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ANÁLISE DE "AMOR DE SALVAÇÃO", DE CAMILO CASTELO BRANCO, SOB A PERSPECTIVA DA NOVELA PASSIONAL. Propp. Estrutura da narrativa.

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ANÁLISE DA OBRA AMOR DE SALVAÇÃO, DE CAMILO CASTELO BRANCO, 
SOB A PERSPECTIVA DA NOVELA PASSIONAL 
 
 
 
 
 
RESUMO: Este artigo busca fazer uma análise sucinta acerca das características da novela passional 
presentes na obra Amor de salvação, de Camilo Castelo Branco. Desta forma, o objetivo deste trabalho 
é criar um diálogo entre teoria e prática. Para isto, o presente artigo fundamenta-se em Fernandes (2013), 
Franchetti (2007) Saraiva (2010) e Sousa (2009). A importância do trabalho reside na exploração desta 
temática que foi muito disseminada na literatura, porém pouco compreendida por conta da escassez de 
materiais que possibilitem ao leitor ampliar seu entendimento e, dessa forma, criar pontes viáveis entre 
a teoria literária e a sua prática. O artigo está organizado em duas partes: a primeira fará uma breve 
contextualização e localização teórica sobre o tema, enquanto a segunda buscará analisar trechos da obra 
e relacioná-los à teoria. 
Palavras-chave: Novela Passional. Análise. Teoria e Prática 
 
 
1. Considerações iniciais 
O presente trabalho pretende fazer uma breve análise acerca das características 
passionais presentes na obra Amor de salvação, de Camilo Castelo Branco. Esta obra foge à 
regra da novela passional, a qual tem como característica sempre ter um aspecto trágico na 
trama. Amor de salvação, como o próprio nome diz, não se configura pela tragédia, como 
ocorreu em Amor de perdição, pois aqui Camilo tenta uma nova configuração do amor, este 
como redenção. Para a análise, buscar-se-á dialogar os trechos da obra supracitada com os 
pontos mais importantes da novela passional. 
A relevância do trabalho consiste na ampliação de conhecimento desta temática que foi 
muito difundida na literatura e no teatro, mas ainda assim, escassa de referências. Como 
fundamentação teórica, serão utilizadas a seguintes referências: “As formações discursivas da 
memória na composição da narrativa”, de José Guilherme Fernandes (2013); “A novela 
Camiliana”, de Paulo Franchetti (2007); “História da literatura portuguesa”, de José Saraiva 
(2010) e “A ficção Camiliana: a escrita em cena”, de Moizeis Sobreira de Sousa (2009). O 
trabalho será estruturado da seguinte forma: a primeira seção fará uma breve contextualização, 
localização teórica e discussão a respeito das características da novela passional; na segunda 
seção, será analisada a novela Amor de salvação em consonância com as exposições feitas 
anteriormente, criando, dessa forma, um diálogo que direcionará o leitor a identificar as 
características da novela passional na obra de Camilo Castelo Branco. 
 
2. Breve contextualização 
O movimento romântico Português surgiu no contexto da Guerra Civil, que se estendeu 
de 1832 até 1834. Com a vitória dos Liberais, ocorreu a ascensão da burguesia e, com isso, 
iniciou-se um novo período na economia e na sociedade portuguesa. Com o surgimento deste 
novo público, surgiu também uma nova demanda pela literatura, e foi dentro desse contexto 
político e social que o romantismo ganhou forças. 
O romantismo foi oficialmente inaugurado em Portugal em 1825 com a publicação do 
poema Camões, de Almeida Garret. O movimento Romântico português apresentou três fases 
distintas: a primeira fase ainda apresentava muitas características neoclássicas e possuía uma 
forte tendência nacionalista, seus principais representantes foram Garret, Herculano e Castilho; 
já a segunda fase foi chamada de ultrarromântica, e teve como representantes basais Soares de 
Passos e Camilo Castelo Branco; por último, a terceira fase Romântica portuguesa, a qual 
seguiu a mesma linha do movimento europeu, no entanto adaptou-se ao contexto social, 
econômico e cultural do país. 
Além disso, cabe aqui enfatizar o segundo momento do Romantismo Português, período 
que se estende de 1838-1860, no qual o ideal romântico era cultuado para além dos parâmetros 
estéticos, essa tendência ficou conhecida como ultrarromântica. Nesse período, destaca-se a 
figura de Camilo Castelo Branco, dono de uma extensa obra. Suas produções são variadas, vão 
da poesia lírica ao teatro, no entanto ele destaca-se no gênero novela, segundo Saraiva (2010, 
p.782) “ [...] até cerca de 1875, Camilo depura o esquema da novela passional, dando-lhe o 
máximo da intensidade dramática, avivando-lhe o ritmo narrativo”. Apesar das diferenças que 
permeiam suas obras, a temática do culto ao amor é um fator comum a todas elas. 
 
