Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Alfabetização e Letramento Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho Rita de Cássia Geraldi Menegon Revisada por Cecília R. C. F. Coelho e Rita de Cássia G. Menegon (setembro/2012) É com satisfação que a Unisa Digital oferece a você, aluno(a), esta apostila de Alfabetização e Letramento, parte integrante de um conjunto de materiais de pesquisa voltado ao aprendizado dinâmico e autônomo que a educação a distância exige. O principal objetivo desta apostila é propiciar aos(às) alunos(as) uma apresentação do conteúdo básico da disciplina. A Unisa Digital oferece outras formas de solidificar seu aprendizado, por meio de recursos multidis- ciplinares, como chats, fóruns, aulas web, material de apoio e e-mail. Para enriquecer o seu aprendizado, você ainda pode contar com a Biblioteca Virtual: www.unisa.br, a Biblioteca Central da Unisa, juntamente às bibliotecas setoriais, que fornecem acervo digital e impresso, bem como acesso a redes de informação e documentação. Nesse contexto, os recursos disponíveis e necessários para apoiá-lo(a) no seu estudo são o suple- mento que a Unisa Digital oferece, tornando seu aprendizado eficiente e prazeroso, concorrendo para uma formação completa, na qual o conteúdo aprendido influencia sua vida profissional e pessoal. A Unisa Digital é assim para você: Universidade a qualquer hora e em qualquer lugar! Unisa Digital APRESENTAÇÃO SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................... 5 1 CONCEPÇÃO DE ALFABETIZAÇÃO ........................................................................................... 7 1.1 Resumo do Capítulo .......................................................................................................................................................8 1.2 Atividades Propostas ......................................................................................................................................................9 2 PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA ...................................................................................... 11 2.1 A Escrita como Sistema de Representação .........................................................................................................12 2.2 Evolução Histórica da Escrita ...................................................................................................................................12 2.3 As Concepções das Crianças a Respeito do Sistema de Escrita ..................................................................13 2.4 Sondagem .......................................................................................................................................................................17 2.5 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................19 2.6 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................20 3 COMO ORGANIZAR UMA ROTINA DE AULA .................................................................... 23 3.1 O Conhecimento Prévio dos Alunos .....................................................................................................................23 3.2 Modalidades Organizativas das Rotinas de Trabalho Pedagógico ............................................................24 3.3 Ambiente Alfabetizador .............................................................................................................................................26 3.4 Agrupamentos Produtivos ........................................................................................................................................26 3.5 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................27 3.6 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................28 4 O QUE É LETRAMENTO? ................................................................................................................. 31 4.1 A Distinção entre Escrita, Alfabetização e Letramento ..................................................................................32 4.2 Escrita ................................................................................................................................................................................33 4.3 Alfabetização ..................................................................................................................................................................34 4.4 Letramento......................................................................................................................................................................35 4.5 Letramento em Todas as Áreas do Conhecimento ..........................................................................................36 4.6 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................37 4.7 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................37 5 IDEIAS DAS CRIANÇAS SOBRE LINGUAGEM ESCRITA .............................................. 39 5.1 Escrever Contos .............................................................................................................................................................39 5.2 Escrever Notícias ...........................................................................................................................................................42 5.3 Escrever Anúncios ........................................................................................................................................................43 5.4 Escrever Textos Expositivos .......................................................................................................................................43 5.5 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................44 5.6 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................44 6 ENSINAR E APRENDER A LINGUAGEM ESCRITA ........................................................... 45 6.1 O que é Ler e Escrever? ...............................................................................................................................................45 6.2 Para que Serve Ler e Escrever Textos? ...................................................................................................................46 6.3 Atividades que Permitam Pensar ...........................................................................................................................47 6.4 Construção Progressiva da Linguagem Escrita .................................................................................................47 6.5 A Função da Escola no Ensino da Linguagem ...................................................................................................49 6.6 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................49 6.7 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................507 O TRABALHO EM CONTEXTOS LETRADOS ....................................................................... 51 7.1 O Trabalho com Diferentes Gêneros de Texto ...................................................................................................52 7.2 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................55 7.3 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................55 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................... 57 RESPOSTAS COMENTADAS DAS ATIVIDADES PROPOSTAS ..................................... 59 REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................. 65 Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 5 INTRODUÇÃO Nesta disciplina, Alfabetização e Letramento, esperamos atingir algumas expectativas ao longo deste módulo, oferecendo subsídios a você em sua trajetória de formação, para que futuramente possa tornar-se um(a) educador(a) competente, que vise à propagação da escrita e da leitura para seus educan- dos em cada escola do Brasil. Além disso, pretendemos auxiliá-lo(a) no desenvolvimento de suas com- petências profissionais e esperamos que, ao se apropriar dos conteúdos disponibilizados nas aulas e nos materiais oferecidos nesta disciplina, produza os seus próprios, a fim de que muitos outros leiam, pois a cultura não para, sempre avança, se transforma, se aprimora. Esse movimento constante deve ser incor- porado por todos os envolvidos em educação e trabalhado por homologia de processos desde a sala de aula. Desejamos formar profissionais que desenvolvam um trabalho coletivo, conscientes de que a ajuda mútua é fundamental no processo de alfabetização e letramento. Devem ser conhecedores dos pro- cessos de aprendizagem de seus alunos para planejar as atividades e fazer intervenções pedagógicas adequadas, bem como criar situações desafiadoras, sempre considerando o nível de conhecimento real dos alunos. Além disso, devem encarar seus educandos como pessoas que precisam ter sucesso em suas aprendizagens para se desenvolverem pessoalmente e criarem uma imagem positiva de si mesmos. Para atingirmos todas essas expectativas, precisamos formar professores cada vez mais competen- tes e preparados para esses desafios. Finalmente, estamos em uma nova era. A atualidade solicita que pensemos em novas formas de ensinar a ler e escrever, visando a novas práticas de ensino para a vida no Brasil, transformando-o em um lugar melhor e mais humano. