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Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 Imunologia – Caso 03 Síndrome Mono-Like ou Mononucleose A mononucleose infecciosa é uma das causas da síndrome de mononucleose provocada pelo vírus Epstein-Barr (EBV), o Toxoplasma gondii, o vírus da imunodeficiência humana (HIV) e o herpes vírus humano. A MI é uma doença febril aguda, transmissível, que acomete principalmente indivíduos entre 15 e 25 anos. Tem baixa letalidade, manifestações geralmente benignas e extenso polimorfismo clínico. O período de incubação é de quatro a seis semanas. As alterações laboratoriais incluem leucocitose, reações leucemoides (se diferencia da leucemia através da enzima fosfatase alcalina leucocitária, na leucemia ela está elevada enquanto na mononucleose essa enzima está normal), trombocitopenia (redução das plaquetas no sangue), e anemia hemolítica autoimune (destruição das hemácias sem dar tempo para a medula óssea repor), além de aminotransferases (TGO e TGP) elevadas (relacionadas com lesão hepática) e bilirrubina aumentada (associação com lesões hepáticas, obstrução biliar, alta velocidade da morte de hemácias e problemas renais) destacando-se a linfocitose atípica que é habitualmente observada. * Diagnóstico com base nos sintomas, achado de linfócitos atípicos (indicação precoce de infecção por EBV) e presença de linfocitose, anticorpos heterófilos (indicação de infecção por EBV em adultos) e anticorpos contra antígenos virais. Obs: anticorpos heterófilos não são anticorpos específicos do EBV, são anticorpos produzidos previamente devido a outras infecções virais, mas que conseguem interagir com o EBV por conta da similaridade dos antígenos de superfície. Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 Epstein-Barr (EBV) O vírus EBV não é eliminado do organismo, ele se mantém latente, apesar da resolução clínica da doença. Existem dois sorotipos de vírus, o EBV-1 e o EBV-2 e eles se diferenciam apenas em alguns alelos. Tais distinções causam expressivas diferenças no crescimento do linfócito. O EBV-1 é o mais comum e de distribuição mundial, já o EBV-2 é mais encontrado da África Equatorial, principalmente nas áreas endêmicas de malária, de linfoma de Burkitt na Nova Guiné e em indivíduos infectados pelo HIV. Estrutura Viral Composto (de fora para dentro) por proteinas de envelope, envelope, tegumento e nucleocapsídeo que abriga o genoma viral. As características anatômicas desse vírus estão associadas as suas características de latência, recorrência e cronicidade. EBV em crianças e adultos Nas crianças a suscetibilidade ao agente etiológico se estabelece tão logo haja redução dos níveis séricos das imunoglobulinas maternas transferidos passivamente, destacando-se que nessa etapa da vida a infecção primária é geralmente subclínica. A imunidade EBV nos infantes (< 5 anos) é adquirida, geralmente, sem o desenvolvimento das manifestações clínicas típicas da mononucleose infecciosa, acredita-se que isso se deve ao sistema imune ainda imaturo. Mas quando as crianças manifestam sintomas, é comum notar febre, faringite, linfadenomegalia, mal estar e esplenomegalia, sendo rara a ocorrência de complicações graves e formas atípicas. Existem teorias que pretendem explicar o motivo das manifestações ocorrerem com maior frequência em adolescentes e em adultos, ressaltando-se: 1 – A existência de maior carga viral na infecção relacionada à atividade sexual quando comparada à aquisição pelo contato exclusivamente pela saliva. A elevada carga viral poderia induzir elevadas respostas de linfócitos TCD8, os quais têm participação no desenvolvimento das manifestações clínicas, através da liberação de citocinas. Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 2 – A existência prévia de imunidade a infecções – ou à vacinação – por outros agentes virais (imunidade heteróloga), a qual poderia justificar os achados clínicos mais exuberantes em indivíduos com maior idade. Infecção A infecção do epitélio da orofaringe permite a replicação do vírus que passa a ser eliminado na saliva, o que explica a transmissão pelo contato com esse fluido biológico. Na infecção primária o EBV infecta e se multiplica nos linfócitos B, enquanto linfócitos T citotóxicos específicos são desenvolvidos e regulam a proliferação das células infectadas. Infecção primária: O vírus EBV interage com o epitélio e o infecta, nessas células ele se replica e sai causando a lise celular. Depois ele infecta, preferencialmente, as células B. Essas células B reconhecem o vírus, se ativam e produzem anticorpos protetores antivirais. Porém, uma boa parte dessas células, ao invés de se ativar para matar o patógeno, sofrem uma alteração induzida pelo vírus que resulta na ativação de um programa de crescimento e proliferação. Além disso, essas células se tornam imortais e, por isso, que se diz que essa infecção é persistente e não se consegue eliminar por completo o vírus. Nesse contexto, os linfócitos T atuam eliminando os linfócitos B infectados, porém que não foram imortalizados. As que sofreram esse processo e se tornaram imortais, os linfócitos T atuam induzindo a latência delas. Na fase de latência o quadro clínico desaparece e o indivíduo pode permanecer nela por muito tempo. Mas se algo deprimir o sistema imunológico, essas células saem do estado de latência e os vírus voltam a se replicar dentro dos linfócitos B. Inicia, então, novamente o ciclo lítico, os vírus saem das causando lise e vão infectar novas células, inclusive as do epitélio. Nesse momento o vírus estará presente na saliva do indivíduo. Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 A entrada do vírus no linfócito B ocorre devido à interação entre o completo glicoproteico viral (gp350/220) e o receptor CR2/CD21 do sistema C3d do linfócito. Outro complexo viral, o gp85/42 atua como um co-receptor de ligação a moléculas MHC de classe II do linfócito. Ocorre então, infecção dos linfócitos B nas criptas das tonsilas, destacando-se a importância da molécula CD21 na infecção de células B. Essas duas interações tornam possível a adesão e internalização dos vírus nos linfócitos B. O epitélio da orofaringe é o local de replicação primária, mas não se sabe ainda qual o mecanismo de infecção, uma vez que essas células epiteliais são expressam CD21 ou moléculas MHC de classe II. Imunidade humoral: ativação timo dependente O linfócito B, ou seja, a imunidade humoral, tem dois tipos de ativação que ocorre nos linfonodos: - Ativação timo independente: a célula B se ativa sozinha e não depende do timo para isso. - Ativação timo-dependente: precisa da célula T para se ativar. Ativação timo-independente: Na infecção por EBV temos essa via de ativação da resposta humoral. A CR2 é um receptor de complemento. BCR é um anticorpo de membrana que se comporta como receptor de célula B. A seta laranja aponta para o linfócito B. A seta verde aponta para uma estrutura similar a uma coroa que representa as proteínas opsonizantes que estão envolvendo o vírus. O BCR reconhece os antígenos virais e sinaliza para o núcleo do linfócito B para que ele se ative. Mas essa sinalização não basta para ativar, é necessária a ajuda da CD2/CD21. Esse CD21 reconhece a proteína BCR que está envolvendo o vírus, depois do reconhecimento ele sinaliza o núcleo para induzir a ativação. Esse CD21 vai funcionar como um segundo Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 sinal que amplifica a sinalização para o núcleo. Agora com essas duas sinalizações o linfócito B consegue se ativar.Esse linfócito B ativado só produz anticorpo da classe IgM e não produz memória imunológica, é uma resposta mais simples. Ativação timo-dependente Essa reposta será mais intensa e mais protetora, pois nessa além da sinalização do BCR, do CD21, teremos a co- estimulação do linfócito T. Nessa resposta temos a ativação de IgM, IgA e IgG e ativação de memória imunológica, por isso que ela é mais eficaz em comparação à timo-independente. O linfócito B reconhece o antígeno, endocita, processa. Logo após ele se comporta como uma célula apresentadora de antígeno, uma vez que ele apresenta esse antígeno ao linfócito T diferenciado (Th2). O objetivo é que esse linfócito T co-estimule o linfócito B para que ele se ative e produza