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Hepatite Infecciosa canina

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Etiologia
A  hepatite  infecciosa  canina  (HIC),  causada  pelo  adenovírus  canino  (CAV)­1,  tem  homogeneidade
sorológica mundial e similaridades imunológicas com os adenovírus humanos. Sinônimos históricos da
doença incluem a encefalite de raposas e a doença de Rubarth. O CAV­1 é antigênica e geneticamente
distinto  do CAV­2,  que  causa  doença  respiratória  em  cães  (ver Etiologia,  no  Capítulo 6).  Variantes
genéticas do CAV­2 foram isoladas do  intestino de um filhote canino com diarreia hemorrágica e de
cães de canis que apresentaram diarreia. Adenovírus humanos foram usados como vetores para testar a
vacina recombinante em cães.26
Como outros adenovírus, o CAV­1, por ser altamente resistente à inativação ambiental, sobrevive à
desinfecção  com  várias  substâncias  químicas,  como  clorofórmio,  éter,  ácido  e  formol,  e  é  estável
quando  exposto  a  certas  frequências  de  radiação  ultravioleta.  O  CAV­1  sobrevive  durante  dias  à
temperatura ambiente em restos no solo, permanece viável por meses a temperaturas abaixo de 4°C e é
inativado após 5 min a 50 a 60°C, o que torna a limpeza a vapor um meio plausível de desinfecção. A
desinfecção  química  também  foi  bem­sucedida  com o  uso  de  iodo,  fenol  e  hidróxido  de  sódio, mas
todos são potencialmente cáusticos.
O  CAV­1  causa  doença  clínica  em  cães,  coiotes,  raposas,  lobos  e  outros  membros  das  famílias
Canidae  e  Ursidae  (ursos).  Foi  relatada  infecção  fatal  em  uma  lontra  (Lutra  lutra).31  Além  desses
carnívoros,  também  foram  detectados  anticorpos  séricos  em  mamíferos  marinhos,  inclusive  morsas
(Odobenus  rosmarus)  e  leões­marinhos  (Eumetopias  jubatus).5,32,35 A  alta  prevalência  de  anticorpos
séricos  neutralizantes  de  ocorrência  natural  na  população  canina  silvestre  e  selvagem  não  vacinada
sugere que a infecção subclínica esteja disseminada.2,14,16,17,38 O CAV­1 foi isolado de todos os tecidos
corporais  e  secreções de  cães durante os  estágios  agudos da doença. Por volta de 10  a 14 dias pós­
inoculação  (PI),  o  vírus  pode  ser  encontrado  nos  rins  e  é  excretado  na  urina  por  pelo menos  6  a  9
meses. A transmissão do vírus por aerossol via urina é improvável, e foi observado que cães suscetíveis
mantidos  a  espaços  de  15  cm  dos  que  eliminavam  o  vírus  não  se  infectaram.  Pode  ocorrer
disseminação  viral  por  contato  com  fômites,  incluindo  utensílios  usados  para  a  alimentação  dos
animais e as próprias mãos. Ectoparasitas podem abrigar o CAV­1 e estar envolvidos na  transmissão
natural da doença.
Patogenia
Após  exposição oronasal  natural,  o  vírus  inicialmente  localiza­se  nas  tonsilas,  de onde  se  dissemina
para linfonodos regionais e  linfáticos antes de alcançar o sangue pelo ducto torácico. A viremia, que
dura 4 a 8 dias após a infecção, resulta na disseminação rápida do vírus para outros tecidos e secreções
corporais,  inclusive  a  saliva,  a  urina  e  as  fezes. As  células  parenquimatosas  hepáticas  e  endoteliais
vasculares de muitos  tecidos,  inclusive do sistema nervoso central  (SNC), são os principais alvos de
localização viral e lesão.
A lesão celular inicial do fígado, dos rins e dos olhos está associada aos efeitos citotóxicos do vírus.
Uma resposta de anticorpo suficiente por volta do sétimo dia após a infecção elimina o vírus do sangue
e  do  fígado  e  restringe  a  extensão  do  dano  hepático.  Necrose  hepática  centrolobular  a  panlobular
disseminada  costuma  ser  fatal  em  cães  infectados  experimentalmente,  com  título  de  anticorpos
neutralizantes persistentemente baixo (inferior a 4). A necrose hepática aguda pode ser autolimitada e
centrolobular restrita, pois ocorre regeneração hepática em cães que sobrevivem a essa fase da doença.
Os  cães  que demonstram  título de  anticorpo neutralizante  parcial  (superior  a  16,  inferior  a  500)  por
volta  de  4  a  5  dias  após  a  infecção  podem  desenvolver  hepatite  ativa  crônica  e  fibrose  hepática. A
inflamação hepática persistente continua, provavelmente como resultado da infecção hepática crônica
latente  com  o  vírus.  Geralmente,  os  cães  com  títulos  suficientes  de  anticorpos  neutralizantes  (pelo
menos 500) no dia da infecção exibem pouca evidência clínica da doença. Os cães imunes ao desafio
parenteral com o CAV­1 ainda são suscetíveis à doença respiratória via partículas virais aerossolizadas.
