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Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO PROBLEMA 1 – ABERTURA: REGULAÇÃO DA TEMPERATURA E FEBRE: A temperatura corporal humana é fruto da interação entre a produção de calor endógeno e as perdas ambientais, processo mediado por neurônios termossensíveis em todo o SNC. No centro do organismo, a temperatura se mantem praticamente constante (± 0,6ºC), ao passo que na pele, as interações com o meio são muito mais frequentes. O principal mecanismo produtor de calor é o trabalho da musculatura esquelética, seja pela atividade dessas fibras ou por calafrios. Destaca-se também termogênese química/estática, principalmente gordura marrom, de elevado metabolismo. A regulação da temperatura em RN é dependente da queima desse tipo de tecido, pois eles não apresentam maturidade muscular para promover espasmos ou calafrios. Mecanismos de regulação térmica em recém- nascidos No meio externo, por sua vez, a aquisição da temperatura ocorre pela estadia em ambientes quentes e/ou úmidos. O sistema circulatório é responsável por distribuir o calor para outras partes do corpo, de forma que a vasoconstrição/vasodilatação representam mecanismos eficazes de regulação térmica (diminuem ou aumentam a superfície de contato com o ambiente). Representação da malha vascular que auxilia na condução de calor pelo corpo Quando a T ambiental > T corporal, calor pode ser trocado por meio de condução ou radiação. No entanto, se T corporal > T ambiental, o mecanismo empregado será a evaporação (suor ou respiração). Processos de perda de calor corporal Existem 3 principais mecanismos para a regulação de temperatura, a saber: Mecanismo aferente (sensores): composto primariamente por receptores térmicos na pele (principalmente para o frio), nos vasos, nas vísceras abdominais, na medula e no SNC, são responsáveis por detectar variações na temperatura; Mecanismo central (integrador): representa um centro para análise de impulsos aferentes, representado primariamente pela área pré-óptica do hipotálamo; A ação dessa região se assemelha a um termostato, mantendo uma T corporal constante (ponto de ajuste) através de feedback negativo. Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Alterações no ponto de ajuste para a deflagração da sudorese com o aumento da temperatura da pele (antecipa variações centrais) o Área hipotalâmica anterior: segmento com elevada concentração de neurônios sensíveis ao calor e ao frio. Age como sensor de variação térmica; o Área hipotalâmica posterior: corresponde a um núcleo de integração entre sinais de regulação periférica e central, mediando os processos regulatórios. Mecanismo eferente (efetor): é resultado das conexões do hipotálamo com o restante do SNC, SNA e o sistema endócrino, promovendo artifícios para modular a geração/condução de calor. o Reações ao aumento da temperatura corporal: Vasodilatação de estruturas cutâneas: marcada pela inibição de áreas de ação do SNA simpático no hipotálamo posterior; Sudorese: representa a excreção de filtrado semelhante ao plasma por meio de glândulas sudoríparas. Esse processo é mais acentuado quando a T corporal ultrapassa 37ºC; Redução da produção de calor: há supressão dos mecanismos externos ao metabolismo basal capazes de gerar aumento da temperatura. Correlação entre os mecanismos de regulação térmica frente a um aumento central o Reações à diminuição da temperatura corporal: Vasoconstricção da pele; Piloereção: impulsos simpáticos promovem a contração de músculos adjacentes ao folículo piloso, levando os pelos a adotarem uma posição vertical (não é tão expressiva em humanos); Intensificação da termogênese: há a estimulação de diversos processos secundários que liberam calor, como a termogênese e os calafrios. Ainda no hipotálamo posterior, em sua porção dorsomedial, é encontrado o centro motor primário para os calafrios, frequentemente inibido até que sinais de percepção do frio sejam detectados, rebaixando a T corporal. A estimulação para essa resposta é enviada bilateralmente pelo tronco encefálico em direção às colunas laterais da medula e, por fim, aos neurônios motores. Nos calafrios não há contração muscular efetiva, mas sim um aumento generalizado do tônus, causando “tremores” que oscilam conforme o ciclo de estiramento de fusos dos músculos. Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Mecanismo de geração de calor por calafrios A termogênese química, por sua vez, é decorrente da ação da noradrenalina sobre os depósitos de gordura, liberando calor sem gerar ATP. Como mencionado anteriormente, a intensidade desse processo é mais elevada na gordura marrom, bastante vascularizada e densa em mitocôndrias, que expressa termogenina na presença do neurotransmissor descrito anteriormente. Esse processo também pode ser mediado por meio da elevação na secreção de tiroxina pela tireoide, processo deflagrado com a captação de estímulos de frio pela porção posterior hipofisária. O hormônio descrito é responsável por aumentar o metabolismo, facilitando a geração de calor. FEBRE: A febre corresponde à elevação excessiva da T corporal, ultrapassando os limites de variação normal, sendo causada por alterações endógenas ao SNC ou por meio da ação de agentes exógenos sobre os centros de regulação térmica. Possíveis fatores associados a variações térmicas normais e anormais Esse mecanismo estimula diversas estratégias de defesa no corpo humano, elevando a quimiotaxia e a fagocitose, porém também pode estimular a liberação excessiva de citocinas, o que pode agravar quadros de sepse. Os fatores que podem causar a elevação do ponto de ajuste térmico são denominados pirogênios, também segmentados em endógenos (de ação direta e rápida, causando a febre verdadeira) e exógenos (atuam indiretamente após algumas horas). Frente a essa alteração, os mecanismos corporais de conservação de calor começam a agir, até que a temperatura corporal atinja esse novo patamar. Os pirogênios externos, presentes tanto em vírus como em bactérias e fungos, atuam na ativação de receptores TLR, principalmente por meio de lipopilissacarídeos (Gram-negativos), que em seu processo de ligação mediam a deflagração da cascata inflamatória, que por sua vez estimula a secreção de agentes endógenos. Hipóteses de surgimento da febre por vias de sinalização já foram descritas, destacando-se o papel da liberação hepática de PGE2 na ativação vagal, culminando no recrutamento hipotalâmico anterior à produção de citocinas. Principais pirogênios externos e seus indutores Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Os principais produtores de citocinas pirogênicas no corpo humano são monócitos, neutrófilos polimorfonucleares, macrófagos, histócitos e células gigantes, todas consideradas células de caráter fagocitário. A liberação dos pirogênios endógenos depende da sensibilidade de seus produtores a estímulos, normalmente infecções, reações imunológicas, traumas, queimaduras e demais eventos lesivos causadores de inflamação. Mecanismos da patogênese da febre Devido a essa condição, citocinas inflamatórias, como IL-1, IL-6, TNF e INF-α participam da alteração do ponto de ajuste, agindo diretamente sobre o hipotálamo por meio da liberação de PGE2 (se liga a reveptores EP1 e EP3). Principais citocinas com potencial pirogênio Com a alteração da regulação térmica hipotalâmica, diversos eventos são deflagrados para “ajustar” a temperatura corporal e evitar sua dissipação. Nesse momento, o paciente passa a sentir frio intenso, calafrios e a apresentar pele fria (vasoconstricção) até que sua T corporal alcanceo “novo padrão” basal. Esses comportamentos se mantém até que seja alcançado o ponto de ajuste ou que o agente pirogênio seja removido. Nessa última situação, ocorre uma tentativa súbita de retorno à T corporal normal, o que se dá por meio de vasodilatação generalizada e sudorese. Esse período é denominado crise ou rubor. Diversos antipiréticos endógenos tentam suprimir a febre, como glucocorticoides (inibidores de citocinas inflamatórias), os neuropeptídios (ACTH e vasopressina), e as citocinas anti- inflamatórias (IL-10, principalmente). Cronologia da febre, destacando os pontos de alteração do ponto de ajuste térmico e a evolução do quadro até a crise e o retorno à temperatura basal Além desses sintomas voltados para a modulação térmica, um paciente com febre apresenta outros sinais importantes, como astenia, prostração e alteração na secreção de diversas proteínas hepáticas mediadoras da inflamação. Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO A intermação ocorre quando a elevação da temperatura supera a temperatura crítica, caracterizada por desorientação e alterações neurológicas, como rebaixamento da consciência, e desconforto abdominal. A gravidade se eleva quando há perda de líquidos em excesso. A continuidade dessa exposição pode levar à hiperpirexia, fenômeno causador de hemorragias e degeneração celular (principalmente em neurônios, no fígado e nos rins), que podem induzir falência de órgãos. Em pacientes febris, é possível observar o Sinal de Faget, no qual a elevação térmica não é acompanhada aumento da FC esperado (10 bpm/0,5ºC). Vale ressaltar que a febre não é um sinal isolado, mas sim componente de uma síndrome (síndrome febril) que pode apresentar diversas etiologias, sinais e sintomas. Destacam-se: Febre neurogênica: é comum em pacientes com lesões graves ao SNC, nos quais há comprometimento hipotalâmico e exacerbação de respostas inflamatórias, perpetuando o quadro. É refratária a antipiréticos; Febre Neutropênica: decorre de déficits imunológicos, podendo assumir diversas apresentações, relacionadas ou não à infecção; Febre de origem desconhecida (obscura): em adultos, corresponde à febre que persiste acima de 38,3ºC por mais de 3 semanas, não sendo encontrado um diagnóstico após 1 semana de tentativas. Em crianças essa definição é mais ampla, podendo ser aplicada a quadros de até 5 dias. No primeiro ano de vida, esse quadro está frequentemente associado a infecções respiratórias, ao passo que, com o crescimento, essa predominância passa a ser de doenças do tecido conjuntivo (como lúpus) ou neoplasias. Síndromes auto inflamatórias hereditárias: mais comum em crianças, essa apresentação febril é marcada por temperatura > 39ºC, com respostas inflamatórias e fadiga associados. Por vezes o agente desencadeante é um estímulo de pequena magnitude, como uma vacina. Principais manifestações inflamatórias hereditárias associadas à febre Em neonatos, as principais etiologias associadas à febre são: Infecções virais: na maioria das vezes, o primeiro contato é assintomático, porém esse quadro favorece o surgimento concomitante de infecções bacterianas. A contaminação pode ser vertical, durante o parto, ou horizontal, pela interação com familiares ou funcionários do hospital. Os agentes etiológicos de maior gravidade são: o Vírus herpes simplex; o Vírus varicela-zóster; o Enterovírus; o Influenza; o Adenovírus; o Vírus sincial respiratório. Infecções baterias invasivas: diversas infecções bacterianas podem acometer o RN, como meningite, pneumonia, Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO alterações na pele e tecido conjuntivo, gastroenterite ou infecções do trato urinário. Os principais fatores de risco para infecções graves ou sepse são a idade < 28 dias, temperatura retal > 40ºC, a não-imunização, prematuridade e antibioticoterapia antes do 7º dia de vida. Os patógenos mais associados ao desenvolvimento de infecções bacterianas em RN são E. coli, Steptococcus tipo B, S. aureus, Sreptococcus pneumoniae, Salmonella spp., Moraxella catarrhalis e Klebsiella spp Principais vírus e bactérias associados à febre no RN As convulsões febris são urgências pediátricas bastante comuns, afetando principalmente crianças de 3 meses a 5 anos, com pico entre o 9º e o 20º mês de vida. Os processos inflamatórios basais associados à febre podem elevar a excitabilidade neuronal ou provocar mutações genéticas em canais iônicos, aumentando a predisposição ao quadro. AVALIAÇÃO SEMIOLÓGICA DA FEBRE: A avaliação da febre deve contar com a aferição da temperatura, que pode ser realizada por via axilar, oral ou retal, sendo esta última mais fiel à temperatura interna, ainda que incômoda. Temperatura axilar normal: 36º a 37,2ºC; Temperatura oral normal: 36,5º a 37,5ºC; Temperatura retal normal: 37º a 38,2ºC (normalmente é 1ºC maior que a T axilar). O ciclo circadiano pode alterar fisiologicamente a T corporal, que tem valor mínimo durante o sono e pico