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0013 MONO - Krauss, Thaissa Sant'Anna de Oliveira Análise da restauração de 1944 da igreja e rsidência de Reis Magos - Serra, Espírito Santo (1)


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VITORIA-ES, 201 5
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FACULDADE BRASILEIRA
THAISSA SANT'ANNA DE OLIVEIRA KRAUSS
CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
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VITÓRIA-ES, 2015
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FACULDADE BRASILEIRA
THAISSA SANT'ANNA DE OLIVEIRA KRAUSS
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CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
Análise da Restauração de 1944 da
Igreja e Residência de Reis Magos
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Serra, Espírito Santo
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Prometo de pesquisa apresentado na
disciplina Trabalho Final de Graduação ll,
da Faculdade Brasileira - Multivix Vitória.
ministrada pela Prof. Aline Miceli, como
requisito para avaliação da banca final.
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VITORIA-ES, 2015
RESUMO
Pesquisa feita como requisito para avaliação de Trabalho Final de Graduação do
curso de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade Multivix - Vitória. Este trabalho faz
uma reflexão sobre a postura do IPHAN - Instituto de Património Histórico e Artístico
Nacional em relação a restauração feita no ano de 1944 na Igreja e Residência de
Reis Magos, situada em Nova Almeida, Serra - Espírito Santo - Brasil, com base nas
teorias dos Restauradores Jhon Ruskin, Camillo Boato, Gustavo Giovannoní e
Cesare Brandi e no conteúdo das Cartas Patrimoniais Carta de Atenas, Carta de
Veneza, Carta de Restauro e Carta de Burra.
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LISTA DE IMAGENS
Imagem 1 - Palácio Anchieta, antigo Colégio São Tiago: com a fachada original e
após alterações que descaracterizaram o edifício. Fonte: Google imagens, imagem
alterada por Thaíssa Krauss. e arquivo pessoal.
Imagem 2 -- Igreja Reis Magos, em Nova Almeida, município da Serra, ES. Fonte
Google imagens.
Imagem 3 - Planta típica de uma aldeia jesuítica no Brasil colónia. Fonte: UNICAMP
Imagem alterada por Thaíssa Krauss.
Imagem 4 - Fotografia do antigo Colégio Tiago. 1907.Fonte: Slides disponibilizados
pela Professora Cada de Paula do Colégio Castro Avles. Imagem alterada por
Thaíssa Krauss.
Imagem 5 - Mapa com as primeiras aldeias Jesuíticas do Estado do Espírito Santo
Fonte: Imagem do google alterada por Thaíssa Krauss.
Imagem 6 - Croqui comparando fachadas típicas dos estilos Maneirista,
Renascentista e Barroco (na ordem). Fonte: Lúcio Costa, a arquitetura dos Jesuítas
no Brasil. Imagem alterada por Thaíssa Krauss.
Imagem 7 Igreja São Roque, em Lisboa. Fonte: Google
Imagem 8 - Igreja de Jesus, em Romã ltália. Fonte: Google
Imagem 9 - Igreja São Vicente de Fora, em Lisboa-Portugal Fonte: Google Mapa
alterada por Thaíssa Krauss.
Imagem10 - Croqui da Capela de Santo Antõnio. Fonte: Lúcio Costa, a arquitetura
dos Jesuítas no Brasil. Imagem alterada por Thaíssa Krauss.
Imagem 1 1 - Foto aérea da Igreja e Colégio Nossa Senhora das Graças de Olinda
em Pernambuco: exemplificando a implantação em quadra. Fonte: Google imagens.
Imagem 12 - Interior da Igreja Nossa Senhora da Assunção, em Anchieta
mostrando as ordens arcadas citadas acima. Fonte: Google.
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Imagem 13 - Igreja e Residência de Reis Magos atualmente. Fonte: Arquivo
Pessoal.
Imagem 14 -- Igreja e Residência Reis Magos, localizada a mais de 40m acima do
mar. Fonte: Google Imagens.
Imagem 15 -- Foto aérea da Igreja e Residência de Reis Magos, em Nova almeida
mostrando o conjunto arquitetõnico e implantação do monumento. Fonte
www. SQ [ra : es :gov .br.
Imagem 16 - Fachada principal da Igreja e Residência Reis Magos com praça
Fonte: www.serra.es.aov.br.
Imagem 17 Foto do óculo Polilobado citado acima. Fonte: www.serra.es.aov.br
Imagem 18 - Foto do Claustro da Igreja e Residência de Reis Magos. Fonte
www: serra :es .qov .br.
Imagem 19 - Retábulo esculpido em madeira com pintura de Reis Magos ao centro
Fonte: Arquivo pessoal.
Imagem 20 - Peças com mármore de Lioz: pia de água benta e pia batismal. Fonte
Arquivo Pessoal.
Imagem 21 - Croqui da Planta Baixa da edificação mostrando onde é a Igreja: pav
térreo e pav. superior. Fonte: Feito por Thaíssa Krauss.
Imagem 22: Croqui da Planta Baixa da edificação mostrando onde é a Residência
pav. térreo e pav. superior. Fonte: Feito por Thaíssa Krauss.
Imagem 23 - Alvenaria deixada exposta para contemplação do público na
restauração de 2001-2003. Fonte: Arquivo Pessoal.
Imagem 24 - Ala Oeste com vista para a Sacristia - sem telhado - antes da Obra de
Restauração do Telhado em 1 944. Fonte: Arquivo do IPHAN-ES.
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Imagem 25 -- Fachada Posterior - antes da Obra de Restauração em 1944. Fonte
Arquivo do IPHAN-ES
Imagem 26 - Fachada Lateral Direita - Ala Oeste - Antes da Obra de Restauração
em 1 944. Fonte: Arquivo do IPHAN-ES.
Imagem 27 - Ala Oeste escada de acesso ao púlito - Antes da Obra de Restauração
em 1 944. Fonte: Arquivo do IPHAN-ES.
Imagem 28: Croqui com Mapeamento das Áreas Afetadas em 1943. Fonte: Feito por
Thaíssa Krauss.
Imagem 29 - Fachada Posterior: antes da Restauração de 1944 e atualmente em
201 5. Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal.
Imagem 30 - Fachada Lateral direita e Posterior: antes da restauração em 1944 e
atualmente em 201 5. Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal.
Imagem 31 - Fachada Lateral Direita - Ala Oeste: Antes da Obra de Restauração
em 1 944 e Atualmente em 201 5. Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal.
Imagem 32 - Fachada Lateral Direita - Ala Oeste - Antes da Obra de Restauração
em 1 944 e Atualmente em 2015. Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal.
Imagem 33 - Pátio Interno em 1944 antes da Restauração e atualmente em 2015
Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal.
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Imagem 34 - Corredor ao redor do pátio em 1944 antes da Restauração e
atualmente em 201 5. Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal.
Imagem 35- Corredor ao redor do pátio em 1944 antes da Restauração e
atualmente em 201 5. Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal.
Imagem 36 - Coliseu em Romã, ltália: simulação de como era originalmente e
fotografia de como está atualmente. Fonte: Google.
Imagem 37 A Cúpula do edifício Reichtag em Berlim, Alemanha: original no século
XIX. que foi destruída durante a segunda guerra mundial e a atual cúpula projetada
pelo arquiteto Norman Foster.Fonte: Google
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Palavras-chave
arquitetura-jesuítica; arquitetura jesuítica no espírito santo; arquitetura-colonial
igreja-reis-magosl aldeia-reis-magosl nova-almeidal teoria-do-restauro
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l . Os Padres Jesuítas no Brasil
Os jesuítas faziam parte de uma ordem religiosa católica chamada Companhia de
Jesus, que foi criada com o objetivo de disseminar a fé católica pelo mundo. Os
padres jesuítas eram subordinados a um regime de privações que os preparava para
viver em locais distantes e se adaptarem às mais adversas condições.