Tanto cepas virulentas quanto cepas vivas modificadas do CAV­1 causam lesões renais. No início, o
vírus  detectado  por  imunofluorescência  positiva  e  avaliação  ultraestrutural  localiza­se  no  endotélio
glomerular  na  fase  virêmica  da  doença  e  causa  lesão  glomerular  inicial.  Aumento  de  anticorpos
neutralizantes  aproximadamente  7  dias  após  a  infecção  está  associado  a  deposição  glomerular  de
complexos imunes circulantes (CIC) e proteinúria transitória. O CAV­1 não é detectado no glomérulo
em período  superior  a 14 dias  após  a  infecção, mas persiste no  epitélio  tubular  renal. A  localização
tubular  do  vírus  está  associada  principalmente  a  virúria  e  observa­se  proteinúria  apenas  transitória.
Observa­se nefrite intersticial focal discreta nos cães que se recuperam, mas, ao contrário do que ocorre
na  doença  hepática,  não  foi  possível  encontrar  evidência  de  que  a  doença  renal  crônica  progressiva
resulte de HIC.
Ocorrem complicações clínicas da localização ocular do CAV­1 virulento em aproximadamente 20%
dos cães com infecção natural e em menos de 1% dos cães após vacinação subcutânea com a vacina
contra  o  CAV­1  contendo  o  vírus  vivo  modificado  (VVM).  O  desenvolvimento  de  lesões  oculares
começa durante a viremia, que ocorre 4 a 6 dias após a infecção; o vírus entra no humor aquoso a partir
do sangue e se replica nas células endoteliais da córnea.
Uveíte anterior grave e edema de córnea surgem 7 dias após a  infecção, período correspondente a
aumento  no  título  de  anticorpos  neutralizantes  (Figura  4.1).  A  deposição  de  CIC  com  fixação  de
complemento  resulta  em  quimiotaxia  das  células  inflamatórias  na  câmara  anterior  e  dano  endotelial
extenso na córnea. A ruptura do endotélio intacto da córnea, que serve como uma bomba de líquido da
córnea para a câmara anterior, causa acúmulo de líquido edematoso dentro do estroma da córnea.
Geralmente  a  uveíte  e  o  edema  são  autolimitantes,  a menos  que  ocorram outras  complicações  ou
destruição endotelial maciça. O término do edema de córnea coincide com a regeneração endotelial e o
restabelecimento do gradiente hidrostático entre o estroma da córnea e o humor aquoso. A recuperação
ocular normal costuma ser aparente por volta de 21 dias após a infecção. Se as alterações inflamatórias
forem graves o suficiente para bloquear o ângulo de filtração, o aumento da pressão intraocular poderá
resultar em glaucoma e hidroftalmia.
Figura 4.1 Patogenia sequencial da  infecção ocular pelo CAV­1. A. Durante o período virêmico, o CAV­1 entra no
olho pelo  trato uveal,  localizando­se nas células endoteliais vasculares da coroide e causando uveíte  leve. O vírus
também  entra  no  humor  aquoso  e  se  localiza  nas  células  endoteliais  da  córnea.  B.  A  resposta  específica  de
anticorpo ao CAV­1 aumenta no sangue, alcança o olho pelo trato uveal e entra no humor aquoso quando há vírus.
C.  Vírus  livre  no  humor  aquoso  e  nas  células  endoteliais,  com  formação  de  complexo  viral­anticorpo  e  de
corpúsculos de inclusão intranucleares. D. Fixação de complemento nos complexos do vírus com anticorpos livres e
nas células endoteliais para quimiotaxia de neutrófilos. Ocorrem uveíte mais grave e lesão endotelial da córnea. E.
Detalhe mostrando perda do endotélio e a bomba do humor aquoso acarretando  influxo de humor aquoso para a
córnea. F. A  perda  de  células  endoteliais  na  córnea  faz  com  que  o  humor  aquoso  penetre  na  córnea,  causando
edema  de  córnea  (olho  azulado).Depois  que  os  fagócitos  mononucleares  removem  os  complexos  de  vírus  e
anticorpos  e  a  inflamação  diminui,  o  endotélio  da  córnea  se  regenera. G. A  inflamação  da  úvea  pode  ocasionar
bloqueio  do  ângulo  de  filtração  e  glaucoma  subsequente.  (Arte  de  Brad  Gilleland,  ©  2010  University  of  Georgia
Research Foundation Inc.)
As complicações em geral estão associadas à patogenia da HIC. Os cães são mais propensos a  ter
pielonefrite  bacteriana  como  resultado  do  dano  renal  após  a  infecção  pela  HIC.  A  coagulação
intravascular  disseminada  (CID),  uma  complicação  frequente  da  HIC,  começa  no  início  da  fase
virêmica da doença e pode ser desencadeada pelo dano a células endoteliais, com ativação disseminada
do  mecanismo  da  coagulação,  ou  pela  incapacidade  do  fígado  doente  de  remover  os  fatores  da
coagulação ativados. A síntese hepática diminuída de fatores da coagulação ante o consumo excessivo
responde pelo defeito hemorrágico.
Embora  a  causa  da  morte  na  HIC  seja  incerta,  o  fígado  é  o  local  primário  da  lesão  viral.  A
insuficiência e a encefalopatia hepáticas podem resultar em um estado de semicoma e na morte. Alguns
cães morrem tão subitamente que não há tempo para a ocorrência do dano hepático com insuficiência
hepática  resultante. A morte nesses  cães pode  resultar de dano cerebral,  pulmonar  e  a outros órgãos
parenquimatosos vitais ou do desenvolvimento de CID.