entre 17 e 22h. Em neonatos, temperaturas retais acima de 38ºC já despertam sinais de alerta (é permitida uma variação de apenas 0,5ºC em relação à temperatura média). A temperatura do ambiente, estresses psicológicos e a realização de exercícios pode deslocar esse valor dentro dos limites normais. Para cada ºC aumentado, a FC deve se elevar em 10 a 20 bpm, processo que, quando ausente, indica bradicardia relativa e dissociação pulso/T. A idade também apresenta papel importante na delimitação da temperatura, pois RN apresentam maiores oscilações (febre = ~38ºC), crianças possuem maior metabolismo e idosos contam com retardo na regulação. As possíveis classificações da febre abrangem: Intensidade (em adultos): o Febre baixa: entre 37,3ºC e 37,7ºC; o Febre moderada: entre 37,8º e 38,9ºC; o Febre alta (pirexia): entre 39º a 40ºC; o Hiperpirexia: acima de 40ºC. Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Valores de referência para a intensidade da febre em adultos Principais etiologias para cada intensidade febril Início: pode ser súbito ou insidioso; Duração: o Aguda: > 7 dias, comum em infecções; o Subaguda: entre 7 e 14 dias de duração, observada em abcessos ou na febre tifoide; o Crônica: > 14 dias, presente em neoplasias ou doenças bacterianas crônicas. Evolução/Padrão: o Contínua: há pouca variação nos valores de temperatura ao longo do dia, sem períodos de apirexia, estendendo-se por até 3 ou 4 dias (típica de bacteremia persistente); Curva da febre contínua o Intermitente: a elevação da temperatura cede ao menos 1x por dia, sendo típica de quadros oscilatórios, como a malária; Curva da febre intermitente o Remitente: há variações térmicas de mais de 1ºC, porém a temperatura não alcança valores fisiológicos. Pode persistir por longos períodos; Curva da febre remitente o Recorrente/Recidivante: há oscilação entre fases febris e afebris, seja com dias ou semanas espaçando uma da outra. É comum em pacientes com malária, linfomas ou que realizaram tratamento parcial para quadros infecciosos; Padrão temporal da febre recorrente o Febrícula: a temperatura não ultrapassa 38ºC, mas há sudorese. Variações mínimas ocorrem ao longo do dia, com pico vespertino e duração prolongada. É comum na tuberculose pulmonar e em doenças com bacteremia baixa. Principais etiologias por padrão febril Defeverscência: o Em crise: marcada por redução rápida da temperatura, com sudorese intensa; Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO o Queda em lise: é mais lenta, não afetando o prognóstico. A anamnese pode auxiliar a coletar informações capazesde descrever as características da febre, bem como identificar sintomas associados que explicitem a etiologia do quadro basal. Devem ser investigados sintomas “guarda-chuva” presentes em diversas doenças com febre de curta duração, como tosse, dor de garganta, espirros, coriza, dor torácica, dispneia, dor abdominal, disúria ou mal-estar. É necessário pontuar se já houve o uso de antitérmicos para o manejo da febre e qual a resposta a eles A determinação da história patológica pregressa também é importante, uma vez que pacientes imunossuprimidos estão mais susceptíveis a infecções oportunistas que cursam com febre. A história epidemiológica permite confirmar ou destacar hipóteses diagnósticas associadas a condições endêmicas ou correlacionadas ao contexto socioeconômico do paciente. O exame físico se inicia com a confirmação da febre, prosseguindo com a determinação do estado geral, avaliação do estado de hidratação, alterações no humor, e o estado nutricional do paciente. Esses dados permitem pontuar possíveis comprometimentos sistêmicos decorrentes da doença de base. No restante do exame, deve-se atentar para demais sinais de inflamação, como linfonodomegalia, hepatoesplenomegalia e sinais de inflamação meníngea. A solicitação de exames complementares, como o hemograma, pode ser recomendada em suspeita de casos mais graves ou frente a pacientes com maior risco de complicações, visando identificar leucocitoses, elevação da hemossedimentação ou aumento da proteína C reativa. Radiografias de tórax e sumário de urina devem ser prescritos conforme a suspeita diagnóstica e os