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Capítulo 5 Teoria da crise e prevenção específica O conceito de "crise de desenvolvimento" formulado por Erikson (1959) designa períodos da evolução do indivíduo em que o comportamento é "dediferenciado". São períodos de transição; surgem nas etapas do desenvolvimento normal da personalidade em que uma fase é qualitativamente diferente da anterior, ocorrendo tensões cognitivas e afetivas . Às crises de desenvolvimento contrapõe Erikson a noção de "crises acidentais", períodos de tensão análogos aos anteriores, mas precipitados por acontecimentos vitais envolvendo perda, ameaça de perda ou aumento de suprimeJ\tO de bens afetivos, físicos ou materiais. Caplan, em seu excelente Principies of Preventive Psychiatry (1964), apresenta-nos uma teoria da crise partindo do conceito de homeostase adaptativa, desequilíbrio e reequilíbrio. O equilíbrio é perturbado por um "problema", estimulando mecanismos solucionadores, um dos quais resolve o problema, de modo semelhante e em tempo semelhante a ocasiões prévias, havendo tensão mínima. Na crise, esse processo é semelhante, apenas exagerado: I) porque o problema estimulante é maior; 2) os recursos reequilibradores não são bem-sucedidos no tempo usual; 3) período de conduta inconsistente é maior que o habitual; 4) havendo reequilíbrio surge novo padrão significativamente diferente do anterior; 5) o novo padrão pode ser estável e incorporar-se às forças homeostáticas. Afirma Caplan que a identificação de um padrão de funcionamento como "equilibrado" ou "crítico" é relativa, dependendo do espaço de tempo da observação. Compara a uma observação feita de perto e outra 57 de longe, sobre O mesmo objeto, tom.ando a distância igual ao tem Co~sidera, portanto, a nosso ver, a diferença como meramente Qua~~~ tauva. . _ Apreciamos e adotamos mmtas das concepçoes de Caplan m , as nest Particular discordamos. Pensamos que entre os problemas "hab't . e · "h' ' · d'f 1· i ua1s'' e os problemas "críticos a notaveis i erenças qua itativas. o e . · ' f d · · ssenc1al na geração da cnse, supomos, e o ato o suJeito se ver frente a u . tu ação nova e vi talmente transformadora. De algum modo isso e mtáª. s1- . d e 1 · · ,. s 1m plícito na teona e ap an, p01s menciona a ocorrencia de um no - drão após a solução da crise. Isso nunca poderia provir do somat;~ Pa- soluções antigas. Por soma do igual pode-se chegar ao diferente no de na teoria atômica da constituição dos elementos químicos: _ po~ como de um elétron e um próton a um átomo de hidrogênio se obtém O hs?1~ª . d h' d ,. . ~ " " 1 e io diferente o i rogemo, mas nao um novo e emento. Esses eleme t ' sã? ~s meJ~o.s, desde que o mund~,. ex~ste. O novo, porém, exige um na~~ cnauvo. E umco, como cada expenenc1a humana. A experiência é ind' . dual, intran~ferível e origi~al. ~ssas _diferenç~s nã? correspondem a;:: nas a uma diversa concepçao filosófica. Elas •~phcam diferentes atit _ des pragmáticas diante do problema da crise. E típico do novo que e~ não pode ser ensinado. (Falamos do novo no sentido de experiência hu~ mana.) Pode-se ensinar a montar uma peça, a consertar um aparelho re- solver uma equação matemática. Pode-se até ensinar a tocar música· 'não se pode ensinar a intepretá-la, a executá-la com alma, como um virt~ose. Pode-se ensinar a escrever; não se pode ensinar a fazer poesia. Pode-se ensinar técnica psicanalítica; não se pode ensinar a fazer psicanálise. Pode- se ensinar filosofia; não se pode ensinar sabedoria. Cremos que com es- sas ilustrações vamos alcançando um pouco o que pretendemos transmitir. Assim, quando Caplan dá ênfase ao aspecto cognitivo na solução das crises (mecanismos prévios de solução do problema) - embora não igno- re, mas, a nosso ver, deixa em segundo plano o aspecto afetivo - e quando apenas estabelece uma diferença quantitativa entre funcionamento "equi- librado" e funcionamento "crítico" na abordagem da situação "proble- ma", parece-nos que tais premissas conduzem a maneiras de abordagem que lhe são inerentes. Por exemplo, levam-no a propor soluções pedagó- gicas. Ou seja, admite Caplan que a resistência a distúrbio mental pode ser incrementada auxiliando-se o indivíduo a ampliar seu repertório de habilidade eficaz para resolver problemas. Assim não necessitará usar meios regredidos, irrealistas ou socialmente inaceitáveis para lidar com dificuldades que levam ao uso de sintomas neuróticos ou psicóticos como forma de evitar ou simbolicamente dominar seus problemas. Como se, digamos, pelo incremento da leitura de bons literatos o sujeito se tornas- se capaz de escrever boa literatura. Pensamos que a tal "habilidade eficaz para resolver problemas" não se ensina. É provavelmente uma esperança piedosa de Caplan e outros 58 ,. 1 l J que pensam na mesma linha de concepções e implicações mecanicistas. Pode-se ensinar o que é repetitivo, mecânico, material; o que é novo, vi- vo, é imprevisível e irrecorrível, e requer a cada momento um ato de cria- ção. O risco inerente às técnicas pedagógicas é o de transformar o sujeito num boneco obediente a um modelo idealizado; um copiador de pseudo- soluções, que, por temor de suportar a angústia e de enfrentar a vida, desenvolve uma falsa personalidade, uma adaptação postiça à realidade. Como dizíamos, essa divergência de pontos de vista tem implicações essenciais na tarefa de prevenção. Para ilustrar, consideremos a situação muito freqüente de um grupo de mulheres grávidas que apresentam va- riável grau de ansiedade durante a gestação e procuram ajuda. Temos co- nhecimento de procedimentos preventivos nessas condições que consis- tem em " ensinar" à mulher grávida a "ampliar seu repertório eficaz de soluções de problemas"; dão aulas sobre desenvolvimento fetal e coisas correlatas; ensinam a relaxar; ensinam a respirar de modo especial no mo- mento do parto. Como métodos sugestivos têm sua utilidade. Mas para enfrentamento das situações críticas ligadas à gestação, parto e cuidados ao bebê, não são muito. As soluções antigas, ensinadas, chegam a per- turbar a descoberta do novo. A nosso modo de ver, diante desta situação nova com o grupo de grávidas, nós nos reuniríamos com elas a intervalos regulares e conversaríamos sobre as experiências emocionais nesse dado momento. Tentaríamos descobrir, juntos, que significados emocionais te- riam para elas carregar um ser em formação dentro de si, do medo do parto, da responsabilidade de cuidar de um ser vivo e desconhecido. Num grupo pedagógico existe algum programa, alguém que " sabe" e transmite seu conhecimento a quem não sabe, sendo os grupos mais ou menos semelhantes, descontadas algumas diferenças acidentais. No gru- po terapêutico, como o entendemos, temos alguém que "não sabe" , e vai junto com outros que também não sabem, caminhar em busca do des- conhecido; sem meta, sem plano, enfrentando com todas as emoções, em vez de descartá-las, o que for emergindo da escuridão. Cada grupo é di- ferente dos demais, nessas condições. É fato que quando há alguém que "sabe" o grupo se apega a ele avidamente em busca de conforto e segu- rança. Mesmo quando o terapeuta se recusa a saber, o grupo o força a assumir a posição de onisciente para desfrutar de uma dependência segu- ra (Bion, 1961). Pode formar-se um conluio entre o terapeuta e os mem- bros do grupo para que a verdade não apareça. Esta segurança à custa da mentira é precária. Pode-se fugir da verdade durante algum tempo; mas não se pode fugir dela todo o tempo. Mais cedo ou mais tarde a pes- soa terá de enfrentar a crise. E então estará quase tão despreparada como sempre esteve. O autoconhecimento não se transmite pedagogicamente, mas apenas mediante experiência humana emocionalmente significativa. O indivíduo que aprende a conhecer-se melhor, ainda que um pouco, po- de contar consigo com um pouco mais de segurança. E é isso o que vale na hora da verdade. 