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Neuropatia diabética ➢ Conceitos: A neuropatia diabética periférica (NDP) é uma complicação microvascular do marcada por presença de sintomas e/ou sinais de disfunção dos nervos periféricos em indivíduos com diabetes mellitus (DM), após a exclusão de outras causas. ➢ Epidemio: O comprometimento do sistema nervoso periférico afetando até 50% dos pacientes DM do tipo 2 e pacientes DM tipo 1 em menor proporção. Os fatores de risco conhecidos são idade avançada, duração do DM, suscetibilidade genética, glico/lipotoxicidade, inflamação e estresse oxidativo. ➢ Fisiopatologia: É considerada uma complicação multifatorial que envolve, além dos danos metabólicos resultantes da glicotoxicidade, o estresse oxidativo, os processos de glicosilação não enzimática tardia e as alterações em fluxo vascular perineural, dentre outras, de ordens inflamatórias e autoimunes. O excesso intracelular de glicose resulta do fluxo aumentado da via poliol com aumento de sorbitol e frutose decorrente da maior atividade das enzimas aldose redutase (AR), sorbitol desidrogenase e aumento do estresse oxidativo. A glicólise excessiva sobrecarrega a cadeia de transporte mitocondrial de elétrons e gera espécies reativas de oxigênio (ROS, reactive oxigen species). Há aumento da osmolalidade celular, que reduz NADPH e aumenta também o estresse oxidativo. O fluxo aumentado da via hexosamina associa- se a lesão inflamatória, e o excesso de ROS induz alterações intracelulares no retículo endoplasmático e no DNA, provocando alterações funcionais da célula nervosa. As ROS elaboram o óxido nítrico (NO), um potente vasodilatador, que antagoniza trombose, tem propriedades anti-inflamatórias e pode inibir o crescimento de células do músculo liso vascular. O NO também inibe a produção do peptídeo vasoconstritor, a endotelina-1 (ET-1). A disponibilidade de NO está reduzida, uma vez que o superóxido se liga ao NO para formar o oxidante peroxinitrito, diretamente tóxico para as células endoteliais. A membrana basal das células endoteliais, glicosilada, contribui para uma vasodilatação prejudicada ao lado do controle insuficiente pelo NO e resposta defeituosa aos efeitos vasodilatadores da substância P, do peptídeo relacionado com o gene da calcitonina (CGRP), da bradicinina, da histamina e do polipeptídeo intestinal vasoativo (VIP). Os produtos finais de glicação avançada (AGE) aumentam, e os AGE, ligados ao receptor extracelular (RAGE), iniciam umacascata inflamatória por meio das NADPH oxidases e da ativação de macrófagos, com produção de citocinas inflamatórias (interleucina-1, fator de necrose tumoral-alfa), fatores de crescimento (semelhante à insulina, derivado de plaquetas e do nervo), moléculas de adesão intracelular (ICAM, intracelular adhesion molecules) e fatores vasculares, danificando a função biológica das proteínas.18,24,25 Os AGE interagem também com receptores tipo Toll (TLR, Toll-like receptors) e com RAGE, ativando o fator de transcrição NFκ-B e, ainda, citocinas pró-inflamatórias.26,27 Um elevado conteúdo intracelular de glicose também estimula a formação de diacilglicerol (DAG), ativando a proteinoquinase C (PKC). Além disso, principalmente no DM2, os ácidos graxos livres (AGL) podem causar dano direto às células de Schwann e promovem liberação de citocinas inflamatórias pelos adipócitos e macrófagos. A síndrome metabólica (SM) também induz inflamação pelas adipocinas, ➢ Classificação: A NDP possui diversas formar de apresentação e, logo, de classificação. A classificação clássica está no quadro ao lado, que classifica em (1) Neuropatias focais e multifocais e (2) Polineuropatias simétricas generalizadas. As formas mais comuns são as polineuropatias simétricas generalizadas, que incluem a sensoriomotora crônica (PNSD), seguindo-se as autonômicas (PNAD) e mais raramente a sensorial aguda (PNSAD), enquanto as formas focais e multifocais são as menos frequentes. A PNSD, também denominada polineuropatia simétrica distal, é referida na literatura como polineuropatia diabética periférica crônica (PND), por constituir a modalidade predominante na prática clínica. Porém, recentemente, o painel de Toronto determinou incluir os subtipos (1) PND típica (mais prevalente, de evolução crônica e