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C
A
P
Í
T
U
L
O 5
INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Neste capítulo lidaremos com o conceito de integral de uma função de uma
variável complexa ao longo de um caminho e discutiremos suas propriedades
básicas. Depois faremos aplicações mais elaboradas destes conceitos, culmi-
nando com as diversas formas do Teorema de Cauchy para funções holomor-
fas de uma variável complexa.
5.1 INTEGRAIS DE LINHA
Dada f : [a,b] ⊂R−→C, f (t ) = u(t )+ i v(t ), contínua, definimos:
Definição 5.1.1: Integral de uma função complexa com valores reais
b∫
a
f (t )d t =
b∫
a
u(t )d t + i
b∫
a
v(t )d t . (5.1)
Esta definição "herda"a maioria das propriedades da integral de funções
se uma variável real com valores reais como conhecemos. Podemos organizar
estas informações na seguinte
71
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Proposição 5.1.2: Propriedades da integral
Sejam f , g : [a,b] ⊂R−→C contínuas e c ∈C. Então,
(i)
b∫
a
( f (t )+ g (t ))d t =
b∫
a
f (t )d t +
b∫
a
g (t )d t ;
(ii)
b∫
a
c f (t )d t = c
b∫
a
f (t )d t ;
(iii)
∣∣∣∣∣∣
b∫
a
f (t )d t
∣∣∣∣∣∣≤
b∫
a
∣∣ f (t )∣∣d t .
Demonstração Para ver que as igualdades acima são de fato verdadeiras, es-
creva as partes real e imaginária de cada um dos membros das igualdades em
(i) e (ii) e compare. Isto resolve os dois primeiros itens.
Verifiquemos agora a desigualdade em (iii): seja c = e−iθ, com θ a ser es-
colhido convenientemente. Temos que pela equação 5.1, que
Re
e−iθ b∫
a
f (t )d t
= b∫
a
Re(e−iθ f (t ))d t ≤
b∫
a
∣∣∣e−iθ f (t )∣∣∣d t = b∫
a
∣∣ f (t )∣∣d t .
Observe que na expressão acima estamos usando parte da desigualdade que
queremos demonstrar, mas no caso real que é conhecido.
Escolhendo θ = arg
 b∫
a
f (t )d t
, então Re
e−iθ b∫
a
f (t )d t
 =
∣∣∣∣∣∣
b∫
a
f (t )d t
∣∣∣∣∣∣, e
portanto ∣∣∣∣∣∣
b∫
a
f (t )d t
∣∣∣∣∣∣≤
b∫
a
∣∣ f (t )∣∣d t .
Definição 5.1.3: Integral de uma função complexa ao longo de uma
curva
Se γ é uma curva diferenciável por partes dada por z = z(t ), t ∈ [a,b],
e se f é uma função contínua em γ∗(o traço de γ), então t 7→ f (z(t )) é
contínua no intervalo [a,b], e definimos
∫
γ
f (z)d z =
b∫
a
f (z(t ))z ′(t )d t . (5.2)
72
5.1. Integrais de linha
Note que z ′ não é contínua, mas existem pontos a = t0 < t1 < t2 < ·· · tn = b,
tais que em cada subintervalo [t j−1, t j ], j = 1, · · · ,n, z ′ é contínua, e portanto
a integral acima fica definida por,
∫
γ
f (z)d z =
b∫
a
f (z(t ))z ′(t )d t =
n∑
j=1
t j∫
t j−1
f (z(t ))z ′(t )d t . (5.3)
Definição 5.1.4
Duas parametrizações, z : [a,b] −→ C e z̃ : [α,β] −→ C são equivalen-
tes se existe uma bijeção continuamente diferenciável s 7→ t (s) de [α,β]
sobre [a,b], tal que t ′(s) > 0, e z̃ = z ◦ t .
A condição t ′(s) > 0 significa precisamente que o sentido de percusso é
preservado.
Proposição 5.1.5
Suponha que t 7→ z(t ), t ∈ [a,b] e que τ 7→ z̃(τ), τ ∈ [α,β] são parametri-
zações equivalentes de uma curva γ. Então,
b∫
a
f (z(t ))z ′(t )d t =
β∫
α
f (z̃(τ))z̃ ′(τ)dτ.
Demonstração Seja t : [α,β] −→ [a,b], t = t (τ) seja uma bijeção continu-
amente diferenciável e crescente tal que z̃ = z ◦ t (estamos supondo que as
duas parametrizações são equivalentes). Então, usando a mudança de variá-
vel t 7→ t (τ), temos:
b∫
a
f (z(t ))z ′(t )d t =
β∫
α
f (z(t (τ))z ′(t (τ))t ′(τ)dτ=
β∫
α
f (z̃(τ))z̃ ′(τ)dτ.
Na última igualdade usamos a regra da cadeia na igualdade z̃ = z ◦ t .
Dada a curva γ parametrizada no intervalo [a,b], (t 7→ z(t )), definimos a
curva −γ por z = z(−t ), t ∈ [−b,−a]. Equivalentemente podemos definir −γ
como z = z(a +b − t ), t ∈ [a,b].
Temos então que,
73
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Proposição 5.1.6
Para toda f : Ω ⊆ C −→ C contínua e toda γ C 1 por partes com γ∗ ⊂Ω,
tem-se que ∫
−γ
f (z)d z =−
∫
γ
f (z)d z.
Demonstração Temos, usando a mudança de variável t =−τ,
∫
−γ
f (z)d z =
−a∫
−b
f (z(−t ))(−z ′(−t ))d t =
a∫
b
f (z(τ))z ′(τ)dτ=−
b∫
a
f (z(τ))z ′(τ)dτ
=−
∫
γ
f (z)d z.
A definição a seguir é baseada no fato que podemos dividir qualquer curva γ
em um número finito de arcos γ1, γ2,. . . ,γn , e que então se dá a igualdade∫
γ1+···+γn
f (z)d z =
∫
γ1
f (z)d z +·· ·+
∫
γn
f (z)d z,
qualquer que seja a função contínua f definida nos pontos de γ∗
Definição 5.1.7: Soma de caminhos
Definiremos a soma de caminhos γ = γ1 + ·· · +γn , pela igualdade de
integrais, ∫
γ1+···+γn
f (z)d z =
∫
γ1
f (z)d z +·· ·+
∫
γn
f (z)d z,
para todas as funções f que sejam contínuas em γ∗.
Quando γ é uma curva fechada, podemos tomar dois pontos distintos
quaisquer dela que ficará dividida em duas curvas γ1 e γ2. Temos então que∫
γ
f (z)d z =
∫
γ1+γ2
f (z)d z =
∫
γ2+γ1
f (z)d z.
Naturalmente podemos escrever qualquer integral complexa em termos
de integrais reais. Se f (z) = u(x, y)+ i v(x, y), então teremos:
∫
γ
f (z)d z =
b∫
a
f (z(t ))z ′(t )d t =
∫
γ
ud x − vd y + i
∫
γ
vd x +ud y .
74
5.1. Integrais de linha
Exemplo 5.1.8
Sejam γ o círculo unitário orientado positivamente e n ∈Z. Então,∫
γ
znd z =
{
0, n ̸= −1
2πi , n =−1 .
Para verificar esta afirmação parametrizamos γ por
z(t ) = cos t + i sen t , t ∈ [0,2π].
Então teremos no caso n ̸= −1:
∫
γ
znd z =
2π∫
0
(cosnt + i sennt )(−sen t + i cos t )d t
=
2π∫
0
(−cosnt sen t − sennt cos t )d t
+i
2π∫
0
(cosnt cos t − sennt sen t )d t
=
2π∫
0
−sen(n +1)td t + i
2π∫
0
cos(n +1)td t
=
[
1
n +1 cos(n +1)t
]2π
0
+ i
[
1
n +1 sen(n +1)t
]2π
0
= 0+ i 0 = 0.
No caso em que n =−1, a integral acima se transforma em
∫
γ
z−1d z = i
2π∫
0
d t = 2πi .
Seria instrutivo ver as integrais reais obtidas neste último caso(n =−1)
e notar que a integral da parte real é nula e que a integral relativa a parte
imaginária é um bem conhecido exemplo que se vê em Cálculo 3.
O próximo exemplo nos lembra em parte a integral que define o logaritmo
real. Naturalmente temos neste caso a necessidade de escolher um ramo ho-
lomorfo da função logaritmo complexa.
75
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Exemplo 5.1.9: O logaritmo principal
Seja γ a curva assim definida: o intervalo na reta [1, |z|], z ̸= 0 seguido
do arco de círculo |z|e i t , 0 ≤ t ≤ θ. Então,∫
γ
d w
w
= log |z|+ iθ = Logz.
(Veja a figura abaixo)
x
y
θ
1 |z|
z
Figura 5.1: O logaritmo dado por uma integral
Temos que a integral desejada é a soma das integrais, primeiro ao longo
do segmento [1, |z|], e depois ao longo do arco de círculo |z|e i t , t ∈ [0,θ],
donde,
∫
γ
d w
w
=
|z|∫
1
d t
t
+
θ∫
0
i |z|e i t
|z|e i t d t =
|z|∫
1
d t
t
+
θ∫
0
i d t = log |z|+ iθ.
Sejam p e q funções contínuas em uma região G. Considere as duas afir-
mações a seguir:
(a) Quaisquer que sejam os caminhos γ1 e γ2 em G que tenham os mesmos
pontos inicial e final, tem-se que∫
γ1
pd x +qd y =
∫
γ2
pd x +qd y .
76
5.1. Integrais de linha
(b)
∫
γ
pd x +qd y = 0, qualquer que seja a curva fechada γ contida em G.
Proposição 5.1.10
As afirmações (a) e (b) acima são equivalentes.
Demonstração Mostraremos primeiro que
(b) ⇒ (a)
Dados γ1 e γ2, caminhos em G com os mesmos pontos inicial e final, γ =
γ1 −γ2 é um caminho fechado em G, donde∫
γ1
pd x +qd y −
∫
γ2
pd x +qd y =
∫
γ
pd x +qd y = 0,
portanto, ∫
γ1
pd x +qd y =
∫
γ2
pd x +qd y .
Mostremos agora
(a) ⇒ (b)
Seja agoraγum caminho fechado qualquer em G. Sejam A e B dois pontos
distintos de γ∗; estes pontos dividem a curva em duas, γ1 que é a parte da
curva no sentido positivo de A até B , e γ2 que é a parte da curva, mantendo o
sentido, de B até A. É claro que γ= γ1 +γ2. Portanto,∫
γ
pd x +qd y =
∫
γ1+γ2
pd x +qd y =
∫
γ1
pd x +qd y −
∫
−γ2
pd x +qd y = 0,
pois γ1 e −γ2 tem os mesmos pontos inicial e final.
