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Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR PROBLEMA 1 – ABERTURA: ASPECTOS BIOPSICOSSOCIAIS DA VIDA SEXUAL NA ADOLESCÊNCIA: ADOLESCÊNCIA E SEXUALIDADE: A adolescência, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é descrita como o período que se estende dos 12 aos 18 anos de idade, ao passo que para a Organização Mundial da saúde, esta fase contempla toda a segunda década de vida (dos 10 aos 19 anos), sendo sucedida pela juventude, que se inicia ainda aos 15 anos, perdurando até os 24. Esse é um momento de crescimento em várias esferas, física, psicológica, social e espiritual que está intimamente relacionado à puberdade, etapa de alterações biológicas que refletem a maturação reprodutiva humana. Se a mudança do corpo é o principal eixo da puberdade, a adolescência apresenta como seu ponto-chave as crises de identidade, nas quais o indivíduo começa a distanciar-se da família em prol de relacionamentos significativos com seus pares, tendo suas perspectivas de mundo ampliadas. Existem cinco dimensões de relacionamentos que evoluem ao longo da adolescência: o envolvimento romântico (engajamento em relações sociais como o namoro), a identidade com o parceiro (estabelecimento das características de seus interesses amorosos), a relação de conteúdo (atividades desempenhadas pelos parceiros), a qualidade (positiva, de apoio, ou experiências benéficas dos relacionamentos) e os processos cognitivos e emocionais envolvidos no relacionamento. As interações entre adolescentes evoluem de relacionamentos curtos, caracterizados por uma interação física limitada e pouco investimento emocional, para conexões mais íntimas e profundas, com elevado apego. Dessa forma, tais indivíduos passam a ser reconhecidos como seres sexuados e dotados de certa autonomia (aumentando sua vulnerabilidade), um importante passo para a transição rumo à vida adulta. Para compreender o comportamento sexual da adolescente é importante conhecer o processo de construção da sexualidade na infância, que fundamenta as bases para as vivências e expressões manifestadas durante essa fase. Ainda que os conceitos de sexualidade e função sexual sejam muitas vezes tratados como sinônimos, o último está diretamente associado às relações sexuais, ao passo que o primeiro se refere à energia motriz para a busca do amor, da intimidade e do contato. A construção da sexualidade se inicia logo com o nascimento, sendo influenciada por características biológicas e psíquicas da pessoa, favorecendo ou desfavorecendo suas interpretações em relação ao ambiente no qual vive. A relação da criança no ambiente familiar é fundamental nesse processo, e a sexualidade vai sendo consolidada na medida em que a criança amplia seu convívio social a partir de sua vivência nos diferentes contextos culturais e econômicos. A maneira de ser da pessoa está, portanto, ligada à sua sexualidade e influenciará sua relação com os outros nos planos profissional e afetivo. Dessa forma, a relação sexual saudável é associada à sexualidade saudável, que irá depender do valor dado pelo indivíduo a suas experiências positivas e negativas, na interação com os outros, desde a infância. O interesse de crianças por questões atreladas ao sexo é paralelo ao aumento dos androgênios a partir dos três anos de idade, produzidos por meio do sulfato de dehidroepiandrosterona (DHEA-S). Antes dessa idade, a criança não manifesta comportamento sexual compartilhado nem Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR preferências por brinquedos estáticos (associados ao feminino) ou móveis (tipificados como masculinos), sugerindo que essas características surgem com o início da adrenarca. Mesmo com essa influência hormonal, os fatores socioculturais, educacionais, econômicos e o ambiente escolar têm forte influência sobre o comportamento sexual da criança e do adolescente, sendo a participação dos pais fundamental para mediar os efeitos externos sobre o comportamento geral e sexual nessa fase. A existência de comportamentos sexuais ao longo da infância deve ser considerada como normal, desde que eles apresentem práticas e frequências diversificadas. Os eventos mais comuns são a masturbação, olhar a genitália do outro e o envolvimento oportuno em brincadeiras sexuais com outras crianças. Com o avançar da idade, determinadas manifestações da sexualidade tornam-se menos frequentes, sugerindo que a autocensura se torna evidente quando se inicia a fase da adolescência. A interpretação de tais atitudes por parte dos adultos é deturpada pelo tabu que permeia suas próprias experiências em relação ao sexo, podendo afetar de forma negativa as crianças tuteladas por ele. Nesse sentido, a atitude correta a ser tomada frente à experimentação sexual deve ser a manutenção da tranquilidade, evitando comentários que possam envergonhar a criança, tolhendo sua curiosidade. No entanto, caso essas práticas se tornem constantes e levem ao isolamento do indivíduo, faz-se necessário uma investigação para afastar quadros de depressão, hipersexualidade, negligência ou exposição a qualquer tipo de violência. Uma boa assistência à saúde sexual e reprodutiva da adolescente envolve o conhecimento das vivências sexuais nessa fase, que ocorrem nos mais diversos formatos, relações homoafetivas, heteroafetivas, ambas, ou interações diferentes, que podem ser transitórias ou permanentes, de acordo com o estado de tolerância da sociedade em que a adolescente vive. A heteronormatividade e a inadequação a essa conduta podem afetar negativamente a saúde mental das jovens elevando o risco para o desenvolvimento de ansiedade, depressão, distorção da autoimagem e baixa autoestima. Todos esses fatores, quando presentes, podem predispor o indivíduo a comportamentos de risco, como o consumo de álcool e substâncias ilícitas, e a iniciação sexual precoce e desprotegida. Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR As alterações biológicas no sistema reprodutor e nas estruturas encefálicas (áreas pré-óptica e amígdala) envolvidas no comportamento sexual, juntamente com os hormônios ovarianos, promovem o aparecimento do impulso sexual, que impele a adolescente para interações íntimas. Entretanto, a decisão de iniciar a vida sexual é determinada por fatores ambientais relacionados com a cultura, os costumes, a educação e a religião, bem como pelo comportamento do círculo de convivência da adolescente (iniciação sexual de suas amigas e pressão do parceiro). Algumas condições patológicas também podem adiantar a sexarca, como a violência física e sexual na infância, o uso de álcool e de substâncias ilícitas e o convívio em lares conflituosos e com pais negligentes ou separados. As meninas afetadas por essas situações têm maior risco de tentativa de suicídio, autoagressão e de sofrerem violência pelo companheiro. A resposta sexual da menina nos primeiros anos da adolescência pode ser descrita como análoga ao modelo linear e fisiológico proposto por Masters e Johnson e expandido por Kaplan, que introduziu nesse modelo a fase do desejo sexual, primeira fase dessa resposta. Rosemary Basson redimensionou a resposta sexual feminina (RSF), que passou a ser representada como um modelo circular que move o foco do desejo sexual espontâneo, acreditando que a maioria das mulheres perde tal desejo após algum tempo de relacionamento. A RSF se inicia por um estado de neutralidade sexual e se alterará dependendo de motivação da mulher, baseada na intimidade. A neutralidade aconteceria em relacionamentos de longo tempo de duração, em que a mulher perde o desejo sexual espontâneo,mas, quando estimulada sexualmente, ela fica excitada e passa a sentir desejo de se engajar na relação sexual. Assim, retira-se o foco da genitalidade e valoriza-se a satisfação sexual e a intimidade emocional. PROTEÇÃO CONTRA A SEXARCA PRECOCE E O DESENVOLVIMENTO DE COMPORTAMENTOS SEXUAIS SAUDÁVEIS: A OMS considera como sexarca precoce a ocorrência de relações sexuais pênis-vagina com idade ≤ 15 anos, porém atualmente já se é indicado postergar essa iniciação até ao menos os 16 anos de idade. As adolescentes que começam cedo sua vida sexual não utilizam métodos contraceptivos eficazes e Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR tendem a empregar menos o preservativo em relações posteriores. Fatores protetivos para o início precoce da vida sexual e para comportamentos de risco na adolescência englobam a religiosidade da jovem, a educação sexual na escola e o monitoramento dos pais. A atitude restritiva ou permissiva familiar em forma de conselhos ou conversas abertas sobre sexo não influenciam as vivências dos adolescentes, independentemente da cultura e de sua condição socioeconômica. As medidas educativas instituídas em escolas, assim como as políticas públicas, visando à promoção da saúde sexual e reprodutiva de adolescentes, são eficazes para prevenir ambos os comportamentos supracitados, bem como para evitar os agravos relacionados com as práticas sexuais na adolescência. O médico apresenta papel importante ao fornecer informações sobre a função sexual para adolescentes que buscam os serviços de atendimento à saúde. Graças a essa participação relevante, é imprescindível que o olhar do profissional sobre a sexualidade seja direcionado para a expressão natural da feminilidade, que motiva a paciente a buscar o sexo como uma forma de obter prazer físico e emocional, representando uma ponte em direção às