achados do exame clínico. A RESPOSTA IMUNE INATA E A INFLAMAÇÃO: A resposta primária a uma infecção ou lesão tecidual é a inflamação aguda, mediada pela migração e acúmulo de leucócitos e derivados plasmáticos nos locais danificados, sendo o período de ação da imunidade inata. O tipo de leucócito mais “requisitado” para essas reações é o neutrófilo (porém macrófagos, monócitos e linfócitos também estão presentes), ao passo que proteínas do sistema complemento, anticorpos e reagentes de fase aguda são os principais componentes plasmáticos envolvidos. Todo esse processo depende de mudanças vasculares reversíveis, que contam com a participação dos componentes da MEC e com a alteração do fluxo sanguíneo local. Representação da mediação inflamatória, com seus principais efetores Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Mesmo que a inflamação tenha como propósito a remoção de agentes infecciosos e lesivos, esse processo pode desencadear comprometimento considerável ao organismo. O processo inflamatório pode ser agudo, iniciado de forma rápida, com ação primordial neutrofílica e resolução espontânea, ou crônico, que leva dias para se instalar, com infiltrados de macrófagos e linfócitos, de caráter progressivo. A inflamação aguda tem como principais agentes causais as infecções, traumas, presença de corpos estranhos e reações de hipersensibilidade. Há dois grandes tipos de eventos mediando essa resposta, as modificações vasculares e os eventos celulares (recrutamento e ativação leucocitária). Mecanismos celulares e vasculares na inflamação Diversas fases são necessárias à instalação da resposta inflamatória, a saber: Reconhecimento de antígenos: diversas células como fagócitos, células dendríticas e células epiteliais apresentam receptores TLR em suas membranas e endossomos, capazes de reconhecer endotoxinas ou DNA bacteriano e de outros agentes. Após a detecção desses microrganismos, os receptores estimulam a transcrição de mediadores da resposta inata. Os inflamossomos também são úteis na detecção antigênica, pois reconhecem produtos metabólicos em células mortas, deflagrando a produção de caspase 1, precursora de importantes citocinas inflamatórias, como a IL-1. Ação dos TLR (figura A) e inflamossomos (figura B) na detecção de antígenos Alterações vasculares: há vasodilatação e aumento da permeabilidade de forma a atrair mais células imunes ao local lesado. Esse processo ocorre segundos após uma resposta constritora inicial. Esse processo pode ser desencadeado pela contração do endotélio (dependente da presença de histamina e bradicinina), lesão direta ao leito vascular, aumento na transcitose proteica por fusão de vesículas ou pela angiogênese. O líquido plasmático, rico em proteínas consegue deixar os vasos e passa a infiltrar a MEC. Com isso, há redução do fluxo sanguíneo (sangue mais viscoso) e estase venosa, processo que precede a marginação leucocitária. Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Representação das mudanças mediadas pela inflamação sobre os vasos sanguíneos Os vasos linfáticos reagem ativamente à inflamação permitindo a drenagem do edema, mas podem ser afetados de forma secundária pelo antígeno. Recrutamento dos leucócitos: o processo de migração dos leucócitos do vaso para o sítio de inflamação depende de uma série de processos, a saber: o Marginação e rolamento: com o aumento da viscosidade do sangue, os leucócitos passam a ser deslocados para a periferia do vaso, facilitando sua interação com as células endoteliais. As citocinas favorecem a adesão entre as células imunes e o vaso, processo denominado rolamento. Os agentes envolvidos nesse processo são as selectinas (tipos E, P e L), expressos de forma quase exclusiva na inflamação. o Adesão: as integrinas, expressas pelos leucócitos, mediam sua ligação estável com o endotélio, situação que só ocorre na presença de quimiocinas, uma vez que estas estimulam a expressão de receptores vasculares, como a ICAM-1. o Transmigração: com a fixação descrita anteriormente, os leucócitos passam a se espremer pelas junções intercelulares, movimento denominado diapedese. O endereçamento dessas células pode ser guiado pelas citocinas