Teorema 5.1.11
Sejam G um aberto conexo de C, γ um caminho em G, e p, q : G −→ C
funções contínuas. A integral de linha∫
γ
pd x +qd y
depende apenas dos pontos inicial e final de γ, se e só se existe
U =U (x, y) : G −→C tal que ∂U
∂x
= p, e ∂U
∂y
= q
77
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Demonstração A suficiência é imediata: Se existe U =U (x, y) definida em G
tal que
∂U∂x
= p, e ∂U
∂y
= q , e se o intervalo do parâmetro de γ é [a,b], então
temos que:
∫
γ
pd x +qd y =
b∫
a
(
∂U
∂x
x ′(t )+ ∂U
∂y
y ′(t )
)
d t =
b∫
a
d
d t
(
U (x(t ), y(t ))
)
d t
=U (x(b), y(b))−U (x(a), y(a)),
o que mostra que a integral só depende dos pontos inicial e final.
Necessidade Fixe um ponto qualquer z0 = (x0, y0) ∈ G; como G é conexo, po-
demos ligar um outro ponto qualquer z = (x, y) ao ponto fixado por uma poli-
gonal, e, podemos se necessário determinar que cada trecho desta poligonal
seja paralelo a um dos eixos coordenados, e em particular, o trecho final pode
ser horizontal ou vertical, como na figura abaixo .
z0
z
x
y
z0
z
x
y
Figura 5.2: Integrais independentes do caminho
Vejamos primeiro o caso em que o caminho termina em um trecho na
horizontal. Como a integral de linha depende apenas dos pontos inicial e final
do caminho de integração, se γ é qualquer caminho em G, ligando z0 a z, a
expressão
U (z) =U (x, y) =
∫
γ
pd x +qd y ,
define uma função em G. Escolhendo uma poligonal ligando z0 a z com o
último trecho horizontal, teremos U (x, y) =
x∫
p(t , y)d t + constante, donde
∂U (x, y)
∂x
= p(x, y). Da mesma forma, se a poligonal ligando z0 a z tem
78
5.1. Integrais de linha
seu último trecho na vertical, então, U (x, y) =
y∫
q(x, t )d t + constante, logo,
∂U (x, y)
∂y
= q(x, y).
Definição 5.1.12
Se existe U tal que
∂U (x, y)
∂x
= p(x, y) e ∂U (x, y)
∂y
= q(x, y), diremos que
p(x, y)d x +q(x, y)d y é uma forma diferencial exata.
Em resumo:∫
γ
pd x +qd y depende apenas dos pontos inicial e final de γ, se e só se
pd x +qd y é uma forma diferencial exata.
Cabem aqui duas observações:
1 – Se U como no teorema existe, ela é única, a menos de adição de constante.
2 – As funções p, q, U , podem ser reais ou complexas.
Pergunta: Dada f contínua em G, em que condições f (z)d z é uma diferencial
exata?
Observe que f (z)d z = f (z)d x + i f (z)d y , portanto, esta forma diferencial
é exata se e só se
∂F
∂x
= f (z) e ∂F
∂y
= i f (z), ou, equivalentemente, ∂F
∂x
=−i ∂F
∂y
,
logo, f é contínua e F satisfaz as equações de Cauchy-Riemann, donde F é
holomorfa em G com F ′ = f .
Resposta: Se f é contínua em G então f (z)d z é exata se e somente se f é a
derivada de uma função holomorfa em G.
Como exemplo, já vimos, a menos de translação(a = 0) que∫
|z−a|=R
(z −a)nd z =
{
0, n ̸= −1
2πi , n =−1 ,
portanto não existe função holomorfa f definida em uma vizinhança de a,
com a removido, tal que f ′(z) = 1
z −a nesta vizinhança.
Um outro exemplo: Se n ∈Z, n ̸= −1, então (z−a)n =
(
(z−a)n+1
n+1
)′
, e z 7→ (z−a)n+1n+1
é uma função holomorfa em C \ {a}, se n < 0 e holomorfa em C se n ≥ 0, por-
tanto∫
γ
(z −a)nd z =
{
0, −1 ̸= n < 0 para toda curva fechada γ que não passa por a
0, n ≥ 0 para toda curva fechada γ .
79
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Exemplo 5.1.13
Calcular
∫
|z|=2
2d z
z2 −1.
Note que
2
z2 −1 =
1
z −1−
1
z +1. Olhando formalmente o segundo mem-
bro desta última igualdade,vemos que é igual a derivada de log
(
z −1
z +1
)
,
e, onde existir um ramo holomorfo desta função com múltiplos valores,
a igualdade deixa de ser formal para ser real. Ora, podemos facilmente
ver que existe um ramo holomorfo de log
(
z −1
z +1
)
em C \ [−1,1], logo a
curva fechada |z| = 2 está contida em C\ [−1,1], portanto,∫
|z|=2
2d z
z2 −1 =
∫
|z|=2
[
log
(
z −1
z +1
)]′
d z = 0.
Exemplo 5.1.14
Calcular
∫
|z|=1
|z −1||d z|.
Com a parametrização, z(t ) = e i t = cos t + i sen t , t ∈ [0,2π], obtemos,
∫
|z|=1
|z −1||d z| =
2π∫
0
√
(cos t −1)2 + sen2 td t =
2π∫
0
√
2(1−cos t )d t = 8.
Exemplo 5.1.15
Calcular
∫
|z|=r
xd z.
Use a parametrização natural de |z| = r para calcular esta integral. Aqui
faremos este cálculo de um modo diferente.
Observe que x = z + z
2
= 1
2
(
z + r
2
z
)
. Consequentemente,
∫
|z|=r
xd z =
∫
|z|=r
1
2
(
z + r
2
z
)
d z = 1
2
∫
|z|=r
zd z+1
2
∫
|z|=r
r 2
z
d z = 0+r
22πi
2
= r 2πi .
80
5.2. O Teorema de Cauchy-Goursat.
5.2 O TEOREMA DE CAUCHY-GOURSAT.
Usaremos o termo retângulo para indicar um subconjunto de C da forma
R = [a,b]× [c,d ], ou seja, um retângulo cujos lados são paralelos aos eixos
coordenados. Os lados do retângulo percorridos no sentido anti horário com-
põem a fronteira ∂R do retângulo.
Teorema 5.2.1: Teorema de Cauchy para retângulos
Se f é holomorfa em um retângulo R, então∫
∂R
f (z)d z = 0.
Demonstração Dados um retângulo qualquer R e f uma função holomorfa
em R(lembrar que por definição, f é holomorfa em um aberto G que contém
R), seja,
η(R) =
∫
∂R f (z)d z. (5.4)
x
y
R
R(1) R(2)
R(3)R(4)
G
Figura 5.3: Subdivisões de um retângulo R
É claro que temos(observe a figura),
η(R) = η(R(1))+η(R(2))+η(R(3))+η(R(4)),
81
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
pois em cada uma das arestas interiores, calculamos duas integrais da mesma
função, uma com a orientação oposta da outra e somamos os resultados, e
portanto cancelam-se mutuamente. Podemos ver também que pelo menos
um dos retângulos R(k), k = 1,2,3,4, satisfaz∣∣∣η(R(k))∣∣∣≥ 1
4
∣∣η(R)∣∣ ,
pois do contrário, aplicando a desigualdade triangular chegaríamos na con-
tradição, η(R) < η(R). Seja R1 este retângulo. Podemos aplicar o mesmo pro-
cedimento a R1 obtendo então um retângulo R2, e assim por diante, obtendo
então uma sequência de retângulos,
R ⊃ R1 ⊃ R2 ⊃ ·· · ⊃ Rn ⊃ ·· · ,
tal que ∣∣η(Rn)∣∣≥ 1
4
∣∣η(Rn−1)∣∣ ,
e portanto, ∣∣η(Rn)∣∣≥ 4−n ∣∣η(R)∣∣ . (5.5)
Por semelhança de triângulos vemos que dn = 2−nd , onde dn é o compri-
mento da diagonal de Rn e d é o comprimento da diagonal de R. Assim , existe
z∗ ∈ R, tal que lim
n→∞Rn = z
∗, no sentido de que:
∀δ> 0, ∃N ∈N, tal que n ≥ N ⇒ Rn ⊂ D(z∗;δ).
Basta observar que se denotarmos por zn a extremidade superior direita da
diagonal do retângulo Rn , então a sequência (zk ) é uma sequência de Cauchy,
uma vez que se m > n, |zn − zm | ≤ dn = d/2n , e portanto converge para algum
ponto z∗ ∈ R.
Primeiro escolhemos δ> 0 suficientemente pequeno de modo a termos f
holomorfa em D(z∗;δ).
Segundo, dado ϵ> 0 escolha δ> 0 tal que∣∣∣∣ f (z)− f (z∗)z − z∗ − f ′(z∗)
∣∣∣∣< ϵ,
ou seja, ∣∣ f (z)− f (z∗)− (z − z∗) f ′(z∗)∣∣< ϵ ∣∣z − z∗∣∣ , se ∣∣z − z∗∣∣< ϵ.
Como
∫
∂Rn
f (z∗)d z =
∫
∂Rn
(z − z∗) f ′(z∗)d z = 0, já que os integrandos são res-
pectivamente as derivadas das
82
5.2. O Teorema de Cauchy-Goursat.
funções holomorfas f (z∗)z e
f ′(z∗)
2
(z − z∗)2, temos que:
η(Rn) =
∫
∂Rn
f (z)d z =
∫
∂Rn
[ f (z)− f (z∗)− (z − z∗) f ′(z∗)]d z,
portanto,
∣∣η(Rn)∣∣≤ ∫
∂Rn
∣∣ f (z)− f (z∗)− (z − z∗) f ′(z∗)∣∣ |d z| ≤ ϵ ∫
∂Rn
∣∣(z − z∗∣∣ |d z|. (5.6)
A maior distância entre dois pontos de um retângulo é o comprimento da di-
agonal, portanto, como z, z∗ ∈ Rn , temos que |z − z∗| ≤ dn , e se Ln denota o
prímetro de retângulo Rn , então da equação (3) temos que∣∣η(Rn)∣∣≤ dnLnϵ. (5.7)
Temos que dn = 2−nd e Ln = 2−nL, sendo d e L respectivamente a diagonal e
o perímetro de R, portanto, substituindo na equação (4) temos∣∣η(Rn)∣∣≤ 4−ndlϵ. (5.8)
Portanto, pelas equações (2) e (5) temos que∣∣η(R)∣∣≤ 4n |(Rn)| ≤ ndLϵ.