intimidades do parceiro. Tais “impulsos” não podem ser impedidos por restrições ou conselhos que sugiram o adiamento da iniciação sexual, fazendo com que as orientações sejam direcionadas para as implicações da sexarca precoce e das práticas sexuais desprotegidas, buscando informar a adolescente para que ela realize suas escolhas de forma consciente. O conhecimento do risco real de contrair HIV, o maior comprometimento na escola, o monitoramento dos pais e a oferta de orientações sobre saúde sexual e reprodutiva pelos educadores e por profissionais de saúde são medidas que auxiliam a reduzir tais comportamentos de risco, sendo que a participação familiar na educação sexual pode também postergar a primeira relação, mesmo que um grande número de jovens ainda se engaje em tais atividades sem discussões prévias com os pais sobre controle de natalidade, ISTs e preservativos. A escola representa um local no qual adolescentes se reúnem para trocar relatos sobre suas experiências sexuais, por vezes incentivando as práticas precoces. Caso a educação sexual nessas instituições seja executada mais cedo, para alunos do 5º e 6º ano, sua eficácia para reduzir o comportamento sexual de risco seria mais elevada, definido conceitos como iniciação sexual precoce, múltiplos parceiros, sexo casual, e relações sexuais desprotegidas. Os programas de políticas públicas mais efetivos para retardar a iniciação sexual são aqueles que oferecem informações práticas acerca do autocontrole e da negociação diante de situações de risco, aumentando a capacidade de comunicação dos adolescentes por meio de grupos que atuam por meio de discussões e debates, além de encenações de situações associadas ao cotidiano da faixa etária. Os programas que vinculam as ações nas escolas juntamente com serviços de saúde reprodutiva e ações comunitárias são os que mais contribuem para a redução das taxas de gravidez na adolescência. É nesse contexto que se insere o projeto Saúde e Prevenção nas Escolas (SPE), que dentre outras funções, é responsável por oferecer estímulos para o debate e a apropriação de saberes sobre a sexualidade, favorecendo a identificação das diversas dimensões (biológicas, afetivas e socioculturais) da expressão da sexualidade, e fomentando o respeito à diversidade Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR humana em suas interações pessoais e sociais. Outros pontos de fundamental importância enfocados pelo SPE são os Direitos sexuais e reprodutivos, que se referem ao poder sobre o próprio corpo, à liberdade para vivenciar a sexualidade e à maternidade, porém, correlacionam-se principalmente aos acordos para a vida em sociedade. O objetivo da afirmação desses direitos é a redução das violações à autonomia pessoal e à integridade física e psicológica, e a garantia dos meios necessários para o ser humano alcançar seu bem-estar sexual e reprodutivo. Alguns desses direitos são a possibilidade de decidir sobre reprodução sem sofrer discriminação, coerção, violência ou restrição ao número de filhos e intervalo entre seus nascimentos, o direito de ter acesso à informação e aos meios para o exercício saudável e seguro da sexualidade, o direito a ter controle sobre o próprio corpo, e o direito de exercer a orientação sexual sem sofrer discriminações ou violência. INFECÇÕES SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS NA ADOLESCÊNCIA: A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PenNSE), que foi realizada pela última vez em 2015, apontou que 27,5% dos escolares brasileiros cursando o 9º ano do Ensino Fundamental já tiveram sua primeira relação sexual. Dentre os alunos entrevistados, 36% daqueles com vida sexual ativa eram do sexo masculino, ao passo que esse grupo representa 19,5% das meninas. Nota-se que nesse grupo, o percentual de indivíduos que utilizaram preservativos no primeiro intercurso chega a 61,2%, com prevalência maior entre mulheres. A adesão a esse método parece continuar, com 66,2% dos entrevistados apontando o uso do condom na última relação sexual. Nessa pesquisa, o acesso a informações sobre sexualidade, ISTs e AIDS alcançou 87,3% dos estudantes, sendo pouco mais frequente entre as alunas. As ISTs são causadas por vírus, bactérias ou outros microrganismos, transmitidos principalmente por contato sexual desprotegido com uma pessoa que esteja infectada. A transmissão pode ainda acontecer de forma transplacentária, durante o parto ou a amamentação, e pela utilização de seringas, agulhas ou outro material perfurocortante compartilhado. No Brasil, as informações sobre a prevalência de ISTs entre adolescentes são escassas e pontuais. Apenas a AIDS, a sífilis e as hepatites virais estão presentes na lista nacional de doenças e agravos de notificação compulsória, não havendo obrigatoriedade do relato de todas as infecções sexualmente transmissíveis. Há um aumento na ocorrência de ISTs em pacientes assintomáticos, que não recebem orientações ou tratamento adequados, carreando infecção subclínica e representando elos fundamentais na cadeia da transmissão dessas condições. As ISTS podem ser classificadas em bacterianas (gonorreia, clamídia, vaginose bacteriana, sífilis, cancroide, linfogranuloma venéreo e donovanose), virais (herpes, HIV, HPV, hepatites B e C), fúngicas (candidíase) e outras (molusco contagioso, escabiose e amebíase genital). Alguns outros patógenos não tão usuais podem ser transmitidos por via sexual, causando quadros como pediculose, oxíuriase, hepatite A, shigelose, dermatofitose, entre outros. Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR Por diversas vezes é possível observar lesões genitais em pacientes com algum desses quadros, porém diversas outras doenças podem acometer essa região, sendo necessária atenção para o diagnósticodiferencial. EPIDEMIOLOGIA DAS ISTS EM ADOLESCENTES: A coinfecção por outras infecções sexualmente transmissíveis representa um dos principais facilitadores para a transmissão do HIV, cuja via de contágio é predominantemente sexual, e atualmente a faixa etária dos portadores desse vírus tem se expandido para limites cada vez mais baixos. O Ministério da Saúde aponta que em indivíduos maiores de 13 anos, a transmissão do HIV pelo intercurso correspondeu a 94,9% dos casos notificados em homens e 97,4% em mulheres. Dentre as hepatites virais, monitoradas no Brasil por meio do registro de casos no SINAN, destaca-se a o HBV, que tem como principal forma de transmissão o contato sexual. Desde 1999, a taxa de incidência desse vírus enfrenta grande crescimento, partindo de 0,3% para 6,9% em 2010. No ano seguinte, registrou-se que o percentual de infectados na faixa etária de 10 a 19 anos corresponde a 1,1% do número total de ocorrências. A transmissão da hepatite C (HVC) por relações sexuais, por sua vez, é menos frequente, ocorrendo principalmente em indivíduos com comportamentos de risco, como prática sexual desprotegida e múltiplos parceiros. Segundo o Ministério da Saúde, em 2011, a soroprevalência do HCV na população geral foi de 1,38%, sendo 0,75%, na faixa etária entre 10 e 19 anos. Dessa forma, nota-se que os adolescentes apresentam risco elevado para a infecção por ambas as formas dessa doença, o que aponta a necessidade de instituir programas preventivos que busquem interferir na cadeia de transmissão da hepatite viral. O HPV enquadra-se como uma IST de destaque graças a sua prevalência e repercussão a nível mundial. As adolescentes sexualmente ativas apresentam as taxas mais altas de infecções por esse vírus, variando entre 50 e 80%, a partir de dois a três anos do início da atividade sexual. Atualmente, na tentativa de impedir a transmissão desse patógeno e refrear os impactos nocivos deste à saúde (principalmente feminina) à longo prazo, é realizada a vacinação de meninas de 9 a 13 anos e de meninos, estes com idade de 10 a 14 anos. Os rapazes enquadram-se como os principais veículos carreadores do vírus, que raramente causa agravos em homens, podendo, no entanto, gerar verrugas genitais e aumentar o risco de desenvolvimento de câncer de colo uterino em mulheres. Nos trópicos, a sífilis representa a segunda ou terceira causa de úlcera genital, sendo as outras principais o cancroide e a herpes genital). Em 1999, foi realizado um estudo com adolescentes do sistema correcional de Vitória, no qual foram incluídos 103 Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR adolescentes, predominantemente do sexo masculino, apresentando prevalência da infecção pelo Treponema de 7,8%. A infecção pelo vírus herpes simples HSV-1 (principal agente do herpes extragenital) tem-se tornado cada vez mais precoce na população, estando presente na forma latente em indivíduos cada vez mais jovens. O aumento na incidência de contágio pelo vírus é uma tendência mundial, tendo ele sido demonstrado como agente causal de 28,5% das ulcerações genitais de certas populações amazônicas. O HSV-2 é o agente principal nas formas perigenitais, com prevalência que aumenta de forma cumulativa após a adolescência. O herpes simples genital, como esperado para uma IST, tem alta prevalência em pacientes com vida sexual de risco. O contato com lesões clinicas do herpes é a forma usual de contágio. Esta moléstia tem ganhado destaque com o aumento do número de indivíduos infectados pelo HIV em faixas etárias menores, com manifestações clínicas atípicas. As vulvovaginites mais comuns na adolescência são a vaginose bacteriana, a infecção por clamídia, gonorreia e candidíase. A vaginose