A atividade Jesuítica no Brasil colónia teve início em 1549 e prosseguiu até 1759.
quando o Marquês de Pombas ordenou a expulsão dos padres da Companhia de
Jesus do Brasil. Os Jesuítas foram os primeiros missionários enviados aos nativos
pelos portugueses, assim como acontecia em outros lugares colonizados por
Portugal. Quando chegaram no Brasil no século XVI, os padres se defrontaram com
a população indígena dispersa e nõmade, diferente de outras colónias onde a
população era densa e concentrada. E evidente que os poucos missionários
enviados não poderiam iniciar a longa e difícil tarefa de conversão das tribos
indígenas do Brasil enquanto elas permanecessem em seu estado nõmade. O
problema foi avaliado de maneira realista pelos padres jesuítas, que se empenharam
de forma contínua e incansável para achar uma forma de assentare concentrar os
índios em aldeias. Essas aldeias reuniam comunidades menores e menos
organizadas que as conhecidas Rede/iões dos Jesu/fas' espanhóis na região sul
dos rios Paraguai e Paraná, apesar de serem fundamentadas em princípios
semelhantes . '
A tarefa de assentar os indígenas trazia enormes dificuldades. As plantações
exigiam trabalho escravo e o aldeamento tornava os índios vulneráveis à captura e
mais valiosos como escravos do que seus irmãos selvagens que estavam mais
seguros na floresta. Essa mudança radical trazia ainda para os índios um forte
desconforto psicológico, já que até então eles eram livres, acostumados à vida
l BURY. John. A arquitetura e arte no Bmsil colonial. Brasília: IPHAN/Monumenta, 2006. Pag 63
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dinâmica e natural que a vida na floresta lhes proporcionava. Além disso, as
epidemias trazidas pelos europeus também se alastravam em grande escala nas
aldeias. Os primeiros padres jesuítas assumiram então a enorme responsabilidade
de preservar a liberdade dos índios, ajusta-los ao novo modo de vida e ainda tiveram
que ajudar no aumento gradual da resistência dos mesmos às novas doenças.2
Após a difícil tarefa de assentamento dos indígenas em aldeias, era essencial que
os padres jesuítas também os educassem. Embora a educação dos índios fosse a
tarefa principal concedida pelos portugueses, também era confiada aos
representantes da Companhia de Jesus a tarefa de educar os filhos dos colonos,
assim como a formação dos candidatos às funções sacerdotais. 2
Os padres jesuítas acumularam um grande número de bens materiais, incluindo
fazendas de cana-de-açúcar. fazendas de criação de gado e também se dedicavam
à produção agrícola, além de contarem com o apoio financeiro da Igreja. Esses
empreendimentos eram tocados principalmente pela mão-de-obra escrava dos
índios. Com o aumento de bens e da influência política e económica que os
membros da Companhia de Jesus adquiriram, eles passaram a ter certa
independência sobre o Estado e até mesmo sobre a Igreja.3
Com a ascensão da Companhia de Jesus, os conflitos entre os padres jesuítas e os
colonos passaram a ser cada vez mais frequentes. Os padres Jesuítas repudiavam
o tratamento que os colonos davam a seus escravos índios. Essa diferença de
opinião deu origem a vários conflitos conhecidos. Mais tarde, os padres Jesuítas
foram acusados de instigarem motins contra os colonos. 3;4
2 BURY. John. A arquitetura e arte no Brasil colonial. Brasília: IPHAN/Monumenta,. 2006. Pag. 63
' BRAZÃO. Eduardo. O Marquês de Pombal e os Jesuítas. Revista de História das Ideias. Vo1. 4 -
Tolmo 1. 1 982
4 OLIVEIRA, José Teixeira de. A História do Estado do Espírito Santo. Vitória: Arquivo Público do
Estado do Espírito Santo: Secretaria de Estado e Cultura. 3' edição, volume 8. 2008. Pag. 21 1 -245
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O reestabelecimento das diretrizes portuguesas guiadas pelo absolutismo5, aliado
aos constantes conflitos com os bandeirantes e colonos, deu fim à missão dos
jesuítas no Brasil. Para o Marquês de Pombal, primeiro ministro de Portugal, a
Companhia havia se tornado um enorme obstáculo à construção da sua política de
reformas. Em 3 de setembro de 1759 0 Rei José 1, influenciado pelo Marquês de
Pombal, ordenou a publicação de um decreto acusando os Padres Jesuítas de
traidores e expulsando os Padres da Campainha de todo o Reino e Domínios de
Portugal. Os Padres foram deportados para seus Países de origem. Após a
expulsão dos padres Jesuítas, o governo confiscou as propriedades da Companhia
de Jesus. '
Declaro os sobreditas regulares [. . .] rebeldes, traidons, adversários
e agnssons que estão contra a minha real pessoa e Estados, contra
a paz pública das meus reinos e domínios, e contra o bem comum
dos meus fiéis vassalos [...] mandando que efetívamente sejam
expu/sos de todos os meus reinos e dom/nãos. (Decreto de expulsão
dos Jesuítas, 1 759)
Os membros da Companhia de Jesus, movidos pela necessidade, foram os
pioneiros na construção do Brasil colónia. Por causa de suas capacidades e
notoriedade, tornaram-se os principais desenvolvedores da arte e da arquitetura
brasileira durante os dois primeiros séculos da colonização. A influência dos padres
jesuítas foi tão grande que até hoje é utilizada a expressão "estilo jesuítico" para
descrever toda a fase de arquitetura e decoração religiosa do primeiro período
colonial. '
5 Absolutismo: Teoria política contrária ao Iluminismo. Foi popular na Europa no Seculo XVlll
Disseminava a concentração de poderes em uma pessoa só: judicial, legislativo e religioso.
6 BURY, John. A arquitetura e arte no Brasil colonial. Brasília. Editora Monumenta/IPHAN. 2006
64Pag
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Imagem 3 Planta típica de uma aldeia jesuítica no Brasil colónia
Fonte: UNICAMP. Imagem alterada por Thaíssa Krauss
l .l . Os padres jesuítas no Estado do Espírito Santo
Os missionários da Companhia de Jesus chegaram ao Espírito Santo por volta do
ano de 1551 liderados peão Padre Afonso Brás que reatou "t...] Esta, onde ao
presente estou, é a melhor e mais férti] terra do Brasil [...]". Padre Afonso em 25 de
julho de 1551 fundou o primeiro colégio da Capitania, intitulado Colégio São Trago
(imagem 4), atualmente Palácio Anchieta. 7
7 LEITE, Serafim, História da Companhia de Jesus no Brasil. Tomo
Estabelecimento. Belo Horizonte-Rio de Janeiro: Editora ltatiaía, 2000.
Século XVI
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Imagem 4 Fotografia do antigo Colégio Tiago, 1 907
'4
Fonte: Slides disponibilizados pela Professora Cada de jaula do Colégio Castra Avles. Imagem alterada por
Thaíssa Krauss.
A população indígena do Espírito Santo era abundante se comparada com outras
regiões açucareiras mais prósperas como Pernambuco e Bahia. 8
No Espírito Santo o aldeamento dos indígenas começou na década de 1550. A
primeira aldeia capixaba foi a aldeia da Conceição, atualmente no município da
Serra, que era formada por índios tupiniquim, de um grupo denominado Maracajás,
vindos da Ilha do Governador, no Rio de Janeiro, seguida pela aldeia de São Jogo,
atual Carapinal prosseguindo com Reritiba, Reis Magos e Guarapari que foram
formadas como resultado de expedições militares promovidas pelo governo da
capitania e do trabalho dos jesuítas que realizaram uma intensa tarefa missionária
até as primeiras décadas do século XVll trazendo milhares de índios do sertão e
catequizando-os nas missões. Na década de 1580, apenas nas aldeias jesuíticas
' SALE'n'O, Nau. Sobre a composição étinica da população capixaba. Disponível
http://www.angelfire.com/planet/anpuhes/ensaio25.htm. Acesso em 2 de maio de 2015.
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havia na capitania "mais de 150 vizinhos portugueses" e cerca de 4500 índios, fora
os escravos e os índios livres em contato com os portugueses. Reritiba e Reis
Magos permaneceram como aldeamentos até a expulsão dos Jesuítas do Brasil, em
91759
Imagem 5 Mapa com as primeiras aldeias Jesuíticas do Estado do Espírito Santo
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Fonte: Imagem do goagle alterada por Thaíssa Krauss
É evidente a importância dos aldeamentos jesuíticos para a formação populacional
do Espírito Santo visto que no final do século XVlll, três das cinco vilas existentes na
capitania foram originadas dos aldeamentos jesuíticos. São elas: Guarapari
(Guarapari), Benevente (Reritiba) e Nova Almeida (Reis Magos). As outras duas
vilas eram: Vitória e Vila Velha (Espírito Santo). Por volta dos anos 1 789 foi feito um
9 SALE-rl-O, Nau. Sobre a composiçãoétinica da população capixaba. Disponível
http://www.angelfire.com/planet/anpuhes/ensaio25.htm. Acesso em 2 de maio de 201 5.
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censo indicando que os índios constituíam grande parte da população livre. Reritiba
e Reis Magos possuíam juntas cerca de cinco mil setecentos e trinta habitantes
livres, sendo em sua maioria índios, enquanto Vitória, Vila Velha e Guarapari
possuíam juntas quatro mil novecentos e trinta habitantes livres, incluindo aldeias
antigas. Em 1872 no Estado de Espírito Santo havia seis mil duzentos e sessenta e
três habitantes pretos e pardos livres, que significava 46% da população total livre
contra 45% de brancos. lo
A aldeia de Reritiba tinha uma população estimada em sete mil habitantes. Além da
Aldeia de Reritiba, destacam-se a Aldeia de Muribeca que foi fundada no ano de
1581, era situada no sul do Estado, próximo às localidades de ltapemírim.