Como ϵ é arbitrário, segue que
∣∣η(R)∣∣= 0, C.Q.D.
Teorema 5.2.2: Teorema de Cauchy para retângulos-versão 2
Seja f holomorfa em um conjunto R′ obtido de um retângulo R pela
omissão de um número finito de pontos ζ j . Se
lim
z→ζ j
(z −ζ j ) f (z) = 0, ∀ j ,
então,
∫
∂R
f (z)d z = 0.
Demonstração Basta considerar o caso de um único ponto, pois podemos
dividir R em sub retângulos de maneiras que cada ponto excepcional seja o
centro de um dos sub retângulos.
83
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
x
y
R
ζ
R0
G
Figura 5.4: Retângulo com ponto excepcional
Suponha então que R seja um retângulo, com um único ponto excepcional
ζ localizado no seu centro. Como lim
z→ζ j
(z −ζ) f (z) = 0, dado ϵ> 0, existe δ> 0,
tal que
∣∣ f (z)∣∣ ≤ ϵ|z −ζ| , se |z −ζ| < δ. Dividimos agora R em nove retângulos
de tal modo que o do centro seja um quadrado R0 contido em D(ζ;δ), e seja l
o comprimento de seus lados. Então,∣∣∣∣∣∣
∫
∂R
f (z)d z
∣∣∣∣∣∣=∣∣∣∣∣∣∣
∫
∂R0
f (z)d z
∣∣∣∣∣∣∣≤ ϵ
∫
∂R0
|d z|
|z −ζ| .
Mas, |z −ζ| ≥ l
2
, z ∈ R0, portanto,
∫
∂R0
|d z|
|z −ζ| ≤
2
l
∫
∂R0
|d z| = 2
l
(4l ) = 8.
Assim,
∣∣∣∣∣∣
∫
∂R
f (z)d z
∣∣∣∣∣∣≤ 8ϵ, e como ϵ> 0 é arbitrário, segue o resultado.
Um exemplo concreto de aplicação desta versão do teorema de Cauchy:
Seja R um retângulo qualquer
contendo a origem no seu interior; então, como lim
z→0(z −0)
sen z
z
= lim
z→0 sen z =
0, segue que
∫
∂R
sen z
z
d z = 0.
84
5.2. O Teorema de Cauchy-Goursat.
Teorema 5.2.3: Teorema de Cauchy para discos-versão 3
Se f é holomorfa em um disco aberto D(a;r ), então,∫
γ
f (z)d z = 0,
qualquer que seja a curva fechada γ em D(a;r ).
Demonstração Dado um ponto qualquer z ∈ D(a;r ), o retângulo com vértices
opostos a e z está contido em D(a;r )(veja a figura).
x
y
a
z
β
α
Figura 5.5: Teorema de Cauchy num disco
Sejam α o caminho cujo traço é a poligonal tracejada ligando a a z com a
orientação indicada pelas setas, e β o outro caminho indicado na figura (3).
Os dois caminhos formam um retângulo contido em D(a;r ), e como
f é holomorfa neste disco, pelo teorema 1 segue que
∫
β−α
f (z)d z = 0, donde
∫
β
f (z)d z =
∫
α
f (z)d z. Assim, a função em D(a;r ) dada por,
F (z) =
∫
β
f (z)d z =
∫
α
f (z)d z,
85
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
satisfaz,
∂F (z)
∂y
= i f (z) e ∂F (z)
∂x
= f (z), logo f (z)d z é uma diferencial exata, e
portanto o resultado.
Teorema 5.2.4: Teorema de Cauchy para discos-versão 4
Seja f holomorfa em uma região ∆ obtida ao excluir um conjunto finito
de pontos ζ j de um disco D(a;r )(∆= D(a;r ) \ {ζ1, · · · ,ζn}). Se f satisfaz
a condição
lim
z→ζ j
(z −ζ j ) f (z) = 0, j = 1, · · · ,n,
então
∫
γ
f (z)d z = 0, para toda curva fechada contida em ∆.
Demonstração Suponha que a = x0+i y0, e analisemos primeiramente o caso
em que nenhum dos pontos excepcionais ζ j está sobre uma das retas x = x0
ou y = y0, veja a figura abaixo.
x
y
a
z
ζ
Figura 5.6: Teorema de Cauchy num disco com pontos excepcionais
Podemos então ir de a a z por uma poligonal consistindo de três segmen-
tos paralelos a um ou o outro eixo coordenado,e que evita os pontos excep-
cionais. Aplicando o teorema aos retângulos determinados pelas poligonais,
86
5.2. O Teorema de Cauchy-Goursat.
temos que o valor da integral independe de escolhermos a poligonal cheia ou
a poligonal tracejada. Portanto,
F (z) =
∫
σ
f (z)d z,
onde σ é qualquer um dos caminhos mencionados acima, está bem definida,
e, como anteriormente, f ′(z) = F (z), e portanto o resultado.
Quando tivermos pontos excepcionais sobre as retas x = x0 e y = y0, a
próxima figura mostra como podemos dar uma demonstração semelhante,
usando quatro segmentos em vez de três.
x
y
a
z
Figura 5.7: Teorema de Cauchy num disco com pontos excepcionais
5.2.1 O Teorema de Cauchy em uma região simplesmente conexa
Teorema 5.2.5: Teorema de Cauchy versão 5
Seja f uma função holomorfa sobre os pontos de uma curva fechada
simples γ e do seu interior. Então∫
γ
f (z)d z = 0.
87
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Demonstração A curva γ é fechada, portanto limitada, ou seja está contida
em algum retângulo suficientemente grande, e é um conjunto fechado, por-
tanto é compacto. Como f é holomorfa sobre γ e seu interior, existe um
aberto G contendo γ e seu interior tal que f é holomorfa nesse aberto. Veja a
figura abaixo.
γ
Γ
G
Figura 5.8: Teorema de Cauchy para a região limitada por uma curva fechada
simples
Seja δ a distância de γ ao complemento de G, ou seja δ= inf
z∈C\G, w∈γ∗
|z −w |,
que é um número positivo.
Agora, cubramos o plano por uma rede de quadrados de lados menores
que δ/
p
2, todos com fronteira orientada positivamente. É claro que o con-
junto dos quadrados Q j que tem interseção não vazia com γ e seu interior é
finito, e seja
Γ=
∑
∂Q j ,
que devido os cancelamentos, nos dá exatamente a poligonal que circunda
γ∗. Temos então que ∫
Γ
f (z)d z = 0,
88
5.2. O Teorema de Cauchy-Goursat.
pelo teorema de Cauchy para retângulos. Mostremos agora que temos que∫
γ
f (z)d z =
∫
Γ
f (z)d z = 0.
Para tanto considere a região do plano limitada internamente pela curva γ,
e externamente pela poligonal Γ. A rede de quadrados divide esta região em
sub regiões limitadas em parte pela curva γ (com a orientação oposta), e em
parte por arestas dos quadrados. Seja R j , j = 1,2, . . . ,k estas regiões. Temos
então que cada R j está contida em um disco onde f é holomorfa, portanto,∫
∂R j
f (z)d z = 0, j = 1,2, . . . ,n pelo Teorema de Cauchy num disco,
donde,
0 =
n∑
j=1
∫
∂R j
f (z)d z =
∫
Γ
f (z)d z −
∫
γ
f (z)d z.
Como a integral sobre a poligonal Γ é nula, segue que a integral sobre γ
também é nula, donde o resultado.
Vejamos algumas consequências do teorema acima.
Corolário 5.2.6
Seja f uma função holomorfa em uma região simplesmente conexa do
plano G, e seja γ uma curva fechada contida em G. Então,∫
γ
f (z)d z = 0.
Demonstração Como por definição G é simplesmente conexo se Ĉ \ G é co-
nexo, temos que se γ é uma curva fechada contida em G, o interior de γ está
contido em G. Se γ não é uma curva simples, podemos descrevê-la como uma
soma finita de curvas simples fechadas, γ= γ1 +·· ·+γn , donde,∫
γ
f (z)d z =
∫
γ1
f (z)d z +·· ·+
∫
γn
f (z)d z = 0.
89
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Corolário 5.2.7
Sejam G uma região simplesmente conexa, e f uma função holomorfa
em G. Então, existe uma função holomorfa F em G tal que F ′ = f ,
ou seja, em uma região simplesmente conexa toda função holomorfa
é uma primitiva.
Demonstração Pelo corolário anterior a integral de f sobre qualquer curva
fechada é 0, ou, equivalentemente, a integral de f sobre uma curva ligando
dois pontos , depende apenas dos pontos e não da curva que os liga e por-
tanto, existe uma função holomorfa F em G tal que F ′ = f .
Corolário 5.2.8
Sejam G uma região simplesmente conexa, e f uma função holomorfa
em G que não se anula com f ′ holomorfa em G. Então existem um
ramo holomorfo de log f (z) em G, e um ramo holomorfo de n
√
f (z) em
G.
Observação Veremos mais tarde que a hipótese de f ′ ser holomorfa
pode ser removida.
Demonstração Como f é diferente de 0 em G,
f ′(z)
f (z)
é analítica em G, e como
G é simplesmente conexo, pelo último lema existe F holomorfa em G tal que
F ′(z) = f
′(z)
f (z)
, z ∈ G. Assim, a função em G, g (z) = f (z)e−F (z) é tal que
g ′(z) = f ′(z)e−F (z) − f (z)e−F (z)F ′(z) = f ′(z)e−F (z) − f ′(z)e−F (z) ≡ 0,
portanto g é constante. Isto significa que fixado um z0 qualquer de G, temos
que f (z) = f (z0), para todo z ∈ G. Escolha um ponto qualquer z0 em G, e fixe
um valor para o log f (z0). Temos então que
g (z) = g (z0) =⇒ f (z)e−F (z) = f (z0)e−F (z0) =⇒ f (z) = f (z0)eF (z)−F (z0) = eF (z)−F (z0)+log f (z0),
portanto
log f (z) = F (z)−F (z0)+ log f (z0),
define um ramo holomorfo de log f (z) em G.
Usando o ramo holomorfo de log f (z) como o obtido acima, definimos
n
√
f (z) = exp
(
1
n
log f (z)
)
, que é holomorfa.
90
5.3. A fórmula integral de Cauchy
5.3 A FÓRMULA INTEGRAL DE CAUCHY
Teorema 5.3.1
Sejam f holomorfa em um disco aberto D(z0;r ), γ uma curva fechada
simples em D(z0;r ) e a um ponto do disco que não pertence à curva γ.