extravasculares ou pela PECAM-1 (molécula de aderência plaquetária), favorecendo a passagem endotelial. Após essa migração, os leucócitos secretam colagenases, responsáveis por enfraquecer a membrana basal vascular, de forma a permitir o acesso à MEC. Processo de migração dos leucócitos para fora dos vasos o Quimiotaxia: esse processo depende de citocinas (discutidas a seguir), proteínas do sistema complemento, leucotrienos ou até mesmo de toxinas bacterianas, que irão guiar os leucócitos para o sítio de ação destes. O tipo de célula que fará esse percurso irá variar conforme o tempo da reação inflamatória e seu agente causal, sendo que na maioria dos quadros agudos, neutrófilos predominam nas primeiras 6 a 24h, e, entre 24 e 48h, há prevalência de macrófagos. Secreção de citocinas: produzidas pelos macrófagos e células dendríticas, essas substâncias possuem ação majoritariamente parácrina, tornando-se endócrina em quadros intensos de infecção. As principais citocinas pró-inflamatórias são: o TNF-α: é um importante mediador para inflamações contra bactérias e demais agentes infecciosos, aderindo-se fortemente ao seu Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO receptor. A secreção excessiva pode favorecer o desenvolvimento de efeitos patológicos; o IL-1: age de forma similar ao TNF, porém é produzido por uma maior variedade celular, mediada por inflamossomos. Sua liberação é intensificada perante a morte de macrófagos e células infectadas; o IL-6: apresenta ação indutora para a produção de outros mediadores inflamatórios, como a geração de citocinas hepáticas e a síntese de neutrófilos medulares. Sua expressão é estimulada pelos compostos supracitados; Efeitos do TNF ao organismo o IL-12: favorece a diferenciação de células inflamatórias Th1 eeleva a toxicidade das células NK, sendo produzida por células dendríticas em resposta à ativação de TLR. Ativação de leucócitos: a ação leucocitária se dá por meio de diversos processos: o Fagocitose: tem como agente o leucócito, que identifica resíduos de células mortas ou de opsoninas, substâncias endógenas (principalmente IgG) que marcam um microrganismo para a degradação. A conexão entre a célula e o segmento opsonizado promove o engolfamento e a degradação microbiana decorrente da formação de um fagolisossoma (junção de um fagócito com proteínas lisossomais). Destruição do material fagocitado: ocorre por meio da secreção de compostos microbicidas como ERO e enzimas lisossômicas, que degradam isoladamente as vesículas fagocitárias. Na incapacidade de fagocitar antígenos, o organismo reage com uma ativação leucocitária excessiva. Mecanismo fagocitário Os sinais cardinais inflamatórios (dor, calor, rubor, edema e perda funcional) são as manifestações sintomáticas típicas de um processo inflamatórios, associados principalmente à variação hemodinâmica temporária. A evolução do processo inflamatório CRITÉRIOS DE INTERNAÇÃO PARA RECÉM- NASCIDOS E ADULTOS COM PROCESSIS INFECCIOSOS: Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO IDENTIFICAÇÃO E AVALIAÇÃO DE INFECÇÕES E M RECÉM-NASCIDOS: A ocorrência de infecções em RN desperta um maior número de sinais de alerta devido à fragilidade das barreiras imunológicas do indivíduo, a exemplo da pele, que ainda é fina e permeável. Mucosas do TGI ou das vias respiratórias também se encontram vulneráveis, pois a produção de IgA não ocorre nos primeiros dias de vida. A secreção de citocinas inflamatórias, que podem potencializar a resposta a agentes nocivos, também é pouco eficaz, pois a maior parte das células da imunidade inata apresentam função diminuída (ex.: células NK) ou ainda não chegaram à sua concentração ideal (ex.: neutrófilos). Graças a todo esse processo, os estágios de marginação, transmigração e ativação leucocitária são defasados em neonatos. As infecções em neonatos podem ser de origem precoce, provavelmente transmitidas verticalmente pela mãe, como as TORCH, antes do 2º dia de vida, ou de desenvolvimento tardio, associadas à interação com vírus e bactérias no ambiente hospitalar após as primeiras 48h de vida. Principais locais para infecção neonatal e seu período de incubação Dentre as manifestações