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 7 CONCEPÇÃO DE ALFABETIZAÇÃO1 Neste capítulo, pretendemos discutir um pouco as concepções de alfabetização e letra- mento que iremos abordar nesta apostila, escla- recendo que, por trás da prática pedagógica de qualquer professor, existe um conjunto de ideias que o orientam em seu trabalho. Às vezes, eles não têm consciência dessas ideias, dessas con- cepções, dessas teorias. Elas estão, porém, sem- pre presentes em sua ação pedagógica. Por exemplo, os professores precisam per- ceber as concepções que estão presentes em seu trabalho. Para desvelá-las, propomos as seguintes questões: a) Que conteúdos ele espera que seus alu- nos aprendam? b) Por quais caminhos a aprendizagem acontece? c) Como deve ser o ensino? Ao respondê-las, o professor revela quais concepções estão presentes em sua ação. Historicamente, a concepção mais presente no trabalho docente é a decorrente da teoria em- pirista. A prática dela resultante se expressa em um modelo de aprendizagem conhecido como “estímulo-resposta”. Esse modelo define a apren- dizagem como “a substituição de respostas erra- das por respostas certas”. Acredita-se, também, que o aluno, para aprender, precisa memorizar e fixar informações – as mais simples e parciais possíveis – que devem ir se acumulando com o tempo. O modelo típico de cartilha tem tal fun- damento. Segundo Telma Weisz e Sanchez (2001, p. 35): As cartilhas trabalham com uma concep- ção de língua escrita como transcrição da fala: elas supõem a escrita como es- pelho da língua que se fala. Seus ‘textos’ são construídos com a função de tornar clara (segundo o que elas supõem) essa relação de transcrição. Em geral, são palavras-chave e famílias silábicas, usa- das exaustivamente – e aí se encontram coisas como ‘o bebê baba na babá’, ‘o boi bebe’, ‘Didi dá o dado a Dedé’. A função do material escrito numa cartilha é apenas ajudar o aluno a desentranhar a regra de geração do sistema alfabético: que b com a dá ba, e por aí afora. Centrada nessa abordagem que vê a língua como pura fonologia, a cartilha introduz o aluno no mundo da escrita apresentando-lhe um texto que, na ver- dade, é apenas um agregado de frases desconectadas. Essa concepção de ‘texto’ para ensinar a ler está tão internalizada no imaginário do professor que, certa vez, uma professora que se esforçava para transformar sua prática, documen- tou em vídeo uma aula e me enviou, para mostrar como já conseguia trabalhar sem a cartilha. A atividade era uma produção coletiva de texto na lousa. O texto produ- zido pelos alunos e grafado pela profes- sora era o seguinte: O sapo O sapo é bom. O sapo come inseto. O sapo é feio. O sapo vive na água e na terra. Ele solta um líquido pela espinha. O sapo é verde. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 8 Como se pode observar, cada enunciado é tratado como se fosse um parágrafo in- dependente. Exigências mínimas de coe- são textual, como não repetir ‘o sapo’ em cada enunciado, nem sequer são consi- deradas. Só na quinta frase aparece, pela primeira vez, um pronome para substituir ‘o sapo’. E na sexta frase, lá está ele de novo. Seria fácil concluir que a professora é que não sabe escrever com um mínimo de coerência e coesão. Mas não era esse o caso. Além de saber escrever, era uma ótima professora: empenhada e compro- metida com o seu trabalho e seus alunos. Apenas havia interiorizado em sua práti- ca um modelo de ‘texto’ que caracteriza a metodologia de alfabetização expressa nas cartilhas. E de tal maneira que nem sequer tinha consciência disso: foi preciso tematizar sua prática a partir dessa situa- ção documentada para que ela pudesse se dar conta. (BRASIL, Módulo 1, Unidade 2, Texto 5, 2001, p. 1-2). Já em uma abordagem construtivista, o professor necessita apresentar aos seus alunos conteúdos sobre alfabetização de forma inteira e não fragmentada. Deverá criar situações que per- mitam aos aprendizes vivenciar os usos sociais que se fazem da leitura e da escrita, o sistema alfabético (sistema pelo qual a língua é grafada), a linguagem apropriada às diversas situações co- DicionárioDicionário Transcrição: latim transcriptio, -onis, transcrição, có- pia, imputação. municativas, as características dos diferentes gê- neros textuais e as características das diferentes esferas literárias. Os professores devem oferecer atividades com as quais os alunos sejam os ouvin- tes de textos de diversos gêneros; que participem de situações sociais nas quais os textos reais são utilizados, refletindo, assim, acerca dos usos e do funcionamento da língua escrita, tornando-os protagonistas da aprendizagem, indivíduos que produzam a transformação e que convertam a in- formação em conhecimento. Essa construção rea- lizada pelos aprendizes deve partir de situações em que os alunospossam interagir com o objeto de conhecimento, pensar sobre ele, receber aju- da, sendo desafiados a refletir e interagir com ou- tros colegas. O conhecimento não se constrói no vazio, necessita do planejamento estratégico do professor e de sua mediação em todo o processo de aprendizagem. O que precisamos compreender bem é que concepções tão diferentes dão origem, necessa- riamente, a práticas pedagógicas muito diferen- tes. Também é importante ressaltar que todo o ensino e aprendizagem estão ligados diretamen- te à escolha, consciente ou não, da concepção de trabalho dos educadores. Portanto, é imprescin- dível que você, caro(a) aluno(a), aprenda a reco- nhecer e analisar as concepções de alfabetização e letramento, para que, assim, possa realizar em sua jornada escolhas mais bem-sucedidas na arte de alfabetizar os alunos. 1.1 Resumo do Capítulo Neste primeiro capítulo, preocupamos-nos em apresentar as concepções de alfabetização e le- tramento que estão sendo utilizadas em nossas escolas (tradicional e construtivista) e refletir um pouco acerca das práticas escolares que estão por trás delas. Vimos, também, como é importante aprender a identificá-las no processo de ensino e aprendizagem para a aquisição de uma prática pedagógica bem- -sucedida e eficaz. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 9 Agora que você terminou de ler este capítulo, responda às seguintes questões: 1. A partir da leitura do capítulo 1, analise os quadrinhos abaixo e escreva quais são as concep- ções que norteiam as práticas pedagógicas das duas professoras. Professora A Professora B Professora A: Professora B: 2. Qual a concepção de língua escrita que a cartilha trabalha? Explique. 1.2 Atividades Propostas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 11 PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA2 Aqui neste segundo capítulo, para início de conversa, vamos desvelar o que significa o termo psicogênese. A psicogênese é o estudo do desen- volvimento dos conhecimentos que remontam suas raízes, sua gênese, sua origem. Esse estudo consiste em redefinir, rediscutir os processos cognitivos. Portanto, a psicogênese da língua escrita traz a interpretação do ponto de vista do sujeito que aprende, que interage com esse objeto de conhecimento (a escrita). Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (1984), preocupadas com o fracasso de inúmeras crian- ças no processo de alfabetização, efetuaram pes- quisas com base na teoria de Jean Piaget. Realiza- ram uma reflexão epistemológica, por meio da qual passaram a compreender a aprendizagem do sistema de escrita. A partir das pesquisas por elas elaboradas pudemos, então, conhecer as in- terpretações que as crianças dão à escrita, mesmo antes de aprender a ler e escrever convencional- mente. DicionárioDicionário Epistemológica: fem. sing. de epistemológico; Epistemológico: relativo à epistemologia; Epistemologia: (epistem- + -o- + -logia) s. f. [Filosofia] Ramo da filosofia que se ocupa dos pro- blemas que se relacionam com o conhecimento humano, refletindo sobre a sua natureza e valida- de = FILOSOFIA DO CONHECIMENTO, TEORIA DO CONHECIMENTO. A psicogênese traz, pelo menos, três ideias simples e fundamentais para a prática de alfabe- tização: a) Entrada e saída de informação extraes- colar na sala de aula. b) As crianças podem escrever, de acordo com suas hipóteses. O professor deixa de ser o único que sabe ler e escrever. c) A prática escolar, a respeito da repre- sentação escrita da linguagem, propicia que crianças que ainda não estão alfa- betizadas possam contribuir na própria alfabetização e na dos seus companhei- ros. Sendo assim, revendo as contribuições apontadas, podemos concluir que existem prá- ticas que levam a criança a conceber que o co- nhecimento é algo que o outro possui e que se pode obter da boca dos outros, sem que haja a participação na construção do conhecimento. Existem práticas que nos induzem a pensar que o que existe para saber já está estabelecido, como algo fechado, pronto e não modificável. Existem práticas que levam a criança a ficar fora do conhe- cimento, como espectador passivo ou receptor mecânico, sem nunca encontrar respostas aos “para quês” e aos “porquês” que já nem sequer se atrevem a formular em voz alta. Existem, por ou- tro lado, práticas que levam em conta as concep- ções das crianças, nas quais elas participam do processo de construção do conhecimento. Todas essas práticas estão apoiadas em um modo de conceber o processo de aprendizagem e o objeto dessa aprendizagem. Portanto, nenhu- ma prática pedagógica é neutra. Caro(a) aluno(a), neste parágrafo, queremos salientar que a teoria formulada por Emilia Ferrei- ro e Ana Teberosky (1984) não se constitui em um método, mas em uma reflexão epistemológica, na qual se categorizam as respostas das crianças em diferentes níveis de evolução. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 12 O construtivismo, tendo por base as teorias de Piaget, passa a ver a escrita como objeto de conhecimento e o sujeito da aprendizagem como sujeito cognoscente. Essa é a concepção que de- fendemos e em que acreditamos. Também será a concepção que utilizaremos durante os estudos desta apostila. Se observarmos, tanto os métodos analíti- cos que partem do todo, de uma estrutura global, e dirigem-se para a parte, o particular – o ponto de partida costuma ser uma palavra, uma frase ou um texto –, quanto os métodos sintéticos que partem de unidades pequenas, como as letras, os sons ou as sílabas, e caminham em direção a uni- dades maiores e mais significativas, não levaram em conta as concepções das crianças sobre o sis- tema de escrita. Portanto, segundo Piaget, o conhecimento não resulta nem de um sujeito que já nasce com a inteligência pré-formada, nem de experiência prática com objetos. O conhecimento passa a ser compreendido como resultado da interação entre o sujeito e as experiências. Esse sujeito aprende por meio de suas próprias ações sobre os objetos, constrói hipóteses, busca conhecimento, formula ideias na tentativa de compreender o mundo. 2.1 A Escrita como Sistema de Representação Neste item, aprofundaremos mais as nos- sas reflexões, pois, de acordo com Emilia Ferreiro (1994), a escrita pode ser considerada: como uma representação da linguagem, como um código de transcrição gráfica da linguagem ou como um código de transcrição gráfica de unidades sono- ras. Quando colocamos em primeiro plano a discriminação perceptiva (visual e auditiva), en- tendemos a escrita como um código de transcri- ção que transforma as unidades sonoras em uni- dades gráficas, no qual os elementos e as relações estão predeterminados. Essa concepção centra- DicionárioDicionário Representação: aspecto, caricatura, desenho. liza suas energias no exercício da discriminação, sem questionar sobre a natureza das unidades utilizadas. A linguagem é reduzida a uma série de sons. Dissocia-se o som do significado, destruí- mos o signo linguístico. Então, podemos verificar que essas práticas objetivam afirmar que a escrita é uma simples transcrição do código sonoro para um código vi- sual. Ao entendermos a escrita como um código de transcrição, sua aprendizagem é concebida como mera aquisição de uma técnica. Entretanto, se a escrita é compreendida como um sistema de representação, sua aprendizagem é vista como apropriação de um novo objeto de conhecimen- to, ou seja, um novo código a ser aprendido. 2.2 Evolução Histórica da Escrita Caro(a) aluno(a), agora vamos falar a respei- to da evolução histórica da escrita, que serviu e tem servido para muitas finalidades, de religiosas a políticas, de literárias a publicitárias.Raramente paramos para pensar que a hu- manidade necessitou de milhares de anos para construir o sistema alfabético de escrita e que ele não é a única forma possível de escrita. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 13 Ao longo da história da humanidade, a es- crita, que é uma produção social, sofreu várias transformações. A escrita pictográfica – forma mais antiga que conhecemos – permitia a repre- sentação dos objetos que se podiam desenhar. Portanto, o pictograma representava o próprio objeto. Surgiu, também, o sistema ideográfico, que representava o objeto referido por analogia. Esse sistema foi difundido pelos egípcios e continua existindo atualmente na escrita chinesa. Os povos antigos tinham dificuldades para escrever os nomes próprios, e foi por aí que se iniciou a fonetização, como a logografia. O logo- grama ainda era construído com desenhos. Por exemplo, a palavra soldado poderia ser escrita assim: Nesse caso, os desenhos já não se referiam mais ao objeto apresentado, e sim ao seu nome. Rapidamente, a fonetização rumou na di- reção de escritas silábicas. O sistema silábico de escrita desvencilhou-se completamente do de- senho e passou a trabalhar com sinais arbitrários, um para cada sílaba. A partir desse instante, a es- crita passou a representar o desenho sonoro das palavras. Nesse momento da história, apareceu a necessidade de valores sonoros convencionais e estáveis, da ordem das grafias que precisavam corresponder à ordem de emissão da fala. Assim, por meio da reflexão e da tomada de consciência das propriedades da linguagem, a es- crita silábica evoluiu para a escrita alfabética. Por exemplo, a letra M não corresponde a uma emis- são isolada. Ela é o que o ma, o me, o mi, o mo e o mu têm em comum. O número de sinais a ser memorizado diminui drasticamente. 2.3 As Concepções das Crianças a Respeito do Sistema de Escrita Caro(a) aluno(a), neste item, abordaremos as descobertas realizadas a respeito das concep- ções de escrita das crianças. É importante lermos este estudo com cuidado, porque este conheci- mento é a base para que possamos aprender a criar as intervenções necessárias para o aprendi- zado e avanço dos alunos no processo de alfabe- tização. Os pesquisadores de Genebra, Inhelder, Sinclair e Bovet (1974), a partir de um estudo experimental, concluem que as novas estruturas se formam mediante a integração e coordenação de esquemas já existentes. Essa integração se produz como consequência dos conflitos que surgem quando os esquemas existen- tes se encontram com outros em novos contextos e se mostram incompatíveis de serem relacionados e aplicados. (SILVA, 1995, p. 9). As pesquisas de Emilia Ferreiro podem ser inseridas no contexto citado. Ela nos diz: Para ser assimilada, a informação deve ser integrada a um sistema previamente elaborado (ou sistemas em processo de elaboração), não é a informação como tal, que cria o conhecimento. O conheci- mento é resultado da construção de um sujeito cognoscente conhecido. (SILVA, 1995, p. 10). DicionárioDicionário Cognoscente: latim cognoscens, -entis, particípio presente de cognosco, -ere, conhecer. adj. 2 g. Que conhece ou tem a capacidade de conhecer. = COGNOSCITIVO. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 14 Uma atitude teórica definida é necessária para a interpretação das escritas infantis. Logo, podemos concluir que exige um grande apren- dizado dos professores. Podemos pensar que as crianças aprendem apenas quando começam a frequentar a escola, ou podemos vislumbrar que podem ter muitos conhecimentos acerca da escri- ta, apesar de não ter sido dada a elas a autorização escolar para tanto. Elas possuem conhecimentos que ora são valorizados e aceitos socialmente, ora não. As propostas de alfabetização vêm sendo elaboradas tendo como referência teóri- ca o construtivismo interacionista piage- tiano e, mais especificamente, a psicogê- nese da língua escrita descrita por Emilia Ferreiro e Ana Teberosky têm cumprido o papel de divulgar um corpo de ideias – cuja origem é a pesquisa psicolinguís- tica –, dentre as quais uma das mais im- portantes é a de que as crianças, em seu processo de alfabetização, constroem hipóteses sobre o que a escrita represen- ta. Hipóteses estas que evoluem de uma etapa inicial, em que a escrita ainda não é uma representação do falado (hipóte- se pré-silábica) para uma etapa em que ela representa a fala por correspondên- cia silábica (hipótese silábica) e, por fim, chegando a uma correspondência alfa- bética, esta sim, adequada à escrita em português. (BRASIL, Módulo 3, Unidade 1, Texto 4, 2001, p. 4). No início do processo de alfabetização, as crianças pensam que não é possível ler apenas uma letra; portanto, há, na opinião delas, uma exigência mínima de caracteres para que se pos- sa escrever, o que gera alguns conflitos na escrita dos monossílabos e dissílabos. Segundo Telma Weisz e Sanchez (2001), as escritas silábica e silábico-alfabética têm sido vis- tas como patológicas pela escola, que não perce- DicionárioDicionário Psicolinguística: (psico- + linguística) s.f. Área da linguística que estuda os processos cognitivos que permitem a produção e a compreensão da lingua- gem. be e nem compreende o processo evolutivo da escrita. Portanto, o professor deve estar atento às hipóteses das crianças para que possa problema- tizar as contradições que apresentam, a fim de au- xiliar os educandos na construção e compreensão do sistema alfabético. De acordo com as descobertas acerca da psi- cogênese da língua escrita, feitas por Emilia Fer- reiro, as crianças desenvolvem suas concepções acerca da escrita a partir de níveis sequenciais e com características bastante distintas, como ve- remos a seguir: Nível Pré-Silábico, Nível Silábico, Nível Silábico-Alfabético e Nível Alfabético. Explicaremos, agora, cada nível de escrita. Sugerimos que você realize uma leitura cuidado- sa, procurando compreender as características de cada um deles. O primeiro nível é o pré-silábico. Observe as características das crianças nessa fase: Nível Pré-Silábico: no nível pré-silábico, a criança explora os critérios quantitativos (procura variar a quantidade de letras de uma escrita para outra, para obter escritas diferentes) e os critérios qualitativos (procura variar o repertório das letras ou a posição sem alterar a quantidade). Não exis- te uma relação entre grafema/fonema; as partes da escrita não correspondem às partes do nome. Cada letra pode valer pelo todo e não tem um va- lor em si mesma. DicionárioDicionário Fonema: s.m. 1. Qualquer som elementar (vogal ou consoante) da linguagem articulada. 