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Durkheim, Simmel e Weber e a Liberdade

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CONTRIBUIÇÕES DE DURKHEIM, WEBER E SIMMEL NA DELIMITAÇÃO DA
NOÇÃO DE LIBERDADE
Um tema sempre ganhou destaque e inspirou diversos feitos conforme o decorrer da
história da humanidade: a liberdade. Ela foi vista de diversas perspectivas e tomou vários
significados diferentes, uma ideia que ganhou destaque, principalmente a partir do século
XVIII e perdura até hoje, é a visão liberal que busca e entende a liberdade como
incondicional, ou seja, uma situação em que os indivíduos são livres de qualquer influência
externa em suas escolhas. No entanto, esta noção de livre-arbítrio, que é a possibilidade de
autonomia nas decisões e na vontade própria, foi problematizada por diversos pensadores
desde a época. Alguns dos principais intelectuais que desenvolveram teorias adversas a essa
concepção foram Émile Durkheim, Max Weber e Georg Simmel, sociólogos que, ao
refletirem sobre os fenômenos sociais, consideraram as influências inevitáveis sobre os
sujeitos. Assim, traçaram limites no poder de escolha e, por conseguinte, na noção de
liberdade dos indivíduos. Reconhecer a importância de suas teorias que cercam o tema da
liberdade e do livre-arbítrio nos faz ir além das influências sociais sobre os sujeitos, do papel
singular do indivíduo no meio e dos limites das alternativas de ação para uma compreensão
também dos fenômenos que agridem a liberdade na atualidade.
Desde a Grécia Antiga, berço da civilização ocidental que tinha como um dos
fundamentos a ideia do mito, de origem sobrenatural, já se discutia acerca do conceito de livre
arbítrio, sendo o destino delimitado pelos interesses divinos, como pode ser visto de forma
clara em inúmeras obras do período, como no mito das moiras e nos relatos de Homero e
Hesíodo. Alguns séculos adiante, em especial no século XIX, pensadores debatem questões
sobre como a liberdade humana se delimita a influências do meio externo. Apesar de
sugerirem a mesma ideia de liberdade determinada, se, para a consciência mítica, o limite é
imposto de formas sobrenaturais, para o discurso dos cientistas europeus do século XIX o
homem está sujeito ao que se chamou de “determinismo”. A noção determinista,
exaustivamente aplicada às ciências naturais, sugere a ideia de que os comportamentos do
mundo são guiados por uma noção de causalidade, ligados à uma funcionalidade mecânica.
Assim, através de uma tentativa de aplicação desse fenômeno às ciências humanas, vários
pensadores então sugerem que toda escolha livre não passa de uma ilusão.
Diante da noção conflitante de indivíduo livre ou determinado, cabe, ao invés de
radicalizar como fez o materialismo mecanicista, propor formas de que essas noções se
dialoguem. Por um lado, pode-se dizer que o homem é determinado pelo contexto histórico em
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que se encontra, determinado pelas causas, porém, por outro lado, tem-se a consciência de que
o homem perante a causalidade transforma-se em agente atuante, e não somente passivo, do
meio em que vive. Nessa perspectiva, pensa-se na liberdade como um fenômeno que não
existe como “coisa em si”, pois é necessária uma relação entre o indivíduo dentro de um
contexto próprio e os obstáculos que ele enfrenta. A abstração do conceito libertário atrasa a
percepção do ser como atuante, e dominante, na superação desses entraves impostos pela
realidade social em que vive, pois a liberdade não é um dom, nem a ausência de obstáculos, é
algo a ser conquistado. É preciso ver o homem também como influente na composição social
através de suas próprias singularidades e escolhas, mesmo que estas possam ser em parte
finitas de alternativas segundo as estruturas do contexto que o cerca.