Achados clínicos
A HIC é observada com maior  frequência em cães com menos de 1 ano de  idade,  embora cães não
vacinados  de  todas  as  idades  possam  ser  acometidos. Os  cães  com  acometimento mais  grave  ficam
moribundos e morrem em questão de horas após o início dos sinais clínicos. Os proprietários em geral
acreditam que o animal tenha sido envenenado. Os sinais clínicos nos cães que sobrevivem ao período
virêmico agudo incluem vômitos, dor abdominal e diarreia, com ou sem evidência de hemorragia.
Os achados físicos anormais na fase inicial da infecção incluem aumento da temperatura retal (39,4 a
41,1°C)  e  frequências  de  pulso  e  respiratória  aceleradas. A  febre  pode  ser  transitória  ou  bifásica  no
início  da  evolução  da  doença. O  aumento  das  tonsilas,  em  geral  associado  a  faringite  e  laringite,  é
comum. Tosse e sons respiratórios ásperos mais baixos à auscultação são manifestações de pneumonia.
É comum observar­se  linfadenomegalia  cervical  com edema  subcutâneo da  cabeça,  do pescoço e de
partes pendentes do  tronco. Sensibilidade abdominal e hepatomegalia em geral  são aparentes no cão
com a enfermidade aguda. Pode ocorrer diátese hemorrágica demonstrada por hemorragias petequiais
disseminadas e equimoses, epistaxe e sangramento em locais de punção venosa. Icterícia é incomum na
HIC aguda, mas é encontrada em alguns cães que sobrevivem à fase fulminante aguda da doença. A
distensão  abdominal  é  causada  pelo  acúmulo  de  líquido  serossanguinolento  ou  hemorragia.  Podem
surgir  sinais do SNC,  incluindo depressão, desorientação, convulsões ou coma  terminal em qualquer
momento da infecção. Em raposas e em raros casos de filhotes caninos domésticos, podem ser vistos
sinais do SNC na ausência de outras manifestações sistêmicas.7
Cães com acometimento leve podem recuperar­se após o primeiro episódio febril. Os sinais clínicos
desses  casos  de  HIC  sem  complicações  costumam  durar  5  a  7  dias  antes  da  melhora.  É  possível
encontrar  sinais  persistentes  em  cães  com  uma  infecção  viral  concomitante,  como  a  cinomose,  ou
naqueles que desenvolvem hepatite  crônica ativa. Ocorrem outros  sinais  clínicos ou mais graves em
cães infectados concomitantememte com outros patógenos.9,10,33
Geralmente ocorrem edema de córnea e uveíte anterior quando a recuperação começa, e essas podem
ser  as  únicas  anormalidades  clínicas  observadas  em  cães  com  infecção  inaparente  (ver  também
Hepatite infecciosa canina, no Capítulo 92). Cães com edema de córnea apresentam blefaroespasmo,
fotofobia  e  secreção  ocular  serosa.  O  embaçamento  da  córnea  em  geral  começa  no  limbo  e  se
dissemina em direção central (Figura 4.2) (ver Figura 92.17). A dor ocular, presente durante os estágios
iniciais da  infecção, em geral diminui quando a córnea fica completamente embaçada. No entanto, a
dor pode voltar com o desenvolvimento de glaucoma ou ulceração e perfuração da córnea. Nos casos
sem complicações, o desembaçamento da córnea começa no limbo e se dissemina na direção central.
Diagnóstico
Os  achados  hematológicos  iniciais  na  HIC  incluem  leucopenia  com  linfopenia  e  neutropenia.
Neutrofilia  e  linfocitose  ocorrem mais  tarde  em  cães  com  recuperação  clínica  sem  complicações.  É
possível  encontrar  um  número  elevado  de  linfócitos  (ativados)  corados  em  escuro  e  eritrócitos
nucleados.  As  alterações  na  proteína  sérica,  detectáveis  apenas  à  eletroforese  sérica,  são  aumento
transitório  na  globulina  α2  7  dias  após  a  inoculação  e  aumento  tardio  na  globulina  γ,  que  atinge  o
máximo 21 dias após a inoculação.
Figura  4.2  Olho  azul  característico  da  HIC  viral  e  dano  imunológico  subsequente  ao  en­dotélio  da  córnea.
(Fotografia de Craig Greene © 2004 University of Georgia Research Foundation Inc.)
O grau de aumento na atividade da alanina aminotransferase (ALT), da aspartato aminotransferase e
da fosfatase alcalina sérica depende do momento em que é obtida a amostra e da magnitude da necrose
hepática. Tal aumento continua até 14 dias após a inoculação, depois do que há um declínio, embora
seja possível observar elevações persistentes ou recorrentes em cães que desenvolvem hepatite crônica
ativa. Bilirrubinúria moderada  a  acentuada  é  frequente,  em decorrência  do baixo  limiar  renal  para  a
bilirrubina conjugada no cão; hiperbilirrubinemia é incomum. De importância diagnóstica, o aumento
na ALT,  uma medida  de  necrose  hepatocelular,  é  desproporcionalmente maior  do  que  na  bilirrubina
sérica, apesar da natureza difusa da lesão hepática. Tal disparidade, típica da HIC e que a diferencia da
maioria  das  outras  causas  de  necrose  hepática  disseminada  resulta  da  natureza  centrolobular
predominante  da  necrose  em  torno  das  vênulas  hepáticas. Em contrapartida,  as  regiões  periportais  e
lobulares periféricas em torno do ducto biliar são poupadas. As medidas da função hepática, como os
níveis  séricos  de  amônia  ou  a  retenção  de  ácido  biliar,  podem  estar  aumentadas  durante  a  evolução
aguda da HIC ou mais tarde em cães que desenvolvem fibrose hepática crônica. De maneira similar, é
possível detectar hipoglicemia em cães na fase terminal da doença.