2. Unidade mínima do sistema fonológico de uma língua. Grafema: s.m. - Letra. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 15 Veja, agora, exemplos de escritas do nível Pré-silábico: Caroline Johnny Willian Guilherme Cruz Fábio a) Hipótese central: A escrita reproduz traços típicos da escrita. A criança já compreende que, para poder ler coisas diferentes, deve uti- lizar letras diferentes. b) Processo gráfico: Grafismos ondulados ou quebra- dos (zigue-zague), contínuos ou fragmentados ou como uma série de elementos discretos repetidos (séries de linhas verticais ou de bo- linhas). Os grafismos se aproximam das le- tras convencionais. Nessa fase, a criança consegue ad- quirir modelos estáveis de escrita. Exemplos: o nome próprio, o nome dos familiares, o nome do brinque- do preferido. c) Fato conceitual: Intenção subjetiva (a forma escrita não tem relação com a forma gráfi- ca). Nãoé possível interpretar a escrita sem conhecer a intenção do autor. Tentativas de correspondência figu- rativa entre a escrita e o objeto re- ferido. O que mais aparece nesta escrita são os substantivos. Existe a preocupação de variar a quantidade, a qualidade e a posição das letras. d) Leitura: Global. Conheceremos, agora, as características que as crianças apresentam em suas escritas no nível silábico: Nível Silábico: nesse nível, cada grafismo corresponde a uma sílaba, ou seja, a criança des- cobre que a quantidade de letras com que se vai escrever uma palavra pode ter uma correspon- dência com a quantidade de partes que se reco- nhece na emissão oral. Pode haver uma associa- ção do som à letra convencional ou não. [...] a hipótese silábica cria suas próprias condições de contradição: contradição Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 16 entre o controle silábico e a quantidade mínima de letras que uma escrita deve possuir para ser interpretável (por exem- plo, o monossílabo deveria se escrever com uma única letra, mas quando se co- loca uma letra só, o escrito ‘não pode ser lido’, ou seja, não é interpretável); além disso, há contradição entre a interpreta- ção silábica e as escritas produzidas pelos adultos (que têm sempre mais letras do que as que a hipótese silábica permite antecipar). No mesmo período – embora não neces- sariamente ao mesmo tempo – as letras podem começar a adquirir valores so- noros (silábicos) relativamente estáveis, o que leva a uma correspondência com o eixo qualitativo: as partes sonoras se- melhantes entre as palavras começam a se exprimir por letras semelhantes. E isto também gera suas formas particulares de conflito. (WEISZ, 1985, p. 15). Cleonilda Lourivaldo a) Hipótese central: A criança procura atribuir valor so- noro a cada uma das letras que for- mam uma sílaba. b) Processo gráfico: Ainda aparecem algumas grafias distantes das formas convencionais das letras. A criança consegue atribuir valor so- noro convencional ou não às letras. c) Fato conceitual: Nessa fase, há um salto qualitativo, pois a criança já consegue estabe- lecer relações entre parte de textos escritos e parte de textos orais. A criança trabalha com a hipótese de que a escrita representa partes sonoras da fala (recorte silábico). Fase de conflito (retira letras ou co- loca letras a mais nas palavras). d) Leitura: Silábica. Veja, agora, as características dos alunos que estão no nível silábico-alfabético: Nível Silábico-Alfabético: no nível silábi- co-alfabético, a criança pode fazer a correspon- dência entre sons e grafias silábica e alfabética, ou seja, ela escreve parte da palavra utilizando a hipótese silábica e parte da palavra analisando os fonemas da sílaba. Victor Hugo a) Hipótese central: Nessa fase, surge um conflito entre a hipótese silábica e a escrita con- vencional, pois a criança começa a perceber que uma palavra possui mais letras do que o representado em suas escritas. A criança descobre que escrever é fazer uma análise que vai além da sílaba. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 17 b) Processo gráfico: Ocorre alternância da escrita, ora utilizando a hipótese silábica, ora utilizando uma relação fonética. c) Fato conceitual: Uma transição entre o silábico e o alfabético. Início de contradição entre o valor sonoro atribuído às letras. d) Leitura: Pode ler globalmente as palavras (fase de grande conflito). E, finalizando, abordaremos as característi- cas da última fase de escrita, o nível alfabético. Nível Alfabético: A criança faz a correspon- dência entre fonemas e grafias. Cleonilda Lourivaldo a) Hipótese central: A criança descobre que, para cada fonema, deve corresponder um gra- fema, que são unidades menores do que as sílabas. b) Processo gráfico: Escrita alfabética. c) Fato conceitual: A criança percebe que uma sílaba é composta por letras que variam de uma a cinco; não mantêm a mesma quantidade. d) Leitura: Cada vez mais próxima da leitura convencional. 2.4 Sondagem Caro(a) aluno(a), para identificarmos o nível de escrita dos alunos, nós, professores, realizamos a sondagem de escrita, procedimento que será explicado também neste capítulo. Compreendemos como sondagem uma ati- vidade que visa a diagnosticar os conhecimentos dos alunos sobre a escrita. Para tanto, organiza-se a partir da produção de uma lista de palavras co- nhecidas pelos alunos, podendo ou não abarcar a escrita de uma frase. Conhecer as palavras não significa conhecer como grafá-las, e sim o seu sig- nificado no uso cotidiano. Após a escrita de cada palavra, deve ocorrer a leitura daquilo que o alu- no escreveu, pois é por meio da leitura que o pro- fessor observará se o aluno estabeleceu ou não relações entre aquilo que escreveu e aquilo que leu em voz alta, ou seja, entre a fala e a escrita. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 18 É importante destacar que a lista deve ser ditada normalmente e sem silabar. Ela precisa fa- zer parte de um rol de palavras do mesmo campo semântico. Para conhecer as hipóteses de escrita de seus alunos, o professor, ao realizar as sondagens durante o período letivo, encontrará elementos para fazer as intervenções adequadas e necessá- rias de modo que seus alunos avancem nos co- nhecimentos. Ao fazer a sondagem do nível de escrita, é importante que o professor ofereça uma folha sem pauta para que possa observar a direção e o alinhamento da escrita de seus alunos. Sugerimos os seguintes critérios para reali- zação da sondagem, conforme indicação do Guia para o Planejamento do Professor Alfabetizador – Ler e Escrever – Prioridade na Escola Municipal (SÃO PAULO, 2006, p. 35-36): - As palavras devem fazer parte do voca- bulário cotidiano dos alunos, mesmo que eles ainda não tenham tido a oportunida- de de refletir sobre a representação escri- ta das palavras. - A lista deve contemplar palavras que va- riam na quantidade de letras, abrangen- do palavras monossílabas, dissílabas, etc. - O ditado deve ser iniciado pela palavra polissílaba, depois a trissílaba, a dissílaba e, por último, a monossílaba. Esse cuida- do deve ser tomado para o caso de as crianças escreverem segundo a hipótese do número mínimo de letras. Poderão recusar-se a escrever caso tenham de co- meçar pelo monossílabo. - Evite palavras que repitam as vogais, pois isso também pode fazer com que as crianças entrem em conflito – por causa da hipótese da variedade – e também se recusem a escrever. - Após o ditado da lista, dite uma frase que envolva pelo menos uma das pala- vras da lista, para que se possa observar se os alunos voltam a escrever essa pa- lavra de forma semelhante, ou seja, se a escrita dessa palavra permanece estável mesmo no contexto de uma frase. Uma possibilidade para a realização da sondagem é a utilização de uma lista de animais, como a que segue: BORBOLETA JACARÉ PATO BOI O PATO NADA NA LAGOA. Vejamos, agora, algumas sondagens apre- sentadas no Guia para o Planejamento do Profes- sor Alfabetizador – Ler e Escrever – Prioridade na Escola Municipal (SÃO PAULO, 2006): 1ª sondagem A aluna apresenta uma escrita pré-silábica. Demonstra conhecer que escrever não é dese- nhar. Crê que para escrever é preciso muitas le- tras; utilizando a largura da página, presume que a quantidade de letras é determinada pelo espa- ço da largura do papel. Não existe a representa- ção entre a escrita e afala. DicionárioDicionário Campo semântico: uma classificação ou categoria dos significados de palavras ou conceitos, como, por exemplo, uma classificação usada em um di- cionário de termos afins; campo lexical. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 19 2ª sondagem Na segunda sondagem, a menina continua escrevendo segundo a hipótese pré-silábica. Ain- da procura utilizar a largura da página como crité- rio para definir a quantidade de letras a ser escri- ta. Entretanto, há um avanço, pois ela se preocupa em variar as letras utilizadas. Conhece várias letras e domina o traçado delas. 