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FACULDADE DE CIÊNCIAS APLICADAS E SOCIAIS DE PETROLINA – FACAPE MARCOS FLADIMY FILHO VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER PETROLINA 2018 MARCOS FLADIMY FILHO VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER Artigo Científico requisitado como atividade avaliativa referente a disciplina de Introdução ao Estudo do Direito. Docente: Nadielson PETROLINA 2018 Resumo O presente artigo aborda a importância da discussão sobre a violência de gênero, buscando entender como ela ocorre e por quais motivos, além de traçar um panorama geral sobre os tipos mais comuns de sua manifestação, bem como ressaltando a importância em perceber como a vítima se sente ante à situação. Ressalta-se também a relevante importância da Lei Maria da Penha na luta contra a banalização deste tipo de violência e a forma como ampara a vítima. Palavras-chave: Gênero. Mulher. Violência. Lei Maria da Penha. Sumário INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 5 1. CONCEITO DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER .............................................................. 5 FORMAS DE VIOLÊNCIA ................................................................................................................... 7 1.1 Violência Física ................................................................................................................... 7 2.2 Violência Psicológica ................................................................................................................. 8 2.3 Violência Sexual ......................................................................................................................... 8 2.4 Violência Patrimonial ................................................................................................................. 9 2.5 Violência Moral ........................................................................................................................... 9 2. FATORES QUE CONTRIBUEM PARA MANTER A VIOLÊNCIA DE GÊNERO ........... 10 2.1 Omissão das Vítimas ....................................................................................................... 11 3.2 Desigualdade e a sua Influência para a Violência .............................................................. 12 LEI 11.340/06 - MARIA DA PENHA ................................................................................................ 13 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................ 18 INTRODUÇÃO A violência contra a mulher é um sério problema que atinge milhares de pessoas no mundo todo e, de maneira intensa, no Brasil. Essa forma de opressão pode ocorrer sobre qualquer uma, em qualquer lugar: em casa, na rua, no transporte, no local de trabalho e de lazer. A situação é tão grave que em 2015 a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a considerá-la uma epidemia mundial e uma das mais frequentes violações dos Direitos Humanos. É latente, por outro lado, a necessidade de compreender a realidade das mulheres que encontram-se nessa situação, bem como o comportamento da sociedade em relação ao ato cometido. No contexto brasileiro, essa condição apresenta elevada prevalência e coloca a violência contra a mulher como um dos problemas prioritários a ser combatidos pela saúde pública e pelos organismos de defesa dos direitos humanos, assim como um desafio ao setor saúde. Apesar de caracterizar-se como um problema de grande relevância, a violência de gênero somente ganhou maior notoriedade a partir da criação da Lei 11.340/2006 – conhecida como Lei Maria da Penha. Este tipo de violência passou, então, a ser definido como um crime específico e possíveis mudanças na forma de punição aos agressores foram asseguradas. A Lei Maria da Penha (Lei 11.340 de 2006) foi uma grande conquista, pois reconheceu a violência doméstica contra as mulheres, conforme acima citado, como crime e não como assunto privado, além de garantir uma proteção especial àquela que tivera sofrido violência. No entanto, ainda se faz necessária a efetiva implantação e ampliação de políticas públicas de combate e prevenção dessas práticas. 1. CONCEITO DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER Para abordar a violência contra a mulher, faz-se necessário conceituar que o gênero deve ser entendido como elemento constitutivo das relações sociais, ou seja, aquela que é exercida de um sexo sobre o sexo oposto. Baseada nas diferenças entre os sexos, este conceito refere-se à violência onde o sujeito passivo é a pessoa de gênero feminino (FERRANTE; SANTOS; VIERA, 2009). O termo violência deriva da palavra latina vis, que significa força e se refere às noções de constrangimento e de usar a superioridade física sobre outra pessoa. A violência contra a mulher pode ser compreendida como uso intencional de poder ou força física, podendo ser real ou apenas ameaça, que possa resultar em lesão, dano psicológico ou físico e até morte (BRASIL, 2002). Tal