Outro aspecto presente no debate do que seria a liberdade é a teoria da liberdade
incondicional. Em contraste com a ideia determinista de que tudo existe por uma causa, reside
a ideia de livre-arbítrio, dando ao indivíduo o poder de escolha plena. Sendo assim, ser livre,
para o conceito da liberdade incondicional, é poder decidir e agir como deseja, independente
de fatores exteriores e interiores, de qualquer condição. Esta é uma ideia que as teorias de
Durkheim, Weber e Simmel desfazem.
A partir do rompimento com o pensamento medieval, da ruptura do obscurantismo
religioso e da ideia tirânica de coletivo, houve uma mudança radical de mentalidade e
organização da sociedade. Foi através da modernidade que começou a valorização da
individualidade, da capacidade de julgamento crítico e da vontade individual. Por meio dessa
mudança de paradigma, toda a estrutura social foi alterada e moldada em aspectos liberais, que
refletindo a mudança da sociedade, transformou o governo em um poder regulador a serviço
da proteção da propriedade, dos interesses individuais e da subjetividade. A estrutura, que
antes era baseada em uma relação de submissão do indivíduo perante seu dever com a
comunidade, passou a preservar a autonomia individual.
O conflito entre a propriedade - em todo seu sentido de independência com relação ao
conjunto - e a ideia de submissão individual perante a comunidade foi o ponto chave da
modernidade, visto que assim que surgiu o sentido de propriedade privada, sem vínculos
sociais com a comunidade, os indivíduos se tornaram mais autônomos. Devido a toda essa
ruptura e reestruturação da mentalidade social, a concepção de liberdade também foi afetada.
A liberdade passou a ser um princípio essencial em que tudo deveria ser baseado nela,
tornou-se o valor
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básico de todos os fundamentos morais e fundou-se no pensamento liberal essencialmente
individualista.
Como consequência desse contexto, o princípio estabelecido era de um sujeito capaz de
escolher de forma autônoma partindo de sua avaliação pessoal, ou seja, um princípio de livre
arbítrio e de uma liberdade incondicional. Dessa forma, a estrutura social baseava-se na ideia
de indivíduos livres e independentes exercendo sua liberdade de escolha, se relacionando por
meio de acordos livres entre semelhantes.
Durkheim, Weber e Simmel irão problematizar essa ideia através de suas teorias que
colocaram o indivíduo como determinado pelos fenômenos sociais, logo, estabelecendo limites
ao livre-arbítrio e a liberdade. Para estabelecer tais limites de forma eficiente, mesmo que
todos esses sociólogos compartilhem algumas concepções, a seguir será ressaltado
fundamentos específicos de cada um que se articulam e constroem a estrutura de uma
liberdade onde o indivíduo, ainda que determinado em parte, pela heterogeneidade de
elementos que o constituem possui certa singularidade e poder de escolha, mesmo que esta
finita de opções e influenciada socialmente. O mais importante é a compreensão da quebra
com os conceitos de um livre-arbítrio absoluto e uma liberdade incondicional que permeia a
consciência coletiva até hoje.