3ª sondagem Nessa sondagem, a hipótese de escrita é si- lábica. Conhece que o número de letras é determi- nado pela relação entre a fala e a escrita. Controla a quantidade de letras, bem como a qualidade da letra que será escrita – seleciona-as de acordo com o som que recebe em cada fala. Conforme já mencionamos, é preciso pedir que a criança leia cada palavra escrita, a fim de en- tendermos como ela está raciocinando acerca da própria escrita. Para a posterior análise e retoma- da dos registros infantis, sugerimos as seguintes marcas de leitura: a) Pré-Silábica MLONE PATO b) Silábica J A R JA CA RÉ c) Silábico-Alfabética B O R B L T A BOR BO LETA d) Alfabética BOI BOI 2.5 Resumo do Capítulo Caro(a) aluno(a), no segundo capítulo, aprendemos alguns conteúdos importantes: A psicogênese é o estudo do desenvolvimento dos conhecimentos que remontam suas raízes, sua gênese, sua origem. Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (1984) efetuaram pesquisas nas quais se categorizam as respos- tas das crianças em diferentes níveis de evolução. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 20 A escrita é compreendida como um sistema de representação. Sua aprendizagem é vista como apropriação de um novo objeto de conhecimento, ou seja, um novo código a ser aprendido. Ao longo da história da humanidade, a escrita, que é uma produção social, sofreu várias trans- formações. A escrita pictográfica era representada por desenhos; portanto, o pictograma re- presentava o próprio objeto. O sistema ideográfico representava o objeto referido por analo- gia. O logograma ainda era construído com desenhos, porém já não se referia mais ao objeto apresentado, e sim ao seu nome. A fonetização rumou na direção de escritas silábicas, e, por meio da reflexão e da tomada de consciência das propriedades da linguagem, a escrita silábica evoluiu para a escrita alfabética. De acordo com as descobertas acerca da psicogênese da língua escrita, feitas por Emilia Ferrei- ro, as crianças desenvolvem suas concepções acerca da escrita a partir de níveis sequenciais e com características bastante distintas: Nível Pré-Silábico, Nível Silábico, Nível Silábico-Alfabéti- co e Nível Alfabético. A sondagem é uma atividade que visa a diagnosticar os conhecimentos dos alunos sobre a escrita. Para tanto, organiza-se a partir da produção de uma lista de palavras conhecidas pelos alunos, podendo ou não abarcar a escrita de uma frase. 2.6 Atividades Propostas Agora que terminamos este capítulo, vamos verificar se você compreendeu bem o conteúdo. As- sim, responda às seguintes perguntas: 1. Quais são as ideias simples e fundamentais que a Psicogênese da Língua Escrita proporcionou para a prática de alfabetização? Qual a relevância delas? 2. Analise as escritas das crianças e escreva em qual nível de escrita a criança está, completando a tabela a seguir: Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 21 BRIGADEIRO – BEIJINHO – COXINHA – CONVITE – BEXIGA BRIGADEIRO – BEIJINHO – COXINHA – BEXIGA CEBOLINHA – CHICO BENTO – MAGALI – ROSINHA WILLIAN LAURA CARLA JABUTICABA – TOMATE – CAJU – MEL / MEL É DOCE. BRIGADEIRO – GUARANÁ – BOLO – BIS PEDRO EDNALDO **** Criança Nível de Escrita 1 Willian 2 Laura 3 Carla 4 Pedro 5 Ednaldo 3. Assinale a lista de palavras que melhor contempla os critérios para a aplicação de uma boa sondagem da hipótese de escrita. a) cão – gato – sapo – camelo – O camelo vive no deserto. b) camelo – gato – sapo – cão – O camelo vive no deserto. c) rinoceronte – camelo – gato – cão – O gato come ração. d) cão – gato – rinoceronte – O gato come ração. e) cão – gato – camelo – rinoceronte – O gato bebe leite. 4. Justifique a escolha da alternativa do exercício 3. Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 23 Caro(a) aluno(a), no capítulo 3, pretende- mos abordar a necessidade de o professor orga- nizar uma rotina para sua sala de aula, pois a ma- neira como organizamos o espaço, os materiais e o tempo desvelam as intenções e as concepções educativas, de homem, de mundo e de socieda- de. Por exemplo, quando optamos por ler apenas uma vez por semana, mas escrever diariamente, o que estamos ensinando para nossos alunos, mesmo que não tenhamos consciência, é que a escrita é mais importante do que a leitura. Ou, se o trabalho com as áreas do conhecimento do Eixo Natureza e Sociedade ocorrem apenas quando sobra um tempinho ou nos dias que antecedem as provas, também ensinamos que esses conteú- dos devem ser estudados apenas às vésperas das provas e que não há necessidade de estudá-los com seriedade. Outro exemplo, clássico, é quando só da- mos atividades de ditado e cópia para os alunos. Se assim procedermos, estaremos ensinando que só aprendemos a ler e a escrever por meio dessas atividades. COMO ORGANIZAR UMA ROTINA DE AULA3 Quando damos prioridade a algumas ativi- dades revelamos nossas intenções e, consequen- temente, nossas concepções. Para organizar uma rotina de trabalho pe- dagógico precisamos definir os seguintes aspec- tos previamente: a) Todas as disciplinas a serem trabalha- das e a frequência. b) A melhor forma de tratar os conteúdos (atividades sequenciadas, projetos di- dáticos, atividades permanentes etc.). c) Os textos e os tipos de atividades pro- postos durante a semana ou em casa e sua frequência. d) Se as atividades serão realizadas indivi- dualmente ou em grupos (como serão formadas as duplas ou os trios e fre- quência). 3.1 O Conhecimento Prévio dos Alunos Neste item, abordaremos a necessidade de conhecer os saberes dos nossos alunos e a impor- tância que o levantamento desses conhecimen- tos tem para a realização de um bom trabalho pedagógico. O modelo construtivista de aprendizagem requer a utilização de uma metodologia de ensi- no que proponha a resolução de problemas. Para tal, é necessário que o professor escute e obser- ve as crianças, refletindo, então, sobre o que elas estão pensando ao dar uma resposta em detri- mento de outra. A resposta errada passa a não ser fruto da ignorância, mas parte do processo. É preciso perguntar ao aluno o que ele quis dizer com aquela resposta para que possamos com- preender as concepções que levaram a criança a dar determinada resposta. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 24 Os erros construtivos são aqueles que se destacam dos demais erros (por falta de atenção ou memória, por exemplo) exatamente por ca- racterizarem-se como respostas que, na perspec- tiva do adulto, separam-se das corretas, mas que, longe de impedir seu alcance, permitem acertos posteriores. 3.2 Modalidades Organizativas das Rotinas de Trabalho Pedagógico Neste item, abordaremos as modalidades organizativas necessárias para uma melhor or- ganização da rotina de trabalho do professor, na tentativa de organizar o tempo, o espaço e garan- tir a diversidade de conteúdos necessáriospara a aprendizagem dos alunos. Além da seleção dos conteúdos a serem trabalhados e do tipo de atividade espe- cífica que será proposta, há ainda outra importante decisão pedagógica, relacio- nada ao tratamento dos conteúdos: a depender dos objetivos que se têm, eles podem ser trabalhados na forma de ativi- dades permanentes, atividades sequen- ciadas, atividades de sistematização, ati- vidades independentes ou projetos. As atividades permanentes são as que acontecem ao longo de um determinado período de tempo, porque são impor- tantes para o desenvolvimento de pro- cedimentos, de hábitos ou de atitudes. É o caso de atividades como: leitura diária feita pelo professor; roda semanal de lei- tura; oficina de produção de textos; hora das notícias; discussão semanal dos co- nhecimentos adquiridos, etc. As atividades sequenciadas são as plane- jadas em uma sequência encadeada: o que vem a seguir depende do que já foi realizado (e aprendido) anteriormente. Por exemplo: atividades para alfabetizar, para ensinar a produzir textos de um de- terminado gênero, para ensinar ortogra- fia ou o uso de certos recursos gramati- cais, etc. As atividades de sistematização, embora não decorram de propósitos imediatos, têm relação direta com os objetivos didá- ticos e com os conteúdos: são atividades que se destinam à sistematização dos conteúdos já trabalhados. As atividades independentes são aquelas que não foram planejadas a priori, mas que fazem sentido num dado momento. Por exemplo: em algumas oportunida- des, o professor encontra um texto que considera valioso e compartilha com seus alunos, ainda que pertença a um gênero ou trate de um assunto que não se rela- ciona às atividades previstas para o pe- ríodo. E, em outras ocasiões, os próprios alunos propõem a leitura de um artigo de jornal, um poema, um conto que os tenha impressionado e que o professor também considera interessante ler para todos. Nesses casos, não teria sentido nem renunciar à leitura dos textos em questão, pelo fato de não ter relação com o que se está fazendo no momento, nem inventar uma relação inexistente. Os projetos são situações didáticas em que o professor e os alunos se compro- metem com um propósito e com um produto final: em um projeto, as ações propostas ao longo do tempo têm rela- ção entre si e fazem sentido em função do produto que se deseja alcançar. É o caso de atividades como o jogral, drama- tização, apresentação