comportamento pode invadir a autonomia, integridade física ou psicológica e mesmo a vida de outro. Pode ocorrer de diversas maneiras, como a violência e o abuso sexual contra as crianças, maus-tratos contra idosos e pessoas com deficiência, violência contra a mulher, etc. A violência afeta mulheres de todas as classes sociais, etnias e regiões brasileiras. A situação é tão grave que em 2015 a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a considerá-la uma epidemia mundial e uma das mais frequentes violações dos Direitos Humanos. Disso, atualmente, a violência contra as mulheres é entendida não como um problema de ordem privada ou individual, mas como um fenômeno estrutural, de responsabilidade da sociedade como um todo. No Brasil, a situação é alarmante: a cada 5 minutos uma mulher é espancada; a cada 2 horas uma mulher é assassinada devido à violência doméstica; de 2009 a 2012 as denúncias de estupro cresceram 158%; aumentaram consideravelmente os relatos públicos de assédio sexual e/ou moral nos locais de trabalho. (Dados da Secretaria de Políticas para Mulheres – SPM/PR – 2012) Apesar de os números relacionados à violência contra as mulheres no Brasil serem alarmantes, muitos avanços foram alcançados em termos de legislação, sendo a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) considerada pela ONU uma das três leis mais avançadas de enfrentamento à violência contra as mulheres do mundo. A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, mais conhecida como Convenção de Belém do Pará, define violência contra a mulher como ―qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada‖ (Capítulo I, Artigo 1°). A Lei Maria da Penha apresenta mais duas formas de violência - moral e patrimonial -, que, somadas às violências física, sexual e psicológica, totalizam as cinco formas de violência doméstica e familiar, conforme definidas em seu Artigo 7°. Em 2015, a Lei 13.104 (Lei nº 13.104, de 2015) altera o Código Penal para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e inclui o feminicídio no rol dos crimes hediondos. O feminicídio, então, passa a ser entendido como homicídio qualificado contra as mulheres ―por razões da condição de sexo feminino‖. 2. FORMAS DE VIOLÊNCIA Em termos gerais, a violência contra a mulher é um tipo de violência que acontece geralmente no âmbito privado ou doméstico. É praticada nas relaçõesinterpessoais onde agressores estabelecem relações de afetividade com a vítima. Particularmente, os agressores se configuram como maridos, ex-maridos, companheiros, ex-companheiros, namorados, ex-namorados que usam da violência como uma forma de exercer o poder sobre a mulher, ante à sua hipossuficiência desta. Mesmo que esse tipo de violência venha a ser praticada no âmbito privado ela deve ser tratada com um caráter político e público, pois é um tema de responsabilidade geral e social. A violência contra a mulher se expressa de várias formas. A citada Lei Maria da Penha estabelece, no seu artigo 7º, basicamente quatro espécies: violência física, psicológica, patrimonial e sexual. 2.1 Violência Física De acordo com a Lei Maria da Penha, ―a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal‖. É caracterizada por lesões corporais causadas por tapas, chutes, arremessos de objetos e por qualquer outra forma que possa deixar marcas no corpo físico da vítima. Nesse tipo de violência pode ocorrer lesões graves e deixá-la incapacitada de realizar tarefas habituais por toda sua vida podendo leva-la a morte. 2.2 Violência Psicológica Nos termos da legislação especial, é ― a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação. 2.3 Violência Sexual A Lei Maria da Penha define a violência sexual como ―qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos‖. Caracteriza-se quando a mulher é forçada a ter relações sexuais com alguém, que pode ser seu marido, companheiro, namorado ou mesmo alguém desconhecido. Esse tipo de violência pode ocorrer de várias formas: através do estupro, abuso sexual, este, praticado especialmente contra crianças e adolescentes, assédio sexual que é a perseguição constrangedora da vítima por alguém que se aproveita de sua condição hierarquicamente superior; e atentado violento ao pudor. 2.4 Violência Patrimonial A violência exercida sobre os bens da mulher também recebeu tratamento especifico da Lei Maria da Penha, que é entendida, nos seus dizeres como ― qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades‖. Configura-se, portanto, pela ação de retenção ou subtração, destruição parcial ou total de pertences da vítima: objetos, aparelho de telefone, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, dinheiros, roupas etc. Estragar um computador necessário para o desempenho profisisonal, uma máquina de costura, de lavar, ou qualquer outro instrumento de trabalho das mulheres são formas de violência patrimonial contra estas relacionada ao trabalho. 