59 balh -rhe deve/opment of mentalfunctioning, Melanie 1?"1 • Em seu tra o ' 1 • f ã d~ e1n 1958 faz uma revisão de sua teoria d~ orma~ o ? s~per-ego e apresen. ~a a h~pótese de que as figuras aterro~1zantes (mtroJeçao do "peito mau' ' . _ quiz· oparanóide) não mais fazem parte da estrutura do supe na pos1çao es r· d' · d r · d Olvl·mento normal, mas 1cam 1ssoc1a as e relegadas a e ego, no esenv . , 243 d balh . . x- f dos do inconsciente. A p. o tra o acuna citado d tratos pro un ( ) r· . e- 1 Kl . "Eu suponho porém, que ... as 1guras aterrorizantes das c ara em: ' . . das Profundas do inconsciente fazem-se sentir quando as pressões cama ,, internas ou externas são extrem~s · . . Poderíamos aproveitar a !eor~a ?e ~lem para enriquecer a concepção de crise com significados ps1codmam1cos. Igualando os fatores de crise às pressões internas ou externas e:t~emas, supomos que ~s _sentimentos de intensa angústia, às vezes de pamco, qu~ assaltam o suJe1to em crise, não seriam devidos apenas à falta de sol~çao para o novo, mas à proje- ção e identificação do novo com fant~st1cas ~eaças provocadas pelas figuras aterrorizantes das camad~s do mconsc1ente que emergem nesses estados de extrema tensão emocional. Voltando aos conceitos de crises de "desenvolvimento" e "acidentais" verificamos que são noções válidas do ponto de vista descritivo, fenome: no lógico, correspondendo à observação dos fatos como eles são apreen- didos na realidade. Todavia, para manipulação teórica e melhor aprofun- damento da análise das situações críticas, julgamos mais apropriada uma classificação etiológica das crises. Ou seja, classificando-as de acordo com o fator essencial que lhes deu origem. Retomando a concepção de perda ou ameaça de perda; ou aumento de suprimentos básicos, gerando ten- são crítica, podemos dispensar a diferença entre crises de desenvolvimen- to e acidentais e classificar as crises por perda (ou expectativa); e crises por aquisição (ou expectativa), independentemente de seu aspecto descri- tivo (desenvolvimento ou acidental). A generalização mais ampla nos leva a propor que a crise se deve a aumento ou redução significativa do espaço no universo pessoal. Quan- do dizemos ''significativa'', neste contexto, salientamos que se trata de uma incógnita, que por sua vez é função da pessoa real que experimenta essas variações. Chamamos de "universo pessoal", para efeito desta ex- posição, ao conjunto formado pela pessoa (psicossomático), mais a tota- lidade de objetos externos (aqui compreendidas outras pessoas, bens ma- teriais ou espirituais e situações sócio-culturais). Nesta classificação etio- lógica, ambas as formas de crise têm em comum a angústia diante do no- vo e desconhecido. A partir daí, divergem pelos sentimentos predominantes nas situações de perda ou de aquisição. Nas situações geradoras de crise por perdas, os sentimentos predominantes são de depressão e culpa. Por exemplo, na perda de um ser querido (ou da própria saúde), além de sen- timentos de depressão há sempre auto-recriminações por não ter feito al- go para evitar a perda, ou não ter aproveitado melhor os momentos en- 60 * 1 • i quanto o outro vivia (ou a saúde existia). Nas crises provocadas por aqui- sição os sentimentos predominantes são de insegurança, inferioridade, ina- dequação. Esses sentimentos podem expressar-se de inúmeras maneiras: medo de não estar à altura da situação, medo de não suportar as pressões e sucumbir, desagregar-se etc. Pesquisando dinamismos inconscientes, pro- vavelmente