pública de leitura, produção de livro, de jornal, de texto in- formativo e outras similares. Uma proposta pedagógica que privile- gia o trabalho com projetos se justifica por princípios que se expressam em ne- cessidade da natureza didática: a com- preensão do aluno enquanto sujeito da própria aprendizagem; a elaboração jun- to com os alunos de propostas a serem implementadas na classe; a construção de algumas certezas compartilhadas e a discussão de muitas incertezas (o que permite maior compreensão da nature- za de um empreendimento coletivo e melhor relacionamento entre o grupo); a contextualização das propostas de en- Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 25 sino, considerando que a aquisição de conhecimento é sempre mediada pelo modo de aprender dos alunos e pelo modo de ensinar dos professores; a má- xima aproximação entre a ‘versão escolar’ e a ‘versão social’ do conhecimento, o que requer planejamento de situações esco- lares à semelhança das práticas sociais (com o cuidado de não produzir simplifi- cações ou distorções nos conhecimentos a serem trabalhados); o fato de a ação educativa ter que responder ao mesmo tempo os objetivos de ensino e objeti- vos de realização do aluno – nem sempre coincidentes. (LERNER, 2002, p. 87-92). Certamente, essa modalidade de projetos é privilegiada para organizar conteúdos escolares, porém nem tudo pode ser abordado por meio deles. É preciso que o professor identifique a me- lhor maneira de abordar os conteúdos que deve ensinar aos alunos, pois existem alguns conteú- dos que não necessitam de um trabalho com pro- jetos, pois uns devem ser sistematizados, outros não. Também existem os recorrentes e os inde- pendentes, e solicitam que o trabalho seja orga- nizado em modalidades diferentes. É importante saber que os conteúdos escolares são ensinados para que os alunos desenvolvam diferentes ha- bilidades e competências. A forma de abordá-los deve ser aquela que melhor atende ao objetivo de desenvolver essas capacidades. Aqui, exemplificaremos, para que você pos- sa compreender melhor como organizar uma ro- tina em salas de alfabetização. Observe o quadro abaixo (BRASIL, 2001, Módulo 2, Unidade 1, Texto 4) contendo a rotina de uma sala de alfabetização: Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 26 3.3 Ambiente Alfabetizador Caro(a) aluno(a), outro aspecto muito im- portante no trabalho pedagógico é ajudar o pro- fessor a construir um ambiente alfabetizador. Como transformar o ambiente da sala de aula em alfabetizador? Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998), um am- biente alfabetizador é aquele que promove um conjunto de situações de usos reais de leitura e escrita das quais as crianças podem participar. Então, quais são as situações reais de leitura e escrita que perpassam pela escola? São elas: a) leitura de uma notícia de jornal de interesse das crianças, b) informação de data e horário de uma festa, c) leitura de um convite de aniversário, d) leitura coletiva de um bilhete aos pais, permitin- do que se informe seu conteúdo e sua intenção. Outra possibilidade é trabalhar com receitas culi- nárias ou com leitura de regras de jogos, entre outras. Um ambiente alfabetizador fornecerá a to- das as crianças e, em especial, às que se originam de comunidades pouco letradas, a oportunidade de participar ativamente dos eventos de letra- mento. Dispor de uma sala de aula com paredes re- pletas de textos não garante um ambiente alfabe- tizador, uma vez que entendemos que é preciso expor as crianças às práticas nas quais a leitura e a escrita tenham uma função real de expressão e comunicação. É importante oferecer vários gêneros tex- tuais de acordo com os interesses e a faixa etá- ria dos alunos para a formação de um ambiente de letramento. Esses gêneros, escolhidos pelo professor, necessitam de um trabalho contínuo e sistemático, para que os educandos se apropriem de suas características e peculiaridades. 3.4 Agrupamentos Produtivos Como você pode observar, o professor deve organizar sua classe em função dos objetivos das atividades e das possibilidades de aprendizagem dos alunos. Na sala de aula, sempre teremos gru- pos heterogêneos, com níveis de compreensão e conhecimentos diferentes; assim, surge a neces- sidade de o professor conhecer, acompanhar e analisar o que os educandos aprendem, a fim de adequar as práticas de ensino, considerando os conhecimentos e as necessidades de aprendiza- gem de todos. É preciso ter o cuidado de não ofe- recer mais oportunidades a uns do que a outros, negligenciando, assim, o atendimento às necessi- dades de aprendizagem do grupo. Para o trabalho com classes heterogêneas, há três tipos de organização do trabalho pedagó- gico, os quais podem ser realizados individual- mente ou em grupos: a) momentos em que todos realizam a mesma proposta; b) momentos em que, diante de uma mes- ma proposta ou material, os alunos rea- lizam tarefas diferentes; c) momentos de propostas diversificadas, em que os grupos têm tarefas diferen- tes em função do que precisam realizar. DicionárioDicionário Heterogêneas: fem. pl. de heterogêneoheterogê- neo. heterogêneo: gregoheterogenês, -ês, de um outro gênero.gênero. adj. 1. Que se compõe de partes de natureza ou de es- pécie diferente. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 27 Assim, para organizar a classe em duplas, trios ou individualmente, devemos considerar os objetivos do docente e o nível de conhecimen- to dos alunos em relação ao conteúdo que será abordado. É fundamental que se garantam, na sala de aula, todas as organizações (individuais e coletivas), para que os alunos aprendam os pro- cedimentos tanto do trabalho individual como do trabalho coletivo. Deve-se sempre lembrar que, se os alunos estiverem trabalhando em duplas ou trios, é pre- ciso que o professor atue como parceiro expe- riente, procurando dar assistência a todos, ensi- nando-lhes os procedimentos quanto a trocas, interações e auxílio, proporcionando o desenvol- vimento da autonomia dos educandos. Além disso, deve-se perceber que todo pro- fessor precisa criar mecanismos que ajudem seus alunos a colaborar uns com os outros, por exem- plo: oferecer uma única folha para a realização da tarefa; definir claramente qual será o papel de cada aluno na dupla ou no grupo etc. Outro aspecto a ser destacado é que, se o professor organizar agrupamentos para uma de- terminada atividade, deverá levar em conta: os conhecimentos de seus alunos e as possíveis tro- cas que poderão realizar com os colegas; a perso- nalidade, as preferências e a disposição de reali- zar atividades em conjunto com um determinado colega e não com outro; o que podem aprender com a atividade proposta (o professor deve for- mular boas perguntas durante a realização da ta- refa) etc. Nunca se deve esquecer que no trabalho coletivo o professor também deve apresentar informações úteis à classe; circular pela sala, pro- pondo questões aos grupos; socializar as respos- tas; questionar, discutir como foram encontradas as respostas; estar atento aos procedimentos utilizados pelos alunos para realizar as tarefas e aos conhecimentos que revelam enquanto traba- lham. É impossível um professor acompanhar de perto todos os seus alunos; portanto, é necessá- rio que distribua esse acompanhamento ao lon- go das semanas, utilizando uma forma de registro com data, nome dos alunos observados no dia, perguntas realizadas e respostas que foram dadas pelos observados etc. Às vezes, também se faz necessário montar um esquema de ajuda pedagógica mais sistemá- tica e intensiva para os alunos cujo desempenho está se distanciando da média da classe. A função da avaliação é justamente identificar a ajuda es- pecífica de que cada um necessita ao longo de seu processo de aprendizagem e depois refletir acerca da forma como acontecerá esse atendi- mento, se por meio de uma recuperação paralela ou um de grupo de apoio extraclasse ou, ainda, na própria sala de aula, formando um grupo de apoio permanente etc. 3.5 Resumo do Capítulo Caro(a) aluno(a), no capítulo 3, vimos a importância da criação de uma rotina de trabalho em alfa- betização e outros aprendizados: A importância de organizar a rotina utilizando as modalidades organizativas que nos auxiliam em sua organização: atividades permanentes, atividades sequenciadas, atividades indepen- dentes ou ocasionais e projetos. Como é necessário o levantamento de conhecimentos prévios dos alunos para o melhor plane- jamento das atividades, propiciando o avanço desses conhecimentos. A conscientização de transformar o trabalho em sala de aula em um ambiente alfabetizador, onde a circulação de informações e as pesquisas devem estar presentes. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 28 A necessidade de trabalhar com os agrupamentos produtivos para favorecer trocas de expe- riências e aprendizagens entre os alunos. Agora que terminamos este capítulo, vamos verificar as reflexões que você consegue realizar. As- sim, responda às seguintes questões: 1. Analise o excerto a seguir e elabore uma reflexão a partir da leitura da apostila. “As crianças não aprendem simplesmente porque vêem os outros ler e escrever, e sim porque ten- tam compreender que classe de atividade é essa. As crianças não aprendem simplesmente porque vêem letras escritas, e sim porque se propõem a compreender por que essas marcas gráficas são diferentes de outras. As crianças não aprendem apenas por terem lápis e papel à disposição, e sim porque buscam compreender o que é que se pode obter com esses instrumentos.” (FERREIRO; TE- BEROSKY, 1984, p. 95). 