bacteriana é a mais frequente causa de corrimento genital, responsável por 40 a 50% dos casos, com metade das portadoras sendo assintomáticas. Trabalhos demonstram predomínio dessa afecção entre os 15 a 19 anos (41,1%), seguido da faixa dos 10 aos 14 anos (33,3%). Infecções por Chlamydia trachomatis podem desencadear diversas síndromes, compondo uma das principais ISTs de origem bacteriana. As estimativas para a prevalência desse quadro nas adolescentes oscilam entre 8 e 35% naquelas sintomáticas e 8 a 20% nas assintomáticas. Esse crescimento no número de casos pressiona os profissionais para manterem a infecção por essa bactéria como um critério para diagnósticos diferenciais e investigação clínica. Os dados referentes ao contágio da gonorreia são difusos não só no Brasil como também em diversos outros países, dificultando a coleta de dados atualizados. Em 2003, registraram-se 1,54 milhões de casos da doença em território nacional, com maior prevalência em indivíduos dos 15 aos 30 anos (mesmo que ultrapasse a adolescência, indica que indivíduos jovens eram frequentemente acometidos pelo quadro). As ISTs que apresentam quadros clínicos menos expressivos, como a tricomoníase, não devem ser menosprezadas, uma vez que ainda apresentam elevada prevalência dentre jovens. Mesmo que essa seja uma doença clássica e curável, estima-se que ocorrem 170 milhões de casos a cada ano no mundo em pessoas entre 15 e 49 anos, sendo as mulheres as mais afetadas. MANEJO INICIAL DE INFECÇÕES SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS NA ADOLESCÊNCIA: A abordagem sobre sexualidade deve ser abordada em qualquer consulta realizada com um adolescente, seja qual for a queixa principal, uma vez que é nesse período que geralmente se inicia a vida sexual. Nas situações nas quais o indivíduo já teve sua sexarca, é necessário que se investigue e que se esclareça todas as dúvidas apresentadas pelo paciente, oferecendo orientações sobre ISTs, gravidez e sexo seguro. Na coleta de informações para a construção da história clínica, alguns dados podem direcionar a uma suspeita diagnóstica de ISTs, como comportamento sexual de risco, múltiplos parceiros, ausência do uso de preservativo, parceiros sexuais com comportamento sexual de risco e/ou Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR usuários de drogas, lesões perianais e genitais como queixa, ocorrência de secreção uretral ou vaginal, dor pélvica, dispareunia, prurido genital, disúria, polaciúria, urgência miccional, lesões de pele e mucosas, adenite inguinal, artrite e hepatite. Alguns jovens comparecem aos centros de atendimento em saúde com sintomatologia fortemente associada a tais infecções, porém negam o início da vida sexual, o que torna imprescindível a investigação sobre a possibilidade de abuso sexual. A abordagem das ISTs nos adolescentes não está restrita ao trato genital. Isso implica em sempre incluir na anamnese questionamentos sobre sinais e sintomas extragenitais. Além disso, o exame físico deverá ser completo, incluindo a avaliação de todo tegumento e mucosas, além da palpação de linfonodos de todos os segmentos corporais. As seguintes lesões elementares devem ser consideradas suspeitas para as ISTs no exame dermatológico, principalmente se localizadas na região genital: eritema, pápulas, vesículas, úlceras, nódulos, cicatrizes e verrugas. GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: A gestação é o sonho de diversas mulheres, inclusive na adolescência. No entanto, a gravidez precoce pode acarretar vários riscos e crises não só para a jovem mãe como também para o recém-nascido (RN) e sua família, podendo inclusive impactar sobre a manutenção da pobreza e nos índices de mortalidade infantil. Salienta-se, no entanto, que o prognóstico desse quadro depende da comunicação entre fatores biológicos, sociais, culturais, econômicos e psicológicos. A gravidez precoce no Brasil é alta para aAmérica Latina, com 400 mil casos por ano. Quanto à faixa etária, dados do Ministério da Saúde indicam que em 2014 nasceram 28.244 filhos de meninas entre 10 e 14 anos e 534.364 crianças de mães com idades entre 15 e 19 anos, sendo necessárias medidas urgentes em planejamento e ações preventivas. Em 2015, 18% dos brasileiros nascidos vivos eram filhos de mães adolescentes. Quanto à distribuição demográfica, a região com maior número de mães adolescentes é a região Nordeste, concentrando 180 mil nascidos ou 32% do total. Em seguida encontram-se a região Sudeste, com 32%, a região Norte (14%), a região Sul (11%) e a Centro Oeste (8%). Vários são os fatores que contribuem para a ocorrência da gravidez precoce, no entanto a desinformação acerca da sexualidade e dos direitos sexuais/reprodutivos representa o principal fator. Questões emocionais, psicossociais e contextuais também influenciam nesse processo, inclusive para a falta de acesso à proteção social e ao sistema de saúde, incluindo o uso inadequado de contraceptivos, como métodos de barreira e preservativos. A falta de um projeto de vida e expectativas de futuro, o acesso precário à educação, a pobreza, inserção em famílias disfuncionais e vulneráveis, o abuso de álcool e outras drogas, além de situações de abandono, Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR abuso, violência e a falta de proteção efetiva às crianças e aos adolescentes, também fazem parte desse quadro de etiologias da gravidez na adolescência. Como a gestação é um fenômeno que requer muita responsabilidade dos indivíduos envolvidos, é recorrente a entrega do recém- nascido a um abrigo ou a adoção do bebê pelos avós ou familiares, atuando como substitutos da maternagem do RN e retirando esse direito dessas adolescentes. Muitas vezes, a gravidez é desejada pela jovem, inclusive em resposta ao meio que a circunda ou como forma de exercer a sexualidade, de ser incluída e aceita socialmente. Ou até por gerar benefícios futuros para a família em programas de transferência de renda, fatores estes que colaboram para a reincidência do ocorrido antes dos 19 anos de idade. Além dos possíveis riscos à saúde maternofetal, a gestação na adolescência apresenta diversas implicações de cunho social, destacando-se principalmente a interrupção da vida escolar, que ocorre em 68,3% dos casos, aumentando para 85,7% no terceiro trimestre. Essa evasão não afeta somente a continuidade da educação, mas também resulta em menor qualificação profissional e maior dificuldade em conquistar independência financeira. No entanto, a gravidez na adolescência não é um fenômeno homogêneo e depende do contexto social no qual a garota está inserida. Nas camadas sociais média e alta, a ocorrência de gestação na jovem tende a não prejudicar tanto o percurso de escolarização e profissionalização. Por outro lado, em classe social baixa, a adolescente tem maior dificuldade em continuar e finalizar os estudos, encontrando mais obstáculos na sua profissionalização, até porque, na maioria das vezes, não pode contar com o apoio familiar e social. O suporte do parceiro e da família também é um aspecto importante no contexto da gravidez precoce, sendo dependente do cenário cultural, econômico e financeiro da jovem. A consolidação da paternidade nesses casos pode ser dificultada por meio do acúmulo de responsabilidades pelos pais dos jovens, porém os companheiros apresentam boa aceitação após um período inicial de dificuldade. Quando às relações intrafamiliares, por vezes a adolescente não consegue criar canais de diálogo viáveis, tendo que enfrentar a rejeição familiar, porém esse desfecho não é universal, havendo diversos casos de cooperação entre diversas gerações nesse momento de transição. Os desafios múltiplos enfrentados pelas mães adolescentes, suas famílias e companheiros justificam maior compreensão do acolhimento, de acompanhamento do pré-natal e das medidas de promoção e prevenção de saúde destas mães. Mudanças nas políticas de atenção à saúde, favorecendo o apoio a esse grupo e a abordagem das causas da gravidez na adolescência, das desvantagens sociais, risco à saúde das adolescentes e aos bebês podem ajudar a melhorar a vidas dessas meninas e dos indivíduos em seu convívio familiar. FATORES DE PROTEÇÃO CONTRA A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR A educação representa um dos mais importantes fatores de prevenção contra a gravidez precoce, sendo imprescindível não só para a saúde individual como para a coletividade. Nesse contexto, as medidas devem incorporar tanto a sexualidade quanto a saúde reprodutiva, no âmbito doméstico e escolar, estendendo-se para além das Unidades de Saúde. A educação sexual integrada e compreensiva faz parte da promoção do bem-estar dos adolescentes e jovens, realçando o comportamento sexual responsável, o respeito pelo outro, a igualdade e equidade de gênero, assim como a proteção da gravidez inoportuna, prevenção de infecções sexualmente transmissíveis/HIV, e a defesa contra violência sexual e outros abusos. Ao se comunicar com adolescentes, não se deve utilizar somente a perspectiva negativa da sexualidade, no sentido de doenças, infecções ou gravidez inesperada, muitas vezes envolvendo estereótipos das mídias, inclusive das redes sociais e digitais. É necessário empregar exemplos que facilitem a compreensão da função sexual individual e de suas formas de expressão, de modo a proporcionar a tomada consciente de decisões. CONTUTA MÉDICA EM CONSULTAS GINECOLÓGICAS COM ADOLESCENTES: A presença cada vez mais frequente