3. A novela passional Camiliana 
Em Camilo, a figura do homem é sempre combatente diante dos obstáculos que a 
sociedade lhe impõe, afastando-o do objeto de desejo. As relações que envolvem a trama 
Camiliana sempre estão associadas à proibição, pecado, desejo, amor não permitido e valores 
morais que conferem sempre um tom de amor sofredor. A figura da mulher na novela de Camilo 
Castelo Branco é sempre colocada num nível de elevação, conforme afirma Saraiva: 
 À mulher confere-se sempre um papel da mais nobre dignidade (geralmente angélica, 
por vezes demoníaca), mas tal supremacia esvazia-se, na realidade, de sentido 
psicológico, reduzindo-se a um símbolo poético do misterioso eterno feminino, e às 
vezes a uma personificação abstracta do espírito de sacrifício (SARAIVA, 2010, 
p.784) 
 
As personagens femininas são extremamente ativas na trama Camiliana e são 
responsáveis pelas ações que permeiam a narrativa. O amor na novela passional está sempre 
acompanhado de uma proibição social ou de um sentimento religioso, fatores que parecem 
indissociáveis nesse tipo de trama e que criam um obstáculo para a consumação do amor entre 
o homem e a mulher. Assim, torna esse sentimento inatingível e configura à mulher o papel de 
uma vítima angelical, ou de uma mulher fatal. 
A luta entre razão e emoção é constante na novela passional. A busca pelo objeto da 
paixão e sua não realização direciona o herói romântico a um fim trágico, e essa morte funciona 
como uma espécie de redenção na narrativa. No caso de Amor de salvação, a própria 
concretização do amor configura a redenção, no entanto verifica-se que esta é uma exceção nas 
novelas passionais de Camilo Castelo Branco e, mesmo com a concretização do amor, a busca 
pelo objeto de desejo é sempre muito frustrante e dolorosa. 
 