2. Imagine a seguinte situação-problema: Você é professor(a) em uma escola, e um colega do 1º ano solicitou sua colaboração para montar agrupamentos produtivos – com a preocupação de responder às necessidades dos alunos e permitir bons problemas a resolver. Ele planejou uma atividade de leitura para os alunos. Para auxiliá-lo nessa decisão, você observará as escritas das crianças. O professor priorizou essas crianças para acompanhar o desenvolvimento da atividade. Defina as du- plas e explique o porquê da escolha. 3.6 Atividades Propostas Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 29 Dupla Motivo da escolha Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 31 O QUE É LETRAMENTO?4 Caro(a) aluno(a), no capítulo 4, abordare- mos a diferença entre letramento e alfabetização, na tentativa de esclarecer bem esses conceitos para que você saiba reconhecer em suas ações pedagógicas quais são as que favorecem a aqui- sição do código escrito, a alfabetização, e quais propiciam a ampliação do nível de letramento dos alunos. Existe uma palavra nova que vem sendo muito utilizada no vocabulário da Pedagogia e das Ciências Linguísticas: letramento. No Dicio- nário Contemporâneo da Língua Portuguesa, en- contramos como um vocábulo ‘ant’; isto é, antigo, antiquado, e este lhe atribui o significado de ‘es- crita’, palavra vinda do verbo ‘letrar’. Hoje em dia, ao termo ‘letramento’, atri- buem-se outros significados, porque recente- mente passamos a vivenciar um novo momento social, no qual não basta apenas ler e escrever, e sim saber fazê-los em todas as situações cotidia- nas em que se fizerem necessários. Precisamos responder às exigências sociais do ler e escrever. Dessa forma, surge o termo ‘letramento’ em detri- mento do termo ‘alfabetismo’. O novo significado de letramento (palavra traduzida, ao pé da letra, vinda do inglês literacy: letra – do latim littera, e o sufixo – mento) resulta da ação de ensinar ou aprender a ler e a escrever. Consideramos letrada uma pessoa que aprende a ler e a escrever e usa a leitura e a escrita no seu dia a dia. Concluímos que letramento resulta do processo de aquisição da leitura e da escrita, bem como da apropriação de suas práticas sociais. É importante saber que existem níveis de letramento. Uma pessoa pode não estar alfabeti- zada, porém conseguir fazer uso das práticas so- ciais com a ajuda de outros alfabetizados, como, por exemplo, ditar uma carta para outra pessoa escrever conhecendo a linguagem utilizada do discurso, ou seja, o gênero apropriado, bem como sua estrutura e características. O inverso também ocorre. Uma pessoa lê e escreve, porém não se uti- liza de práticas sociais de leitura e escrita em seu cotidiano. Essas pessoas são conhecidas como analfabetos funcionais, porque conhecem o có- digo escrito, decifram palavras, frases, mas não compreendem a mensagem trazida pelo texto e, portanto, não são capazes de executar tarefas por meio da leitura ou escrita. Segundo Soares (1998), atualmente, é mui- to comum encontrarmos países que avaliam o uso da escrita e leitura de sua população e o quanto se apropriam das práticas sociais letradas. Sendo assim, é importante compreenderque esses paí- ses não estão levantando índices de analfabetos, como pensávamos anteriormente, e sim os níveis de letramento de sua população. Nós, brasileiros, ainda estamos preocupados com os índices de analfabetismo, isto é, com a aquisição do código da escrita. Aqui, trouxemos, como curiosidade, um poema que procura definir o conceito de letra- mento. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 32 Saiba maisSaiba mais Letramento definido em um poema: O que é Letramento? Letramento não é um gancho em que se pendura cada som enunciado, não é treinamento repetitivo de uma habilidade, nem um martelo quebrando blocos de gramática. Letramento é diversão é leitura à luz de vela ou lá fora, à luz do sol. São notícias sobre o presidente, o tempo, os artistas da TV e mesmo Mônica e Cebolinha nos jornais de domingo. É uma receita de biscoito uma lista de compras, recados colados na geladeira, um bilhete de amor; telegramas de parabéns e cartas de velhos amigos. É viajar para países desconhecidos, sem deixar sua cama, é rir e chorar com personagens, heróis e grandes amigos. É um Atlas do mundo, sinais de trânsito, caças ao tesouro, manuais, instruções, guias, e orientações em bulas de remédios, para que você não fique perdido. Letramento é, sobretudo, um mapa do coração do homem, um mapa de quem você é, e de tudo que você pode ser. Kate M. Chong (apud SOARES, 1998). 4.1 A Distinção entre Escrita, Alfabetização e Letramento Neste momento, é importante fazermos uma distinção entre os seguintes conceitos: alfa- betização, letramento e escrita. A primeira pergunta que nos ocorre é: “Alfa- betização, letramento e escrita podem ser enten- didos separadamente?”. No nosso enfoque, não. A alfabetização trata da aquisição de habilidades de leitura e de escrita por uma pessoa ou por um grupo de pes- soas. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 33 O letramento evidencia os aspectos sócio- -históricos da aquisição da escrita. Descreve os fatos e analisa o que ocorre na sociedade quando utiliza um sistema de escrita de maneira restrita, estuda quais práticas psicossociais substituem as práticas “letradas” em sociedades ágrafas. Des- se modo, o letramento investiga tanto quem é al- fabetizado como quem não é alfabetizado, visan- do ao social em vez de centrar-se no individual. DicionárioDicionário Psicossociais: pl. (psico- + social) adj. 2 g. Relativo à psicologia individual e à vida social. Caro(a) aluno(a), neste item, queremos pro- por-lhe uma reflexão: o que é a Escrita? Ela é o produto cultural de uma determina- da sociedade. Exige consciência, reflexão, poder de decisão, historicidade, construção e transfor- mação da natureza. A propagação dos sistemas de escrita foi lenta e sujeita à política. Alertamos que a escrita não é neutra; ela traz consigo as relações de poder e de dominação que existem em toda sociedade. A partir do exposto, podemos refletir acerca das seguintes questões: a) Qual a finalidade da escrita? b) A escrita serve para difundir as ideias ou ocultá-las? c) O propósito da escrita é garantir o po- der de alguns que têm acesso a ela? Ressaltamos, aqui, a importância de saber- mos que, atualmente, em alguns casos, a escrita contém as ideias das classes ou dos grupos domi- nantes de forma a ocultar suas intenções. Na China temos outro exemplo dessa não-neutralidade, agora relativo ao tipo de código escrito adotado: o sistema ideográfico da escrita chinesa funcionou durante séculos como forma de garantir o poder aos burocratas e religiosos (con- 4.2 Escrita fucionistas). Com efeito, tanto a quanti- dade elevada quanto o grau de sofisti- cação dos ideogramas são barreiras que impedem que as pessoas do povo pos- sam aprender a ler e escrever. Kathleen Gough (1968, p. 68), falando sobre a questão, relata que ‘apesar de a escrita alfabética ser conhecida dos chi- neses desde o século II d.C., eles se re- cusaram a aceitá-la até a época atual [...] provavelmente porque seu código mais desajeitado [...] havia, há séculos, se tor- nado o meio de expressão de uma vasta produção literária, além de estar inexpli- cavelmente ligado às instituições religio- sas e de ser aceito como marca distinta das classes educadas. (TFOUNI, 1995, p. 11-12). Aqui, podemos observar que a escrita não representa apenas os interesses dos dominantes, dos excluídos e poderosos; também pode estar associada ao desenvolvimento social, cognitivo e cultural dos povos, promovendo mudanças nos seus hábitos comunicativos. Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 34 Enfim, o aparecimento das civilizações modernas, bem como o seu desenvolvimento científico, tecnológico e psicossocial, desenvolveram-se como consequência da escrita. Saiba maisSaiba mais “No Ocidente, a escrita alfabética (sistema fonográfico, em que sinais gráficos representam sons de fala) foi introduzida na Grécia e Jônia por volta do século VIII a.C. Inicialmente, contudo, não ocorreram mudanças decorrentes na cultura de tradição oral daquela sociedade, visto que o processo de difusão de um sistema escrito é demorado, levando, muitas vezes, séculos. Por esse motivo é que somente nos séculos V e VI a.C. foi possível reconhecer a sociedade grega como generalizada- mente ‘letrada’. Não é por coincidência que esse seja o momento histórico em que a sociedade grega passou por um processo de radicais transformações culturais e político-sociais. O aparecimento, entre outras coisas, do pensamento lógico-empírico e filosófico, a formalização da história e da lógica enquanto disciplinas intelectuais, e a própria democracia grega tem íntima relação com a expansão e a solidificação fonética na Grécia e Jônia.” (TFOUNI, 1995, p. 13-14). 