encontraríamos impulsos de inveja (no sentido kleiniano, 1957), voracidade e arrogância perturbando a efici@ncia do sujeito. Diante de pressões emocionais intensas desencadeadas pelas situações críticas há risco de prejuízos para o universo pessoal. E aqui as aberturas para intervenção preventiva ficam mais explícitas. Nas crises por perda significativa, diante de fortes sentimentos de depressão e culpa, há o ris- co de o indivíduo tentar aliviar-se por auto-agressão (que pode variar da mutilação pessoal, material ou situacional, até o sucídio), ou projeção da culpa em alguém ainda menos resistente (por exemplo, mãe lançar a cul- pa por aborto ou parto prematuro ao excesso de solicitação do filho mais velho). Nas crises por aquisição os riscos são de fuga direta (abandono do ganho no universo pessoal: por exemplo, abandono do filho por doa- ção; ou, demissão do emprego), ou fuga indireta (provocar a desaparição dissimulada do acréscimo no universo pessoal: - por exemplo, enfrentar o acréscimo de aquisição, mas com intuito secreto, ou inconsciente, de fracassar e assim livrar-se da tensão crítica). Outros riscos nas situações de crise por aquisição seriam aqueles de o sujeito admitir mais do que pode (por arrogância e voracidade) e sair da crise sustentando pela vida afora um ganho que em vez de aumentar diminui sua eficácia adaptativa (úlcera péptica, por exemplo) - (Alexander, 1950). Diante destes riscos nas duas espécies de fatores geradores de situação crítica, os objetivos principais da prevenção nas crises serão: nas cri- ses por perda, ajudar o sujeito a aceitá-las, resignar-se à frustração, lidar com depressão e culpa, e, decorrido tempo apropriado, estimulá-lo a re- tomar o interesse pelo universo pessoal diminuído significativamente pe- la perda crítica. Nas crises por aquisição, ajudar o indivíduo a aceitar o ganho, escoimado de projetos pretensiosos (que podem estar estimulados pela arrogância ou inveja), e com ambição moderada (controlando avo- racidade), de modo a ampliar seu universo pessoal tanto quanto possível dentro da realidade (conforme sua capacidade e condições ambientais). E ainda, no caso do aumento do universo pessoal estar provocando crise por aquisição de responsabilidade acima da capacidade real do sujeito de assumi-la, mostrar-lhe que pode renunciar ao ganho através de ajudá-lo a descobrir as ciladas do narcisismo e da voracidade. Colocando num esquema a classificação etiológica das crises, conf or- me nossa proposição, teremos uma visão sintética de seus pontos essen- ciais, segundo apresentamos na figura II. 61 O'I N Figura II - Classificação Etiológica das crises vitais e prevenção específica (emoção básica: angústia diante do novo e desconhecido) F . I, . perda d . . r· . . I ( b . ) ator etio og1co: e espaço s1gni 1cat1vo no umverso pessoa = pessoa + o JS . ext. Tipo crise p/perda (ou expectativa) crise p/ ganho (ou expectativa) ganho (Significativo = incógnita em função da pessoal real) Sentimentos Predominantes depressão culpa insegurança inferioridade inadequação Riscos auto-agressão projeção de culpa fuga (direta ou indireta) admitir mais do que pode Objetivos da Prevenção aceitar a perda reinteressar-se p/ universo pessoal lidar com os sentimentos predominantes evitar os riscos aceitar (ou renunciar) o ganno realisticamente (conforme ca- pacidade e condições externas) lidar com os sentimentos pre- dominantes evitar os riscos - Para concluir a análise teórica de alguns pontos da situação de crise, sugerindo algumas implicações práticas na elaboração da estratégia pre- ventiva, vejamos outro aspecto. Do ponto de vista do sujeito ou do grupo social que é afetado pela situação crítica, esta pode já estar ocorrendo ( caso em que resta aos en- volvidos lidar com a situação passivamente), ou