Então, ∫
γ
f (ζ)
ζ−a dζ= f (a)
∫
γ
dζ
ζ−a =
{
2πi f (a), se a ∈ Int(γ)
0, se a ∉ Int(γ).
Demonstração Defina a função holomorfa F : D(z0;r ) \ {a} −→ C por, F (z) =
f (z)− f (a)
z −a . Esta função satisfaz limz→a(z −a)F (z) = 0, portanto, pela versão do
Teorema de Cauchy para Discos com pontos excepcionais, temos que
0 =
∫
γ
F (ζ)dζ=
∫
γ
f (ζ)
ζ−a dζ−
∫
γ
f (a)
ζ−a dζ,
logo, ∫
γ
f (ζ)
ζ−a dζ= f (a)
∫
γ
dζ
ζ−a .
Se a não é ponto interior da curva, a função z 7→ 1
z −a é holomorfa no interior
de γ, e portanto sua integral ao longo de γ é nula pelo teorema de Cauchy para
regiões limitadas por curvas fechadas simples. Por outro lado, se a ∈ Int(γ),
então por Int(γ) ser aberto, podemos tomar um pequeno círculo centrado em
a com raio ϵ suficientemente pequeno para que este círculoesteja contido
no Int(γ). Considere agora o caminho Γ, obtido ao seguir a curva γ com a
orientação positiva depois o trecho reto α, ligando γ ao círculo centrado em
a, depois o círculo no sentido anti horário, −β, depois o trecho reto com a
orientação invertida,−α e finalmente a curvaγno sentido positivo até o ponto
de onde partiu(Veja a próxima figura). Podemos pensar nesta curva como
uma curva fechada simples contida em D(z0;r ), Γ = γ+α−β−α, logo, pelo
Teorema de Cauchy num disco temos que
0 =
∫
Γ
dζ
ζ−a =
∫
γ+α−β−α
dζ
ζ−a =
∫
γ−β
dζ
ζ−a =
∫
γ
dζ
ζ−a −
∫
β
dζ
ζ−a =
∫
γ
dζ
ζ−a −2πi ,
ou seja,∫
γ
dζ
ζ−a = 2πi , ( independe do ponto a no interior da curva fechada simples γ).
91
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
x
y
z0
a
β
γ
α
Figura 5.9: A fórmula integral de Cauchy
Fica assim demonstrado o resultado.
Exemplo 5.3.2: Usos da Fórmula Integral de Cauchy
a)
∫
|z−4|=5
cos z
z
d z = 2πi cos(0) = 2πi .
b)
∫
|z−i |=1
z2
z2 +1d z =
∫
|z−i |=1
z2
(z − i )(z + i )d z = 2πi
[
z2
z + i
]
z=i
=−π.
c) Se f é holomorfa em D(0;r ), com r > 2, como podemos usar a
fórmula integral de Cauchy para calcular I =
∫
|z|=2
f (z)
z2 −1d z?
Inicialmente observamos, usando frações parciais, que
1
z2 −1 =
1
2
(
1
z −1 −
1
z +1
)
. Em seguida podemos escrever:
I =1
2
 ∫
|z|=2
f (z)
z −1d z −
∫
|z|=2
f (z)
z +1d z
= 1
2
(
2πi f (1)−2πi f (−1))
=πi ( f (1)− f (−1)).
92
5.3. A fórmula integral de Cauchy
Teorema 5.3.3: Teorema de Liouville via fórmula integral de Cauchy
Seja f uma função inteira e limitada. Então f é constante.
Demonstração Suponha que f é inteira, e que M é um número real positivo
tal que
∣∣ f (z)∣∣ ≤ M , ∀z ∈ C. Mostraremos que independentemente de a ∈ C,
f (a) = f (0), e portanto f é constante.
Seja a ∈ C qualquer fixado, e seja R ≥ 2 |a|, donde se |ζ| = R então
|z| , |z −a| ≥ R/2. Se γR , é o círculo centrado em 0 e de raio R, com a orien-
tação positiva, então, pela fórmula integral de Cauchy temos:
f (a)− f (0) = 1
2πi
∫
γR
f (ζ)
ζ−a dζ−
1
2πi
∫
γR
f (ζ)
ζ
dζ= 1
2πi
∫
γR
(
1
ζ−a −
1
ζ
)
f (ζ)dζ
= 1
2πi
∫
γR
a f (ζ)
ζ(ζ−a)dζ.
Temos então que
∣∣ f (a)− f (0)∣∣=
∣∣∣∣∣∣ 12πi
∫
γR
a f (ζ)
ζ(ζ−a)dζ
∣∣∣∣∣∣≤ 12π
∫
γR
∣∣∣∣ a f (ζ)ζ(ζ−a)
∣∣∣∣ |dζ| = 12π
∫
γR
|a| ∣∣ f (ζ)∣∣
|ζ| |ζ−a| |dζ|.
Para ζ de valor absoluto R ≥ a, temos que |ζ−a| ≥ R/2, e como ∣∣ f (ζ)∣∣≤ M ,
temos:
∣∣ f (a)− f (0)∣∣≤ 1
2π
|a|M
R(R/2)
2πR = 2M a
R
.
Nesta última igualdade, fazendo R →∞ e lembrando que a é arbitrário porém
fixo, teremos que f (a) = f (0). Portanto f é constante.
Uma consequência interessante do teorema de Liouville é o teorema de
Gauss conhecido como Teorema Fundamental da Álgebra:
Teorema 5.3.4: Teorema Fundamental da Álgebra
Todo polinômio complexo não constante P (z) tem pelo menos uma
raiz.
Demonstração Suponhamos por absurdo que P é um polinômio complexo
não constante e que P (z) ̸= 0, ∀z ∈ C. Como P é não constante, o grau de P é
digamos n ≥ 1, i.e.,
P (z) = an zn +an−1zn−1 +·· ·+a1z +a0, an ̸= 0,
93
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
e portanto, |P (z)| = |z|n
∣∣∣an + an−1z +·· ·+ a1zn−1 + a0zn ∣∣∣. Então,
|P (z)| ≥ |z|n
(
|an |−
∣∣∣an−1
z
+·· ·+ a1
zn−1
+ a0
zn
∣∣∣) ,
donde, |P (z)| ≥ |z|n
(
|an |−
∣∣ an−1
z
∣∣−·· ·− ∣∣∣ a1zn−1 ∣∣∣− ∣∣ a0zn ∣∣). No segundo membro da
última desigualdade, todos as parcelas tendem para 0 quando |z| −→∞, ex-
ceto a primeira que é constante e diferente de zero, por conseguinte, existe
R1 > 0 tal que |z| > R1 implica que |z|n
(
|an |−
∣∣an−1
z
∣∣−·· ·− ∣∣∣ a1zn−1 ∣∣∣− ∣∣ a0zn ∣∣) > |an |2 ,
e portanto |P (z)| −→∞ quando |z| −→∞.
Se P não tem raiz, então a função f (z) = 1/P (z) é inteira, e como
|P (z)| −→∞ quando |z| −→∞, segue que lim
z→∞ f (z) = 0, donde existe R > 0
tal que
∣∣ f (z)∣∣ < 1, se |z| > R. Assim, como ∣∣ f (z)∣∣ é contínua, em |z| ≤ R ela é
limitada e fora de |z| ≤ R a mesma é limitada por 1, donde é limitada. Como é
inteira, pelo Teorema de Liouville é constante, o que é uma contradição pois f
é o recíproco de um polinômio não constante, portanto não constante. Logo,
todo polinômio não constante com coeficientes complexos tem pelo menos
uma raiz.
Outros exemplos de aplicação do teorema de Liouville:
Exemplo 5.3.5: Outras aplicações do Teorema de Liouville
1-) Se f é inteira e
∣∣ f (z)∣∣> 1, ∀z ∈C, então f é constante.
Basta observar que nestas condições, g (z) = 1/ f (z) é inteira e∣∣g (z)∣∣< 1.
2-) Se f é inteira e e f é limitada, então f é constante.
Neste caso, veja que e f é inteira, e como é limitada, pelo teo-
rema de Liouville é constante. assim, e f (z) = c ̸= 0. Temos então
por derivação que c f ′(z) = 0, ∀z ∈C, e como c ̸= 0, f ′(z) = 0, ∀z ∈
C, donde f é constante.
3-) Se f é inteira e Re( f ) é limitada superiormente ou inferiormente,
então f é constante.
Suponha que Re( f (z)) ≥ M , ∀z ∈ C (o outro caso é feito de
maneira análoga). Então, temos que e− f satisfaz,∣∣∣e− f (z)∣∣∣= e−Re f (z) ≤ e−M ,
portanto, e− f é uma função inteira e limitada, logo pelo item 2 f
é limitada.
94
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
5.4 A FÓRMULA INTEGRAL DE CAUCHY - DERIVADAS SUCESSIVAS
Seja f uma função holomorfa em uma região G. Dado a ∈ G, tomemos um
círculo C centrado em a de raio suficientemente pequeno para que C e seu
interior estejam contidos emG. Então a fórmula integral de Cauchy nos dá
que qualquer que seja z no interior de C , têm-se,
f (z) = 1
2πi
∫
C
f (ζ)
ζ− z dζ.
Se pudermos justificar a derivação sob o sinal de integração teremos:
f ′(z) = 1
2πi
∫
C
f (ζ)
(ζ− z)2 dζ, e f
(n)(z) = n!
2πi
∫
C
f (ζ)
(ζ− z)n+1 dζ, z ∈ Int(C ).
No que segue mostraremos que de fato podemos derivar dentro do sinal
de integração, que portanto as fórmulas acima são verdadeiras.
Lema 5.4.1
Suponha que φ(ζ) é uma função contínua sobre um arco γ. Então, para
cada n ∈N a função
Fφ,n(z) =
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z)n dζ,
é holomorfa em cada uma das regiões do plano determinadas pela
curva γ, e sua derivada em cada ponto é dada por F ′φ,n(z) = nFφ,n+1(z).
Demonstração A demonstração será feita por indução em n. Primeiro mos-
traremos que F1,φ é contínua: Seja z0 ∉ γ∗ e escolhaδ> 0 tal queγ∗∩D(z0;δ) =
;. Restringindo z ao disco D(z0;δ/2), teremos que |ζ− z| > δ/2, ∀ζ ∈ γ∗. Te-
mos então,
Fφ,1(z)−Fφ,1(z0) =
∫
γ
φ(ζ)
ζ− z dζ−
∫
γ
φ(ζ)
ζ− z0
dζ= (z − z0)
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z)(ζ− z0)
dζ,
portanto,
∣∣Fφ,1(z)−Fφ,1(z0)∣∣≤ |z − z0|∫
γ
∣∣φ(ζ)∣∣
|ζ− z| |ζ− z0|
|dζ| < |z − z0| 2
δ2
∫
γ
∣∣φ(ζ)∣∣ |dζ|.
