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Alice Bastos Herpes simples Introdução e Epidemiologia Os herpesvírus simples (HSV-1, HSV-2) produzem inúmeras infecções que afetam as superfícies cutaneomucosas, o sistema nervoso central (SNC) e, às vezes, órgãos viscerais; As infecções pelos vírus herpes simples (HSV-1 e HSV- 2) representam as doenças sexualmente transmissíveis mais comuns a nível global, alcançando uma soroprevalência de 80% em adultos; A infecção por HSV-1 é adquirida com mais frequência e mais precocemente do que a infecção por HSV-2; A prevalência de infecção pelo HSV-1 é de 60 a 80%; Soroprevalência por faixa etária no Brasil (homens e mulheres): 1 a 4: 36%; 5 a 9: 52,4%; 10 a 14: 68,1%; 15 a 19: 83,3%; 20 a 29: 83,6%; 30 a 35: 95,2%; 35 a 44: 96%; > 45: 94,6%; Em populações com menor nível socioeconômico, a taxa de soropositividade ao HSV-1 é mais elevada, ocorrendo precocemente na infância. Etiologia Herpes é uma infecção causada por dois vírus da família Herpesviridae (herpes simples tipo 1 e 2), e pode afetar a região da boca, principalmente labial, órgãos genitais e áreas próximas; O vírus herpes simples tipo 1 (HSV-1) é o agente etiológico principal das lesões vesiculares da região orofacial; O vírus herpes simples tipo 2 (HSV-2) é a causa principal das lesões na região genital. Patogenia A exposição das superfícies mucosas ou da pele esfoliada ao HSV permite a entrada do vírus nas células da epiderme e da derme e o início de sua replicação nestas células; A replicação viral é suficiente para permitir a infecção das terminações nervosas sensoriais ou autônomas; Após penetrar nas células neuronais, o vírus (ou mais provavelmente o nucleocapsídio) é transportado pelo axônio até os corpos das células nervosas nos gânglios; Durante a fase inicial da infecção, ocorre replicação viral nos gânglios e no tecido nervoso contíguo; Em seguida, o vírus propaga-se para outras superfícies mucocutâneas por migração centrífuga dos virions infecciosos, por meio dos nervos sensoriais periféricos; Essa forma de disseminação ajuda a explicar a grande superfície da área afetada, a elevada frequência de novas lesões distantes do grupo inicial de vesículas e a capacidade de recuperar o vírus a partir do tecido neural distante dos neurônios que inervam o local de inoculação; A infecção latente pode ocorrer por ambos os subtipos de vírus em gânglios tanto sensoriais quanto autônomos; Na infecção por HSV-1, os gânglios trigeminais são mais comumente infectados, embora também ocorre extensão para os gânglios cervicais inferior e superior; Na infecção genital, os gânglios das raízes dos nervos sacrais (S2-S5) são mais comumente afetados; O mecanismo de reativação a partir da latência não é conhecido, mas duas teorias são levadas em consideração: Gatilho ganglionar: uma mudança no ambiente imune, hormonal ou físico do gânglio leva à reativação (por ex.: imunodeficiência); Alice Bastos Gatilho cutâneo: mudanças no microambiente cutâneo permitem que a replicação se inicie (por ex.: exposição a raios ultravioletas). Quadro clínico As manifestações clínicas e a evolução da infecção por HSV dependem do(a): Local anatômico afetado; Idade; Estado imunológico do hospedeiro; Tipo antigênico do vírus; As infecções por HSV primárias (ou seja, as primeiras infecções por HSV-1 ou HSV-2, em que o hospedeiro carece de anticorpos anti-HSV no soro da fase aguda) acompanham-se frequentemente de sinais e sintomas sistêmicos. Ç A gengivoestomatite e a faringite são as manifestações clínicas mais comuns do primeiro episódio de infecção por HSV-1; São manifestações mais comuns em crianças e adultos jovens; A herpes labial recorrente é a manifestação clínica mais comum da reativação da infecção por HSV-1; Podem estar presentes também os seguintes sinais e sintomas (com duração de 3-14 dias): Febre; Mal estar; Mialgias; Incapacidade de alimentar-se; Irritabilidade; Adenopatia cervical; Nos pacientes imunossuprimidos, a infecção por HSV pode estender-se para a mucosa e as camadas cutâneas profundas; Consequentemente, pode ocorrer friabilidade, necrose, sangramento, dor intensa e incapacidade de ingerir alimentos ou beber. Ç O primeiro episódio de herpes genital primário caracteriza-se por febre, cefaleia, mal estar e mialgias; Os sintomas locais predominantes incluem dor, prurido, disúria, secreções vaginal e uretral e linfadenopatia inguinal hipersensível; Lesões bilaterais bem espaçadas da genitália externa são típicas; Essas lesões são encontradas em vários