a situação crítica pode ser postergada (caso em que pode ser manejada ativamente). Nas situa- ções em que a crise já eclodiu, o psico-higienista tem de aceitá-Ia passiva- mente, como já está colocada. Chamamos ao conjunto de medidas para lidar com a crise em andamento de "prevenção passiva nas crises". Nas situações em que a crise tem possibilidade de ocorrer, mas ainda é laten- te, o psico-higienista pode preparar o sujeito ou grupo para lidar com a situação, ou pelo menos estar presente desde o início da crise, para evitar ou atenuar danos, ou consolidar benefícios. Neste caso, ao conjunto de medidas chamaremos de ''prevenção ativa nas crises' '. Elaboramosuma lista, empiricamente, arrolando instituições onde se- ria provável encontrar pessoas enfrentando estados de crise, ou que po- tencialmente continham essa eventualidade. Depois de organizada a lis- ta, a título de exercício, relacionamos as instituições onde seriam encon- trados estados de crise atual e potencial, o que equivaleria a pôr em práti- ca medidas de prevenção "passiva" ou "ativa". Indo mais além nesse exercício de correspondência, usamos o critério etiológico proposto para as crises, ou seja, "crises por aquisição" e " crises por perda". O resulta- do foi surpreendente. Apresentamos abaixo o quadro III referente a ins- tituições nas quais as crises são supostas de estar em curso ou serem po- tencialmente prováveis. Na coluna referente a etiologia da crise, quando a situação geradora de crise se deve a perda ( ou expectativa de perda) é colocada a letra minúscula ''p' ' ; da mesma forma, se a situação crítica é devida a aquisição (ou expectativa) é colocada a letra minúscula " a" . Na coluna seguinte, adiante das instituições onde seriam encontradas pes- soas em situações que comportem medidas de prevenção ativa, coloca- mos a letra maiúscula "A"; do mesmo modo, quando as medidas de pre- venção são passivas, foi colocada a letra " P". Assim, o interessante nessa relação do quadro III é que as situações que geram crise por perda, comportam medidas de prevenção passiva; e as situações que geram crise por aquisição, comportam medidas de pre- venção ativa. A nós nos surpreendeu o .resultado do relacionamento nes- se quadro porque começamos a compô-lo casualmente. Começamos en- fileirando uma lista de instituições e correspondentes crises esperadas (por litígio, morte, nascimento, promoção etc.). A seguir confrontamos cada espécie de crise com as medidas de prevenção (ativa ou passiva) concei- tuadas acima. E por fim, relacionamos cada espécie de crise com a condi- ção etiológica pertinente (perda ou aquisição). (No quadro III para faci- litar a inteligibilidade, colocamos a coluna referente à etiologia antes 63 Quadro III - Instituições ligadas a pessoas em situação crítica atual ou potencial, relacionadas à etiologia da crise e medidas de prevenção INSTITUIÇÃO Etiologia Medidas de da crise Prevenção Delegacias de Policia Oitíglo, agressões) p p Juizado de Menores (abandono, delinqüência) p p Pré-Natal em Centros de Saúde (e análogos) a A Maternidades a A Cartórios de Protesto (ameaças de falência) p p Organizações de Luto p p Hospitais Gerais (clinlca e cirurgia) p p Hospitais Psiquiátric9s (ingresso, perdas de familia e trabalho) p p Hospitais Psiquiátricos (alta, reabilitação) a A Escolas (primária e superior) a A Agências de Emprego, Departamento de Pessoal (admissão) a A Orfanatos (ingresso por perda familiar) p p Orfanatos (saída para adoção) a A Previdência Social (aposentadoria por idade ou invalidez) p p Igrejas, Cartórios de Paz (casamentos) a A Justiça Civil (desquites, divórcios, sep. filhos) p p Presídios (ingresso: privação da liberdade etc.) p p Presídios (egresso: reabilitação) a A a = aquisição A = ativa p = perda P = passiva da prevenção; isto