A desigualdade acima mais o fato que
∫
γ
∣∣φ(ζ)∣∣ |dζ| é um número real positivo
que só depende de φ e γ, implicam que Fφ,1 é contínua em z0.
95
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
É necessário estar alerta para o que foi realmente demonstrado: qualquer
que seja o ponto z0 que não pertence a γ∗ e qualquer que seja a função φ
contínua sobre γ, a função Fφ,1 é contínua em z0.
Apliquemos agora o que acabamos de demonstrar a Fϕ,1, onde ϕ(ζ) =
φ(ζ)
ζ− z0
, que é também uma função contínua sobre γ. Então,
Fφ,1(z)−Fφ,1(z0) = (z−z0)
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z)(ζ− z0)
dζ= (z−z0)
∫
γ
ϕ(ζ)
ζ− z dζ= (z−z0)Fϕ,1(z),
consequentemente, como temos que Fϕ,1 é contínua em z0, vem que
F ′φ,1(z0) = limz→z0
Fφ,1(z)−Fφ,1(z0)
z − z0
= lim
z→z0
Fϕ,1(z) = Fϕ,1(z0) =
∫
γ
ϕ(ζ)
ζ− z0
dζ
=
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z0)2
dζ= Fφ,2(z0).
Mostramos assim que a afirmação é válida quando n = 1. Continuemos então
com a indução:
Suponha que F ′φ,n−1(z) = (n −1)Fφ,n(z), para todo z fora de γ∗, e toda função
φ contínua sobre γ∗. Temos então a identidade:
Fφ,n(z)−Fφ,n(z0) =
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z)n−1(ζ− z0)
dζ−
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z0)n
dζ

+(z − z0)
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z)n(ζ− z0)
dζ
nos dá que Fφ,n é contínua em z0, pela hipótese de indução aplicada a função
ϕ, na parte entre colchetes, e a última parcela tende a 0 quando z → z0 por que
pelo mesmo argumento no caso n = 1, a integral que lá aparece é limitada.
Dividindo a equação anterior por z − z0, teremos,
Fφ,n(z)−Fφ,n(z0)
z − z0
= 1
z − z0
[∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z)n−1(ζ− z0)
dζ−
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z0)n
dζ
]
+
∫
γ
φ(ζ)
(ζ− z)n(ζ− z0)dζ,
e agora,fazendo z → z0 teremos.
A primeira parcela do segundo membro, pela hipótese da indução, apli-
cada a ϕ(ζ) = φ(ζ)
ζ− z0
tende para (n − 1)Fϕ,n(z0) = (n − 1)Fφ,n+1(z0), e a outra
96
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
parcela, Fϕ,n(z) é contínua em z0, logo tende a Fϕ,n(z0) = Fφ,n+1(z0), portanto
F ′φ,n(z0) existe e é igual a nFφ,n+1(z0).
Segundo o lema que terminamos de demonstrar, se f é holomorfa em um
domínio G, e D(z;r ),C = ∂C ⊂ G, então,
f (n)(z) = n!
2πi
∫
C
f (ζ)
(ζ− z)n+1 dζ, n = 0,1, . . . .
5.4.1 Algumas consequências da Fórmula integral de Cauchy
Corolário 5.4.2
Se f é holomorfa em um domínio G então f ′, f ′′, etc são todas holo-
morfas em G.
Teorema 5.4.3: Teorema de Morera
Se f é contínua em uma região G e
∫
γ
f (z)d z = 0, para toda curva fe-
chada γ contida em G, então f é holomorfa em G.
Demonstração Se para toda curva fechada γ contida em G,
∫
γ
f (z)d z = 0,
então f é a derivada de uma função holomorfa em G, logo holomorfa, pelo
corolário anterior.
Teorema 5.4.4: As desigualdades de Cauchy
Se f é holomorfa no disco fechado centrado em a e de raio r , então
existe uma constante positiva M tal que, para cada número natural n
se tem
∣∣ f (n)(a)∣∣≤ Mn!r−n .
Demonstração Como f é contínua sobre C = ∂D(a;r ) existe M positivo tal
que
∣∣ f (ζ)∣∣ ≤ M , ζ ∈ C . Então, usando a fórmula integral de Cauchy para as
derivadas de f em a, temos
f (n)(a) = n!
2πi
∫
|ζ−a|=r
f (ζ)
(ζ−a)n+1 dζ,
e portanto,
∣∣ f (n)(a)∣∣≤ n!
2π
∫
|ζ−a|=r
∣∣ f (ζ)∣∣
r n+1
|dζ| ≤ n!
2πr n+1
M2πr = Mn!r−n .
Novamente temos uma demonstração do Teorema de Liouville, agora
usando as desigualdades de Cauchy.
97
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Teorema 5.4.5
Toda função inteira limitada é constante.
Demonstração Suponha que f é holomorfa em todo o plano e que existe
constante positiva tal que
∣∣ f (z)∣∣ ≤ M , no plano inteiro. Dado z ∈ C qualquer
aplicamos a desigualdade de Cauchy, com n = 1 a f no disco de centro z e raio
R. Temos então que
∣∣ f ′(z)∣∣ ≤ M/R, qualquer que seja R, portanto, fazendo
R −→∞, obtemos f ′(z) = 0, e como z é qualquer, segue que f tem derivada
nula, e portanto é constante.
5.4.2 Representação por séries de potências
Inicialmente mostraremos que em certas circunstâncias podemos trocar a or-
dem de uma soma infinita com a integral. Não estamos preocupados com as
condições mais gerais em que isto é possível; usaremos a condição que é su-
ficiente para os nossos objetivos no restante do curso.
Teorema 5.4.6: Troca de ordem da soma de uma série com uma inte-
gral
Sejam γ um caminho em C e U ,u0,u1, . . . ,un , . . . funções contínuas em
γ∗, tais que a série
∞∑
k=0
uk (z) converge para U (z), para todo z ∈ γ∗.
Suponha também que existem constantes Mk > 0, tais que
∞∑
k=0
Mk con-
verge e que |uk (z)| ≤ Mk , para todo k suficientemente grande, e para
todo z ∈ γ∗. Então,
∞∑
k=0
∫
γ
uk (z)d z =
∫
γ
∞∑
k=0
uk (z)d z =
∫
γ
U (z)d z.
Demonstração Seja UN (z) =
N∑
k=0
uk (z). Pelo critério da comparação(com a
série
∞∑
k=0
Mk ), temos que
∞∑
k=0
|uk (z)| converge. Assim,
∣∣∣∣∣∣
∫
γ
U (z)d z −
N∑
k=0
∫
γ
uk (z)d z
∣∣∣∣∣∣=
∣∣∣∣∣∣
∫
γ
(U (z)−UN (z))d z
∣∣∣∣∣∣≤ supz∈γ∗ {|U (z)−UN (z)|}×l (γ),
98
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
onde l (γ) é o comprimento de γ. Portanto,∣∣∣∣∣∣
∫
γ
U (z)d z −
N∑
k=0
∫
γ
uk (z)d z
∣∣∣∣∣∣≤
(
sup
z∈γ∗
∞∑
k=N+1
|uk (z)|
)
× l (γ) ≤
( ∞∑
k=N+1
Kk
)
× l (γ).
Como a série dos Mk converge, temos que lim
N→∞
( ∞∑
k=N+1
Mk
)
= 0, donde∣∣∣∣∣∣
∫
γ
U (z)d z −
N∑
k=0
∫
γ
uk (z)d z
∣∣∣∣∣∣→ 0, quando N →∞.
Como exemplo do uso deste teorema, se f (z) =
∞∑
k=0
ck z
k , |z| < R, R > 0, mos-
tremos que
cn = 1
2πi
∫
|z|=r
f (z)
zn+1
d z, 0 < r < R, n = 0,1, . . . .
Primeiro, notemos que se U (z) = z−n−1 f (z), e uk (z) = ck zk−n−1, teremos so-
bre |z| = r que
|uk (z)| = |ck |r k−n−1 := Mk , e portanto
∞∑
k=0
Mk converge; além disso
∞∑
k=0
uk (z)
converge para U (z), para todo z, |z| = r . Então pelo teorema acima, podemos
trocar a ordem da somação com integração, donde:
f (n)(0)
n!
= 1
2πi
∫
|z|=r
f (z)
zn+1
d z = 1
2πi
∫
|z|=r
( ∞∑
k=0
ck z
k
)
z−n−1d z =
∞∑
k=0
ck
 1
2πi
∫
|z|=r
zk−n−1d z
= cn ,
já que todos os termos em que o expoente de z é diferente de −1 tem integral
nula ao longo de |z| = r .
Teorema 5.4.7: Teorema de Taylor
Seja f uma função holomorfa no disco D(a;R); então existem constan-
tes cn tais que
f (z) =
∞∑
n=0
cn(z −a)n , z ∈ D(a;R),
com cn = 1
2πi
∫
|ζ−a|=r
f (ζ)
(ζ−a)n+1 dζ=
f (n)(a)
n!
, 0 < r < R.
99
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Demonstração Fixe z ∈ D(a;R), escolha r > 0 tal que |z −a| < r < R e denote
por γ, o círculo positivamente orientado |ζ−a| = r . Pela fórmula integral de
Cauchy temos que,
f (z) = 1
2πi
∫
γ
f (ζ)
ζ− z d w .
Como |z −a| < |ζ−a| , ∀ζ ∈ γ∗, temos que
1
ζ− z =
1
(ζ−a)+ z −a) =
1
ζ−a
1
1− z−a
ζ−a
= 1
ζ−a
( ∞∑
n=0
(
z −a
ζ−a
)n)
=
∞∑
n=0
(z −a)n
(ζ−a)n+1 ,
portanto,
f (z) = 1
2πi
∫
γ
∞∑
n=0
(z −a)n
(ζ−a)n+1 f (ζ)dζ.
Mas sobre γ∗ temos que,∣∣∣∣ (z −a)n(ζ−a)n+1 f (ζ)
∣∣∣∣≤ Mn := Mr
( |z −a|
r
)n
,
onde M = sup{∣∣ f (ζ)∣∣ , |ζ−a| = r }.