Marataízes, ltabapoana, tinha uma população indígena estimada em cinco mil
índiosl Aldeia de Araçatiba, atual Vianal e a Aldeia de ltapoca, atual Município de
Cariacical e a aldeia de São Jogo, atual Carapina. Todas essas aldeias foram
importantes polos económicos e de abastecimento das demandas internas da
Capitania do Espírito Santo com criação de gado, produção de cana-de-açúcar.
farinha de mandioca e produção de legumes.ll
Os padres Jesuítas também se interessaram pela exploração mineralógica, com a
finalidade de encontrar esmeraldas. Em 1636, foi organizada uma expedição dirigida
pelo padre Início Siqueira, atingindo o atual Estado de Minas Gerais, que naquela
época ainda pertencia à Capitania do Espírito Santo. ll
Os padres jesuítas tiveram muita influência política e religiosa em todo mundo. Com
o seu árduo trabalho, foram responsáveis por grandes feitos, principalmente no
10 SALETTO, Nau. Sobre a composição étinica da população capixaba. Disponível em
http://www.angelfire.com/planet/anpuhes/ensaio25.htm. Acesso em 2 de maio de 201 5
'' GONÇALVES, Flávia de Cássia. A Colonização no Espírito Santo entre 1535-1700 e a
contribuição dos diversos segmentos populacionais na sua formação sócio-economico-
cultural. Disponível em: http://wwwangelfire.com/planet/anpuhes/ensaio1 3.htm. Acesso em 2 de
maio de 2015.
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Brasil, onde tiveram a importante missão de catequisar os índios, que eram, em sua
maioria, considerados selvagens e agressivos, permitindo assim, a colonização e o
início da civilização do Brasil.
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2. A Arquitetura Jesuítica
Os Jesuítas não tinham um único ''estilo'' definido, assim como não possuíam um
ideal arquitetõnico e artístico único. Eles foram uma das ordens religiosas mais
versáteis de todos os tempos se adaptando a diversas situações históricas, culturais
e a diferentes tipos de sociedades, tornando-se um estilo único em cada lugar pelo
qual passaram os padres. ':
No Brasil, não podemos falar de arquitetura Jesuítica sem entendermos a sua
relação com a arquitetura do Maneirismo. A arquitetura do Maneirismo foi muito
intensa na ltália. Foi desenvolvida por Michelangelo na década de 1520 ofuscando o
estilo Renascentista, sendo suplantada pelo Barroco no início do século XVII. O
objetivo dos arquitetos renascentistas era racional tendo resultados harmónicos e
simétricos enquanto o objetivo dos arquitetos do Barroco era emocional e os
resultados eram turbulentos, dramáticos e comoventes. Apesar de serem estilos
completamente opostos, ambos eram precisos, enquanto o Maneirismo se mostra
ambíguo apresentando temas dúbios e duplas funções, indo contra a proporção
renascentista . ' '
O Maneirismo viola as regras clássicas do Renascimento. Os princípios do
Humanismo baseados na proporção natural e harmonia matemática foram
transformados em complexos elementos dúbios, com efeito de total desequilíbrio. A
perfeição renascentista foi substituída pela inquietação, mas, diferente do Barroco,
os maneiristas deixaram em aberto as tensões criadas. ';
'z PATETTA, Luciano. A arquitetura da Companhia de Jesus entre maneirismo e barroco. Disponível
em: httD://jer:letras.up.pt/UDloads/ficheiros/7549.pdf . Acesso em 1 5 de junho de 201 5.
13 BUFiY, John. A arquitetura e arte no Brasil colonial. Brasília: IPHAN/Monumenta,. 2006.
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Imagem 6 - Croqui comparando fachadas típicas dos estilos Maneirista
Renascentista e Barroco (na ordem)
Fonte: Lúcio Costa. a arquitetura dos Jesuítas no Brasil. Imagem alterada por Thaíssa Krauss
Na Espanha e em Portugal as figuras mais importantes para a influência das novas
formas clássicas foram os arquitetos da Companhia de Jesus que logo adotaram o
estilo maneirista da ltália e passaram a utiliza-lo em toda parte, inclusive nas
colónias. No México, onde a influência dos padres jesuítas era pequena o
Plateresco14 foi o estilo dominante na época, enquanto no Brasil, onde os Jesuítas
tinham grande influência, uma arquitetura levemente clássica se estabeleceu por um
curto período. Em Portugal, o principal responsável pela introdução do estilo
Maneirista foi o arquiteto Filippo Trezi contratado pelos padres jesuítas para a
elaboração da fachada da lgrela Jesuítica de São Roque (imagem 7), em Lisboa, por
volta do ano de 1 580. 15
'4 Plateresco: estilo arquitetõnico exclusivo do Renascimento espanhol
século XV ao final do século XVII.
Muito popular do início do
 
     
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Imagem 7 - Igreja São Roque, em Lisboa
Fonte: Google
No século XVll, Portugal entrou em guerra contra a Holanda e a Espanha,
impossibilitando o patrocínio da vinda da nova geração de arquitetos italianos que
trariam o estilo Barroco romano. No século XVlll, quando a economia portuguesa se
recuperou com os benefícios do ouro extraído no Brasil e dos tratados com a
Inglaterra, a influência artística italiana voltou para o país e a partir da segunda
década do século XVlll o Barroco tardio italiano chegou a Portugal. 15
Quando o Barroco Italiano estava sendo introduzido no Brasil, a Companhia de
Jesus foi expulsa pelo Marquês de Pombal dos domínios do Rei D. José 1, em 1759.
Desta forma, a arquitetura jesuítica no Brasil absorveu em sua maior parte a
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arquitetura do estilo maneirista, e com menor frequência a arquitetura do estilo
Barroco. ''
A Chiesa del Gesú (imagem 8), Igreja de Jesus em português, foi a principal
influência da arquitetura Jesuítica em todo mundo. Datada do ano de 1562, está
localizada em Romã, foi projetada pelo arquiteto Giacomo Vignola para ser a igreja
matriz dos Jesuítas. Além das edificações jesuíticas em todo mundo, sua arquitetura
e principalmente a fachada se tornou modelo para toda produção Barroca. A Planta
tem um caráter longitudinal, não possui capelas laterais nem torres, o transepto é
contraído e o corpo da cruz é formado por duas arcadas. 15
Imagem 8 - Igreja de Jesus, em Romã - ltália
Fonte: Google
'5 PATETA-A, Luciano. A arquítetura da Companhia de Jesus entre maneirismo e barroco
em: 111tp://lerá etras:yp:pt/uploads/ficheiros/7549.odf . Acesso em 1 5 de junho de 201 5.
Disponível
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A Igreja de São Vigente de Fora (imagem 9), do ano de 1582, em Lisboa, projetada
pelo arquiteto Filippo Treze, foi a primeira fachada maneirista de duas torres bemsucedida. Teve grande influência na concepção da Catedral de Salzburgo, projetada
por Scamozzi em 1614, que por sua vez, influenciou a construção de várias igrejas
por toda Europa. Portugal não tinha estruturas antecedentes de grande influência
para a fachada de duas torres no início do século XVI tornando o prometo de Trezi
mais relevante. A partir da construção da Igreja de São Vicente (imagem 9) em
Lisboa, não foi construída nenhuma igreja de importância em Portugal sem as duas
torres na fachada. ''
Imagem 9 Igreja São Vicente de Fora, em Lisboa-Portugal
Fonte: Google Mapa, alterada porThaíssa Krauss
lõ BURY, John. A arquitetura e arte no Brasil colonial. Brasília: IPHAN/Monumenta, 2006
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Os padres jesuítas portugueses estavam divididos entre influências opostas. Como
membros da Companhia de Jesus, tinham a Igreja de Jesus em Romã, sem
nenhuma torre, que era a sede da Companhia emergindo como modelo para a obra
dos padres em todo mundos e a Igreja de São Vicente de Fora em Lisboa, com as
duas torres. que teve muita influência em Portugal nos anos seguintes à sua
Construção. Tendo prevalecido a primeira influência, a segunda foi relegada. Assim,
as igrejas jesuíticas no mundo lusitano17 podem ser classificadas entre ambas
citadas acima.''
As Igrejas Jesuíticas brasileiras não podem ser consideradas puramente barrocas,
diferente do trabalho dos Jesuítas da América espanhola. No Brasil, os padres
interpretaram e expressaram de maneira única o estilo barroco com uma adesão
conservadora e maciça dos elementos maneiristas.''