é, na ordem inversa à da nossa descoberta). O fato de ter havido uma coincidência tão grande entre prevenção ativa e crise por aquisição; e prevenção passiva e crise por perda falam a favor de ser esta classificação, embora baseada em abstrações, algo mais do que me- ramente arbitrária. Ou seja, que não seria simplesmente uma coincidên- cia, mas conteria alguma aproximação à natureza real dos fatos . Deixemos por ora o aspecto teórico e passemos à prática da prevenção nas crises. Nas medidas de prevenção que chamamos ativa (e surgem quan- do há aquisição) a crise propriamente dita está latente, o sujeito não tem clara vivência das tensões*. É a criança que está para nascer e o psico- • Para caracterizar a crise como oriunda de aquisição ou perda, mais importante do que a situação objetiva em si mesma é a significação que a pessoa dá ao fato vivido, represen- tando aumento ou diminuição do espaço no universo pessoal. Um mesmo fato pode ser vivido como aquisição ou perda, gerando a crise correspondente. Exemplificando: a gravi- dez de uma mulher que quer ter o seu bebê, no caso de sobrevir a crise, será claramente uma crise por aquisição. Porém, seja o caso de uma mulher grávida, mas já com muitos filhos, e situação econômica precária; o filho não significará aumento, mas diminuição do espaço no universo pessoal. Ou então a gravidez da mulher solteira, que não pretendia ter 64 higienista procura a mãe nos serviços de pré-natal nos Postos de Saúde; o casamento que está para ser realizado e se procura os cônjuges nas pa- róquias ou Cartórios de Paz; o emprego que está para ser assumido (ou promoção) e se encontra o candidato nas agências de emprego ou depar- ta~ento do pessoal das empresas; o curso que está para se realizar e se vai ao encontro do estudante nas escolas. Não tendo experiência aguda da tensão crítica o sujeito não tem muita disposição para colaborar. A maior dificuldade do psico-higienista é conseguir a adesão da população sob risco a seu programa de prevenção ativa. Quando o sujeito não cola- bora por antecipação, sempre pode o psico-higienista atender o sujeito nos pródromos do estado crítico, evitando ou atenuando a utilização de soluções inadequadas para manejar a crise. As crises causadas por situa- ções de aquisição e que seriam programadas e manejadas por medidas de prevenção ativa podem na prática ser frustradas por falta de colabora- ção do sujeito. Este pode não querer ou não saber da possibilidade de ajuda prévia, e só recorrer ao psico-higienista quando a braços com um estado de crise já avançado. Nesses casos, embora a etiologia da crise se- ja por aquisição, as medidas de prevenção seriam em parte passivas, por- que a equipe de prevenção é colhida despreparada para o caso. Uma das precauções dos programas de prevenção ativa é reduzir ao mínimo o nú- mero de indivíduos· sujeitos a crise que aparecem procurando ajuda já mui- } to tarde no proceso crítico. Quando mais não seja, porque pode-se efe- tuar algum preparo, estar presente desde o começo, trabalhando as nega- ções do sujeito. As medidas de prevenção passiva aplicam-se, como vimos, nas crises geradas por perda. Prevenção passiva, é bom esclarecer, não tem relação com passividade. Significa apenas que quando as medidas de prevenção podem ser acionadas a crise já está em curso e a equipe de prevenção está diante de fatos consumados. Assim acontece porque as perdas geradoras de crise, ou sua expectativa, geralmente se dão sem aviso, a equipe é to- mada de surpresa, e nisso consiste o aspecto passivo. O grupo de preven- ção tem que atender à emergência no mais curto espaço de tempo possí- Yel. Isso leva ao planejamento de uma estratégia específica de prevenção nas crises por perda. Considerando que o fator tempo é crucial no aten- dimento das crises, a