2.5 Violência Moral A nossa legislação extravagante conceitua violência moral como ―qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria‖. Advém de ações destinadas a caluniar, difamar ou injuriar a honra ou a reputação de uma mulher. Uma forma de violência velada é o assédio moral. Fofocas mal-intencionadas que depreciem as mulheres e que sejam feitas no locais de trabalho são exemplos desse tipo de violência. Os tipos que vitimizam as mulheres de violência são inúmeros, logo seria de muita pretensão tentar falar aqui de todos eles. O Instituto DataSenado, na realização da sua pesquisa sobre a Violência doméstica e familiar contra a mulher – 2015, constatou que as agressões físicas e psicológicas foram majoritárias entre as mulheres que declararam ter sido vítima de violência – sete em cada dez mulheres sofreram agressão física; 48%, quase metade, sofreram agressão psicológica. A violência sexual ainda atinge uma em cada dez brasileiras. https://www12.senado.leg.br/institucional/datasenado https://www12.senado.leg.br/institucional/datasenado/pesquisas/consultarpesquisa?materia_id=brasileiras-sabem-da-lei-maria-da-penha-mas-a-violencia-domestica-e-familiar-contra-as-mulheres-persiste https://www12.senado.leg.br/institucional/datasenado/pesquisas/consultarpesquisa?materia_id=brasileiras-sabem-da-lei-maria-da-penha-mas-a-violencia-domestica-e-familiar-contra-as-mulheres-persiste Nota-se que mesmo existindo a Lei, diferentes razões impedem a mulher de recorrer à justiça, entre elas destacam-se o medo do agressor, a vergonha, a dependência financeira e a punição branda, onde neste último geralmente o autor do crime presta apenas serviços sociais, o que para as mulheres violentadas não é o bastante (BRASIL, 2009). 3. FATORES QUE CONTRIBUEM PARA MANTER A VIOLÊNCIA DE GÊNERO Fruto da construção histórica das sociedades modernas, o processo por meio do qual o capitalismo é reforçado pelo patriarcado faz com que os homens, enquanto grupo social, tenham privilégios e sejam protegidos quando agem de forma a tentar manter a submissão das mulheres. Muitas lutas têm conseguido questionar e até mesmo reverter em parte a construção machista de nossa sociedade, mas, ainda há uma série de obstáculos que precisamos romper para podermos colocar fim à violência sexista. Tais como a impunidade dos agressores, o silêncio das mulheres agredidas, as ideias construídas socialmente sobre a inferioridade das mulheres que, consequentemente, influenciam para a banalização da violência de gênero. Além de tudo isso, é nítido que há, no seio social, uma espécie de transformação das vítimas em culpadas – afirmação de que a mulher que provocou e que mereceu, bem como as diversas desculpas para tentar justificar os atos de violência: bebida, estresse ou loucura. Diante da enorme necessidade de se proteger e amparar, de maneira sistêmica, as vítimas da violência de gênero é que houve o nascimento da Lei Maria da Penha, diploma legislativo importantíssimo e de grande valia para o combate da violência sexista. 3.1 Omissão das Vítimas De acordo com a cartilha Campanha permanente do Ministério Público do ano de 2012, Maria da Penha em Ação, acredita-se que mais de 50 % das mulheres que sofrem agressão permanecem caladas sem pedir ajuda. Por vergonha, medo, dependências financeiras ou emocionais, essas são muitas das causas. Cativas ainda de uma cultura machista, sofrem sozinhas e em silêncio. Em muitos casos o agressor acusa a própria vítima de ser a responsável pela agressão e até promete depois do ato agressor que não acontecera novamente. Porém não demora muito para que o ato monstruoso volte a ocorrer. De acordo com Silva (2002), ao observar-se o contexto das vítimas, percebe-se a vergonha, o medo e o desconhecimento do arcabouço legal que impõe limites à violência. Esses fatores dificultam a ida das vítimas aos serviços de saúde. Mesmo quando se veem obrigadas a procurar esses serviços, devido à presença de lesões físicas, as mesmas tendem a silenciar o problema e raramente fazem queixas espontâneas durante as consultas8. Isto proporciona um caráter de invisibilidade àviolência de gênero, que não é algo consentido, mas sim cedido, em virtude das mulheres não usufruírem plenamente do poder patriarcal, como ocorre com os homens. Mesmo contemplando a intensidade que esta realidade vem sendo discutida é necessário cada vez mais trazer luz a essas mulheres do direito que todas elas despõe de viver sem violência. Que quando gritam por socorro, não é vergonhoso, mas, demonstram dignidade, liberdade e cidadania. Faz com que o Estado cumpra o seu dever de punir o responsável e proteger a vítima. 