Os padres Jesuítas adotaram a arquitetura maneirista como seu estilo próprio.
reproduzindo-a em diversos lugares quando esse estilo ainda era muito recente em
Portugal. Aqui, os territórios recém-descobertos ofereciam uma atmosfera muito
parecida com a do século XVI, sendo compreensível que a arquitetura da província
dos jesuítas tenha preservado simbolicamente os aspectos originais da arquitetura
da primeira fase do estilo jesuítico.''
17 Mundo Lusitano: Se refere à cultura e tradição portuguesa.
'' BURY, John. A arquitetura e arte no Brasil colonial. Brasília: IPHAN/Monumenta,. 2006
19 PATE'n-A, Luciano. A arquitetura da Companhia de Jesus entre maneirismo e barroco. Disponível
em: htto://ler.letras.uo.ot/UDloads/ficheiros/7549.pdf . Acesso em 15 de junho de 201 5.
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2.1 A arquitetura Jesuítica no Brasil
A arquitetura Jesuítica é classificada em três períodos. Primeiro período: século XVI.
caracterizado por uma tipologia e ornamentação muito simples, austeros e
funcionais. Segundo período: século XVI e XVll, fundação de importantes sedes e a
armação tipológica das grandes áreas colegiais. E o terceiro período, século XVlll,
baseado no acabamento decorativo das edificações já existentes, neste quase não
houve novas construções jesuíticas.:'
Para os europeus falar de arquitetura Jesuítica remete, além das formas mais
simples iniciais, ao auge do estilo Barroco, onde este era mais desenvolvido e
dramático. Para os hispano-americanos, onde a Companhia permaneceu por todo
século XVlll, arquitetura Jesuítica remete a todo o ciclo do barroco. Já no Brasíl,
onde a atividade dos padres da Companhia de Jesus foi brutalmente interrompida
em 1759, grande parte das obras dos Jesuítas remete à primeira fase. Aqui quando
se fala em Arquitetura Jesuítica significa o que temos de mais antigo em termos de
arquitetura, são as composições mais simples, regulares, ainda muito marcadas pelo
renascimento . ' '
Quando se estuda arquitetura é importante saber primeiramente, além das
imposições do meio físico e social, quais são as finalidades da edificação, quais as
necessidades que a mesma precisa atender e qual a funcionalidade que ela possui.
Em segundo lugar é preciso analisar o sistema construtivo e os materiais utilizados,
ou seja, de que maneira a utilização dessa técnica atendeu às determinações
daquele programa. Por fim, entender as particularidades plásticas do monumento.:'
20 PATETTA, Luciano. A arquitetura da Companhia de Jesus entre maneirismo e barroco. Disponível
5 de junho de 2015.
serviço do património histórico e
artístico nacional. 1941 .
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28
O Programa das construções Jesuíticas era relativamente simples podendo ser
dividido em três partes, cada uma destas partes possuía uma determinada função:
A igreja com coro e sacristia para as celebraçõesl as oficinas e as salas de aula para
a catequização dos nativosl os quartos que serviam como a residência dos padres
Jesuítas. Além dessas três, havia a enfermaria e dependências de serviço, e ainda
na parte exterior havia horta e pomar.::
O objetivo da Companhia de Jesus era a catequização dos nativos, assim como a
disseminação da religião católica entre os colonos, logo, a igreja tinha a necessidade
de ser ampla, com a intenção de abrigar um número sempre crescente de fiéis e
curiosos, preferencialmente localizada em frente a um espaço aberto, onde as
pessoas pudessem se encontrar e caminhar. A construção das casas dispostas de
forma ordenada ao redor da praça não havia sido idealizada pelos padres
construtores. O programa Jesuítico brasileiro é mais modesto e menos independente
do que o dos padres das missões da Província do Paraguai, onde o programa da
aldeia compreendia também traçados urbanísticos.22
A descrição do colégio construído na Bahia pelo arquiteto Francisco Dias demonstra
o programa simples da arquitetura Jesuítica:
Tem de novo feito um claustro de pedra e cal e no quarto da parte
Leste, fica a igreja e a sacristia; a igreja é razoável, bem acabada,
com seu coro, é bastante por agora para a terra, e bem ornada de
ricos omamentos [...] O outro quarto da parte Su] tem por cima a
capela e a enfemtaría de boa gmndum, por baixo despensa e adega.
O quarto da parte Poente tem 19 câmaras: nove por cima e por
debaixo dez com as janelas grandes que fazem cruz nos corredores.
O quarto da parte Nordeste tem sete câmaras por cima e seis por
debaixo: todas são forradas de cedro, e amplas mais que as de
:: COSTA, Lúcio. A arquitetura dos jesuítas no Brasll. Revista do serviço do património histórico e
artístico nacional. 1941
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O partido adotado pelos Jesuítas para a planta baixa aqui no Brasil foi o de uma
nave só, tendo apenas dois casos diferentes conhecidos. O primeiro caso aparece
na Igreja de São Pedro d'Aldeia onde aparece de forma bem rudimentar o partido de
três navesl os esteios centrais aliviam o peso da cobertura permitindo uma maior
amplitude, sendo possível abrigar mais fiéis, o que era mais apropriado às igrejas
missionárias. O segundo caso é na atual cidade de Anchieta (Imagem 12), antiga
aldeia de Reritiba, possui duas ordens de arcadas (disposição que parece ser
original) sustentando o madeiramento da cobertura e como consequência, divide o
corpo da igreja em três partes.:/
Imagem 12 - Interior da Igreja Nossa Senhora da Assunção, em Anchieta
mostrando as ordens arcadas citadas acima
Fonte: Google
27 COSTA, Lúcio. A arquítetura dos jesuítas no Brasil. Revista do serviço do património histórico e
artístico nacional. 1941 .
33
O partido geral de uma nave só em território brasileiro possui quatro tipologias
diferentes:
A primeira tipologia é a mais simples, onde estão enquadradas as capelas mais
rudimentares dos primeiros tempos e no qual a capela-mor e a nave constituem um
mesmo corpo de construção dividido em duas partes por um arco cruzeiro. Apesar
de muito rara hoje em dia, podemos encontrar essa tipologia na capela de Santo
Antõnio, do segundo século da colonização, que, apesar de ser uma capela
particular,não deixa de ser uma capela de inspiração jesuítica. 2a
A segunda tipologia tinha um partido claro e de composição espontânea, foi muito
desenvolvida tardiamente em Minas Gerais. Embora fossem relativamente recentes.
obedeciam a um programa mais modesto de construção. De largura e pé-direito
menores, a capela-mor e a nave aparecem nitidamente separadas.28
A terceira tipologia abrange as igrejas que possuíam um partido complexo com uma
forma mais singela. As igrejas dessa tipologia eram maiores, do século XVII. Aqui
ainda mantém-se os três altares usuais do modelo anterior, com a particularidade de
também serem criadas pequenas capelas laterais de maior e menor profundidade.
Os padres adotaram no partido a disposição de duas capelas no sentido transversal,
voltando a velha tipologia de cruz latina. A igreja de Olinda, igreja de Vinhais situada
no Maranhão e a igreja do Socorro em Sergipe, são exemplos de construções dessa
tipologia.:'
:' COSTA, Lúcio. A arquitetura dos jesuítas no Brasil. Revista do serviço do património histórico e
artístico nacional. 1941.
34
A quarta tipologia tinha muita influência da igreja jesuítica Gesü de Romã. No lugar
dos três altares, como ocorria geralmente na tipologia anterior, aparece diversos
altares dispostos em capelas laterais, sendo que as duas mais próximas da capela-
mor eram quase sempre mais largas, mais altas e mais profundas que as demais
tendo o mesmo objetivo de marcar em planta baixa o cruzeiro. Pertenceram a esta
categoria as igrejas de São Paulo em Piratininga, a igreja do Belém do Para, além
da igreja do Colégio do Salvador que funcionava como a matriz brasileira da
Companhia de Jesus.28
O considerável legado de obras do período jesuítico pode não ser o maior nem o
mais rico no contexto do legado brasileiro, mas é o legado mais antigo e um dos
mais significativos da história do Brasil.