de adolescentes nos consultórios ginecológicos traz consigo o desafio do estabelecimento e manutenção da relação médico-paciente, uma vez que esse último se encontra num grande momento de transição no seu desenvolvimento biopsicossocial. Diferente da paciente adulta, a adolescente apresenta diferenças no seu modo de agir e pensar, de acordo com a fase da adolescência que ela está vivendo. O estabelecimento de uma boa relação entre profissional e paciente, garantindo a privacidade e respeitando a confidencialidade, é um aspecto fundamental para que a consulta transcorra de forma bem-sucedida e para que a adolescente estabeleça um vínculo com o ginecologista, cujo objetivo é promover a saúde sexual e reprodutiva desse indivíduo. Entre os motivos de consulta mais frequentes observam-se a avaliação de rotina do desenvolvimento da puberdade, problemas relacionados aos ciclos menstruais, cólicas, corrimento e desejo de iniciar o uso de métodos contraceptivos. A relação entre confidencialidade e adolescentes ainda não apresenta uma conduta estabelecida, dada a escassez de pesquisas que abordam esse tema e a ambiguidade nos resultados, pois certos trabalhos apontam que os pais associam a confidencialidade a comportamentos de risco e queda na qualidade dos relacionamentos, enquanto outros consideram-na favorável, desejando ser informados apenas sobre tópicos específicos como saúde mental, atividade sexual e gravidez, mesmo que os filhos requisitassem sigilo. Independentemente da situação, o ginecologista deve ter empatia para perceber como a adolescente está se sentindo naquele momento e tentar vencer a resistência da paciente que insiste em ficar em silêncio apontando para a mãe sempre que fazemos alguma pergunta como sinal de protesto. O maior medo das adolescentes é com relação ao exame ginecológico, assim, é muito importante assegurar que nada será feito sem a sua permissão. Essas atitudes tranquilizam a paciente no primeiro contato. A anamnese ginecológica da adolescente nãodifere da de uma adulta, entretanto alguns aspectos não podem ser esquecidos, como a situação vacinal da paciente (resgate de vacinas desatualizadas), alergias medicamentosas (anti-inflamatórios como Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR primeira opção no tratamento de dismenorreias), uso de anticonvulsivantes (interferências com contraceptivos orais), tabaco, drogas e álcool (presença de comportamentos de risco), porém esses últimos tópicos podem ser deixados para quando a paciente estiver sozinha. A história menstrual deve ser detalhada, e para tal as adolescentes devem ser orientadas a marcarem seus períodos menstruais, podendo ser oferecido um calendário menstrual ou podem ser sugeridos aplicativos de controle do ciclo, disponíveis para smartphones. Muitas dúvidas surgem com relação aos ciclos irregulares no período da pós-menarca, e a orientação sobre imaturidade do eixo, comum nesta fase, tranquiliza a paciente e a sua mãe, muitas vezes preocupadas com o futuro reprodutivo. Uma das maiores dificuldades na anamnese é abordar assuntos ligados à sexualidade, uma vez que estamos frente a pacientes menores de idade, o que gera preocupação aos profissionais sobre aspectos ligados ao sigilo e privacidade. Perguntas sobre vida sexual na presença da mãe são consideradas não apropriadas, mesmo que seu relacionamento seja aparentemente positivo. Essa abordagem só é recomendada se a adolescente diga espontaneamente que deseja falar sobre contracepção pois possui ou quer iniciar sua vida sexual, evitando assim promover situações de conflito entre mãe e filha. Pedir à adolescente acompanhada para que ela fique sozinha pode ser um momento de tensão, porém indaga-la com “Você faz questão da presença de sua mãe no momento do exame?” pode dar a chance à jovem para que ela se sinta segura em continuar o atendimento por conta própria, dispensando o apoio de forma harmoniosa. Uma vez a sós com a adolescente, os aspectos de sigilo devem ser abordados, garantindo a confidencialidade. Essa informação é muito importante, já que as adolescentes se sentem inseguras, principalmente quando o ginecologista foi escolhido pela sua mãe. Ao ser tranquilizada que o sigilo será preservado, será possível orientar a respeito de contracepção e cuidados para se prevenir de infecções sexualmente transmitidas, além de evitar o uso indiscriminado da contracepção de emergência. A confidencialidade, a privacidade e a autonomia são direitos da adolescente que recebe atendimento médico. Em relação ao sigilo em consultas com pacientes menores de 18 anos, o Código de Ética Médica, em seu artigo 74º, determina que é proibida a revelação de segredos profissionais de pacientes menores de idade, mesmo a seus pais ou guardiões, desde que esse indivíduo tenha capacidade de avaliar seus problemas e conduzir-se por conta própria para resolvê-los. Colegas de trabalho e auxiliares do profissional responsável pelo atendimento também são vetados a compartilhar essas informações, penalizando o médico por meio do art. 78º. Essa limitação só deve ser ignorada em situações nas quais a guarda do sigilo possa vir a causar danos ao paciente. Nas situações em que a quebra do sigilo é justificada e não havendo anuência da adolescente, mesmo após a equipe profissional encorajá-la a envolver a família e oferecer apoio na comunicação, a jovem será esclarecida dos motivos para tal atitude, antes do repasse da informação aos seus responsáveis. É necessário reforçar, no entanto, que os códigos de conduta médica são subordinados ao Código Penal Brasileiro (CPB) e à Constituição Federal. O último documento não aborda de forma explícita os direitos reprodutivos dos jovens, porém o primeiro regimento postula como estupro de Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR vulnerável as práticas libidinosas ou de conjunção carnal com indivíduos de idade inferior a 14 anos, sendo o profissional obrigado a fazer a denúncia de violência sexual quando lhe for relatada situação que se configure nesses autos. O exame físico da adolescente deve contar com a anotação de todos os dados biométricos, dada a continuidade do desenvolvimento físico. O exame ginecológico na adolescente que já menstrua e não apresenta nenhuma queixa no dia da consulta pode ser adiado para uma segunda visita, caso ela se mostre relutante em ser examinada na primeira consulta, mostrando para a adolescente o respeito à sua autonomia. Nas pacientes sexualmente ativas, o exame ginecológico não difere do da paciente adulta, e a importância da sua realização deve ser enfatizada para a adolescente, para pesquisa de infecções de transmissão sexual. Naquela adolescente que mantém sua vida sexual em sigilo, poderá ocorrer dificuldade com relação aos exames complementares, seja por impossibilidade de arcar com o custo, seja por questões de convênios médicos, por ela ser dependente dos pais. É importante discutir previamente com a adolescente sobre quem vai levar o material ao laboratório, se a adolescente vai acompanhada ou não para a coleta de material ou mesmo para os exames de imagem, quem vai buscar os resultados previamente, evitando deste modo quebra inadvertida de sigilo. Todos os dados coletados na anamnese e exame físico devem ser cuidadosamente registrados, inclusive o dado se a vida sexual é mantida em segredo para evitar quebra inadvertida de sigilo numa conversa com a mãe. Nas consultas subsequentes, nas adolescentes que eram virgens na primeira consulta, é importante sempre perguntar se ela já iniciou atividade sexual, e, para aquelas que já eram sexualmente ativas, se ainda mantém sua vida sexual em segredo. O Conselho Federal de Medicina emitiu, em 1998, um parecer sobre o controle das ISTs na população adolescente e da realização de testes sorológicos. Esse registro determina que nenhum paciente, independentemente da idade, é obrigado a realizar o teste de HIV, exceto em situações de doação de sangue, órgãos ou esperma, assim como não existe a obrigatoriedade da revelação da sua soropositividade a ninguém. No entanto, é caracterizado como crime a omissão da condição ao parceiro caso esteja tendo relações sexuais sem preservativo. A adolescente tem direito à educação sexual, ao acesso à informação sobre contracepção, à confidencialidade e sigilo sobre sua atividade sexual e à prescrição de métodos contraceptivos, desde que respeitadas as restrições previstas pela Lei do Planejamento Familiar. Segundo a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, a prescrição de métodos anticoncepcionais para menores de 14 anos deverá levar em conta a solicitação delas, respeitando-se os critérios médicos de elegibilidade, o que não constitui ato ilícito. Por fim, em relação ao abortamento, é necessária a autorização do responsável legal tão somente para a realização do Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR procedimento, caso um episódio de violência sexual resulte em gravidez. Nos casos que apresentarem divergências entre a opinião da jovem e de sua família, inicialmente deve ser preservada a vontade da primeira, não sendo realizado nenhum encaminhamento que vá de encontro a suas escolhas. Se o desacordo permanecer, os profissionais de saúde devem garantir o acionamento do Conselho Tutelar para que a questão seja resolvida pelo Poder Judiciário, que buscará a garantia da autonomia da adolescente. Também é de responsabilidade dos serviços de atendimento o acompanhamento psicossocial para ambas as partes