As anormalidades da coagulação características da CID são mais pronunciadas durante os estágios
virêmicos  da  doença.30  Trombocitopenia  com  ou  sem  alteração  na  função  plaquetária  em  geral  é
aparente.  O  tempo  de  protrombina  em  um  estágio,  o  de  tromboplastina  parcial  ativado  (aPTT;  do
inglês,  activated  partial  prothrombin  time)  e  o  de  trombina  estão  variavelmente  prolongados.  É
provável que o prolongamento precoce do aPTT resulte do consumo de fator VIII, cuja atividade está
reduzida,  havendo  aumento  dos  produtos  de  degradação  do  fibrinogênio.  Disfunção  plaquetária  e
prolongamento  do  aPTT  provavelmente  resultam  do  aumento  dos  produtos  da  degradação  do
fibrinogênio. Na maioria dos casos, o prolongamento do tempo de protrombina é menos notável.
A proteinúria (primariamente albuminúria) é um reflexo do dano renal causado pelo vírus e em geral
pode ser detectada na urinálise aleatória, porque a concentração está acima de 50 mg/dℓ. O aumento na
permeabilidade  glomerular  pode  resultar  da  localização  do  vírus  nos  estágios  iniciais  da  infecção.
Como  alternativa,  à medida  que  a  doença  progride,  os  glomérulos  ficam  danificados  pelos  CIC  ou
como  efeito  da  CID.  À  paracentese  abdominalobtém­se  um  líquido  cuja  cor  varia  de  amarelo
transparente a vermelho­brilhante, dependendo da quantidade de sangue presente. Em geral, trata­se de
um exsudato com células inflamatórias e teor de proteína superior a 5,29 g/dℓ  (e densidade acima de
1,020).
A citologia da medula óssea reflete a alteração notável nos leucócitos da circulação periférica. Não
há megacariócitos ou seu número está diminuído durante o estágio virêmico da doença, e os presentes
podem ter a morfologia alterada.
O  líquido  cerebrospinal  está  dentro  dos  limites  de  referência  em  cães  com  sinais  neurológicos
causados  pela  hepatoencefalopatia  e  geralmente  é  anormal  em  cães  que  desenvolvem encefalite  não
supurativa a partir da localização do vírus dentro do cérebro. A concentração de proteína (acima de 30
mg/dℓ) aumenta com pleocitose mononuclear (superior a 10 células/μℓ). O humor aquoso também tem
concentrações elevadas de proteína e células, em associação a uveíte anterior.
Os  resultados  de  procedimentos  laboratoriais  previamente  discutidos  são  sugestivos  de  HIC  e  o
principal meio de estabelecer o diagnóstico na prática clínica. A confirmação antes da morte, embora
não  seja  indispensável  para  se  instituir  o  tratamento  adequado,  pode  ser  obtida  por  sorologia,
isolamento  do  vírus  e  coloração  imunofluorescente  para  o  vírus  intralesional.  A  sorologia  inclui
neutralização  do  vírus,  hemaglutinação  indireta,  fixação  do  complemento,  imunodifusão  e  ensaio
imunossorvente  ligado  a  enzima  (ELISA;  do  inglês,  enzyme­linked  immunosorbent  assay),  que  em
geral  mostram  altos  títulos  após  infecção  com  o  vírus  virulento,  em  contraste  com  as  infecções
causadas pelas vacinas que contêm o VVM.
O CAV­1 pode ser isolado por ser altamente resistente e de fácil replicação em cultura de células de
várias espécies, inclusive a canina. A citopatologia típica induzida por adenovírus inclui aglomeração
de  células  do  hospedeiro  e  descolamento  em  monocamadas,  com  a  formação  de  inclusões
intranucleares. Quando  a  viremia  começa,  no  quinto  dia  PI,  o CAV­1  pode  ser  cultivado  a  partir  de
qualquer  tecido  ou  secreção  do  corpo.  O  vírus  é  isolado  na  câmara  anterior  durante  a  fase  leve  da
uveíte, antes da infiltração de anticorpos e da formação de complexo imune. A cultura do vírus a partir
do  fígado de cães em geral  é difícil porque a arginase hepática  inibe a  replicação do ácido nucleico
viral. O vírus não  foi  isolado a partir  do  fígado depois de 10 dias PI, mesmo em cães  com hepatite
crônica  ativa,  talvez  porque  se  desenvolva  latência  viral. O  rim  é  a  localização mais  persistente  do
vírus, e é possível isolar o CAV­1 da urina por pelo menos 6 a 9 meses após a infecção inicial.