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35
3. A Igreja e a Residência de Reis Magos
3.1 . Histórico da Construção
A Igreja e residência de Reis Magos é um dos principais legados deixados pelos
Jesuítas por ser um exemplar muito raro e sem grandes alterações da arquitetura
original. Apesar das suas peculiaridades, é classificada uma obra da primeira fase
da arquitetura Jesuítica.29
Além do Esplendor e admiração que Reis Magos causa, por sua história e sua
harmonia com a natureza, Reis Magos representa um período muito austero da
nossa história. Reis Magos representa a opressão e dominação que existia aqui no
Brasil na época da colonização. 30
A Igreja e Residência de Reis Magos foi tombada património histórico do Espírito
Santo em 21 de setembro de 1943 no livro de Belas Artes e no Livro Histórico, na
mesma data. A partir de 13 de agosto de 1985 o tombamento inclui todo o seu
acervo de acordo com a resolução do Conselho Consultivo da SPHAN -- Secretaria
de Património Histórico e Artístico Nacional, de acordo com o processo
administrativo no 1 3/85/SPHAN.31
A Igreja de Reis Magos é o único monumento importante remanescente da região de
Nova Almeida e também é muito importante por constituir um dos principais
exemplos do património histórico e arquitetõnico dos padres Jesuítas no Brasil. A
:' LOPES, A.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
Bela professora doutora de história da aNe. Vitória. 201 3. Gravada em português.
' ABREU, C. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
Eleva ex-superintendente do IPHAN-ES, Vitória, 2013. Gravada em português.
'' IPHAN. Documento de Tombamento da Igreja e Residência de Reis Magos. Disponível em:
If&Cod=1205. Acesso em: OI de
setembro de 2015.
36
edificação sofreu pouquíssimas interferências durante os séculos seguidos de sua
construção. "
A aldeia de Reis Magos, atualmente Nova Almeida, no município da Serra, teve um
papel muito importante na história dos Jesuítas. A Aldeia foi criada em um momento
de intensa ação missionária dos Jesuítas no Brasil e era o centro regional dos
padres jesuítas ao norte da vila da Vitória. Os padres jesuítas queriam ser
especialistas no território da missão. A missão para eles era formar padres
especialistas nas entradas para o interior. ";;;
Os padres jesuítas já estavam aqui na província do Espírito Santo a algum tempo.
Por esse motivo, já era grande o número de sacerdotes formados que entendiam e
falavam a língua tupi. A partir das variações de tupi que os padres jesuítas haviam
encontrado pelo litoral, eles criaram uma nova língua, chamada de língua geral. A
língua geral consistia em uma variação resumida do tupi, onde era possível que
todos os povos tupis entendessem. A língua geral, falada na província do Espírito
Santo também podia ser entendida pelos povos guaranis do norte do Brasil e por
alguns colonos portugueses. Por esse motivo, a maior parte dos padres jesuítas que
vieram para o Brasil para catequisar os índios passou por Reis Magos para aprender
a língua geral (tupi). 32;34;35
A aldeia de Reis Magos funcionava permanentemente como formação dos futuros
padres missionários, pois dentro da formação dos padres, havia um momento em
que eles precisavam aprender a língua local. Foi tentado sem sucesso que os
32 CARVALHO, José Antõnio. O Colégio e as residências dos Jesuitas no Espírito Santo. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura.1982. Pags. 1 13-123.
B CUNHA, M.J.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de
Sá pela historiadora, Vitória, 2013. Gravada em português
34 PEROTA, C. A.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de
Sá pelo arqueólogo, Vitória.2013. Gravada em português
3 SALETTO, N. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
pela historiadora, Vitória, 201 3. Gravada em português.
37
futuros sacerdotes aprendessem o tupi nas aldeias durante a catequização dos
índios, então, a melhor maneira de aprender a língua tupi era durante a formação
sacerdotal dos missionários. ;'
Após a expulsão dos padres jesuítas, em 1959, o conjunto arquitetõnico passou a
pertencer ao governo e teve vários usos. Além de igreja e habitação dos padres, o
edifício foi utilizado como Câmara e Cadeira e como aposentadoria do juiz.37
A data em que o edifício voltou a ser utilizado é incerta. A igreja e a residência, a
segunda para habitação do vigário, parecem ter sido utilizadas imediatamente. Em
janeiro de 1760 o reverendo Pedro da Costa Ribeiro, visitador geral, autorizou que o
vigário padre José Correia de Azevedo fizesse um pedido de reparo para a igreja. A
utilização da residência como Câmara e Cadeia e como aposentadoria do juiz
também é difícil precisar, estima-se que em 1786 já era utilizada. 36
A província do Espírito Santo era muito pobre e não tinha recursos financeiros para
manter e nem para recuperar o edifício. Todas as edificações que dependiam do
governo da província para serem mantidos ou conservados apresentavam um
aspecto de total abandono. Além disso, Nova Almeida era uma região muito
pequena e pobres não possuía preocupações em manter ou utilizar o edifício exceto
para o necessário. Assim, os "quartos" leste e norte, que não estavam sendo
utilizados, logo desabaram e em 1 808 o conjunto já se encontrava em ruínas. 38
36 CUNHA, M.J.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de
$á pela historiadora, Vitória, 201 3. Gravada em português.
37 (CARVALHO, José Antõnio. O Colégio e as residências dos Jesuítas no Espírito Santo. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura.1982. País. 1 13-123
38 CARVALHO. José Antõnio. O Colégio e as residências dos Jesuítas no Espírito Santo. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura.1982. Pags. 1 13-123
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Em 1813 o ouvidor havia mandado fazer alguns consertos na Casa da Câmara,
porém em 1818 o edifício ainda se encontrava em ruínas. Entre 1820 e 1821 foram
feitos novos consertos no mesmo local. 39
Cada vez mais a vila de Nova Almeida decaía de pobreza e a província ainda não
tinha recursos para mantero edifício que além da degradação natural do tempo e
das intempéries da natureza, sofria com a revolta de alguns prisioneiros mantidos na
parte do edifício destinado à cadeia.39
Em 1840 houve um incêndio, provocado por um dos presos, na ala da cadeia. Em
setembro de 1 843 não havia mais sacerdotes no edifício e a igreja ameaçava ruína.
Em 1846 a cadeia necessitava de novos reparos. Em 1848 a igreja se encontrava
em ruínas e o estado da parte da residência que não era utilizada era tão crítica que
nem era cogitado pedir seu reparo, só os cómodos utilizados seriam reparados. 39
Em maio de 1850 foi executado o conserto do telhado da igreja, substituindo toda a
madeira velha e consertando a calha entre a torre sineira e a igreja. Não havia
sobrado dinheiro para reparar o corredor que dava acesso ao púlpito, torre e coro
que se encontrava em ruínas. Em novembro do mesmo ano o corredor desabou. 39
Em 1 857 a igreja havia sofrido uma violação onde "mão sacrílegas" destruíram parte
do retábulo à procura de tesouros deixados pelos padres jesuítas. Neste mesmo ano
o reparo na Cada da Câmara foi concluído. 39
39 CARVALHO, José Antõnio. O Colégio e as nsidências dos Jesuítas no Espírito Santo
Janeiro: Expressão e Cultura.1982. Pags. 113-123
Rio de
39
No ano de 1859 foi relatado ao presidente da província alguns consertos que foram
executados pelo vigário Manuel Antõnio dos Santos Ribeiro:
'... Tratei do assoalho da Capella mor, e do que faltava no corpo da
lgnja e torre; nparei o telhado, barrotamento e assoalho do corredor
da Sacristia; mandei fazer as escadas necessárias; feixar o lugar que
pela portaria dá entrada pala os claustros da Igreja, a fim de evitar a
continuação dos actos indecentes e immoraes que nelles se
praticavãol e estou tratando do aparo de parte do forro da capella
mor, afim de poder mandar tomar as goteiras que no telhado tem
aberto, caso pam isto chegue a restante quantia que ainda existe em
meu poder e então pastar as competentes contas.. ." 40
As escadas relatadas acima pelo vigário substituíam o corredor desabado no ano de
1 851 , que ainda se encontrava caído, e davam acesso ao púlpito e ao coro.40
Com o passar do tempo, o edifício construído pelos padres jesuítas ia se
deteriorando cada vez mais. Os responsáveis pelo governo da província nâo
possuíam interesse em conservar o edifício, mas passaram a se interessar pelas
imagens e adornos da Igreja de Reis Magos. A igreja sofreu alguns furtos e alguns
casos de apropriação indevida por membros do governo da província dos utensílios
foram relatados ao longo dos anos.40
O conjunto arquitetõnico ameaçou ruína várias vezes mais e foi reparada outras
vezes mais, sem muito empenho do governo em mante-la em estado vigoroso. Até
que em julho de 1907 o sr. bispo diocesano Dom Fernando de Sousa Monteiro
exigiu que o governo da província Ihe entregasse o edifício com a igreja reformada e
40
em perfeitas condições, além de todos os terrenos e bens do edifício, pois pretendia
transformar o mesmo em um Colégio sob a direção dos padres salesianos.40
A fundação do colégio na Igreja de Reis Magos nunca foi executada. A Igreja era
anexa a uma das paróquias vizinhas sendo dirigida pelo Reverendo Vigário da Serra
e foi deixada de lado. A ruína quase total do monumento era inevitável. A
recuperação total do edifício aconteceu em 1 944 quando a Secretaria do Património
Histórico e Artístico Nacional restaurou todo o conjunto.40
Na época do tombamento, a residência de Reis Magos se situava em estado de
ruínas. Nos anos de 1944 e 1945 o monumento passou por uma grande obra de
restauração onde foi possível recuperar toda edificação. A partir desta reforma,
foram executados vários pequenos reparos. Nos anos de 1987 e 1988 foi realizada
uma nova obra de restauro. Atualmente a última grande obra de restauro foi feita no
ano de 2001 , tendo sido concluída em 2003.41
w CARVALHO, José Antõnio. O Colégio e as residências dos Jesuítas no Espírito Santo. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura.1982. Pags. 1 13-123
'' IPHAN. Documento de Tombamento da Igreja e Residência de Reis Magos. Disponível ern:
e1205. Acesso em: 01 de
setembro de 2015.