Como
|z −a|
r
< 1, a série
∞∑
n=0
Mn converge, e portanto podemos trocar a
ordem da integração com a soma, e assim temos que,
f (z) =
∞∑
n=0
 1
2πi
∫
γ
f (ζ)
(ζ−a)n+1 dζ
 (z −a)n ,
donde o resultado.
Algumas observações importantes devem ser salientadas:
Observação 1 As constantes cn a que se refere o teorema são únicas, posto que
os mesmos dependem apenas dos valores que a função f assume em uma
vizinhança de a.
Observação 2 Pela unicidade dos coeficientes cn , é permitido calcula-los por
qualquer método, e não apenas pela fórmula integral que normalmente daria
uma quantidade muito grande de cálculos.
Observação 3 Se f é holomorfa em uma região G, e a ∈ G, então a série de
Taylor de f baseada neste ponto converge no maior disco centrado em a e
contido em G, ou seja, o raio de convergência da série de Taylor de f baseada
em a, é a distância de a ao complemento de G.
100
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
Exemplo 5.4.8
Se f (z) = z6 sen3z, e a = 0, seria gasto muito tempo para calcular os
coeficientes de Taylor dessa função pela fórmula integral. No entanto,
como sabemos expandir a função sen z em série de potências, sen z =
∞∑
n=0
(−1)n
(2n +1)! z
2n+1, segue que
f (z) = z6
∞∑
n=0
(−1)n
2n +1(z)
2n+1 =
∞∑
n=0
(−1)n32n+1
(2n +1)! z
2n+7.
Exemplo 5.4.9
Consideremos agora o ramo principal do logaritmo, f (z) = log |z| +
iθ, θ ∈ (−π,π). f é holomorfa no disco D(1;1). Suponha que neste disco
a série de Taylor de f seja f (z) = Logz =
∞∑
n=0
cn(z −1)n .
Sabemos que
1
z
= d
d z
(Logz) =
∞∑
n=1
ncn(z −1)n−1, em |z −1| < 1. Por ou-
tro lado, se |z −1| < 1 temos que 1
z
= 1
1+ (z −1) =
∞∑
n=0
(−1)n(z −1)n .
Assim, pela unicidade da série de Taylor temos que ncn = (−1)n−1,n ≥ 1,
ou seja, cn = (−1)
n−1
n , n ≥ 1, e c0 = f (1) = 0, logo,
Logz =
∞∑
n=1
(−1)n−1
n
(z −1)n , z ∈ D(1;1).
Chegaremos à fórmula de Taylor de outra maneira. Esta nova fórmula é
a versão finita do teorema de Taylor, e é bastante útil como veremos no que
segue.
Teorema 5.4.10: Extensão holomorfa
Suponha que f é holomorfa em uma região G′, obtida ao omitir um
ponto a da região G. A condição necessária e suficiente para para que
exista uma função holomorfa em G que coincida com f em G′ é que
lim
z→a(z −a) f (z) = 0.
A função estendida fica determinada de maneira única.
101
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Demonstração A unicidade e necessidade são claras, uma vez que a função
estendida é contínua. Quanto a suficiência, seja r > 0 suficientemente pe-
queno para que o disco fechado de centro a e raio r , D(a;r ) esteja contido em
G. Seja C = ∂D(a;r ). Então, a função
g (z) =

f (z), z ̸= a
1
2πi
∫
C
f (ζ)
ζ−a dζ, z = a
é analítica em G e coincide com f em G′.
Para economizar as letras do alfabeto manteremos a notação f para a nova
função.
Apliquemos agoraeste teorema para dar uma demonstração da forma fi-
nita do teorema de Taylor.
Teorema 5.4.11: Teorema de Taylor - forma finita
Se f é holomorfa em uma região G e a ∈ G, é possível escrever
f (z) = f (a)+ f
′(a)
1!
(z −a)+·· ·+ f
(n−1)(a)
(n −1)! (z −a)
n−1 + fn(z)(z −a)n ,
com fn holomorfa em G.
Demonstração Apliquemos o resultado anterior a função F (z) =
f (z)− f (a)
z −a , z ∈ G \ {a}. Temos então que existe uma função holomorfa
f1 em G tal que f1 coincide com F em G \ {a} e que f1(a) = f ′(a). Repe-
tindo o processo com 1, existe uma função holomorfa em G, f2, tal que
f2(z) = f1(z)− f1(a)
z −a , z ∈ G \ {a}, e que f2(a) = f
′
1(a). Podemos repetir o pro-
cesso tantas vezes quisermos, o que nos dá:
f (z) = f (a)+ (z −a) f1(z)
f1(z) = f1(a)+ (z −a) f2(z)
. . . . . . . . . . . .
fn−1(z) = fn−1(a)+ (z −a) fn(z).
Efetuando todas as substituições nas equações acima temos que
f (z) = f (a)+ f1(a)(z−a)+ f2(a)(z−a)2+·· ·+ fn−1(a)(z−a)n−1+(z−a)n fn(z).
Derivando a última igualdade n vezes e fazendo z = a, temos que fn(a) =
f (n)(a)
n!
, o que nos dá o resultado desejado.
102
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
Podemos definir a função fn acima por uma fórmula integral como segue:
seja z ∈ D(a;r ), como acima. Então temos que
fn(z) = 1
2πi
∫
C
fn(ζ)
ζ− z dζ=
1
2πi
∫
C
1
(ζ− z)(ζ−a)n
(
f (ζ)− f (a)− f
′(a)
1!
(ζ−a)−·· ·− f
(n−1)(a)
(n −1)! (ζ−a)
n−1
)
dζ.
Nesta integral o integrando é composto de uma soma de termos
dos quais um contém o fator f (ζ), e os demais termos são da forma
− f
(n−µ)(a)
ν!(ζ− z)(ζ−a)ν , 1 ≤ ν ≤ n − 1. Escrevendo a integral como soma das inte-
grais das parcelas , mostraremos que no final teremos
fn(z) = 1
2πi
∫
C
f (ζ)
(ζ−a)n(ζ− z)dζ, |z −a| < r. (5.9)
Para verificar esta afirmação basta mostrar que as integrais
Fν(a) =
∫
C
dζ
(ζ− z)(ζ−a)ν , ν≥ 1
são todas nulas. Inicialmente temos que
F1(a) =
∫
C
dζ
(ζ− z)(ζ−a)1 =
1
z −a
∫
C
(
1
ζ− z −
1
ζ−a
)
dζ= 0,
pois
1
ζ− z −
1
ζ−a =
d
dζ
log
(
ζ− z
ζ−a
)
, visto que existe um ramo holomorfo de
log
(
ζ− z
ζ−a
)
fora do segmento [a, z], e este não cruza o círculo C .
Por outro lado, para ν ≥ 1, temos que Fν+1(a) =
F (ν)1 (a)
ν!
, donde Fν(a) =
0, , ν≥ 1, donde o resultado.
5.4.3 Zeros de funções holomorfas
Suponha, mantendo a notação, que f (ν)(a) = 0,∀ν≥ 0. Podemos então usar a
forma finita do teorema de Taylor e escrever que, para |z −a| < r tem-se
f (z) = fn(z)(z −a)n , ∀n ∈N.
103
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Mas se 0 < |z −a| < R < r e ∣∣ f (ζ)∣∣ ≤ M quando |ζ−a| = R, então, usando a
equação (5.9), a parametrização ζ = a +Re i t , 0 ≤ t ≤ 2π, e tendo em mente
que |ζ− z| = |ζ−a +a − z| ≥ |ζ−a|− |z −a| temos
∣∣ fn(z)∣∣=
∣∣∣∣∣∣∣
1
2πi
∫
|ζ−a|=R
f (ζ)
(ζ−a)n(ζ− z)dζ
∣∣∣∣∣∣∣≤
1
2π
∫
|ζ−a|=R
∣∣∣∣ f (ζ)(ζ−a)n(ζ− z)
∣∣∣∣ |dζ|
≤ 1
2π
2π∫
0
MRd t
Rn(R −|z −a|) =
M
Rn−1(R −|z −a|) , |z −a| < R.
Portanto,
∣∣ f (z)∣∣≤ |z −a|n
Rn−1
M
R −|z −a| ) =
( |z −a|
R
)n MR
R −|z −a| .
Como
|z −a|
R
< 1, temos que lim
n→∞
( |z −a|
R
)n
= 0, e portanto f (z) ≡ 0 em
|z −a| < R.
Mostremos então que f ≡ 0 em G.
Sejam
U = {z ∈ G | f (ν)(z) = 0, ν= 0,1,2, . . .}
e
V =
{
z ∈ G | ou f (z) ̸= 0, ou ∃ j ∈N tal que f ( j )(z) ̸= 0
}
.
Temos que U ∩V = ; e U ∪V = G, que pelo argumento acima U é aberto e
que V é aberto pelo fato de que f e todas as suas derivadas serem contínuas.
Como G é conexo segue que U = G ou V = G, e como estamos supondo que
U ̸= ;, segue que U = G, isto é, f ≡ 0 em G.
Se f (a) = 0, mas f não é nula, existe algum inteiro positivo m tal que
f (m)(a) ̸= 0. Seja h o menor inteiro positivo com esta propriedade. Então,
f (a) = f ′(a) = ·· · = f (h−1)(a) = 0, e f (h)(a) ̸= 0, donde,
f (z) = (z −a)h fh(z), fh(a) ̸= 0, fh holomorfa em G,
e a é um zero de ordem h de f . Da última equação fica claro que se f (a) = 0 e
f não é identicamente nula, então existe r > 0 tal que f (z) ̸= 0, se 0 < |z −a| <
r , ou seja, os zeros de uma função holomorfa não nula são isolados. Dito de
uma outra forma: Se uma função f , holomorfa em uma região G, se anula em
uma sequência (zn) que tem ponto de acumulação em G, então f ≡ 0 em G.
104
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
5.4.4 Singularidades isoladas
Definição 5.4.12
Um ponto a é uma singularidade isolada de f , se f é holomorfa em
0 < |z −a| < r , para algum r > 0.
Temos as seguintes possibilidades de comportamento de f em uma sin-
gularidade isolada a:
I -
∣∣ f (z)∣∣ é limitada em alguma vizinhança de a.
Neste caso, lim
z→a(z − a) f (z) = 0, e como já sabemos f pode ser estendida a a
como função holomorfa por lim
z→a f (z) que existe; neste caso diremos que a é
uma singularidade removível.
II -
∣∣ f (z)∣∣ não é limitada em nenhuma vizinhança de a e lim
z→a f (z) =∞.