Técnicas de imunofluorescência são usadas experimentalmente para confirmar se há vírus em vários
tecidos. Tais métodos ajudaram a detectar locais de replicação do vírus, sua disseminação nas células e
a  existência  do  antígeno  viral  em  corpúsculos  de  inclusão.  Procedimentos  com  imunoperoxidase,
aplicados  a  tecidos  fixados  em  formol  e  embebidos  em  parafina,  detectaram  o  vírus  em  tecidos
hepáticos armazenados até há 6 anos. As técnicas de reação em cadeia da polimerase (PCR; do inglês,
polymerase  chain  reaction)  foram  desenvolvidas  para  detectar  o  CAV­1  em  amostras  biológicas  e
distingui­lo do CAV­2 em amostras clínicas.8,20,30
Achados patológicos
Os achados de necropsia ou em biopsias de tecidos de cães em geral podem confirmar o diagnóstico de
HIC. Cães que morrem durante a fase aguda da doença costumam estar com a musculatura boa, apesar
do  edema  e  da  hemorragia  de  linfonodos  superficiais  e  no  tecido  subcutâneo  cervical. A  icterícia  é
discreta  ou  não  costuma  ser  evidente.  A  cavidade  abdominal  pode  conter  líquido,  que  varia  de
transparente a vermelho­brilhante. Hemorragias petequiais e equimóticas estão presentes em todas as
superfícies serosas. O fígado está aumentado, com aspecto escuro e manchado, em geral apresentando
exsudato  fibrinoso proeminente na  superfície  e nas  fissuras  interlobares  (Figura 4.3). Tipicamente,  a
vesícula  biliar  está  espessada  e  edematosa,  com  aspecto  opaco  azul­esbranquiçado. A  fibrina  pode
depositar­se em outras superfícies serosas abdominais, o que lhes dá um aspecto de vidro. Hemorragia
gastrintestinal  intraluminal  é  um  achado  frequente.  O  baço  está  aumentado  e  fica  protuberante  na
superfície de corte.
As lesões macroscópicas variáveis em outros órgãos incluem infartos corticais renais hemorrágicos
multifocais. Os pulmões têm múltiplas áreas de manchas de consolidação cinzentas a vermelhas. São
encontrados  linfonodos  brônquicos  hemorrágicos  e  edematosos.  Áreas  hemorrágicas  dispersas,
presentes ao corte coronal do cérebro, estão localizadas primordialmente no mesencéfalo e no tronco
cerebral  caudal. As  lesões  oculares,  quando  presentes,  caracterizam­se  por  opacificação  da  córnea  e
embaçamento do humor aquoso.
É possível os cães que sobrevivem à fase aguda da doença apresentarem lesões, as quais podem ser
encontradas durante a necropsia. O fígado daqueles com fibrose hepática crônica pode estar pequeno,
firme e nodular. Os rins de muitos cães que se recuperam apresentam múltiplos focos brancos (com 0,5
cm  de  diâmetro),  estendendo­se  da  pelve  renal  até  o  córtex  mais  externo. As  sequelas  oculares  da
doença aguda podem incluir glaucoma ou ftise bulbar.
As  alterações  histopatológicas  no  fígado  de  cães  que morrem  de  hepatite  aguda  incluem  necrose
disseminada  centro  ou  panlobular.  Em  cães  com  necrose  hepatocelular  discreta,  a margem  entre  os
hepatócitos  necróticos  e  os  viáveis  é muito  bem  definida  dentro  do  lóbulo  hepático  (Figura 4.4). A
preservação de estroma de sustentação subjacente possibilita a eventual regeneração hepática. Apenas
nos  casos  graves  a  necrose  de  coagulação  de  lóbulos  hepáticos  inteiros  impede  a  regeneração  do
fígado.  Infiltrados  neutrofílicos  e  de  células  mononucleares  estão  associados  à  remoção  do  tecido
necrótico  subjacente.  O  pigmento  biliar  raramente  se  acumula  na  maioria  dos  casos,  por  causa  da
natureza  transitória  da  necrose  hepatocelular  e  da  ausência  frequente  de  acometimento  lobular
periférico de radículas portais. As inclusões intranucleares inicialmente são encontradas nas células de
Kupffer e depois em células parenquimatosas hepáticas viáveis. Doença hepática subaguda a crônica é
assinalada  por  focos  esporádicos  de  necrose  com  infiltração  neutrofílica, mononuclear  e  plasmática,
sendo encontrada em cães com imunidade parcial que sobrevivem aos estágios iniciais da infecção.
Figura  4.3  Fígado  tumefato  e  manchado  com  edema  nas  bordas  e  na  vesícula  biliar,  característico  de  HIC.
(Fotografia de Craig Greene © 2004 University of Georgia Research Foundation Inc.)
Figura  4.4  Aspecto  histológico  de  necrose  centrolobular  maciça  em  um  caso  fatal  de  HIC  mostra  poucos
hepatócitos  viáveis  remanescentes  (H)  em  torno  de  uma  veia  porta  (P)  na  área  lobular  periférica  (coloração  com
H&E, 250×). (Fotografia de Craig Greene © 2004 University of Georgia Research Foundation Inc.)