envolvidas. CONTRACEPÇÃO NA ADOLESCÊNCIA: Adolescentes entre 15 e 19 anos apresentamtaxas menores de conhecimento e utilização de métodos contraceptivos, configurando índices elevados de necessidades não atendidas no atendimento médico. O aconselhamento contraceptivo nessa faixa etária deve ser holístico, levando em consideração aspectos da saúde reprodutiva e sexual, possibilitando a oferta de todos os métodos disponíveis. Nenhuma estratégia anticoncepcional (exceto as definitivas) deve ser contraindicado baseando-se unicamente na idade. Várias barreiras são interpostas em relação ao uso correto dos contraceptivos por adolescentes, motivadas pelo desconhecimento, aconselhamento ineficaz, atitudes moralistas e tabus quanto à sexualidade, afetando até mesmo as jovens que desejam ou escolhem fazer uso de tais métodos. Embora os LARCs (Long Acting Reversible Contraceptives) sejam priorizados por algumas entidades médicas, dificuldades no acesso e na aceitabilidade pela adolescente mostram que métodos tradicionais, como os contraceptivos orais combinados (COCs) e preservativos, devem ser o foco principal de orientação por profissionais de saúde, visando à melhora das taxas de continuidade e à redução da possibilidade de gestações não planejadas. Frente a esse cenário de desinformação, o aconselhamento contraceptivo na adolescência tem papel crucial, devendo ter como componentes: Acolhimento: deve reforçar a confidencialidade do atendimento, reconhecendo que a adolescente difere de uma mulher adulta. O médico deve criar um ambiente aberto, tratando a paciente com empatia. Além disso, é necessário reforçar que não há necessidade de exame ginecológico inicial. o Tópicos que devem ser questionados na entrevista: Histórico sexual e uso prévio de contraceptivos; Histórico médico; Expectativas da jovem sobre o método contraceptivo desejado; Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR Motivação e habilidades para o uso adequado da contracepção; Opinião sobre injetáveis e métodos reversíveis de longa duração; Apoio familiar e do companheiro; Necessidade de manter o método em segredo. Checagem: o profissional deve ajudar a escolher o método contraceptivo e avaliar o conhecimento (e a qualidade deste) e as preferências individuais da paciente (investigando medos e preocupações), a adequação das estratégias às expectativas da jovem, e as opções acessíveis a ela. Cabe ao médico também verificar se há a necessidade de realização de exames para rastreio de ISTs. o Nesse ponto, devem ser abordados o mecanismo de ação, eficácia, forma de iniciar o uso e dicas para a administração correta do medicamento, o impacto deste sobre o ciclo menstrual, os efeitos adversos que podem surgir, os benefícios não contraceptivos e a necessidade de consultas de seguimento. Reforço positivo (tranquilizar a paciente): o médico deve reafirmar que os benefícios da contracepção são maiores que os riscos, enfatizando a necessidade de uso constante, interrompendo-o somente com anuência profissional. Também deve ser pontuado que esse é o primeiro passo a ser tomado para uma vida sexual segura, sanando eventuais dúvidas e anseios não explorados. TIPOS DE CONTRACEPTIVOS: Os métodos contraceptivos podem ser divididos de forma ampla em hormonais e não hormonais. Nesse primeiro grupo encontram-se as estratégias comportamentais, as mecânicas e as de barreira, ao passo que no último são descritos os contraceptivos orais combinados, adesivos, anéis vaginais e medicações injetáveis. CONTRACEPTIVOS NÃO HORMONAIS: Métodos comportamentais: Essas estratégias incluem a amamentação (amenorreia lactacional), a curva de temperatura basal, avaliação do muco cervical, a tabela de Ogino-Knauss (“tabelinha”), o método sinto-térmico e o coito interrompido. Tais métodos requerem determinação do período fértil, situação complexa na adolescência, uma vez que exige disciplina e o conhecimento das mudanças físicas puberais, resultando em eficácia média-baixa. Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR Ressalta-se que nos três primeiros anos após a menarca, a ocorrência de ciclos anovulatórios é frequente, causando irregularidade menstrual, que pode interferir ainda mais no uso desses métodos. Porém, no início da vida sexual estes podem ser os únicos recursos disponíveis, apresentando consigo algumas vantagens, como educar a adolescente sobre seu ciclo reprodutor, respeitando preceitos religiosos ou filosóficos que impeçam o emprego de outras modalidades de contracepção, e a ausência de custo. Idealmente sempre deve ser alertada a necessidade sistemática e concomitante do preservativo para aquelas jovens que optarem por esses métodos. Métodos de barreira: Compõem essa categoria os preservativos masculino e feminino, o diafragma e o espermicida. O uso do preservativo é recomendado devido à sua ação preventiva contra ISTs e o HIV, independentemente de sua função contraceptiva. As versões masculinas (maioria feita de látex) e femininas (compostas por poliuretano) são os únicos métodos que oferecem comprovadamente essa dupla proteção. Sua eficácia depende da técnica de colocação e da constância de uso, com índices de falha do preservativo masculino em 15% na população adulta, com taxa dez vezes maior entre adolescentes. O preservativo feminino tem falha entre 5% e 21%, é mais caro e de distribuição limitada, mas protege a genitália externa, sendo necessária a orientação adequada da jovem quanto a seu uso. Métodos mecânicos: O DIU, o implante subdérmico e o SIU compõem o grupo dos LARC, métodos contraceptivos reversíveis de longa duração. Estas ferramentas apresentam eficácia elevada por não dependerem da adesão e monitorização por parte da usuária, minimizando falhas por esquecimento. Menos de uma mulher dentre 100 engravidam no primeiro ano de uso. Os LARC são apropriados para adolescentes obesas, nulíparas, primíparas, diabéticas, hipertensas, com mutações trombogênicas, portadoras de HIV, doenças hepáticas, doenças cardiovasculares ou imunossuprimidas. Não afetam o ganho de massa óssea, mas podem induzir o aumento da acne. O uso de dispositivos intrauterinos é contraindicado se existe doença inflamatória pélvica ou malformações uterinas. Em adolescentes com anemia falciforme é recomendado anticonceptivo oral somente com progestagênios ou DIU com levonorgestrel ou o implante subdérmico. A contracepção de longo prazo evoluiu a partir do conhecimento da fisiologia reprodutiva e seus efeitos colaterais são mínimos comparáveis com outros anticoncepcionais, sendo considerados métodos seguros e práticos, com excelente custo-benefício para grupos especiais, como as adolescentes. Os LARC podem ser inseridos a qualquer etapa do ciclo menstrual, desde que haja segurança de que a adolescente não esteja grávida e num período mínimo de 5 dias após o último coito desprotegido, mesmo que esta tenha sido a sexarca. O período pós- parto e pós aborto imediatos devem ser evitados, devido à fragilidade da parede uterina. Logo antes da inserção do DIU, a paciente deve fazer uso de algum método contraceptivo, para garantir que não há possibilidade de gestação. o Dispositivo Intrauterino (DIU): No Brasil, há dois tipos principais de DIU, um hormonal e outro não. O não hormonal, também conhecido como T de Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR cobre ou T380A, está disponível na rede pública e pode ser utilizado por adolescentes, independente de paridade. Dois grandes mitos circundam a ação do DIU, um sendo a sua suposta ação abortiva e outro, o aumento da incidência de doença inflamatória pélvica aguda (DIPA). O funcionamentodo DIU de cobre ocorre, no entanto, pela promoção da inflamação endometrial, gerando um ambiente hostil à função dos espermatozoides. Em relação à DIP, o risco é baixo, predominantemente após o período inicial de inserção. Mesmo nos casos de diagnóstico da doença após a colocação do dispositivo, inicialmente não se recomenda sua retirada, sendo o tratamento apenas medicamentoso. o Implante subdérmico de etonorgestrel (ISE): Esse método consiste numa haste flexível com cerca de 4 cm de comprimento, feitas de etileno vinil com acetato de etonorgestrel, um progestágeno, que deve ser implantado, sob anestesia local, na camada subdérmica da porção medial do braço com a companhia de um profissional capacitado. O aparelho não é biodegradável, portanto deve ser substituído a cada três anos ou quando a paciente solicitar a interrupção do método, o que é feito por meio de uma incisão pequena no local do implante. Sua ação contraceptiva se dá pela inibição da ovulação, espessamento do muco cervical e atrofia endometrial, dificultando a fixação da mórula. Aproximadamente 40% das pacientes com tal implante evoluem com amenorreia, porém sangramentos irregulares não são raros. Com alta eficácia, sua taxa de continuação entre adolescentes que já têm filhos é maior quando comparada à das pílulas. o Sistema intrauterino liberador de levonorgestrel (SIU): O SIU, conhecido como Mirena, é um dispositivo intrauterino com levonorgestrel, com formato similar ao do DIU de cobre. A contracepção ocorre por uma reação intrauterina ao corpo estranho, além do espessamento do muco cervical e atrofia endometrial. Graças a essa alteração na dinâmica das secreções uterinas, acredita-se que esse método possa reduzir a possibilidade de infecções ascendentes por Chlamydia e Neysseria. Sua duração é de cinco anos. Entre os efeitos colaterais estão o sangramento uterino