Émile Durkheim formula a tese do fato social, que por definição, possui três principais
características: a primeira, a exterioridade, implica na existência dos fatos sociais fora dos
indivíduos, independentemente de suas vontades e aceitação voluntária, ou seja, o indivíduo ao
nascer já adentra num mundo cercado de uma força social que exerce poder sobre seus
comportamentos. A segunda característica, a coercitividade, diz respeito à força exercida pelos
fatos sociais a fim de regular suas ações em detrimento das regras impostas pela sociedade. A
coercitividade se dá pelo constrangimento que causa no indivíduo ao não aderir às regras que a
sociedade dita, como por exemplo usar determinado tipo de roupa para determinada situação
social: caso não haja adesão à regra, é inevitável que o indivíduo vá sofrer com olhares de
descontentamento. Na situação exemplificada anteriormente, percebe-se que com a reprovação
de suas ações, o indivíduo passa a sentir a força coercitiva, que antes agia sutilmente, eis,
então, uma grande característica dessa coerção: passa despercebida até que se levante contra
ela. Ainda sobre a questão dessa força agir através de constrangimento, cabe ressaltar outroponto levantado por Durkheim: a coesão. Esta sendo, portanto, resultado da coerção,
apresenta-se como uma fuga desse constrangimento social, promovendo um estado de união
coesa do grupo
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social. Sem ela, a sociedade adoece no estado de anomia, visto que a coesão é o que mantém a
união coletiva e promove a solidariedade. Por fim, a terceira característica, a generalidade,
Durkheim afirma: “este fenômeno é um estado do grupo, que se repete nos indivíduos porque
se impõe a eles” (DURKHEIM, Émile. As Regras do Método Sociológico. 3° ed. São Paulo:
Martins Fontes, 2007, p. 9). Sendo assim, o fato social é geral justamente porque é coletivo e
se difunde por toda a sociedade, se expressa de forma geral a ela, um exemplo é o idioma de
uma nação.
Em suma, “é fato social toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o
indivíduo uma coerção exterior; ou então ainda, que é geral na extensão de uma determinada
sociedade, apresentando uma existência própria, independente das manifestações individuais
que possa ter” (Op. cit. p. 13). Desse modo, implica que para Durkheim uma liberdade
incondicional não é real, visto que não somos autores absolutos da nossa própria vivência em
sociedade. “Somos vítimas de uma ilusão que nos faz crer que elaboramos, nós mesmos, o que
se impôs a nós de fora”. (Op. cit. p. 5)
Porém, mesmo diante tantos fenômenos que determinam o ser, ainda somos indivíduos
ativos dentro da sociedade e também temos papel no constructo coletivo com nossas atitudes.
Max Weber trabalha com a questão: em suas obras, ele considera o indivíduo como a unidade
explicativa, fazendo dele o ponto de partida e de chegada, na medida em que o processo de
conhecimento se fundamenta na ação individual. O sociólogo acreditava que os sujeitos
dispunham de liberdade para agir e modificar sua realidade, mesmo que, em contrapartida,
tenham alternativas finitas de escolha, pois é determinado pelo contexto social.
Weber desenvolveu em suas obras a questão da “ação social”, a qual se dá em um
comportamento que, mesmo atribuído por um agente singular, se orienta também através do
comportamento dos outros. Foram fundamentais para que ele desenvolvesse suas teorias, do
valor dado a cada escolha individual, as ideias de Heinrich Rickert (1943), as quais
sustentavam que cada indivíduo constrói sua personalidade, define e decide seu destino, ou
seja, define uma causa ou ideal a que se dedica. Diante dessa visão, constrói o conceito de
ação social significativa (compreensível), tendo como princípio básico o indivíduo como
centro da ação, mas que também se expande para as instituições sociais como Estado e
empresas privadas ou públicas.
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Além disso, para Weber, o conceito de razão universal é abandonado em prol da
contingência histórica, a qual possui um sentido fluido, visto que tem por base as dinâmicas de
sentido que determinam a ação dos sujeitos, cabendo a cada um escolher seus valores. As
ciências que estudam a ação social se diferem das ciências exatas justamente por essa fluidez,
que causa falta de certeza e solidez no sentido das ações. Weber, ao falar de ação social, se
utiliza de “tipos ideais”, que, embora não se enquadrem em contextos históricos, são
construtos fundamentados no desencanto do mundo aliado à busca e produção de um sentido.
Ao refletir tal fenômeno, usa da religião como exemplo, e vincula ela como elemento de
legitimação de poder e de domesticação das massas, deixando evidente a sua ideia de
influência social na ação humana, embora esta seja a causa inicial daquela. Logo, visto a
consideração das influências sociais nas ações dos sujeitos, percebemos mais um discurso que
rompe com a ideia de liberdade incondicional e com a noção de livre-arbítrio. À vista deste
fato, das determinações externas sobre o indivíduo, as ações sociais de Weber abrem espaço
para um debate importante: os limites do livre-arbítrio, ou seja, até onde o sujeito tem
capacidade de escolher suas ações e, portanto, definir seu destino.