Em termos históricos, o CAV­1 foi observado com anticorpo fluorescente direto em hepatócitos de
cães recuperados com inflamação hepática crônica. A PCR e a coloração histoquímica de tecidos foram
usadas para examinar o CAV­1 no fígado de cães com HIC de ocorrência natural, hepatite crônica ativa
e fibrose hepática.8 Embora nos casos de HIC os resultados dos testes sejam positivos, o DNA ou os
antígenos virais não foram detectados nas amostras dos outros animais. Em outros estudos, não foram
identificados  agentes  infecciosos,  incluindo  o  CAV­1,  na  triagem  por  PCR  do  fígado  de  cães  com
achados de inflamação hepática agudaou crônica à necropsia.4
Ocorrem alterações histológicas disseminadas em outros órgãos como resultado da lesão endotelial
causada  pelo  vírus.  A  vesícula  biliar  tem  edema  subseroso  acentuado,  mas  o  epitélio  permanece
intacto.  Inclusões  virais  inicialmente  são  encontradas  nos  glomérulos  renais,  porém  mais  tarde  no
endotélio vascular tubular renal. Acúmulos intersticiais focais de neutrófilos e células mononucleares
são encontrados no córtex e na medula renais. Geralmente, essas alterações discretas progridem para
fibrose  intersticial  focal.  Órgãos  linfoides,  inclusive  linfonodos,  as  tonsilas  e  o  baço,  estão
congestionados  com  infiltrados  de  neutrófilos  e  células mononucleares.  Os  folículos  linfoides  estão
dispersos, com áreas centrais de focos necróticos. Inclusões intranucleares podem ser encontradas nas
células  endoteliais  vasculares  e  em  histiócitos.  Os  pulmões  têm  alvéolos  espessados,  com  acúmulo
peribrônquico de células septais e linfoides. Os alvéolos nas áreas consolidadas estão preenchidos com
exsudato constituído por eritrócitos, fibrina e líquido. Edema de mucosa e submucosa com hemorragia
subserosa  focal  é  encontrado  no  trato  intestinal.  Degeneração  vascular  disseminada  e  hemorragia  e
necrose teciduais estão associadas à existência de trombos intravasculares de fibrina.
Células  epiteliais  tumefatas  e descamativas nos vasos meníngeos  contêm  inclusões  intranucleares.
Acúmulo mononuclear está presente em torno de pequenos vasos por  todo o parênquima do SNC. A
proliferação endotelial  discreta  e  a  infiltração perivascular mononuclear persistem por pelo menos 3
semanas após a recuperação clínica.
As alterações oculares caracterizam­se por  iridociclite granulomatosa com ruptura do endotélio da
córnea e edema de córnea. Os vasos da íris e ciliares estão congestionados, com células inflamatórias
também presentes na íris e no ângulo de filtração.
Os corpúsculos  de  inclusão  vistos  na  HIC  foram  classificados  como  Cowdry  do  tipo A  e  estão
presentes em tecidos tanto ectodérmicos quanto mesodérmicos e são abundantes no fígado, o que torna
este órgão o melhor  tecido para esfregaços por  impressão obtidos por biopsia ou à necropsia (Figura
4.5). A hipertrofia inicial do núcleo celular é seguida por marginação periférica da rede de cromatina e
do nucléolo, que forma um remanescente nuclear central corado em escuro e circundado por um halo
de cromatina. As inclusões iniciais são acidófilas, mas tornam­se basofílicas à medida que a cromatina
vai para a margem. É preciso cuidado para distinguir entre inclusões e nucléolos de hepatócitos que se
coram em cor clara.
Tratamento
O  tratamento  clínico  de  cães  que  desenvolvem  HIC  é  primariamente  sintomático  e  de  suporte. A
insuficiência hepática  fulminante decorrente da necrose hepatocelular  é uma causa  comum de morte
em cães que não sobrevivem aos estágios agudos da doença. Na ausência de fatores complicadores, a
recuperação  clínica  e  a  regeneração  hepatocelular  podem  ocorrer  com  necrose  centrolobular.  O
tratamento é de suporte até que haja tempo suficiente para o reparo hepatocelular. Como em geral os
cães  estão  semicomatosos,  é  impossível  prever  se  os  sinais  neurológicos  estão  relacionados  com  a
hepatoencefalopatia  ou  a  encefalite  viral.  Contudo,  essa  questão  pode  ser  parcialmente  resolvida
verificando­se a glicemia ou as concentrações de amônia ao se instituir o tratamento.
A  colocação  imediata  de  um  cateter  intravenoso  permanente  é  uma  necessidade  em  cães  com
acometimento grave; entretanto, como não há capacidade de coagulação, é preciso cuidado para evitar
hemorragia excessiva. O tratamento hídrico com um líquido isotônico poli­iônico como a solução de
Ringer corrigirá perdas decorrentes dos vômitos e da diarreia e ajudará a baixar a temperatura corporal.
Animais  muito  deprimidos  ficam  muito  abatidos  para  beber  água,  e  os  que  continuam  a  vomitar
precisam receber reposição de manutenção diária com líquidos (45 mℓ/kg) por via parenteral.
O  tratamento  da  CID  depende  do  estágio  do  déficit  de  coagulação.  A  remoção  do  estímulo
desencadeador é o objetivo inicial do tratamento, mas isso não é possível nas doenças virais. Graças à
síntese hepática insuficiente, poderá ser necessário repor os fatores da coagulação e plaquetas por meio
da  transfusão  de  plasma  fresco  ou  sangue  total,  em  conjunto  com  a  terapia  anticoagulante  quando
houver incapacidade acentuada da coagulação.
Figura 4.5 Aspecto citológico de inclusões intranucleares em hepatócitos (setas) de um esfregaço por impressão de
tecido  hepático  à  necropsia  (coloração  de  Wright,  400×)  de  um  filhote  canino  que  morreu  em  virtude  de  HIC.
Comparar  com o nucléolo  (N)  do  hepatócito.  (Fotografia  de Craig Greene © 2004 University  of Georgia Research
Foundation Inc.)
Devido  à  possibilidade  de  que  a  hipoglicemia  seja  responsável  pelo  estado  de  coma,  deve­se
administrar  um bolo  intravenoso  (IV) de glicose  a  50%  (0,5 mℓ /kg)  durante  o  período de 5 min. É
provável que volte a ocorrer hipoglicemia se a infusão contínua de glicose hipertônica não for mantida.