Neste caso, teremos que existe r > 0 tal que f (z) ̸= 0, se 0 < |z −a| < r , e por-
tanto, a função definida por g (z) = 1/ f (z), z ̸= a satisfaz lim
z→a(z − a)g (a) = 0,
donde a é singularidade removível de g . Assim, a é um zero de ordem ≥ 1
de g , ou seja, em uma vizinhança de a temos que g (z) = (z − a)h gh(z), h ≥
1, gh(a) ̸= 0. Desse modo teremos em alguma vizinhança de a, f (z) = (z −
a)−h fh(z), com fh(z) = 1/gh(z) ̸= 0 em uma vizinhança de a. Neste caso dire-
mos que a é um polo de ordem h de f .
III - Se não ocorrem nem caso (I) nem caso (II) então lim
z→a f (z) não existe, fi-
nito ou infinito. Neste caso diremos que a é uma singularidade essencial de
f .
Definição 5.4.13: Função meromorfa
Diremos que uma função é meromorfa se a mesma é holomorfa exceto
por singularidades do tipo polo. Observe que por definição, os polos de
uma função meromorfa são isolados.
Teorema 5.4.14: Casorati-Weierstrass
Uma função holomorfa assume valores arbitrariamente perto de qual-
quer número complexo, em qualquer vizinhança de uma singularidade
essencial.
Demonstração Usemos redução ao absurdo. Se a afirmação fosse falsa, exis-
tiriam um número complexo A, δ > 0 e ϵ > 0, tais que ∣∣ f (z)− A∣∣ > δ se
0 < |z −a| < ϵ. Então a função g (z) = 1
f (z)− A é limitada em 0 < |z −a| < ϵ
e portanto tem uma singularidade removível em a. Mantendo a mesma nota-
105
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
ção para a extensão de g , podemos escrever em uma vizinhança de a, g (z) =
(z−a)l gl (z), gl (a) ̸= 0, l ≥ 0, de forma que f (z)−A ou é limitada em uma vizi-
nhança de a(l = 0), ou tem um polo em a(l ≥ 1). Como f (z) = ( f (z)− A)+ A,
temos que lim
z→a f (z) existe e é finito no primeiro caso, e existe e é infinito no
segundo caso, levando sempre a uma contradição, e portanto a afirmação do
teorema é verdadeira.
5.4.5 A aplicação local
Apliquemos agora a forma finita do teorema de Taylor a algumas situações
mais concretas.
Teorema 5.4.15: Número de zeros de uma função holomorfa dentro
de uma curva fechada
Seja f uma função holomorfa sobre uma curva fechada simples γ e seu
interior, e tal que f não se anula sobre γ∗. Então,
1
2πi
∫
γ
f ′(ζ)
f (ζ)
dζ= número de zeros de f no interior de γ.
Demonstração Como pelas hipóteses f ≡/ 0, então existe apenas um número
finito de zeros de f no interior da curva fechada γ, digamos z1, z2, . . . , zn , con-
tando multiplicidades. Aplicando repetidamente a fórmula finita de Taylor,
obtemos,
f (z) = (z − z1)(z − z2) · · · (z − zn)g (z),
sendo g uma função holomorfa sobre a curva γ e seu interior, e que não se
anula nem sobre γ∗ nem no interior de γ. Temos então que,
f ′(z)
f (z)
= 1
z − z1
+ 1
z − z2
+·· ·+ 1
z − zn
+ g
′(z)
g (z)
, z ̸= z j , z ∈ γ.
Como g (z) ̸= 0 sobre γ e no seu interior, o teorema de Cauchy garante que∫
γ
g ′(ζ)
g (ζ)
dζ= 0,
e então ,
1
2πi
∫
γ
f ′(ζ)
f (ζ)
dζ=
n∑
k=1
1
2πi
∫
γ
dζ
ζ− zk
= n,
como queríamos.
Observe que usamos acima o seguinte fato já demonstrado anterior-
mente:
106
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
Se a e b pertencem a mesma componente conexa de C \ γ∗, então
1
2πi
∫
γ
dζ
ζ−a =
1
2πi
∫
γ
dζ
ζ−b .
Corolário 5.4.16
Suponha que f é uma função holomorfa sobre uma curva fechadasim-
ples γ e seu interior, e é tal que f (ζ) ̸= a, se ζ ∈ γ∗. Então,
1
2πi
∫
γ
f ′(ζ)
f (ζ)−a dζ= número de raízes de f (z) = a no interior de γ.
Demonstração Aplique o teorema a função h(z) = f (z)−a.
Uma consequência imediata desta última afirmação é que se se a curva
γ é um círculo C , se a e b são pontos interiores a Γ = f ◦C , e f não assume
os valores a ou b sobre C , então, se a e b estão em uma mesma componente
conexa do complemento de Γ∗, as equações f (z) = a e f (z) = b tem o mesmo
número de soluções no interior de C , donde podemos enunciar o seguinte
Teorema 5.4.17
Suponhamos que f é holomorfa em z0, f (z0) = w0 e que a equação
f (z)−w0 = 0 tem uma raiz múltipla de ordem n em z0. Se ϵ > 0 é su-
ficientemente pequeno, existe δ> 0 tal que ∀a, |a −w0| < δ, a equação
f (z) = a tem exatamente n raízes no disco |z − z0| < ϵ.
Demonstração Como os zeros de uma função holomorfa não nula são isola-
dos, podemos escolher ϵ > 0 tal que f é holomorfa em |z − z0| ≤ ϵ, e que z0 é
o único zero de f no interior deste disco. Seja γ o círculo |z − z0| = ϵ, e seja
Γ= f ◦γ. Como w0 ∉ Γ, existe uma vizinhança |w −w0| < δ que não intersecta
Γ. Segue então que todos os a nesta vizinhança são imagem por f o mesmo
número de vezes dentro de γ. Como a equação f (z) = w0 tem n raízes iguais
dentro deγ, segue que cada valor dentro desta vizinhança é assumido n vezes,
contando multiplicidades.
Corolário 5.4.18: Teorema da aplicação aberta
Uma função holomorfa não constante é uma aplicação aberta, ou seja,
leva conjuntos abertos em conjuntos abertos.
Demonstração Pelo teorema todos os pontos de uma vizinhança de qualquer
ponto da imagem de f estão também na imagem de f .
107
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Uma consequência muito importante deste último corolário, é o resultado
conhecido com princípio do máximo.
Teorema 5.4.19: Princípio do máximo
Se f é uma função holomorfa não constante em uma região G então
seu valor absoluto
∣∣ f (z)∣∣ não atinge máximo em G.
Demonstração Pelo teorema da aplicação aberta, se w0 = f (z0), então existe
δ > 0 tal que |w −w0| < δ, então w = f (z). Assim existem pontos na imagem
com valor absoluto maior que
∣∣ f (z0)∣∣, logo |w0| não pode ser máximo local.
Uma outra forma de enunciar o princípio do máximo é:
Se f é uma função contínua num compacto K e holomorfa no interior de K ,
então
∣∣ f (z)∣∣ atinge seu máximo na fronteira de K .
Teorema 5.4.20: Lema de Schwarz
Se f é holomorfa em |z| < 1 e satisfaz:
(a)
∣∣ f (z)∣∣≤ 1;
(b) f (0) = 0,
então
∣∣ f (z)∣∣≤ |z| , |z| < 1 e ∣∣ f ′(0)∣∣≤ 1.
Se
∣∣ f (z)∣∣= |z| para algum z ̸= 0 ou se ∣∣ f ′(0)∣∣= 1, então f (z) = cz, com c
constante de módulo 1.
Demonstração Aplique o princípio do máximo a função holomorfa
f1(z) =

f (z)
z
, z ̸= 0
f ′(0), z = 0.
Sobre o círculo |z| = r < 1, temos que ∣∣ f1(z)∣∣= ∣∣ f (z)∣∣|z| ≤ 1r , e portanto, pelo
princípio do máximo temos que
∣∣ f1(z)∣∣≤ 1
r
, se |z| ≤ r , e, fazendo r → 1, temos
que
∣∣ f1(z)∣∣≤ 1, ∀z, |z| < 1. Assim ∣∣ f (z)∣∣≤ |z|, se |z| < 1 e ∣∣ f ′(0)∣∣≤ 1.
Se
∣∣ f ′(0)∣∣ = 1 ou ∣∣ f (z)∣∣ = |z|, para algum z ̸= 0 então ∣∣ f1(z)∣∣ assume o seu
máximo em um ponto interior, donde, pelo princípio do máximo, f1(z) é uma
função constante. Como no ponto de máximo,
∣∣ f1(z)∣∣ = 1, segue que f (z) =
cz, com |c| = 1.
A próxima afirmação é uma generalização do Teorema 5.4.5
108
5.4. A fórmula integral de Cauchy - derivadas sucessivas
Teorema 5.4.21: Princípio do argumento
Sejam f é uma função meromorfa em uma região G e γ é uma curva
fechada simples que não passa por nenhum dos polos ou zeros de f e
tal que γ e seu interior estejam contidos em G, então, se temos Z zeros
de f no interior de g amma e P polos no interior de γ, teremos
1
2πi
∫
γ
f ′(ζ)
f (ζ)
dζ= Z −P.
Demonstração No domínio G′ obtido de G pela remoção dos polos de f in-
terseção com o interior de γ, podemos escrever
f (z) = (z − z1)h1 · · · (z − zn)hn f1(z),
com f1 holomorfa no interior de γ interseção com G′ e z1, · · · , zn são zeros de
f que estão no interior de γ.
Do mesmo modo, agora fatorando os polos de f1 podemos escrever que
f1(z) = (z −p1)−k1 · · · (z −pm)−km F (z),
onde os p1, · · · , pm são os polos de f no interior de γ, e F é uma função holo-
morfa sem zeros sobre γ e no interior de γ. Temos então que
f (z) = (z − z1)h1 · · · (z − zn)hn (z −p1)−k1 · · · (z −pm)−km F (z),
donde,
f ′(z)
f (z)
=
n∑
j=1
h j
z − z j
−
m∑
l=1
kl
z −pl
+ F
′(z)
F (z)
.
Assim,
1
2πi
∫
γ
f ′(ζ)
f (ζ)
dζ=
n∑
j=1
1
2πi
∫
γ
h j
ζ− z j
dζ−
m∑
l=1
1
2πi
∫
γ
kl
ζ−pl
dζ+ 1
2πi
∫
γ
F ′(ζ
F (ζ)
dζ.
Como
F ′
F
é holomorfa sobre γ e no interior de γ, pelo teorema de Cauchy a
última integral é nula, logo,
1
2πi
∫
γ
f ′(ζ)
f (ζ)
dζ=
n∑
j=1
h j −
m∑
l=1
kl = Z −P.