Acerca destes certos fenômenos que o indivíduo tem controle, ou seja, do que está
restrito a seu livre-arbítrio, Georg Simmel contribui para compreensão dos limites da liberdade
através da sua sociologia das formas. Propondo uma análise social pautada em uma abstração
particular da sociedade, Simmel aborda o conceito de “microssociologia”, que seria baseado
na ideia de que ao estudar a sociedade, deve se ater às partes, e não somente ao todo. Sua
maior crítica foi à sociologia genérica, que parte do pressuposto da realidade histórica como
um todo, e que tem como objeto todos os eventos que ocorrem na sociedade. Para ele, uma
forma de conhecimento direcionada à totalidade não poderia ser ciência, pois esta opera com
recortes e seleções. Portanto, a Sociologia para Simmel só ocuparia lugar perante as ciências
caso abandonasse a tentativa de abarcar o todo da sociedade, da história, passando a dividir,
fracionar esse todo. Logo, baseando-se em Kant, Simmel afirma que, assim como para o
filósofo a geometria é possível porque toma como objeto intuições puras do espaço, nas quais
as formas do espaço podem ser pensadas de maneira independente do todo, de todo conteúdo
particular, a sociologia deveria separar forma de conteúdo, ou seja, separar as formas de
socialização dos conteúdos particulares da vida. Para ele, o conhecimento dos fenômenos
sociais só poderia ser compreendido mediante a adoção de categorias, que teriam como
função a interpretação da realidade social de maneira meticulosa. Desta forma, Simmel
propõe uma sociologia que estuda as formas de determinados fenômenos sociais, assim, acaba
por articular a ideia de formas e
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objetos culturais específicos no mundo que cercam os indivíduos e que estes interagem. À
vista disto, concluímos que os sujeitos fazem parte de uma pluralidade de esferas, formas
culturais, que vão influenciar seu ser. Logo, o livre-arbítrio está limitado à experiência
segundo os objetos culturais que a pessoa entrou em contato, sua liberdade então é definida
por padrões culturais que ele está sujeito. Nunca será, portanto, uma liberdade incondicional,
pois não há poder de decisão além das perspectivas dos objetos culturais interagidos, ou seja,
as oportunidades de escolha tornam-se finitas.
Seguindo essa lógica, podemos concluir que quanto mais formas culturais o indivíduo
interage, mais autonomia das influências sociais teria, pois o poder de escolha é maior sobre
suas próprias ações por conta da consciência de diversas perspectivas para seguir. Ou seja,
quanto mais objetos culturais são conhecidos, mais expandido é o poder de decisão sobre suas
ações e, por conseguinte, maior a liberdade. Visto isto, é esperado que a modernidade, o
desenvolvimento da globalização, o progresso científico, a experiência da internet, e entre
outros fenômenos que impõe uma relação com diversas formas culturais sobre os sujeitos,
façam o indivíduo cada vez mais livre. Porém, certas questões da atualidade nos fazem
questionar se realmente a liberdade é maior nos dias de hoje, ainda mais quando consideramos
os conceitos de Durkheim, Weber e Simmel na compreensão dos fenômenos atuais.
Segundo observa o filósofo sul coreano Byung Chul Han, o neoliberalismo nos
conduziu a uma nova forma de liberdade que é ilusória e coercitiva, os sujeitos que
acreditavam ter se libertado das forças externas e das restrições impostas pelos outros agora se
submetem a coações internas na forma de obrigações de desempenho e otimização. O sistema
neoliberal criou condições que nos fazem acreditar que somos projetos livres, e não
indivíduos submissos, porém, sem um senhor, ele se torna um servo absoluto: se autoexplora
na coerção social de maximizar seu desempenho. É uma liberdade ilusória onde o modelo é
eficiente e consegue se manter oculto pois explora a pessoa a favor de sua própria vontade, e
sobretudo, faz de quem fracassar nele acreditar que a culpa é de si mesmo e não do sistema.