tardias, os exemplos mais comuns de infecção são: Celulite: causada por Streptococcus grupo B (se fixam facilmente à mucosa pela ausência de anticorpos e pela baixa função leucocitária), S. aureus e demais bactérias Gram-negativas, pode ou não ser associada à sepse; Impetigo: causado principalmente pelo S. aureus e pelos Streptococcus B; Pneumonia clínica: apresenta uma grande variedade de agentes etiológicos, virais ou bacterianos, transmitidos de forma vertical ou pelo contato com a comunidade; Principais etiologias para a pneumonia em RN Meningite: geralmente ligada à sepse, é causada por Streptococcus B e E. coli, esta última sendo capaz de evadir o reconhecimento do sistema imune por meio de ligações ineficientes com anticorpos maternos; Infecções do Trato Urinário: decorrente da invasão de E. coli [principal etiologia], Klebsiella, Pseudomonas, Proteus e fungos; Onfalite: corresponde à presença de sinais inflamatórios no coto umbilical, decorrentes de uma infecção por bactérias Gram-positivas ou negativas, com destaque para a Clostridium sp. A perpetuação destas infecções sem tratamento pode levar à sepse, quadro de bacteremia elevada que induz diversas reações deletérias ao organismo. Ala pode ser precoce, normalmente associada à invasão por bactérias presentes no canal Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO vaginal da mãe, ou tardia, de início após 2 dias de vida, decorrente do contato com outros indivíduos, como familiares e profissionais da saúde. Os microrganismos mais associados a esse quadro são Streptococcus B e E. coli. Principais sintomas associados à sepse neonatal O manejo de neonatos com infecções e febre deve ser feito de forma rigorosa, evitando complicações e desfechos sombrios. A internação é recomendada para todos os RN febris, de forma a monitorar o risco para sepse e realizar antibioticoterapia. Critérios de baixo risco para crianças de até 60 dias A escolha da via de administração de fármacos utilizados no tratamento da infecção deve priorizar acessos intravenosos periféricos tanto pela maior velocidade de ação como também pela intolerância oral no neonato, que não possui reflexos orais bem desenvolvidos. A ação das enzimas hemáticas ainda é deficiente nessa população, potencializando os riscos de toxicidade. O mesmo é aplicado à excreção renal. Administrações intramusculares devem ser aplicadas no músculo vasto lateral da coxa, com volume máximo de 0,5 mL em RN a termo, fazendo rodízios entre os pontos de injeção. ANTIPIRÉTICOS E ANTIBACTERIANOS: ANTIPIRÉTICOS: O tratamento farmacológico para a febre tem como principal recomendação o alívio do incômodo causado por ela e a prevenção de complicações em indivíduos susceptíveis, porém ainda há debates quanto a sua eficácia. Principais argumentos para a adoção ou não da terapia antitérmica Os principais alvos para a ação de antipiréticos são a diminuição da produção de PGE2, a estimulação da secreção de antitérmicos endógenos e a supressão da inflamação subjacente. Percebe-se, portanto, que AINES como a dipirona podem ser empregados nessas situações. No tratamento da febre, destacam-se: AAS: além de antipirético, é um importante anti-inflamatório, analgésico e anticoagulante de metabolismo hepático, o que, junto ao risco de desenvolvimento da Síndrome Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO de Reye, contraindica seu uso em crianças. O efeito persiste por 3 a 4 h, e os efeitos adversos geralmente se associam a alterações digestivas; o Posologia: 10 a 15 mg/kg ou 500 mg a 1 g VO a cada 6 h (adultos). Paracetamol (acetaminofeno): apresenta ação antitérmica semelhante à do AAS, com baixo potencial anti- inflamatório e analgésico. Seu uso deve ser feito de forma racional, pois doses elevadas podem causar hepatotoxicidade pelo acúmulo de NAPQI não metabolizado; o Posologia: 10 a 15 mg/kg a cada 4 ou 6h (adulto e pediátrico, mesmo em RN). Ibuprofeno: é uma AINE de baixa incidência de efeitos adversos bastante usado como antipirético, principalmente em idosos. o Posologia: máximo de 3,2 g/dia (adulto) e 5 a 10 mg/kg até 6x ao dia (pediátrico). Dipirona: apresenta boa ação como antipirético e analgésico, podendo ser