A infusão de glicose hipertônica deve prosseguir a velocidade não maior do que 0,5 a 0,9 g/kg/h para
que  seja  utilizada  de  maneira  eficiente.  O  tratamento  para  diminuir  a  concentração  sanguínea  de
amônia é voltado para a redução do catabolismo proteico pelas bactérias do cólon e para a reabsorção
de amônia nos  túbulos renais. A produção de amônia a partir da degradação da proteína no intestino
pode ser reduzida pela diminuição da quantidade de proteína  ingerida e pela cessação da hemorragia
gastrintestinal. O cólon pode ser evacuado por limpeza e mediante o uso de enemas acidificantes que
aliviam  a  estase  intestinal  e  retardam  a  absorção  da  amônia. Antibacterianos  orais  não  absorvíveis
como a neomicina  têm sido defendidos para  reduzir a quantidade de bactérias produtoras de amônia
nos  intestinos,  mas  sua  eficácia  é  questionável.  Também  é  possível  acidificar  o  conteúdo  colônico
fornecendo­se lactulose oral para os animais que não estejam vomitando. A reabsorção oral da amônia
pode  ser  reduzida  com  a  administração  parenteral  ou  oral  de  potássio  e  a  correção  da  acidose
metabólica. A acidificação urinária com um acidificante atóxico como o ácido ascórbico pode reduzir
bastante a reabsorção da amônia pelos rins.
O  ácido poli­inosínico­policitidílico,  um  indutor  de  interferona,  foi  usado  experimentalmente para
reduzir a mortalidade de cães com infecção experimental pelo vírus da HIC, mas sua aplicação clínica
é impraticável (ver Indutores de interferonas e outras citocinas, no Capítulo 2).
Prevenção
Imunidade materna
A duração da imunidade passiva adquirida em filhotes caninos depende da concentração de anticorpos
na cadela. A meia­vida dos anticorpos contra o CAV­1 é de 8,6 dias, em comparação com 8,4 dias dos
anticorpos contra o vírus da cinomose, valores que se correlacionam bem com a meia­vida da globulina
canina (ver Imunidade materna e imunização, no Capítulo 100). Em geral, a imunização contra a HIC é
bem­sucedida quando os títulos de anticorpos maternos diminuem abaixo de 100, o que pode ocorrer a
partir  de 5  a 7  semanas de  idade. O nível  de  anticorpos maternos  contra  a HIC em  filhotes  caninos
recém­nascidos cai para níveis negligenciáveis por volta de 14 a 16 semanas de idade.
Vacinação
A hepatite canina causada pelo CAV­1 foi controlada de maneira eficaz e praticamente eliminada da
população canina doméstica em razão da vacinação. Ainda são observados casos esporádicos em cães
que não foram vacinados da maneira adequada quando filhotes. Uma vez que a doença em cães não
vacinados é grave, o vírus é resistente no ambiente e tem um reservatório em carnívoros silvestres, é
preciso continuar com a vacinação para fornecer o antígeno principala todos os cães.
As  vacinas  com  CAV­1  e  CAV­2  inativados  não  são  mais  comercializadas,  pois  sua  eficácia  foi
inferior à dos produtos com VVM e os adjuvantes necessários as  tornaram alergênicas. A fabricação
das  vacinas  com  o  VVM  CAV­1  também  foi  interrompida  na  maioria  dos  países,  de  modo  que  o
antígeno  do  CAV­2  como  VVM  está  presente  em  praticamente  todas  as  vacinas  comercializadas.
Embora as vacinas com o CAV­1 como VVM proporcionem proteção imune sólida,  as  complicações
após a vacinação constituem uma preocupação. Uma desvantagem potencial é que o CAV­1 atenuado
se  localizou  nos  rins  e  causou  nefrite  intersticial  subclínica  leve  e  eliminação  persistente  do  vírus
vacinal. Foi necessário aumentar a passagem do vírus em cultura de células para reduzir a prevalência
da  eliminação  urinária.  A  localização  ocular  com  uveíte  anterior  associada  ocorreu  em
aproximadamente 0,4% dos cães após injeção subcutânea. Quando administrada por via intravenosa, a
vacina contra o CAV­1 ocasionou uma doença sistêmica transitória caracterizada por pirexia e aumento
tonsilar e a prevalência de 20% de uveíte anterior.
As vacinas parenterais contra o CAV­2 foram desenvolvidas como uma alternativa na prevenção da
HIC. A  vacina  com o CAV­2  vivo modificado  raramente,  quando  acontece,  causa  doença  ocular  ou
renal  quando  administrada  pelas  via  intramuscular,  subcutânea  ou  intranasal,  embora  o  vírus  possa
localizar­se no trato respiratório superior e daí ser eliminado. Quando injetado diretamente na câmara
anterior, o vírus da vacina causa lesões oculares semelhantes às causadas pelas cepas do CAV­1. Ao ser
administrada pelas vias intravenosa ou intranasal, a vacina contra o CAV­2 com o VVM pode ocasionar
uma doença respiratória leve, com tosse associada a aumento tonsilar, embora tenha­se mostrado que
tal infecção é subclínica e autolimitante. No entanto, como precaução geral, deve­se ter cuidado para
evitar a aerossolização inadvertida da vacina parenteral durante o uso.