Outro dispositivoneoliberal é a transparência, pois é através dela que se emergem as
informações tão valiosas para apoiar as estratégias de controle e atividade do mercado e da
política. E é neste contexto que se processa a mais grave crise de liberdade: com a intensa, e
voluntária, exposição na internet, até a vontade própria é atingida. Os big data, mecanismo que
capta enorme quantidade de informações distintas do usuário, permitem um prognóstico sobre
o comportamento humano e torna possível prever e controlar os desejos dos indivíduos. Eles
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são usados nas estratégias de estimativa e determinação dos conteúdos mais relevantes para
um sujeito na rede, é por fim uma ferramenta que pode influenciar a psique até em nível pré
reflexivo. Este fenômeno, para Han, anuncia o fim da pessoa e do livre-arbítrio.
Esta crise da liberdade se apresenta mais nítida ao usar os conceitos de Durkheim,
Weber e Simmel que foram apresentados. Com elas, elaboramos limites à noção de
livre-arbítrio e liberdade que propõe um indivíduo determinado, porém também agente do
meio. Este fato que evidencia a grande problemática do cenário denunciado por Han, o
neoliberalismo e a internet criaram fenômenos que submetem os indivíduos a influências
externas tão mais intensas e precisas que podem determinar em muito as atitudes individuais,
pondo em xeque a livre escolha que sustenta uma liberdade mínima.
A autoexploração e extrema transparência dos sujeitos no neoliberalismo e no
ambiente virtual demonstram a precisão das características de exterioridade, coercitividade e
generalidade dos fatos sociais que são bem mais fortes no contexto, mesmo que pouco
perceptíveis. Os big data e algoritmos que preveem e controlam o que é apresentado para o
indivíduo na internet limitam os objetos culturais que este interage, mesmo que o meio nos dê
a sensação que estamos experimentando um contato infinito de formas culturais, há imensa
polarização dos conteúdos que acessamos cuja intenção é fazer o sujeito se sentir satisfeito
com a rede e continuar usando. Além disso, o controle do que nos é mostrado na internet é
manipulado pelo mercado e política de diversas formas com intenção de induzir a um fim de
interesse privado. Estes fenômenos que comandam a exibição de conteúdos são preocupantes
pois pode determinar em muito o indivíduo, podendo o influenciar até em nível pré-reflexivo,
assim, coagindo o poder de escolha e ação dos sujeitos. A ação social individual que é
constituída por vontade própria passa a ter menos força diante tanta coercitividade, o papel
ativo do indivíduo na estrutura social é manipulado, assim sobra uma liberdade que é ilusória.
A fim de uma liberdade mínima é preciso agir contra essas forças que visam controlar
os sujeitos. Mas sobretudo, faz-se necessário uma luta além, que considere também o fim da
ideia de superioridade por alguns, é indispensável enfrentar os mecanismos de desigualdade e
preconceito que impõe obstáculos na liberdade e possibilidade de escolha. Sabe-se que a
liberdade é, além de tudo, social e política, ou seja, ao pensar em sociedade, dever-se-ia pensar
em compromisso, responsabilidade e atravessamentos. Se há injustiça logo não há liberdade, a
autonomia não existe distante do outro, pois o ser humano não é independente da sociedade,
como vimos pelos fundamentos dos sociólogos tratados.