4. Análise da obra sob a perspectiva da novela passional 
A narrativa discorre sobre o amor vivido entre Afonso de Teive, Teodora/Palmira e 
Mafalda, um triângulo amoroso um tanto quanto disforme. A história é contada por um narrador 
que, à primeira vista, pode ser classificado como heterodiegético: que não participa da história. 
No entanto, no decorrer narrativa, vemos que se trata, na verdade, de um narrador 
homodiegético (ou testemunha), pois não é o personagem principal, mas narra acontecimentos 
dos quais participou, mas sem grande destaque. Além disso, esse narrador dá voz a Afonso de 
Teive (protagonista), fazendo-se assim uma mescla entre as vozes. Há momentos em que o 
narrador escreve em terceira pessoa, mas há momentos em que dá voz a Afonso. 
Além disso, tem-se as personagens secundárias: Teodora e Mafalda. Teodora, diferente 
de Teresa (Amor de Perdição), é mostrada como uma mulher de “pulso firme” e que sabe o que 
quer. Inicialmente, é descrita por Afonso como uma “santa de rosto mavioso”, mas no decorrer 
da narrativa essa posição vai sendo substituída pela de “demônio”, pois Teodora trai o marido, 
trai o amante e é vista como uma mulher fútil pelo protagonista. Mafalda, por outro lado, é 
comparada a um “anjo solitário que vê com olhos puros” as coisas do mundo: é simples, 
humilde, paciente e sem maldade no coração. No decorrer da narrativa, surgem outros 
personagens, os quais influenciam, de certa forma, a trama. No entanto, para o fim dessa análise, 
não se faz necessário detalhá-los. 
Ademais, em relação aos espaços na narrativa, tem-se o Minho, que é onde o narrador 
reencontra Afonso depois de anos sem vê-lo. Lisboa,para onde Afonso e Teodora fogem e vão 
viver juntos, e Ruivães, onde Afonso e Mafalda se casam e vão morar juntos. Em relação ao 
tempo, pode-se dizer que se divide entre cronológico e psicológico. Há uma certa linearidade, 
pois tem-se uma linha do tempo com os principais acontecimentos que marcaram a vida do 
protagonista. Por outro lado, pode-se notar muitas digressões, as quais correspondem às 
memórias de Afonso durante a narrativa. 
Ao se fazer uma comparação com Amor de Perdição, pode-se notar que há muita 
semelhança, mas muda-se um pouco a configuração do enredo. Isso já fica explícito logo no 
título da obra: salvação, que significa “resgate, passagem de uma situação difícil para outra 
tranquila. ” A salvação é representada por Mafalda, a qual retira o protagonista da obscuridade 
do sofrimento, e a perdição é representada por Teodora, a qual leva o protagonista à decadência. 
Nesse trabalho, ousamos formular uma hipótese sobre a estrutura da novela passional. 
Não significa que todas as histórias passionais seguirão, necessariamente, esse modelo. 
Basicamente, a novela passional possui a seguinte configuração, se observarmos alguns enredos 
das novelas camilianas: 1. carência (o amor proibido); 2. interdição (a sociedade e os 
opositores diretos); 3. violação (a mulher que foge do convento, ou que busca meios para fugir, 
o homem que mata o opositor, etc.); 4. consequência ou dano (a morte dos amantes, sua 
separação, ou morte do opositor e a ‘burla’ dos costumes sociais); 5. reparação do dano (após 
os embates, vive-se o amor). No meio dessa sequência, tem-se o sofrimento e o lirismo amoroso 
constante; é como se eles formassem o fio condutor que perpassa todo o enredo até se chegar 
ao grande final, que pode ser a perdição ou a salvação. No entanto, em Amor de Salvação, essa 
ordem de acontecimentos ocorre de maneira diferente. A narrativa parece ser dividida em dois 
momentos: o amor entre Afonso e Teodora e entre Afonso e Mafalda. Mais adiante, veremos 
como isso acontece na prática. 
Esse modelo de sequência motivêmica fora utilizado por Fernandes (2013)1 para se 
analisar narrativa orais. O referido autor teve como base os estudos de Vladimir Propp acerca 
da estrutura dos contos maravilhosos. É claro que nosso intuito, aqui, não é fazer esse tipo de 
análise. O objetivo de fazer esse conciso esquema é mostrar ao leitor o que podemos esperar de 
uma narrativa que versa sobre o tema da novela passional. 
Além disso, tal novela, conforme visto em Sousa (2009): “é caracterizada pela 
preeminência do idealismo amoroso, em que o sentimento [...] é promovido à categoria do 
incomensurável, assumindo o estatuto de religião, de maneira tal que as tentativas de 
consumação do amor são acompanhadas pela lembrança do pecado. ” O tema da religião é 
muito presente na novela passional camiliana, com a figura da moça angelical que vai para o 
convento e é impedida de viver um grande amor. Podemos dizer, então, que aqui temos a 
carência. Vejamos um trecho de Amor de Salvação: 
Apenas falecida sua mãe, Teodora foi recolhida ao Convento das Ursulinas, por 
deliberação de um tio paterno, constituído espontaneamente tutor da órfã. Afonso, 
aconselhado pelo coração e por sua mãe, visitava a educanda, disfarçando as 
frequentes visitas com a inocente mentira de parentesco. (CASTELO BRANCO, n.p) 
 
 
Teodora, assim como Teresa, fora recolhida ao convento e impedida de viver o “amor 
real” com Afonso. Isso também é muito característico da novela passional: o amor idealizado, 
inatingível. O enredo gira em torno desse amor proibido, o qual só terá chances de ser realizado 
ao final, após as personagens passarem pelo mar de lágrimas e sofrimento. Há, então, a 
predominância da paixão desenfreada que busca ser realizada a todo custo. Além disso, 
simultaneamente ao amor proibido, tem-se as interdições, conforme pode-se observar no 
trecho: 
Vagamente informado da situação da sua amada, Afonso de Teive foi à portaria do 
convento, no heroico propósito de ir arrancar a vítima de sobre as asas da teocracia 
despótica. A porteira, senhora de óculos e de muita virtude, ofereceu peito de mártir 
às injúrias ímpias do acriançado amante. (CASTELO BRANCO, n.p) 
 