anticorpos. O vírus é capaz de infectar tanto células B naives quanto células B de memória. E os linfócitos T citotóxicos serão capazes de induzir a latência nesses dois tipos e essas células ficarão inativas servindo de reservatório. O agente etiológico se propaga pela corrente sanguínea chegando a acometer 10% ou mais dos linfócitos circulantes. Resumindo: - O EBV pode se replicar em células B e células epiteliais permissíveis para sua replicação. - O EBV pode estimular crescimento e imortalizar as células B (impede apoptose). - O EBV pode causar infecção latente das células B na presença de células T. Nas células epiteliais e nas células B ocorre a transcrição e tradução da proteína ativadora de transcrição ZEBRA que ativa os genes precoces imediatos do vírus e o ciclo lítico. Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 EBV – Bases Patogênicas O vírus estabelece com diferentes células do indivíduo infectado dois tipos simultâneos de interação: Na primeira, referente a infecção a longo prazo e ao potencial oncogênico do vírus, há infecção lítica e espalhamento viral. Na segunda, há infecção lisogênica dos linfócitos B, com disseminação do DNA viral entre essas células, levando à persistência do DNA viral, estabelecendo assim o quadro de infecção latente. A proliferação das células infectadas (lembra que o vírus atua induzindo a proliferação celular?) resulta em aumento do tecido linfoide em diferentes regiões somáticas. O agente viral pode determinar a diferenciação de linfócitos B em plasmócitos e promover grande produção de anticorpos. Os títulos de imunoglobulina M (anticorpo de fase aguda) produzidos pelas células infectadas se elevam. Há, igualmente, proliferação linfoide generalizada não só pelo aparecimento viral, mas também pelo aparecimento de linfócitos TCD8 citotóxicos empenhados na destruição de linfócitos infectados. (Essa proliferação explica a leucocitose do paciente acometido pela MI) * Então o que explica o aumento das regiões linfoides do paciente é tanto a presença de células B imortais infectadas que estão proliferando, quanto a presença de células B protetoras produtoras de anticorpos, e devido à grande quantidade de linfócitos T citotóxicos. Os principais anticorpos encontrados são o IgM, que é o primeiro a ser produzido, IgG que é o mais numeroso no soro e o IgA que está relacionado à proteção de mucosas. Os anticorpos podem ser encontrados na circulação (imunidade humoral sistêmica) ou em mucosas (imunidade humoral local). A imunidade celular é mais importante que a resposta humoral no controle do processo infeccioso desencadeado pelo EBV. Na fase inicial da infecção, as células NK são importantes no controle da proliferação dos linfócitos B infectados por EBV, os macrófagos ajudam, porém a NK é mais importante por se tratar de vírus e devido a sua citotoxicidade. Em uma fase subsequente, ocorre a produção de células T citotóxicas que reconhecem os Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 antígenos nucleares do EBV e as proteínas latentes de membrana. Os níveis de marcadores de ativação de células T e de IFN- gama séricos mostram-se elevados. A principal característica patológica da MI é a notável resposta proliferativa no âmbito do sistema mononuclear fagocitário, especialmente nos linfonodos. O baço também é um órgão linfoide periférico e é marcado pela infiltração de sua estrutura fibromuscular por células mononucleares, de modo que tanto a cápsula quanto as trabéculas são invadidas pelos linfócitos em proliferação. O baço é considerado um filtro sanguíneo então ele será mais ativado quando tivermos antígenos no sangue. Ou seja, quando o vírus cai na corrente sanguínea, ele é atraído para ser filtrado no baço. * Isso pode explicar a ocorrência de esplenomegalia e ruptura esplênica na MI. Ao longo da infecção o indivíduo pode apresentar: 1 – Uma resposta celular satisfatória, que implica na resolução clínica. 2 – Uma resposta celular insatisfatória que possibilita a evolução para doença proliferativa. 