equipe de prevenção deve agir conforme o modelo do pronto-socorro dos hospitais gerais. Melhor ainda; em vez de aguar- dar as queixas numa clínica de higiene mental, um escalão avançado de psico-higienistas deveria instalar-se ou estar intimamente ligado às insti- tuições onde se espera que as pessoas em crise por perda possam apare- filhos, quer porque não aprecia a maternidade, ou não se sente muito envolvida com o pai, ou mesmo teve uma relação casual, ou então foi violentada. Em todos esses casos o signifi- cado é de diminuição do espaço no universo pessoal. Se ocorrer crise face à gestação, será por significar perda e não aquisição. Os sentimentos predominantes serão de depressão e culpa; as medidas de prevenção, do tipo passivo. 65 A •m trabalhando em delegacias de polícia podem atend cer. ss1 , . era cas de litígio e agressão no moment_o em que ocorrem os distúrbios. No. ~s do de menores, atender as cnanças abandonadas, espancada l?1-za 1. .. " . N rt , . d s, ou 10 Vens iniciando-se na de mquenc1a.os ca onos e protesto am -, ,. · N ' Paranct Pessoas em risco de sofrerem ruma econoIDica. as organizaçõe d o ' d" . - d . d d s e luto colocando-se a 1spos1çao e pessoas cuJa per a e parentes Pod , tastrófica (criancinhas que perdem a mãe, velhos que perdem O únie ser ca. panheiro, pessoas idosas que perdem filhos estão sujeitas a cris e~ com. tadoras). Nos hospitais gerais, atendendo a familiares e pacie e~ evas. doença grave ou letal, seções de cirurgia onde os riscos de mur~ e~ co~ mitação física severa ou morte são constantes. Nos hospitais; ~ça?, l!- cos, atendendo à família q~ando o paciente é internado, e prov!Iluiátn. bilitação e reintegração social quando recebe alta. Nos Institutos~ 0 rea. sentado ria, acompanhando severos efeitos que pode ter a interru e ~Po- produtividad~ por ~posenta~oria p~r limite de idade ou invalidetç:o da nente. Nos tnbuna1s de Justiça C1v1l, prestando ajuda a casais en!'u~~- para desquite, e atenuando os reflexos da separação entre pais fil~gio E_ tam~ém nos presídios, assis!in?o ao c~n~enado quando ingress: na 0~~ sao, aJudando-o na adaptaçao as cond1çoes carcerárias preserv dPn , b" ' an o 0 vmculo com o am 1ente externo, ou preparando-o, acompanhand amparando-o após a saída do cárcere. 0-0 e A nosso modo de ver, países sem recursos, com escassas verbas riam possibilidade de fazer programas de prevenção pelo menos para 't te- der a situações de crise. Fora desse âmbito, as medidas de prevençãa en- riam muito dispendiosas, de reduzido efeito, alcançando pouco númº se- d E . ·- , d ero e pessoas. m nossa op1ruao, pa1ses pouco esenvolvidos poderiam co _ siderar programas de prevenção nas crises como pertencendo ao âmbi~ de _saúde pública;_ e~q~anto a preven?~º for~ das crises, por enquanto, sena encargo do md1v1duo e sua fam1ha. Fanam exceção ajuda psicote- rápica sob a forma de psicoterapia breve, ou a modalidade que Balint et ai. (1972) chamaram de psicoterapia "focal", fornecendo ajuda localiza- da e rápida no intuito de prevenir maior prejuízo na adequação a deter- minado setor adaptativo. Propiciaríamos benefício coletivo que poderia advir da aplicação de uma estratégia de saúde mental aplicada no mo- mento em que o sofrimento humano é mais agudo, cujos danos são mui- to mais onerosos em termos de padecimento emocional e mesmo mate- rial. Estes poderiam ser minorados e talvez evitados, a um custo bem me- nor do que se os prejuízos da crise se estabilizassem num nível de adapta- ção menos eficaz. Tais programas poderiam proporcionar a colocação uti- líssima para grande número de psicólogos (e outros psico-higienistas) re- legados à ociosidade ou aceitando ocupação alheia á profissão para sub- sistirem (isso em si já seria um programa de prevenção do desajustamen- to do próprio psicólogo). 66 <