4.3 Alfabetização Caro(a) aluno(a), neste item, definiremos o que é alfabetização. A compreensão desse con- ceito é necessária para que um professor torne-se mestre na arte de alfabetizar. Prosseguindo: Segundo Tfouni (1995), a al- fabetização pode ser entendida de duas formas: a) processo de aquisição individual de habilidades requeridas para a leitura e escrita. Aqui há a necessidade de uma especial atenção no que tange à inter- pretação que pode ser dada, uma vez que a alfabetização não deve ser re- duzida à aquisição de objetivos instru- cionais, mas como um processo que se caracteriza pela incompletude. A des- crição dos objetivos a serem alcança- dos deve-se à necessidade de controle mais da escolarização do que da alfa- betização, ou seja, a alfabetização está ligada à instrução formal e às práticas escolares. A alfabetização vista sob a luz do sociointeracionismo, enquanto pro- cesso individual, não se completa nun- ca, considerando que a sociedade está em permanente processo de transfor- mação, e a atualização individual para acompanhar as mudanças é constante; b) processo de representação de objetos diversos, de naturezas diferentes. Nessa perspectiva, Emilia Ferreiro evidencia que a alfabetização não é apenas codi- ficação e decodificação de sinais gráfi- cos, mas um processo de simbolização. [...], o processo de representação que o indivíduo deve aprender a dominar du- rante a alfabetização não é linear (som- -grafema); é antes um processo comple- xo, que acompanha o desenvolvimento, e que passa por estágios que vão desde a microdimensão (por exemplo, represen- tar o som |s| com os grafemas ss (osso), c (cena), sc (asceta), xc (exceto), etc.) até um nível mais complexo (representar o interlocutor ausente durante a produção de uma carta, por exemplo). (apud TFOU- NI,1995, p. 19). DicionárioDicionário Microdimensão:1 Extensão pequena em qualquer sentido; tamanho, medida, volume. Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 35 Continuando nossas reflexões, convido- -o(a), agora, a pensar sobre o letramento. Os aspectos sócio-históricos da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade são ob- jetivos do letramento. Para investigar esse fenômeno, os pesqui- sadores do letramento estudam as pessoas não alfabetizadas e as alfabetizadas. Estudam as con- sequências da ausência da escrita em nível indivi- dual, mas sempre visando ao social. A escrita, ou a ausência desta, traz causas e consequências de transformações sociais, cul- turais e psicológicas na sociedade. O letramento, como já mencionamos, causa transformações históricas, como o aparecimento da imprensa, da sociedade industrial, da máquina a vapor, e é tido como um produto do desenvolvimento do comércio e da diversificação dos meios de produ- ção. Segundo Vygotsky (1984), os processos mentais superiores são maneiras mais sofistica- das de uso do comportamento humano, e o le- tramento é uma elaboração inserida nesses com- portamentos, como: memória ativa, resolução de problemas, raciocínio abstrato etc. Para Vygotsky, a vivência em sociedade é essencial para a transformação do ho- mem de ser biológico em ser humano. É pela APRENDIZAGEM nas relações com os outros que construímos os conheci- mentos que permitem nosso desenvol- 4.4 Letramento vimento mental. Segundo o psicólogo, a criança nasce dotada apenas de FUN- ÇÕES PSICOLÓGICAS ELEMENTARES, como os reflexos e a atenção involuntá- ria, presentes em todos os animais mais desenvolvidos. Com o aprendizado cultural, no entanto, parte dessas funções básicas transforma- -se em FUNÇÕES PSICOLÓGICAS SUPE- RIORES, como a consciência, o planeja- mento e a deliberação, características exclusivas do homem. Essa evolução acontece pela elaboração das informa- ções recebidas do meio. (PELLEGRINI, 2001, p. 2). Saiba maisSaiba mais Lev S. Vygotsky (1896-1934), professor e pesquisa- dor, foi contemporâneo de Piaget e nasceu em Or- sha, pequena cidade da Bielorrússia, em 17 de no- vembro de 1896. Viveu na Rússia; quando morreu, de tuberculose, tinha 37 anos. Construiu sua teoria tendo por base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendi- zagem nesse desenvolvimento, sendo essa teoria considerada histórico-social. Sua questão central é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio. Prezado(a) aluno(a), assista a este vídeo: Escrita pelo aluno para aprender a escrever. Você aprenderá mais um pouco sobre a alfabetização. Link: http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/alfabetizacao-inicial/escrever- -aprender-431517.shtml MultimídiaMultimídia Cecília Regina Carlini Ferreira Coelho e Rita de Cássia Geraldi Menegon Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 36 Dando continuidade a nossa conversa, que- remos lembrar que temos oportunidades de letra- mento a todo momento nas diferentes instâncias da vida social, porque vivemos em uma socieda- de letrada. É função da escola ensinar a ler e a es- crever e ampliar o uso da leitura e da escrita. De que letramento estamos falando? De acordo com Street, citado por Soares (1998), letramento é um termo síntese para resumir as práticas sociais e as concepções de leitura e escrita e tem significado ideológico do qual não pode ser separado. Assim, podemos concluir que as práticas sociais de letramento possibilitam ao indivíduo olhar o mundo de forma diferente; desse modo, cada área de conhecimento torna-se uma jane- la a ser aberta. Abrir essas janelas para a leitura crítica de mundo requer, antes de qualquer coisa, que a escola reflita sobre o papel do Ensino Fun- damental. Que conhecimentos, habilidades, valo- res, atitudes pretende-se que as crianças e jovens desenvolvam e como desenvolvê-los? É essencial perceber que o currículo é o ins- trumento privilegiado para essa finalidade já ex- posta. A seleção de conteúdos a serem ensinados e o modo de ensiná-los são decisões dos profes- sores que devem levar em conta as experiências vividas pelos alunos na escola e fora dela. É fun- damental que os professores escolham entre os diversos saberes os conhecimentos que precisam ser ensinados em sua área, conteúdos de relevân- cia social, de forma que auxiliem jovens e crianças a ampliar os conhecimentos acerca do lugar onde residem, tornando-se conhecedores da sua reali- dade e podendo, assim, transformá-la, visto que um sujeito letrado pode modificar sua condição em vários aspectos, como sociais, psíquicos, cul- turais, políticos, cognitivos, linguísticos e econô- micos. Já o sujeito iletrado é aquele que não con- segue exercer todos os seus direitos de cidadão, pois é excluído socialmente devido a sua falta de conhecimentos referente aos usos diários da lín- gua. Não é esse o quadro que precisamos rever- ter? Não existe outra saída, só mesmo por meio da educação. É importante lembrar também que alguns professores já contribuem com a aprendizagem de seus alunos nesse sentido, pois passaram a organizar conteúdos com uma metodologia de ensino capaz de trazer para o interior das escolas o uso de práticas sociais cotidianas. Estão preocu- pados em ensinar seus alunos a ler e a produzir textos em diversos gêneros e linguagens – textos que circulam em nosso meio social em Portu- guês, Arte, Matemática, Educação Física, Ciências, História e Geografia, tais como: mapas, gráficos, fórmulas matemáticas, representação do movi- mento humano, música, teatro, dança, desenho, esculturas, filmes, fotografias, pintura, contos, fá- bulas, notícias, propagandas, poemas, situações- -problema, relatos históricos etc., importantes para a formação de um cidadão, rompendo com ações pedagógicas tradicionais e empiristas, re- produtoras do contexto social que desejamos transformar. AtençãoAtenção “Letramento pode ser visto de dois ângulos: de um lado, tem a ver com as práticas sociais que integram a produção e a leitura de materiais es- critos, por outro lado tem a ver com conceitos, valores, normas socioculturais subjacentes ao que é considerado um desempenho letrado numa dada situação.” (SÃO PAULO, 2003, p. 8). AtençãoAtenção “A escola encontra-se desafiada a deslocar o foco do conteúdo para o sujeito humano e reconhece que só alcançará esse objetivo através de uma nova relação com o conhecimento. Nesse sentido é que a valorização dos espaços mediadores de lei- tura como eixo onde se estrutura o conhecimento nos parece o caminho para que esses sujeitos se desenvolvam plenamente, na alegria constante da descoberta, na troca e no partilhamento de dúvi- das, de certezas, de constatações, de buscas indivi- duais e coletivas.” (SÃO PAULO, 2003, p. 10). 4.5 Letramento em Todas as Áreas do Conhecimento Alfabetização e Letramento Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 37 No capítulo 4, concluímos que: A alfabetização trata da aquisição de habilidades de leitura e de escrita por uma pessoa ou grupo de pessoas. Trata-se do conhecimento e da apropriação do código escrito e suas regras de funcionamento. O letramento evidencia os aspectos sócio-históricos da aquisição da escrita, investigando tanto quem é alfabetizado como quem não é alfabetizado, visando ao social em vez de centrar-se no individual. Também resulta do processo de aquisição da leitura e da escrita, bem como da apropriação de suas práticas sociais. A escrita é o produto cultural de uma determinada sociedade. Exige consciência, reflexão, po- der de decisão, historicidade, construção e transformação da natureza. Temos oportunidades de letramento a todo momento nas diferentes instâncias
Compartilhar