3 – Não apresentar resposta e desenvolver MI fulminante ou síndrome hemofagocítica. Diagnóstico: O primeiro anticorpo a ser produzido é o IgM e logo depois o IgG, ainda na fase aguda da infecção. A IgM cai logo após a fase aguda justificando seu papel como marcador de fase aguda. A IgG permanece alta por toda a vida do indivíduo, mas através dele não é possível diferenciar uma infecção ativa da pregressa. IgM e IgG +: fase aguda IgM – e IgG +: fase tardia Dois antígenos virais também podem ser diretamente dosados: - Antígeno inicial: associado às formas mais graves, como o carcinoma nasofaríngeo e o linfoma de Burkitt, então a presença dele serve de sinalizador da forma grave da doença. - Antígeno nuclear: auxilia no diagnóstico agudo. Se ele estiver presente significa fase tardia, se a sua dosagem for negativo significa fase aguda. Observe que no gráfico ele inicia baixo e chega ao seu pico apenas no 6º mês de infecção. Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 Impacto do sistema imunitário em infecção pelo CMV O citomegalovírus assim como o EBV também gera uma resposta inata e adaptativa. Na inata teremos a participação de macrófagos, DC, NK, sistema complemento. Os macrófagos e as células dendríticas drenam o tecido e levam a ativação do linfócito T, teremos o TCD4 estimulando a fagocitose e o TCD8 matando por citotoxicidade. Os linfócitos B são ativados e são produzidos anticorpos específicos contra as glicoproteínas virais. Na maioria dos pacientes, assim como na EBV, a doença é autolimitada e evolui sem deixar sequelas. A clínica se constitui de sinais de infecção viral, como febre, mialgia, artralgia e cefaleia, acometendo o baço e gerando esplenomegalia. No entanto, sinais como linfadenopatia e a faringite se tornam incomuns no quadro de mononucleose por CMV. O aparecimento de rash após o uso de amoxicilina não é incomum. Nesse quadro os exames laboratoriais podem se assemelhar ao da mononucleose por EBV, porém a ausência de anticorpos heterófilos será fundamental para o diagnóstico. O diagnóstico de certeza necessita de um exame que confirme a presença do vírus ou detecte indiretamente sua presença. Nesse momento podemos utilizar a cultura celular, ensaios sorológicos e o PCR, método mais sensível utilizado por detectar o genoma viral. Toxoplasmose: Os exames laboratoriais se mostram totalmente inespecíficos, podendo apresentar uma discreta elevação dos marcadores hepáticos. A presença de linfócitos atípicos também se encontra presente. Pode haver elevação das transaminases. O diagnóstico de certeza é marcado pela sorologia e um título de IgM positivo. A presença de IgG isoladamente indica uma infecção pregressa. Logo, em caso de dúvida de uma infecção aguda, pode ser feito um teste de avidez paraIgG. O padrão-ouro pouco utilizado se dá pela visualização do toxoplasma em líquidos ou tecidos corporais. Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2 HIV Após 3 a 6 semanas de inoculação do vírus HIV, 50% a 70% dos pacientes apresentam um quadro clínico agudo conhecido como síndrome aguda do HIV. Essa síndrome nada mais é do que uma síndrome mononucleose-like mediada por uma soroconversão sintomática daqueles que adquiriram o vírus e ocorre juntamente com um surto de viremia plasmática. O quadro é típico de uma síndrome viral aguda com febre, faringite, linfadenopatia (70%), cefaleia, mal estar, podendo estar acompanhada de um rash maculopapular eritematoso. Foram observadas infecções oportunistas nesse período. Ocorrem aqui também diversos distúrbios do sistema imune com inicial redução de CD4+ e CD8+ com posterior inversão da razão entre ambas. A maioria dos pacientes se recupera do quadro com um período de latência do vírus, entretanto até 10% evoluem para uma forma fulminante e potencialmente fatal. Laboratório: leucopenia, trombocitopenia e elevação das transaminases. Pode haver linfocitose com linfócitos atípicos. O diagnóstico é feito através da soroconversão pelo teste Elisa ou pelo teste rápido. Se tratados com antirretroviral nessa fase alguns pacientes conseguem a negativação da soroconversão, porém a maior parte deles retoma com a viremia voltando a soroconverter. Nathália Machado – TUT 01 – 2020.2
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