 Afonso vai até o convento (assim como Simão), no entanto não consegue vencer a 
barreira que lhe é imposta, a saber, física e moral: os portões e as normas sociais preconizadas. 
A sociedade pode ser vista como uma opositora “mediata”, pois no decorrer do enredo surgem 
 
1 Vale ressaltar que fizemos uma adaptação da sequência motivêmica proposta pelo referido autor para que 
pudéssemos utilizá-la aqui, uma vez que ele trabalha sob outra perspectiva. 
outras figuras que assumem o papel de opositoras “imediatas”, digamos assim, como no 
fragmento: 
Teodora, quando acordou na manhã seguinte, viu duas imagens: uma enevoar-se e 
esvair-se como sonho que a memória não pode já reter: era a imagem de Afonso; outra 
avultou-lhe completa nos menores traços, radiosa, animada e animadora: era a 
imagem de Eleutério Romão dos Santos. (CASTELO BRANCO, n.p) 
Eleutério, primo de Teodora, parece ser esse opositor direto na história de amor entre 
ela e Afonso. No entanto, a personagem não se importa com a afetividade de seu primo, mas 
somente com o desejo de liberdade: 
Amava ela Eleutério Romão?! Não amava, disse-o ela, e eu juro nas palavras de 
Teodora. O que ela amava era a liberdade; os anelos de sua alma ansiavam sôfregos 
um viver, que o temperamento lhe estava pedindo a gritos, gritos que a sociedade não 
escuta, não acredita e não perdoa. (CASTELO BRANCO, n.p) 
 
 Nesse trecho, é possível notar as características mencionadas acima: a interdição entre 
os amantes, a qual é representada por Eleutério, pois ele e Teodora casam-se, o que causa o 
sofrimento de Afonso; e pela sociedade, pois segundo Teodora: ela “não escuta, não acredita e 
não perdoa. ” 
 Como visto anteriormente, a narrativa parece ser dividida em dois momentos: Afonso e 
Teodora/ Afonso e Mafalda. Assim, muda-se a ordem da sequência motivêmica proposta acima, 
a saber: 1. carência (o amor proibido); 2. interdição (a sociedade e os opositores diretos); 3. 
violação (a mulher que foge do convento, ou que busca meios para fugir, o homem que mata o 
opositor, etc.); 4. consequência ou dano (a morte dos amantes, sua separação, ou a morte do 
opositor e a ‘burla’ dos costumes sociais); e a 5. reparação do dano (após os embates, vive-se 
o amor). 
Nessa narrativa, a carência é a proibição do amor entre Afonso e Teodora; a interdição 
surge por meio do casamento entre Teodora e Eleutério e a violação dos preceitos morais e 
sociais ocorre quando Teodora trai o marido Eleutério (com Afonso). Porém, muda-se a ordem 
e nos é dada, logo, a reparação do dano: 
Estou livre. Aqui me tens, Afonso. Aqui está a tua Palmira, com o virgem coração que 
lhe conheceste, mais valioso do que era, mais depurado dos instintos maus, graças aos 
trabalhos que me angustiaram a vida [...] Volvido um mês sobre os sucessos descritos, 
Afonso de Teive e Palmira que nunca mais se chamou Teodora viviam num palacete 
ao Campo Grande, por ser entrada a sazão estiva. (CASTELO BRANCO, n.p) 
 
Nesse trecho, os amantes vivem o amor proibido ao fugirem para Lisboa. Entretanto, 
esse momento de felicidade não dura por muito tempo, pois tem-se, em seguida, o resultado da 
consequência ou dano, com a separação de Teodora e Afonso: 
Pois saia, tornei eu, mas leve consigo o esterco com que sujou a minha casa! E, 
dizendo, atirei-lhe ao rosto os macetes das cartas. Palmira fugiu da sala em 
arremetidas de louca [...] E eu caí extenuado sobre uma cadeira, pensando morrer ali 
afogado de congestão de sangue no coração (CASTELO BRANCO, n.p) 
 