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3.2. Reis Magos Hoje
No restauro de 2001-2003 foi necessário fazer uma estudo arqueológico em Reis
Magos para suprir a falta de informações que não foram encontradas em fontes
tradicionais de pesquisa, como livros, documentos e registros históricos.42
Com as escavações foi descoberta uma estrutura na parte externa da Igreja.
Acredita-se que essa estrutura tenha sido utilizada como igreja provisória enquanto
a Igreja e Residência de Reis Magos estava sendo construída. Essa estrutura está
aparente para a contemplação da população e também para gerar conhecimento
sobre sua existência. Em uma sala também foram expostas as pedras e reboco das
paredes para as pessoas terem conhecimento de como eram executadas as
técnicas construtivas, e quais materiais foram utilizados na construção do edifício.43
Dentro do monumento há uma exposição de ll moedas, uma coleção de louças
portuguesas datadas do século XVI e porcelanas feitas pela própria população neo-
brasileira que vivia aos redores de Reis Magos. Todos esses materiais também
foram encontrados nas escavações arqueológicas.«
As escavações arqueológicas de 2001 tiveram um papel muito importante na
descoberta arquitetõnica e histórica de Reis Magos, assim como contribuiu com o
conhecimento de novas técnicas construtivas e culturais que eram utilizadas pelos
padres jesuítas.';
'* MACHADO, C.L. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de
$á pela arqueóloga, Vitória, 201 3. Gravada em português
© ABREU, C. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
E)ela ex-superintendente do IPHAN-ES, Vitória, 201 3. Gravada em português
' PEROTA, C. A.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de
Sá pelo arqueólogo, Vitória,2013. Gravada em português
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42
A pintura de reis magos foi restaurada na obra de restauração da década de 40, pelo
renomado professor Edson Mota. A pintura possui altíssima qualidade. Foi feita
sobre madeira e por causa do descuido. quando foi retirada para a restauração
estava infestada de cupins. A intenção da restauração da pintura era chegar mais
próximo possível da intenção do artista original, sem que deixasse de mostrar a
passagem do tempo."
Atualmente, Reis Magos pertence à ordem dos padres Capuchinhos, da família dos
padres franciscanos. Os usuários da Igreja mudam constantemente o seu layout,
conforme sua necessidade. Funciona como Monumento histórico e é aberto para
visitação de terça a domingo de 9:00h às 17:00h e também funciona como santuário
onde é possível serem realizados casamentos, batizados e missas.
Imagem 13 Igreja e Residência de Reis Magos atualmente
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Fonte: Arquivo Pessoal
n COLNAGO, A. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de
Sá pelo professor restaurador, Vitória,201 3. Gravada em português.
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3.3. Tipologia Arquitetõnica de Reis Magos
Quando resolveram se mudar da Aldeia Velha para Reis Magos, os Jesuítas
puderam escolher o que julgavam a melhor localização para a construção da Igreja e
Residência. A residência está localizada a mais de 40 metros do nível do mar
(imagem 14), na mais alta elevação da região que também possui a melhor posição
estratégica: fácil acesso para o interior pelo rio para capturar novos índios e para
vigiar a costa do alto do monte. A parte norte do edifício, que corresponde à parte
dos fundos, está localizada junto a um barranco que se situa à margem sul da foz do
rio Reis Magosl sua fachada principal está voltada para uma grande praça em formade quadrilátero de aproximadamente 46,20 metros x 85,80 metros na parte sul do
edifício. A torre e as janelas do cómodo da residência tem uma vista privilegiada e
dominante da foz do rio Reis Magos.46
Imagem 14 - Igreja e Residência Reis Magos, localizada a mais de 40m acima do
mar
Fonte: Google Imagens
" CARVALHO, José Antõnio. O Colégio e as residências dos Jesuítas no Espírito Santo
Janeiro: Expressão e Cultura.1982. Pags. 1 13-123
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44
O conjunto arquitetõnico é composto da igrqa, da residência anexa e também
possui uma praça. Reis Magos, assim como outros exemplares de igrejas jesuíticas
no estado do Espírito Santo, são classificados da primeira fase do estilo jesuítico,
portanto são maneiristas. As construções da primeira fase do estilo jesuítico no
Brasil se caracterizam pela planta em formato quadrangular e normalmente
possuem uma torre sineira. Reis Magos demonstra uma grande evolução pela
localização da sua torre sineira, que está localizada entre a igreja e a residência, fato
que a torna exceção, assim como o óculo polilobado, que também é muito incomum
nas Igrejas da primeira fase do estilo jesuítico.4r
Imagem 1 5 -- Foto aérea da Igreja e Residência de Reis Magos, em Nova almeida
mostrando o conjunto arquitetõnico e implantação do monumento
Fonte: www.serra.es.gov.br
4r LOPES, A.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
pela professora doutora de história da arte. Vitória. 201 3. Gravada em português.
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45
A arquitetura de Reis Magos é bem singela, quase rudimentar. A cobertura é feita
em telha-van. Além da capela mora que guarda o retábulo esculpido pelos índios em
madeira, a peça mais importante da igrejas poucos cómodos possuem forro em
madeira. "
A Igreja
A fachada principal da igreja possui um frontão triangular simples, característica
típica do estilo maneirista, com cornijas e volutas, um óculo polilobado (imagem 17)
central em rosácea, três janelas, um púlpito e a portada principal cujos quadros são
em mármore de noz. No prolongamento da fachada principal está situada a entrada
principal para a residência.48; 49
O mármore de noz encontrado nas portadas da igreja e também na pia batismal
(imagem 20) atribuem nobreza à arquitetura tão singela do Conjunto de Reis
Magos."
A Igreja dispõe de uma nave, capela mor e a torre sineira coberta por uma abóboda
e tijolos. A porta principal possui ombreira de pedra trabalhada na parte superior. As
janelas são almofadadas e os vãos das janelas contêm ombreiras retangulares. A
torre sineira situa-se entre a igreja e a residência sendo coberta por uma cúpula e
contém quatro pináculos. Na parte interna, o altar-mor apresenta um retábulo
(imagem 19) com quatro colunas em estilo salomõnico contornando uma pintura de
Reis Magos, possivelmente a primeira pintura feita no Brasil, ao centro e um nicho
para imagens nos cantos esquerdo e direito. O conjunto de imagens sacras possui:
" ABREU, C. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
Eleva ex-superintendente do IPHAN-ES, Vitória, 2013. Gravada em português.
' IPHAN. Documento de Tombamento da Igreja e Residência de Reis Magos. Disponível em:
2Q5, Acesso em: OI de
setembro de 2015
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46
uma imagem de Nossa Senhora da Conceiçãol uma imagem de Nossa Senhora da
Boa Mortes uma imagem de Santo Ináciol e um Cristo crucificado.48; 49
O retábulo apresenta um desenho maneirista, muito primitivo, típico dos retábulos
das igrejas da primeira fase do estilo jesuítico. Possui um desenho muito culto, no
entanto, o entalhamento foi executado de forma rudimentar. O retábulo (imagem 19)
também contém um simbolismo muito incomum no Brasil, como o desenho das
cobras coroadas. Esse simbolismo indica a participação da mão-de-obra indígena.
possivelmente proveniente de um acordo imposto aos índios pelos padres jesuítas.se
Imagem 16 Fachada principal da Igreja e Residência Reis Magos com praça
Fonte: www.serra.es.gov.br
50 LOPES. A.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
pela professora doutora de história da arte, Vitória, 201 3. Gravada em português
47
Imagem 17 Foto do óculo Polilobado citado acima
Fonte: www.serra.es:qov.br
Imagem 1 8 - Foto do Claustro da Igreja e Residência de Reis Magos
Fonte: wvwv.serra.es.gov.br
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Imagem 1 9 - Retábulo esculpido em madeira com pintura de Reis Magos ao centro
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Fonte: Arquivo pessoal
Imagem 20 Peças com mármore de Lioz: pia de água benta e pia batismal
Fonte: Arquivo Pessoal
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Imagem 21 - Croqui da Planta Baixa da edificação mostrando onde é a Igreja: pav
térreo e pav. superior
Fonte: Feito por Thaíssa Krauss
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A Residência
A residência apresenta fachada simples com janelas retangulares. As portas
possuem ombreiras em pedra. Na parte superior da porta principal há uma
representação de uma coroa envolvida por dois ramos de planta. No interior da
residência encontramos o claustro com pilastras em alvenaria e vigamento em
madeira.''