irregular, alterações de humor e acne. MÉTODOS HORMONAIS: Anticonceptivos hormonais combinados: Essas medicações contêm estrogênio e progestagênio, abrangendo o anel vaginal, adesivo contraceptivo e anticonceptivo hormonal combinado oral. Cerca de 9 a cada 100 mulheres engravidam no primeiro ano de uso desses métodos. As adolescentes podem empregar esses métodos para o controle de natalidade desde a menarca, utilizando seus benefícios para além da anticoncepção, como o auxílio no tratamento da tensão pré-menstrual, na regularização de ciclos em casos de anovulação crônica e demais irregularidades menstruais, a redução da dismenorreia, controle da endometriose e dos sinais do hiperandrogenismo. Na avaliação que antecede a prescrição do contraceptivo, deve-se observar a data da última menstruação, o padrão menstrual da jovem, a presença ou não de tensão pré- menstrual e/ou a dismenorreia primária. É Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR fundamental investigar por contraindicações absolutas dos estrogênios como hepatopatias graves, tireoideopatias descompensadas, doenças tromboembólicas, gestação confirmada ou suspeita e avaliar o histórico de cefaleia com aura. Como rotina, deve-se realizar o exame físico geral com verificação de mucosas e escleróticas, pressão arterial, peso corporal, palpação da tireoide e do abdome (procurando por visceromegalias). o Anel vaginal: Esse equipamento consiste num anel flexível que libera dose diária de etinilestradiol e de etonorgestrel, suprimindo a ovulação. É inserido e retirado pela própria adolescente, devendo permanecer em contato com a mucosa vaginal por três semanas seguidas por uma de intervalo. Não interfere com a flora vaginal, tendo falha real de 8%. É discreto e com bom controle de ciclo. O manuseio da genitália para sua colocação pode dificultar o uso no início da vida sexual. o Adesivo transdérmico: Esse equipamento fixo à pele libera uma dose diária de etinilestradiol e de norelgestromina, suprimindo a ovulação. A troca é feita semanalmente por um período de duas a três semanas, após o qual há um intervalo de 7 dias. A presença do adesivo pode dificultar, ou não, sua aceitação entre adolescentes. Pode ocorrer desconforto mamário como nos demais métodos hormonais, além de reações dermatológicas locais. Sugere-se que a eficácia declina em pacientes com peso igual ou maior que 90 kg. o Contraceptivo oral combinado (COC): Para a OMS, o consenso quanto a prescrição desses medicamentos para adolescentes recomenda versões de baixa dosagem, considerando a adesão da paciente ao tratamento, falhas por esquecimento ou abandono e os benefícios para além do controle de natalidade. O índice de falha real gira em torno de 8%. Ao prescrever os COC, deve-se orientar às pacientes que sangramentos irregulares podem ocorrer, principalmente no curso da primeira cartela. Se a paciente apresentar cefaleia com aura é contraindicado o uso desses medicamentos. Na maioria dos anticonceptivos hormonais combinados de uso oral, o componente estrogênico é o etinilestradiol, em doses de 15μg a 30μg, associados a diferentes progestagênios, em regimes de 21/7, 24/4 ou 28 dias, com maior eficácia dos regimes sem intervalo. As apresentações podem ser uni ou multifásicas. As primeiras contam com comprimidos de mesma dosagem, ao passo que as últimas apresentam composição variada, sendo necessário atentar-se à ordem dos comprimidos. Fármacos e drogas podem interagir com os contraceptivos orais por meio de alteração na ligação a proteínas séricas e aumento do metabolismo hepático pela indução das enzimas do citocromo P-450, podendo diminuir a eficácia do outro e vice-versa. Anticonceptivos orais apenas com progestagênio: Esses medicamentos não estão associados ao estrogênio e são utilizados de maneira ininterrupta, com taxa de falha de 9%. Não interferem na densidade mineral óssea, apresentam poucos efeitos adversos e poucas contraindicações. Produtos com acetato de noretindrona ou levonorgestrel têm em comum a inibição inconstante da ovulação, efeitos androgênicos variáveis e sangramento uterino imprevisível. Os produtos com Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR desogestrel podem ser utilizados além do período de aleitamento, promovendo uma inibição da ovulação eficiente, baixa ação androgênica, com tendência a amenorreia ou sangramentos infrequentes e melhora da dismenorreia. o Anticonceptivos hormonais injetáveis (trimestrais ou mensais): A primeira injeção deve ser feita a qualquer momento, desde que a paciente não esteja grávida, nos sete primeiros dias de início do sangramento, ou após episódio de aborto, parto ou uso de outros contraceptivos, sendo necessário aguardar uma semana para a administração da medicação. As injeções trimestrais podem causar aumento de peso (varia de 2kg a 3 kg), mastalgia, depressão, alterações no fluxo menstrual, amenorreia e atraso no retorno da fertilidade em até um ano após a interrupção do uso. Há evidências de diminuição da densidade mineral óssea ao longo do tempo de uso em adolescentes, além de prejudicar o crescimento daquelas meninas que ainda não completaram seu pico de crescimento. Ainda não há conclusão definitiva sobre os efeitos crônicos, o que faz com que para pacientes maiores de 18 anos, não exista restrição para sua prescrição, ao passo que para pacientes entre a menarca e 18 anos, seu uso continuado depende de avaliação individual de riscos e benefícios. ANTICONCEPÇÃO DE EMERGÊNCIA: A “pílula do dia seguinte” é indicada como método emergencial após relação sexual sem proteção, falha potencial de método contraceptivo em uso ou em casos de violência sexual. O seu uso deve ser feito em até 5 dias após o coito, sendoque a eficácia aumenta para 75% em usos até 72 horas após o ato. Sugere-se que tanto o levonorgestrel como comprimidos associados com etinilestradiol (Método Yuzpe) sejam oferecidos tão logo ocorra a relação desprotegida. O uso isolado de levonorgestrel (em dose única de 1,5mg) é mais efetivo, sem os efeitos adversos do estrogênio. O mecanismo de ação varia de acordo com a fase do ciclo menstrual da mulher: se utilizada na primeira fase, impede a ovulação; se o uso é na segunda fase, atua principalmente pelo espessamento do muco cervical. Atualmente não há registros de que tenha efeitos teratogênicos, de que interfira na implantação ou de que altere o endométrio. PARTICULARIDADES E DÚVIDAS SOBRE A CONTRACEPÇÃO NA ADOLESCÊNCIA: A fisiologia reprodutiva da adolescente difere daquela de uma mulher adulta, o que faz com que indagações distintas surjam no processo de aconselhamento contraceptivo. Uma questão comum a mulheres de todos os grupos etários dentro do período fértil refere- se ao ganho de peso, porém não há evidências que comprovem relações causais entre métodos contraceptivos (sejam eles hormonais ou não) e o aumento da massa corporal. Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR USO DE CONTRACEPRIVOS ORAIS ANTES DA MENARCA: Adolescentes que iniciaram a vida sexual antes da primeira menstruação podem necessitar de algum tipo de método contraceptivo, uma vez que é a fecundação é possível nesse período. No entanto, mesmo com a menarca, é comum a presença de ciclos anovulatórios, com elevação da ovulação após 20 episódios menstruais regulares. Dessa forma, não existem evidências que respaldem o uso de contraceptivos hormonais orais precocemente à menarca, sendo avaliada a ocorrência de possíveis interferência desses esteroides sobre o eixo hipotálamo-hipófise-ovariano (HHO). Nessa situação, recomenda-se a orientação para o uso de preservativos, inócuos à saúde reprodutiva a longo prazo. IMPACTO DOS CONTRACEPTIVOS HORMONAIS SOBRE A DENSIDADE MINERAL ÓSSEA: A supressão gonadotrófica característica dos métodos hormonais determina a redução dos níveis de estrogênio produzidos pelo organismo, porém seu impacto sobre a Densidade Mineral Óssea é positivo, não havendo restrições ao seu uso. Essas estratégias podem até induzir o ganho de massa óssea, sendo possibilidades para uso na adolescência. ACNE: A acne é um quadro bastante comum entre adolescentes, que frequentemente procuram por contraceptivos para o tratamento, que se baseia na possibilidade de haver redução da oferta androgênica ou seu total bloqueio junto às unidades pilossebáceas. A administração oral do etinilestradiol é seguida por aumento significativo da SHBG (sex hormone-binding globulin), promovendo maior captação de androgênios livres. A supressão gonadotrófica, evento relacionado ao progestagênio, propicia menor produção androgênica ovariana. A somatória desses efeitos caracteriza o efeito antiandrogênico comum a todos os anticoncepcionais orais. Em condições normais, a manutenção da pele sem excessiva oleosidade ou acne ocorre com o uso de todos os contraceptivos orais, incluindo os de baixa dose, ainda que contenham progestagênios derivados da 19- nortestosterona. Para o tratamento da acne severa ou hirsutismo, no entanto, frequentemente se utilizam progestagênios antiandrogênicos, cujo efeito é amplificado pela ação direta desses compostos bloqueando os receptores na unidade pilossebácea. ESPECIFICIDADES DO CICLO MENSTRUAL NA ADOLESCÊNCIA: O CICLO MENSTRUAL NORMAL: O ciclo menstrual humano reflete as alterações hormonais e morfológicas endometriais que afetam a organização endometrial. Esse processo é mediado pelo eixo HHO que produz diversos hormônios numa cadeia de retroalimentação, como o FSH, que favorece a secreção de estrogênio, o LH, que deflagra o processo final de amadurecimento e liberação do ovócito, e os hormônios ovarianos (estrogênios e progestagênios), formados pela conversão da androstenediona. Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR Dois segmentos podem ser decompostos, a depender de qual órgão está sendo examinado: o ciclo ovariano e o ciclo uterino. O primeiro pode ser ainda dividido em fases folicular e lútea, enquanto o último é dividido em fases proliferativa e secretora correspondentes. Sobre a organização do ciclo ovariano, é possível caracterizá-la da seguinte forma: Fase folicular: O mecanismo de feedback hormonal promove o desenvolvimento de um folículo dominante, que se torna maduro e pronto para a ovulação na metade do ciclo. A extensão desse período gira em torno de 10 a 14 dias, sendo a principal determinante da extensão total do ciclo; Fase lútea: Representa o período que se estende desde a ovulação até o início da menstruação, durando cerca de 14 dias. As fases do ciclo uterino, que correspondem ao desenvolvimento e posterior descamação endometrial podem ser descritas também em duas fases, a saber: Graças à combinação dessas etapas, é possível perceber que um ciclo menstrual normal tem duração de 21 a 35 dias, com 2 a 6 dias de fluxo e perda sanguínea de 20 a 60 ml. Os extremos da vida reprodutiva, como a pós-menarca e a perimenopausa, são marcados por maior porcentagem de ciclos irregulares ou anovulatórios. As variações hormonais presentes no organismo feminino são, como mencionado anteriormente, cíclicas, e afetam diretamente não só o amadurecimento do gameta como também a arquitetura uterina e as interações entre outros hormônios. De forma resumida, essa dinâmica pode ser descrita em oito etapas: No início de cada ciclo menstrual, os esteroides gonadais encontram-se em baixa, com diminuição desde a fase lútea do ciclo prévio; Com a involução do corpo lúteo, os níveis de FSH se elevam, estimulando o recrutamento de uma série de folículos em crescimento. Cada folículo irá secretar dosagens crescentes de estrogênio, o que induz a proliferação endometrial; O FSH hipofisário começa a declinar próximo à metade da fase folicular em decorrência das correntes de retroalimentação negativa. Além disso, os folículos em crescimento produzem inibina-B, que suprime a secreção desse hormônio pela hipófise. De maneira oposta, o LH inicialmente diminui em resposta a níveis de estradiol elevados, mas, em um momento mais tardio na fase folicular, suas taxas são dramaticamente aumentadas (resposta bifásica); Ao final da fase folicular, pouco antes da ovulação, receptores de LH/FSH- induzidos estão presentes na superfície de células da granulosa e, com a estimulação do LH, modulam a secreção de progesterona; Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR Depois de uma determinada carga de estimulação estrogênica ocorre um aumento repentino de LH, desencadeando a ovulação, que ocorre após 24 a 36 horas desse pico. A partir desse momento é iniciada a fase lútea (ou secretora); O nível de estrogênio é reduzido pouco antes da ovulação até o meio da fase lútea, quando começa a se elevar outra vez como resultado da secreção do corpo lúteo, que também produz inibina-A; Os níveis de progesterona sobem após a ovulação, podendo ser utilizados como sinal presuntivo da ocorrência desse fenômeno; A progesterona, o estrogênio e a inibina- A agem de forma central (sobre o hipotálamo e a hipófise) para frear a secreção de gonadotrofinas e o consequente crescimento de mais um folículo. Esse período de aumento se mantém até o início da involução do corpo lúteo, marcando o próximo ciclo. A análise do endométrio também permite monitorar os estágios do ciclo reprodutivo feminino, avaliandoa espessura e a nutrição desse tecido. Os dois terços superficiais dessa estrutura correspondem à zona que prolifera e é descartada a cada ciclo (na ausência de gravidez). Essa porção do endométrio que passa pelo ciclo é conhecida como decidua funcionalis, composta por uma zona intermediária situada profundamente (stratum spongiosum) e uma zona compacta superficial (stratum compactum). A decidua basalis é a região mais profunda do endométrio, não sofrendo proliferação significativa mensalmente, mas atua como fonte para a constante regeneração endometrial. Nesse cenário, as fases dividem-se em: Fase proliferativa: Por convenção, o primeiro dia de sangramento vaginal é chamado de dia 1 do ciclo menstrual. Após as menstruações, a decídua basal é composta por brotos glandulares e estroma denso escasso na sua localização adjacente ao miométrio. A fase proliferativa é caracterizada pelo crescimento mitótico progressivo da decídua funcional, no preparo para a implantação do embrião em resposta à elevação dos níveis circulantes de estrogênio. A mudança notada predominantemente durante esse período é a evolução das glândulas endometriais, a princípio, retas, estreitas e curtas, em estruturas mais longas e tortuosas. Por todo esse período, o estroma é uma camada compacta densa, e estruturas vasculares não são vistas com frequência. Fase secretora: Dentro de 48 a 72 horas após a ovulação, o início da secreção de progesterona produz uma mudança na histologia do endométrio ao passar para a fase secretora, assim denominada pela presença evidente de produtos eosinofílicos ricos em proteína secretados na luz glandular. Em contraposição à fase proliferativa, a fase secretora do ciclo menstrual é caracterizada pelos efeitos celulares da progesterona, além dos efeitos do estrogênio, geralmente Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR antagônicos. Como resultado da diminuição gradual do estradiol, durante a segunda metade do ciclo, a síntese de DNA induzida pelo hormônio e a mitose celular são bloqueadas. Durante a fase secretora, as glândulas endometriais formam vacúolos característicos contendo glicogênio, migrando gradualmente para a luz glandular, o que ocorre por volta do 19º ou 20º dia do ciclo. No sexto ou no sétimo dia pós- ovulatório, é comum a atividade secretora das glândulas ser máxima e o endométrio estar plenamente preparado para a implantação do blastocisto. O estroma da fase secretora permanece sem modificações histológicas até aproximadamente o décimo sétimo dia pós- ovulatório, quando há o aumento progressivo do edema. As artérias espiraladas tornam-se claramente visíveis e, então, alongam-se de maneira progressiva, espiralando-se ainda mais durante o restante da fase secretora. Menstruação: Na ausência de implantação, a secreção glandular cessa, e ocorre o colapso irregular da decídua funcional. A descamação resultante dessa camada do endométrio é chamada menstruação. A destruição do corpo lúteo com consequente queda da produção de estrogênio e progesterona é a causa presumida dessa degradação. Com a retirada dos hormônios sexuais, há um intenso espasmo vascular das artérias espiraladas, que, por fim, leva à isquemia endometrial. De maneira simultânea, lisossomos se rompem, causando liberação de enzimas proteolíticas, que promovem destruição tecidual local. Essa camada do endométrio é então descamada, deixando a decídua basal como a fonte subsequente do crescimento endometrial. CONDIÇÕES RELACIONADAS AO ATRASO MENSTRUAL EM ADOLESCENTES: A menstruação normal, como descrita anteriormente, requer constante interação hormonal, mediada por um sistema de retroalimentação intrincado. Se não houver gravidez, a secreção de hormônios ovarianos diminui, e se inicia o sangramento por privação. No entanto, em caso de inatividade de qualquer um dos componentes desse maquinário (fatores endócrinos, ginecológicos ou metabólicos), não há sangramento. Com a redução da idade média para a menarca, a amenorreia passou a ser definida como ausência de menstruação aos 13 anos de idade, não havendo caracteres sexuais secundários, ou aos 15 anos de idade, havendo caracteres sexuais secundários normais. Mulheres que já menstruaram podem ter amenorreia secundária, definida como a ausência de menstruação por três ciclos menstruais normais. O teste de gravidez pode ser indicado para mulheres com ciclos regulares que enfrentam atrasos, mesmo que de apenas uma semana. É conveniente avaliar pacientes que têm menos de nove ciclos por ano. Com algumas Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR exceções, as causas de amenorreia primária e secundária são semelhantes. As pacientes podem apresentar alterações pequenas no eixo hipotalâmico-hipofisário- ovariano, que por vezes não são graves para causar amenorreia, mas levam a quadros de irregularidade menstrual (oligomenorreia) associada à ausência ou baixa frequência de ovulação. É possível esses indivíduos apresentarem sangramento excessivo durante a menstruação, pois não há oposição ao estrogênio. As causas de oligomenorreia superpõem-se às de amenorreia, exceto pelo fato de algumas anormalidades anatômicas e do cariótipo estarem mais associadas à última. A OMS determina três classes de amenorreia: o grupo I inclui mulheres sem evidências de produção endógena de estrogênio, que apresentam níveis normais ou baixos de FSH, níveis normais de prolactina e ausência de lesão do eixo hipotalâmico-hipofisário; o grupo II está associado a pacientes com evidências de produção de estrogênio e níveis normais de prolactina e FSH; o grupo III, por sua vez, inclui mulheres com altos níveis séricos de hormônio folículo estimulante, indicativos de insuficiência ou falência gonadal. Na investigação da