Talvez essa reviravolta de acontecimentos ocorra em função das atitudes dessa 
“mocinha apaixonada” às avessas (em comparaçãoa Teresa), pois Teodora trai Eleutério e trai 
Afonso, o que se distancia um pouco da imagem que temos da mulher romântica: pura, como 
um anjo. Com isso, a narrativa parece se estender para um segundo momento, o qual é 
preenchido pelo tão esperado final feliz: a história, até então em segundo plano, entre Afonso e 
Mafalda. Para esse segundo momento, não nos cabe formular outra hipótese de sequência 
motivêmica passional, como fizemos sobre a história de amor entre Afonso e Teodora, o que 
vale mostrar é que, após todo o sofrimento do protagonista, finalmente ocorre a tão esperada 
reparação do dano: o amor de salvação: 
Aqui tens a minha vida, a vida dos dois homens que na curta passagem de quarenta 
anos tocaram as duas extremas do infortúnio pela desonra e da felicidade pela virtude. 
Uma mulher me perdeu; outra mulher me salvou. A salvadora está ali naquele ermo, 
glorificando a herança que minha mãe lhe legou: o anjo desceu a tomar o lugar da 
santa: a um tempo se abriu o Céu à padecente que subiu e à redentora que baixou no 
raio da glória dela. (CASTELO BRANCO, n.p) 
 
Tendo como base as explicações dadas anteriormente, convém relembrar o que ocorre 
em Amor de Perdição: lá, a narrativa termina com o fim trágico, que fora a consequência ou 
dano das atitudes do protagonista. Por outro lado, em Amor de Salvação, a narrativa termina 
com o final feliz do protagonista (no segundo momento da história): a reparação do dano, que 
é a vivência com Mafalda. Com isso, confirma-se o que havíamos posto anteriormente: Amor 
de Salvação vai de encontro ao modelo preconizado de novela passional, pois desagua no mar 
de felicidade e nos dá um final um tanto quanto “às avessas”. 
5. Considerações finais 
O presente trabalho teve como objetivo fazer uma breve análise acerca das 
características passionais presentes na obra Amor de salvação, de Camilo Castelo Branco. Para 
isso, fizemos algumas considerações sobre a temática da novela passional e sobre o movimento 
Romântico no qual o referido autor estava inserido. Além disso, formulamos uma hipótese de 
estrutura de tal novela, tendo como base o trabalho de Fernandes (2013): 1. Carência, 2. 
Interdição, 3. Violação, 4. consequência ou dano, 5. reparação do dano. Tal formulação foi 
muito relevante, pois nos permitiu mostrar um panorama concernente à temática passional e, 
assim, aplica-lo à prática. No entanto, conforme mencionamos na seção de análise, nem todas 
as histórias passionais seguirão, necessariamente, esse modelo. Um exemplo bem evidente 
disso é o próprio objeto de estudo desse trabalho: Amor de Salvação, uma vez que não termina 
com um fim funesto, mas sim com a realização de um grande amor. 
Assim, com base na análise realizada nesse trabalho, pudemos concluir que Amor de 
Salvação foge à regra da novela passional, a qual tem como característica ter sempre um aspecto 
trágico em sua trama. Tal novela, como o próprio nome diz, não se configura pela tragédia, 
como ocorreu em Amor de perdição, pois aqui Camilo tentou uma nova configuração do amor, 
este como redenção. 
Referências 
CASTELO BRANCO, Camilo. Amor de Salvação. [Versão E-book]. 
FERNANDES, José Guilherme dos Santos. As formações discursivas da memória na 
composição da narrativa. In: Boitatá, Londrina, n 16, p. 106, 2013. 
FRANCHETTI, Paulo. A novela Camiliana. In: Estudos de Literatura Brasileira e 
Portuguesa. Cotia, São Paulo: Ateliê Editorial, 2007, p. 87-101. 
SARAIVA, Antônio José. A novela camiliana: sua evolução. In: História da Literatura 
Portuguesa. Porto, Portugal: Porto Editora, 2010, p.780-792 
SOUSA, Moizeis Sobreira de. A ficção camiliana: a escrita em cena. 2009. 123 f. Dissertação 
(Mestrado em Literatura Portuguesa) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, 
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.

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