A residência possui dois pavimentos
No pavimento térreo localiza-se a sacristia que se destaca dos demais cómodos
pela nobreza da mesma. O acabamento da sacristia possui forro em saia e camisa e
5' LOPES, A.S. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
pela professora doutora de história da arte. Vitória, 201 3. Gravada em português.
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a porta almofadada dando acesso pelo corredor de chão batido que cerca o pátio
interno. Na sacristia está localizada a pía batismal em mármore de noz.s2
No pavimento superior encontram-se as celas que funcionavam como quartos para
os padres jesuítas e uma varanda cujo piso é totalmente composto por tabuado
sobre barrotes de madeira. A edificação também possui salas que eram utilizadas
como oficinas para os padres jesuítas ensinarem aos índios técnicas de trabalho
como, por exemplo, carpintaria, técnicas de tecelagem, entre outras. 52; 53; H
Imagem 22: Croqui da Planta Baixa da edificação mostrando onde é a Residência
pav. térreo e pav. superior
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Fonte: Feito por Thaíssa Krauss
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52 CUNHA, M.J.$. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de
Sá pela historiadora, Vitória, 201 3. Gravada em português.
s3 IPHAN. Documento de Tombamento da Igreja e Residência de Reis Magos. Disponível em:
http://portal.iphan:gQV.br/ans.net/tema consulta.asp?Linha=tc hist,aif&Cod=1205. Acesso em: 01 de
setembro de 2015.
54 ABREU. C. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
pela ex-superintendente do IPHAN-ES, Vitória, 201 3. Gravada em português
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3.4 Técnicas construtivas e materiais utilizados
Os Padres jesuítas eram construtores muito distintos. No início da colonização, não
havia muitos materiais disponíveis. Por isso, as construções jesuíticas eram erguidas
utilizando materiais da natureza natural, como pedras, encontrados na proximidade
dos edifícios. No caso de reis magos, as pedras poderiam ser encontradas nos
corais próximos à construção. A alvenaria e também a fundação de Reis Magos são
feitas em pedra (imagem 23). As pedras possuíam tamanhos irregulares onde as
pedras de menor tamanho sustentavamas pedras de maior tamanho. Por fim, as
pedras recebiam uma camada de argamassa. Essa argamassa era feita de barro e
era misturado com conchas, óleo de baleia e todos os aglutinantes que pudessem
incrementar essa argamassa. Após estar executada a alvenaria de pedra, as
paredes eram rebocadas e revestidas com tinta a base de cal, por esse motivo a
maioria das construções possuem essa coloração branca. As construções dessa
época, principalmente quando se trata de Arquitetura Sacra, eram construídas para
durarem muito tempo, e duraram.ss
Imagem 23 - Alvenaria deixada exposta para contemplação do público na
restauração de 2001 -2003
Fonte: Arquivo Pessoal
" ABREU. C. Para Durar Enquanto o Mundo Durasse. 2014. Entrevista concedida a Ricardo de Sá
pela ex-superintendente do IPHAN-ES, Vitória, 201 3. Gravada em português.
56
No ano de 1 972, na ltália, foi criada a Carta do Restauro defendendo que devem ser
adotadas medidas preventivas com o intuito de evitar intervenções maiores no
futuro, respeitando os elementos que foram adicionados ao longo dos anos e evitar
intervenções de renovação. A diferença desta carta para as outras cartas já citadas
é que esta carta permite a alteração no uso dos monumentos, desde que estas
sejam compatíveis com o interesse histórico e artístico do monumento. Caso ocorra
a alteração de uso, as alterações na obra devem conservar a sua forma externa e
não deve haver alteração na sua tipologia, nos espaços internos e na sua
estrutura."
Em 1980, na Austrália, foi criada a carta de Burra. Esta carta reafirma os valores
defendidos na Carta de Atenas e na Carta de Veneza, defendendo que os
procedimentos de restauração devem respeitar ao máximo o material existente não
deve alterar as peculiaridades contidas no monumento. 6s
M Carta do Restauro, 1972. IPHAN. Disponível em:
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20do%20Restauro%201 972.pdf. acesso
em: 10 de outubro de 2015
M Carta de Burra, 1980. IPHAN. Disponível em:
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckülnder/arquivos/Carta%20de%20Burra%201 980.pdf, acesso em
1 0 de outubro de 201 5
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5. Análise da Restauração de Reis Magos de 1 944
Como foi citado anteriormente, o conjunto de Reis Magos até 1907 passou por
inúmeros reparos e ameaçou ruína várias vezes. O governo não tinha muito
interesse em manter o conjunto em estado vigoroso. Após 1907 a Igreja passou a
fazer parte de uma das paróquias vizinhas, sendo dirigida pelo Reverendo Vigário da
Serra e foi deixada de lado, sendo inevitável a sua ruIRá.66
No ano de 1 940, todas as alas do conjunto arquitetõnico estavam em mau estado de
conservação, prestes a desabar. A parte Igreja era a menos prejudicada, mas os
vigamentos e telhado, por serem muito antigos, estavam em péssimo estado de
conservação. A residência encontrava-se sem a água do telhado da varanda
localizada no lado oeste (imagem 24), ao lado da nave da igreja. 67
Imagem 24 - Ala Oeste com vista para a Sacristia - sem telhado - antes da Obra de
Restauração do Telhado em 1 944
Fonte: Arquivo do IPHAN-ES
m CARVALHO. José Antõnio. O Colégio e as residências dos Jesuítas no Espírito Santo. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura.1 982. Pags. 1 1 3-123
'' Identificação e Interpretação das fotos da década de 1 940. Arquivo IPHAN-ES
58
Em 1943, a cobertura da nave da igreja encontrava-se em más condições, com os
caibros arruinados. Alguns caibros estavam presos com telha vã. A fachada lateral
direita estava muito arruinada. as janelas estavam sem esquadrias e a parte que
encontrava com a fachada posterior havia ruído. Ainda na fachada lateral só havia
esquadrias nas janelas da sacristia (imagens 24 e 25).6n
Na mesma época o claustro (atualmente salas 7 e 8), no pavimento superior, estava
em ruínas, restando apenas algumas vigas. Grande número de degraus das
escadas do monumento havia perdido o tablado. Todas as escadas estavam em
ruínas e necessitavam ser restauradas (imagem 26).6a
Imagem 25 - Fachada Posterior - antes da Obra de Restauração em 1 944
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Fonte: Arquivo do IPHAN-ES
" Identificação e Interpretação das fotos da década de 1 940. Arquivo IPHAN-ES
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A cela (atualmente sala de exposição) possuía o piso e o telhado em telha vã em
mau estado. O piso e o forro do cómodo 22 (atual sala 12) estava em más
condições."
Ainda em 1943, o madeiramento dos cómodos 9, 10 (atualmente salas 9 e 10), 21 e
22 (anualmente 12 e 1 1) estavam em más condições e o madeiramento dos demais
cómodos havia ruído completamente, não existindo mais. A cobertura da Igreja e da
frente do colégio precisava ser renovada e a cobertura dos cómodos restantes
estava em mau estado."