estágios, tais como vesículas, pústulas ou úlceras eritematosas dolorosas; Às vezes, a doença do trato genital causada por HSV manifesta-se por endometrite e salpingite em mulheres, e prostatite em homens; O HSV-1 e o HSV-2 podem causar infecções retais e perianais sintomáticas ou assintomáticas; Os sinais e sintomas apresentados são: dor, secreções anorretais, tenesmo e constipação; A sigmoidoscopia revela a presença de lesões ulcerativas nos 10 cm distais da mucosa retal; Alice Bastos As lesões herpéticas perianais extensas e/ou proctite por HSV são comuns entre paciente com infecção pelo HIV. É a infecção do dedo por HSV; Pode ocorrer como complicação do herpes oral ou genital primário, em consequência da inoculação do vírus através de uma solução de continuidade na superfície epidérmica ou pela introdução do vírus na mão devido à exposição ocupacional ou de outro tipo; Sinais e sintomas: início abrupto de edema, eritema e hipersensibilidade localizada no dedo infectado; Observam-se lesões vesiculosas ou postulosas na extremidade do dedo; É comum a ocorrência de febre, linfadenite e linfadenopatias epitroclear e axilar. Ç A ceratite (infecção da córnea) por HSV manifesta-se pelo início agudo de dor, borramento visual, quemose, conjuntivite e lesões dendríticas típicas da córnea; A coriorretinite, que geralmente é uma manifestação da infecção disseminada por HSV, pode ocorrer em recém-nascidos ou em pacientes com infecção pelo HIV. Ç Nas crianças e adultos jovens, a infecção primária por HSV pode resultar em encefalite; O vírus adquirido de modo exógeno penetra no SNC por propagação neurotrópica a partir da periferia, por meio do bulbo olfatório; A maioria dos adultos com encefalite por HSV apresenta evidências clínicas ou sorológicas de infecção cutaneomucosa por HSV-1 antes do início dos sintomas do SNC; A marca clínica da encefalite herpética tem sido o início agudo de febre e sinais e sintomas neurológicos focais, sobretudo do lobo temporal. Ç A infecção de órgãos viscerais por HSV resulta de viremia, sendo comum o comprometimento de múltiplos órgãos; Em certas ocasiões, as manifestações clínicas da infecção por HSV afetam apenas o esôfago, o pulmão ou o fígado; Esofagite: presença de odinofagia, disfagia, dor subesternal e perda de peso; Surgem múltiplas ulcerações ovais sobre uma base eritematosa, com ou sem pseudomembrana branca; O esôfago distal é mais comumente afetado; Pneumonite: é incomum, exceto em pacientes gravemente imunossuprimidos; Hepatite: HSV é uma causa incomum de hepatite em pacientes imunocompetentes; Está associada à febre, elevação abrupta da bilirrubina e das aminotransferases séricas e leucopenia; A infecção disseminada por HSV em pacientes imunocompetentes é rara. Diagnóstico Pode-se estabelecer um diagnóstico clínico preciso na presença de múltiplas lesões vesiculosas características em uma base eritematosa; No entanto, as ulcerações herpéticas podem assemelhar-se a ulcerações cutâneas de outras etiologias e por isso, recomendam-se exames laboratoriais para confirmar o diagnóstico e orientar o tratamento;A melhor maneira de confirmar laboratorialmente a presença de infecção por HSV consiste na detecção do vírus, de antígenos virais ou de DNA viral no raspado das lesões; A detecção do DNA do HSV por PCR constitui a técnica de laboratório mais sensível para a detecção das infecções de mucosa ou viscerais pelo HSV e deve ser utilizada, quando disponível. Tratamento O Aciclovir (ACV) é a terapia padrão-ouro tanto para a forma mucocutânea quanto para outras formas da doença causada pelo VHS; Pode ser administrado por via tópica, oral ou intravenosa; Alice Bastos Também podem ser utilizados fanciclovir e valaciclovir; Os três compostos recomendados (aciclovir, valaciclovir e fanciclovir) têm eficácia comprovada em reduzir a duração dos sintomas e das lesões nas infecções cutaneomucosas por HSV em pacientes imunocomprometidos e imunocompetentes; Aciclovir IV (30 mg/kg/dia, administrados em forma de infusão de 10 mg/kg durante 1h, a intervalos de 8h) mostra-se eficaz na redução da letalidade e gravidade da encefalite por HSV. Referências COREY, L. Infecções pelo herpes-vírus simples. In: KASPER, D. L., et al. Medicina interna de Harrison. 19. ed. Porto Alegre: AMGH, 2017. p. 4913- 4939. KIFFER, C. R. V.; GRANATO, C. F. H. Herpes simples. In: FOCACCIA, R. Veronesi: tratado de infectologia. 5. Ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2015. p. 700-715.
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