relacionada a longa exposição hiperglicêmica e fatores metabólicos e cardiovasculares. É simétrica, distal e sensorimotora) e (2) PND atípica (surge em qualquer fase do DM, com evolução monofásica ou flutuante, dor neuropática aguda ou subaguda e alterações autoimunes), como mostra o esquema ao lado. 1. Neuropatias focais e multifocais: a) Cranianas = acometem pares cranianos. A ordem de comprometimento é: III (oculomotor), IV (troclear), VI (abducente) e VII (facial) pares. A instalação é aguda, dolorosa e limitada, com recuperação média em 3 meses. O acometimento do 3º par cursa com um padrão característico no diabético: ptose, oftalmoparesia, sem alteração pupilar. b) Mononeuropatias dos membros e neuropatias compressivas = resultam de traumatismos, têm caráter progressivo e requerem abordagem diversificada, inclusive cirúrgica. Os nervos mediano, ulnar e radial, menos frequentemente, são envolvidos no segmento superior. Os nervos perineal comum, femoral lateral cutâneo e, mais raramente, sural e isquiático são acometidos no segmento inferior. Pode haver ainda a mononeuropatia múltipla, quando há comprometimento sintomático assimétrico de mais de um nervo periférico. c) Radiculopatias = também chamada de amiotrofia diabética ou neuropatia proximal assimétrica. O acometimento mais comum é o das raízes lombares L2, L3 e L4 , manifestando-se como dor na região dorsal da coxa que evolui insidiosamente para fraqueza muscular proximal amiotrófica, que pode acometer em seguida o membro contralateral. A doença atinge um platô em uma média de seis meses, apresentando melhora espontânea. d) Polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica (PNDIC) = associada a deficits motores progressivos (simétricos ou não), neuropatia sensitiva progressiva (a despeito de um controle glicêmico adequado) e de um aumento importante de proteínas no liquor. Deve-se descartar síndrome de Guillain-Barré. 2. Polineuropatias generalizadas simétricas: MAIS ENCONTRADAS! a) Polineuropatia Simétrica Distal (PNSD ou PND ou Polineuropatia Diabética Sintomática/Dolorosa) = forma mais comum, é provocada por lesão das fibras axonais grossas mielinizadas ou fibras A (que conduzem a sensibilidade vibratória e proprioceptiva) e de fibras finas não mielinizadas ou fibras C (que conduzem a sensibilidade térmica, dolorosa e tátil), iniciando-se distalmente e, logo, acometendo primeiro os nervos periféricos dos membros inferiores. Pode já se apresentar na abertura do quadro de DM2, mas a ausência de sintomas não afasta a coexistência de neuropatia diabética, requerendo-se um exame clínico. Só 25-30% são sintomáticos. Alguns sinais são: hipoestesia plantar ou em pododáctilos para diversos tipos de sensibilidade (vibração, tato, picada de agulha, frio), a perda do reflexo do Aquileu, positividade no exame do monofilamento, propensão a úlceras plantares indolores, que podem infectar, acarretando gangrena úmida (pé diabético). Os sintomas podem ser brandos ou limitantes: parestesias (dormência, formigamento); disestesias; dor neuropática ou hiperpatia (dor ao toque), sendo a dor geralmente de caráter em queimação, com piora noturna (impedindo o paciente de dormir) e melhora com a deambulação; alodínea (intolerância a estímulos simples, como contato com roupas, lençóis etc); hiperalgesia, que consiste em resposta intensa a estímulos de mínima intensidade dolorosa. Em fases mais avançadas, os sintomas podem progredir até a panturrilha (“em bota”) e posteriormente para as mãos, evoluindo para a distribuição “em luva”. As fibras motoras são menos afetadas no início do quadro, mas, com o avançar da doença, a disfunçãoé comum, podendo cursar com deformidades (ex.: dedos em martelo, dedos em garra etc.), atrofia dos músculos interósseos e limitação da extensibilidade articular das mãos, originando o “sinal do rezador” (incapacidade de pôr as palmas das mãos uma contra a outra, devido à flexão parcial dos dedos). A resolução espontânea ocorre em 40-50%dos casos após um ano. b) Polineuropatia Sensitiva Aguda = início agudo ou subagudo, com quadro marcado por dor importante, tipicamente com exacerbação noturna e durante o repouso, podendo ser uma dor lancinante, em queimação, hiperalgesia, choques, agulhadas e alodínea de contato bastante intensa, principalmente