfaces de ambientes digitais? a) I e III b) I, II e IV c) II, III e IV d) III e IV DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 30 Questão 7 Ao criar a metáfora do desktop, Alan Kay inventou um mecanismo que facilita a ação do usuário e cria profundidade para a interface. Por que esse desenvolvimento é tão importante para a produção de ambientes digitais nos computadores? a) O desktop funciona como a principal área de atuação do usuário. Sendo assim, essa profundidade significa que o usuário precisa manipular menos aplicações e tem menos possibilidades de ação, o que o impede de “se perder” no meio delas. b) O desktop reúne todas as ferramentas práticas de um computador: possibilita acessar pastas e guardar documentos. Sendo assim, sua função é facilitar a principal finalidade dos computadores: armazenagem de dados. c) Sabemos que dados binários podem representar imagens, vídeos, sons e várias outras formas expressivas. Dar profundidade à interface significa possibilitar que o usuário experimente, manipule e execute esses dados na ordem que achar melhor, pois pode organizá-los no espaço virtual com mais eficiência. d) O desktop adiciona profundidade, pois ele é a primeira camada do espaço- informação. Ele é feito a partir do mapeamento de bits e, portanto, possibilita a simulação de um ambiente. Questão 8 Para a autora Katherine Hayles, existem duas maneiras de pensar a relação entre humano e máquina. Tudo depende do ponto de vista sob o qual consideramos a relação entre os dois. O ponto de vista antigo, para Hayles, posiciona uma barreira entre nós e o que é maquinal. Como é possível resumir a proposta da autora para repensar essa dicotomia? a) É preciso repensar a diferença entre ser humano e máquina. Se compreendermos que não é possível estabelecer uma comunicação totalmente efetiva, chegaremos à conclusão de que os ambientes digitais são, no fundo, máquinas de calcular e processar dados. b) A autora propõe que os computadores irão romper com a lógica das relações humanas. As pessoas passarão a se relacionar apenas através do mundo DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 31 digital. Como isso é inevitável, resta apenas criar condições propícias para essas relações digitais. c) Hayles alega que não existe diferença entre humano e máquina. No contexto da tecnologia atual, é possível perceber que os computadores estão cada vez mais complexos, e já não há diferenças entre interagir com eles ou com outras pessoas. d) Podemos relevar a diferença que existe entre humano e máquina e pensar as trocas de informações que podem ocorrer entre eles. Assim, compreendemos um fluxo contínuo de comunicação que nos possibilita agir em um ambiente digital, por exemplo. Questão 9 Propomos a exploração como a principal forma de se comportar nas interfaces gráficas. Qual das alternativas a seguir não representa um motivo pelo qual podemos dizer que exploramos os ambientes digitais? a) Ambientes digitais são navegáveis. Isso significa que temos diversas rotas possíveis de serem seguidas e diversos destinos aos quais podemos chegar. Paranão chegarmos ao destino errado, é preciso planejar as ações e escolher o melhor percurso. b) Ambientes digitais são navegáveis. Como são digitais, funcionam numa lógica binária. Navegar nos ambientes significa compreender sua natureza matemática e saber fazer exatamente o que queremos. c) É possível se movimentar em ambientes digitais. Como os dados do computador são mapeados pela interface, o resultado é uma simulação espacial que nos permite a locomoção: mudar de pastas, arquivos, mover o cursor e a barra de rolagem. Todas essas ações representam o movimento em um ambiente. d) É possível se movimentar em interfaces gráficas. Cada uma delas estipula suas regras de movimentação. Por exemplo, em um jogo como Adventure, o jogador move o quadrado pelos corredores com “paredes” que impedem o movimento. Em um site, os hiperlinks e botões podem nos mover para outras áreas. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 32 Questão 10 A affordance, para o psicólogo James Gibson, é a possibilidade de ação que surge do pareamento entre dois ou mais elementos em um ambiente, ação essa que só pode acontecer quando eles se unem. Nos ambientes digitais, esses elementos podem ser pessoas e funções da interface, por exemplo. Qual das opções a seguir não representa uma affordance? a) Em um computador, é possível computar qualquer problema calculável de forma binária e representar qualquer dado armazenável dessa maneira. b) Uma pessoa pode usar um microfone e o botão “REC” em um software de gravação de som para criar um arquivo digital de áudio com sua voz. c) É possível usar o recurso de criação de grupos do Facebook para organizar uma comunidade com o objetivo de traduzir um artigo ou texto de forma colaborativa. d) Um pesquisador pode usar um mecanismo de busca em um site de notícias para organizar um banco de dados com todas as matérias sobre um determinado assunto. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 33 Aula 1 Exercícios de fixação Questão 1 - B Justificativa: A pessoa desloca o mouse e logo vê o cursor se movendo de acordo com o modo como o mouse foi movimentado. É um processo diferente das linhas de comando, que exigem o aprendizado de uma sintaxe, uma linguagem estruturada. O mouse exige apenas uma habilidade amplamente desenvolvida do aparelho sensório-motor humano: reconhecer padrões de movimento. Questão 2 - D Justificativa: Essa é a grande epifania de Douglas Engelbart: a tela antes era usada apenas para exibir dados, mas, com o mapeamento de bits, ela foi transformada em uma simulação espacial, uma espécie de ilusão criada através de código. O espaço bidimensional da tela deixa de ser um projetor de imagens e texto para ser um espaço virtual onde se pode manipular a posição das coisas, abrir novos espaços e criar pontes entre eles. Questão 3 - A Justificativa: Como dito no enunciado, o espaço-informação comunica através de possibilidades de ação. A identidade visual de um site certamente informa a quem o acessa; no entanto, quando falamos de design de interação, estamos falando de criação de ferramentas de manipulação, navegação e movimento – diferentemente de impressões causadas pela aparência do site, e não nas ações que ele mostra ao usuário serem realizáveis. Questão 4 - D Justificativa: Uma imagem presente na interface gráfica comunica não só cores e formas, mas também uma possível intervenção nos dados ali exibidos. Nós DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 34 compreendemos através da imagem de um “x” desenhado em um botão de cor vermelha que podemos fechar aquela janela e finalizar a atuação do programa. Questão 5 - D Justificativa: A arte de criar uma metáfora visual eficiente consiste, para Steven Johnson, em criar uma imagem que lembre algo familiar, indicando uma ação executável na interface relacionada a essa familiaridade. Mas, na hora de criar as condições dessa ação, o designer pode eliminar etapas tediosas (como ter que andar até o escritório, abrir uma gaveta e procurar um arquivo específico dentro de uma pasta escondida no fundo). As interfaces gráficas Magic Cap e Microsoft Bob praticamente não eliminaram essas etapas, pois acreditaram que isso tornaria o processo de interação mais fácil. O que eles não perceberam é que também o torna mais tedioso. Questão 6 - D Justificativa: As opções III e IV saem da visão limitada que trata os computadores como ferramentas. Elas mostram que eles podem funcionar como ambientes, ou seja, que podemos usá-los como plataformas para expressar dimensões da vida e aumentar as possibilidades de manifestações culturais e criativas. Questão 7 - A Justificativa: A profundidade trazida pelo desktop adiciona uma camada de complexidade à manipulação dos dados guardados no computador. É como se o espaço-informação pudesse assumir uma tridimensionalidade, onde podemos organizar nossos objetos em diferentes lugares, sempre podendo voltar para uma área de trabalho fixa. Isso contribui bastante para a simulação de um ambiente, pois podemos explorar suas possibilidades, criar combinações e expressar formas comunicativas. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 35 Questão 8 - D Justificativa: Podemos analisar os fluxos de informações que trafegam quando usamos um computador, smartphone ou tablet. As interfaces gráficas facilitam a percepção de informação. Por exemplo, as coisas que podemos fazer com aquele objeto: eles nos comunicam essas possibilidades pela organização do espaço-informação. Independentemente das diferenças entre homem e máquina, essa comunicação é possível e efetiva, se estabelecida com sucesso. Questão 9 - B Justificativa: Todas as opções descrevem como ações que definem a exploração de ambientes reais e que podem ser representadas em uma interface gráfica. A segunda opção, ao contrário, ignora a conexão entre ambientes digitais e ambiente concreto. Não precisamos compreender o funcionamento matemático das interfaces, precisamos compreender as possibilidades de ação que elas nos oferecem e o que e como podemos produzir com elas (assim como em um ambiente). Questão 10 - A Justificativa: A primeira opção, ao contrário das outras, não descreve uma ação que surge do encontro de vários elementos. Ela descreve apenas uma propriedade abstrata do computador. Essa propriedade geral permite tudo que fazemos nele, mas não é uma ação possível em si. É apenas a definição do contexto no qual as ações em ambientes digitais acontecem. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 36 Introdução Se estamos buscando compreender a interface gráfica digital como um elemento de comunicação, podemos considerar que ela expressa-se através de uma linguagem. Para compreendermos as capacidades e o limite dessa linguagem, é necessário que olhemos para o fundamento que a possibilita. No nosso caso, a base que permite o nascimento da linguagem da interface é a linguagem computacional. Seja em um smartphone ou em um videogame de última geração, as interfaces gráficas nascem de maquinações internas que respeitam uma lógica digital. Não precisamos compreender como elas funcionam do ponto de vista eletrônico, mas podemos certamente pensar quais são suas propriedades comunicacionais. E o fenômeno que melhor representa as questões que nascem com o uso da linguagem digital é a “interatividade”. Nesta aula, partiremos da análise da comunicação digital, afim de problematizar o que entendemos como interatividade. Esse movimento nos permitirá criar um novo entendimento da natureza comunicativa permitida pela cultura digital. Depois disso, nos aprofundaremos em outros conceitos que nos permitirão lançar luz sobre processos existentes no mundo dos computadores e também de possibilidades ainda não desbravadas. Objetivo: 1. Analisar a questãoda interatividade nas interfaces gráficas; 2. Elencar conceitos que permitam a compreensão dos mais diversos fenômenos de interação na cultura digita. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 37 DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 38 Conteúdo Interatividade: além do senso comum A partir do momento em que os computadores assumiram papel de destaque no cotidiano humano, um modo próprio de comunicação emergiu. As pessoas apertam botões no teclado, movem o mouse, e veem os pixels representar mudanças na tela. Dessa dinâmica, nascem produtos que nos ajudam a realizar uma série de objetivos: organizar dados e arquivar informações; mandar, receber e interpretar mensagens; programar e agir com ferramentas e em ambientes digitais; expressar ideias através de trabalhos de ordem prática ou até obras de cunho artístico. Não há dúvida, a partir desse pensamento, de que a computação configurava uma nova linguagem, que passa necessariamente pelo entendimento da interface (MANOVICH, 2001; LEMOS, 2002). A interface gráfica digital se incumbe de traduzir as informações magnéticas, elétricas e binárias – incompreensíveis para a maioria das pessoas – para espaço-informação, que comunica possibilidades de visualizar e produzir informação – de forma mais compreensível para a maioria dos usuários. Poder sobre a experiência Essa sensação de agência e poder sobre os dados causa a impressão aparente de que, pela primeira vez, o usuário possui poder sobre a experiência e pode direcioná-la de modo ativo. Esse modelo de comunicação contrastaria com o dos livros e do cinema, por exemplo, nos quais o sujeito ocuparia uma posição de passividade. Não existiria “conversa” entre autor e público. Podemos dizer que essa é a ideia resumida que o senso comum tem de interatividade. Podemos ressaltar complicações em alguns pressupostos desse tipo de pensamento. Principalmente, é possível observar práticas de comunicação não digitais nas quais o público possui capacidade de intervir. Programas de TV e rádio que recebem ligações telefônicas, por exemplo, mudam seu conteúdo DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 39 drasticamente a partir do tipo de intervenção que recebem. De forma semelhante, podemos observar como alguns sistemas digitais oferecem poucas alternativas de intervenção sobre seu conteúdo, lembrando livros como os da série “Choose your own adventure”. Os livros da série Choose your own adventure poderiam ter seu título traduzido para “Escolha sua própria aventura”. Começou a ser publicada pela editora americana Batham Books em 1979, resistindo até o ano de 1998. Consistia em livros aparentemente comuns, mas seu conteúdo era narrado em segunda pessoa, apresentando uma história na qual o protagonista é o leitor. Ao final de trechos específicos, quem lia o livro era confrontado com escolhas simples, como “ir para o leste ou para o oeste?”; “atravessar o lago ou seguir por dentro da caverna?”