3.2 Desigualdade e a sua Influência para a Violência A violência doméstica, tem raízes culturais, está relacionado a práticas machistas que foram e continuam sendo a causa da desigualdade, que legitimam e que acabam contribuindo para que as mulheres se vejam como dependentes no qual sentem dificuldades financeiras e emocionais, de romper o ciclo de agressões. A violência é portanto um meio de coagir, de submeter outrem a seu domínio, é uma violação dos direitos essenciais do ser humano. A dominação que o homem exerce sobre a mulher constitui uma das dificuldades para que ela consiga sair da situação de violência em que se encontra. Um problema que leva as mulheres a continuarem vivendo em situação de violência é a dependência emocional em relação ao marido. Muitas sofrem para manter o casamento, pelo fato de confundirem o papel de esposa com o de mãe. Até chegam, muitas vezes, a denunciar o marido, mas não chegam, na maioria dos casos, a se separar em definitivo. Só que muitas vezes, o problema vai criando uma proporção tamanha que ela necessita denunciar e quando o faz se sentem culpadas. Portando a violência contra a mulher é entendida como um fenômeno social baseado nas desigualdades de gênero e refletidas nos papeis atribuídos a homens e mulheres. No Brasil, esta condição apresenta elevada prevalência e coloca a violência sexista como um dos problemas prioritários a ser combatidos pela saúde pública e pelos organismos de defesa dos direitos humanos, assim como um desafio ao setor saúde. Apesar de caracterizar-se como um problema relevante, a violência de gênero apenas ganhou maior notoriedade a partir da criação da Lei 11.340/2006 – conhecida como Lei Maria da Penha. Este tipo de violência passou, então, a ser definido como um crime específico e possíveis mudanças na forma de punição aos agressores foram proporcionadas. 4. LEI 11.340/06 - MARIA DA PENHA A violência doméstica contra mulher é crime, e, para evitar este ato e punir quem o pratica, foi criada em 7 de agosto de 2006 a lei de número 11.340 – Lei lei Maria da Penha, que entrou em vigor no dia 22 setembro de 2006. A lei recebeu este nome para homenagear a mulher Maria da Penha Maia Fernandes, que foi violentada pelo marido durante seis anos de casamento. O estopim para que Maria o denunciasse foi quando o marido atirou contra ela deixando-a paraplégica, porém o marido foi punido dezenove anos depois e ficou apenas dois anos preso. Seu caso foi abordado pela Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos que responsabilizou o Brasil por ficar omisso diante de tal fatalidade. A OEA realizou no Brasil a Convenção do Belém do Pará, em 9 de junho de 1994, para punir e evitar a violência doméstica contra a mulher e buscou investigar como estava o caso de Maria na justiça. Diante da situação, exigiram que o Brasil criasse uma lei com o fim punir a violência doméstica contra mulher. Para melhor entendimento da lei iremos abordar suas principais características. Segundo o artigo 1º da Lei Maria da Penha, esta tem o principal objetivo de caracterizar a violência doméstica e familiar como violação dos direitos humanos das mulheres proteção e procedimentos policiais e judiciais mais humanizados, para as vítimas: Art. 1o Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Para Hermann (2007, p. 83), a proteção da mulher preconizada na Lei decorre da construção de sua condição (ainda) hipossuficiente no contexto familiar, fruto da cultura patriarcal que facilita sua vitimação em situações de violência doméstica, tornando necessária a intervenção do Estado a seu favor [...]. Conforme o pensamento de Hermann acima, pode-se entender que a mulher tem o estereótipo de um ser frágil, dona de casa que dedica a vida à família. É vítima de agressões do marido, na maioria das vezes não o denuncia por medo, insegurança, por depender economicamente dele, e, muitas vezes, por estar iludida pelas promessas de mudança do parceiro. Já diz o ditado popular: ‖Em briga de marido e mulher não se mete a colher‖, porém este conhecimento popular é machista e ultrapassado, pois garante autoridade ao homem em relação à mulher, consequentemente a tornando submissa às suas vontades e rompendo os princípios do art. 5o inciso I da Constituição Federal, que garante igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres. O art. 2o da lei Maria da Penha estabelece que: Art. 2o Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. Conforme descrito neste artigo, a lei garante igualdade entre as mulheres pelo fato de não distingui-las por suas crenças e origens. Garante também uma igualdade de gênero entre o homem e a mulher, pois a mulher perdeu aquele título de Amélia e conquistou seu espaço na sociedade. Isso se torna notório principalmente durante a I e II Guerra Mundial, quando seus parceiros foram para os campos de batalha e elas puderam se libertar da condição de dependência do marido e começaram a ocupar os mesmos cargos que eram ocupados por eles. Portanto elas precisavam de um ente que intervisse na situação para garantir seus direitos e sua proteção; esta instituição é o Estado. A função do Estado está expressa na Lei Maria da Penha no art. 8o: Art. 8o A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não- governamentais, tendo por diretrizes: I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação; II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às consequências e à frequência da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas; III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1o, no