Como uma consequência do princípio do argumento, mostraremos o te-
orema de Rouché.
109
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Teorema 5.4.22: Teorema de Rouché
Se γ é uma curva fechada simples, f e g são funções holomorfas em
uma região G contendo γ e seu interior e são tais que
∣∣ f (z)− g (z)∣∣ <∣∣ f (z)∣∣ sobre γ, então f e g tem o mesmo número de zeros no interior
de γ.
Demonstração A condição
∣∣ f (z)− g (z)∣∣ < ∣∣ f (z)∣∣ , z ∈ γ∗ implica que nem f
nem g se anulam sobre γ. Portanto satisfazem sobre γ,∣∣∣∣g (z)f (z) −1
∣∣∣∣< 1.
u
v
1
Γ
|w −1| = 1
Figura 5.10: Teorema de Rouché
Observem na figura que se Γ= F ◦γ, onde F (z) = g (z)
f (z)
= w , então Γ∗ está
contida no disco D(1;1), onde temos definido um ramo do log, portanto, por
um lado,
1
2πi
∫
γ
F ′(z)
F (z)
d z = 1
2πi
∫
Γ
d w
w
= 0.
110
5.5. Singularidades novamente – Teorema de Laurent
Por outro lado, pelo Princípio do Argumento temos que,
1
2πi
∫
γ
F ′(z)
F (z)
d z é
numericamente igual a diferença entre o número de zeros de F no interior de
γ e o número de polos de F no interior de γ.
Como a é zero de F se e só se a é zero de g e p é polo de F se e só se p
é zero de f , temos o resultado. Vejamos agora exemplos de aplicações desta
última afirmação.
Exemplo 5.4.23
Quantas raízes a equação z7−2z5+6z3−z+1 = 0 tem dentro do círculo
unitário?
Observando a equação vemos que um dos coeficientes tem valor abso-
luto maior que a soma dos valores absolutos dos demais coeficientes;
isto é o que precisamos para aplicar o teorema de Rouché. Portanto, to-
mando f (z) = 6z3 e g (z) = z7−2z5+6z3−z+1, temos que sobre |z| = 1,∣∣ f (z)− g (z)∣∣= ∣∣−z7 +2z5 + z −1∣∣≤ |z|7 +2 |z|5 +|z|+1 = 5 < 6 = ∣∣ f (z)∣∣ .
Então f e g tem o mesmo número de zeros dentro do círculo unitário;
como f tem o 0 como zero triplo, tem três zeros, logo a equação dada
tem três raízes dentro do círculo unitário.
Exemplo 5.4.24
Se n é um inteiro positivo e a > e é um número real, então a equação
ez = azn tem n raízes dentro de |z| = 1.
Chame g (z) = ez −azn e f (z) =−azn .
Em |z| < 1, f tem n zeros, e temos sobre |z| = 1 que∣∣ f (z)− g (z)∣∣= ∣∣ez∣∣= e Rez ≤ e.
Por outro lado, sobre |z| = 1, ∣∣g (z)∣∣= |a| |z|n = |a| > e, logo, sobre |z| = 1,
temos que
∣∣ f (z)− g (z)∣∣< ∣∣ f (z)∣∣ . Portanto, pelo teorema de Rouché f e
g tem o mesmo número de zeros dentro do círculo unitário, n.
5.5 SINGULARIDADES NOVAMENTE – TEOREMA DE LAURENT
Se uma função f , definida e holomorfa em U \ {a}, com a ∈U ⊂ C, não é ho-
lomorfa em a, então, naturalmente não podemos expandi-la como uma série
de potências em z−a, mas veremos que podemos ter uma expansão em série
111
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
em que aparecem termos da forma a j (z − a) j , onde j pode assumir valores
negativos também.
Vejamos inicialmente alguns exemplos simples:
Exemplo 5.5.1
Seja f (z) = 1
1+ z , z ̸= −1.
(a) Como f é holomorfa em z = 0, podemos expandi-la em torno deste
ponto, e, lembrando da fórmula da soma de uma série geométrica, te-
mos que
f (z) = 1
1+ z =
∞∑
n=0
(−1)n zn , |z| < 1.
(b) Se |z| > 1, f (z) = 1
1+ z =
1
z(1+ 1z )
. Como |z| > 1,
∣∣∣∣1z
∣∣∣∣ < 1, donde po-
demos escrever:
f (z) = 1
1+ z =
1
z(1+ 1z )
= 1
z
∞∑
n=0
(−1)n
(
1
z
)n
=
∞∑
n=0
(−1)n
(
1
z
)n+1=
∞∑
n=0
(−1)n z−n−1 =
−1∑
m=−∞
(−1)m zm .
(c) Seja agora f (z) = e1/z , z ̸= 0. Temos então que f (z) =
∞∑
n=0
1
n!
(
1
z
)n
=
∞∑
0
1
n!
z−n .
(d) Seja agora f (z) = 4
(1− z)(z +3) =
1
1− z +
1
z +3, 1 < |z| < 3.
Teremos então que , f (z) =
−1∑
n=−∞
zn +
∞∑
n=0
(−1)n3−n−1zn .
Definição 5.5.2
Diremos que uma série da forma
∞∑
−∞
an converge se e somente se as
séries
∞∑
n=0
an e
∞∑
1
a−n convergem.
112
5.5. Singularidades novamente – Teorema de Laurent
Teorema 5.5.3: Teorema de Laurent
Seja A a região do plano complexo,
A = {z ∈C | R1 < |z −a| < R2}, 0 ≤ R1 < R2 ≤∞,
e seja f holomorfa em A. Então,
f (z) =
∞∑
−∞
cn(z −a)n , z ∈ A,
sendo cn = 1
2πi
∫
γr
f (w)
(w −a)n+1 d w, R1 < |w −a| = r < R2 e γr o círculo de
raio r centrado em a e orientado positivamente.
Demonstração Considere a próxima figura para orientar nosso argumento, e
defina as seguintes funções:
f1(z) = 1
2πi
∫
γr
f (η)
η− z dη, |z −a| < r < R2,
f2(z) =− 1
2πi
∫
γr
f (η)
η− z dη, R1 < r < |z −a| .
x
y
a
r
R1
R2
Figura 5.11: Região anelar
113
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
O valor de r é irrelevante pelo teorema de Cauchy, desde que |z −a| = r
não passe por z. Desta forma f1 e f2 são funções holomorfas únicas defini-
das em |z −a| < R2 e |z −a| > R1, respectivamente. Além disso, o teorema de
Cauchy nos garante que f (z) = f1(z)+ f2(z), R1 < |z −a| < R2. Teremos então
que:
f1(z) =
∞∑
n=0
An(z −a)n , com An = 1
2πi
∫
γr
f (ζ)
(ζ−a)n+1 dζ.
O desenvolvimento de f2 é um pouco menos direto:
Primeiro, a transformação ζ = a + 1
ζ′
, e z = a + 1
z ′
leva |ζ−a| = r em ∣∣ζ′∣∣ = 1
r
com orientação invertida; calculando temos:
f2(a + 1
z ′
) = 1
2πi
∫
|ζ′|= 1r
z ′
ζ′
f
(
a + 1ζ′
)
ζ′− z ′ dζ
′ =
∞∑
n=1
Bn z
′n ,
com
Bn = 1
2πi
∫
|ζ′|= 1r
f
(
a + 1
ζ′
)
ζ′n+1
dζ′ = 1
2πi
∫
|ζ−a|=r
f (ζ)(ζ−a)n−1dζ.
Portanto,
f (z) =
∞∑
−∞
An(z −a)n , An = 1
2πi
∫
γr
f (ζ)
(ζ−a)n+1 dζ, n ∈Z.
Como já vimos antes, diremos que a ∈ C uma singularidade isolada de
uma função holomorfa f , se f é holomorfa em U \{a}, com U sendo um aberto
que contém a. Neste caso podemos desenvolver a função f em série de Lau-
rent, em um domínio da forma 0 < |x −a| < R, para algum R > 0, e teremos
então que
f (z) =
∞∑
−∞
An(z −a)n , An = 1
2πi
∫
|ζ−a|=r
f (ζ)
(ζ−a)n+1 dζ, n ∈Z.
Assim, em 0 < |z −a| < R, a função f se escreve como:
f (z) =
−1∑
−∞
An(z −a)n +
∞∑
n=0
an(z −a)n .
A primeira série acima é chamada de parte principal da expansão de Laurent.
A segunda série representa uma função holomorfa em uma vizinhança de a.
114
5.5. Singularidades novamente – Teorema de Laurent
Seja então a uma singularidade isolada de uma função holomorfa f .
Definição 5.5.4
A singularidade a é:
i) Uma singularidade removível, se An = 0, ∀n < 0;
ii) Um polo de ordem m, se A−m ̸= 0 e An = 0, se n <−m.
iii) Uma singularidade essencial se não existe m tal que cn = 0,
∀n <−m.
Exemplo 5.5.5
A função f (z) = (z −1)−3 é sua própria expansão de Laurent em torno
de z = 1, onde tem um polo triplo.
Exemplo 5.5.6
A função f (z) = πcot(πz) = πcos(πz)
sen(πz)
= 1
z
− z
3!
+ . . . em 0 < |z| < 1. A
parte principal é
1
z
e portanto πcot(πz) tem um polo de ordem 1 na
origem. Como cot(π(z −1)) = cot(πz −π) = cot(πz) então todos os in-
teiros são polos de ordem 1 de πcot(πz), e parte principal de πcot(πz)
em z = n é 1
z −n .
Exemplo 5.5.7
A função f (z) = (1−cos z)z−2 tem uma singularidade removível na ori-
gem. Para vermos isto, basta expandir cos z em série de potências de z,
e fazermos as simplificações.
(1−cos z)z−2 =
(
1−
∞∑
n=0
(−1)n
(2n)!
z2n
)
z−2 =
(
1
2!
z2 − 1
4!
z4 + 1
6!
z6 − . . .
)
z−2
= 1
2!
z − 1
4!
z2 + 1
6!
z4 − . . . , |z| > 0.
Neste caso não existem termos com expoentes negativos.
Podemos agora reformular o que sabemos sobre polos:
115
5. INTEGRAÇÃO NO PLANO COMPLEXO
Corolário 5.5.8
Um número complexo a é um polo de ordem m de uma função f se e
só se ∃D ∈C\ {0} tal que lim
z→a(z −a)
m f (z) = D .
O teorema seguinte também é imediato:
Teorema 5.5.9
(a) f holomorfa em Ĉ=⇒ f constante.
(b) f meromorfa em Ĉ=⇒ f = P
Q
, com P e Q polinômios.
116

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