encontrada em apresentação oral e injetável (único antitérmico intravenoso, deve ser evitado em bebês com menos de 5 kg). Também age na inibição da COX, porém com o objetivo específico de impedir a secreção de IL-1 sobre o hipotálamo. o Posologia: 10 a 20 mg/kg VO, em até 4 administrações diárias (adulto e pediátrico acima de 3 meses). ANTIBACTERIANOS INIBIDORES DA PAREDE CELULAR: O mecanismo de ação de alguns antibióticos pode estar associado às modificações na síntese da parede celular, estrutura que auxilia na proteção bacteriana. Neste grupo, destacam-se: Compostos β-lactâmicos: o Penicilinas: dividem-se em 4 grupos: Penicilina G: benzilpenicilina - maior afinidade para microrganismos Gram-positivos e cocos Gram-negativos; Penicilinas antiestafilocócicas: meticilina e oxaclina - ativas apenas contra Staphylococcus e Streptococcus; Penicilinas de espectro ampliado: amoxicilina e ampicilina - apresentam maior atividade contra bactériasGram- negativas; Microrganismos contra os quais a ampicilina (penicilina de amplo espectro) pode atuar Penicilinas antipseudomonas: piperacilina – atividade elevada contra Pseudomonas aeruginosa, porém também possui. O mecanismo de ação desses fármacos para a proliferação microbiana é a interferência sobre a transpeptidação (ligação cruzada), processo crucial para formar a parede celular. As penicilinas removem alaninas terminais nas cadeias de peptídeos, agindo de forma estruturalmente análoga a elas, de forma a modificar a morfogênese desse envoltório por meio da ativação de autolisinas. Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Mecanismo de ação das penicilinas Essa ação é mediada inicialmente pela inativação das PLP, proteínas de membrana com alta participação na produção da parede celular. Interação entre penicilinas e PLP em bactérias Gram-positivas (esqu., com maior capacidade de ação) e Gram-negativas (dir., menor atividade) Formulações desses compostos associados a inibidores aumentam o espectro de ação desses antimicrobianos. Isso ocorre, pois, o principal mecanismo de resistência às penicilinas é a β-lactamase, composto que desagrega o segmento bactericida por hidrólise. A administração VO das penicilinas (exceto a amoxicilina) deve ser realizada longe das refeições, evitando a ligação a proteínas alimentares. Estabilidade das apresentações de penicilinas A tolerância elevada a esses medicamentos favorece seu uso de forma inadequada, potencializando o desenvolvimento de resistência. Os efeitos colaterais estão associados principalmente à hipersensibilidade. Pode ocorrer também diarreia (quebra no equilíbrio da flora intestinal), nefrite (em pacientes com doença renal e principalmente com o uso da meticilina), e neurotoxicidade (quanto em concentração elevada ou em contato com o LCR Posologia das principais penicilinas empregadas na prática clínica Júlia Figueirêdo – FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO Resumo das principais características das penicilinas Inibidores da β-lactamase: apresentam estrutura similar às penicilinas, porém sua ação antibacteriana direta é baixa. Os representantes dessa classe são o ácido clavulânico, sublactam e tazobactan. Por serem capazes de suprimir diversas enzimas que protegem os organismos contra os fármacos supracitados, esses compostos são administrados apenas em associações medicamentosas, protegendo as penicilinas. Principais apresentações farmacológicas de combinações entre penicilinas e inibidores da β- lactamase Sua ação é maior contra enzimas de classe A, produzidas por Staphylococcus sp., H. influenzae, N. gonorrhoeae, Salmonella, Shigella, E. coli e K. pneumoniae. Representação do aumento da capacidade de eliminação bacteriana decorrente da combinação entre penicilinas e inibidores da β-lactamase A principal indicação clínica para essas associações é o tratamento empírico de infecções bacterianas, tanto em paciente imunocompetentes como em imunossuprimidos. A dose segue os mesmos padrões para a aplicação individual das penicilinas, com exceção da piperacilina (3-4 g a cada 6h). Em caso de insuficiência renal é necessário reajustar a prescrição.
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