inciso IV do art. 3o e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal; IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres,em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher; V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres; VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não- governamentais, tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher; VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia; VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia; IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à equidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher. É notório que a função do Estado é evitar a violência doméstica conforme o caput do artigo; para isso ele deve desvendar os motivos que levam o agressor à prática da violência contra sua parceira, descobrir o motivo de tantas mulheres se manterem em silêncio diante das agressões, e, principalmente verificar as consequências causadas à mulher. A partir destes dados pode-se desenvolver campanhas para evitar a violência doméstica e propagar a lei para a sociedade. Para regulamentar sobre a punição do agressor, a lei utiliza-se dos princípios do Código Penal e do Código Civil, conforme art. 13 da lei 11.340. Com relação ao cumprimento de pena a lei estabelece conforme art. 17 que o agressor não pode se escusar de cumprir pena com o pagamento de multa, doação de cestas básicas ou prestação de serviços comunitários, que deveria ser aplicada no julgamento de ouros crimes a fim de evitar a impunidade dos criminosos. A Lei Maria da Penha necessita ser conhecida, difundida, interpretada, amplamente divulgada, tanto em espaços acadêmicos como em escolas, associações, sindicados, locais de trabalho, comunidades de periferia, grupos de mulheres, entre outros. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Conclui-se que a violência contra a mulher é fruto das desigualdades de gênero sendo estas identificadas nos papéis atribuídos pela sociedade aos homens e as mulheres e que isto advém de raízes culturais criadas e impostas pelos indivíduos. São exatamente essas práticas machistas que legitimam e acabam contribuindo para que as mulheres se vejam como dependentes em relação ao marido ou companheiro, tanto financeiramente como afetivamente, no qual sentem dificuldade de sair da situação em que se encontram. A edição da Lei nº 11.340/2006 veio como um passo em direção ao cumprimento das determinações da Convenção de Belém do Pará e da Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra as Mulheres, além de regulamentar a Constituição Federal. Essa Lei traz medidas protetivas à mulher vítima de violência doméstica e familiar, e, na esfera punitiva, proíbe a aplicação das chamadas pena alternativas, principalmente os benefícios da Lei nº 9099/95 (a transação penal, as multas que eram convertidas em cestas básicas —, e a suspensão condicional do processo). Dentre as medidas protetivas elencadas na Lei ‗Maria da Penha‘, algumas merecem destaque, diante de seus feitos intimidativos, bem como para a garantia da integridade física e moral da ofendida. Pode-se citar a obrigação de a Autoridade Policial garantir a proteção da mulher, encaminhá-la ao hospital, fornecer-lhe e aos dependentes o transporte que se fizer necessário, e acompanhar-lhe ao domicílio para a retirada dos pertences. O combate ao fenômeno da Violência contra Mulher não é função exclusiva do Estado; a sociedade também precisa se conscientizar sobre sua responsabilidade, no sentido de não aceitar conviver com este tipo de violência, pois, ao se calar, ela contribui para a perpetuação da impunidade. Faz-se urgente a compreensão, por parte da sociedade como um todo, de que os Direitos das Mulheres são Direitos Humanos, e que a modificação da cultura de subordinação calcada em questões de gênero requer uma ação conjugada, já que a violência contra a mulher desencadeia desequilíbrios nas ordens econômica, familiar e emocional. Além disso, a conscientização da natureza histórica da desigualdade de gênero precisa ser trabalhada desde o início do ensino escolar, já que a desigualdade de gênero somada a ordem patriarcal vigente são alguns dos ingredientes que, unidos ao sentimento de culpa inculcado historicamente na psique das mulheres, contribuem para a perpetuação das relações desiguais de poder que acabam por acarretar em violência REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Ministério da Saúde. Violência Intrafamiliar: orientações para a prática em serviço. Brasília: Ministério da Saúde, 2002b. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt0104_25_01_2011.html. Acesso em: 29 de novembro de 2018. Departamento de Assuntos Jurídicos Internacionais. Convenção Interamericana para previnir, punir e erradicar a violência contra a mulher. Disponível em: http://www.oas.org/juridico/portuguese/treaties/a-61.htm. Acesso em: 29 de novembro de 2018. FERRANTE, F. G.; SANTOS, M. A.; VIEIRA, E. M. 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