. Cada escolha pedia que o leitor folheasse o livro até uma determinada página, na qual era possível ler o resultado de sua decisão. Este é um exemplo de que certos tipos de interatividade são perfeitamente possíveis de serem apresentados em mídias não digitais. Níveis de interatividade Para Alex Primo, pesquisador brasileiro, a interação pode assumir duas formas básicas: a reativa e a mútua. Observe: Na interação reativa, o usuário teria o papel apenas de escolher uma opção dentre uma série de possibilidades predeterminadas por quem o desenvolveu. Por exemplo, uma aplicação digital como um teste vocacional elaborado a partir de questões de múltipla escolha. Todas as opções são preestabelecidas e a agência do usuário se limita a selecionar dentre as possibilidades. O resultado também pode ser predeterminado, e exibido ao usuário de acordo com suas escolhas. Nessa interação não há a possibilidade, por exemplo, de inovação e criação, tema que abordaremos posteriormente no curso. Por enquanto, é possível dizer que a reatividade permite apenas que surjam resultados previamente elaborados por quem planejou aquele sistema. DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 40 Na interação mútua, existe algo que lembra uma conversa entre duas pessoas: um sistema que pode gerar resultados imprevistos a partir das ações de seus agentes. Um chat em uma rede social é um exemplo claro: temos a possibilidade de intervir nos dados do sistema e de nos comunicar com outras pessoas. Mas ao contrário da enquete do exemplo anterior, os resultados não foram previamente imaginados por alguém. Eles surgem das ações dos sujeitos que agem no sistema, e que se afetam mutuamente. Web 2.0 (imagem representativa da web 2.0) Esses dois modelos de interatividade podem ser encontrados a todo momento na cultura digital e nas interfaces gráficas que manipulamos. Sobretudo na emergência do paradigma comumente chamado de “web 2.0”, as interfaces vêm sendo planejadas cada vez mais para possibilitar a intervenção dos usuários no conteúdo, criando uma rede de comunicação na qual os agentes adaptam-se mutuamente às ações uns dos outros. Há de se reconhecer, DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 41 porém, que essa vertente de interação mútua ocorre desde os primórdios da Internet, por exemplo nos MUDs. Atenção Os MUDs são híbridos de salas de chat com jogos online. Começaram a fazer sucesso na década de 1980, criando ambientes nos quais os usuários podiam criar personagens para interpretar e partilhar aventuras conjuntas, tudo isso através de texto. Os MUDs são um exemplo poderoso para relativizarmos a noção de interatividade na Internet, pois ofereciam grandes possibilidades de criatividade e expressão em uma fase muito incipiente da rede. Em contrapartida, os portais de notícias, por mais completos que sejam, ainda baseiam-se fortemente numa lógica reativa. Seus conteúdos são organizados para serem acessados em diferentes ordens e dividindo-se em vários temas. Não obstante, esses conteúdos que assumem diferentes formatos (textos, fotografias, vídeos, links etc.) são preestabelecidos pelos responsáveis pelo site. O usuário apenas reage ao sistema, que exibe a informação correspondente. Logicamente estamos ignorando as áreas de comentários e eventuais setores destinados a reportagens com participação de usuários, que embora ofereçam modelos de interação mais próximos do tipo “mútuo”, não são tão comuns quanto a experiência reativa em sites de notícias. A experiência de ler notícias na Internet envolve uma parte significativa de interação reativa: escolhemos assuntos ou notícias dentro de um conjunto pré- concebido pelos editores. Interatividade A interatividade, com isso, é uma propriedade importante das interfaces gráficas, mas não é exclusiva delas (ou mesmo dos computadores modernos). Interatividade mútua é quando os agentes de um sistema comunicativo DESIGN DE INTERAÇÃO E INTERFACES DIGITAIS 42 respondem às ações um do outro de forma imprevisível e nova a cada interação. O mesmo processo de interação mútua ocorre em uma conversa ao vivo, por exemplo. Da mesma forma que um jornal impresso diário, em regra, promove uma interação reativa, na medida em que o seu leitor apenas seleciona entre conjuntos de textos e imagens pré-organizados. Mas algo parecido ocorre num portal de notícias online, adicionando apenas alguns recursos como vídeo e áudio, e talvez um grau limitado de personalização da página inicial, por exemplo. De todo modo, estamos selecionando e manipulando “pedaços de informação” pré-concebidos, e não gerando informação nova. A importância de ser programável Conforme vimos até aqui, podemos pensar do seguinte modo esquemático: A interação
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