Os  cães  ficam bem protegidos  contra  a  infecção  pelo CAV­1 pelo  título  de  anticorpo  heterotípico
produzido quando se usa a vacina contra o CAV­2, mas a resposta do anticorpo homotípico em geral é
maior. A  vacina  contra  o  CAV­2  foi  administrada  experimentalmente  a  filhotes  caninos  com  3  a  4
semanas  de  idade,  como  tentativa  de  superar  os  anticorpos maternos  heterotípicos  contra  o  vírus  da
HIC. Embora  a  vacinação  parenteral  nessa  idade  seja  ineficaz,  a  administração  intranasal  da  vacina
resultou em resposta de anticorpo tardia ao CAV­2 e resposta fraca ao CAV­1 4 a 8 semanas depois. É
provável  que  o VVM da  vacina  contra  o CAV­2  se  localize  no  trato  respiratório  até  que  o  nível  de
anticorpos  maternos  caia,  e  então  se  dissemine  sistemicamente,  estimulando  uma  resposta  imune.
Algumas  cepas  do  CAV­1  e  do  CAV­2  são  conhecidas  como  oncogênicas  em  hamsters,  mas  as
existentes  nas  vacinas  comerciais  não  parecem  ocasionar  tal  efeito  colateral.  Não  foram  relatadas
reações  oncogênicas  em  cães  durante  mais  de  20  anos  de  uso  de  campo  desses  produtos.  Foi
desenvolvida uma vacina de DNA experimental contra o CAV­1, e os estudos preliminares indicaram
proteção  de  camundongos  vacinados  como  desafio,  em  comparação  com  camundongos  não
vacinados.27
As  vacinas  parenterais  contra  o  CAV­2  com VVM  tornaram­se  a  pedra  fundamental  da  proteção
contra a infecção pelo CAV­1 virulento. O baixo índice de complicações após a vacinação e a proteção
heteróloga adequada constituem vantagens significativas. As vacinas parenterais contra o CAV­2 são
aplicadas quando se pretende obter proteção contra a HIC, dispondo­se de preparações intranasais para
proteção  contra  a  infecção  respiratória  (ver  também  Capítulo  6,  Doença  Respiratória  Infecciosa
Canina).
O  esquema  recomendado  para  qualquer  vacina  como  proteção  contra  a HIC  envolve  pelo menos
duas doses, administradas a intervalos de 3 a 4 semanas, a animais com 8 a 10 e 12 a 14 semanas de
idade. É mais comum conseguir isso com a combinação desse antígeno com o protocolo de vacinação
contra o vírus da cinomose e o parvovírus (ver Capítulo 100, Imunoprofilaxia).  Pode­se  aconselhar  a
vacinação  mais  cedo  e  mais  frequente  em  áreas  de  alta  prevalência.  Quando  as  vacinações  forem
adiadas  em  filhotes  caninos,  será  observada  infecção  esporádica  por  HIC.  Nunca  são  relatadas
infecções  em  animais  adultos  que  tenham  recebido  uma  série  adequada  da  vacina.  Para  reforços,  as
vacinas com VVM podem ser aplicadas a cada 3 anos, conforme indicado por estudos de desafio.1,13 A
vacinação  anual,  conforme  praticada  no  passado,  não  é  necessária  por  causa  da  longa  duração  da
imunidade proporcionada pelas vacinas com VVM (ver Duração da imunidade e estudos de desafio,
no Capítulo 100).
Uma hepatite distinta da HIC e que se caracteriza por formas aguda, persistente ou crônica foi descrita
na Grã­Bretanha.31 A evidência que leva a crer que essa síndrome tenha natureza infecciosa vem da alta
prevalência do carcinoma hepatocelular em cães. O agente, o qual se suspeita que seja um vírus, não
foi identificado, embora a doença possa ser reproduzida por inoculação bacteriologicamente estéril de
homogeneizados  hepáticos  que  não  contenham  CAV­1  nem  CAV­2  de  animais  acometidos
espontaneamente  em  cães  de  experimentação.  Presume­se  que  as  infecções  agudas  com  esse  agente
acarretem hepatite aguda a crônica, cirrose com hiperplasia multilobular e, em alguns casos, carcinoma
hepatocelular.22
Os achados clínicos na fase inicial da doença podem ser vagos e incluem febre variável, inapetência,
vômitos e dor abdominal, mas em geral não há febre. Os achados clínicos terminais incluem distensão
abdominal com ascite, episódios de convulsões, anormalidades do estado mental e semicoma.
As únicas anormalidades laboratoriais consistentes incluem aumento episódico da atividade da ALT
e da fosfatase alcalina. O diagnóstico envolve o exame macro e microscópico do tecido hepático. Os
achados macroscópicos de biopsia ou necropsia incluem hepatomegalia com arredondamento dos lobos
hepáticos  e  aumento  das  tonsilas,  dos  linfonodos  regionais  e  das  placas  de  Peyer.  Os  cães  com
acometimento  crônico  podem  ter  o  fígado  reduzido  de  tamanho,  com  delineação  exagerada  das
radículas  portais  ou  proliferação  nodular.  O  aumento  do  tecido  hepático  é  evidente  ao  exame
histológico, tanto na região central quanto na periférica. As células acidófilas estão dispersas por todas
as lesões hepáticas e se caracterizam por citoplasma angular e acidófilo com núcleo hipercromático.
O tratamento dessa condição é incerto e parece progredir com o tempo. A prevenção não pareceria
plausível até que a natureza do agente infeccioso suspeito fosse determinada. Embora relatada apenas
na Grã­Bretanha, pode ser que a doença esteja mais disseminada. Deve­se suspeitar dela ante relatos de
alta frequência de hepatite crônica ativa ou fibrosa e carcinoma hepatocelular.

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