nas pernas e pés. Ocorre independente de outras complicações, não se apresenta geralmente com sinais neurológicos e tende a melhorar com o controle metabólico adequado. c) Neuropatia Autonômica = Subdivide-se nos seguintes componentes: (1) cardiovascular; (2) periférico; (3) gastrointesti nal e (4) geniturinário. Os sintomas mais comuns são: disfunção sexual (que pode ter um componente macrovascular associado), tontura postural (às vezes incapacitante), náuseas, vômitos e plenitude pós-prandial (sintomas da gastroparesia diabética), sudorese profusa da face e tronco superior, constipação, diarreia diabética (sintomas noturnos), sudorese gustatória (sudorese intensa na porção superior do corpo após ingestão de certos alimentos) e alterações na acomodação pupilar. Os pacientes assintomáticos ou oligossintomáticos podem ser detectados por exames simples à beira do leito, tais como a pressão arterial supina e após dois minutos em ortorstatismo (positivo, se houver hipotensão postural: queda > 20 mmHg da PA sistólica ou queda > 10 mmHg na PA diastólica) e o eletrocardiograma durante uma inspiração profunda comparado ao da expiração. Outros achados no exame físico podem ser: frequência cardíaca fixa, entre 80-120 bpm, anidrose na porção inferior do corpo, hiperidrose na porção superior do corpo. A Disautonomia cardiovascular decorre alterações estruturais no neurônio autonômico periférico. A Disautonomia periférica decorre de desnervação simpática dos membros, tendo sintomas como hiperidrose, alteração de temperatura e edema. A Disautonomia geniturinária pode gerar bexiga neurogênica, disfunção erétil, ejaculação retrógrada e dispareumia. Finalmente, a Disautonomia gastrointestinal pode estar associada a sintomas dispépticos, náuseas e vômitos (gastroparesia diabética), diarreia (enteropatia diabética) ou constipação de início recente, excluindo-se outras causas. Na gastroparesia, o diagnóstico pode ser confirmado por cintigrafia de esvaziamento gástrico ou pela radiografia contrastada do abdome demonstrando retenção alimentar gástrica após período de jejum de 8-12h, na ausência de obstrução. ➢ Diagnóstico: Clínico! Podem ser utilizados alguns testes semiológicos, como ao lado. ➢ Tratamento: a) Polineuropatia Simétrica Distal: ▪ Cuidado com o pé (sapatos com solado macio, evitar deambular descalço, autoinspeção diária dos pés, inspeção no consultório médico); ▪ Terapia medicamentosa para dor neuropática ou disestesia com antidepressivos tricíclicos (primeira linha, ex: Amitriptilina, dose inicial de 25-50 mg VO à noite, com aumento progressivo até 150-200 caso não haja resposta), anticonvulsivantes (gabapentina 900 a 3.600 mg/dia ou pregabalina 300 a 600 mg/dia), ISRSN (duloxetina 60 a 120 mg/dia), ácido alfalipoico (ácido tióctico 600 mg/dia), creme de capsaicina a 0,075%, opioides (tramadol, oxicodona, metadona). b) Polineuropatia Sensitiva Aguda: c) Neuropatia Autonômica: ▪ Disautonomia cardiovascular: a hipotensão postural deve ser tratada com medidas gerais (levantar-se devagar, elevar a cabeceira da cama, cruzar as pernas ao levantar, aumentar a ingestão de sal, suspender ou substituir drogas relacionadas) ou com o uso do mineralocorticoide fludrocortisona, contraindicado na hipertensão arterial. Betabloqueadores cardiosseletivos, como o atenolol, são utilizados com boa resposta nas taquicardias decorrentes da disautonomia. ▪ Disautonomia periférica: tto do edema com elevação das pernas e/ou meia elástica. ▪ Disautonomia geniturinária: uso de colinérgicos (betanecol 10 mg quatro vezes ao dia) e alfabloqueadores (doxazosina 1 a 2 mg duas a três vezes ao dia) podem ser úteis para melhorar os sintomas. No caso de disfunção erétil, o pcte deve ser investigado para hipogonadismo (dosagem hormonal), causa vascular (Doppler peniano), uso de medicamentos (diuréticos, betabloqueadores, metildopa etc.) e causas locais (ex.: doença de Peyronie). As drogas mais eficientes no tratamento da disfunção erétil são os inibidores da fosfodiesterase tipo 5: silfenafil, tadalafil e vardenafil. ▪ Disautonomia gastrointestinal: Os sintomas da gastroparesia devem ser controlados com metoclopramida 30 minutos antes das refeições, domperidona, bromoprida ou cisaprida.
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