No ano de 1943 só existiam as esquadrias da nave, capela-mor, sacristia, cómodo
22 (atualmente sala 12) e do coro da igreja. As portas e janelas da igreja, sacristia,
capela-mor e coro eram almofadadasl os demais cómodos possuíam esquadrias de
calha. O retábulo é original, mas foi alterado. Em 2001 , foi verificado no local que o
retábulo aparenta ter sido muito maior do que é atualmente.69
Com base nas pesquisas em documentos e fotos históricas em arquivos do IPHAN
foi feito o seguinte mapeamento das áreas afetadas:
60 Identitlcação e Interpretação das fotos da década de 1 940. Arquivo IPHAN-ES
61
Imagem 28: Croqui com Mapeamento das Áreas Afetadas em 1 943
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Fonte: Feito por Thaíssa Krauss
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SEM COBERTURA
COBERTURA EM MAU ESTADO
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SEM ESQUADRIAS
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Imagem 28: Croqui com Mapeamento das Áreas Afetadas em 1 943
Fonte: Feito por Thaíssa Krauss
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RUINAS
SEM PISO E SEM COBERTURA
SEM COBERTURA
COBERTURA EM MAU ESTADO
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Em 1944, a residência de Reis Magos foi tombada pelo IPHAN património histórico
do Espírito Santo no livro de Belas Artes e no livro Histórico. Na época do
tombamento, a residência encontrava-se em estado de ruínas e foi totalmente
recuperada pelo IPHAN. 70
O Restauro de 1944 foi executado sob a direção de André Carloni, assim como
aconteceu com outros edifícios. Carloni era desenhista e possuía muito prestígio no
Estado do Espírito Santo, mas não possuía nenhuma formação técnica para
executar a restauração de um edifício. Como o conjunto de Reis Magos estava em
estado de ruínas, Carloni restaurou o edifício sem nenhuma pesquisa detalhada, da
forma que melhor Ihe convinha, alterando algumas características do edifício. 71
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No ano de 1 987, o professor Celso Perota, atribuiu a André Carloni e ao restauro de
1944 a inserção de muretas que separavam o pátio interno da circulação no
pavimento térreo da edificação, pois, nas pesquisas arqueológicas vinculadas à obra
de restauração em 1 987, foram descobertos adornos na base das colunas do pátio
que estavam escondidas por parte dessas muretas. ''
Sobre as muretas do pavimento térreo, atribuídas á André Carloni no restauro de
1944, podemos citar a Carta de Atenas, assim como os teóricos Ruskin, Boato e
Brandi, que recomendam que a inserção de novos materiais em restaurações de
edifícios é válido desde que os novos elementos não alterem as características do
edifício restaurado, ou de seus elementos originais, devendo ser inseridos somente
nos casos em que fosse necessário a inserção dos elementos com o intuito de
preservar os elementos, evitando a degradação.
70 CARVALHO, José Antõnio. O Colégio e as residências dos Jesuítas no Espírito Santo. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura.1982. Pagã. 1 13-123
n MOTA, F.T. A ação do IPHAN na Restauração de Reis Magos, em Nova Almeida, ES. Vitória,
2010(
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Comparação de Fotos
A seguir podemos observar algumas fotografias da época do tombamento do
monumento e compara-las com fotografias atuais da edificação.
Imagem 29 - Fachada Posterior: antes da Restauração de 1 944 e atualmente em
2015
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Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquiva pessoal
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Imagem 30 - Fachada Lateral direita e Posterior: antes da restauração em 1 944 e
atualmente em 201 5
Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal
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Imagem 31 - Fachada Lateral Direita - Ala Oeste: Antes da Obra de Restauração
em 1 944 e Atualmente em 201 5
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Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal
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Imagem 32 - Fachada Lateral Direita - Ala Oeste - Antes da Obra de Restauração
em 1 944 e Atualmente em 201 5
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Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal
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Imagem 33 - Pátio Interno em 1 944 antes da Restauração e atualmente em 201 5
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Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal
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Imagem 34 - Corredor ao redor do pátio em 1 944 antes da Restauração e
atualmente em 201 5
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Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquivo pessoal
Imagem 35- Corredor ao redor do pátio em 1 944 antes da Restauração e
atualmente em 201 5
Fonte: Arquivo IPHAN-ES e arquiva pessoal
72
Considerações Finais
Os padres Jesuítas tiveram grande importância na formação social e cultural
brasileira. Por serem grandes construtores, se superaram para construir edificações
"para durar enquanto o mundo durasse" com materiais limitados devido ao fato do
Brasil ser um lugar recentemente descoberto.
A Igreja de Reis Magos é importantíssima para a nossa cultura já que se encontra
com as características praticamente intactas, sendo referência para estudos sobre a
época, pois sua arquitetura do Estilo Jesuítico está muito bem conservada. No
restauro de 2001-2003 foram feitas várias descobertas que esclareceram muitas
dúvidas sobre a vida naquela época.
Na década de 1940, o conjunto foi tombado património histórico e passou pela
primeira grande restauração. A restauração de 1944 teve o intuito de reconstruir a
parte que havia ruído do conjunto de Reis Magos. da mesma forma que os padres
jesuítas haviam feito, como estratégia de preservação cultural. Porém, a obra foi
executada por profissionais que não possuíam qualidade técnica e que não tiveram
o interesse nem a preocupação de preservar as características do monumento ou de
seguir as recomendações da Carta de Atenas e dos teóricos citados neste trabalho.
Essa intervenção planejada inadequadamente mascarou a verdadeira história da
obra e falsificando a técnica que caracteriza a época em que o monumento foi
construído.
Na restauração de 1944, o IPHAN incentivou a produção de um passado forjado
validando a reconstrução da ruína de Reis Magos como estratégia de preservação
cultural, criando um edifício teatral e desprovido de conteúdo artístico e histórico.
Não é possível voltar no tempo e reconstituir as condições de vida e de trabalho dos
índios e dos padres jesuítas que aqui viveram. Não é possível reconstituir as
condições que os fizeram construir o edifício com pedras de coral e argamassa de
conchas e óleo de baleia. Não é possível reconstituir o contexto de transição durante
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73
a catequização dos índios que os estimulou a entalhar símbolos de sua cultura
original das peças em madeira do retábulo e portada. Não é possível reconstituir o
conjunto de Reis Magos e o que ele representa para a nossa história.
Hoje em dia Reis Magos só possui suas características originais praticamente
intactas por causa da restauração de 2001 que teve como objetivo devolver ao
edifício suas características mais antigas, chegando o mais próximo possível das
características originais preservando suas peculiaridades em virtude da sua
importância.
Na época da restauração de 1944 existiam as teorias dos restauradores citados
neste trabalho e a Carta de Atenas. Mesmo assim o restauro de 44 não foi
embasado em nenhum desses documentos. As teorias defendidas por Ruskin, Boito,
Giovannoni e Brandi são tão importantes que a partir da carta de Atenas, foram
produzidos diversos documentos, como a Carta de Veneza de 1964, a carta de
Restauro de 1972 e a carta de Burra de 1980, reafirmando-as. Essas teorias são
acatadas até hoje embalando projetos de restauração por todo o mundo.
Atualmente o IPHAN ainda valida e aprova obras com o mesmo caráter falsificador
da Restauração de Reis Magos de 1944 incentivando a produção de passados
temáticos, principalmente em casos de grande comoção populacional como o caso
da Capela de N.S. das Mercês em São Paulo ou o caso da Igreja Matriz de São Luiz
de Tolosa. Ambas construções haviam desmoronado e foram fiel e
minunciosamente reconstruídas, sem demonstrar vestígios do desmoronamento. ''
27 BRENDELE, Mana de Betânia Uchõa Cavalcanti. Conflitos Projetuaís entre a Academia e o IPHAN
em Laranjeiras, SE
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74
Algumas intervenções em ruínas servem de modelo para a preservação do
património histórico sem a falsa ideia de preservação cultural da reconstrução do
monumento. Essas intervenções destacam possibilidades projetuais de uma
harmonização entre a preservação do património através do tratamento das
patologias, da preservação de suas estruturas com o objetivo de preservar a sua
história o seu significado e não adulterar a sua memória, como acontece hoje no
Coliseu (imagem 36), em Romã-ltália, seguindo o modelo sugerido por Césare
Branda em sua Teoria do Restauro. 7n
Imagem 36 - Coliseu em Romã, ltália: simulação de como era originalmente e
fotografia de como está atualmente
Fonte: Google
Quando é necessária a reposição de algum elemento que ruiu, a nova intervenção
deve incorporar-se à ruína ou incorporar a ruína assumindo claramente sua
Identidade contemporânea à construção, não camuflando nem copiando elementos
arquitetõnicos antigos, preservando a veracidade e historicidade da edificação em
questão harmonizando a convivência do passado e do presente e ainda agregando
aos fragmentos arruinados o reconhecimento memorial de suas historia como
r8 BRANDI, Cesare. Teoria da restauração. Cona: Ateliê, 2004
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podemos observar na intervenção feita por Norman Foster na cúpula do edifício
Reichtag, o Parlamento Alemão (imagem 37). 79
Imagem 37 - A Cúpula do edifício Reichtag em Berlim, Alemanha: original no século
XIX, que foi destruída durante a segunda guerra mundial e a atual cúpula projetada
pelo arquiteto Norman Foster.
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Fonte: Google
D BRANDI, Cesare. Teoria da restauração. Cona: Ateliê, 2004
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edida a
chia Cavalcanti Conflitos Projetuais entre a Academia e o