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Nina Simone, cantora ativista pelos direitos civis do povo preto norte-americano cita:
“liberdade pra mim é não ter medo”, demonstrando que o discurso de emancipação se torna
vazio de sentido quando há opressão. Sendo assim, questiona-se, para que serve uma liberdade
vazia de justiça social? A liberdade que só abrange a branquitude, a cisgeneridade, o homem e
a heteronormatividade, de fato é emancipatória? Quanto vale sua autonomia? Edgar, artista
brasileiro, responde com seu trecho de “Sem preguiça pra fazer revolução”: “é preciso se
movimentar e encontrar frequências parecidas, e equalizar todas as estratégias possíveis para
que as nuvens não parem de chover, chover o suficiente para lavar o sangue do asfalto, e as
crianças soterradas na lama”.
À vista de tudo isso, conclui-se que as teorias de Durkheim, Weber e Simmel
contribuem para um desmanche nas ideias de um livre-arbítrio absoluto e uma liberdade
incondicional. O conceito de fato social (Durkheim) apoia a ideia de que a sociedade
influencia na determinação dos sujeito, a definição de ação social (Weber) implica que mesmo
definido pelo meio o indivíduo possui papel ativo na dinâmica coletiva e tem poder de
escolha, e a proposta da sociologia das formas (Simmel) coopera para noção de que as
alternativas de conduta são limitadas aos objetos culturais que foram experimentados. Assim,
também é estabelecido um tipo de liberdade onde, mesmo que formado pelo contexto que nos
cerca, devido a heterogeneidade de elementos que cada um vivencia, temos singularidade, e
logo, capacidade de tomar decisões próprias mesmo que num número finito de opções. Este
fato nos permite constatar uma crise da liberdade na atualidade por conta dos mecanismos
neoliberais e da internet que impõe uma coerção intensa, manipulativa e oculta. Também
levanta a questão de como não é possível uma liberdade mínima enquanto existirem injustiças
sociais.
9
REFERÊNCIAS
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. A questão da liberdade.
In: ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Introdução à
Filosofia. São Paulo: Moderna Ltda., 1992. Cap. 29. p. 315-322.
CANCIAN, Renato. Georg Simmel - microssociologia - Cientista criou a sociologia das
formas. Georg Simmel - conceito de sociação. Disponível em:
https://educacao.uol.com.br/disciplinas/sociologia/georg-simmel---microssociologia-cientista
criou-a-sociologia-das-formas.htm. Acesso em: 19 nov. 2020.
DURKHEIM, Émile. As Regras do Método Sociológico. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes,
2007. 153 p. (Coleção Tópicos).
HAN, Byung-Chul. Psicopolítica: O neoliberalismo e as novas técnicas de poder. 7. ed. Belo
Horizonte: ÂYINÉ, 2020.
LUMIER, Jacob (J.). A Microssociologia na Formação dos Grupos Sociais e seus efeitos
sobre as Estruturas Sociais. Disponível em: https://leiturasociologica.wordpress.com/a
microssociologia-na-formacao-dos-grupos-sociais-e-seus-efeitos-sobre-as-estruturas-sociais/.
Acesso em: 19 nov. 2020.
MORAES, Lúcio Flávio Renault de; MAESTRO FILHO, Antonio Del; DIAS, Devanir Vieira.
O paradigma weberiano da ação social: um ensaio sobre a compreensão do sentido, a criação
de tipos ideais e suas aplicações na teoria organizacional. Rev. adm. contemp., Curitiba, v.7,
n.2, p.57-71, jun. 2003. Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-
65552003000200004&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 23 nov. 2020.
https://doi.org/10.1590/S1415-65552003000200004.
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Acesso em 24 de novembro de 2020
Sem Preguiça Pra Fazer Revolução (ACORDA AMOR). Direção de Roberta Martinelli.
Produção de Décio 7 (Bixiga 70). São Paulo: Selo Sesc, 2020. Son., color. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=0H1E3g73rj0&t=31s. Acesso em: 20 nov. 2020.
WEBER, Max. Max Weber Conceitos Sociológicos Fundamentais. 3. ed. Lisboa: Edições
70, 2012.

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