causa da amenorreia, é relevante verificar a presença de caracteres sexuais secundários. Caso não sejam encontrados, a mulher não foi exposta ao estrogênio. AMENORREIA PRIMÁRIA: HIPOGONADISMO HIPERGONADOTRÓFICO ASSOCIADO À AUSÊNCIA DE CARACTERES SEXUAIS SECUNDÁRIOS: A disgenesia gonadal é um termo frequentemente empregado para descrever alterações no desenvolvimento das gônadas, que em geral assemelham-se a fitas. Esse quadro está relacionado com elevados níveis de FSH e LH circulantes, uma vez que os ovários não produzem estrogênio e inibina, hormônios que, por meio de feedback inibem a produção desses compostos hipofisários. Tal condição é comum em mulheres com cariótipo anormal, sendo a maior parte delas portadoras da Síndrome de Turner (45, X). Outros distúrbios associados à amenorreia primária são anormalidades estruturais dos cromossomos X, mosaicismo, disgenesia gonadal pura (46,XX e 46,XY com ovários em fita decorrentes da ausência de desenvolvimento das gônadas), deficiências enzimáticas que impedem a produção normal de estrogênio e mutações inativadoras do receptor de gonadotrofina. A maioria das pacientes com esses distúrbios tem amenorreia primária e não apresenta caracteres sexuais secundários. Por vezes, pacientes com deleção parcial do cromossomo X, mosaicismo ou disgenesia gonadal pura podem sintetizar quantidade suficiente de estrogênio no início da puberdade para induzir o desenvolvimento das mamas e alguns episódios de sangramento uterino, tendo, portanto, amenorreia secundária. É possível haver ovulação e, às vezes, gravidez. A lesão grave dos ovários antes do início da puberdade pode causar insuficiência ovariana e ausência de caracteres sexuais secundários. É possível que essa disfunção esteja relacionada a irradiação dos ovários, quimioterapia com alquilantes ou combinações de radioterapia e outrosJúlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR quimioterápicos. É válido salientar, no entanto, que outras causas para essa insuficiência ovariana primária podem causar ausência de menstruação mesmo após o surgimento dos caracteres sexuais secundários. HIPOGONADISMO HIPOGONADOTRÓFICO SEM CARACTERES SEXUAIS SECUNDÁRIOS: A amenorreia primária causada por hipogonadismo hipogonadotrófico se dá quando o hipotálamo não secreta quantidades adequadas de GnRH ou em caso de distúrbio hipofisário associado à produção inadequada de FSH e LH. O atraso fisiológico ou constitucional da puberdade é a manifestação mais comum de hipogonadismo hipogonadotrófico. A amenorreia pode ser resultante da ausência de desenvolvimento físico causada pela reativação tardia do gerador de pulsos de GnRH. Há deficiência funcional desse hormônio em relação à idade cronológica, mas os níveis são normais em termos de desenvolvimento fisiológico. A segunda causa hipotalâmica mais comum para a amenorreia primária associada ao hipogonadismo hipogonadotrófico é a insuficiente secreção pulsátil de GnRH (conhecida também como síndrome de Kallmann), que apresenta vários mecanismos de propagação genética. A deficiência na secreção do GnRH resulta, graças ao feedback hormonal, menor produção de FSH e LH. Muitas vezes, a síndrome de Kallmann está associada à anosmia, embora a mulher possa não estar ciente do comprometimento do olfato. O hipogonadismo e a anosmia são consequência de falha da migração neuronal durante o desenvolvimento fetal. Fatores genéticos também se fazem presentes como possíveis causadores dessa forma de amenorreia. As pacientes com deficiência de FSH costumam buscar tratamento para puberdade tardia e amenorreia primária associada ao baixo volume de estrogênio circulante. Elas são distinguidas de outras pacientes hipoestrogênicas por apresentarem níveis diminuídos de FSH e taxas elevadas de LH. Essas pacientes têm baixos níveis séricos de androgênios, apesar da razão LH/FSH anormal, indicando que o desenvolvimento folicular estimulado por FSH é um pré- requisito para a produção de androgênios pelas células tecais. Em algumas dessas mulheres foram identificadas alterações cromossômicas que afetaram a expressão de uma subunidade hormonal que, quando ausente impede o seu acoplamento ao receptor. AVALIAÇÃO DE QUADROS DE AMENORREIA ASOCIADA A AUSÊNCIA DE CARACTERES SEXUAIS SECUNDÁRIOS: Para o diagnóstico e tratamento adequado da amenorreia primária associada ao hipogonadismo, a anamnese e o exame físico detalhados são imprescindíveis, principalmente em pacientes com síndrome de Turner. História de baixa estatura com velocidade de crescimento regular, história familiar de puberdade tardia e achados físicos normais (incluindo avaliação do olfato, discos ópticos e campos visuais) podem sugerir atraso fisiológico. A presença de cefaleias, distúrbios visuais, baixa estatura, sintomas de diabetes insipidus e fraqueza de um ou mais membros sugerem lesões do SNC. Em suma, o processo de formulação de hipóteses diagnósticas consiste em: Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR Solicitar a dosagem de FSH e LH de acordo com a história clínica, permitindo assim diferenciar o hipogonadismo como de origem hipo ou hipergonadotrófica. Caso os níveis de FSH sejam elevados, será preciso fazer o cariótipo; o Pacientes que forem diagnosticadas com síndrome de Turner (FSH elevado + cariótipo 45, X) devem ser acompanhadas com provas anuais de função tireoidiana e ecocardiograma a cada 3 a 5 anos. Se o cariótipo for anormal e contiver o cromossomo Y, como na disgenesia gonadal, as gônadas devem ser removidas para que se evitem tumores; O baixo nível de FSH no exame de rastreamento confirma o diagnóstico de hipogonadismo hipogonadotrófico. As lesões do SNC devem ser excluídas por tomografia computadorizada ou ressonância magnética (identificam calcificações típicas de craniofaringiomas), sobretudo se houver galactorreia, cefaleia ou problemas do campo visual; O diagnóstico de atraso fisiológico deve ser feito por exclusão, havendo dificuldade em distingui-lo da secreção insuficiente de GnRH. O respaldo diagnóstico se dá por meio de uma história clínica sugestiva associada a radiografia do punho que ateste retardo na idade óssea da paciente. TRATAMENTO DA AMENORREIA PRIMÁRIA: Pacientes com amenorreia primária associada a todos os tipos de insuficiência gonadal e hipogonadismo hipergonadotrófico devem fazer uso de um tratamento cíclico com estrogênio e um progestágeno para deflagrar o amadurecimento e a manutenção dos caracteres sexuais secundários. A prevenção da osteoporose é outro benefício dessa terapia, uma vez que o hormônio incrementa a deposição de cálcio nos ossos. Sempre que possível, o tratamento deve corrigir a causa da amenorreia primária, seja por meio de radioterapia (craniofaringiomas), antagonistas da dopamina, de correções nutricionais ou até mesmo da tranquilização da paciente (em caso de atraso fisiológico). AMENORREIA CAUSADA POR ANORMALIDADES PÉLVICAS: A amenorreia secundária também pode afetar mulheres que já passaram pela menarca e apresentam caracteres sexuais desenvolvidos. Uma das possíveis causas desse distúrbio são anormalidades nas estruturas reprodutivas, como bloqueio no trato de saída, agenesia deste ou não existência de um útero funcional. Para a ocorrência de menstruação, o endométrio deve ser ativo, com suas mudanças cíclicas, e o colo do útero e a vagina devem ter patência. Todo bloqueio transversal do sistema mülleriano causa amenorreia. Essas Júlia Figueirêdo - SAÚDE DA MULHER, SEXUALIDADE HUMANA E PLANEJAMENTO FAMILIAR obstruções da saída incluem hímen imperfurado e septo vaginal transverso, bem como hipoplasia e ausência de colo do útero ou vagina. Com frequência, o bloqueio transversal do trato de saída com endométrio intacto causa dor cíclica sem sangramento menstrual em adolescentes. Quando o fluxo sanguíneo torna-se obstruído, há risco de se desenvolverem diversas complicações, como hemoperitônio e endometriose. A ausência de atividade endometrial também pode causar amenorreia. Quando os achados ao exame físico são normais, devem-se cogitar anormalidades anatômicas da cavidade uterina, podendo ser causas para amenorreia primária (ex.: agenesia do endométrio). A síndrome de Asherman, mais comum em quadros secundários da disfunção menstrual, pode ocorrer em pacientes com fatores de risco para sinéquias endometriais ou cervicais (colo do útero), incluindo história de cirurgia uterina ou cervical, infecções relacionadas com o uso de um dispositivo intrauterino e doença inflamatória pélvica (DIP) grave. Indivíduos com fenótipo feminino com insensibilidade androgênica congênita completa (conhecida anteriormente como feminização testicular) desenvolvem caracteres sexuais secundários femininos, mas não menstruam. Seu genótipo é masculino (XY), mas há um defeito que impede a função normal do receptor androgênico, ocorrendo o desenvolvimento do fenótipo feminino. Os níveis séricos de testosterona estão na faixa masculina normal. É possível que não haja vagina ou que ela seja curta. Os déficits de receptor androgênico são diversos e podem ser decorrentes da diminuição da função ou da concentração dessa estrutura. É possível que a diversidade de mutações esteja relacionada com a diversidade do fenótipo. Como o hormônio anti-mülleriano está presente e tem atividade normal nesses pacientes, não há estruturas femininas internas como útero, vagina e tubas uterinas. Do contrário, há testículos, em vez de ovários, no abdome ou em hérnias
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